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A Dama da Floresta 1
Catherine Archer A Dama da Floresta
(Catherine Archer)
Título original: The Bride of Spring
Digitalizado: Polyana
Revisado: Anicieli
Inglaterra, 1461
Raine Blanchett encontrava-se entre os inúmeros cortesãos que
aguardavam a audiência do rei Edward mas, ao contrário dos requintados nobres,
ela não fora ao castelo para falar com o rei. Raine estava à procura de um marido.
A necessidade de encontrar um pretendente o mais rápido possível
tornara-se uma pressão insustentável nos últimos dias, pois o mês que havia
passado na corte não fora nada produtivo.
Ir à corte parecera-lhe a melhor alternativa quando comunicara a decisão
ao irmão, William, e à criada, Aida. No entanto, ao concretizar a idéia, descobrira
que colocá-la em prática era mais difícil que concebê-la.
O caráter firme e honesto de Raine apresentava-se como um obstáculo à
complicada situação. Não almejava encontrar qualquer marido, um rosto bonito e
uma soberba inteligência não seriam suficientes. Precisava de um homem
responsável que cuidasse de seu irmão de onze anos e das propriedades que ele
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não sou casado. Prefiro conversar sobre temas mais interessantes que
Ainsworth.
— Sim, talvez mais tarde — Raine dispensou-o. Já pensava em uma maneira
de descobrir mais sobre Benedict Ainsworth, embora não...
— Atenção! — o rei Edward exclamou, de repente. — Lamento muito, mas
agora preciso tratar de um assunto sério. Peço-lhes que se retirem. Amanhã
estarei à disposição de todos.
Raine ficou desapontada. Queria tanto conhecer o homem que viera ter
com o rei Edward, e perdera aquela oportunidade única, porque todos começavam
a se retirar. Não havia como permanecer no recinto.
Junto aos demais, ela caminhou em direção à porta. Ouviu comentários de
desagrado e suspirou. Não era a única frustrada, embora duvidasse de que os
motivos dos outros fossem semelhantes aos dela.
A vontade de ver aquele homem de perto a impedia de caminhar. Raine
postou-se atrás da multidão. Entretanto, antes que tivesse a oportunidade de se
virar para ver Benedict Ainsworth, o assistente do rei apressou os presentes.
Raine resmungou. Se pudesse se transformar em um ser minúsculo, não
seria notada. Então, pressionada pelas pessoas, roçou o ombro na pesada
tapeçaria pendurada à parede, e uma idéia resvalou-lhe a mente.
Talvez não pudesse ser minúscula, mas conseguiria ocultar sua presença.
Sem se permitir refletir, ela esgueirou-se atrás da tapeçaria. Prendeu a
respiração, temendo que alguém a notasse, mesmo sabendo que o pesado tecido a
ocultaria por completo.
Benedict Ainsworth, o barão de Brackenmoore, encarava o rei Edward
enquanto esperava que os nobres deixassem a sala. Sabia que a decisão de ir à
corte lhe custaria alguns bens. Maxim Harcourt fora morto pelas mãos de seu
irmão, Tristan Ainsworth. Não havia como negar que o irmão de Maxim exigiria
alguma retribuição.
Tristan tinha matado Harcourt por uma boa causa. Porém, Benedict
pretendia negociar a morte do homem com o rei em pessoa. Por isso tivera a
ousadia de requerer uma audiência privativa com Edward, caso contrário jamais
solicitaria um favor especial.
Quando o último dos cortesãos se retirou, Edward dirigiu-se ao assistente.
— Pode nos deixar a sós.
O homem olhou para Benedict. Ainsworth não disse nada. A opinião do
assistente era irrelevante. Havia questões mais importantes a tratar.
Tão logo o assistente saiu, Edward virou-se e sorriu.
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tenham paz. Já sofreram bastante e precisam construir uma nova vida juntos. —
Benedict notou, surpreso, o tom de voz suave que usou para falar do amor de
Tristan. Embora estivesse feliz pelo irmão, não pretendia experimentar uma
emoção tão arrebatadora.
Brackenmoore e a família eram suas paixões. Talvez o casamento recente e
a alegria dos noivos lhe trouxessem aquele ar romântico.
Voltou a atenção a Edward, que parecia pensativo.
— Já considerou a possibilidade de viver na corte, Benedict? — O rei
sorriu. — Poderíamos usar essa sua mente diplomática.
— Ando muito ocupado em administrar minhas terras, Majestade. Deixarei
a vida diplomática para aqueles que a apreciam.
Edward levantou-se e puxou a corda ao lado da mesa. Imediatamente, o
assistente entrou por uma porta atrás do trono.
— Vossa Majestade?
— Chame o escrevente.
O homem assentiu e desapareceu novamente. Edward aproximou-se de
outra mesa, encheu duas taças de vinho e ofereceu uma delas a Benedict.
— Só por curiosidade, amigo. Devo estar preparado para ser generoso com
Alister Harcourt?
Benedict sorriu pela primeira vez.
— Oh, com moderação, milorde, com moderação. — Ele ergueu a taça e
bebeu.
Raine escutou cada palavra quando o escrevente entrou na sala e depois
saiu, apesar de não conseguir enxergar nada através da grossa tapeçaria. Quanto
mais ouvia, mais intrigada ficava acerca de Benedict Ainsworth e ansiava vê-lo de
perto.
No entanto, não ousou sair do esconderijo pois, enquanto os homens
conversavam, notou quão atrevida fora ao bisbilhotar a conversa privativa do rei.
Ninguém acreditaria que ela havia se escondido para descobrir tudo sobre o enig-
mático barão.
A história de Benedict Ainsworth deixou-a curiosa. Ele parecia um homem
bom e decente, capaz de abrir mão de propriedades e dinheiro para proteger a
reputação da cunhada e da sobrinha.
Enquanto o escutava discriminar os bens os quais estava disposto a
oferecer, Raine ficou comovida ante o desprendimento do barão. Precisava de um
homem como Ainsworth! A vida seria bem diferente se houvesse alguém para
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Entre todos, Raine era a pessoa que mais desejava retornar a Abbernathy
e fingir que tudo acabaria bem. Mas com Denley à espreita, ninguém conseguiria
viver em paz.
Era a única pessoa capaz de garantir o futuro da família, por mais difícil
que fosse.
— Aida, por favor, não vamos discutir outra vez. Preciso de que me ajude.
William, que lia um livro, deixou o volume sobre a mesa e fitou a irmã.
— Quem é ele, Raine? Como ele é?
William era um recém-nascido na ocasião em que perderam a mãe, de modo
que não se recordava dos acontecimentos que se sucederam ao falecimento. O
pai, abalado pela dor, caíra em profunda depressão, forçando Raine a amadurecer
aos oito anos de idade.
Agora William compreendia, de certa maneira, as razões da irmã. Ele
permanecera ao lado do pai na noite em que este faleceu, e testemunhara a
responsabilidade que fora imposta a Raine.
Nenhuma criatura esperava que o velho William abandonasse o filho mais
moço. Aos olhos de Raine, ele fora um homem forte e invencível. A doença que lhe
tirara a vida desenvolveu-se tão rapidamente que ninguém se encontrava
preparado para sua morte. Na ocasião, Raine não se permitiu sentir a própria dor,
havia ignorado a angústia e canalizado a energia para cuidar de William como seu
pai desejara.
O irmão não era robusto, mas possuía caráter e inteligência. A
vulnerabilidade física incrementava a determinação de Raine em se sacrificar por
ele.
Resumidamente, ela relatou o que havia acontecido no castelo real.
Wiliam parecia tão preocupado quanto Aida.
— Você se escondeu atrás da tapeçaria e escutou a conversa do rei com
esse homem? Raine, ficou louca? E se fosse pega em flagrante? Podia ser acusada
de espionagem ou traição...
— Não fui pega, William. — Raine, de repente, deu-se conta de quão
terrível seria para ele caso fosse acusada de alguma ilegalidade. Quem cuidaria
dos interesses de William?
— Mas correu um risco enorme. E disse que esse homem a viu? Ele pode
ter contado a alguém. — A indignação nos olhos verdes de William revelou o
homem honrado que um dia ele se tornaria.
— Ainsworth não vai contar a ninguém — Raine afirmou com uma convicção
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inexplicável.
— Como sabe, lady Raine? — Aida perguntou. — Nem sequer o conheceu.
— Ele não dirá nada. — Raine não ousou encarar a criada. A noção parecia
fortalecer-se cada vez que ela refletia sobre o assunto. Benedict Ainsworth não
a trairia.
CAPÍTULO II
Raine arrumou-se para a ceia com muito mais primor desde que chegara à
corte. Estava determinada a se apresentar a Benedict Ainsworth e rezava para
que ele aparecesse no grande salão do castelo real.
A bem da verdade, também precisava explicar-lhe por que se escondera
atrás da tapeçaria. Pensaria em algo convincente quando chegasse a hora. Sua
prioridade, a de descobrir se lorde Ainsworth seria ou não um bom guardião para
William, sobrepunha-se a qualquer detalhe.
Raine adentrou o esplendoroso salão, trêmula de expectativa. Mal prestou
atenção às tapeçarias ainda mais luxuosas ou aos cortesãos elegantemente
vestidos, que ocupavam as mesas, degustando carnes suculentas, pães frescos,
iguarias variadas e copiosas quantidades de vinho e cerveja.
Porém, notou que Edward não se encontrava na mesa principal, pois a
pesada cadeira estava vazia. Raine ficou aliviada, embora acreditasse que
Ainsworth não contara nada ao rei.
Precisava ser firme em seu objetivo. A possibilidade de completar a busca
àquele que daria proteção a William, um marido, tanto a apavorava quanto a
empolgava, em especial, quando lembrava quão charmoso e bonito era o
pretendente em questão.
Sacudindo a cabeça, ela eliminou o último pensamento. Não podia se
agarrar a fantasias. Sentimentos frágeis atrapalhavam o raciocínio e
atrapalhavam o julgamento que deveria fazer acerca de Benedict Ainsworth a
fim de saber se era o homem certo para proteger William.
E era tudo que o barão precisava fazer. Ela não estava interessada em um
casamento verdadeiro. Tinha Abbernathy e o irmão para cuidar.
Endireitou os ombros, ajeitou o vestido cor de safira e vistoriou o salão.
Como não localizasse o barão entre os presentes, soltou um suspiro e voltou a
procurá-lo mais uma vez. Não havia sinal daquele corpo inconfundível, tampouco
dos cabelos negros.
Ficou desapontada. Apesar de não existir garantias, ela havia suposto que
lorde Ainsworth compareceria à ceia.
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Ela prosseguiu:
— Admito que não deveria me esconder na sala do rei, agi tolamente.
Refugiei-me atrás da tapeçaria porque queria evitar um certo cavaleiro que não
parava de me assediar e... — Raine baixou o rosto. — Eu não podia sair enquanto o
senhor e o rei estavam na sala. O que Sua Majestade iria pensar de mim?
Benedict ficou desconfiado da frágil explicação.
— Suas palavras não me convenceram, começo a pensar que deveria ter
discutido o problema com o rei.
— Não! por favor, milorde. Eu lhe imploro. Juro pela alma de meu falecido
pai que não pretendia ferir o rei ou a coroa com minhas ações. Não estou
interessada nos negócios do rei.
Agora Benedict acreditava nela. Não havia dúvidas de que era sincera. A
razão que a levara a cometer tamanha sandice não tinha nada a ver com traição.
Respirou aliviado e, sem saber por quê, convenceu-se de que não tomava
parte de nenhum complô contra o rei.
Percebeu o cacho rubro que roçava a face rosada de Raine Blanchett.
Dirigiu o olhar para o arco de pérolas. Em seguida, fitou a manga do vestido de
veludo azulado. Obviamente, ela não sofria dificuldades financeiras. Lembrou-se
dos sapatos verdes que Raine usara naquela manhã. Jamais esqueceria a surpresa
de divisar os pés femininos sob a tapeçaria. De súbito, notou que sorria.
No mesmo instante, recuperou a expressão grave. Não devia sorrir diante
do que ela fizera. Na verdade, tinha de alertá-la para as consequências de tal
ato.
— Acredito em suas palavras, lady Raine, e sugiro que pondere no futuro.
Se eu souber que voltou a fazer algo parecido, falarei com rei Edward. Minha
partida em dois dias não irá impedir que eu seja informado de qualquer
irregularidade na corte.
Um brilho de desapontamento pareceu surgir nos olhos dourados.
— Oh, obrigada, milorde, é o mais gentil dos cavaleiros. Não ousarei trair
sua confiança.
A promessa, embora feita em voz baixa, foi tão sincera que o comoveu.
Benedict ficou encantado ante a genuína lisonja. Por quê? Afinal, ela nem sequer
o conhecia. Sem dúvida, Raine Blanchett era um enigma e jamais conhecera
alguém tão interessante.
Repreendeu-se em pensamento. Não precisava de outros interesses em sua
vida. As propriedades e a família lhe eram suficientes, Havia dez anos, desde a
morte dos pais, que ele dedicava a vida a tais interesses e não pretendia mudar
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agora.
Raine ficou ainda mais impressionada com Benedict Ainsworth e
decepcionada com a revelação de que ele partiria em dois dias. Ficou evidente que
o barão não acreditara na mentira de estar sendo assediada por um admirador
qualquer, contudo, pareceu crer que ela não tinha intenções de prejudicar a
coroa. Como era astuto!
Não pôde evitar o sorriso enquanto erguia o rosto e... De súbito, divisou
Denley Trent, seu primo, adentrando o salão. O prazer transformou-se em um
resmungo. Denley era o último homem que esperava ver.
Ele usava um manto novo vermelho, o modelo preferido entre os membros
da corte. Era curto e as longas mangas bufantes pareciam femininas demais em
comparação às mãos grossas de Denley. O grotesco primo não combinava com a
moda ascendente.
Aquela presença tornou-se um peso nos ombros de Raine. Que atrevimento
segui-la à corte! Até onde iria a persistência de Denley de subjugar Raine e
William?
Olhou para Benedict Ainsworth. Como ele era diferente de Denley. Ter o
barão em sua retaguarda faria o primo reconsiderar a teimosa determinação de
esposá-la.
Mas Ainsworth agora falava com um nobre a sua direita. Apesar de Raine
ter se esforçado em parecer atraente, o barão mostrou-se interessado somente
no bem-estar do rei Edward. Depois de esclarecer a situação, o homem a
dispensara.
O que ela faria agora ante a chegada do primo?
Desesperada, vasculhou o salão repleto de pessoas na esperança de
encontrar uma solução para o problema. Durante a estada na corte, Raine não
conhecera nenhum homem, além de Benedict Ainsworth, capaz de suprir sua
expectativa.
Voltou a observar Denley. Ele parecia procurar alguém. Quando a avistou
entre os presentes, mostrou-se aliviado.
Raine suspirou. Denley precipitava-se em sua direção, tal qual um boi
teimoso.
Não queria enfrentar Denley no salão real. Seria constrangedor, caso ele a
inquirisse sobre o fato de ter saído de Abbernathy sem comunicá-lo. Ele a
visitava todos os dias, desde a morte do pai, e, com certeza, ficara chocado
quando não a encontrara em casa. Principalmente porque Raine havia proibido os
criados de informarem a ele onde estava.
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voz. — Não é hora nem lugar para discutir certos assuntos. E, em vez de humilhá-
la diante da assembléia, o senhor deveria salvaguardá-la.
Pela primeira vez, Denley pareceu reparar que os outros o observavam.
Corou e soltou o braço de Raine. Porém, o constrangimento não sobrepujou a raiva
que ele ainda demonstrava.
— Sendo o único parente vivo, considero-me seu guardião.
— Ele não é meu guardião — Raine apressou-se em explicar. — Meu pai
morreu há poucos meses, mas não entregou nenhuma responsabilidade a Denley.
Como lhe disse, é meu primo e nada mais.
Denley expressou o desagrado, contudo, não disse palavra já que Benedict
passou a ignorá-lo. Raine não tinha o menor interesse em saber o que o primo
estava pensando.
Olhou para Benedict, que a observava atentamente. A expressão
consternada a agitou. A sensação de ser cuidada havia se perdido no remoto
passado. Raine habituara-se a proteger Wil, Aida e os residentes de Abbernathy.
A experiência de ser protegida a enervava. Sentiu lágrimas ofuscando-lhe
a visão, mas se recusou a sucumbir. Não precisava de nenhum guardião. Desviou o
olhar de Benedict e reparou então que todos os presentes à mesa a observavam
com explícita curiosidade.
Estava certa de que a causa de sua vergonha era a atitude intempestiva de
Denley. Sentiu-se fraquejar ante a bisbilhotice dos cortesãos, não conseguiria
permanecer ali sem cair em prantos. Mais uma vez tentou sair da mesa. Quando
Denley aproximou-se para ajudá-la, Ainsworth levantou-se a fim de impedi-lo.
Com o olhar, Raine agradeceu a gentileza de Benedict e também se
levantou. Sabia que as pessoas continuavam a assistir à cena e logo espalhariam o
ocorrido. Ela chegara a escutar comentários maldosos acerca de outros. Não
fugiu correndo como, no íntimo, desejava. Endireitou os ombros e forçou-se a
caminhar de cabeça erguida.
Após uma longa noite insone, Raine não podia mais protelar sua decisão.
Denley a perseguira até a corte, encenara um espetáculo horrível diante da
sociedade, sem se preocupar com os sentimentos dela ou de outrem.
Benedict Ainsworth não hesitara ao ajudá-la, mas nem sequer havia notado
os frágeis esforços de atraí-lo, talvez ele não a achasse atraente. A hipótese não
era estimulante, já que pretendia persuadi-lo a se casar. Ora, o barão não
precisava amá-la profundamente. Amor era uma emoção sem a qual ela pretendia
viver uma vez que o único propósito da união seria proteger William.
De fato, o futuro marido não deveria estar apaixonado por ela, em
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especial, porque não tinha a menor vontade de morar com ele, pois tencionava
retornar a Abbernathy tão logo o casamento fosse realizado.
A família Blanchett vivera naquelas terras desde a época de William I.
Raine não seria a primeira a abandonar o que lhe cabia por direito, mas pretendia
administrar Abbernathy até que William estivesse maduro o bastante para
assumir seus deveres de herdeiro. Se o suposto marido desejasse acompanhá-la,
seria bem-vindo.
Novamente lembrou-se de que só poderia voltar para casa depois do
casamento e ainda não havia encontrado um marido.
Em um momento de desespero, sentiu vontade de chorar. Felizmente
achava-se sozinha no minúsculo quarto. Aida e Willíam haviam ido passear nos
jardins do castelo. Raine não tinha tempo para distrações, tampouco desejava que
os dois percebessem quanto estava preocupada com aquela situação.
Quando uma batida à porta ecoou pelo cômodo, ela assustou-se. Estava
ansiosa demais. Não ganharia nada com aquele nervosismo exagerado. Respirou
fundo e soltou o ar bem devagar, acalmando-se, antes de abrir a porta.
Não sabia quem poderia ser, já que Aida e William não bateriam antes de
entrar.
Ver Denley Trent à soleira da porta perturbou-a ainda mais. De imediato,
ela tentou fechar a porta, mas o primo impediu-a, colocando o pé na abertura, e
obrigou-a a recuar. Ela o enfrentou, resoluta, embora o sorriso malicioso nos
lábios de Denley e o modo como entrou no quarto a deixassem insegura.
— Quero que se retire agora. — Raine apontou a porta que ele acabava de
fechar.
— Oh, Raine, é assim que espera me conquistar? Fingindo-se de difícil?
— Não desejo conquistá-lo! — ela exclamou, exasperada. — Quero que vá
embora e nunca mais cruze meu caminho. Pode compreender isso?
Por um instante, Denley pareceu incerto. Raine sentiu esperança de que
havia se estabelecido um entendimento. No entanto, ele voltou a sorrir de forma
maliciosa. Aproximou-se de braços abertos.
