Você está na página 1de 10

O Humanismo

(séculos XV e XVI)
Mofina

“Por mais que a dita me enjeite


Pastores, não me deis guerra;
Que todo humano deleite,
Como o meu pote de azeite,
Há-de dar consigo em terra.”

(Gil Vicente – Auto da Mofina Mendes)

Na Europa medieval, o poder e as riquezas estavam


concentrados nas mãos da nobreza feudal e do clero. A Igreja
surgia como proprietária dos textos escritos, que mantinha sob
vigilância nos mosteiros e bibliotecas. Limitava a circulação de
informações, impedindo a divulgação do saber.
O Humanismo caracterizou-se como um período de conflitos e
mudanças de valores. Aos poucos, o ser humano foi deixando de
lado a visão teocêntrica da existência humana, passando a
interferir mais objetivamente no mundo em que vivia. Começou a
valorizar sua própria capacidade intelectual e artística,
tornando-se autor de descobertas científicas e de obras de arte
admiráveis.
O verdadeiro princípio do Humanismo foi intuído pelo poeta
latino Horácio, quando afirmou que in medio est virtus, isto é, a
virtude está no meio-termo, no equilíbrio entre o real e o irreal,
entre os impulsos do instinto e as forças racionais do homem.
Durante o Humanismo foi iniciado o registro sistemático dos
principais episódios da história de Portugal.
O novo período literário se inicia, em Portugal, no século XV, com
a nomeação de Fernão Lopes como cronista-mor da Torre do
Tombo, em 1434, e termina em 1527, quando Sá de Miranda
retornou da Itália, introduzindo os versos decassílabos e os
sonetos.

Contexto Histórico
Na Europa, o advento da imprensa refletiu o crescimento de um
público leitor, acelerando-se a difusão de notícias. O
conhecimento da cultura greco-latina se intensificou.
Em Portugal, a crise política provocada pela questão sucessória
aberta com a morte de D. Fernando, termina com a aclamação de
D. João I, o mestre de Avis, em 1383. A dinastia de Avis,
inaugurada sob o sopro do espírito anticastelhano e
impulsionada pela nova classe social nobilitada, rasga novas
perspectivas para a nação, tanto no plano cultural como
histórico.
Rei culto, determinado e empreendedor, D. João I incentivou o
cultivo das letras, no que foi imitado por seu filho, D. Dinis,
procurou modernizar Portugal e implementou as grandes
navegações, além de expandir o comércio. Escreveu o Livro da
Montaria, e iniciou a formação de um clima mental continuado
por seus sucessores.
Essa época foi caracterizada, fundamentalmente, por um
processo da humanização da cultura, através da preocupação
com o homem individual e coletivo. a concepção teocêntrica de
vida continuava vigente, embora já começassem a despontar
atitudes contraditórias centradas diretamente no homem.
A euforia provocada pelas descobertas e conquistas ultramarinas
em muito contribuíram para essa mudança de concepção. a
cultura tornou-se laica em grande parte de suas expressões e a
educação do homem, sobretudo o fidalgo, constituiu o objetivo
da literatura moralista da época.
Uma onda de realismo, de terrenalismo e de apego à natureza
física se elevou, contrapondo-se ao transcendentalismo anterior.

Características

_ valorização do ser humano


_ teocentrismo X antropocentrismo
_ valorização da cultura
_ uso de novas formas literárias
_ poesia palaciana
_ teatro popular

Prosa
A prosa, no humanismo português, consistiu principalmente na
crônica histórica, que floresceu graças á grande cultura de
Fernão Lopes e de outros cronistas que o sucederam. Outro tipo
de prosa inaugurado pelo regime absolutista da dinastia de Avis
foi a prosa doutrinária, que servia para a educação da realeza e
da fidalguia, com o sentido de orienta-la no convívio social e no
adestramento físico para a guerra.

Crônica Histórica

Em 1418, o rei D. Duarte nomeou Fernão Lopes ( v. biografia )


para o cargo de guarda-mor da Torre do Tombo, com a tarefa de
analisar e preservar os documentos da história de Portugal.
Os cronistas eram encarregados de organizar os documentos e
as narrativas sobre a história de Portugal em ordem cronológica.
Até então, os cronistas nunca haviam se preocupado em verificar
a autenticidade dos fatos históricos, suas causas ou
conseqüências. Fernão Lopes reorganizou as Memórias escritas
pelos outros cronistas, submetendo sempre os dados a um
criterioso exame.
Além de pesquisador, Fernão Lopes sempre foi um escritor
cuidadoso, procurando incluir em seus relatos as ações dos reis,
dos nobres e dos indivíduos que se destacavam na massa
popular. Também percebeu a importância dos fatores
econômicos no destino das personagens. Seu texto era criativo e
formalmente bem cuidado, reproduzindo com vivacidade os fatos
históricos e aproximando-se do texto literário.
Segundo Maria Leonor Buescu, a incumbência dada a Fernão
Lopes “responde a uma intenção estrutural, é certo, mas
também conjuntural: a de alicerçar e construir os pilares de uma
memória coletiva e de uma consciência identificadora. Memória e
identidade, fatores indissociáveis e necessários, na laboriosa
afirmação do Estado e da Nação.”
Outros historiadores dignos de nota na época foram: Gomes
Eanes de Zurara e Rui de Pina.

