Você está na página 1de 23

A Criança em Desenvolvimento 73

Genótipos e Fenótípos
Empregando dados dos estudos de g é m e o s e de a d o ç ã o , os geneticistas do comportamen-
to fizeram grandes progressos na identificação das tiabilidades, das características ou dos
traços que são influenciados pela hereditariedade. Apesar desses a v a n ç o s científicos, ne-
nhum geneticista p r o p õ e que uma c o m b i n a ç ã o de genes herdada determina por inteiro
qualquer resultado em um indivíduo. Os geneticistas (e os psicólogos) fazem uma impor-
tante distinção entre o g e n ó t i p o , que é o conjunto específico de " i n s t r u ç õ e s " contido nos
genes de um indivíduo, e o f e n ó t i p o , que s ã o as características reais observadas no indiví-
duo. O fenótipo é um produto de três itens: do genótipo, de todas as influências ambientais
a partir do momento da c o n c e p ç ã o e da i n t e r a ç ã o entre o ambiente e o g e n ó t i p o . Uma
criança poderia ter um g e n ó t i p o associado a um alto QI, mas, se sua m ã e fizer ingestão ex-
cessiva de bebidas alcoólicas durante a gravidez, pode haver dano no sistema nervoso fetal,
resultando em um leve retardo. Uma outra criança pode ter um g e n ó t i p o com uma mistura
de genes contribuindo para um temperamento "difícil", mas, se os pais forem particular-
mente sensíveis e cuidadosos, ela p o d e r á aprender maneiras adequadas de se comportar.
Pensamento Crítico
Essa distinção entre g e n ó t i p o e fenótipo é crucial. Os c ó d i g o s genéticos n ã o são sinais
Você poderia imaginar outros
irrevogáveis deste ou daquele p a d r ã o de desenvolvimento; desta ou daquela d o e n ç a . O re-
exemplos em que o fenótipo seria
sultado desenvolvimental final t a m b é m é afetado pelas experiências específicas que o indi-
diferente do genótipo?
víduo tem a partir da c o n c e p ç ã o .

O Desenvolvimento: Da Concepção ao
Nascimento
Se partirmos do princípio de que a c o n c e p ç ã o ocorre duas semanas a p ó s u m p e r í o d o mens-
trual, quando normalmente se dá a ovulação, e n t ã o o p e r í o d o de g e s t a ç ã o do b e b é humano
é de 38 semanas (cerca de 265 dias). A maioria dos m é d i c o s calcula a g e s t a ç ã o como um pe-
ríodo de 40 semanas, contando a partir do início do último p e r í o d o menstrual. Porém, todas
as especificações de semanas de g e s t a ç ã o que faço aqui se baseiam em um cálculo de 38 se-
manas, contando a partir da época presumida da c o n c e p ç ã o . °
Essas 38 semanas foram subdivididas de várias maneiras diferentes. Os m é d i c o s cos- A maioria dos pais considera os nove
tumam falar em termos de três p e r í o d o s iguais de três meses, chamados trimestres. Em meses de gravidez como uma época
contraste, os biólogos e embriologistas dividem as semanas de g e s t a ç ã o em t r ê s s u b p e r í o - de deliciosa antecipação. Essa
dos desiguais, vinculados a m u d a n ç a s específicas no organismo em desenvolvimento: o também é a época em que o padrão
germinal, que tem a d u r a ç ã o aproximada de duas semanas; o embrionário, que continua até genético da criança (o genótipo) é
cerca de oito semanas depois da c o n c e p ç ã o ; e o estágio fetal, que constitui as 26 ou 30 se- estabelecido e em que se desdobram
manas restantes. complexas sequências maturacionais.

A concepção ocorre em uma das duas trompas de Falópio; o óvulo fertilizado passa, então,
cerca de uma semana viajando pela trompa até chegar ao ú t e r o . A divisão celular c o m e ç a
de 24 a 36 horas a p ó s a c o n c e p ç ã o ; dentro de dois ou três dias já existem várias dúzias de
células, e a massa toda é mais ou menos do tamanho da c a b e ç a de um alfinete. Cerca de
quatro dias após a c o n c e p ç ã o , a massa de células, agora chamada b l a s t ó c i t o , c o m e ç a a se
subdividir, formando uma esfera oca com duas camadas de células em torno do p e r í m e t r o .
A camada externa vai formar as várias estruturas que irão sustentar o organismo em desen-
volvimento, enquanto a camada interna forma o p r ó p r i o e m b r i ã o . Quando toca na parede
do útero, a camada externa de células do blastócito se rompe no ponto de contato. Peque-
nas garras se desenvolvem e prendem a massa de células à parede uterina, em um proces-
so chamado i m p l a n t a ç ã o . Quando a i m p l a n t a ç ã o se completa, normalmente 10 dias ou 2
semanas a p ó s a c o n c e p ç ã o , existem talvez umas 150 células no blastócito (Tanner, 1990). Vo-
cê pode ver esquematizada toda essa s e q u ê n c i a na Figura 2.4.
Helen Bee

Figura 2.4
Este desenho esquemático mostra a progressão normal de desenvolvimento nos primeiros 10 dias de
gestação, da concepção à implantação.

