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Francesco Petrarca

De filho de um exilado aos poemas mais famosos da Bota

Francesco Petrarca, o poeta e


humanista italiano.

Nos séculos XIV, XV e XVI, Itália foi berço de um intenso e revolucionário movimento na
área das letras, filosofia, medicina, astronomia, artes, botânica, etc. O Renascimento, nome dado
a este movimento cultural, iniciou-se naquela região peninsular devido a diversos fatores
favoráveis tais como a conservação da cultura e arquitetura clássica (Grécia e Roma) que Itália
proporcionava. Nesta altura, Itália não era como a conhecemos hoje, um país único, eram várias
cidades estado com governo e leis próprias. Cidades como Florença, Nápoles, Veneza, Milão e
Turim. Nessas cidades haviam vários, banqueiros, comerciantes e pessoas com altos cargos
políticos na Cidade que queriam ter nas suas casas e nas suas cidades peças de arte
extraordinárias e únicas. Esta rivalidade fazia os homens ricos e com poder comprar mais peças,
o que fazia com que os artistas trabalhassem mais devido aos patrocínios. Alguns desses artistas
como Michel Angelo e Leonardo da Vinci eram também Humanistas.
Os Humanistas eram as pessoas que acreditavam e defendiam o Humanismo. Durante a época
feudal e Idade Média, o Clero fazia com que os nobres, o povo e até o rei acreditassem que
Deus estava acima de tudo e que era ele quem comandava e tinha poder sobre tudo e todos. Na
época renascentista, os Humanistas defendiam que Deus não era o centro do universo, mas sim
o Homem, o Antropocentrismo. Estes homens cultos criaram esta teoria e ideia a partir de
livros antigos escritos por filósofos gregos e romanos que á séculos atrás tinham refletido e
debruçado-se sobre estes mesmos problemas. Por outro lado, desenvolveram a ideia de que cada
um era único e tinha as suas próprias potencialidades, o Individualismo. Os responsáveis por
estas ideias estavam determinados em criar uma nova imagem do Homem, um ser confiante em
si mesmo, com espírito crítico e argumentativo, com gosto pela descoberta, com vontade de
saber mais (Enciclopedismo), com importante vida social e em sociedade, com exercício físico
como parte fundamental do seu bem-estar e gosto pelas artes. O Humanismo, também se fez
sentir na literatura com alguns escritores:

- Nicolau Maquiavel: autor de O Príncipe, fala sobre o poder na vida do Homem


- Erasmo de Roterdão: autor de O Elogio da Loucura, questiona a forma como o Homem elogia
ações bárbaras e ridículas como a Inquisição e as pregações da Igreja Católica
- Thomas Moore: autor de A Utopia, neste livro descreve o mundo perfeito, com o homem com
autoconhecimento.
-William Shakespeare: autor de várias peças de teatro com os sentimentos do ser humano como
tema principal.
O Homem também se interessou pelo Naturalismo, o gosto pela Natureza, através das novas
descobertas do meio que nos rodeia. Os estudiosos seguiam um método intitulado Método
Científico. Observavam algo, colocavam uma questão, faziam experiências em busca de uma
explicação plausível e iam colocando hipóteses. Se havia várias hipóteses iam fazendo
experiências para as eliminar e no fim a que sobrasse era aceite como verdadeira. O
Naturalismo também se fez sentir em várias áreas:

- Na Geografia e Ciências da Natureza – os Descobrimentos vieram mostrar ao mundo novas


terras, plantas e seres até aí desconhecidas, o estudo delas possibilitou confirmar várias teorias e
refutar algumas. Duarte Pacheco Pereira notabilizou-se na Geografia, já Garcia de Orta fez
importantes descobertas na Botânica.

- Na Astronomia – Durante toda a Idade Média a sociedade tomava a teoria de Cláudio


Ptolomeu como certa. A Terra estava no centro de tudo (Teoria Geocêntrica). Mas, na época
renascentista, o Polaco Nicolau Copérnico criou uma teoria que dizia que não a Terra mas o Sol
estava no centro do Universo (Teoria Heliocêntrica). Posteriormente, Galileu Galilei,
descobridor das 4 luas de Júpiter e criador do telescópio, apoiou esta teoria.