— Não precisa ter medo, Raine. Não vou machucá-la. Sei como agradar uma
mulher.
Era difícil acreditar. Caso fosse verdade, ele teria se mostrado bem mais
gentil em outras circunstâncias. Apesar de Raine não possuir experiência com
homens, preferia viver na ignorância a ver Denley provar o contrário.
Mas não havia tempo para reflexões porque o primo continuava a se
aproximar, e o brilho intencional nos olhos dele era mais que evidente. Na
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meta?
Aida, que se sentara à beira da cama enquanto Raine lhe relatava o plano,
meneava a cabeça em negativa.
— Milady, não podemos fazer isso. E se formos descobertas?
— Ninguém vai descobrir. Ao menos não antes de me casar. Se seguirmos o
plano como eu o arquitetei, não haverá desconfianças.
O terror explícito nos olhos da criada faria qualquer mulher reconsiderar,
porém Raine não era qualquer mulher.
— Eu lhe contei o que Denley tentou fazer hoje neste quarto. Você viu
como ficou meu vestido. Não posso adiar mais. Preciso garantir o futuro de Wil.
Papai nunca me perdoaria por deixar o primo Denley controlar suas terras.
— Mas, lady Raine, não creio que... Não entendo como tem coragem de...
Sabe o que quero dizer. Tenho medo de me envolver neste esquema. Ele é um
nobre.
— Você não tem de fazer nada, exceto conseguir os itens de que preciso na
cozinha do castelo, manter William longe do quarto durante a noite e gritar feito
louca quando entrar no cômodo na manhã seguinte, é uma função muito simples.
Sou eu quem vai atraí-lo até aqui e executar o resto.
Aída ainda continuava incerta quanto à proposta de Raine.
— Você vai me ajudar a me vestir para a ceia de hoje. Tenho de ficar ainda
mais bonita que ontem, embora não acredite que Benedict Ainsworth irá notar. —
Raine ignorou a repentina decepção. — Mas preciso considerar todas as
possibilidades. Nosso sucesso depende de eu trazer aquele homem até este
quarto.
Então abriu o baú que continha os vestidos novos, os quais ela mandara
confeccionar para ajudá-la na busca ao marido. Infelizmente, como dissera a
Aida, após a reação de Benedict na noite anterior, Raine não acreditava que sua
aparência fizesse alguma diferença.
Pelo menos, a criada se ocuparia com algo e esqueceria o medo até a hora
da ceia.
Assim como Raine. Ela nem sequer ousara considerar a chance de Benedict
não comparecer ao jantar, tampouco queria pensar no fato de ele não acompanhá-
la até o quarto. Não podia ater-se ao impossível.
Várias horas depois, Raine parou à soleira da porta e fitou William, que se
encontrava sentado na cama. Ele havia passado a tarde nos estábulos e, quando
chegara ao cômodo, observara os preparativos para a ceia em profundo silêncio.
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Embora não tecesse comentário algum, Raine tinha certeza de que o irmão
estava ciente da ansiedade de Aida. Mas, como a criada fosse agitada por
natureza, William não pareceu notar nada de estranho naquele comportamento.
William não podia saber o que Raine pretendia. Queria poupá-lo do
sofrimento que ele manifestaria caso descobrisse o plano. Em várias ocasiões,
notara a culpa que o irmão sentia pelo fardo que ela era obrigada a carregar.
A despeito da vontade de aliviar a pesada responsabilidade de Raine, não
havia nada que William pudesse fazer. Era apenas um menino, apesar de adorável
e bom.
A informação de que ele e Aida iriam dormir na companhia dos servos do
castelo naquela noite não suscitou nenhum comentário, pois Raine alegara
precisar partilhar o cômodo com outra dama que tinha acabado de chegar à
corte.
Odiava mentir para o irmão, porém, não podia contar-lhe a verdadeira
razão de ficar sozinha naquela noite. Além de evitar qualquer desagrado, Raine
não conseguiria fazê-lo entender a lógica existente no bendito plano. Talvez
estivesse com medo de discutir o assunto para não desistir do esquema. Se desse
vazão aos receios, ela pensaria em um motivo que a impedisse de prosseguir. Saiu
do quarto, apressada.
Como todas as noites, o salão estava lotado. Ela parou na entrada, temendo
que Benedict Ainsworth já houvesse partido. Lembrava-se de ouvi-lo comentar
com o rei Edward a repulsa que sentia pelas atividades da corte.
Raine concordava com ele. Sentia falta das montanhas e dos vales, dos
deveres em Abbernathy e dos habitantes.
Foi com alívio que o viu sentado à mesa que ambos tinham ocupado na noite
anterior. Respirou fundo e caminhou resoluta até ele.
Sem saber o que fazer, simplesmente esperou que Benedict a visse.
Poucos instantes depois, ele a fitou surpreso.
— Boa noite, lady Raine.
— Milorde. — Ela indicou o salão. — Vejo que as mesas estão repletas de
convidados. Seria pedir demais que o senhor me deixasse sentar aqui?
Raine não parou para pensar na audácia de seu pedido. A bem da verdade,
na mesa de Benedict também não havia espaço. Ele, com certeza, sabia disso.
— Estou certo de que conseguiremos encontrar um lugar para esta pequena
dama. Certo, lorde Longly? — Benedict dirigiu-se ao homem a seu lado.
O idoso nobre assentiu.
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— É evidente que sim. — Ele apontou o diminuto espaço que haviam aberto
no banco.
Enquanto os dois homens retomavam a conversa, Raine sentou-se. O fato
de Ainsworth não manifestar qualquer mudança em relação a ela a desanimava.
As iguarias dispostas à mesa não lhe causavam o menor apetite, mas Raine
tinha de, pelo menos, fingir que estava comendo. Suas mãos tremiam quando se
serviu de uma fatia de carne e outra de pão.
O forte tempero da carne quase a fez engasgar ao saborear um pedaço.
Estava apavorada ante a armadilha que pretendia realizar. Podia sentir o calor do
corpo de Ainsworth e escutar a voz profunda enquanto ele falava com o outro
nobre.
O barão havia sido bondoso com ela ao defendê-la de Denley quando
nenhum homem nem sequer arriscara interferir. Era confortante tê-lo tão perto.
Cada nova faceta que ele revelava mostrava quão forte e honrado era.
De repente, Raine caiu em si. Seu plano mirabolante poderia prejudicar
aquele homem decente, mas não tinha escolha, pensou. As qualidades que a faziam
hesitar representavam o motivo pelo qual o escolhera. O tempo se esgotava e
Benedict Ainsworth parecia ser o homem ideal... na verdade, representava a única
opção.
Denley Trent era o maior culpado. Ele a obrigara a tomar uma atitude
drástica. Pelo bem de seu irmão, Raine não podia falhar.
Com tal assertiva em mente, observou a conversa dos homens e, quando
Benedict fez menção de fatiar o pão, interferiu:
— Milorde?
Ele se deteve e a encarou, de certa forma, desconfiado.
— Sim?
Embora tentasse se mostrar calma, Raine tinha vontade de sair gritando
do salão. Então, sorriu, rezando para que o gesto parecesse um flerte.
— Milorde, queria lhe agradecer por me ajudar ontem à noite.
— Não há necessidade -— Benedict falou com desdém. — Eu jamais
deixaria um safardana perturbar uma mulher.
Raine sorriu novamente e piscou algumas vezes, tal qual vira as damas da
corte fazerem.
— Ainda assim, lorde Ainsworth, serei sempre grata por seu ato de
cavalheirismo. Não foi uma mera gentileza. Meu primo insiste em me molestar e
nega-se a aceitar minhas recusas.
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Capítulo III
pesar de Benedict ter passado o dia todo tentando tirar Raine Blanchett
do pensamento, não obteve o sucesso que desejara. A relutância em conhecê-la
dera-lhe a plena certeza de que um ínfimo envolvimento, por mais adorável que
ela fosse, resultaria em uma série de problemas.
Aparentemente, situações conflitantes a perseguiam, a começar pela
ousadia de esconder-se na sala do rei Edward. Raine alegara estar fugindo de um
admirador persistente; e agora, era molestada por outro.
Enquanto escutava a narrativa, sentiu uma profunda simpatia por aquela
delicada mulher. Não podia culpá-la pelo fascínio que homens encontravam nos
olhos dourados e brilhantes.
Aliás, naquele momento, viu-se apreciando o inesquecível olhar cintilante,
como se estivesse sob o efeito de alguma magia.
— Se houver algo que eu possa fazer para ajudá-la, não se acanhe em
pedir. Estarei na corte por mais um dia, mas me disponho a pedir ao rei que
interceda a seu favor.
Raine meneou a cabeça e sorriu.
— Não, milorde. Não há necessidade. Não quero que o rei Edward indique
Denley como nosso guardião. E, sendo o único parente vivo, ele é bem capaz de
convencer Sua Majestade, é muito persuasivo quando lhe convém.
Benedict fitou-a, surpreso. Não descreveria o safardana daquela maneira.
Ele parecia, na verdade, um estúpido, mas, em todo caso, Raine certamente o
conhecia melhor.
Tristan não fora forçado a matar o mesmo tipo de homem, cujo irmão
almejava vingança, com o intuito de impedi-lo de molestar Lily?
— Como quiser — Benedict retrucou, enfim.
— Há algo que poderia fazer por mim — Raine confessou, insegura. — Se
não for incômodo, eu ficaria grata caso pudesse acompanhar-me a meus
aposentos. Tenho certeza de que meu primo não se atreveria a me molestar em
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— Eu lhe concedi toda a paciência que possuo. Sugiro que saia deste
quarto e não dirija a palavra a esta mulher outra vez, a menos que ela lhe dê
permissão.
Apavorada, Raine viu Denley erguer a mão. Mas não houve motivos para se
preocupar. Embora fosse do mesmo tamanho que Ainsworth, Denley não era tão
ágil ou forte.
O barão agarrou a mão de seu primo no ar. Denley ficou chocado por um
momento, antes de recuar e erguer novamente o punho.
— Não. — Benedict nem sequer alterou a voz, porém o tom de comando era
explícito.
Frustrado, Denley hesitou. Então se virou e saiu do quarto, mostrando a
covardia de enfrentar seu oponente. Raine ficou irada. O primo só tinha coragem
de atormentar mulheres e crianças. Ou talvez homens mais fracos.
Ainda enfurecido, Benedict fitava a porta. Sem sombra de dúvida, ela
escolhera o pretendente ideal. Não havia planejado o confronto com Denley, mas
o ocorrido provara que Ainsworth possuía a força mental e física para proteger
William.
Apressada, Raine fechou a porta. Não podia deixá-lo sair.
Olhou para a mesa, sobre a qual dois copos jaziam intocados. Quando Aida
os trouxera, sabia que apenas um seria utilizado.
Teria Raine a coragem de seguir adiante? Sim, porque precisava. A
aparição de Denley a havia convencido disso.
Decidida, ela despejou vinho em um dos copos e aproximou-se de Benedict.
— Não, obrigado — ele declinou o vinho. — Tenho de ir embora.
— Por favor, ainda não, milorde. — Raine fitou a porta. — Eu... meu primo
pode voltar e não quero estar sozinha.
— Ficarei por mais algum tempo até sentir-se segura. Mas não creio que
ele voltará esta noite e não se esqueça de trancar a porta depois que eu sair.
Raine assentiu. Concordaria com qualquer ordem desde que ele bebesse
aquele vinho.
— Farei isso, milorde.
Aparvalhada, observou-o pegar o copo e engolir o líquido. Uma exclamação
silenciosa escapou de seus lábios.
Estava feito.
O plano entrava em andamento e não havia meios de retroceder. Assim que
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o sonífero fizesse efeito em Benedict, ela não teria como tirá-lo do quarto sem
alertar outros hóspedes do castelo e, enfrentar as consequências.
— Este vinho é bem doce — ele comentou. — Não vai bebê-lo também?
— Não esta noite.
Benedict mal escutou a resposta. Ansioso para retirar-se, voltou-se à
porta. Raine estava calma, só precisaria retardá-lo mais um pouco e logo ele
estaria inconsciente. Aida sabia como dosar os ingredientes, já que era uma
especialista em ervas medicinais.
— Quer se sentar? — Raine sugeriu.
— Não, tenho... — Ainsworth piscou algumas vezes. — Você é tão... linda...
As palavras causaram uma sensação diferente em Raine. Fechou os olhos,
dizendo a si mesma que precisava concentrar-se na tarefa a que havia se
proposto. A droga o deixava criativo. Necessitava pensar naquele homem como
um meio para atingir um fim. Respirou fundo para bloquear o calor repentino que
a invadiu.
Estonteado, Benedict colocou o copo na mesinha e levou a mão à cabeça, na
tentativa de focalizar Raine.
— O que...
— Deixe-me ajudá-lo. — Raine o segurou pelo braço e guiou-o à cama.
Sentiu uma pontada de arrependimento. Não cederia à influência dos
sentimentos. Precisava acomodá-lo na cama, ou não seria capaz de carregá-lo uma
vez que ele adormecesse.
O efeito da poderosa poção impediu que Benedict resistisse. Sentou-se na
beirada da cama, antes de gemer e tombar no colchão, inconsciente.
Raine observou o homem que agora parecia mais imponente que nunca. Para
levantar somente os ombros largos seria preciso de no mínimo dois homens. Ou
uma mulher muito determinada, pensou consigo.
Primeiro, tinha de despi-lo e depois acomodá-lo sob as cobertas. Não sabia
como empreender tal esforço, contudo, semelhante a outras dificuldades, essa
deveria ser superada.
Ajoelhou-se na cama. Começaria pela túnica e pelo casaco.
Não foi tão trabalhoso quanto havia imaginado, até desnudar o tórax
musculoso.
Embora prometesse a si mesma que não o tocaria além do necessário, viu-
se acariciando a pele bronzeada. Os dedos moviam-se devagar. Então reparou
quão diferente era a textura daquele corpo comparado ao dela.
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alguém acreditaria que Benedict lhe tirara a virgindade sem nenhuma evidência
aparente. Raine não soubera argumentar.
Espantado, Benedict fitou a mancha no lençol e então confrontou Raine.
Quando ela notou a expressão de suspeita no rosto do barão, desafiou-o com o
olhar.
Uma senhora apareceu à porta, abrindo caminho entre a multidão que se
aglomerava.
— Ulric, esse homem é um bruto — disse ao senhor de idade. — Nunca vi
tanto sangue. Você tem de tomar uma atitude.
Raine não acreditava que suas faces se tornariam ainda mais ruborizadas,
mas assim aconteceu.
O homem, que deveria ser o marido da senhora, retrucou:
— Farei isso, minha querida, tão logo eu entenda o que está havendo.
Benedict lançou um olhar beligerante a Raine, antes de voltar-se aos
presentes.
— Vou cuidar deste assunto — disse, em tom de comando. — Podem se
retirar.
A senhora ficou indignada.
— Não creio que...
— Perdoe-me, milady — Benedict a interrompeu. — Não quero ofendê-la,
mas este assunto concerne a mim e a esta dama.
A mulher empinou o nariz e segurou o braço do marido.
— Venha, Ulric. Vamos tomar providências. Benedict caminhou até a porta,
digno e imponente, apesar de estar coberto apenas com o lençol. Os curiosos
recuaram quando ele se aproximou.
Menos Aida, que continuava no quarto. Agora que havia cumprido seu papel,
ela mostrou-se tão confusa quanto no dia em que o pai de Raine falecera.
Encarando a criada, Benedict deteve-se ao fechar a porta. Aida o fitou.
Ele apontou a saída.
— Poderia nos dar licença, por favor?
— Milady... — Aida dirigiu-se a Raine.
— Ela ficará bem. — O tom de Ainsworth, embora calmo, não admitia
argumentos.
Aida precipitou-se à porta. Quando a criada se aproximou de Benedict, ele
inclinou-se.
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Ao notar a expressão sagaz de Raine, foi adiante antes que ela inventasse
outra história.
— E não tente me convencer de que a torturei a ponto de causar tanto
sangue. Nunca em minha vida feri uma mulher, tampouco a possuí sem estar
consciente disso. O último fato de que me lembro é a tontura que senti depois de
tomar o vinho. Não sou um amante soberbo, mas posso atuar mesmo sonolento.
Raine cruzou os braços e baixou a cabeça. Benedict esperou. Por fim, ela
voltou a fitá-lo. Ao divisar as lágrimas rolando nas faces rosadas, odiou-se por
sentir compaixão.
— Está certo, milorde. Eu trapaceei. Coloquei uma droga no vinho, e o
senhor não chegou a me tocar.
O tom frustrante na voz de Raine o comoveu ainda mais.
— Contarei a verdade a todos aqueles que nos viram esta manhã.
Não somente ficou surpreso, como também chocado diante do
desprendimento em lhe dizer a verdade. A despeito da ameaça que Benedict
impusera, esperava ao menos que ela tentasse defender-se.
Levou as mãos ao rosto e respirou devagar. Agira como um insano ao
dispensar aquelas supostas testemunhas, usando apenas um lençol para cobrir a
nudez, mas não pretendia perder tempo com detalhes insignificantes. Sentou-se
na beira da cama.
— Diga-me por que fez isso.
— Não tive escolha. — Raine endireitou os ombros, orgulhosa. — Tentei
atrair sua atenção, mas não demonstrou interesse algum em mim.
Benedict soltou uma gargalhada. Sentia-se atraído por ela, mas não quisera
admitir.
— Por que eu? Não sou o tipo de homem que desperta interesse em uma
linda dama.
Raine o fitou espantada.
— Acredita mesmo nisso? Milorde é tudo que eu procurava, é forte,
honrado e gentil. Preciso de alguém que zele por meu irmão e sua herança, sem
intenções escusas, como as de meu primo Denley Trent. Os direitos de William
são a razão pela qual ele insiste em me esposar. E o assédio que sofri ontem não
foi mentira. Se eu esperar muito tempo para encontrar um homem que me
ofereça a proteção de seu nome, pode ser tarde demais.
A sincera confissão de querê-lo pela lista de qualidades originou um
inesperado arrependimento em Benedict. Riu consigo mesmo. Não imaginava que
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uma mulher tão jovem e bela se apaixonasse por algum motivo pessoal.
— Pergunto-lhe novamente, por que eu? O que a faz pensar que cuidarei de
sua família sem exigir nada em troca?
— Menti quando lhe disse que me escondi na sala do rei por acaso. — Raine
ajoelhou-se na cama, e os cabelos avermelhados caíram sobre os ombros esguios
e alvos. Benedict foi obrigado a se convencer de que não a desejava.
Descobrir que ela mentira não o surpreendeu, mas continuava atônito e, de
alguma forma, chocado, com a ávida necessidade de Raine em revelar a farsa. Ela
parecia não conseguir se conter. Que criatura impulsiva!
Forçou a atenção no que ela dizia.
— O senhor mostrou-se tão preocupado com a honra da mulher de seu
irmão naquele dia, tão cuidadoso em relação a ela e à filha. Eu queria alguém que
resguardasse William dessa maneira. Ele é gentil e pequeno demais para a idade
que possui. Além de precisar de alguém que administre suas terras, também
necessita de um guia. Creio que é o homem certo, milorde. Mas não sou tola a
ponto de acreditar piamente nas palavras que disse ao rei. Fiz algumas perguntas
àqueles que o conhecem e não escutei nada que o desabone. Uns dizem que
exagera nas responsabilidades, mas não vejo problema nisso.
Benedict franziu a testa ante a descrição nada lisonjeira dele próprio,
contudo, não entrou no mérito.
— Ainda não entendo por que não pediu minha ajuda. Para que tanto
esforço nesta encenação que nos causou tamanho constrangimento?
