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Simbolismo

Introdução

Movimento que se desenvolve nas artes plásticas, na literatura e


no teatro no fim do século XIX. Surgido n França, depois se
espalha pela Europa e chega ao Brasil. Caracteriza-se por
subjetivismo, individualismo e misticismo. Rejeita a abordagem
da realidade e a valorização do social feitas pelo realismo e pelo
naturalismo. Palavras e personagens possuem significados
simbólicos. O poeta francês Charles Baudelaire é considerado
precursor do simbolismo por sua obra As Flores do Mal, de 1857.
Mas só em 1881 a nova manifestação é rotulada, com o nome
decadentismo, substituído por simbolismo em manifesto
publicado em 1886.

Artes Plásticas

Para os simbolistas a arte deve ser uma síntese entre a


percepção dos sentidos e a reflexão intelectual. Buscam revelar
o outro lado da mera aparência do real. Em muitas obras
enfatizam a pureza e a espiritualidade dos personagens. Em
outras, a perversão e a maldade do mundo. A atração pela
ingenuidade faz com que vários artistas se interessem pelo
primitivismo. O artista mais significativo é o francês Paul
Gauguin, que começa a pintar influenciado pelo pós-
impressionismo. Em suas telas abandona a perspectiva e delineia
as figuras utilizando contornos pretos. As cenas evocam temas
religiosos e mágicos, como em Cristo Amarelo. Também
destacam-se os franceses Gustave Moreau (1826-1898) e Odilon
Redon (1840-1916). A partir de 1890, o simbolismo difunde-se
por toda a Europa e pelo resto do mundo. Na Áustria ganha a
interpretação pessoal do pintor Gustav Klimt (1862-1918). O
norueguês Edvard Munch concilia os princípios simbolistas a uma
expressão trágica que depois faz dele representante do
expressionismo. Na França destacam-se os pintores Maurice
Denis (1870-1943) e Paul Sérusier (1864-1927), além do
escultor Aristide Maillol (1861-1944).

Literatura

Manifesta-se na poesia, com versos que exploram a sonoridade.


As obras usam símbolos para sugerir objetos, por exemplo, a
cruz para falar de sofrimento. Também rejeita as formas rígidas
do parnasianismo. Difere do romantismo pela expressão da
subjetividade ausente de sentimentalismo. Os principais
expoentes na França são Paul Verlaine, Arthur Rimbaud e
Stéphane Mallarmé. Em Portugal sobressaem Eugênio de Castro
(1869-1944), autor de Oaristos, Antônio Nobre (1867-1900),
que escreve Só, e Camilo Pessanha (1867-1926), autor de
Clépsidra.

Teatro

Como o movimento rejeita a abordagem da vida real, no palco os


personagens não são humanos. Constituem a representação de
idéias e sentimentos. A forte relação com os impressionistas faz
com que o som, a luz, a cor e o movimento tenham destaque nas
encenações. Um dos principais textos teatrais é Pelléas et
Mélisande, do belga Maurice Maeterlinck (1862-1949). Em cena,
os personagens materializam expressões poéticas sobre a
brevidade e a falta de sentido da vida. Outros dramaturgos
importantes são o italiano Gabriele D'Annunzio; o norueguês
Henrik Ibsen; na fase final de sua carreira; o irlandês William
Yeats; e os portugueses João da Câmara (1852-1908) e Raul
Brandão (1867-1930).
 

Simbolismo no Brasil

Nas artes plásticas, o movimento influencia parte das pinturas


de Eliseo Visconti e Lucílio de Albuquerque (1877-1939). É muito
marcante nas obras de caráter onírico de Alvim Correa (1876-
1910) e Helios Seelinger (1878-1965). Na literatura, o primeiro
manifesto simbolista é publicado em 1891, no jornal Folha
Popular. As primeiras obras literárias são Missal e Broquéis
(1863), de Cruz e Souza. O autor aborda mistérios da vida e da
morte com uma linguagem rica, marcada pela musicalidade.
Outro representante do movimento é Alphonsus de Guimaraens
(1870-1921), autor de Câmara Ardente e Kiriale, cuja poesia é
marcada pela religiosidade e pela melancolia. O teatro simbolista
começa a ser escrito e encenado no início do século XX. A
produção de textos é pequena. Falam da sociedade carioca da
época. Os principais dramaturgos são Roberto Gomes (1882-
1922), que escreve O Canto sem Palavras e Berenice, e Paulo
Barreto (1881-1921), autor de Eva. Em 1933, Paulo Magalhães
(1900-1972) monta A Comédia do Coração, que põe no palco
personagens simbólicos, como Dor, Paixão e Ciúme.