A prosa doutrinária

A prosa doutrinária servia fundamentalmente à educação da


fidalguia, com o sentido de orientá-la no convívio social e no
adestramento físico para a guerra, sendo escrita sobretudo por
monarcas. O culto do esporte, principalmente o da caça, ocupava
o primeiro lugar nessa pedagogia pragmática.
As virtudes morais também eram lembradas e enaltecidas,
sempre visando a alcançar o perfeito equilíbrio entre a saúde do
corpo e do espírito.
Contemporaneamente, surgiram obras de devoção e misticismo,
de elogio da vida contemplativa virtuosa e solitária. como
exemplos, temos o Boosco Deleitoso, obra com forte influência
de Petrarca e onde se narra a peregrinação da alma em busca da
salvação. Temos também o Horto do Esposo, obra de um monge
português anônimo, onde os assuntos da vida mística são
misturados a histórias para distrair, inspiradas em temas greco-
latinos e medievais.

Poesia

A poesia abandonou as formas fixas do Trovadorismo, além de


perder o acompanhamento musical, passando a ser recitada.
Adquirindo ritmo próprio, passou a ser apresentada em reuniões
e festas da corte.
Entre concursos e saraus literários, a linguagem poética foi
apurando-se gradativamente, tornando-se as composições mais
estilizadas. Surgiu, assim, a poesia palaciana, onde o amor era o
principal motivo lírico.
Na sátira, os temas principais eram a vida na corte e as
conseqüências indesejáveis da expansão ultramarina.
Quanto à estrutura formal, houve o predomínio das redondilhas,
que acabaram por se tornar uma espécie de molde para a poesia.
Redondilhas são poemas de forma fixa, com versos de cinco
sílabas (redondilha menor) ou sete sílabas (redondilha maior).
A redondilha, por ser a métrica usada no final da Idade Média,
ficou conhecida após o Renascimento como medida velha, em
oposição à medida nova que surgia – o verso decassílabo.
A libertação desejada pela poesia humanista acabou provocando
uma verdadeira crise poética: o que fazer com as palavras
subitamente postas em liberdade, independentes da música?
Alguns procuraram ou encontraram o ritmo especificamente
poético, formado pela sugestão de atmosferas líricas, tendo
apresentado obras perduráveis. Outros, constrangidos dentro da
nova moda, com falta de talento ou equivocados com a revolução
poética em processamento, entendiam que seria suficiente
juntar as palavras, formando versos para criar poesia, falhando.
Para contrabalançar a decadência do lirismo, os poetas
humanistas desenvolveram técnicas e estruturas poéticas
outras, das quais podemos citar:
_ trova - composta de duas ou mais estrofes
_ vilancete - formado por um mote (motivo), composto por dois
ou três versos, seguido de voltas ou glosas, estrofes em que o
poeta retomava e desenvolvia as idéias contidas no mote. Foi
posteriormente largamente usado por Camões.
A poesia da época foi reunida por Garcia de Resende no
Cancioneiro Geral, publicado em 1516.
Os principais poetas humanistas portugueses foram Sá de
Miranda, Garcia de Resende, João Ruiz de Castelo-Branco e
Bernardim Ribeiro.

Teatro

As festas religiosas da Idade Média apresentavam atividades


teatrais de forma bastante rudimentar. Dentro das igrejas, eram
encenados episódios do Evangelho, momentos da vida dos
santos e milagres; do lado de fora, improvisavam-se
apresentações satíricas, ridicularizando-se personagens da
época. Essa foi a origem do teatro português.
As representações improvisadas dividiam-se em:
_ mistério e milagre – encenações de caráter religioso
_ momo – atividades mímicas, apresentadas inclusive nas cortes
_ arremedilho – sátiras curtas, em que os atores “arremedavam”
ou imitavam outras pessoas, acentuando seus traços ridículos
_ entremez – encenação curta que se fazia entre os atos de uma
peça
O marco do surgimento do teatro português é considerado a
declamação do auto Monólogo do vaqueiro, em 1502. seu autor,
Gil Vicente, conhecia profundamente as manifestações do teatro
popular, bem como os autos pastoris, do castelhano Juan del
Encina. Aliando essas duas fontes ao seu talento natural, Gil
Vicente criou uma obra bastante original, retratando a sociedade
portuguesa de sua época.