- Medicina – André Vesálio, pela primeira vez na história, realizou estudos em cadáveres com o
objetivo de conhecer a anatomia do Ser Humano. Foi fortemente criticado mas não desistiu,
hoje é considerado um grande impulsionador da medicina.

- Matemática – Assim como Arquimedes, Tales de Mileto, Eratóstenes e Pitágoras na Grécia


Antiga, também no Renascimento, vários matemáticos criaram teoremas e estudaram a fundo
Álgebra e Geometria. Um português foi afamado por toda Europa, chamava-se Pedro Nunes.

O Renascentismo, conjunto que engloba todos os conceitos anteriores aqui falados, espalhou-se
por toda a Europa. Foi bem recebido na Flandres (na zona da atual Bélgica), Países Baixos,
França e Inglaterra, todavia, nestes locais adquiriu algumas características próprias. A expansão
das ideias possibilitou a comunicação entre Humanistas, que resultou numa maior multiplicação
das escolas e ação da imprensa, inventada por Gutenberg.

Porém houve um nome na Literatura e no Humanismo que se destacou. Um homem que nasceu
numa família humilde e partiu como um renomado poeta italiano. Agora conto a história de
Francesco Petrarca

As Origens de Petrarca e a Infância

No meio de todos estes movimentos, em Florença, um notário chamado Ser Petracco e Dante,
um escritor, são expulsos pelos Guelfos Negros, um dos partidos políticos que lutava pelo
controlo da cidade de Florença.
Ser Petracco refugia-se em Arezzo, onde conhece Eletta Canigiani,. A 20 de Julho de 1304
nasce Francesco Petrarca.
Decorridos 7 meses do nascimento, Francesco e os seus pais mudam-se para Ancisa, o local de
nascimento do seu pai. Em 1312, com o nascimento dos seu irmão de Gherardo, a situação
financeira agrava-se, o que leva Ser a mudar a sua família para a cidade de Avignon, no sul de
França.
Após 4 anos com um professor particular, começa os seus estudos numa Escola de Direito em
Montpellier.
Petrarca, na sua carreira académica, estudou direito devido à pressão colocada pelo pai, mas o
seu principal interesse era a Literatura Latina.
Em 1320, 4 anos passados na escola em Montpellier, Petrarca e o seu irmão Gherardo mudam-
se para Bolonha, em Itália onde Petrarca continua a frequentar Direito.
Infelizmente em abril de 1326 Ser Petracco falece por complicações associadas á idade. Com o
objetivo de ajudar a mãe enviuvada, regressa com o seu irmão para Avignon, lá exerce diversos
trabalhos burocráticos onde tem mais tempo para os seus poemas e obras literárias.
No dia 6 de abril de 1327, sexta-feira santa, durante uma celebração religiosa, Francesco
apaixona-se por uma jovem mulher chamada Laura, que até hoje não se tem registos exatos
sobre a sua aparência física e psicológica. Quando Petrarca, se declarou como pretendente à
mão de Laura, esta recusou. Francesco ficou profundamente abalado e grande parte das suas
obras são dedicadas ao amor não correspondido pela jovem francesa. Para nós Laura foi apenas
um amor não correspondido, mas posteriormente irá perceber-se que era um anjo na terra para
Petrarca. Francesco por esta altura já tinha alguma idade, e começou a pensar muito sobre o
caráter e a personalidade que o Homem pode ter.