CARACTERÍSTICAS

ORIGENS
"O O pintor austríaco Klimt, em Música I (1895), enche o quadro
de alusões simbólicas para representar a criação musical.

A partir de 1880, na França, verifica-se uma reação contra as


concepções cientificistas da classe dominante, representadas na
literatura pelo fatalismo naturalista e pelo rigor parnasiano.

Neste sentido, o Simbolismo surge não apenas como uma


estética oposta à literatura (poesia, especificamente) objetiva,
plástica e descritiva, mas como uma recusa a todos os valores
ideológicos e existenciais da burguesia. Em vez da "belle
époque" do capitalismo financeiro e industrial, do imperialismo
que se adonava de boa parte do mundo, temos o marginalismo
de Verlaine, o amoralismo de Rimbaud e a destruição da
linguagem por Mallarmé.

O artista experimenta agora, à maneira dos românticos, um


profundo mal-estar na cultura e na realidade. Mergulha então no
irracional, fugindo ao mundo proposto pelo racionalismo
burguês, e descobrindo neste mergulho um universo estranho de
associações de idéias, lembranças sem um significado definido.
Universo etéreo e brumoso, de sensações evanescentes que o
poeta deve reproduzir através da palavra escrita, se é que
existem palavras para exprimi-las. O Naturalismo e o
Parnasianismo estão definitivamente mortos, conforme
sentenciou um crítico literário da época:

Em uma época que, sob o pretexto naturalista, a arte foi


reduzida somente a uma imitação do contorno exterior das
coisas, os simbolistas voltam a ensinar aos jovens que as coisas
também têm alma, alma da qual os olhos humanos não captam
mais do que o invólucro, o véu, a máscara.

O Simbolismo define-se assim pelo anti-intelectualismo. Propõe


a poesia pura, não racionalizada, que use imagens e não
conceitos. É uma poesia difícil, hermética, misteriosa, que
destrói a poética tradicional.

SURGIMENTO

Os primeiros indícios do movimento encontram-se em


Baudelaire, cuja obra máxima, As flores do mal, antecipa certas
perspectivas simbolistas. Em 1884, Verlaine publica sua Arte
poética, onde os princípios da escola já são evidentes. Em 1886,
Jean Moréas vale-se de um manifesto para elaborar
teoricamente o Simbolismo. Diz Moréas:

Inimiga do ensinamento, da declamação, da falsa sensibilidade,


da descrição objetiva, a poesia simbolista procura vestir a Idéia
de uma forma sensível

1) SUBJETIVISMO
Absinto (1876), do francês Degas, ilustra o mundo boêmio, semi-
marginal e próximo das vertigens oferecidas pelo absinto e
outras drogas, no qual os simbolistas franceses viviam.
Os simbolistas retomam a subjetividade da arte romântica com
outro sentido. Os românticos desvendavam apenas a primeira
camada da vida interior, onde se localizavam vivências quase
sempre de ordem sentimental. Os simbolistas vão mais longe,
descendo até os limites do subconsciente e mesmo do
inconsciente. Este fato explica o caráter ilógico ou o clima de
delírio de grande parte de sues poemas, como no fragmento de
Cruz e Sousa:

Cristais diluídos de clarões álacres,


Desejos, vibrações, ânsias, alentos,
Fulvas vitórias, triunfamentos acres,
Os mais estranhos estremecimentos.

2) O EFEITO DE SUGESTÃO

Diz Mallarmé:

Os parnasianos tomam os objetos em sua integridade e


mostram-nos. Por isso carecem de mistério. Descrever um objeto
é suprimir três quartas partes do prazer de um poema, que é
feito da felicidade de adivinhar-se pouco a pouco. Sugerir, eis o
sonho. E o uso perfeito deste mistério é o que constitui o
símbolo: evocar o objeto para expressar um estado de alma
através de uma série de decifrações.

Sua observação é chave para o entendimento da poética


simbolista. Abandona-se o descritivismo parnasiano em busca de
uma revitalização do gênero lírico. São criadas novas imagens,
novas metáforas e símbolos. Acentua-se o caráter obscuro de
certas palavras e o emotivo de outras, tudo como repúdio à
linguagem poética usual, carregada de lugares-comuns, clichês e
frases-feitas que se repetiam de geração em geração.