— Não imaginei que pudesse ajudar uma estranha. Só não podia permitir
que Denley me violentasse e forçasse um casamento. Eu não conseguiria viver,
sabendo que ele se apossaria de tudo que meu pai construiu. Na verdade, não
parei para refletir. Denley continuará me perseguindo enquanto eu estiver
solteira. — Ela riu. — Não há como duvidar deste fato, após vê-lo em ação. Certo?
— O homem parece cego a tudo, exceto a sua própria ambição. — Benedict
assentiu. Não tinha meios de rebater a argumentação.
— Exato.
Embora concordasse com Raine nesse ponto, não a liberaria das trapaças
que cometera.
— Mesmo assim, não posso ignorar sua falta de consideração com o
sentimento alheio, incluindo o meu.
Raine teve a gentileza de corar. Pareceu realmente se ressentir com as
palavras de Benedict.
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CAPITULO IV
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sussurrou: — Ela não é tão rebelde quanto parece, sabe? Só que às vezes tem
medo de não conseguir realizar aquilo que acredita ser sua obrigação.
Benedict assentiu e viu Raine observá-los. Tratava-se de uma percepção
muito acurada, pensou. Deixar Raine compartilhar sua vida traria sérias
consequências a sua paz de espírito.
Surpreso com o rumo dos pensamentos, ele ergueu os ombros enquanto
assistia à saída de William. Nenhuma mulher imatura destruiria sua paz.
Precisava somente deixar claro que não toleraria comportamentos semelhantes
no futuro.
Quando a porta se fechou, virou-se para Raine, que ainda se mantinha
sentada na cama.
— Que questões gostaria de discutir comigo, milorde? Creio esgotamos o
assunto antes de William chegar.
Ela não estava facilitando-lhe a decisão. Mas a certeza de que Raine
protegeria William a qualquer custo o encorajou. Benedict se sentira assim em
relação aos irmãos quando foram deixados sob sua tutela.
— Na verdade, há um assunto que temos de discutir. — Ele se aproximou,
firme em seu propósito.
Como se pressentisse a importância do tema, Raine ficou paralisada. Os
olhos corajosos fitaram os dele.
— Peço-lhe, Raine Blanchett, que seja minha esposa — Benedict falou,
convicto.
Boquiaberta, ela arregalou os olhos.
— Não brinque comigo, Benedict Ainsworth.
— Asseguro-lhe de que não estou brincando. Raine o analisou por um longo
instante.
— Por que resolveu, de repente, casar-se comigo? Eu lhe contei toda a
verdade.
— É suficiente dizer que estou disposto a esposá-la — ele afirmou,
impassível.
Dos recônditos da alma, a compreensão surgiu. Era por causa de William!
Ao conhecê-lo, a crença do barão tornou-se real. Raine havia notado que Benedict
Ainsworth era um homem caridoso. Quantos teriam a coragem de pedir um favor
pessoal ao rei da Inglaterra para que a família obtivesse alguma paz?
Embora não quisesse nada além da proteção de um nome nobre, ela se
deleitou ao entender a razão daquele pedido.
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CAPÍTULO V
Raine se levantou tão logo escutou certa agitação no acampamento. Não
havia dormido bem durante a noite.
Aida, que dividia a tenda com ela, parecia ter repousado, pois espreguiçou-
se sob as cobertas ao despertar. Os olhares ansiosos que a criada lhe dava
enquanto a ajudava a se vestir antecipavam que aquele dia, no mínimo, seria
desconcertante.
Raine não sabia como enfrentar aquela manhã.
O beijo de Benediet Ainsworth era inesquecível. A cada lembrança, sentia
um calor chocante dominá-la. O toque firme dos lábios parecia despertar
sentimentos e sensações que, até aquele momento, ela ainda lutava para reprimir.
O fato de ser o primeiro beijo de sua vida explicava as reações tão
inesperadas e, no íntimo, Raine sabia que não podia iludir-se achando que teria
respondido daquela maneira a qualquer homem. O rosto de Benediet era o único
que lhe vinha à mente. A expressão sempre arrogante devido à certeza de que ela
se deliciara com o beijo.
Embora estivesse absorvida em lembranças, escutou uma comoção do lado
de fora da tenda. O tom alterado das vozes indicava que algo estava errado.
Apressada, saiu da tenda e encontrou o sol brilhante da primavera.
Ao divisar o responsável pela desordem, suspirou de raiva e impaciência. A
entrada do acampamento, montado sobre um garanhão marrom, estava Denley
Trent. Naquele instante, ele derrubava um dos homens de Ainsworth, enquanto os
outros aproximavam-se, furiosos.
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Não havia sinal de Benedict nem de William, que insistira em dormir com os
homens perto da fogueira. Denley gritou o nome de Raine, enquanto ela procurava
o marido e o irmão.
O primo trotava em sua direção, ignorando os homens que tentavam lhe
impedir a passagem. O semblante irado era evidente, ele parecia um alucinado.
A máscara de fúria não causava medo a Raine, sabia que estava sob a
proteção de Ainsworth, apesar de uma sensação de angústia a dominar. Ante a
precipitação de Denley, ela não teve tempo para considerar o dilema. Respirou
fundo e preparou-se para enfrentar o oponente.
Denley puxou as rédeas e parou o animal diante dela.
— O que está havendo, Raine? Passei a noite na estalagem com... Sua
teimosia me obrigou a procurar uma companhia. — Ele fez uma pausa,
constrangido. — A corte estava tão atolada de gente que pensei em lhe dar algum
tempo para pensar.
Era óbvio que ele havia encontrado algum conforto nos braços de uma
meretriz, mas Raine desconsiderou o fato.
— O que faz aqui, Denley?
As faces se tornaram vermelhas de ódio.
— Como? Quando retornei à corte, ontem à tarde, soube que havia partido,
que se casara com Ainsworth e fugira para Brackenmoore. Casada? Não pude
acreditar. Achei impossível e agora eu a encontro aqui.
— E o que você tem a ver com isso? — Raine perguntou, beligerante.
Como ela não negasse, a raiva de Denley aumentou.
— Você declinou meus pedidos e, de repente, casa-se com um homem que
acabou de conhecer. O que aconteceu, Raine? Ele a importunou de alguma forma?
Raine sentiu uma súbita necessidade de rir, porque era justamente o
oposto.
— Não, Denley. Casei-me com ele por vontade própria. Ele arregalou os
olhos, incrédulo.
— Mas por quê? Poderia ser minha esposa.
Dessa vez, Raine não conteve a risada, mas a reprimiu rapidamente. Denley
não sabia quão ridículo era, e tampouco entenderia, caso ela lhe explicasse.
Agora tinha um marido, poderoso o bastante para impedir que alguém a
tocasse. O casamento com Ainsworth a deixava muito mais segura e estava
ciente de que os soldados do barão a rodeavam enquanto discutia com o primo.
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Queria dizer-lhes que não havia motivos para confronto, mas precisava,
acima de tudo, fazer Denley ir embora, desejava finalizar aquela discussão sem
maiores danos. Na verdade, podia enfrentar o primo com compaixão, agora que
não mais o temia.
— Agradeço-lhe a honra de me querer esposar, mas já fiz minha escolha,
Denley.
De súbito, sentiu um arrepio percorrer-lhe a nuca. Virou-se e avistou o
marido e o irmão emergindo entre as árvores, ambos tinham os cabelos molhados.
Com certeza, haviam se banhado em algum riacho.
Mesmo atormentada, Raine ficou fascinada com os cabelos encharcados de
Benedict que, jogados para trás, realçavam os traços firmes do rosto. Também
reparou na camisa colada ao corpo úmido, moldando os músculos bem torneados.
Por um momento infinito, Benedict fitou-a nos olhos, revelando um
sentimento que ela não sabia nomear. Raine começou a ofegar. Baixou o rosto,
tentou de se convencer de que a balbúrdia de Denley a deixara agitada e que seu
nervosismo nada tinha nada a ver com a vívida lembrança dos lábios de Benedict.
Quando voltou a fitá-lo, notou a expressão divertida no semblante do
barão. Surpresa, imaginou se ele havia deduzido quão segura Raine se encontrava
naquele casamento, isso, sem dúvida, justificava o sorriso indulgente.
De propósito, ignorou-o. Endireitou os ombros, ciente de que Benedict
marchava em direção a ela.
Sem dirigir-se a Raine, ele encarou o outro homem com desdém.
—- Que está fazendo aqui, Trent?
— Você se atreveu a roubar a mulher com a qual pretendia me casar! —
Denley esbravejou.
— Eu lhe avisei que era melhor manter-se longe de Raine, Trent. Ela não é
mais a mulher que você pretendia coagir, ela agora é minha esposa, lady
Àinsworth.
O rosto de Denley tornou-se mais enfurecido. Raine quase sentiu pena
dele. Quase. A despeito do autoritarismo de Benedict, ela não conseguia
esquecer que o primo tentara possuí-la à força.
Então Denley olhou ao redor. Observou o acampamento repleto de soldados
dispostos a guerrear e o rosto impassível de William. Não poderia achar apoio
entre os presentes.
— Vá embora, Trent — Benedict aconselhou-o, em um tom de comando. —
Ou aguente as consequências de molestar quem me pertence.
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temos uma longa jornada a nossa frente. — Não gostou de escutar o tom
impaciente da própria voz.
Os homens acataram a ordem, e alguns especularam acerca do súbito mau
humor de Benedict. Ele jamais usava de rudeza para se dirigir aos subordinados.
Também podia sentir o pesaroso olhar de William, porém não ousou
enfrentá-lo. Embora começasse a criar laços com o menino, não queria revelar a
ele quanto sua irmã o deixava perturbado, muito menos permitiria que ela
soubesse disso.
Manteve-se de costas para Raine, temendo sucumbir à vontade de
estrangulá-la. Sem mais palavras, ocupou-se com os preparativos da partida,
esforçando-se em controlar a raiva que lhe queimava o peito.
Enquanto desmontavam o acampamento, Benedict a observava pelo canto
dos olhos. Notou quando ela empinou o lindo nariz para cima.
A impaciência ocasionava apenas olhares especulativos de seus homens.
Esperava que atribuíssem tal distúrbio à cena com Denley Trent. Por alguma
razão, não queria que os soldados soubessem quão perturbado ficava com uma
mulher, em especial sendo ela sua esposa. O ultraje continuou a arder-lhe a alma
ao longo do dia, apesar da tentativa de permanecer indiferente à opinião dela.
Não faria bem a ninguém imaginar que o casamento mudaria algo em
Brackenmoore. Ele conseguiria conservar a autoridade e aprenderia a conter
reações indesejáveis a cada insulto de Raine.
O único consolo era saber que jamais falhara em seus intentos. E foi tal
constatação que o manteve longe de Raine e da criada, que cavalgavam no centro
do séquito.
Preferiu concentrar-se no garoto, que permanecera a seu lado o dia
inteiro. William necessitava da companhia de outros homens, embora Benedict
não ignorasse que o menino conservava a atitude protecionista em relação à irmã.
Benedict viu-se impelido a aproximar seu cavalo do de William.
— O que o incomoda? William encarou-o, desconfiado.
— Nada — respondeu e voltou a olhar a irmã.
— Não acredito.
— Posso ver que você e Raine já brigaram — William confessou. — Eu a
adoro e não quero vê-la infeliz, mas compreendo sua posição. Foi imprudência da
parte dela achar que não iríamos a Brackenmoore.
— Isso é um assunto que diz respeito a mim e ela, William. — Benedict
acrescentou com mais gentileza: — Não precisa se preocupar. Raine vai ficar
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bem.
O menino sacudiu a cabeça em negativa.
— Você não a conhece. Ela sempre me coloca em primeiro lugar. — William
fitou a irmã novamente. — Mesmo quando nosso pai era vivo, Raine fazia questão
de garantir meu bem-estar. Não pára de me proteger, como se quisesse me
poupar de medo e preocupações.
Benedict assentiu. Acreditava naquelas palavras e sabia que a atitude
protecionista de Raine prejudicava o garoto. Jurou a si mesmo ser um bom
guardião para William, o que implicava em deixá-lo desenvolver a maturidade.
Contudo, precisava ser cauteloso com Raine nesse aspecto. Tinha de
esquecer as pendências pessoais e se concentrar na devoção cega que ela
oferecia a William. Não podia negligenciar a coragem que a levara a se casar com
um estranho só para proteger quem amava.
Raine não romperia a ligação, que parecia sem limites, tão facilmente e não
ser amado por ela de modo incondicional o irritava. Mas também Benedict não
queria seu amor, apenas sua cumplicidade.
Através da luminosidade do luar, Raine divisou o gigantesco e imponente
castelo de Brackenmoore. Observando as muralhas de pedra, sentiu o estranho
aroma salgado que invadia o ar. Mesmo intrigada com o fenômeno, perguntou-se
como os ancestrais de Benedict Ainsworth haviam construído a poderosa
fortaleza.
Enquanto cavalgavam em direção à propriedade, Raine evitava olhar para o
marido, que se mantinha à frente do séquito. A mágoa que sentia não havia sido
eliminada durante a jornada. Na verdade, parecera aumentar.
Benedict encontrava-se tranquilo com o que havia feito, incluindo o beijo
que lhe roubara. Ele mostrara-se, de fato, quase desinteressado por ela desde o
confronto com Denley naquela manhã.
Não revelara censura ou grosseria, somente fria indiferença. Ele cavalgava
como se nada houvesse acontecido e não fazia o menor esforço para evitá-la, tal
qual Raine.
Aquele comportamento servia apenas para incrementar a raiva. Aliás,
tentava se convencer de que sua ira possuía várias razões. Era ele quem agia com
frieza. Qualquer tolo veria que haviam brigado.
Observou William, que a examinava com grande interesse. Quando se
entreolharam, ele franziu o cenho.
Por que a olhava daquele jeito? William tinha passado tempo demais na
companhia de Benedict e seus homens durante a viagem. Raine estivera tão
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absorvida pela raiva que não notara quanto Wil apreciava os novos amigos, embora
não houvesse deixado de reparar que todos o tratavam com carinho, inclusive
Benedict.
Com certeza, William havia sentido o desentendimento entre ela e
Ainsworth. Precisava conversar com o irmão na tentativa de explicar-lhe a
situação sem entrar em detalhes. Então voltou a olhar a aparência imperturbável
de Benedict, que cavalgava ereto sobre a sela, como se fosse o rei da Inglaterra,
mais magnificente que as muralhas adiante. A postura segura tanto a tumultuava
quanto a atraía.
Raine suspirou. Oh, como queria sentir apenas desprezo por aquele vilão
tão atraente! O único alívio era que Benedict não sabia disso.
Mais uma vez, olhou William e ficou aflita ante a expectativa de lhe
explicar emoções tão imponderáveis.
Pressentindo o nervosismo, a égua começou a pisotear o solo, forçando
Raine a concentrar-se na cavalgada. Sentia certa simpatia pelo animal. A égua
também não queria atravessar aqueles muros que a confinariam em uma vida
desgostosa.
Um arrepio percorreu-lhe o corpo. Então viu Benedict, que agora a
acompanhava de perto, observando-a com uma expressão que ela não ousou
traduzir.
Empinou o nariz e desviou o rosto, não se importava com a opinião dele.
Tão logo passaram pelos portões e atingiram um enorme pátio, rodeado de
construções em madeira e pedra, Benedict postou-se ao lado de Raine. Os olhos
azuis a fitavam, ameaçadores.
— Estamos em casa — ele disse. — Espero que saiba se comportar como a
baronesa de Brackenmoore.
Apesar da irritante repreensão, Raine ouviu o tom de orgulho e prazer
contido da voz de Benedict. Ele só se importava com Brackenmoore?
Sim, somente os assuntos concernentes ao legado poderiam perturbá-lo.
Raine agradecia a Deus o fato de não estar ligada àquele homem por nenhuma
razão afetiva, apesar de a idéia causar-lhe uma repentina tristeza no peito.
O primeiro e último amor de Benedict era, e continuaria a ser, as terras e
a herança. Uma devoção que ela entendia de certa forma. Abbernathy e William
eram seu bem mais precioso, jamais renunciaria à confiança que o pai lhe de-
positara. Custasse o que custasse.
Fitou Benedict com um ar arrogante.
— Não tenha receio quanto a isso. Não vou envergonhá-lo diante de seus
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súditos.
O alívio não podia ter sido mais significativo. Uma pequena chama de mágoa
acendeu no coração de Raine. Por acaso Benedict imaginava que ela não
entenderia a honra de sua posição?
No mesmo instante, reprimiu a indignação. Não se importava com o parecer
de Benedict Ainsworth e odiava as reações que causava nela.
Assim que pararam os cavalos diante dos degraus que davam acesso à
imensa porta de carvalho, Raine sentiu um momentâneo arrependimento. Entraria
em seu novo lar pela primeira vez. Mas, diferente das fantasias que criara quando
criança, não havia nenhum pertence na morada que lhe proporcionasse alguma
familiaridade. Não existia esperança no futuro.
Não possuía nada além dos baús repletos de vestidos que mandara fazer
para frequentar a corte, umas poucas jóias e objetos pessoais. Tudo pertencia a
Benedict, uma lembrança constante de que o lar era apenas dele.
A porta se abriu, e uma senhora apareceu. Era roliça e tinha as faces
coradas, as quais sustentavam um ar de boas-vindas, mas os olhos escuros
possuíam uma sagacidade intrigante.
— Esta é Maeve — Benedict apresentou-a. — É a governanta de
Brackenmoore. — Embora relutante, Benedict prosseguiu, agora dirigindo-se à
mulher: — Maeve, esta é minha esposa, lady Raine. Maeve ficou boquiaberta.
— Sua esposa, lorde Benedict? — A surpresa era mais que óbvia. — Sua
esposa?
— Sim, minha esposa — ele replicou, incomodado.
A raiva renasceu quando Raine o encarou. A promessa de que não o
envergonharia tomou proporções gigantescas. Benedict se espantaria ao ver que
ela era uma mulher de palavra.
Raine ergueu a cabeça é mostrou-se altiva.
— Milady, não sabe como esta novidade nos deixa feliz — Maeve dizia
enquanto descia os degraus. — Há tempos achamos que lorde Benedict necessita
de uma esposa, embora ninguém esperasse que ele fosse capaz de casar-se
durante uma viagem de duas semanas. O barão jamais toma uma decisão
precipitada. Logo, devo deduzir que foi amor à primeira vista.
Aquela criada não media as palavras. A despeito do engano ao achar que
Benedict estava apaixonado, a liberdade de Maeve significava que tinha uma
posição de honra em Brackenmoore. Raine também começava a suspeitar de que o
casamento apressado não condizia com a personalidade de Ainsworth.
O que isso representava, ela não tinha certeza. Só sabia que a opinião de
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CAPÍTULO VI
Benedict observou a silenciosa esposa percorrer o imenso corredor. Cada
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Pelo rumo que seus sentimentos tomavam, ignorava quais seriam suas ações.
Teria solicitado quartos separados, se ela não o fizesse? Fixou-se no
decote do robe que revelava a curva de um dos seios.
Teria mesmo?
Notando o olhar brilhante do marido, Raine engasgou e deu-lhe as costas.
Agitada, fechou o decote. Seu coração batia descompassado. Sentiu-o
aproximar-se e escutou a resposta, tomada pela fantasia da situação.
— Talvez eu não a instruísse para lhe dar um quarto separado, Raine.
Benedict a segurou pelos ombros e Raine se virou, sem atinar por que o
estava fazendo.
— E talvez, no íntimo, você queira partilhar sua intimidade comigo.
Os profundos olhos azuis causaram uma inesperada sensação de calor
dentro de Raine, tal qual minutos antes, quando ele adentrara o quarto. Fora com
grande alívio que ouvira as acusações de Benedict, porque a revolta ajudara-a a
reprimir os sentimentos confusos que começavam a nascer.
No entanto, a proximidade instigava emoções desconhecidas, como se
estivesse mergulhando em uma lagoa profunda. Queria negar o que ele dissera,
mas uma força vital a impedia.