O estágio e m b r i o n á r i o c o m e ç a quando a i m p l a n t a ç ã o se completa, tendo continuidade até


as várias estruturas de s u s t e n t a ç ã o estarem inteiramente formadas e todos os principais sis-
temas de ó r g ã o s estarem definidos, pelo menos de forma rudimentar - em um processo
que, em geral, leva outras seis semanas.
Desenvolvimento das Estruturas de Sustentação. A camada externa de células se separa
outra vez em duas partes, e cada uma delas forma estruturas de s u s t e n t a ç ã o cruciais. Uma
mehnbrana interna, chamada â m n i o , cria o saco, ou bolsa, cheio de líquido {fluido amnióti-
co], em que o b e b é flutua. Da camada exterior, denominada c ó r i o n , desenvolvem-se dois
outros ó r g ã o s : a placenta e o c o r d ã o umbilical. A placenta, que está completamente de-
senvolvida cerca de quatro semanas a p ó s a c o n c e p ç ã o , é uma massa de células em forma
de lâmina, que fica contra a parede do útero. Ela serve como fígado, p u l m õ e s e rins para o
e m b r i ã o e para o feto. Conectada com o sistema circulatório do e m b r i ã o , através do cordão
umbilical, ela serve, de outra parte, como u m filtro entre o sistema circulatório da m ã e e o
do e m b r i ã o . Nutrientes como oxigénio, proteínas, a ç ú c a r e s e vitaminas do sangue materno
podem ser passados para o e m b r i ã o e para o feto; os r e s í d u o s digestivos e o dióxido de car-
bono do sangue do b e b é podem retornar para a m ã e , cujo corpo consegue eliminá-los. Ao
mesmo tempo, muitas (mas n ã o todas) s u b s t â n c i a s nocivas, como vírus ou h o r m ô n i o s da
mãe, s ã o filtradas, porque são grandes demais para atravessar as várias membranas da pla-
centa. Entretanto, a maioria das drogas e dos a n e s t é s i c o s passa através da placenta, assim
como alguns organismos causadores de d o e n ç a s .
Desenvolvimento do Embrião. Enquanto essas estruturas de s u s t e n t a ç ã o estão se desen-
volvendo, a massa de células que f o r m a r á o e m b r i ã o t a m b é m está se diferenciando em vá-
rios tipos de células que v ã o formar os rudimentos da pele, os receptores dos sentidos, as
células nervosas, os músculos, o sistema circulatório e os ó r g ã o s internos. Batimentos car-
díacos podem ser detectados quatro semanas depois da c o n c e p ç ã o ; além disso, um início
de p u l m õ e s e de membros é percebido nesse morinento. A o final do p e r í o d o embrionário,
estão presentes dedos dos p é s e das m ã o s , olhos, p á l p e b r a s , nariz, boca e orelhas rudimen-
tares, assim como partes básicas do sistema nervoso - u m conjunto de m u d a n ç a s resumido
na Tabela 2.2 e apresentado visualmente na Figura 2.5 (ver p. 76). Quando esta formação
preliminar de ó r g ã o s está completa, c o m e ç a u m novo estágio, o de feto.
A Criança em Desenvolvimento

2.2 Marcos da Gestação Inicial

Semana Eventos Desenvolvimentaís

^,™_™.Jst9_gioJieimaaL
1 Fertilização; início da diferenciação.

2 Maior diferenciação; innplantação.

.EstágiJi.EmbtLoj[iárixL
Ausência do período menstrual; o teste de gravidez é positivo; âmnio, córion e
cordão umbilical começam a se desenvolver; começa a se formar o tubo neural.
Está totalmente desenvolvida a placenta; tem início um batimento cardíaco primitivo;
o tubo neural se fecha (de outra forma ocorre a espinha bífida); começam a se
desenvolver os olhos, os vasos sanguíneos e os pulmões; o comprimento total é de
quase 6mm.
Aparecem boca rudimentar, brotos de braços e pernas, e apêndices semelhantes a
dedos; o cérebro se divide em três seções principais: prosencéfalo, mesencéfalo e
rombencéfalo; começam a se desenvolver os nervos periféricos.
Desenvolvem-se nariz e orelhas rudimentares; as estruturas faciais se fundem (ou
podem ser constatados defeitos faciais).
7 Começam as pálpebras; o gene que determina a condição masculina "é acionado" e
tem início a cadeia de eventos que resultam na genitália masculina.
8 Podem ser distinguidos ovários e testículos; é estabelecida, de forma inicial, a
estrutura do sistema nervoso; o ultra-som abdominal pode detectar a presença do
embrião; o comprimento total é superior a 2,5cm.
Fontes: Rosenblith, 1 9 9 2 ; N e e d l m a n , 1 9 9 6 ; Allen, 1 9 9 6 .