Trata-se de reinventar a linguagem, explorar suas


possibilidades, recriá-la palavra após palavra, à procura de
imagens originais e envolventes. A verdadeira poesia consiste
em não-dizer, não-declarar, não designar as coisas pelos seus
nomes triviais. A verdadeira poesia está em insinuar, dizer
figuradamente, sugerir.

Cruz e Souza foi especialista na utilização de imagens ousadas


com efeito de sugestão. Angústia sexual e erotismo misturam-se
na exaltação de uma mulher que parece devorar os homens:

Cróton* selvagem, tinhorão* lascivo, Planta mortal, carnívora,


sangrenta, De tua carne báquica* rebenta A vermelha explosão
de um sangue vivo

*Cróton - arbusto ornamental


*Tinhorão - erva ornamental
*Báquica - relativo a Baco, deus grego do vinho e da dissipação

3) MUSICALIDADE Na tentativa de sugerir infinitas sensações


aos leitores, os simbolistas aproximam a poesia da música.
Entendamos: não se trata de poesia com fundo musical, mas
poesia com musicalidade em si mesma, através do manejo
especial de ritmos da linguagem, esquisitas combinações de
rimas, repetição intencional de certos fonemas, sujeição do
sentido de um vocábulo a sua sonoridade, etc. Realiza-se assim a
exigência de Verlaine: "A música antes de qualquer coisa."
Rimbaud surpreende a França com o ardor de seus versos
malditos, escritos em plena adolescência. Verlaine leva a
musicalidade e o efeito sugestivo das palavras a um limite até
então desconhecido na literatura européia.

Somos atingidos pelo efeito dos ritmos e dos sons de qualquer


poema simbolista, mesmo que não conheçamos profundamente o
idioma em que ele foi escrito. Verlaine, por exemplo, deixou os
mais célebres versos desta sedução pela música em Canção de
outono:

Le sanglots longs / Des violons / De l´automne / Blessent mon


coeur / D´ une langueur / Monotone *

* Os lamentos longos / Dos violinos / Do outono / Ferem o meu


coração / De um langor / Monótono.

A música é obrigatória, como nesta espécie de receita poética de


Cruz e Sousa:

Derrama luz e cânticos e poemas


No verso e torna-o musical e doce
Como se o coração, nessas supremas
Estrofes, puro e diluído fosse.

Mesmo a morte, na obra do simbolista brasileiro, possui uma


terrível musicalidade:

A música da Morte, a nebulosa,


Estranha, imensa música sombria,
Passa a tremer pela minh'alma e fria
Gela, fica a tremer, maravilhosa...
4) IRRACIONALISMO E MISTÉRIO

No princípio, os simbolistas têm como projeto "revestir as idéias


de uma forma sensível", isto é, traduzi-las para uma linguagem
simbólica e musical. Pouco a pouco, este intelectualismo se
converte numa aventura anti-intelectual, numa negativa à
possibilidade de comunicação lógica entre os homens.

"Nós não estamos no mundo", brada Rimbaud, o mundo concreto


se esvaiu, perdeu sua inteligibilidade. Agora é puro mistério:
atrás da ordem aparente das coisas estão o caos, a névoa, a
bruma, a neblina, o incorpóreo, o fantasmagórico, o estranho, o
inefável*.

Tempestade, de Wilian Turner, reflete este mundo nevoento,


nebuloso e quase incorpóreo que os simbolistas tanto valorizam.

Rimbaud considera o artista um vidente que foge da realidade


ilusória e penetra na realidade inexplorada das sensações. Para
adquirir esta vidência é indispensável um "desequilíbrio de todos
os sentidos", uma ponte em direção ao ilógico e à loucura. Só os
"alquimistas do verbo" podem enxergar além da obviedade do
cotidiano e deparar-se com a essência misteriosa da vida. Cruz e
Sousa chega a implorar pelo mistério:
Infinitos, espíritos dispersos,
Inefável, edênicos*, aéreos,
Fecundai o Mistério destes versos
Com a chama ideal de todos os mistérios.

*Inefável - indescritível, o que não pode ser expresso.


*Edênicos: que procedem do Éden, do paraíso

O SIMBOLISMO NO BRASIL

CONTEXTO CULTURAL

O Simbolismo no Brasil é um movimento que ocorre à margem


do sistema cultural dominante. Seu próprio desdobramento
aponta para províncias de escassa ressonância: Paraná, Santa
Catarina e Rio Grande do Sul. É como se o gosto dos poetas da
escola por neve e névoas, outonos e longos crepúsculos exigisse
regiões frias e nebulosas.