Gil Vicente

O teatro de Gil Vicente (v. biografia) foi basicamente


caracterizado pela sátira, onde criticava o comportamento de
todas as camadas sociais: a nobreza, o clero e o povo. Embora
profundamente religioso, o tipo mais comumente satirizado pelo
teatro vicentino era o frade que se entregava a amores
proibidos, chegando a enlouquecer de amor, à ganância na
venda de indulgências, ao exagerado misticismo, ao
mundanismo e à depravação de costumes.
Gil Vicente criticou desde o frade de aldeia até o alto clero, sem
poupar bispos, cardeais ou o papa. Sua crítica estendeu-se
àqueles que rezavam mecanicamente; aos que, invocando Deus,
solicitavam favores pessoais e aos que assistiam à missa por
obrigação social.
A baixa nobreza, representada pelo fidalgo decadente e seu
escudeiro, foi outra classe social criticada pelo autor. O teatro
vicentino também satirizou o povo que abandonava o campo em
direção à cidade ou mesmo aqueles que sempre viveram na
cidade, mas que, como os oriundos dos campos, se deixavam
corromper pela perspectiva de lucro fácil.
A galeria de tipos humanos do teatro vicentino é riquíssima,
embora sem a preocupação de fixar tipos psicológicos, e sim
tipos sociais.
Quanto à forma, o teatro de Gil Vicente é extremamente simples,
não obedecendo às três unidades do teatro clássico – ação, lugar
e tempo. Seu texto apresenta estrutura poética, com predomínio
da redondilha maior.

O Auto

Auto é uma designação genérica para textos poéticos,


normalmente em redondilhas, criados para representações
teatrais em fins da Idade Média.

A maioria dos autos apresentava caráter predominantemente


religioso, embora se note, em Gil Vicente, vários exemplos de
autos de temática profana.

Filmografia

O Nome da Rosa (l986)

Direção de Jean-Jacques Annaud.


Com Sean Connery, Christian Slater, F. Murray Abraham.
Baseado no best-seller do escritor italiano Umberto Eco, o filme
se passa na Itália Medieval, quando um monge franciscano
inglês é chamado para investigar uma série de mortes
misteriosas dentro de uma abadia.
Contexto Histórico
HUMANISMO ( 1418-1527 )

O Humanismo caracteriza-se por uma nova visão do homem em


relação a Deus e, em relação a si mesmo. Essa nova visão
decorre diante da nova realidade social e econômica vivida na
época.
A pirâmide social da era Medieval, já não existe mais ( essa
pirâmide era formada pelos Nobres / Clero / e Povo ), graças ao
surgimento de uma nova classe social: a Burguesia, cujo nome
se origina da palavra burgos que quer dizer cidade.
O surgimento das cidades deve-se ao incremento do comércio
que era a base de sustentação dessa nova classe social. As
cidades por sua vez, oferecem uma nova opção de vida para os
camponeses que abandonam o campo. Esse fato iniciou o
afrouxamento do regime feudal de servidão.
Nessa época também tem início as grandes navegações, que
levam as pessoas a valorizar crescentemente as conquista
humanas. Esses fatores combinados levam a um processo que
atinge seu ponto máximo no Renascimento.
Como conseqüência dessa nova realidade social, o Teocentrismo
pregado e defendido durante tantos anos pelas classes
anteriores, passa a dar lugar para o Antropocentrismo, nova
visão onde o homem se coloca como sendo o centro do Universo.
Na cultura, esse processo de mudanças também tem efeitos
culturais pois, o homem passa a se encarar como ser humano, e
não mais como a imagem de Deus.
Todas as Artes passam a expressar novas partículas que
apareceram com essa nova visão, as pinturas os poemas e as
músicas da época por exemplo, tornam-se mais humanas,
passam a retratar mais o ser humano em sua formação.
Essa nova concepção, não significa que a religião estava
acabando mas, apenas que agora os artistas passavam a embutir
em suas obras também o lado humano derivado desse novo
regime social.
As obras dessa época, vão refletir em sua formação esse
momento de transição de uma mentalidade para outra, ou seja, a
passagem de uma visão Teocêntrica para a visão antropocêntrica
do mundo.
Portanto o Humanismo é considerado como um período de
transição.
A prosa, a poesia e principalmente o teatro produzidos nesse
período refletem essa transição.
Texto: Reinaldo Dias, Adaptado do livro Língua e Literatura
Autores: Carlos Faraco e Francisco Moura
Editora Ática Vol.1 6. Ed., 1983
PROSA
1. Prosa doutrinária: Dirigida principalmente à nobreza, com
finalidade fundamentalmente didática, como atestam os títulos
das obras: O livro da Falcoaria, Livro da Montaria, Ensinança de
Bem Cavalgar Toda a Sela.