Desde a noite na tenda, Raine vinha lutando contra tais sentimentos, com o
intuito de torná-los apenas como ilusões, frutos da imaginação. Contudo, sentindo
a pulsação acelerada e absorvida pelo olhar misterioso, vira quão tola havia sido.
As reações que Benedict Ainsworth causava nela eram tão reais quanto qualquer
outra experiência que tivera na vida.
Quando ele abaixou o rosto a fim de beijá-la, Raine entregou-se por
completo, ao perceber o toque firme e quente dos lábios de Benedict.
O beijo transformou-se em necessidade. Raine não conseguia raciocinar e
quando ele aprofundou o gesto, sentiu o corpo derreter-se de paixão.
Hesitante, ela arriscou algumas carícias, surpreendendo-se com a resposta
imediata de seu marido. Enquanto uma sensação calorosa apossava-se de seu
ventre, Raine colou-se ao corpo viril.
Benedict gemeu e apertou-a contra si; com as mãos traçou as curvas
sinuosas das costas. Deteve-se nos quadris e puxou-os para um contato mais
íntimo. A resposta instantânea de Raine ao desejo explícito serviu apenas para
incrementar as carícias
As pernas não mais a sustentavam. Como se pressentisse o fato, Benedict
sustentou-a pela cintura com um dos braços e agarrou-lhe a nuca, enquanto
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continuava a beijá-la.
Afoito, explorava a boca de Raine. Ela correspondia aos beijos lancinantes
até não lhe restar mais fôlego.
Benedict ergueu o rosto e a fitou, questionador. Raine não podia fingir que
ignorava aquele pedido, tampouco conseguia falar. Fechou os olhos e apoiou-se no
corpo másculo.
Ansioso, Benedict voltou a beijá-la e deslizou a mão sob a abertura do
robe, encontrando a forma robusta do seio O coração de Raine quase parou de
bater e quando ele aprofundou a carícia, atingindo a região jamais tocada por ne-
nhum homem, ela achou que ia desmaiar.
O corpo ávido de desejo clamava por algo que Raine não sabia nomear.
— Benedict, eu quero... Oh, não sei...
Ele delineou as curvas do corpo, deixando um rastro de calor conforme os
dedos deslizavam sobre a pele.
— Sim, Raine, solte-se — Benedict murmurou, extasiado. — Deixe-me
cuidar de você.
Raine ficou paralisada. Mesmo zonza, tentou recobrar o equilíbrio.
Encostou a testa no peito musculoso a fim de organizar os pensamentos. Por que
a beijava e tocava? Só porque queria cuidar dela?
Em um gesto defensivo, cruzou os braços, respirou fundo e o fitou.
— Não, não quero que cuide de mim. Por favor, pare agora. — Precisava
dar maiores explicações, mas não conseguia concatenar as ideias.
Desesperada, ela meneou a cabeça ante o olhar sedutor de Benedict.
— Por quê, Raine?
— Não posso permitir que cuide de mim, Benedict. Tenho de ser
independente, é o único jeito de evitar desilusões.
Quando ele a soltou, Raine recuou, fingindo ajeitar os cabelos que haviam
se desprendido.
— Confie em mim. — Benedict tentou reaproximar-se, porém, ela se
esquivou.
Não podia duvidar daquela segurança absoluta, no entanto, não queria
depender de ninguém. Na infância, contara com o pai, e ele havia falhado quando
Raine mais precisara. Seu pai dependera da esposa e a amara de todo o coração,
mas, pela lei da vida, ela falecera.
— Quando existe amor e necessidade, alguém acaba vulnerável. — Raine
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da comida que Maeve lhe trouxera, apesar das turbulências que sentia. Queria
agir como se tudo estivesse bem, porém largou o pedaço de pão na bandeja, após
dar algumas mordidas nele.
Maeve a observava abertamente.
Enfrentou a criada de cabeça erguida. Não se importava com a opinião
alheia.
— Estou pronta, Maeve.
Sem tecer comentários, Maeve abriu a porta e esperou que Raine passasse.
Enquanto caminhavam pelo corredor, a criada apontava os diversos
cômodos e relatava seus ocupantes. Como não conhecesse nenhum dos moradores,
Raine não conseguiu decorar as informações até escutar o nome do marido.
Apreensiva, fitou o portal maciço. Sabia que a governanta estava atenta, mas
ignorou-a.
Conforme visitava a dependências do castelo, Raine ficava mais ciente de
que se tratava do domínio de Benedict. Era o senhor da propriedade e qualquer
um, homem, mulher ou criança, lhe rendia completa lealdade. Havia contenta-
mento em cada rosto.
Também notou a curiosidade dos empregados enquanto Maeve a
apresentava como a nova senhora de Brackenmoore. A julgar pelo semblante
tranquilo, nenhum deles parecia surpreso, Raine tampouco espantou-se em
atestar quão rápido as notícias corriam e imaginou se achavam estranho que não
fosse Benedict a apresentá-la.
Somente quando atingiram os jardins do castelo, ela conseguiu relaxar.
Benedict possuía cada bloco de pedra e cadeira naquela fortaleza. Mas não era
dono do ar, nem do sol primaveril que despontava no céu azul. Muito menos tinha
poder sobre o canto das gaivotas.
As duas vistoriaram as cozinhas, os depósitos e a lavanderia. Raine reparou
que tudo se encontrava em perfeita ordem. Os criados cumpriam suas obrigações
com conversas animadas que cessavam quando Raine e Maeve se aproximavam.
Embora detestasse ver qualidades em Benedict, ela notou que os
empregados estavam contentes e saudáveis. Suas roupas refletiam limpeza e
pareciam bem conservadas.
Durante a tarefa de explorar o castelo e os arredores, Raine não
esbarrara com o marido nenhuma vez. Talvez ele nem estivesse no domínio,
pensou, esperançosa.
Quando Maeve perguntou-lhe se estava cansada, Raine sorriu, sincera.
— Nem um pouco. Se há mais para vermos, quero prosseguir.
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Ela queria contradizê-lo, rebater cada palavra, mas não podia. Ele estava
certo. Enfrentou os olhos frios do marido.
Sem nada dizer, Benedict agarrou-lhe o braço. Assustada, Raine foi
obrigada a segui-lo, quase correndo para acompanhar os passos largos de
Ainsworth. Todos os observavam, mas ninguém ousou interferir ou comentar.
Benedict só parou quando adentrou o quarto dela. Empurrou-a para dentro
e bateu a porta, antes de soltá-la.
—- Já que se recusa a agir com polidez, deve ficar no cômodo que
requisitou para si própria.
— Como ousa me dar ordens? — Raine rebateu, ultrajada. — E ainda me
arrastou até aqui, sem o menor respeito! Não admito ser motivo de mexericos
entre os empregados.
Tendo os olhos faiscantes de ódio, Benedict avançou sobre ela, fazendo-a
cair na cama.
— Não quer ser motivo de mexericos? Se não se preocupasse tanto com
seu irmão, Abbernathy e você mesma, eu teria vontade de estrangulá-la diante
de todos os moradores do vilarejo. Após a ofensa de se recusar a dormir em meu
quarto, ninguém iria me achar cruel ou desumano, caso eu apertasse esse lindo
pescoço.
— Eu o ofendi? Ah! — gritou, horrorizada.
A raiva crescia dentro dela. Mais que nunca, desejava retornar a seu lar,
porque Benedict estava certo. Ninguém a defenderia, caso ele a violentasse. De
alguma maneira, tinha de fugir daquele lugar e do marido.
Se queria possuí-la, que assim fosse, talvez Benedict a deixasse em paz.
Desesperada, Raine se jogou na cama.
— Vamos acabar logo com isso. Mas saiba que com minha inocência compro
minha liberdade.
Benedict a encarou, aparvalhado. Em seguida, o semblante adquiriu uma
expressão inominável. A respiração de Raine tornava-se ofegante, conforme ele
se aproximava.
Antes que houvesse chance para reagir, Benedict agarrou-lhe as mãos e
prendeu-as acima da cabeça de Raine. Estudou-lhe o rosto por um longo momento
e, então, os olhos azuis fixaram-se no decote do vestido.
Chocada ante o calor que a invadiu, ela fechou os olhos para esconder o
desejo.
Benedict baixou o rosto e roçou o nariz na face rosada. Um arrepio
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CAPÍTULO VII
Após pedir algo para comer a uma das mulheres que arrumavam a mesa,
Benedict sentou-se na cadeira em silêncio. Não estava disposto a conversar.
Pensou sobre o que acontecera no campo de treinamento, dias atrás, e constatou
que Raine faria qualquer coisa para sair de Brackenmoore.
A oferta fora mais que tentadora, mas manteria tal segredo apenas para
si. Benedict a desejava, desesperadamente, mas não queria que Raine
empreendesse tamanho sacrifício por sua liberdade, a qual ele jamais permitiria.
Uma dor aguda cravou-lhe o peito. Devia ser por Brackenmoore, pensou, agoniado.
Raine nunca se libertaria da vida antiga e aceitaria a nova. Fora louco ao casar-se
com ela, embora o desejo de possuí-la crescesse a cada dia, a despeito do
temperamento explosivo da esposa.
Suspirou, aliviado por estar a sós com os próprios pensamentos. Resolvera
descer para o desjejum tão logo soubera que os outros já o haviam feito.
Nos últimos dias, as refeições realizadas naquele salão tinham sido tensas,
em especial porque Raine lhe obedecera e permanecera reclusa no quarto. No
entanto, a ausência tornava-se um peso ante olhares especulativos de William,
Kendran e dos criados.
Minutos depois, Benedict escutou um ruído e divisou Raine adentrar o
salão, mostrando-se mais adorável que nunca. Usando um vestido verde e com os
cabelos soltos ao redor dos ombros, ela parecia uma virgem imaculada e
inatingível. Ao notar a presença de Ainsworth, ela torceu o nariz, aborrecida.
Os ombros de Benedict se contraíam conforme Raine se aproximava. Ele
forçou um sorriso, na tentativa de esconder a infelicidade pelas noites insones
que passara pensando somente nela.
— Raine — cumprimentou-a, indiferente.
— Estou preparada a ser educada e nada mais — ela logo foi avisando.
— Suponho que eu deva estar grato por isso — Benedict ironizou.
Raine o ignorou, empinando o nariz. Ele ficou admirado diante do tremendo
desembaraço.
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direção que tomavam durante a jornada. Claro, também não havia dado
oportunidade ao marido de dissertar sobre as terras, como ele tanto queria.
Porém, Benedict a desejava em Brackenmoore porque era sua esposa, sua
posse, tal qual um objeto. Não se importava com ela como mulher. Mesmo o
desejo insistente de possuí-la parecia advir da necessidade de evitar comen-
tários maldosos entre os empregados.
Raine ignorou o profundo desaponto. Queria somente voltar para casa. O
fato de que havia oferecido a inocência em troca da liberdade agora a
mortificava. Mas se encontrava tão desesperada que... Reparou que William ainda
tagarelava.
— Já que se sente melhor, por que não vem conosco, Raine? Você nunca viu
o mar.
Era verdade que desconhecia o oceano e estava curiosa para ver uma
quantidade tão vasta de água.
— Sim, eu os acompanharei.
Wil sorriu para o outro rapaz que estava próximo.
— Viu, eu disse que ela iria deixar. Raine não me bajula a todo momento.
Raine encarou Kendran. Sem dúvida, ele e Wil haviam conversado sobre
esse assunto. Não gostava de ser motivo de chacotas, ainda que suas ações no
campo de treinamento o houvessem surpreendido. Kendran não a conhecia e, tal
qual o irmão mais velho, julgava-a injustamente.
Agastada, disse a si mesma que não se importava com a opinião do cunhado.
Ela e William não permaneceriam em Brackenmoore.
Voltou a observar Wil. Parecia empolgado com a nova amizade, e Raine
sempre respeitara o conhecimento nato de William acerca do caráter das
pessoas. Nesse caso, ela não devia descontar o ressentimento que sentia por
Benedict em Kendran.
De súbito, William voltou-se para Benedict e perguntou:
— Você também vai, Benedict, se não estiver ocupado? Aflita, Raine não
ousou olhar o marido, rezando para que ele estivesse ocupado. Não estava.
— Ficarei feliz em acompanhá-los até a praia.
A alegria de William foi explícita. — Será fantástico, não, Raine? Todos
nós juntos. Com um desespero que beirava o medo, ela teve vontade de gritar.
Mas não queria desapontar William, nem apagar o brilho daqueles olhos infantis.
Além disso, não desejava dar tamanho poder a Benedict. Se o fizesse, ele a
esmagaria sem perdão.
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Mas como poderia acompanhá-los? De que maneira iria fingir que tudo
estava bem, que não se casara com o homem mais obstinado, mais dominador e
mais frio do mundo? Benedict não era o pior facínora que já nascera?
Indignada, voltou a fitar o marido. Ele a observava com uma expressão
estranha.
Respirou fundo. Nada poderia roubar-lhe a personalidade, nem abrandar o
medo e a solidão que sentira quando a mãe falecera e fora forçada a adquirir
responsabilidades ainda menina. Não havia sucumbido após a morte do pai,
tampouco à ansiedade de encontrar um marido. Benedict Ainsworth não
esmagaria sua determinação.
— Irei passear com vocês na praia, Wil — Raine repetiu, sorridente.
Felizmente a voz soou calma. Ninguém imaginaria que seu coração batia,
acelerado, enquanto Benedict a observava daquele jeito... esquisito. Sabia que
Kendran e William os vigiavam, e o jovem cunhado reparou na tensão que pairava
entre ambos.
Tão logo Raine convencesse Benedict a deixá-la retornar a Abbernathy,
nada disso teria importância. Contudo, sentia-se menos segura com aquele homem
do que havia planejado.
Afoito, William pegou uma porção de queijo e pão e começou a comer.
— Vai se apressar, não vai, Raine? Vamos sair logo. Assim que acabarmos o
desjejum. — Ele sorriu com a boca cheia de comida.
Surpresa ante o apetite do irmão, ela preferiu calar-se a ensinar-lhe bons
modos, mas Benedict não se conteve.
— Não fale com a boca cheia, William.
A tensão aumentou. Raine não pôde evitar a revolta que a assolou. Corrigir
William era tarefa de seu pai.
— Você pode ensinar meu irmão a guerrear — disse, friamente. — Mas, por
favor, deixe as boas maneiras para mim.
Os três, William, Kendran e Benedict, olharam para ela, boquiabertos.
— Tudo bem, Raine — William manifestou-se. — Quero mesmo que
Benedict me ensine como me portar. Ele é a pessoa mais adequada porque preciso
aprender a ser um nobre. Não há necessidade de você se responsabilizar por mim
agora.
Atônita, ela não conseguiu encontrar palavras para rebater o argumento.
Os três continuavam a fitá-la como se fosse a única dizer insanidades. Levantou-
se, lançando um olhar repleto de mágoa ao marido.
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Raine. Estavam aparentes naqueles olhos dourados, que pareciam absorvê-lo. Não
sabia como retrucar tamanho ultraje. Mas, lembrando-se de quanto ela amava o
irmão, resolveu tentar.
— Raine, seu ressentimento exagerado não faz o menor sentido. Quer me
ignorar ou maltratar o menino?
Ela ergueu os braços, exasperada.
— Está distorcendo minhas palavras.
Lutando contra a impaciência, Benedict esfregou o rosto. Não estava
distorcendo as palavras dela, nem de ninguém. Por que Raine sempre se opunha a
tudo?
Não tinha tempo, energia ou disposição para continuar a discutir com a
temperamental esposa. Contudo, queria que ela entendesse a situação para que
pudessem ter paz, e não porque tencionava roubar-lhe o irmão.
— Não estou distorcendo suas palavras, Raine — começou, com uma
paciência que não sabia possuir. — Só preciso entender o que quer de mim. Vamos
deixar William de lado por enquanto. Deseja que eu cuide do garoto?
— Claro que sim. Quero que o ensine e cuide dele. Mas... Benedict ficou
comovido ao ver o brilho de incerteza nos olhos dela.
Mesmo confiante e determinada, Raine necessitava do irmão para
sobreviver. Benedict compreendeu que ela temia perder William, e ele jamais se
perdoaria, caso a fizesse sofrer de alguma forma.
— Raine, não se preocupe. Não vai perder o amor de William. Ele sempre a
amará, a despeito das novas amizades que está fazendo em Brackenmoore.
Ela manteve-se calada, mas Benedict pôde perceber, pelo olhar de
profunda dor, que havia atingido o alvo.
— Por que não consegue ver Brackenmoore como William e usufruir das
novas oportunidades, em vez de sentir-se perdedora? Nós, meus irmãos e eu,
seremos sua família agora, Raine. É minha esposa e será a mãe de meus filhos.
Tão logo terminou de falar, ele notou o corpo de Raine enrijecer.
Conscientizou-se então de que ela jamais o receberia, se não aceitasse a nova
vida. Havia perdido o pai, o lar, a existência que sempre conhecera, e sentir-se
feliz seria trair o passado.
— Não posso sossegar, sabendo que sou necessária em Abbernathy —
Raine declarou, confirmando a dedução de Benedict.
— Pode ficar sossegada em relação a isso. Mandei um administrador
vistoriar a propriedade de seu irmão na manhã seguinte a nossa chegada.
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— Como pôde fazê-lo sem me deixar falar com ele antes? Há muitos
detalhes que ele ignora... o plantio tem de ser distribuído de outra maneira este
ano, os grãos devem ser plantados logo, e a terra, adubada. Esperamos a entrega
de um número específico de ovelhas que precisam ser pagas corretamente ou... —
Raine gesticulou, nervosa. — Ele não sabe de nada!
Benedict espantou-se com a importância das preocupações. Havia
imaginado que, sendo jovem, Raine não tinha idéia de como administrar uma
propriedade. Acreditara que a insistente teimosia em voltar era apenas capricho.
— Perdoe-me, Raine. Eu não sabia que estava tão envolvida no
funcionamento de Abbernathy. Supus que a administração havia virado uma
bagunça após o falecimento de seu pai.
— Pois é justamente isso que venho tentando lhe dizer, Benedict.
— Peço-lhe que me desculpe. Se eu soubesse, teria permitido que
conversasse com sir Max, um homem muito qualificado após anos trabalhando
para mim. — Benedict tentou reforçar, acrescentando: — Caso precise instruí-lo
acerca de outros detalhes, escreva uma carta minuciosa e a mandarei a
Abbernathy hoje mesmo.
— Faria isso? — ela indagou, surpresa.
— É evidente.
Constrangido, desviou o rosto, na tentativa de ignorar os mistérios que
envolviam aquela mulher. Também perguntou-se por que o pai havia esperado
tanto dela.
Mas Raine nunca falaria a respeito disso com ele. Considerava-o um inimigo.
Mesmo agora, comovida ante a permissão de poder comunicar-se com
Abbernathy, havia sofrimento nos olhos brilhantes.
Raine receava que depender do marido implicava em fracasso, abandono da
própria autonomia. Benedict recordou com clareza o que William lhe dissera
quando o conhecera. O menino era muito sensível para alguém tão jovem. Via que
Raine se pressionava ao máximo a fim de não perder a coragem. A impulsividade
irracional representava um meio de conseguir tal intento.
Até as reações físicas tinha de manter sob controle, embora ela houvesse
provado quão completamente podia se entregar. Benedict não se deixou
confundir, achando que Raine nutria algum sentimento amoroso em relação a ele,
e sentiu certo pesar. Era somente uma jovem saudável e passional.
Queria acreditar que pudessem começar uma nova vida juntos em
Brackenmoore.
Se existisse alguém em Brackenmoore, como William, que Raine amasse e
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CAPITULO VIII
— Milorde?
Ao ouvir a voz do assistente, Benedict ergueu o rosto e logo divisou o selo
de Alister Harcourt. Pegou o rolo de papel da mão do homem, apreensivo. Aquele
emblema tornara-se muito conhecido nas últimas semanas.