Há quase um fatalismo geográfico: Alphonsus de Guimaraens


produz seus textos nas cidades montanhosas e fantasmagóricas
de Minas Gerais. No Rio de Janeiro, de grandes sóis e clima
tropical, o agrupamento simbolista, mesmo com o reforço de
Cruz e Sousa - que emigrara da antiga cidade do Desterro (hoje
Florianópolis) - acaba sufocado pela luz, pelo calor e pela onda
parnasiana.

Os adeptos da nova estética tornam-se alvo de zombarias,


quando não de desprezo. A maioria dos críticos não os
compreende e o público leitor mostra-se indiferente ou hostil
frente aquela poética aristocrática, complicada, pretensiosa.
Somente depois do triunfo modernista, alguns desses poetas
seriam revalorizados.
Não se pense contudo que a marginalidade simbolista implica
numa mudança das relações de dependência entre os letrados
brasileiros e os valores europeus. A exemplo dos parnasianos - e
às vezes é difícil identificar diferenças poéticas entre ambos - os
simbolistas transplantam uma cultura que pouco tem a ver com
a realidade local. Daí resulta uma poesia freqüentemente
distanciada tanto do espaço social quanto do jeito íntimo de ser
brasileiro. Um pastiche dos "padrões sublimes da civilização".

Outra vez estamos diante do velho sonho colonizado: reproduzir


aqui os modelos recentes da arte européia. A grande exceção
neste contexto parece ser a obra de Cruz e Sousa, embora outros
poetas do período tenham deixado criações isoladas de relativo
interesse e qualidade.

As primeiras experiências de acordo com os novos preceitos são


realizadas por Medeiros e Albuquerque, a partir de 1890. Porém,
os textos que verdadeiramente inauguram o Simbolismo
pertencem a Cruz e Souza que, em 1893, lança duas obras
renovadoras: Broquéis e Missal. A primeira compõe-se de
poemas em versos e a segunda de poemas em prosa.

AUTORES SIMBOLISTAS

CRUZ E SOUSA (1861 - 1898)

Vida: João da Cruz e Souza nasceu em Desterro (hoje


Florianópolis), filho de escravos libertos pelo marechal
Guilherme de Souza, que adotou o menino negro e ofereceu-lhe
a chance de estudar com os melhores professores de Santa
Catarina. Foi seu mestre, inclusive, o sábio alemão Fritz Müller,
correspondente de Darwin. Apesar da morte de seu protetor,
conseguiu terminar o nível intermediário e, com pouco mais de
dezesseis anos, tornou-se professor particular e militante da
imprensa local. Aos vinte anos, seguiu com uma companhia
teatral por todo o Brasil, na condição de "ponto". Durante estas
viagens entregou-se à conferências abolicionistas. Em 1883, foi
nomeado promotor público em Laguna, no sul da província, mas
uma rebelião racista na pequena cidade, impediu-o de assumir o
cargo, embora esta história seja contestada por algumas fontes.
Primeira edição de Faróis, de Cruz e Sousa

Voltou a viajar e a cada regresso sentia a ampliação do


preconceito de cor. Mudou-se então, definitivamente para o Rio
de Janeiro. Lá se casaria com uma moça negra (Gavita) e
conseguiria modesto emprego de arquivista na Central do Brasil,
já no ano de 1893. Às inúmeras dificuldades financeiras
somavam-se o desprezo dos intelectuais da época, que viam nele
apenas um "negro pernóstico", o período de loucura mansa
vivido pela esposa, durante seis meses, e a tuberculose que
atacou toda a sua família: ele, a mulher e os quatro filhos. Numa
carta ao amigo e protetor, Nestor Vítor, deixou registrado seu
infortúnio:

"Há quinze dias tenho uma febre doida... Mas o pior, meu velho,
é que estou numa indigência horrível, sem vintém para
remédios, para leite, para nada! Minha mulher diz que sou um
fantasma que anda pela casa!"

Este mesmo amigo providenciou uma viagem do poeta à região


serrana de Minas Gerais, em busca de paliativo para a doença.
Mal chegando lá, Cruz e Sousa piorou e faleceu na mais absoluta
solidão. Três anos após - já tendo enterrado dois filhos - Gavina
também desapareceria por causa da tuberculose. O terceiro filho
morreria em seguida. O último, vitimado pela mesma moléstia,
desapareceria em 1915. A família estava extinta numa terrível
tragédia humana.