O Estágio Fetal
Nos sete meses do estágio fetal, todos os sistemas primitivos de ó r g ã o s s ã o refinados. Vo-
cês terão uma ideia da rapidez das m u d a n ç a s examinando a Tabela 2.3 (ver p. 76), que lista
alguns dos marcos de desenvolvimento fetal.
Desenvolvimento do Sistema Nervoso. U m sistema vital que se desenvolve de modo mais
completo durante o p e r í o d o fetal é o sistema nervoso, o qual existe apenas da forma mais
rudimentar no final do p e r í o d o e m b r i o n á r i o . A princípio, forma-se um cilindro oco, o tubo
neural, do qual se desenvolvem o c é r e b r o e a medula espinal. Vocês podem ver a forma ini-
cial desse tubo no desenho e s q u e m á t i c o do c é r e b r o de um e m b r i ã o com 25 dias na Figura
2.6 (ver p. 77), que t a m b é m mostra as extraordinárias m u d a n ç a s no c é r e b r o ao longo das 33
semanas seguintes de g e s t a ç ã o .
O sistema nervoso é composto por dois tipos básicos de células, os n e u r ó n i o s e as c é -
lulas gliais. As células gliais s ã o a "cola" que m a n t é m o sistema unido, proporcionando fir-
meza e estrutura ao c é r e b r o , ajudando a remover fragmentos a p ó s morte ou dano neuro-
nal, ou separando os n e u r ó n i o s uns dos outros. São os n e u r ó n i o s que fazem o trabalho de
receber e enviar mensagens de uma parte do c é r e b r o para outra, ou de uma parte do corpo
para outra.
Os n e u r ó n i o s t ê m quatro partes principais, mostradas de modo e s q u e m á t i c o na Figu-
ra 2.7 (ver p. 78): (1) u m corpo celular, em geral com a forma de uma pirâmide; (2) extensões
ramificadas do corpo celular (chamadas dendritos), que são os maiores receptores dos i m -
pulsos nervosos; (3) uma e x t e n s ã o tubular do corpo celular, chamada a x ô n i o , que pode
chegar a um metro de comprimento; (4) fibras terminais ramificadas na extremidade do
axônio, que formam o principal aparato transmissor do sistema nervoso. Em virtude da
aparência ramificada dos dendritos, os fisiologistas usam termos botânicos para descrevê-
los, falando em "árvore dendrítica" ou em "poda" da árvore.
Helen Bee

Figura 2.5
Embrião com seis semanas de vida

Tabela 2.3 Marcos do Desenvolvimento Fetal

Semanas Eventos Desenvolvimentaís


8-12 Alguns reflexos são visíveis, como o de susto e o de sugar; há movimento dos braços
e das pernas; há expressões faciais primitivas; o comprimento total na 12^ semana é
de aproximadamente 10 c m , sendo a cabeça responsável por cerca da metade
deste comprimento.

13-16 Início do 2° trimestre; genitália externa totalmente diferenciada e detectável; pele e


pêlos verdadeiros; desenvolvimento do esqueleto ósseo; aparecem movimentos de
respirar e engolir.

17-20 A mãe percebe pela primeira vez os movimentos do bebé; os batimentos cardíacos
são audíveis através do estetoscópio; vinte semanas é o limite inferior usual de
viabilidade, com um peso de aproximadamente 460 gramas, mas a grande maioria
dos bebés nascidos tão pequenos não sobrevive.

21-28 Os olhos se abrem por volta da 28^ semana; aumenta a gordura subcutânea;
começa a mielinização da medula espinal; pálpebras e sobrancelhas estão
totalmente formadas; maior desenvolvimento do sistema circulatório; peso médio de
1.300 gramas. Boa chance de sobrevivência se nascer agora.

29-37 A gordura subcutânea aumenta ainda mais; os finos pêlos que antes cobriam o
corpo começam a desaparecer; começa a mielinização das células cerebrais.

38 Nascimento

Fontes: Rosenblith, 1 9 9 2 ; N e e d l m a n , 1 9 6 6 ; Allen, 1 9 9 6 .


A Criança em Desenvolvimento

7 meses 9 meses

Figura 2.6
Estágios no desenvolvimento pré-natal do cérebro, começando com o tubo neural no período
embrionário
Fonte: D e s e n h o s d e T o m P r e n t i s s , e m " T h e D e v e l o p m e n t o f t h e B r a i n " , d e W . M a x w e l l C o w a n , e m Scientific American,
s e t e m b r o d e 1 9 7 9 , p. 1 1 2 - 1 1 4 . A d a p t a d o c o m a p e r m i s s ã o d e N e l s o n H . P r e n t i s s .