O fato de aquela mensagem ter chegado tão depressa não era bom sinal.
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Harcourt não levara muito tempo para responder à oferta do rei. E mais, se
enviara a réplica a Benedict, uma vez que fora Edward quem fizera a proposta,
ele provavelmente não havia aceito a negociação.
Benedict assentiu ao sério mensageiro que se encontrava atrás de seu
assistente.
— Obrigado. Vou redigir a resposta. Por favor, espere no saguão. Os
criados lhe servirão algo para beber.
O homem o reverenciou com formalidade e retirou-se da biblioteca.
Benedict rompeu o selo e começou a ler. Cada frase parecia pesar-lhe
sobre as costas. Por fim, sentou-se e esfregou o rosto.
Por que o homem insistia em uma retribuição pessoal? Por que não aceitava
a vontade do rei? Harcourt corria o grave risco de ter sobre si a ira de Edward
ao exigir que Tristan o enfrentasse em combate. Fora esse o tema central de sua
última mensagem.
As respostas surgiram claras na mente de Benedict. Alister Harcourt
almejava vingar a morte de Maxim. Não queria entender a situação, tampouco
sabia que tipo de homem fora seu irmão.
Com franqueza, Benedict admitia que se alguém assassinasse um de seus
irmãos, chamaria o criminoso para um duelo mortal. No entanto, Alister Harcourt
cometia um erro crasso nessa história.
Tinha de acontecer agora?, pensou, suspirando. Se o relacionamento com
Raine não estivesse tão tumultuado, iria a Trenley e enfrentaria o homem
pessoalmente. Mas não poderia, não com a ausência de Tristan e Lily. Se algo
acontecesse a ele, Kendran ficaria encarregado de tudo e tinha apenas dezesseis
anos.
Tampouco podia alertar Tristan porque não queria que ele soubesse das
ameaças de Harcourt.
Tentou se convencer de que a relutância em ir a Trenley não tinha nada a
ver com Raine, mas foi em vão. Se a deixasse sozinha, ela fugiria para
Abbernathy o mais rápido possível.
Assegurou-se de que não se importava porque não nutria nenhum
sentimento romântico por ela. A despeito do sofrimento, Raine era tão
imprevisível e teimosa quanto uma mulher podia ser.
Benedict precisava de mais tempo para conseguir gerar o almejado filho.
Nos últimos dias, arquitetara um meio de trazer o assunto à tona.
Desde a conversa na praia, ambos pareciam manter uma trégua silenciosa.
Hesitava em tomar alguma atitude que pudesse arruinar a paz, ainda tão precária.
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Raine o evitava sempre que possível. Também estava consciente de que ela o
observava com cautela.
Suspirou e fitou a carta. As ameaças de Alister Harcourt permaneciam
pendentes. Benedict bateu o punho na mesa, agitado. Havia prometido a si mesmo
que o casamento não interferiria em seus deveres.
Voltou a olhar a mensagem. Vinha evitando qualquer contato pessoal com
Harcourt. Se enviasse uma carta solidária à dor e explicasse que nada ganhariam
com outra morte, talvez o homem esquecesse o assunto.
Ainda pensativo, Benedict pegou uma pena e um papel. Porém, quando fez
menção de escrever, novamente a imagem de Raine surgiu-lhe à mente. Os olhos
dourados carregados de desejo, os lábios trêmulos que ansiavam por um beijo...
A visão trouxe uma onda de paixão e expectativa. Benedict respirou fundo
a fim de abrandar a intensidade do desejo. Não podia mais negar, queria Raine,
desde a primeira vez em que a vira.
Consumar a união poderia gerar um filho e uma paz verdadeira entre
ambos, e era nisso que Benedict devia se concentrar. Não deixaria o desejo
dominá-lo.
Impaciente, olhou o papel ainda em branco. Não havia tempo de protelar a
tão desejada paz entre ele e a esposa. Vários assuntos exigiam sua atenção e,
mesmo a contragosto, só sossegaria quando eliminasse a animosidade no
casamento.
Raine sabia que era tarde, pois tinha dispensado Aida havia horas. Não
conseguia pegar no sono. Estava sentada diante do fogo, ciente de que o calor
aquecia-lhe as faces, mas sentia-se alheia às chamas da lareira e aos arredores.
Pensamentos conflitantes em relação a Benedict a perturbavam. Ele agira
com tanta gentileza na praia que Raine quase esquecera a revolta de sentir-se
aprisionada. Porém, achava-se correto em apenas uma questão: ela tolhia a li-
berdade de William.
Benedict não queria magoá-lo. Sua devoção à família havia se tornado clara
no dia em que falara a respeito dos entes queridos. Raine não tinha dúvidas de
que Wil estaria seguro até que pudessem retornar a Abbernathy.
O que mais a afligia eram as crescentes preocupações com o marido, o qual
esforçava-se em evitar. Nos últimos dias, ela e Aida passavam longas horas
bordando roupas que não requeriam bordados e remendando vestidos que não
precisavam de reformas.
De nada adiantou. Sempre que Benedict encontrava-se próximo, Raine o
observava, avaliava os ombros largos, escutava o som da voz profunda, estudava
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partir. A serviçal era muito tagarela, e podia colocar tudo a perder, caso os de-
latasse sem querer.
Por acaso, Aida adentrou o quarto quando Raine terminava de arrumar a
mala. Não foi necessário explicar o plano porque a criada o deduziu na hora.
— Estamos partindo? — Aida sussurrou.
— Sim. E agora que sabe, precisamos ir imediatamente.
— Acha que é a atitude mais sábia, milady? — ela perguntou, ansiosa.
Raine recusou-se a discutir o assunto.
— Partiremos pela manhã. Pegue apenas o que conseguir carregar.
— Mas como faremos isso?
— Você, William e eu sairemos para cavalgar separados e nos
encontraremos na praia após o desjejum. Seguiremos a Abbernathy pela costa.
— Lorde Benedict não irá admitir.
— Ele não vai suspeitar até que estejamos bem longe daqui. Jamais
pensará que partimos sem os homens de William, Aida.
A criada arregalou os olhos.
— Não podemos, milady. A jornada é muito perigosa para duas mulheres e
um menino.
— Por isso temos de ter cautela. Se prefere permanecer em
Brackenmoore, a escolha é sua.
— Sabe que eu nunca deixaria milady e William empreenderem uma viagem
sem mim.
— Muito bem. Esteja pronta. Vou falar com William o mais rápido possível.
Naquela noite, foi difícil esconder a agitação e ficou aliviada ao notar que o
marido não comparecera à mesa. Se Kendran desconfiou de algo, não fez qualquer
comentário e jantou, despreocupado, tal qual Willíam.
Contudo, Kendran supôs que Benedict devia estar ocupado até tarde da
noite. Raine, pressentindo o olhar do rapaz, fitou-o com uma máscara de
inocência. Ele a observou por um momento, sorrindo, e então voltou a atenção ao
prato. O sorriso sutil mostrara a Raine que Kendran estava mais ligado aos
acontecimentos do que aparentava.
Nervosa, esperou a refeição terminar para pedir a William que a
acompanhasse até seu cômodo. Ele acenou ao sorridente Kendran e retirou-se
com a irmã.
Ela sabia que seria um grande sacrifício para William partir sem se
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O alívio foi tão grande que ela nem sequer conseguiu falar. Virou o rosto a
fim de evitar que o irmão testemunhasse as lágrimas. Somente agora dava-se
conta de quão temerosa estava em relação a William não acompanhá-la.
— Obrigada, Wil, por sua lealdade — agradeceu, em voz baixa.
Sentiu-o tocar-lhe o ombro e reparou que havia revelado mais do que
desejava. Ela estava determinada e manter-se firme para que o irmão não
sofresse. Como sempre, tinha de evitar que William experimentasse o terror e a
solidão que Raine vivera quando o pai caíra em desespero.
— Minha lealdade sempre foi e sempre será a você, Raine. Temos o mesmo
sangue. Rezo para que nunca se esqueça disso.
Dessa vez, ela o encarou, desvelando os sentimentos. Ficou tomada pela
doce emoção.
— Eu o amo, William.
— Também a amo — ele replicou, de repente, constrangido com a troca de
afeto. — Agora diga exatamente o que quer que eu faça.
Raine sentiu o amor pelo irmão aumentar. Era apenas um menino e já
possuía a sensibilidade de um homem decente. Respirou fundo e relatou o plano.
A despeito da alegria por ter o apoio de William, Raine sentiu uma ponta de
remorso. Quando decidira partir, havia imaginado que o irmão a condenaria.
Mesmo depois de ele aceitar o plano e mostrar-se disposto a segui-la,
Raine continuava insegura. Suspeitava que a sensação advinha do fato de
abandonar Brackenmoore, sem dúvida, não tinha nada a ver com Benedict.
Muito menos, relacionava-se à resolução de nunca mais se permitir o
prazer que havia encontrado nos braços de seu marido.
CAPÍTULO IX
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castelo. — Maeve respirou fundo. — Ninguém mais os viu desde que saíram para
cavalgar de manhã.
— Dei ordens expressas aos criados para que me informassem de cada
movimento de minha esposa e cunhado — Benedict esbravejou, assustando
Maeve.
— Eles não saíram juntos, milorde, e ninguém imaginou que...
— Os homens de William também desapareceram?
— Não, milorde, eles também não têm idéia de onde lady Raine e lorde
William possam estar.
Benedict poderia interrogar os homens, no entanto, pressentia que Raine
não lhes havia confidenciado nada, caso contrário, os fiéis soldados não a
deixariam sair desprotegida. Também poderia mandar vasculhar cada canto do
castelo e seus arredores, mas não os encontraria. Sabia para onde tinham ido e
por quê.
Em questão de poucas horas, conseguira que seus homens e os de William
se preparassem para partir. Os últimos, com certeza, seriam capazes de guiá-lo
até Abbernathy.
Os dedos de Benedict apertavam as rédeas, enquanto esporeava o cavalo.
Raine em breve aprenderia a não agir por livre vontade. Não tinha permissão de
partir e ainda carregar o irmão de onze anos, sem escolta, preocupando não só
Benedict, mas todos os habitantes de Brackenmoore. Nem sequer ousava
considerar a possibilidade de ela não ter conseguido chegar a Abbernathy.
A profunda aflição aumentava a ansiedade. Claro, os sentimentos receosos
advinham da responsabilidade que possuía como marido. Afinal, o casamento os
unira. Seria loucura nutrir alguma emoção pessoal por ela. A noite lancinante que
haviam passado juntos não entrava no mérito.
Raine tinha fugido só porque Benedict tentara fazê-la entender que
precisavam se acertar a fim de gerarem um herdeiro para Brackenmoore. Aquela
fuga inesperada era mais um sinal de egoísmo e irresponsabilidade.
Seria ótimo chegar em Abbernathy antes dela e receber a teimosa esposa
como esta merecia. Duvidava de que Raine, William e a criada houvessem
percorrido a mesma distância com mais destreza que Benedict e seus homens.
Não tinha a menor noção de quanto tempo havia se passado quando as
muralhas de Abbernathy surgiram no horizonte. Benedict galopou até os portões
e parou.
— Abram!
Um homem apareceu sob a escuridão. O pronto atendimento agradou
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Catherine Archer A Dama da Floresta
Benedict, pois significava que o guarda não estava dormindo em seu posto,
indicava também que sir Max cumpria os deveres administrativos com eficiência.
— Quem ordena entrada? — perguntou o vigia em tom de autoridade.
Mais uma vez Benedict ficou satisfeito, mas não tinha paciência para
discutir.
— Benedict Ainsworth, o marido de lady Raine. Houve um longo silêncio.
— É o marido de lady Raine? — o homem indagou.
— Sou e não vou tolerar esta demora. Se não abrir os portões, derrubarei
pedra por pedra. E acredite-me, homem, até lá estarei muito furioso.
— Por favor, milorde, aguarde um instante para que eu obtenha permissão.
Não posso abrir os portões, apesar de acreditar em sua ameaça. Irei ter com sir
Max ou lady Raine. Se estiver dizendo a verdade, um dos dois permitirá sua
entrada.
Ela estava lá. Benedict ignorou a sensação de alívio para não diminuir a
raiva que sentia. Compreendia também que o guarda não tinha nada a ver com as
atitudes irritantes de Raine.
— Vou contar até cem. É o tempo que lhe dou e nada mais além disso.
O homem desapareceu. Benedict não contou o tempo. Sabia que o guarda
cumpriria sua obrigação o mais rápido possível. Momentos depois, ele retornou,
ofegante.
— Pode entrar, milorde, e perdoe-me a demora.
Benedict permaneceu calado, observando os portões se abrindo.
Mesmo sendo informada de sua chegada, Raine não teria nenhuma
vantagem. Benedict não precisava surpreendê-la. Na verdade, pretendia levá-la
de volta a Brackenmoore à força, caso fosse necessário.
Curiosos já começavam a se reunir no pátio interno do castelo. Ele os
ignorou. Ordenou que os homens cuidassem dos cavalos no estábulo e entrou.
Algumas pessoas encontravam-se próximas à lareira do saguão central.
Elas o observavam com explícita curiosidade. A novidade já havia sido espalhada
entre os habitantes do feudo. Benedict não estava disposto a se explicar. Ca-
minhou em direção a uma escada, localizada nos fundos do salão. Suponha ser o
acesso aos aposentos da família. Divisou Raine antes mesmo de chegar ao topo.
Ao vê-lo, ela se deteve no degrau e levou as mãos à cintura.
— Você tem um estilo inigualável, Benedict Ainsworth. Para que intimidar o
pobre vigia?
Enquanto notava a palidez do rosto e as sombras sob os olhos dourados, ele
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lutava a fim de manter a fúria interna. Sem dúvida, a jornada havia sido árdua
para Raine.
— Não intimidei o guarda — respondeu. — Apenas mostrei minha
autoridade de marido. — Benedict a examinou. — Pelo que vejo não ficou tão
perturbada quanto ele. Eu ficaria feliz em desapontá-la. Passei os últimos dois
dias sobre uma sela.
— Por causa de sua teimosia — Raine replicou. — Ninguém o obrigou a vir
atrás de mim.
Irritado, Benedict tentou se conter, não queria discutir com ela.
— Prepare-se para retornar a Brackenmoore imediatamente.
— Ficou louco?
Que ousadia! Frustração e fúria pareciam sufocá-lo. Disfarçando as
emoções, Benedict continuou a encará-la.
— Não pode me forçar a nada! — Raine exclamou. — Nunca concordarei em
acompanhá-lo. — Ela se virou e correu.
Sem perdê-la de vista, Benedict a seguiu. A visão tentadora do corpo
feminino à frente o irritou ainda mais. Queria somente mostrar a Raine que não
toleraria nenhum comportamento abusivo. Era a baronesa de Brackenmoore e
tinha de se comportar de acordo.
Ao final do longo corredor, ela abriu uma porta e desapareceu. Benedict
escutou o ruído da tranca ao se aproximar. Sem hesitar, deu um passo para trás
ejogou o próprio peso contra a porta, arrebentando a fechadura.
Boquiaberta, Raine permanecia estática no meio do quarto. Foi com
satisfação que ele reparou na expressão de choque de sua esposa.
— O que está fazendo? — ela indagou.
Benedict cruzou os braços. Só conseguia concentrar-se no fato de que era
sua esposa e não mais suportaria aquela situação ridícula.
— Como lhe disse, apronte-se para voltar a Brackenmoore — ordenou com
uma calma surpreendente.
— Seu bruto insensível! Não pode arrombar a porta do meu quarto e ditar
ordens com essa frieza. Não vou admitir!
— Não vai admitir?
— Tem idéia de quão humilhante é ver que você não demonstra a menor
emoção quando me dá ordens? Só falta exigir que o jantar seja servido. — Raine
tocou o peito, indignada. — Eu e meus sentimentos somos muito mais importantes
que isso, e você não vai me menosprezar.
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Pasmo, Benedict arregalou os olhos. Raine estava furiosa por que ele agia
com calma!
— Prefere que eu a coloque sobre minhas pernas e lhe dê a lição que
merece?
— Você não se atreveria! Ele deu um passo à frente.
— Está me desafiando?
— Por favor, Benedict — disse uma voz atrás dele. Agastado, Benedict se
virou para deparar-se com William.
Queria tranquilizar o menino dizendo que não pretendia levar a cabo as
ameaças, mas não o faria diante de Raine. Resolveu desviar o assunto.
— Arrume seus pertences, William. Partiremos logo.
— Não vamos a lugar algum — Raine interveio. Fechando os olhos, ele soltou
um suspiro profundo. Raine o acusara de ser calmo demais. Se ao menos soubesse
quanto lhe custava o sacrifício, talvez amenizasse o clima.
— Perdoe-nos, Benedict, pelo transtorno que causamos a você — William
pediu, consternado.
— Obrigado, William, mas não se sinta responsável. É Raine quem deve
assumir a culpa.
— Mas Raine não...
— Por favor, deixe-nos a sós, Wil — Benedict o interrompeu. — Preciso
conversar com sua irmã. — Ao ver a hesitação do menino, ele acrescentou: —
Você sabe que não vou machucá-la.
Embora perturbado, o garoto assentiu.
— Não tenho motivos para me sentir culpada — Raine retrucou, tão logo
William retirou-se.
— Então devo concluir que viajar sem escolta foi idéia de William... ou de
Aida? Graças a Deus vocês conseguiram chegar a salvo. Centenas de desastres
poderiam ter acontecido durante o trajeto.
Raine ficou pálida, mas sustentou a postura desafiadora.
— Nada aconteceu.
A despeito da arrogância, Benedict pôde notar que as palavras tinham
surtido efeito. A jornada certamente fora mais difícil do que ela imaginara a
princípio. Mesmo sabendo que a dura experiência lhe servira de lição, o instinto
protetor invadiu-o por completo.
Surpreso com a reação, Benedict reprimiu-o. Jamais revelaria seus
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tão assustada...
As palavras tortuosas o fizeram lembrar a dor de perder os próprios pais,
a incerteza que sentira ao se ver encarregado de criar os irmãos. Mas Benedict
tinha dezoito anos. Raine era apenas uma criança.
— Deve ter sido terrível, em especial por haver perdido sua mãe.
— O bebê, William, chorava sem parar. Donalda, a governanta de
Abbernathy, encontrou Aida para amamentá-lo, mas ele continuava chorando.
Parecia saber que mamãe... tinha morrido. Logo descobri que, quando o aca-
lentava, William se sentia melhor. Soube então que era meu, que precisava cuidar
dele, amá-lo e, sobretudo, protege-lo de qualquer sofrimento... como papai fizera
comigo. Conforme Wil cresceu, percebi que tinha ajudá-lo a se fortalecer.
Compreendendo enfim os motivos que a levavam a proteger William,
Benedict chegou mais perto dela. Queria abraçá-la, confortá-la, mas não achava
que o gesto seria bem-vindo. Raine acreditava que ele havia interferido em seu
dever quando a forçou a viver em Brackenmoore.
— Também fui obrigado a amadurecer quando meus pais morreram, Raine
— Benedict confessou. — Tive de honrar a confiança que meu pai depositou em
mim. Você não precisa se responsabilizar por tudo, tampouco recear cometer os
mesmos erros de seu pai. É uma mulher, suas obrigações são diferentes das de
um homem.
— São? Talvez eu não queira que sejam. Talvez eu tenha orgulho de ser
forte e independente como você. Devo me contentar em ser a mãe do herdeiro de
Brackenmoore e deixar de lado meus desejos? Não quero me submeter e permitir
que outra pessoa dirija minha vida!
No mesmo instante, Benedict sentiu-se afetado por aqueIas palavras, mas
mascarou o sentimento readquirindo a arrogância habitual.
— Não há vergonha, nem degradação, em ser a mãe do herdeiro de
Brackenmoore. Minha mãe tinha muito orgulho desta posição.