A Carreira Religiosa e o tempo livre para a escrita

Depois de compreender os motivos e as razões pela qual o pai tinha sido expulso da cidade
capital das artes renascentistas, percebeu que o mundo embora tivesse homens justos e
humildes, também tinha arrogantes e egoístas. O facto anterior somado á amizade longa que
Petrarca tinha com um bispo da Casa Colonna, uma casa nobre italiana com ligações á Igreja
Católica, Petrarca entra num seminário e torna-se sacerdote. Embora ele tenha recebido a
tonsura, penteado típico dos frades e monges, é improvável que alguma vez tenha recebido
Ordens Menores da Igreja Católica.
No ano de 1330 tornou-se capelão do Cardeal Giovanni Colonna e por volta de 1335 recebeu
privilégios canónicos pelo mesmo cardeal. Em 1337, Petrarca comprou uma pequena e humilde
propriedade em Vaucluse, num vale perto de Avignon que desde a infância Petrarca sonhou em
ter uma propriedade, nas suas obras refere-se a ele como o “O Lugar mais aconchegante da
Terra”, expressão que usou durante o resto da sua vida sempre que se referia a ele. A região
montanhosa alpina veio tornar-se o local da maior parte das suas atividades, especialmente na
ligação que tinha com a Corte Papal situada em Avignon, corte esta que Petrarca passado pouco
tempo passou a detestar.
Nessa altura a sua principal preocupação para além do sacerdócio era a Literatura. Área esta em
que dois livros de Francesco se destacaram e foram considerados as duas maiores obras por
muitos anos:

-Africa: uma epopeia italiana que conta a História da Segunda Guerra Púnica. O General
Cartaginês (Cartago é a atual Tunes, Tunísia) Hannibal tentou invadir a península itálica por
Sicília, Publius Cornelius Scipio Africanus, comandante do exército romano saiu vitorioso
conseguindo expulsar os estrangeiros. Este poema é essencialmente escrito em Heroico
Quebrado, ou seja, seis sílabas métricas em cada verso. Para criar o comandante Romano,
inspirou-se em Laura como uma pessoa determinada e corajosa

- De Viris Illustribus (tradução de Sobre Homens Ilustres): uma coleção nunca acabada que
consistia em várias biografias. Consiste em dois livros:
* Liber I – 24 a 36 biografias sobre importantes figuras e heróis da civilização grega antiga e
sobre o Império Romano. O número de biografias presente neste livro varia de acordo com a
versão e edição.
* Liber II – são 12 biografias sobre figuras mitológicas e gregas. Esta obra é semelhante a
outras de profetas islâmicos e na Bíblia Hebraica.

Esta obra valeu a Petrarca dois convites para ser coroado Poeta Laureado, um cargo em que o
governo do país ou da região reconhece o escritor como poeta oficial, é esperado dele que
escreva obras para o Estado ou que os declame em cerimónias oficiais. Os dois convites vieram
exatamente do mesmo dia, mas de locais diferentes, da Universidade de Paris e do Senado
Romano, Francesco aceitou o do Senado e recusou o francês.

Este período também é apontado como uma espécie de continuação de poemas e obras italianas
mais antigas, como pequenos poemas e poemas pessoais sobre as emoções. Há evidências que
foi também neste tempo Petrarca começou a trabalhar numa comédia, Filologia, uma obra que
está neste momento perdida.

As viagens e as consequências das mesmas


Por volta de 1340 As atividades de Petrarca ligadas à Literatura, a sua presença e os laços com a
Corte Papal e as suas viagens, fizeram de Francesco um artista e escritor de renome por toda
Europa.
Entre 1342 e 1343, Petrarca estava em Vaucluse e recebeu mais dois privilégios canónicos
diretamente do Papa Clemente VI, papa este que ficou conhecido por ter canonizado Santo Ivo,
patrono dos advogados, juízes e todas as profissões ligadas á justiça. Também neste tempo
Francesco continuava a sua epopeia e as biografias assim como ficou pronto uma nova obra:

- Secretum: uma prosa latina que fala sobre um diálogo imaginário entre o autor e Santo
Agostinho á frente de uma Senhora da Verdade. O Santo acusa o outro de não respeitar Deus e
não dar o valor certo á mortalidade. Francesco admite a sua falta de piedade que acrescenta
dizendo que esta é a fonte da sua infelicidade, mas diz que é insuperável. Então, eles debatem
sobre uma acusação de Santo Agostinho em que dizia que Petrarca não tinha livre arbítrio e que
se apegava demais a coisas terrenas, como Laura e a sua poesia.