O ponto em que dois n e u r ó n i o s se comunicam, onde as fibras transmissoras do axônio


entram em estreito contato com os dendritos de outro n e u r ô n i o é cliamado sinapse; a co-
municação através da sinapse se faz por substâncias químicas, tais como a serotonina, a do-
pamina e as endorfinas, cliamadas n e u r o t r a n s m i s s o r e s . O n ú m e r o dessas sinapses em
um único ser Irumano é imenso. Uma célula na parte do c é r e b r o que controla a visão, por
exemplo, pode ter de 10 a 30 m i l inputs sinápticos para seus dendritos (Greenough et al.,
1987).
As células gliais c o m e ç a m a se desenvolver por volta de 13 semanas depois da concep-
ção e continuam a se multiplicar talvez até dois anos a p ó s o nascimento. A grande maioria
dos neurónios se forma entre a 10^ e a 18^ semana de g e s t a ç ã o (Huttenlocher, 1994; Todd et
al, 1995), constituindo-se, a princípio, como corpos celulares em uma parte do c é r e b r o e,
depois, migrando para outras seções do cérebro. Com raras exceções, esses n e u r ó n i o s cria-
dos no p e r í o d o pré-natal s ã o todos os que o indivíduo terá em sua vida. N e u r ó n i o s perdi-
dos não s e r ã o substituídos posteriormente.
Nessas primeiras semanas do p e r í o d o fetal, os n e u r ó n i o s s ã o muito simples. Eles s ã o
constituídos principalmente por u m corpo celular, com axónios curtos e com pequeno de-
senvolvimento d e n d r í t i c o . Nos últimos dois meses antes do nascimento e nos primeiros
anos após o nascimento é que ocorrem o alongamento dos axónios e o maior crescimento
da "árvore dendrítica". Na verdade, já que os dendritos se desenvolvem no 8^ e 9^^ m ê s de
gestação, eles parecem ser enviados como^yma espécie de sistema exploratório; muitos
desses primeiros dendritos são, em outros momentos, reabsorvidos, restando apenas as ex-
pansões úteis. No entanto, nesses meses finais, a f o r m a ç ã o de sinapses é bem mais lenta; a
maioria das sinapses se forma a p ó s o nascimento. Por exemplo, na parte do c é r e b r o res-
ponsável pela visão, os b e b é s têm, aos 6 meses, cerca de 10 vezes o n ú m e r o de sinapses que
tinham quando nasceram (Huttenlocher, 1994).
78 Helen Bee

Figura 2.7
A estrutura de um único neurônio desenvolvido. Os corpos celulares são os primeiros a se desenvolver,
principalmente entre 10 e 20 semanas de gestação. Os axónios e os dendritos começam a se
desenvolver nos últimos dois meses de gestação e continuam a aumentar em tamanho e complexidade
nos primeiros anos após o nascimento.

Pensamento Crítico
Desenvolvimento do Comprimento e do Peso. Da mesma forma, o maior crescimento no ta-
Você consegue pensar nas
manho do feto ocorre no fim do p e r í o d o fetal. Por volta da 20^ semana de g e s t a ç ã o , o feto
consequências práticas do fato de
tem cerca da metade do comprimento que terá no nascimento, mas n ã o atinge a metade do
já estarem presentes, por volta de
peso até quase t r ê s meses depois, em torno de 32 semanas.
28 semanas de gestação, todos os
neurónios que teremos?

Um Resumo do Desenvolvimento Pré-Natal


Um dos pontos mais importantes sobre o desenvolvimento pré-natal é a sua notável regu-
laridade e previsibilidade. Se o e m b r i ã o sobreviveu ao p e r í o d o inicial cheio de riscos (as pri-
meiras 8 a 10 semanas), o desenvolvimento em geral continua de modo tranquilo, com as
várias m u d a n ç a s ocorrendo aparentemente em uma ordem fixa, em intervalos fixos de tem-
po, seguindo um claro plano básico maturacional.
Tal sequência de desenvolvimento n ã o é imune à modificação ou à influência externa,
como vocês logo verão com detalhes. Na verdade, conforme os psicólogos e os biólogos ob-
servaram com mais cuidado os vários tipos de fatores teratogenicos, foi ficando claro que
essa sequência é mais vulnerável do que parecia anteriormente. Porém, antes de c o m e ç a r a
falar sobre o que pode dar errado, quero enfatizar mais uma vez que o sistema maturacio-
nal é, de fato, muito robusto. O desenvolvimento p r é - n a t a l normal requer um ambiente
adequado, mas "adequado" parece ser bastante amplo. A maioria das crianças é plenamen-
te normal. A lista do que pode dar errado é longa e fica maior à medida que o nosso conhe-
cimento aumenta. Entretanto, muitos desses problemas potenciais s ã o bastante raros, mui-
tos s ã o parcial ou totalmente evitáveis e muitos n ã o precisam ter c o n s e q u ê n c i a s permanen-
tes para a criança. Lembrem-se disso quando estiverem lendo as p r ó x i m a s p á g i n a s .
Os problemas potenciais podem ser agrupados em duas classes: erros g e n é t i c o s e
eventos ambientais nocivos chamados fatores teratogenicos. Os erros g e n é t i c o s ocorrem
A Criança em Desenvolvimento 79