— Não sou sua...
— Raine?
William estava parado diante da porta. O rosto apreensivo fez Benedict
perguntar-se quanto o menino havia escutado da conversa.
— Desculpe-me, Benedict. Posso conversar com minha irmã por um
momento?
Fitando a esposa, Benedict notou o brilho de ressentimento nos olhos
dourados. Raine cruzou os braços, desafiando a autoridade do marido.
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Via agora quão tola fora por ter retornado para casa. Nada voltaria a ser
como antes.
William tinha razão. Sua destino era permanecer com Benedict. Embora a
melancolia a invadisse, ela sentiu também uma nova emoção, mas não se ateve a
ela. Não tencionava aceitar o prazeroso conforto que Benedict estava disposto a
lhe oferecer com seu corpo viril.
CAPÍTULO X
Quando a porta se abriu, Raine já sabia quem era, mesmo antes de se virar.
A presença de Benedict transformava os espaços em um sentimento palpável de
pura energia.
— Raine?
Devagar, ela fitou os olhos azuis. Quis desviar o rosto, pois aquele olhar
tinha o poder de perturbá-la ao ponto de trazer-lhe à mente a sensação de se
perder no ardor da paixão.
— Meu primo já se foi? — perguntou, controlada.
— Sim. Donalda atestou sua suspeita de que o ferimento não foi grave.
— Fico aliviada. Embora Denley seja desnorteado, eu não gostaria de ser
responsável por sua morte.
— Seria eu o único responsável, caso ele viesse a morrer. Raine meneou a
cabeça em negativa.
— Não, meu impulso causou esse conflito. Eu devia ter imaginado que
Denley apareceria tão logo soubesse de minha chegada.
— Ele é o mais estúpido dos homens.
Raine respirou fundo e soltou o ar bem depressa. O que pretendia dizer
arrumaria sua liberdade e autonomia.
— Por favor, Benedict, deixe-me terminar. Sei que cometi muitos erros,
incluindo o fato de achar que você me tratava mal só para me forçar a residir em
Brackenmoore. Eu não podia me casar com um homem, receber sua proteçao e não
dar nada em troca. — Ela fez uma pausa. — Voltarei a Brackenmoore sem
resistência. Prometo que não vou mais fugir, mas me recuso a receber ordens.
Para seu espanto, Raine não divisou a expressão de vitória a qual esperava.
Notou apenas um traço de surpresa e outra emoção estranha que parecia
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remorso. Não fazia sentido. Benedict devia estar contente em saber que ela o
acompanharia por livre vontade.
Não houve recriminação, somente um tom suave na voz quando falou:
— Obrigado, Raine. O que aconteceu entre nós ficará esquecido no
passado. Partiremos quando estiver pronta.
Quando estiver pronta? Como entender aquela súbita concessão? Em vez
de lançar acusações, como esperava que ele fizesse, Benedict se comportava de
modo civilizado e generoso. O lado suave e dadivoso do marido a agradou. Com os
olhos, Raine traçou a forma viril, deteve-se nas mãos largas que tanto prazer lhe
haviam dado e sentiu-se ruborizar.
Benedict fizera amor com ela sob o pretexto de gerar um herdeiro. No
entanto, sabia que ele não conseguia agir de outra maneira. Brackenmoore era e
sempre seria sua primazia. Mesmo que o legado lhe custasse a felicidade.
Apesar de magoada, reparou que havia bondade nele. Benedict jamais a
amaria, mas talvez pudessem construir uma vida juntos e também aprendesse a
respeitar a opinião de Raine. O fato de não ter refutado a exigência de não mais
ditar ordens deu-lhe algum encorajamento.
— Se estiver de acordo, prefiro permanecer aqui por mais um dia para
orientar os servos e informar-lhes sobre os acontecimentos. Quando fomos à
corte, esperávamos voltar... — Raine engoliu um nó que se formara em sua
garganta. - Quero me despedir.
Benedict a observou por um longo momento. — Não tenho objeções —
disse, por fim. — Os homens estão fatigados após a dura jornada e precisam
descansar antes de retornarmos.
Houve uma solene cerimônia na manhã em que partiram de Abbernathy.
Quando os habitantes do castelo se reuniram para o adeus, um clima pesado
instalou-se no ar. Raine e William fariam falta a todos. Durante um dia, Benedict
testemunhara o cuidado e a dedicação da esposa com aqueles que moravam no
legado.
A maneira gentil contradizia o comportamento que ela tivera em
Brackenmoore. Esperava que, com o tempo, Raine aceitasse a condição de
baronesa.
Embora estivesse surpreso ante a rendição de acompanhá-lo e a alegação
de que ele não agira errado ao pedir-lhe que permanecesse em Brackenmoore,
Benedict sentia um vazio em sua alma. Agora compreendia por que Raine era tão
rebelde. A grave depressão do pai a afetara profundamente. Porém, não mais
existiriam motivos para preocupações, pois Benedict sempre cuidaria dela.
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Agora com os lábios, ela traçou o mesmo trajeto ao longo do peito másculo.
Provou o gosto da pele molhada e suspirou.
Benedict murmurava seu nome, incitando-a a prosseguir. Sem parar para
considerar, ela percorreu o abdome musculoso, podia escutar a respiração
tornar-se mais rápida conforme seus lábios se moviam. As reações de Benedict a
estimulavam.
Gentilmente, apossou-se do membro rígido. Ainda se lembrava das carícias
alucinantes que ele lhe proporcionara.
Mais uma vez, Benedict tentou impedi-la, mas Raine não permitiu, ela iria
comandar aquele momento.
— Raine...
O murmúrio de prazer foi o sinal de que ela precisava. Teve a certeza de
que o levava a patamares inimagináveis a ponto de roubar-lhe a consciência.
Benedict estava enlouquecido. As sensações que Raine lhe causava
pareciam afogá-lo em um mar de desejo. Ela era o centro do universo, e tudo
mais ao redor parecia ínfimo se comparado à luz que Raine irradiava. Ondas de
doce deleite o invadiam a cada carícia sensual.
Com grande esforço, segurou-a pelos ombros.
—- Chega, Raine. Por favor... — implorou.
Abraçou-a e mergulhou o rosto nos cabelos avermelhados na tentativa de
recuperar o fôlego. Quando a sentiu estremecer, carregou-a nos braços e deitou-
a sobre a relva úmida. Então posicionou-se entre as pernas esguias, e Raine se
entregou por completo.
Agora empreendiam uma dança instintiva, tendo os corpos fundidos na
mesma melodia.
Raine não mais pensava em roubar o controle de Benedict porque também
estava perdida, imersa na paixão que a dominava, mergulhada no sentimento, no
toque e no sabor de Benedict.
As sensações cresceram até atingir o grau máximo da criação. Somente
quando sentiu o tremor em Benedict, ela se deixou levar pela mais pura jornada
ao êxtase total.
Após o almejado clímax, Benedict ainda sentia o desejo pulsar nas veias.
Fraco, deitou-se sobre a grama molhada. Embora estivesse ciente da chuva que
caía em seu rosto e da relva úmida em sua pele, só conseguia se concentrar em
Raine.
Aos poucos a respiração começou a voltar ao normal, e o frio da chuva
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perguntava, educadamente, como havia passado o dia ou se ela queria mais vinho,
Raine tinha vontade de gritar.
O pior era ter de se preparar para os intermináveis episódios de tortura
como se fosse comparecer a algum evento da corte. Os vestidos elegantes e os
penteados perfeitos serviam de armadura contra a frieza de Benedict. Através
dos trajes finos, Raine igualava-se à posição daquele que chamava de marido.
Também era um meio de se distrair ao invés de lembrar o olhar gelado de
Benedict minutos após fazerem amor. A imagem a angustiava e parecia congelar
seu coração. O que ocasionara a súbita mudança ela nem sequer imaginava. Só
sabia que não conseguiria aguentar outra rejeição.
Mas não precisava se preocupar quanto a isso. Ele não ensaiava nenhuma
tentativa de aproximação.
Quando não estava reclusa no quarto, Raine passava horas na companhia de
William. O menino sentia a infelicidade da irmã, embora ela se esforçasse em
evitar o assunto. Justificara ao irmão, dizendo que tinha saudade dos amigos de
Abbemathy e logo voltaria ao normal, mas não acreditava nas próprias palavras.
Sempre o encorajava a passar mais tempo com Kendran, que continuava a
tratá-lo bem.
Se Benedict não sustentasse aquele ar de reserva e aristocracia, ele seria
como Kendran. Porém, ficava claro que o barão de Brackenmoore era incapaz de
se transformar.
Foi de cabeça erguida que Raine, seis semanas após chegar a
Brackenmoore, entrou no salão. Ao notar que Benedict estava sozinho na mesa
principal, ela hesitou. Mas quando o marido a viu, não teve escolha, exceto ocupar
seu lugar.
Pressentiu o olhar atento de Benedict, contudo não ousou encará-lo.
Apesar de o vestido azul, enfeitado de fios de ouro, ser requintado demais para a
ocasião, ela manteve a dignidade. Pelo menos, podia agradar a si mesma. Não havia
razão para satisfazer um marido que não se interessava por ela.
Felizmente, William e Kendran apareceram. Estavam rindo e, ao fitar o
irmão, Raine reparou no brilho de alegria dos olhos verdes e nas faces rosadas. A
transformação do garoto era evidente, depois que ela se casara com Benedict. O
crescimento de William fazia com que a nova vida se tornasse suportável. Ou
não?
Raine tentou partilhar da esfuziante tagarelice de Wil, mas não tinha a
menor noção do que dizia.
A atenção estava voltada para o marido. Por que o achava tão lindo? Por
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que seu coração disparava cada vez que lembrava o encontro amoroso que tiveram
na floresta? Por que os sonhos surgiam repletos de imagens exóticas?
Gemendo, ela desviou o olhar.
A total indiferença de Benedict em relação a ela e aos dois rapazes
mostrava quão absorvido estava nos próprios problemas. Não tinha tempo a
perder com os pensamentos sensuais que a torturavam.
Raine assegurou-se de que não se importava com aquela falta de interesse.
Nem um pouco. Entretanto, continuava muito atenta à poderosa presença e ao ar
distraído.
— Raine!
De tão mergulhada em pensamentos, ela escutou seu nome sendo
pronunciado com um traço de impaciência. Então notou que William olhava,
ansioso, para ela.
Raine endireitou os ombros e sorriu.
— Desculpe-me, Wil, não estava prestando atenção. O que disse?
— Posso ver que está ausente, Raine. — William fitou-a, preocupado. — Não
se sente bem?
— Estou ótima. Eu só... Oh, não importa. O que queria me dizer?
— Quero ir a Wyndam, com Kendran, amanhã. Raine encarou o outro rapaz.
Kendran sorria com seu charme agora tão conhecido. Novamente, ela pressentiu
que, quando fosse mais velho, aquela qualidade o faria irresistível, embora a
beleza de Kendran não a atraísse.
Na verdade, preferia um homem mais maduro e direto. Voltou a fitar o
marido.
Ficou horrorizada. Estava louca ou o quê? Benedict não era maduro e
direto, mas sim cruel e vil, capaz de mover céus e terras só para manter tudo na
mais perfeita ordem.
Resoluta, Raine olhou para o irmão. Não sabia se queria que William
viajasse com Kendran.
— Quão longe é Wyndam e quando voltarão? Vão levar uma tropa para
protegê-lo?
Houve um infindável silêncio. Raine sentiu-se corar. Tinha certeza de que
se lembravam da fuga a Abbemathy sem escolta.
— Eles tomarão medidas adequadas, Raine — Benedict interveio. —
Wyndam fica a quatro horas daqui. Ambos voltarão depois de amanhã, ao
entardecer.
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Certa de que havia mesmo algo errado, Raine aproximou-se ainda mais,
enquanto examinava as feições da jovem.
— Há algum problema?
— Por que pergunta, milady? — indagou, assustada.
— Não sei. Mas tenho a sensação de que...
Para sua surpresa, a garota levou as mãos ao rosto e começou a chorar.
Sem pensar, Raine a abraçou pelos ombros com o intuito de confortá-la.
— Por que não me conta o que a perturba?
— Não posso contar a ninguém — respondeu a camponesa.
— Para mim você pode contar. Talvez conversar alivie seu sofrimento. —
Raine ficou comovida, mas não pretendia desistir. — Que tal começar me dizendo
seu nome?
A atormentada jovem engoliu um soluço e ergueu o rosto.
— Meu nome é Leandra.
— Que nome lindo.
Novamente, ela cobriu as faces e caiu em pratos.
— Foi o que ele me disse. Raine ficou tensa.
— Imagino que seu sofrimento tenha sido causado por algo que algum
homem lhe fez.
— Sim, milady.
— O cretino.
As lágrimas cessaram tão depressa quanto começaram.
— Perdoe-me, milady, mas ele não é um cretino — Leandra afirmou. — É
gentil, bom e...
— Então qual é o problema? Leandra corou.
— Milady, estou... — Ela tocou o ventre e olhou para o oceano.
Ao ver o gesto, Raine entendeu o que estava acontecendo.
— Ele abusou de você, e se recusa a fazer o que é certo.
— Não, milady. Eu me entreguei por vontade própria. — Leandra corou
outra vez. — Nós nos conhecemos no festival de inverno. Ele estava tão lindo e
forte. Bebemos muito vinho e...
— Mas por que tanto sofrimento, Leandra?
— Não contei a ele sobre o bebê.
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— Que absurdo. Meus homens são decentes. Estou certo de que qualquer
um deles honraria a mãe da criança.
— Acha mesmo, Benedict? O fato de serem seus amigos não significa que
tenham bom caráter e honradez. Não pode estar acima dos sentimentos das
pessoas. — Ela se deteve, espantada com a afirmação.
— Não estamos falando de mim e de você, Raine — ele esbravejou. —
Conheço bem o coração de meus soldados.
— Não quero discutir com você. Desejo apenas saber que procedimento
pretende tomar em relação a Leandra.
Por um longo tempo, Benedict ficou em silêncio.
— Raine, não creio que eu deva interferir — disse, enfim. — Anos atrás,
jurei não tomar partido em assuntos como esse. — Ele baixou o olhar. — Custou-
me muito intervir na felicidade de Tristan e Lily. Apesar de eu achar um erro
meu irmão casar-se com a filha de nosso inimigo, cometi um grave engano. Se não
fosse por mim, eles não teriam de fugir, o bebê não teria nascido dentro da
carruagem na calada da noite e Lily não perderia a memória.
A despeito de não compreender os detalhes daquela confissão, Raine notou
quanto Benedict ainda sofria e acreditou em sua sinceridade. Mas precisava
fazê-lo entender que as histórias eram diferentes.
— A situação não pode ficar como está — ela arriscou, frustrada.
— Não entende o que estou tentando lhe dizer, Raine? O que deve ser
feito a fim de retificar esse tipo de situação pode parecer claro, mas não
significa que seja o certo. Aprendi a deixar os outros cuidarem de seus
relacionamentos amorosos. O tempo será suficiente para corrigir os erros.
A maior incapacidade daquele homem era não ousar envolver-se no próprio
casamento. Raine sentiu-se ainda mais frustrada.
— Não me escutou, Benedict? Não podemos ficar parados e rezar pelo bem
de todos. Você tem de agir a despeito de suas crenças. Precisa ser feito agora,
sem ponderações.
Como ele não replicasse, Raine prosseguiu:
— Não me fiz clara? Temo pelo bem-estar daquela jovem. Quando a
encontrei na praia, ela fitava o oceano como se... Receio que Leandra queira
acabar com a própria vida.
Assustado, Benedict segurou-a pelo braço.
— Ela lhe disse isso?
— Não, mas tenho certeza de...
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infindável de primos.
— Deve agradecer a Raine, Maeve. Foi ela quem me chamou a atenção para
a situação de Leandra. Admito que custou-me acreditar, antes de cumprir meu
dever. — Ele sabia ser a mais absoluta verdade. Suspirou novamente, desolado.
— Está passando mal, milorde? — Maeve aproximou-se. Benedict meneou a
cabeça em negativa, evitando olhá-la.
Mesmo considerando-a uma mãe, desde a morte de seus pais, era difícil
aceitar o carinho de Maeve. A responsabilidade impedia a fluidez das emoções. E
ninguém, incluindo Maeve, podia duvidar de sua habilidade de senhor, apesar da
tumultuada vida pessoal.
— Não, Maeve. Não precisa se preocupar comigo.
A criada ficou calada por algum tempo, mantendo o olhar fixo em Benedict.
Quando ele a encarou, sentiu o coração se apertar.
— Sei que é um homem forte e independente, milorde, e que deseja
permanecer sempre controlado e calmo. Porém, há momentos em que a
serenidade é um sacrifício.
Benedict fez menção de falar, mas Maeve o impediu.
— Reconheço que estou invadindo sua privacidade, mas amo o senhor e seus
irmãos como filhos. São as crianças que nunca pude ter. Não consigo ignorar seu
sofrimento e sei qual é a causa.
Benedict examinou as mãos de Maeve, tão calejadas pelos anos de trabalho
duro. Não se atreveria a contradizer a verdade que ela revelava. A boa mulher o
conhecia muito bem.
— Ela nunca vai aceitar a vida que leva aqui — confessou, resignado.
— Lady Raine vai se adaptar. Tem medo de nos amar porque acredita que o
sentimento é uma traição ao passado.
— Ela é incapaz de amar alguém... exceto o próprio irmão.
Maeve sorriu.
— Está enganado, milorde. É o amor pelo irmão que me dá a certeza de que
ela é capaz de amar. Alguém com tanta devoção possui um coração generoso. Por
mais que negue, lady Raine acabará cedendo. Veja como ela se colocou a favor de
Leandra, uma estranha.
— Sim, é verdade. E talvez seja por isso que Raine a ajudou. Leandra não
ameaça sua lealdade exagerada.
— Sabe que meu carinho pelo senhor não está em questão. Portanto, escute
o que vou dizer. Se quiser que lady Raine o ame algum dia, precisa mostrar quanto
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a aprecia.
— Eu mostro a ela respeito e consideração, Maeve. Não posso adulá-la ou
negligenciar meu deveres para escrever poemas a respeito da glória contida
naqueles olhos dourados.
O semblante triste de Maeve assentiu.
— Perdoe a ranhetice de uma velha, milorde. — Ela se virou e saiu.
Benedict encarou a porta que se fechava. Não seria útil a ninguém discutir
a questão. Raine jamais o amaria, por mais que ele tentasse. Somente William
tinha o privilégio de ser amado.
Uma dor súbita invadiu-lhe o coração, mas ignorou-a. Não precisava do
amor da esposa. Era o líder da família e não deveria se ater a futílidades.
Entretanto, aquela certeza não lhe trouxe a confiança que sempre o
fortalecera no passado. Para sua infelicidade, tudo que sentiu foi somente o
vazio.
CAPÍTULO XII
Raine recolheu-se à solidão de seu quarto mais cedo naquele dia. As horas
passavam, mas a raiva não abrandava. Benedict Ainsworth era um sórdido por
acusá-la de infrações sempre que tinha oportunidade. O homem ignorava por
completo as próprias fraquezas.
Pouco tempo depois, enquanto tentava se concentrar em um bordado,
alguém bateu à porta. Seu coração disparou.
— Entre!
Maeve abriu a porta bem devagar. Raine ficou intrigada. A criada hesitou
por um instante e, então, adentrou o quarto, determinada.
Embora pressentisse que não ia gostar daquela suposta conversa, Raine
recebeu-a com um sorriso.
— Sim, Maeve?
— Acredito que deva saber de algo importante, milady — Maeve foi direta.
— Se Benedict a mandou aqui, não estou interessada em ouvi-la — Raine
retrucou, impaciente.
A mulher não escondeu o espanto.