2. Crônica: O cronista medieval não passava de um compilador,


que ordenava os fatos em ordem cronológica, ou seja, pegavam
um texto e faziam um resumo desse texto usando as próprias
palavras do texto escrito, colocando em ordem, sem nenhuma
crítica por parte do cronista. Não expressavam sentimentos seus
em seus escritos.

Fernão Lopes é o grande cronista dessa época, ele mudou essa


concepção ao fazer uma crônica crítica, que resultou de
investigação própria. Merecem destaque ainda nesse período
como cronistas: Rui de Pina e Gomes Eanes de Zurara.

Texto: Reinaldo Dias, Adaptado do livro Língua e Literatura


Autores: Carlos Faraco e Francisco Moura
Editora Ática Vol.1 6. Ed., 1983

POESIA

À poesia do período humanista compreende a chamada poesia


palaciana, documentada através de uma coletânea feita por
Garcia de Resende e publicada em 1516 com o nome Cancioneiro
Geral. A leitura dessa coletânea mergulha-nos em plena vida
palaciana. A corte ainda concentrada em torno do rei buscava
novas formas de diversão e passatempos. A maioria das
composições do Cancioneiro Geral destinava-se aos serões do
paço, onde se recitava, disputavam concursos poéticos, ouviam
música, galanteavam, jogavam, realizavam pequenos
espetáculos de alegorias ou paródias. Tudo isso feito pelos
nobres, tendia a apurar-se, os vestuários, os gestos, os
penteados e a linguagem mantendo forte influência da corte.

Nessa época a poesia, enfim, pode ter sua autonomia e separar-


se da música, ou seja, até então todas as poesias eram feitas
para serem musicadas, e a partir desse momento, as poesias
puderam ser apenas declamadas, sem acompanhamento usando
apenas a voz do poeta.

Texto: Reinaldo Dias, Adaptado do livro Língua e Literatura


Autores: Carlos Faraco e Francisco Moura
Editora Ática Vol.1 6. Ed., 1983
TEATRO

A característica fundamental desse período de transição aparece


na obra daquele que é considerado o criador do teatro escrito em
língua portuguesa: Gil Vicente ( 1465?-1536? ).
Sua produção literária apresenta, ao lado do espírito religioso
que caracteriza a 1ª fase medieval, uma novidade: a crítica à
sociedade da época.
A obra de Gil Vicente pode ser dividida em duas fases distintas:

1. Autos : Peças de teatro cujo assunto podia ser religioso ou


profano, sério ou cômico, os autos tinham a finalidade de
divertir, de moralizar ou difundir a fé cristã. Os principais autos
de Gil Vicente são:
· Monólogo do Vaqueiro
· Auto da Alma
· Trilogia das Barcas ( Auto da Barca da Glória, Auto da Barca do
Inferno e Auto da Barca do Purgatório.)
· Auto da Feira
· Auto da Índia

2. Farsas : Peças cômicas de um só ato, enredo curto e poucos


atores. Em geral, as farsas eram irreverentes, pois criticavam os
costumes da época. Destacam-se como as principais farsas de Gil
Vicente:
· Farsa do Velho da Horta
· Farsa de Inês Pereira
· Quem tem Farelos?
· Farsa dos Almocreves
· Juiz da Beira
Nas farsas, Gil Vicente faz uma crítica contundente a todas as
classes sociais de seu tempo, desde a nobreza até o povo,
passando pelo clero. Dessa crítica , que não perdoa nenhum
segmento da pirâmide social, só escapa o camponês, que era o
sustentáculo de todo o resto. Esse tipo de crítica social já
apresenta traços do momento histórico que rompe com a cultura
medieval: o Renascimento.
* Dica procure ler o Auto da Barca do Inferno e A Farsa de Inês
Pereira ( leituras obrigatórias para quem pretende prestar um
concurso ou vestibular. )

Texto: Reinaldo Dias, Adaptado do livro Língua e Literatura


Autores: Carlos Faraco e Francisco Moura
Editora Ática Vol.1 6. Ed., 1983

Referências Bibliográficas:

http://www.estudiologia.hpg.ig.com.br/humanismo_4.htm

http://geocities.yahoo.com.br/veluhdias/humanismo

Você também pode gostar