no momento da c o n c e p ç ã o e n ã o podem ser alterados - embora as novas tecnologias pos-


sam acabar mudando isso; os fatores teratogenicos, ao contrário, podem afetar o desenvol-
vimento em qualquer momento a partir da c o n c e p ç ã o .

Erros Genéticos
Em cerca de 3 a 8% de todos os óvulos fertilizados, o material genético c o n t é m erros pro-
vocados por uma meiose imperfeita do e s p e r m a t o z ó i d e ou do óvulo, resultando ou na falta
ou no excesso de cromossomos. As estimativas atuais são de que 90 a 95% desses concep-
tos anormais sejam abortados espontaneamente (Tanner, 1990). Só cerca de 0,5% dos re-
cém-nascidos vivos apresentam essas anormalidades.
Foram identificados mais de 50 tipos diferentes de anomalias c r o m o s s ô m i c a s , algumas
delas muito raras. A mais comum é a s í n d r o m e de Down (também chamada trissomia 21),
na qual a criança tem três cópias do cromossomo 21 em vez das duas normais. Aproximada-
mente 1 em cada 800 a mil b e b é s nasce com essa anormalidade (Rogers et al., 1996). Essas
crianças possuem características faciais distintivas, em especial um rosto achatado e olhos
um pouco oblíquos com uma prega epicântica na pálpebra (como vocês podem ver na foto),
tamanho cerebral total reduzido e, com frequência, outras anormalidades físicas, como de-
feitos cardíacos. Elas apresentam retardo mental.
O risco de ter um filho com este p a d r ã o desviado é consideravelmente maior para as
mães mais velhas. Para uma mulher de 35 anos, o risco é de 1 em 385 nascimentos; aos 45 Observem as características faciais
distintivas desta criança com síndrome
anos, o risco é de 1 em 30 (Centers for Disease Control, 1995a). A pesquisa de epidemiolo-
de Down.
gistas sugere, ainda, um vínculo entre a exposição a vários tipos de toxinas ambientais e o
risco de ter um filho com s í n d r o m e de Down. Por exemplo, u m amplo estudo no C a n a d á
mostra que os homens que trabalham como mecânicos, em fazendas ou em serrarias, regu-
larmente expostos a solventes, óleos, chumbo e pesticidas, correm um risco maior de terem
filhos com s í n d r o m e de D o w n do que os homens que trabalham em ambientes mais limpos
(Olshan et al., 1989). Achados como esse sugerem que as anomalias c r o m o s s ô m i c a s talvez
não sejam eventos apenas casuais, e sim uma resposta a vários fatores teratogenicos. Esses
resultados t a m b é m sublinham o fato de que o pai, assim como a mãe, pode contribuir para
os efeitos teratogenicos.

Ariomalias do Cromossomo Seioai


Uma segunda classe de anomalias, associada a uma divisão incompleta ou incorreta de um
dos cromossomos sexuais, ocorre em aproximadamente 1 de cada 400 nascimentos (Berch
e Bender, 1987). A anomalia mais comum de cromossomo sexual é o p a d r ã o XXY, chamado
síndrome de Klinefelter, presente em aproximadamente 1 de cada 1.000 homens. Os meni-
nos afetados, muitas vezes, parecem normais, embora tenham, como caracterísitica, pernas
e braços longos e testículos pouco desenvolvidos. A maioria n ã o chega a ter retardo men-
tal, mas são comuns as dificuldades de linguagem e de aprendizagem. U m pouco mais raro
é o padrão XYY. Essas crianças t a m b é m se desenvolvem como meninos, s ã o incomumente
altas e apresentam um leve retardo mental. U m p a d r ã o de X único (XO), chamado síndro-
me de Turner, e um p a d r ã o de X triplo (XXX) t a m b é m podem ocorrer, e, em ambos os ca-
sos, a criança se desenvolve como menina. As meninas com s í n d r o m e de Turner - talvez um
em cada 3 mil b e b é s vivos do sexo feminino (Tanner, 1990) - apresentam um crescimento l i -
mitado e, em geral, s ã o estéreis. Sem uma terapia de h o r m ô n i o s , elas n ã o menstruam nem
desenvolvem seios na puberdade. Elas t a m b é m apresentam um desequilíbrio interessante
em suas capacidades cognitivas: com frequência, t ê m u m mau desempenho em testes que
medem a capacidade espacial, mas u m desempenho normal ou acima da m é d i a em testes
de habilidade verbal (Golombok e Fivush, 1994). As meninas com u m p a d r ã o XXX são de ta-
manho normal, mas t ê m u m desenvolvimento físico mais lento. Em contraste com as meni-
nas com s í n d r o m e de Turner, elas apresentam capacidades verbais muito limitadas e um QI
global mais baixo; seu desempenho escolar é especialmente fraco se comparado ao de ou-
tros grupos com anomalias do cromossomo sexual (Bender et al., 1995; Rovet e Netley,
1983).
80 Helen Bee