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irmão, a despeito das ações pouco convencionais que tive em relação a Benedict,
deixa-me muito grata.
Maeve assentiu, ponderando acerca das palavras seguintes.
— Há muitos detalhes entre a senhora e lorde Benedict dos quais não
tenho o direito de falar. Todos em Brackenmoore são uma família. Lorde
Benedict sempre nos tratou com respeito. Meu mestre é um homem especial. Não
só criou os irmãos após a morte dos pais, como também cuidou do bem-estar dos
subalternos, e ninguém jamais traiu sua confiança.
Pensativa, ela fez uma pausa.
Raine a observava, calada e apreensiva.
— Ele certamente cuidará da senhora da mesma maneira. Embora esteja
absorvido em suas responsabilidades a maior parte do tempo, nunca lhe faltará
com o respeito.
Raine reconhecia o amor e o cuidado de Benedict para com a família e
apreciara tais qualidades desde que escutara a conversa com o rei. O que
ignorava na época era que ele não podia oferecer nada além disso. Brackenmoore
viria sempre em primeiro lugar. Raine não tinha a menor pretensão de se tornar
mais uma das obrigações de Benedict. Queria apenas ser a esposa.
Infelizmente, na vida de Benedict não havia espaço para luxos como uma
esposa.
A fria indiferença era uma prova disso. Até a raiva seria mais aceitável. Se
Benedict sentisse o mais ínfimo afeto por ela, o teria demonstrado em algum
momento. O modo como a tratara nas últimas semanas indicava somente honra e
dever de marido.
Raine sentiu uma estranha sensação de vazio. Se a situação fosse
diferente... Reprimiu o pensamento. Não exigiria nada mais de Benedict.
A lembrança da união de ambos sob a chuva, o selvagem abandono, veio a
sua mente. Corou até a raiz dos cabelos. Talvez tivesse distorcido o significado
daquela experiência, talvez Benedict não a desejasse e não soubesse o que dizer
diante da súbita mudança de Raine. Não podia mais fingir o contrário.
Suas faces ficaram ainda mais coradas. Benedict não a tocara, tampouco
dera sinais de que havia apreciado o interlúdio na floresta.
Ainda perdida em devaneios, fitou o rosto ansioso de Maeve. Sabendo
quanto aquela mulher era fiel ao carinho que sentia por Benedict, Raine não ousou
revelar os pensamentos que a afligiam.
— Obrigada pela consideração, Maeve, e pelo incentivo. — Raine sorriu. —
Vou pensar a respeito de tudo que me disse.
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diante do marido.
— Você me quer — disse, sem pensar. — Por que agiu como se fazer amor
comigo naquela floresta o enojasse?
Aparvalhado, Benedict sacudiu a cabeça, negando.
— Nojo? Garanto a você que jamais me senti enojado.
Além do súbito arrepio, ela percebeu também uma onda de prazer pela
gratificação emocional que sentiu e pela sensualidade que viu estampada naquela
reação.
Benedict continuava a fitá-la, enquanto seus olhos tornavam-se mais
escuros. De repente, Raíne descobriu que a paixão sempre estivera entre ambos,
mesmo nos momentos de raiva, irritação e indiferença. Por algum motivo, a
emoção era camuflada, mas nunca suprimida.
— Raine?
Ela tocou-lhe os lábios.
— Não vamos falar mais nada.
Seu marido fora até ela para pedir um sincero perdão. Por enquanto, isso
era o suficiente.
— Tem certeza?
— Tenho. — Raine não queria pensar nos problemas que os afastavam,
desejava apenas fugir da solidão e carência. E o alívio só podia acontecer nos
braços de Benedict.
Estava disposta a aceitar somente uma noite de amor. Um remorso
momentâneo tocou-lhe o coração. Logo sentiu o toque gentil de Benedict.
Raíne ficou surpresa ao ver que as mãos másculas tremiam. A noção de que
aquele momento único o afetava deixou-a sôfrega.
Ela segurou-lhe a mão e, levantando-a, beijou-lhe a palma calejada.
— Raine...
O som sussurrado de seu nome foi tal qual uma carícia sobre a pele,
fazendo-a arrepiar-se.
Fitou-o nos olhos, sem esconder nenhuma emoção e sabendo que o fato de
ele sempre tê-la desejado a deixava vulnerável.
— Benedict.
Como conseguiria encontrar palavras para definir aquela mudança
repentina? Benedict só sabia que a ideia de manter-se longe dela agora lhe
parecia loucura. Com certeza, havia exagerado o que acontecera na floresta. O
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amor selvagem e passional que haviam partilhado, fora o fruto daquele lugar
mágico, e a chuva molhando a nudez de ambos incrementara as sensações.
Em seu domínio, não existiam motivos para acreditar que a entrega
ocorreria de novo. Raine era somente uma mulher e o desejo de gerar um
herdeiro não desaparecera por causa da romântica experiência que tivera aquele
dia.
A fraqueza das reações reforçava a determinação de superá-la, de render-
se ao desejo arrebatador de fazer amor com sua esposa. Ela estava tão linda, tão
sensual. Absorvido por aqueles olhos dourados, dava-se conta de quão tolo havia
sido.
Devagar, roçou os lábios rosados, experimentando o momento. Sentiu certa
tontura ao notar que ela o queria para si. Explorou a boca macia, provando a
doçura de Raine, sua mulher.
— Pensei que não me quisesse — ela murmurou.
A culpa o invadiu, de repente. Benedict acariciou a face delicada, enquanto
ainda beijava os lábios rubros.
— Eu a quero, Raine. Sempre a desejei. Mostrarei quanto a desejo através
do prazer que vou lhe dar.
As palavras a fizeram estremecer. Benedict começou a beijar-lhe as
curvas do pescoço. Ela se inclinou para trás, trêmula de paixão, permitindo acesso
ao colo alvo.
Ele envolveu a fina cintura, redescobrindo as sinuosas linhas de sua Raine,
sua esposa. Desde o começo, vira-se atraído por ela e vivera a necessidade
urgente de possuí-la. Com outras mulheres, existira apenas a satisfação física.
O fato de que Raine parecia incapaz de lutar contra o desejo, a despeito
do rancor, rompeu as precárias defesas que Benedict havia construído nas
últimas semanas.
A ansiedade crescia dentro dele. Poderia tocá-la e acariciá-la como
quisesse, pois Raine o receberia. E era exatamente isso que pretendia fazer.
Intensificou as carícias, moldando-se às curvas perfeitas do corpo
feminino. Para sua gratificação, Raine colou-se a ele, beijando-o com a mais
absoluta sensualidade.
Dedos gentis afagavam-lhe os cabelos e, inebriado, Benedict aprofundou o
beijo como resposta ao gesto afetivo. Raine suspirou quando ele começou a
acariciar a região entre os seios.
A força máscula daquele corpo parecia enfeitiçá-la. A pulsação aumentava,
e sensações lancinantes a percorriam, como sempre acontecia quando ele a
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tocava.
Aflito, Benedict tentou erguer a saia do vestido. Não conseguia tolerar
aquela barreira entre ele e Raine. Ela o ajudou e, em pouco tempo, a veste
esverdeada tombou no chão, tal qual uma piscina natural.
Sob a luminosidade das velas, reparou que o tecido não era mais barreira
para seu olhar famélico. Fascinado pela beleza, traçou a adorável saliência dos
seios, sentindo o toque suave sobre a palma da mão.
Observou, completamente extasiado, os mamilos tornarem-se rijos.
Respirou fundo, tentando abrandar a pulsação enquanto retirava a última
peça de roupa. A repentina visão da nudez, embora conhecida, prometia uma
fantástica aventura.
Afagou os mamilos ainda túrgidos e, ao escutar um gemido fraco, fitou-a
nos olhos e viu o brilho inconfundível da paixão. Raine aproximou-se.
O corpo de Benedict tremia de expectativa. Tão logo o corpo feminino
colou-se a ele, sentiu uma profunda frustração por ainda estar vestido. Precisava
relembrar a sensação de roçar naquela pele quente.
Recuou e despiu-se, depressa. A paixão crescia cada vez que sentia as
mãos delicadas ajudando-o a se livrar das roupas.
Quando as peças caíram no chão, ele tentou abraçá-la novamente.
Raine afastou-se, por um breve momento.
— Você é maravilhoso, Benedict, como nenhum homem tem o direito de ser.
Era uma grande verdade. Ela examinou os músculos bem torneados das
pernas e o tórax avantajado. O homem exalava um poder viril. Mas foi a imagem
do desejo explícito que a encantou.
— Tão lindo.
Uma emoção que não pôde nomear invadiu-lhe os sentidos, aquecendo-o,
perturbando-o. Jamais imaginara que o corpo de guerreiro pudesse ser
considerado lindo. Raine incitava sensações que ele não conhecia.
A experiência foi tão intensa que chegou a assustá-lo. Percebeu-se repleto
de ternura e carinho. Sem se ater aos novos sentimentos, puxou-a para si e
mergulhou o rosto nos cabelos vermelhos. A lembrança de como era sentir os
cachos sedosos o forçou a tirar o arco que os prendia.
Raine notou que Benedict havia soltado seus cabelos somente no momento
em que eles tombaram sobre ela. Sentiu o coração bater mais forte. O gesto
simples parecia conter intimidade, cumplicidade.
Era como se ele lhe dissesse que o próximo passo representava algo muito
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maior que a mera união de corpos. Tratava-se de um encontro mágico, bem mais
profundo que o prazer que haviam partilhado antes.
Algum lugar de sua alma pareceu suavizar-se. Raine pertencia a Benedict,
sempre seria apenas dele. Na verdade, nunca deixara de desejá-lo.
Acariciou o peito másculo, sem tirar o foco dos olhos azuis, que a
admiravam com paixão.
— Benedict... — sussurrou, segurando-o pelas mãos. Lentamente, guiou-o
em direção à cama, o leito solitário onde passara noites insones, sonhando com
ele até adormecer de cansaço.
Quando chegaram à beirada da cama, Benedict beijou-lhe os lábios para,
em seguida, traçar as linhas do pescoço e atingir as curvas dos seios. Raine
gemeu e agarrou-se aos ombros largos, incapaz de se sustentar sobre as pernas
trêmulas.
Benedict percebeu a súbita fraqueza e acomodou-a sobre o leito
aconchegante. Fitou os delicados pés e recordou a sensação de vê-los na primeira
noite em Brackenmoore.
Com extremo respeito, deslizou as mãos sobre as pernas esguias e sentiu-a
estremecer quando beijou a ponta dos pés, rendido ao encanto daquela mulher.
— Benedict...
Então começou a provar cada um dos pequenos dedos, com absoluta
languidez. Algo dentro dele se insinuou, como se não apenas o desejo físico o
estimulasse e fizesse o sangue ferver nas veias.
— Venha até mim — Raine implorou.
Não havia meios de resistir a ela ou à própria necessidade. Quando o
puxou, as pernas perfeitas se abriram para recebê-lo com paixão. Benedict
fechou os olhos e penetrou no delicioso calor daquele corpo.
Raine gritou de prazer ao senti-lo dentro de si. Acompanhou o ritmo,
derretendo-se ante a paixão e sabendo que ele os levaria ao êxtase.
A incomparável sensação explodiu, aumentando de intensidade. Raine se
fundiu ao marido, ciente de que nunca mais seria uma pessoa só. O limite entre
ambos não existia. Estava presa, completamente absorvida por Benedict.
Onda após onda de prazer incitava a união natural. Quando enfim o clímax
a atingiu, sentiu-se dissolver em uma chuva de puro deleite, gritando o nome
daquele que também lhe pertencia.
Ao percebê-lo estremecer, Raine foi presenteada com a alegria de saber
que Benedict também atingira o patamar da perfeição. Abraçou-o com força para
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rejeitava.
Não queria nutrir carinho e afeto por uma mulher tão intempestiva. Em
silêncio, ele se levantou. A despeito da brisa quente que entrava pela janela
aberta, sentiu um tremor estranho. Rápido, recolheu as roupas e vestiu-as.
Quando terminou, viu Raine atenta à paisagem da janela. A postura tensa
do corpo não admitiria conversas.
Enquanto a observava, Benedict sentiu-se outra vez infeliz. Iam ter um
filho. Queria torná-la nos braços, beijá-la, mergulhar o rosto naqueles cabelos
rubros e chorar de alegria. Desejava provar novamente o júbilo total.
Queria perguntar a ela o que havia acontecido, por que o rejeitara de
repente, mas não podia. Não quando a dispensa surgira sem aviso ou motivo. A
menos que Raine pretendesse castigá-lo por tê-la magoado. Nesse caso, não
permitiria que usasse artimanhas vis contra ele.
Ela se fizera muito clara. Que assim fosse. Benedict respeitaria sua
vontade. Retirou-se do quarto, sem mais palavras.
CAPITULO XIII
Raine caminhava de um lado para o outro, inquieta. Não conseguia dormir,
permanecer sentada ou ponderar. A irrefutável verdade de que estava
apaixonada por Benedict tumultuava-lhe a razão.
O fato era devastador. Não esquecia a obstinação de Benedict em cultuar
o papel de defensor absoluto de todos que habitavam Brackenmoore.
Cada detalhe doloroso da última conversa surgia-lhe à mente, somado à
certeza de Maeve de que Benedict cuidaria dela, tal qual fazia com todos a sua
volta. Não queria a proteção do marido.
Desejava ser amada com a mesma intensidade que o amava.
Oh, se ao menos o que ele lhe oferecia fosse o suficiente... Se não
alimentasse a esperança de que um dia Benedict retribuiria seu amor...
Raine queria que ele a amasse e não aceitaria nada aquém disso. Como se
conformar-se com pouco depois de entregar-se tão completamente?
Raine passou as mãos nos cabelos já despenteados. O pesado silêncio do
castelo parecia sufocá-la. Não conseguiria dormir outra noite por causa daquele
estado de agitação. Precisava de algo para ocupar a mente. De repente, uma idéia
lhe surgiu. A biblioteca. Nunca havia visto tantos livros em um único lugar.
Sem pensar, pegou um candelabro e precipitou-se à porta, mas hesitou.
A biblioteca era o santuário de Benedict. Ele se sentia muito à vontade
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mandado embora após lhe contar que estava grávida. Tampouco desejava ater-se
à estranha sensação em seu peito cada vez que pensava no profundo afeto que
sentira ao fazer amor com ela.
Não, enquanto não solucionasse o problema de Harcourt, não poderia
descansar. Ninguém deveria ter conhecimento das ameaças do homem. Benedict
revelara o conflito apenas ao assistente, que fora encarregado de receber e
enviar as mensagens.
Não queria que ninguém soubesse para que o fato não chegasse aos ouvidos
de Tristan.
A medida que se aproximava da biblioteca e percebia a fraca luminosidade
no interior da sala, Benedict diminuía o passo. Ao divisar sua esposa debruçada
sobre a carta que o impedira de dormir, sentiu uma pontada no coração.
Raine, que não gostava dele e nem se importava com o que acontecia em
Brackenmooré, era a última pessoa com a qual queria discutir o problema. Porém,
ao escutar o suspiro profundo, Benedict ficou tocado e também suspirou.
Sobressaltada, Raine olhou para cima e o viu. Levou a mão aos lábios, fitou
a carta e voltou a encará-lo.
— Perdoe minha intrusão. Não quis...
Como ele continuasse calado, Raine disse, arrogante:
— A carta estava sobre a mesa e... Você não devia deixá-la aqui, à vista de
todos. — Empinou o nariz, como se Benedict fosse o culpado por ela ter lido o
documento.
Não estava preparado para aceitar tal argumento. Raine tinha ciência de
que havia invadido um espaço que não lhe dizia respeito. O susto inicial fora prova
suficiente disso, mas Benedict duvidava de que ela fosse admitir a culpa.
Aproximou-se da mesa, pegou o papel e começou a enrolá-lo.
— Não esperava que alguém bisbilhotasse minha correspondência pessoal.
— Não estava bisbilhotando — Raine retrucou, indignada. — Não me
rebaixaria a esse ponto. Vim procurar um livro para ler, se não for abuso de
minha parte.
A irritação de Benedict começou a ceder. Ela não viera à biblioteca para
espioná-lo. Suspirou, percebendo o erro que, mais uma vez, cometera.
— Desculpe-me, Raine, acredito em você. Como afirmou, eu não devia ter
deixado esta carta aqui. Qualquer um poderia lê-la. — Embora notasse a surpresa
nos olhos dourados, prosseguiu: — Peço-lhe que não comente o assunto com
ninguém.
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— Raine, eu... perdoe-me... não foi minha intenção. Oh, Deus, Raine, por
favor, perdoe-me pelo modo como a tratei. — Benedict passou a mão sobre o
rosto.
Atônita, ela não sabia o que dizer. Acreditara que Benedict fosse
indiferente a ela, mas a reação tão sofrida a fazia pensar que poderia haver
algum afeto nele.
— Peço-lhe desculpas. Não tinha noção do que eu estava fazendo.
O profundo remorso contido no tom de voz mostrava quão custosa era
aquela conversa. Devia haver algo muito sério acontecendo para Benedict para
ficar tão arrasado. Raine não acreditava ser ela o motivo. O suposto problema o
magoava ao extremo.
Pasma, ela se jogou na cadeira, pois sentia que as pernas não mais a
sustentavam. O tremendo choque apagou o rancor e a raiva que tanto queria
preservar.
— Por que me tratou assim, Benedict? — perguntou, com a voz fraca. — Eu
pensei...
— Não sei explicar. Só sei que nunca quis magoá-la. Jamais me dei conta de
quanto minhas ações poderiam ferí-la.
— Como não? Era só... — Raine se deteve ao perceber que a dor a obrigava
a esmorecer. Mas não pôde se controlar. — Eu me entreguei a você e pensei que
estivéssemos selando uma nova vida. Porém...
— Também pretendia recomeçar, mas tudo é tão... — O semblante tornou-
se duro. — Você não entenderia. Disse-lhe diversas vezes que não posso esquecer
quem sou e quais são minhas responsabilidades.
Raine não entendia mesmo. Não pedia que ele esquecesse tudo, sabia que
Brackenmoore era o mais importante. Queria apenas um pequeno lugar em seu
coração, um pouco de afeto. No entanto, ele a negava sem nem sequer ter cons-
ciência disso.
— O que quer de mim, Raine? — Benedict perguntou, de repente.
— Não quero que desista de sua posição. Aceito o que deve ser, por isso
eu o mandei embora. Não há lugar para mim em sua vida. Você almeja uma família,
um herdeiro, contudo não lhe sobra nada para dar em troca.
Irritada, ela apontou a carta que Benedict apertava entre os dedos.
— Creio que isto tenha sido causado por você. Sempre se coloca como
guardião de todos, mas não é sua responsabilidade, tampouco seu lugar. — Raine o
encarou. — Acha que Tristan vai lhe agradecer? Seu irmão é um homem. Um
homem que tem o direito de defender a si e à família. Está cometendo o mesmo
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Talvez ela o compreenda bem demais. Benedict escutou uma voz interior
clamar e perguntou-se de onde vinha tal alegação.
Do coração. Embora não quisesse escutar, aquela voz insistia em se
pronunciar.
Porque você a ama e tem medo desse amor. Mergulhou o rosto nas mãos,
sentindo o mundo desmoronar. Por mais que tentasse negar as palavras, elas
continuavam a surgir, verdadeiras.
Amava Raine. Tinha se apaixonado por ela desde o primeiro instante em que
a vira. Estivera convicto de que a única intenção era protegê-la por dezenas de
motivos. Enganara-se redondamente.
No momento em que aqueles olhos dourados encontraram os dele, Benedict
perdera-se na paixão. Ao conhecer a coragem e a dedicação de Raine por William,
o sentimento crescera ainda mais.
Ele e Raine eram idênticos, pensou, espantado. Agiam de acordo com o
senso de responsabilidade e amor ao próximo. No entanto, o modo como
realizavam tal devoção era diferente.