Começou a trabalhar também em algumas outras obras como Psalmi Poenitentiales, Rerum
memorandarum libri, que conta a história de um cardeal e as suas virtudes na forma de biografia
e com algumas anedotas.
O Triunfo do Amor e O Triunfo da Castidade são dois poemas didáticos dentro do livro Terza
Rima, e a primeira versão de Canzionere, aquela que se vem a tornar a obra mais famosa, era
chamada como a coleção lírica de Rerum Vulgarium Fragmenta. Estas obras também foram
começadas neste tempo.
No fim de 1343, Petrarca mudou-se para Parma, uma cidade medieval italiana, onde se
manteve até ao ínicio do ano de 1345. Nesta cidade ele continuou a trabalhar em duas obras:
Africa e Rerum memorandum libri. Estas nunca foram acabadas e provavelmente nunca mais
foram desenvolvidas.
Voltou para Vaucluse aproximadamente em 1345 depois de receber em Parma mais um
previlégio canónico pelo Papa, e perto de 1347 tornou-se um ativo apoiante de Cola di Rienzo,
um político, humanista e orador inigualável que foi eleito notário do papa.
Petrarca, durante a sua presença em Provença, viagem que realizou, escreveu oito das doze
obras mais notórias do autor chamadas Eclogues, aqui ficam duas:

- De Vita Solitaria: uma prosa filosófica em que Petrarca descreve e comenta grande parte do
dia a dia do seu amigo Phillipe de Cabassoles

- De Otio Religioso: outra prosa semelhante á anterior, fala da solidão mas principalmente do
clero, Petrarca aqui fala com alguma experiência própria dado que também ele era membro
desta classe social.

Começou ainda neste período a segunda versão de Canzionere.

O fascínio de Francesco por Cola di Rienzo, provavelmente foi o impulso para a viagem de
Petrarca a Itália em 1347. O seu desejo de se juntar à causa do Humanista acabou com as
notícias que corriam por fontes fiáveis de que o político era na verdade um tirano e que já tinha
realizado ações dessa natureza nos seus apoiantes. Assim, voltou a Parma onde comprou outra
casa. Em 1348, a Peste Negra, uma das principais crises do séculos XIV, matou de forma
dolorosa Laura e o amigo de Francesco, o Cardeal Colonna.
Em de 1350, um ano Jubilar, ou seja, um ano santo comemorado de 25 em 25 anos em que se
vende indulgências a alguns fieis que cumpram os requesitos estabelecidos pelo Vaticano para
receberem as mesmas, Petrarca estava a ir para Roma, nessa jornada, parou em Florença para
conhecer a cidade de onde o seu pai tinha sido expulso e aprender um pouco sobre a cultura da
região. Porém, nessa etapa do seu caminho, acabou por conhecer duas pessoas influentes na
época:

-Giovanni Boccaccio: Giovanni era filho de um mercador influente e respeitado na cidade de


Florença. Contrariando a vontade do seu pai, seguiu pelo caminho da literatura onde escreveu os
mais diversos poemas, com o foco no Homem, sendo portanto, considerado um humanista. Foi
o responsável por renomear “A Comédia” de Dante para “A Divina Comédia”, nome com que
foi conhecida para o resto dos tempos.

-Francesco Nelli: Francesco foi um sacerdote que exerceu a função de pároco responsável pela
Igreja dos Santos Apóstolos em Florença. Foi secretário do Bispo Angelo Acciaioli.

Estes dois tornaram-se nos amigos mais estimados de Petraca. Enquanto estava nessa viagem
escreveu mais 4 Eclogues, O Triunfo da Morte e começou Triunfo da Fama. Fez também várias
cartas em prosa que mais tarde foram publicadas e escreveu:

-Epistolae Metricae: uma coleção de 66 poemas em latim, cada verso com 6 sílabas métricas
(Heroico Quebrado). Esta obra foi inspirada numa coleção de cartas fictícias datadas em 20 a.c.
pelo poeta latino Horácio. Os poemas tentam passar simplicidade e mostrar que não é difícil
escrever servindo como incentivo á produção de literatura.

A Ascensão enquanto orador e as consequências

Entre 1351 e 1353, Petrarca esteve maioritariamente na sua propriedade em Vaucluse, França.
Este período teve especial destaque para o facto de Petrarca estar voltado para órgãos públicos,
como o governo e a Corte Papal onde teve mais uma vez, depois de se afastar, um papel
importante. Também escreveu nesta altura:
-Invectiva contra medicum: Este livro escrito em prosa, suspeita-se que seja uma vingança de
Petrarca contra um médico da Corte Papal de Clemente VI, que alegadamente insultou os poetas
dizendo que eram pessoas inúteis na vida sem função importante na sociedade. Nesta obra
Francesco critica os médicos e os seus métodos.