U m tipo bem difereme de anomalia genética é referido como "X Frágil", a qual ocorre de
forma completa em cerca de 1 de cada 1.300 homens (Adesman, 1996; Rose, 1995). O pro-
blema surge n ã o de um n ú m e r o i m p r ó p r i o de cromossomos, mas de uma m u t a ç ã o de um
gene específico no cromossomo X. O cromossomo X é "frágil" no sentido de que tem uma
t e n d ê n c i a maior a romper naquele lócus, quando exposto a várias substâncias químicas ou
a outros fatores estressantes. Esse é um transtorno herdado, que segue o p a d r ã o de heran-
ça ligada ao sexo ilustrado na Figura 2.3 (ver p. 72).
A maioria dos meninos afetados tem características faciais distintivas, incluindo um ros-
to comprido e fino e um queixo proeminente e pontudo (como na fotografia); orelhas gran-
des e proeminentes t a m b é m s ã o comuns. Quase todos os indivíduos com X Frágil t ê m pelo
menos algum grau de retardo mental; muitas vezes, eles mostram uma queda de 10 pontos
nos escores de QI entre o o e r í o d o de b e b é e a adolescência, um declínio que, com frequên-
cia, leva-os de u m retcuu^ leve para um retardo moderado. As estimativas atuais s ã o de que,
Este menino, diagnosticado com a entre os homens, 5 a 7% de todos os retardos s ã o causados por essa s í n d r o m e (Zigler e Ho-
síndrome do X Frágil, tem o rosto dapp, 1991).
comprido e fino, e o queixo
proeminente, características comuns
nesta anormalidade.
Um outro problema que pode ocorrer na c o n c e p ç ã o é a criança herdar um gene para uma
d o e n ç a específica. A grande maioria dessas d o e n ç a s é causada por um gene recessivo e,
portanto, segue o p a d r ã o de h e r a n ç a mostrado na Figura 2.2 (ver p. 71). Eu listei alguns
exemplos na Tabela 2.4, mas essa lista n ã o chega a transmitir a grande diversidade desses
transtornos. Entre causas conhecidas de retardo mental, por exemplo, existem 141 doen-
ças ou transtornor- >: . i > lócus g e n é t i c o conhecido e outros 361 cujo lócus ainda n ã o foi iden-
tificado (Wahlstrcur 1990).

Tabela 2A Algumas das Principais Doenças Herdadas


Fenilcetonúria Transtorno metabólico que impede o metabolismo de um aminoácido
comum (fenilalanina). O tratamento consiste em uma dieta especial, livre
de fenilalanina. A criança não pode ingerir uma série de alimentos,
incluindo o leite. Se não seguir uma dieta especial logo depois do
nascimento, a criança, em geral, fica com um grave retardo. Afeta apenas
1 em 8 mil crianças. Atualmente, os testes diagnósticos para esse
transtorno são rotina no nascimento; ele não pode ser diagnosticado
antes de a criança nascer.

Doença de Tay-Sachs Doença degenerativa do sistema nervoso invariavelmente fatal; quase


todas as vítimas morrem nos primeiros três ou quatro anos de vida. Este
gene é mais comum entre os judeus originários da Europa Oriental, entre
os quais ocorre em 1 em cada 3.500 nascimentos. Pode ser
diagnosticada antes do nascimento, pela amniocentese ou amostragem
viio-coriônica.

Anemia falciforme Doença sanguínea às vezes fatal, a qual, entre outros sintomas, manifesta-
se por dor nas articulações e maior suscetibiiidade a infecções. O gene
para essa doença é portado por cerca de 2 milhões de americanos,
especialmente negros. Já pode ser diagnosticada antes do nascimento,
pela amniocentese ou amostragem vilo-coriônica.

Fibrose cística Doença fatal que afeta os pulmões e o trato intestinal. Muitas crianças
com fibrose cística agora vivem até depois dos 20 anos. O gene é portado
por mais de 10 milhões de americanos, especialmente brancos. Nas
famílias afetadas pela doença, os portadores podem ser identificados
antes da gravidez, e as crianças afetadas podem ser diagnosticadas antes
do nascimento. Dois portadores têm uma chance em quatro de ter um
filho com fibrose cística em cada gravidez.