Mas, com certeza, não tinha medo de amá-la. Negara a emoção porque
ainda não havia descoberto a verdade.
O que o tinha impedido de descobrir o óbvio?
Gemendo, recostou-se na cadeira. Daria tudo para voltar a sentir a antiga
certeza e o bem-estar. Porém, sabia que nunca mais seria o mesmo.
Um ruído à porta encheu-o de esperança. Benedict ergueu o rosto e não
encontrou Raine. Era Kendran. Suspirou ao divisar a expressão de censura no
semblante do irmão,
— Eu chegava da... Não importa. — Kendran aproximou-se. — Por acaso,
escutei o que disse a Raine. Ela está certa. Não pode negligenciar sua esposa em
nome do dever. Na realidade, Benedict, nem todas as obrigações em Bracken-
moore lhe dizem respeito. Se há algum conflito que envolve Tristan, ele não vai
gostar de saber que não foi informado.
Benedict tinha certeza de que o irmão caçula havia exercitado seu charme
irresistível com alguma serva.
— Por onde andou, Kendran?
— Não é nobre de minha parte revelar isso. Vamos nos manter no assunto
em questão, por favor.
Fitando aqueles olhos, que muitos alegavam ser semelhantes aos dele,
Benedict resolveu esquecer as peripécias do irmão.
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Encontrava algum conforto naquele pequeno ser, mas, por mais que amasse a
criança, o sentimento materno nunca substituiria a dor de não ser amada pelo
marido.
Prosseguiu a caminhada, alheia aos arredores até perceber que o mar havia
avançado sobre a areia. A praia ficou tão estreita que ela precisou escalar as
pedras para não caminhar na água.
Insegura, resolveu voltar ao castelo. Após atravessar duas rochas
enormes, sentiu um tecido grosso envolver-lhe a cabeça e os ombros. Gritou ao
ser agarrada pela cintura e pressionada contra um tórax musculoso.
O captor era muito mais forte que ela. Raine se debatia em vão. Seus
esforços foram frustrados quando um segundo homem a segurou pelos pés.
Enquanto era erguida, Raine parou de lutar, preocupada com o bebê em seu
ventre. Mesmo que conseguisse escapar, a fuga implicaria em uma queda brusca
que poderia prejudicar a criança.
Momentos depois, percebeu que estava sendo colocada em cima de uma
sela. Um dos captores montou atrás dela, mantendo-a presa.
Tentou respirar, pensar no que poderia estar acontecendo... Por que alguém
a raptaria? A resposta surgiu como um raio.
— Denley! — gritou. Apesar de o grosso tecido abafar a voz, sabia que a
tinham escutado.
Não houve réplica. O imbecil não queria discutir o assunto com ela. Claro,
precisava afastá-la da proteção de Benedict o mais rápido possível.
Raine ficou furiosa, mas sentiu certo alívio por ser o primo insano que a
sequestrava. Denley não desejava o bem, mas seria incapaz de cometer alguma
violência física contra ela. O melhor seria aguardar uma oportunidade de fuga
quando chegasse a hora de enfrentar Denley Trent.
CAPÍTULO XIV
A cavalgada fora árdua e desconfortável, mas não tão longa quanto Raine
antecipara. Havia imaginado que Denley preferiria estar horas, talvez dias, longe
do alcance ameaçador de Benedict.
Enquanto os raptores a tiravam do cavalo, Raine preparava-se para
enfrentar o primo. Apesar da raiva, estava determinada a argumentar, fazê-lo
ver a estupidez que cometia. Sabia quão obstinado ele podia ser e queria conven-
cê-lo a libertá-la antes de causar um dano ainda maior.
Seria capaz de dissuadi-lo a qualquer custo. Na verdade, nunca pensara que
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principalmente, a ele.
Poderia Kendran estar certo? Raine sentia algo por ele? Benedict tinha
medo de se iludir, acreditando que ela o amava. Porém, qualquer sentimento nobre
havia sido estraçalhado pela fúria brutal de Benedict.
Esmurrou a parede com o punho fechado e esfregou a mão arranhada pelo
impacto violento. Não ganharia nada socando paredes ou conjeturando hipóteses.
Precisava falar com Raine, implorar seu perdão, se fosse necessário, e mostrar
que estava disposto a ser um marido, valorizando o amor por ela e pelos filhos
que teriam no futuro.
Raine o aceitaria? Benedict fitou a infinidade de livros da biblioteca. Não
encontraria nenhuma resposta naqueles volumes.
Só conseguiria obter a resposta a sua súplica dentro de si mesmo. Era o
medo de ser rejeitado que o impedia de procurá-la. Benedict endireitou os
ombros. Podia ser autoritário, teimoso, mas nunca um covarde.
E o orgulho de nada serviria para confortá-lo nos tenebrosos invernos que
o aguardavam pela frente.
Com a alma renovada, Benedict saiu da biblioteca. Resolveria seu futuro,
preferia qualquer coisa à agonia da indecisão. Quando entrou no quarto de Raine
não a encontrou e no mesmo instante, sentiu-se desanimar. A frágil esperança de
que ainda nutria algum tipo de carinho por ele dissipou-se.
Chamou Maeve. Aquela boa mulher parecia prever a intenção de Benedict
no momento em que entrou no aposento. A expressão mostrava puro
contentamento.
— Tem alguma idéia de onde esteja minha esposa?
— Sim, milorde. Eu a vi passar pelo saguão. Ela usava um casaco, portanto,
acredito que tenha ido passear.
Benedict dispensou-a, sem se dar ao trabalho de responder à explícita
curiosidade de Maeve. Dirigiu-se ao estábulo e selou o garanhão. Queria
conversar com Raine antes de discutir o assunto com outra pessoa, tratava-se do
casamento de ambos e deveriam resolver os conflitos juntos.
Após percorrer os arredores da propriedade e a praia, Benedict começou a
ficar preocupado. Voltou ao castelo e vasculhou a fortaleza de ponta à ponta.
Aflito, inquiriu Aida que, entre lágrimas e soluços, balbuciou algumas
palavras incoerentes. Tentando parecer calmo diante dela, Benedict descobriu
que todos os pertences de Raine continuavam no cômodo. Nenhum item estava
faltando, exceto as roupas que ela vestira naquela manhã.
Uma certa suspeita cresceu na mente de Benedict e o atormentou, por
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Sem vacilar, Benedíct deu as costas para o assistente. Pela primeira vez,
Brackenmoore não era prioridade em sua vida. Só conseguia pensar em montar no
cavalo e procurar sua esposa e seu filho.
Quando alguns homens e William entraram no estábulo e começaram a
selar os cavalos, ele se deu conta de que o assistente ou Maeve os havia
advertido a acompanhar Benedict. Não tentou impedi-los nem os ajudou, e, ao
atravessar os portões do castelo, ficou satisfeito por vê-los logo atrás.
A jornada até a residência de Trent foi banhada de raiva e impaciência.
Benedict ficou grato por ter a companhia dos homens de William, eles conheciam
a rota mais curta e estavam dispostos a lutar para resgatar Raine.
Não havia meios de esconder a agonia estampada em seu rosto. Benedict
não mais conseguia ocultar ou disfarçar os sentimentos. Raine significava muito
mais que honra ou posição como senhor feudal. Nada importava, somente a
necessidade de encontrá-la.
Chegaram a uma casa de madeira, sob a escuridão que precedia o
alvorecer. Benedict apeou antes que o animal parasse. Marchou até a porta e
esmurrou-a.
— Trent!
Após um tempo, a porta se abriu, e um criado, ainda sonolento, piscou
alguma vezes a fim de se ajustar à escuridão. Ao erguer a lamparina que tinha à
mão e divisar Benedict acompanhado de vários homens, o pobre arregalou os
olhos.
Apavorado, ele recuou e tentou fechar a porta. Benedict empurrou-o e
entrou.
— Exijo ver seu mestre agora.
— Mas...
— Chame-o! Ou farei meus homens incendiarem esse casebre. O criado
correu em direção a uma cortina, localizada nos fundos da sala. Momentos depois,
Benedict escutou Denley gritar:
— Diga-lhe que me recuso a recebê-lo.
Benedict precipitou-se até a cortina. Ao puxá-la, divisou uma cama. Trent
encontrava-se sentado no leito, fitando o criado. Uma mulher atrás dele
arregalava os olhos. Os cabelos em desalinho e a suposta nudez revelavam a
condição de amante,
O medo evidente da mulher fez Benedict hesitar. Ele não queria
aterrorizar ninguém, a não ser o homem que raptara Raine.
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O fato de Benedict ter pedido a ajuda do rei era verdadeiro, logo, não
valia a pena contradízê-lo. Porém, o homem não entendia que o objetivo era
apenas proteger a família, e não usá-lo de forma vil. Benedict dissera também
que Maxim Harcourt fora o único responsável pelo conflito que criou com Tristan,
e Raine acreditava no marido. Afinal, ele provara ser honesto em relação aos
próprios erros.
— Seu marido vai sofrer com a perda da esposa como eu sofri por causa de
meu irmão — Alister prosseguiu.
A noção de que Benedict sentiria falta da esposa era absurda, mas Raine
não revelaria tal detalhe a Alister Harcourt. Seu desaparecimento e, por
consequência, do bebê, o perturbaria ao extremo, já que a criança significava
muito para ele.
Embora Benedict não a amasse, a perda do bebê o deixaria arrasado, e
isso, ela não poderia suportar.
De alguma maneira, tinha de sobreviver.
Estudando aquele homem deformado, pensou no tormento que o infeliz
vivia. Ele devia amar o irmão. Raine sentiu a compaixão invadi-la.
— Acredite-me, milorde, sinto muito a perda que sofreu. Também perdi
meu pai recentemente e sei quão doloroso é saber que nunca mais o encontrarei
ou ouvirei o som de sua voz, sua risada, ou sentirei o carinho de um abraço. É
terrível aceitar que ele se foi para sempre.
Alister ficou calado por um longo tempo.
— Acha que meu sofrimento assemelha-se a essa pieguice? Eu não iria tão
longe só porque sinto falta dele. — Alister aproximou-se, e Raine recuou. — Não
tenho nenhuma saudade dele, lady Ainsworth.
Durante alguns instantes, Raine não soube o que dizer. Meras palavras
pareciam insignificantes perto do desespero que ela via naqueles olhos. Alister
virou-se e caminhou em direção à porta.
— Trevor! — ele gritou.
O sofrimento atroz do pobre homem reverberou na alma de Raine. Por
impulso, aproximou-se dele e passou o braço ao redor dos ombros largos.
Alister esquivou-se, assustado. No momento seguinte, a porta se abriu, e
ele desapareceu, mas não antes de Raine reparar no comovente brilho dos olhos
esverdeados.
Com o coração repleto de pesar, ela permaneceu fitando a porta fechada
Aquele brilho desejoso no olhar não tinha nada a ver com necessidades
masculinas. Era algo mais profundo e talvez mais aterrorizante para um homem
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disposto à vingança.
Podia haver um meio de ajudá-lo a perceber que Benedict não pretendia
feri-lo. Benedict zelava por muitos: ela, William, Brackenmoore, Genevieve e os
irmãos. Jamais tiraria vantagem de um homem deformado como aquele.
Poderia Alister Harcourt acreditar nisso? Do contrário, o que aconteceria
a ela e ao bebê? Em um gesto protetor, tocou o ventre. A situação de risco a
fazia reconhecer quanto já amava aquela criança e a desejava com cada fíbra de
seu ser.
Mesmo se Benedict nunca viesse a amá-la, o amor que Raine tinha por ele
garantia que o bebê fora concebido com paixão e afeto.
A criança tinha de sobreviver, era a prova cabal de que ela e Benedict
haviam produzido algo juntos.
E existia ainda outro detalhe que lhe dava esperanças. Alister Harcourt
não decidira o que fazer com ela. Talvez, se o homem adiasse o plano de vingança,
Raine conseguisse fugir. A possibilidade era remota, claro, mas precisava agar-
rar-se a algo para não sucumbir.
Não ousava acreditar que Benedict viesse resgatá-la. Afinal, ele não tinha
a menor noção de onde encontrá-la.
Benedict cavalgou durante a madrugada, tomado pela dor e confusão. Não
sabia o que fazer, estava perdido. A única determinação que o motivava era
encontrar Raine, trazê-la de volta e implorar perdão por todo mal que lhe
causara. Recusava-se a desistir em nome de proteger seu coração já
despedaçado.
No início da manhã, quando avistou o castelo de Brackenmoore, Benedict
não sentiu alegria ou alívio. Parecia anestesiado, morto por dentro, como se nada
mais importasse. Mesmo quando seus pais faleceram, ainda possuía os irmãos para
ajudá-lo a viver e suportar a dor.
Tal qual Raine dissera, agora eles eram homens capazes de cuidar das
próprias vidas. Não precisavam de Benedict. E as duas pessoas que mais
necessitavam dele, Raine e o bebê, haviam partido, deixando um profundo vazio
que nunca seria preenchido.
Sobretudo, era Benedict quem mais precisava deles, e não tinha idéia de
onde começar a procurá-los.
Tão logo adentrou o castelo, seu irmão e o pálido William correram para
recebê-lo. Kendran entregou-lhe um manuscrito.
— A mensagem chegou poucas horas depois de o assistente mandar me
chamar. Como escutei a briga entre você e Raine e descobri o problema com
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disso, não tinha pena ou medo de mim, mas me tratava com desprezo e preferia
esmurrar meu ombros a abraçá-los. Exceto por ele e por você, ninguém jamais
teve coragem de encostar em mim.
Raine mal sabia o que dizer a um homem que não conhecia a experiência de
ser acarinhado.
— Não tenho medo de tocá-lo, milorde, e sei que outras pessoas também
não.
— Acha que vou libertá-la por causa disso?
— De forma alguma, milorde. Mas, se ao mostrar um pouco de compaixão
humana eu ganhasse minha liberdade, não hesitaria em fazê-lo de novo.
Alister pareceu aturdido por um instante. Logo depois, o semblante
tornou-se austero.
— E quer que eu acredite que não usou essa artimanha?
— Acredite no que desejar. Não pretendo convencê-lo de nada, só quero
voltar para meu marido. — Raine escutou o tom de súplica contido na própria voz,
mas não se importou. Amava Benedict e não esconderia o sentimento.
De repente, alguém bateu à porta e gritou:
— Milorde, um cavaleiro se aproxima.
Um brilho de incerteza surgiu nos olhos de Harcourt, antes de escondê-lo
sob a máscara de raiva.
— Enfim, Ainsworth aceitou meu desafio.
O coração de Raine disparou. Alister Harcourt enviara uma mensagem a
Benedict!
Ele a agarrou pelo braço e puxou-a.
— Abra a porta, Trevor!
Enquanto Harcourt a conduzia pela escadaria, Raine não tentou resistir.
Sabia quem era o misterioso cavaleiro. Somente aquele homem atarracado a
impedia de precipitar-se escada abaixo e cair nos braços de seu marido.
Alister Harcourt não tinha nenhuma chance de vencer Benedict em um
combate de armas.
De súbito, Raine resolveu tentar impedir a morte de Harcourt. Cometera
um grave erro ao raptá-la, mas o pobre infeliz já havia sofrido demais. Não podia
deixá-lo morrer por causa dela.
Mas não sabia como coibir o que estava prestes a acontecer. Harcourt
lançara o desafio, e Benedict o aceitara.
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Sem a raiva, o que lhe restou foi apenas remorso de ter sido tão tolo e uma
inegável admiração pela esposa. Observou Raine pousar a mão sobre o ombro de
Harcourt. Quando o homem ergueu o rosto, deixou escapar um soluço.
De tão unida a ele, Raine pôde sentir a mudança de humor em Benedict. E
amou-o ainda mais por vê-lo mostrar compaixão.
— Peça perdão por seus erros, milorde — sugeriu ela a Alister Harcourt —,
e aceite minha amizade como um pequeno presente para selarmos o fim desta
vingança.
— Aceito sua bondade porque é sincera. Mas para que me oferecer sua
amizade?
— Porque é um homem que precisa de amigos, creio. — Raine indicou
Benedict, que apontava a espada para o solo.
— Meu marido acolhe aqueles que necessitam de cuidados, e o faz sem
segundas intenções. Ele me acolheu quando mais precisei, embora eu tenha
demorado a perceber o valor de suas ações. A compaixão é uma entre tantas
qualidades que Benedict possui. Gostaria de ser como ele neste aspecto.
Raine fitou Benedict, ciente de que revelava tudo que tentara esconder
até então.
— Conheceu seu irmão, milorde — prosseguiu, dirigindo-se a Harcourt. —
Benedict jamais permitiria a morte de alguém, se soubesse como evitá-la. Ele irá
lhe perdoar, embora o senhor tenha raptado a mim e a seu filho que está por vir.
Ao ouvir a novidade, Alister ficou chocado.
— Benedict sabe que merece uma explicação acerca do que aconteceu —
Raine continuou. — Mas o esclarecimento deve vir de Tristan Ainsworth. Farei
questão, milorde, de lhe garantir tal justiça em nome de minha honra.
Ele hesitou por um longo instante e, então, largou a espada.
— Obrigada — Raine murmurou.
Com um grito de alegria, Raine se virou para Benedict. Antes que pudesse
dar dois passos, viu-se envolvida por aqueles maravilhosos braços fortes.
Respirou fundo, sentindo o alívio e a doçura do abraço tão terno. Ele a apertava
contra si, seu marido, o centro de seu mundo, de sua existência.
Após um delicioso momento, enquanto imaginava que ele jamais a soltaria,
Benedict afastou-se.
Ao fitar a expressão triste do marido, Raine se sentiu desolada.
— O que foi? Não está feliz?
— Estou feliz, radiante por encontrá-la ilesa, mas não mereço nenhum
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crédito.
— De que está falando, Benedict? Você salvou minha vida! — Raine
acariciou o ventre. — E a de nosso filho também. Ele levou as mãos ao rosto,
cobrindo as lágrimas que já surgiam.
— Eu quase perdi vocês dois por causa de minha teimosia. Se eu não fosse
tão autoritário, tão senhor de mim, nada disso teria acontecido. Achei que ia
perder a pessoa que mais amo só porque tenho essa obsessão ridícula de
proteger e cuidar daqueles que estão sob meu domínio.
Confusa, Raine não conseguia entender o que dizia.
— Amor. Está se referindo ao amor que sente pelo bebê? Benedict a fitou,
assentindo.
— Claro. Como não amar meu próprio filho? Mas é de você que estou
falando, Raine, minha amada esposa. A possibilidade de perdê-la quase me levou à
loucura.
O coração de Raine pareceu parar de bater.
— Você me ama? Ama mesmo, Benedict?
Os profundos olhos azuis focalizaram os dela.
— Amo, Raine. Eu a amo com todo meu coração e alma. Na verdade, você é
minha alma.
Onda após onda de alegria começou a invadi-la. Raine abriu os braços.
— Eu o amo, Benedict, e sempre vou amá-lo. Havia dor e felicidade no lindo
rosto de Benedict.
— Mas como pode me amar depois de eu ter...
— Chega, meu amor. — Raine tocou-lhe os lábios para silenciá-lo. — Vamos
apenas viver nossas vidas de agora em diante.
Carinhoso, Benedict beijou-lhe a ponta dos dedos e fechou os olhos.
— Também o amo — ela sussurrou, emocionada. Então, Benedict a tomou
nos braços. Raine fechou os olhos, sabendo que nunca mais se separaria dele.
Estava completamente subjugada ao amor que sentia pelo marido e felicidade
maior que esta jamais encontraria.
No entanto, quando ele a beijou, Raine se deu conta de que havia muito
maís a ser descoberto nos anos que viriam.
Algum tempo depois, ao lembrar-se de Alister Harcourt, notou que ele
havia sumido. Não se preocupou. A paz reinaria no coração de um homem tão
sofrido.
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