OBRAS PRINCIPAIS: Broquéis (1893) - Missal (1893) -


Evocações (1899) - Faróis (1900) Últimos sonetos (1905)
A obra de Cruz e Sousa é a mais brasileira de um movimento que
foi, entre nós, essencialmente europeu. Nela opera-se uma
tentativa de síntese entre formas de expressão prestigiadas na
Europa e o drama espiritual de um homem atormentado social e
filosoficamente. O resultado passa, às vezes, por poemas
obscuros e verborrágicos mas, na maioria dos casos, a densidade
lírica e dramática do "Cisne Negro" atinge um nível só
comparável ao dos grandes simbolistas franceses. O primeiro
aspecto que percebemos em sua poética é a linguagem
renovadora.

Alphonsus de Guimaraens

A morte da amada

É um tema dominante em sua poesia: a morte da noiva amada, a


doce Constança, desaparecida na flor da mocidade. De certa
forma, não conseguirá mais esquecê-la e, assim, os seus poemas
de amor sempre se vincularão à idéias fúnebres. Amor e morte é
uma velha fórmula romântica, mas Alphonsus a tratará de
maneira diferente, fugindo do patético e alcançando um tom
elegíaco*, onde predominam a melancolia e a musicalidade.

Nem o casamento, nem o passar do tempo ajudarão o poeta a


atenuar esta tristeza. Em vários momentos, a dor parece mais
uma convenção poética do que propriamente um sentimento
real. No entanto, um soneto como Hão de chorar por ela os
cinamomos guarda forte carga de emoção:

Hão de chorar por ela os cinamomos


Murchando as flores ao tombar do dia
Dos laranjais hão de cair os pomos
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão: - "Ai, nada somos,


Pois ela se morreu silente* e fria..."
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua que lhe foi mãe carinhosa


Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la
Entre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...


E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,
Pensando em mim: - "Por que não vieram juntos?"

* Silente: silencioso, secreto.

A lembrança do sofrimento nunca o abandona, como se percebe


em Ismália, espécie de balada, onde a loucura, a solidão e a
morte se interpenetram:

Manuscrito de Alphonsus de Guimaraens

Quando Ismália enlouqueceu,


Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu


Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E, no desvario seu
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu


As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu


Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar

OUTROS SIMBOLISTAS

No Rio Grande do Sul, o principal simbolista foi Eduardo


Guimarães (A divina quimera, 1916). No Paraná, destacou-se
Emiliano Perneta (Ilusão,1911). Na Bahia, surgiu a poética
estranha de Pedro Kilkerry. Verdade que estes escritores ficam
em segundo plano, diante da figura esplêndida de Cruz e Sousa,
mas contribuem para a expansão de uma onda simbolista. Uma
onda quase invisível, dado o domínio parnasiano e a posterior
vitória modernista, e que só seria percebida nos livros iniciais de
Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes, Cecília Meireles e Mário
Quintana, todos com maior ou menor influência do Simbolismo.

O caso PEDRO KILKERRY (1885-1917)


Vida: Nasceu em Santo Antônio (Bahia). Estudou em Salvador,
onde se formou em Direito. Ao morrer, com apenas trinta e dois
anos, não tinha ainda livro publicado, fato que persiste até hoje.

Redescoberto pela vanguarda concretista, Pedro Kilkerry é mais


um desses casos estranhos que povoam a história literária.
Criador isolado de uma poética fragmentária, feita de
aliterações, onomatopéias e neologismos, levou a extremos as
possibilidades de expressão abertas pelos simbolistas,
aproximando-se do experimentalismo de alguns poetas
modernistas. Veja-se "Horas ígneas":

"Eu sorvo o haxixe do estio*


E evolve um cheiro, bestial
Ao solo quente, como o cio
De um chacal.

Distensas, rebrilham sobre


Um verdor, flamâncias* de asa...
Circula um vapor de cobre
Os montes - de cinza e brasa."**

Em vários momentos, entretanto, esta poesia inovadora descai


para a prolixidade e para o vocabulário pedante.

* Estio: verão
* Flamâncias: brilhos

** Apud Campos, Augusto de. Re-visão de Kilkerry. São Paulo,


Fundo Estadual de Cultura, 1970.

Referências bibliográficas

http://www.terra.com.br/literatura/simbolismo/indice.htm

http://www.netliteratura.hpg.ig/index2.htm

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