Distrofia muscular Doença muscular degenerativa fatal, localizada no cromossomo X e,


portanto, encontrada quase exclusivamente entre os meninos. O gene
para o tipo mais comum de distrofia muscular, a de Duchenne, foi
localizado, e atualmente é possível o diagnóstico pré-natal.
A Criança em Desenvolvimento 81

MÊí O Mundo Real


Diagnóstico Pré-Natal de Erros Genéticos

Até poucos anos atrás, quando uma criança era concebida, mente realizada na 10712^ semana de gestação, a amostra é
: ela nascia com as deformidades, d o e n ç a s ou anomalias que retirada das células da membrana que envolve o embrião, cha-
• porventura acontecessem. Os pais não tinham nenhuma esco- mada córion, que vai se tornar a placenta; na amniocentese, em
jha. Hoje em dia, essa situação já é diferentes, pois os pais têm geral realizada por volta da 15^ semana de gestação, a amostra
•acesso a muitos tipos de testagem genética, de aconselhamen- é do líquido amniótico.
to genético e de testes pré-natais diagnósticos capazes de de- Tanto a amostragem vilo-coriônica como a amniocentese
tectar anormalidades fetais. dão informações sobre qualquer uma das anomalias cromossô-
micas e sobre a presença de genes de muitas das d o e n ç a s ge-
Testagem Genética Pré-Gravidez. Antes de engravidar, você
néticas mais importantes. Cada técnica tem vantagens e des-
e seu marido podem fazer testes de sangue que vão apontar se
vantagens. A amniocentese foi a primeira a ser desenvolvida e é
vocês são portadores de genes para aquelas d o e n ç a s específi-
mais amplamente utilizada. Sua maior desvantagem é a seguin-
cas de lócus conhecido, como a Tay-Sachs ou a anemia falci-
te: uma vez que o saco amniótico deve estar grande o suficien-
forme. Uma vez que ainda não foram determinadas as localiza-
te para permitir a retirada de uma amostra do líquido com risco
ções de todas as d o e n ç a s genéticas, os portadores de muitas
pequeno para o feto, o teste não pode ser feito a t é a gravidez
doenças não podem ser identificados dessa maneira. No entan-
estar em um estágio adiantado, e os resultados, com frequên-
to, essa análise genética pode ser um passo importante se vo-
cia, ficam prontos na 17^ ou 18- semana de gestação, já no 2°
.;çê e seu mando pertencem a um subgrupo com probabilidade
trimestre. Se o teste revelar alguma anormalidade, e os pais de-
"de portar determinados genes recessivos.
cidirem abortar, é muito tarde para tal prática ser realizada. A
Diagnóstico Pré-Natal do Feto. Atualmente existem quatro amostragem vilo-coriônica, ao contrário, é realizada em um mo-
, estratégias de diagnóstico pré-natal. Duas delas, o teste de al- mento anterior a este, de modo que os pais podem tomar deci-
fa-fetoproteína (AFP) e o ultra-som, s ã o usadas principalmente s õ e s antes de a gravidez estar tão adiantada. Por outro lado, a
para detectar problemas na formação do tubo neural, a estrutu- amostragem vilo-coriônica está associada a índices um pouco
ra que se transformará no cérebro e na medula espinal. Se o tu- mais altos de aborto espontâneo do que a amniocentese.
bo não se fechar na extremidade inferior na 4® semana de ges- (Quando a amniocentese é realizada com 12 semanas, também
tação, vai ocorrer uma incapacidade chamada espinha bífida está ligada a índices mais elevados de aborto espontâneo [Ca-
As crianças com este defeito (nascem em torno de 1.500 por nadian Early and Mid-Trimester Amniocentesis Trial Group,
.ano nos Estados Unidos), muitas vezes, s ã o parcialmente para- 1998].) A amostragem vilo-coriônica também está associada a
.lisadas e muitas (mas não todas) s ã o retardadas. um nsco levemente maior de membros e dedos ausentes ou
A alfa-fetoproteína é uma substância produzida pelo feto e anormais (Centers for Disease Control, 1995a). O risco absolu-
detectável no sangue da mãe. Se os níveis forem anormalmen- to dessas anormalidades ainda é baixo, mesmo com a amostra-
te elevados, pode haver algum problema com a medula espinal gem vilo-coriônica - cerca de 3,5 casos por 10 mil procedimen-
bu com o cérebro. O teste de sangue, em geral, não é realizado tos de amostragem vilo-coriônica - , mas ainda é mais alto do
até o 2° trimestre. Se o valor de AFP for alto, isso não significa que quando não foi realizado o exame.
que existe, em realidade, um problema; significa que há um ris- Devido aos riscos associados aos dois procedimentos, os
co maior de problemas, sendo indicados, nesse caso, testes pais precisam refletir com cuidado sobre as o p ç õ e s . A maioria
adicionais. dos médicos recomenda um dos dois para as mulheres com
Um outro teste é o ultra-som, o qual envolve o uso de ondas mais de 35 anos, devido ao risco maior de síndrome de Down,
sonoras para criar um verdadeiro "filme" do feto. Com esse mé- e para aquelas com um risco familiar conhecido op provável de
todo, frequentemente é possível detectar, ou descartar, defeitos alguma d o e n ç a herdada específica, como a Tay-Sachs ou a fi-
do tubo neural ou outras anormalidades físicas. O procedimento brose cística.
não é doloroso e proporciona aos pais a oportunidade, em geral Quando vocês se depararem com tal escolha, a decisão po-
deliciosa, de ver seu bebé não-nascido em movimento; muitas derá ser mais simples: talvez haja técnicas diagnosticas mais
vezes, ele também mostra se o feto é um menino ou uma meni- novas e mais seguras, utilizando amostras do sangue rfiaterno.
na. Contudo, o ultra-som não d á informações sobre a presença Evidências experimentais já indicam que uma técnica assim tal-
de anomalias cromossômicas ou sobre d o e n ç a s herdadas. vez seja adequada para diagnosticar a síndrome de Down ou
Se quiserem as informações mais atuais, vocês têm duas mesmo o sexo do feto (Lo etal., 1989; Wald et al., 1988). Entre-
escolhas: a amniocentese ou a amostragem vilo-coriônica. Em tanto, independentemente da técnica escolhida, as escolhas
ambos os casos, é usada uma agulha para retirar pequenas morais e éticas que talvez vocês sejam obrigados a fazer, com
amostras de células. Na amostragem vilo-coriônica, normal- certeza n ã o serão fáceis.
82 Helen Bee