No ano de 1353, o arcebispo de Milão (Itália), Giovanni Visconti, um homem que para além de
sacerdote também foi um líder militar e co-governante de Milão responsável pela guerra travada
contra Florença, convidou Petrarca para se estabelecer em Milão. Em troca seria recompensado
com terras, dinheiro e poder. Apesar do Arcebispo lhe assegurar que ele teria liberdade e
independência total, os amigos de Francesco em Avignon e Florença repreendiam-no pois
achavam o sacerdote um assassino hipócrita que também contribuía para movimentos tiranos
como o de Cola di Rienzo. Porém Petrarca era altamente respeitado, notável e considerado pelos
governantes, comerciantes e todos os homens ricos de Milão, por o acharem uma pessoa
determinada, inteligente, astuta e que sabia raciocinar em prol das ideias próprias e dos outros
quando necessário. Dado isto mudou-se para a cidade onde foi um orador e emissário em
conferências por toda a Europa em nome da cidade de Milão. Foi também neste período que
terminou:

-Bucolicum carmen: Este foi o nome atribuído aos 12 Eclogues, vários poemas latinos num
livro maioritariamente sobre o ser humano.

- Liber Sine Nome: uma coleção de várias cartas recolhidas postumamente nas residências de
Petrarca em Vaucluse, Parma, Florença e Avignon. Foi publicada também depois da sua morte.

Neste tempo também começou:

-De remediis utriuisque fortunae: é uma coleção de 254 diálogos reais e fictícios. Os diálogos
expressam-se de forma clara e objetiva, mostrando ideias humanistas. Petrarca aborda temas
como o intelecto e a subtileza com que se tratam determinados assuntos recorrendo
especialmente a teorias e fontes da Idade Clássica.

-Itinerarium syriacum: como uma espécie de guia, esta obra conta todas as peripécias de um
individuo até chegar a Jerusalém, a Terra Santa. Conta a história do personagem e todas as
estradas e paisagens que traçou até chegar ao destino.

Na altura de 1361, Petrarca abandona Milão para escapar á Peste Negra, que, por aquela altura
estava a assolar todo o Vale do Pó, no norte de Itália. Nesse mesmo ano, sabendo que Petrarca
estava sem residência, a Família Carrara, uma família italiana que governou Pádua por
aclamação popular durante o século XIV, convidou-o a estabelecer-se em Pádua, convite que
Francesco aceitou. Foi durante este período que terminou:

-Familiarum rerum libri XXIV: uma coletânia de 350 cartas em latim.

E começou:

-Seniles: ou Epistolae familiares, é uma coleção de cartas enviadas por Petrarca para vários
destinatários. Esta obra foi inspirada nas Cartas de Cícero. Esta coleção está dividida em 17
livros.
A Estadia em Veneza e Árqua
No ano de 1362, Francesco continuou a sua saga de fuga á Peste. Desta vez refugiou-se em
Veneza onde o Senado lhe garantiu residência e proteção em troca de aumentar e patrocinar a
biblioteca e o ensino da literatura na cidade. Foi na cidade dos canais, que Petrarca durante 4
anos descreveu em cartas e alguns discursos que foram os anos mais felizes da sua vida, devido
a contactos e amigos que fez na cidade, a paz que sentia e corria pelos canais da região e pela
qualidade de vida elevada que lá existia.
Estes 4 anos foram abruptamente interrompidos por um grupo de jovens defensores do
Aristotelismo, um movimento filosófico que defendia as ideias de Aristóteles, isto é, a lógica
dedutiva. Estes jovens, em praça pública pregavam que Petrarca era um bom homem, mas que
não tinha fundamento para aquilo que dizia e escrevia. Isto fê-lo sair de Veneza e escrever um
livro sobre o assunto: De Sui ipsius et multorum ignorantia.
Durante o ano de 1367, mudou-se para Arquá, posteriormente chamada Arquá Petrarca, onde
comprou um solar nas Colinas Eugâneas. Foi aqui que passou os últimos e felizes anos da sua
vida. Enquanto Petrarca trabalhou infatigavelmente nas suas obras, estava também a estudar e a
tentar seguir bem como rever os valores da literatura greco-romana, seguindo alguns escritores
dessa época:

-Homero: Famoso pelas suas epopeias inspirou Petrarca na sua obra África
-Esopo: Famoso pelas suas fábulas, não inspirou Francesco pelo tipo de histórias, mas sim pelo
valor moral das suas obras
-Sófocles: Importante dramaturgo que ao lado de Ésquilo iniciaram o movimento de criticas
dirigidas geralmente aos governantes, a Tragédia.

Nos últimos sete anos de vida, Francesco acompanhou diversos senhores de casas importantes
italianas em oratórias e conferências sobre a importância da Paz. Infelizmente no dia 19 de
Julho de 1374, chega ao fim a vida de Francesco Petrarca, o homem que nasceu numa família
humilde de um exilado em Arezzo e se tornou num dos maiores humanistas e poetas que a
Península Itálica já viu. Nos últimos anos da sua vida redigiu a versão final de Canzionere e
acabou a coleção de Triunfos, da Castidade, da Morte, da Fama, do Tempo e da Eternidade. Mas
é indiscutível que deixou um legado enorme.

Os Pensamentos, as inspirações e as opiniões próprias de Petrarca

Petrarca, enquanto vivo, sentiu-se e descreveu-se no meio de duas eras, a Antiguidade Clássica
e a Era do Futuro. Uma atitude notória da parte de Petrarca foi o facto de ele se identificar como
um adepto do legado Platónico e Agostiniano, ou seja, quanto mais se pensa em determinado
assunto, mais condições e chances se tem para o realizar e que é impossível algo ser
completamente puro sem se basear nos princípios do Cristianismo. Acreditava que estas duas
ideias juntas poderiam restaurar o Império Romano mas desta vez como o centro da civilização
e referência do mundo. Porém ele também sentia que os valores católicos não eram 100% das
vezes a solução e por vezes tinha conflitos internos entre a sua aspiração e vontade e o que
estava certo de acordo com as ideias religiosas. Os Triunfos também serviram como uma
representação das características humanas que ele via em Laura. Já Africa, era considerada a
maior obra por Petrarca, porém, a obra mais delicada e detalhista de Petrarca era a coletânea de
poemas Canzionere.
Enquanto a sua fama como o grande poeta da altura corria por toda a Itália e Europa, o domínio
que Petrarca exercia sobre o Latim foi considerado uma arte pelos críticos culturais da altura
afirmando que era um dom com que mais nenhum homem teria tido em toda a eternidade. A sua
poesia lírica musical também alvo de performances pelos trovadores da zona da Provença,
mostrando assim que a sua obra tocava as pessoas com sentimentos fortes internacionalmente,
sendo integrado também no movimento de poesia romântica Dolce Stil Nuovo. O que as
palavras de Petrarca nalguns livros inseridos neste movimento, é a clara visão nobre que
Petrarca vem por culturas pagãs e religiosas sejam muçulmanas, hebraicas, budistas, cristãs, etc.
Chegou também á conclusão de que existiram várias pessoas que contribuíram para os
conhecimentos que se tinham na época, mas que não lhes era dado o devido valor, como
filósofos e matemáticos, mas que as suas descobertas de forma indireta, ou seja, influenciando
outras pessoas a debater sobre isso, fazia com que investigassem e pensassem, logo chegaram-se
a mais conclusões. Que depois de vários debates, descobertas e conclusões, chegámos ao
conhecimento de nós e do mundo que hoje nos temos. Petrarca apercebe-se também que o
conhecimento da atualidade é inteiramente devido a debates que houveram e que por cima
desses debates foram saindo conclusões que depois passando por esse ciclo de forma não
definida, chegam ás informações presentes no nosso dia a dia.
Conclui ainda, que esses ensinamentos e morais, são também a maior parte contra o
Cristianismo, que a explicação de alguns factos vai contra a tese da Igreja que prega que é Deus
quem controla o mundo, e aqui Petrarca fica dividido entre a sua fé, que tanto o ajudou durante
a sua vida, e as pesquisas e conclusões a que chegou com muito esforço e dedicação. Decide,
portanto, que Deus criou a terra, os mares, os animais, as plantas, Adão e Eva, etc, mas que após
a criação já não teve qualquer controlo sobre a sua obra divina.
A forma como Francesco escreveu os seus poemas, serviu de inspiração para a determinação de
escrever sobre os sentimentos humanos, que as pessoas não deviam ter medo em expressar-se
sobre os santos, anjos, arcanjos, Deus e todos os cargos do clero, mas que a criticar, protestar e
reclamar, seriam parte importante na decisão do rumo que a Humanidade deveria tomar.. Mas
também aprendeu e interiorizou a renúncia, a renúncia para não serem namorados, a renúncia
que muitas vezes lhe foi dada, por exemplo quando o pai o obrigou a frequentar direito.
Nos seus amigos, Giovanni Boccaccio e Francesco Nelli, viu a inteligência na terceira pessoa,
viu um espírito acolhedor, bondoso e argumentativo, qualidades que lhe foram uteis conhecer
nas suas viagens, palestras e discursos, o saber o que o inimigo pode saber fazer.

Petrarca também é considerado o aperfeiçoador e o difusor do soneto.


Deixo aqui um soneto:

“Das prensas dos martelos das bigornas


Das foices dos arados das charruas
Das alfaias dos cascos e das dornas
É que nasce a canção que anda nas ruas

Um povo não é livre em águas mornas


A liberdade não se abre como gazuas,
E á força do teu braço é que transformas
As fábricas e as terras que são tuas

Abre os teus olhos e vê. Sê vigilante


A reação não passará diante
Do teu punho fechado contra o medo
Levanta-te meu Povo. Não é tarde
Agora é que o mar canta e o sol arde
Pois quando o povo acorda é sempre cedo”

José Ary dos Santos

Este poema, da autoria de José Ary dos Santos, é composto por duas quadras e dois tercetos.
Geralmente, são versos decassilábicos heroicos, isto é, têm 10 sílabas métricas e as sílabas
tónicas mais notórias caem na sexta e na décima sílaba. Tem o esquema rimático: abab abab
ccd eed. A rima é essencialmente formada por rima cruzada, emparelhada, interpolada e verso
branco.
Esta estrutura poética, considera-se criada na Sicília, pelos trovadores da corte de Frederico II
Hohenstaufen. Foi Jacopo Lentini aquele que se acredita como o primeiro poeta e escrever um
soneto e publicá-lo. Apenas na época de Guittone d’Arezzo, se realiza o primeiro registo de um
soneto na estrutura atua redigido por este último. Petrarca, foi então o seu difusor por toda a
Europa que utilizou esta forma de poesia na sua coletânea lírica mais famosa, Canzionere.
Petrarca usou maioritariamente o esquema rimático: abba abba cdc dcd, com rima interpolada,
cruzada, emparelhada e verso branco.
Aqui deixo um poema de Petrarca

Voi ch'ascoltate in rime sparse il suono


Di quei sospiri ond'io nudriva 'l core
In sul mio primo giovenile errore
Quand'era in parte altr'uom da quel ch'i' sono,

Del vario stile in ch'io piango et ragiono


Fra le vane speranze e 'l van dolore,
Ove sia chi per prova intenda amore,
Spero trovar pietà, nonché perdono.

Ma ben veggio or sí come al popol tutto


Favola fui gran tempo, onde sovente
Di me mesdesmo meco mi vergogno;

Et del mio vaneggiar vergogna è 'l frutto,


E 'l pentersi, e 'l conoscer chiaramente
Che quanto piace al mondo è breve sogno.

Um poema que fala sobre os suspiros do coração quando pensa na sua amada, Laura, aquela que
Petrarca nunca esqueceu e colocou referências em todas as suas obras. Desde aquela sexta-feira
Santa, Francesco percebeu o quanto um coração pode sofrer por amor.
As reflexões atuais sobre Petrarca

De um ponto de vista mitológico e religioso, os poemas de Petrarca também são associados ao


fruto proibido do paraíso. A Tentação que o amor provoca, a curiosidade que a morte desperta
nos seres humanos, etc, mas que depois acaba sempre na mesma conclusão, todas as almas e
vidas vão parar a Deus. Também por questões simbólicas, ele conta que conheceu Laura numa
Sexta Feira Santa, para associar á sua morte de Cristo á sua baixa autoestima por ouvir uma
renuncia por parte da sua amada, mais tarde, quando se tornou sacerdote, admitiu que este facto
foi um ato revelador de egocentrismo por estar a associar a morte do filho de Deus a uma
infelicidade amorosa. Porém ele admite que não consegue parar de pensar nela devido á sua
beleza física e á sua bondade, inteligência e simpatia. Por isso ele designa o seu amor por ela,
um amor platónico, ou seja, um ligação sem qualquer interesse económico, político, social ou
sexual.
Embora tenha começado por um humilde capelão e tenha acabado como autor duma das
maiores epopeias italianas, Petrarca mantém-se humilde ao ajudar as pessoas que precisavam e
admitir as suas falhas e sentimentos. Embora não tivesse viagens até ao purgatório e ao inferno
como tinha Dante, o amigo de seu pai, Petrarca escreveu os mais trabalhados e cuidados poemas
do Renascimento italiano. O seu interesse e curiosidade sobre a Antiguidade Clássica fosse nas
ciências, fosse nas letras, Francesco desenvolveu um tipo próprio de latim que não inteiramente
semelhante ao falado no tempo de César, era muito parecido ao antigo e mostrava a todos que
era possível trazer de novo aos tempos atuais a língua que em tempos foi a mais falada do
mundo.

Petrarquismo
A influência de Petrarca, também conhecida por Petrarquismo, manifestou-se como um estilo
literário por toda a Europa, todos queriam escrever sobre os sentimentos e a condição humana,
num latim quase perfeito e com a estrutura poética característica, como foi o caso de Francisco
Sá de Miranda, um poeta português que passou vários anos em Itália, contemporâneo de Luís
Vaz de Camões e considerado o maior poeta português apenas abaixo de Camões na sua época.
Este escritor das suas visitas á península italiana trouxe para o Portugal, o soneto. A maior parte
dos artistas que retiram inspirações das obras de Petrarca, dão mais destaque a estruturas de
certas obras, como Canzionere e Triunfos. Para que mais pessoas tivessem acesso a aquilo que
consideravam arte, houveram traduções das suas obras para Catalão, Espanhol, Português,
Francês, Flamengo (nome atribuído aos dialetos falados na Flandres pelos plebeus que não
falavam francês correto), Belga, Inglês, Escocês, Alemão, Dálmata (idioma da Dalmácia, região
que abrange zonas de três países, Croácia, Bósnia e Herzegovina e Montenegro), Húngaro,
Polaco e Cipriota. Deixo aqui alguns escritores que se inspiraram em Petrarca:
Itália: Boccaccio, Boiardo, Lorenzo de Medici e Tasso
Espanha: O Marquês de Santillana, Auziás March, Garcilaso de la Vega, Juan Boscán e
Fernando de Herrera.
França: Marot, Du Bellay, Scéve, Ronsard e Desportes,
Alemanha: Paul Flemming, Martin Opitz, Georg Weckherlin e Theobald Hock
Reino Unido: Chaucer, Wyatt, Surrey, Spenser, Sidney, Thomas Lodge e Hebry Constable

Também no Período Romântico houveram alguns autores como é o caso de Lamartine, Musset e
Victor Hugo em França, Foscolo e Leopardi em Itália e Longfellow, James Russel Lowell e
Washington Irving nos Estados Unidos da América.

É indiscutível que Petrarca foi um dos maiores poetas e humanistas de todos os tempos. Ele é
considerado por muitos, o maior e o pioneiro na escrita sobre o ser humano e críticas á Igreja. E
que será por muitas e muitas gerações considerado um exemplo a seguir na escrita latina e na
poesia lírica italiana.

Fontes:

Wikipedia
Páginas da História 8ºAno – Aníbal Barreira e Mendes Batista – 2020
A Enciclopédia – Público – 2004
Collier´s Encyclopedia 18 – P.F.Collier, Inc
Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira – Editorial Enciclopédia, Limitada

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