Os geneticistas estimam que o adulto m é d i o carrega genes para quatro diferentes


d o e n ç a s ou anormalidades recessivas (Scarr e Kidd, 1983), mas para nenhuma d o e n ç a a dis-
tribuição dos genes é aleatória. Por exemplo, os genes para a anemia falciforme s ã o muito
mais comuns entre os negros, e a Tay-Sachs é muito mais comum entre os judeus origina-
dos do leste da Europa.

Fatores Teratogenicos: Doenças e Drogas


o desenvolvimento pré-natal anormal t a m b é m pode ser resultado de variações no meio am-
biente em que o embrião/feto se desenvolve. No Capítulo 1, eu mencionei que o efeito da
maioria dos fatores teratogenicos parece depender muito do seu timing (um exemplo de pe-
ríodos críticos). Isto é, um determinado fator teratogênico, como uma droga ou uma doença
da mãe, só resultará em um defeito no e m b r i ã o ou feto se ocorrer durante um p e r í o d o espe-
cífico de dias ou semanas na vida pré-natal. A regra geral diz que cada sistema de ó r g ã o s -
é mais vulnerável a alterações no momento em que está se desenvolvendo com mais rapi-
dez (Moore e Persaud, 1993). Uma vez que o desenvolvimento mais r á p i d o da maioria dos

Período fetal A
Idade do embrião (em semanas) (em semanas)* -termo

1 2 4 5 6 7 8 9
Período de • Indica o local comum de dano causado pelo fator teratogênico
divisão do zigoto,
implantação Palato Ouvido
e embrião Olho uvid
bilaminar

Membros
Dentes

Sistema nervoso central

Coração
I I
Membros superiores

Olhos

Membros inferiores

Dentes

Palato

Não- Genitália externa


suscetível a fatores
teratogenicos Ouvidos
\

Morte Anomalias congénitas maiores Defeitos funcionais e


pré-natal anomalias congénitas menores

Figura 2.8
Períodos críticos no desenvolvimento pré-natal de várias partes do corpo. A parte lilás de cada linha significa o período durante o qual qualquer fator
teratogênico provavelmente produzirá uma deformidade estrutural maior naquela parte específica do corpo. A parte laranja de cada linha mostra o
período em que podem resultar problemas menores. O período embrionário, em geral, é o momento de maior vulnerabilidade.

F o n f e : M o o r e , K.L. e P e r s a u d , T , The Developing Human: Clinically Oriented Embryology, 5. e d . , © 1 9 9 3 ,d e W.B. Saunders. C o m permissão.
A Criança em Desenvolvimento 83

squísa
Fator Rh: Um Outro Tipo d e Problema Genético

Um outro problema possível, a incompatibilidade do fator Rh, substância química no b e b é chamada bilirrubina. Os b e b é s
não é nem um defeito genético nem uma doença herdada, e com altos níveis de bilirrubina têm uma aparência muito amare-
sim uma incompatibilidade entre os genes da m ã e e os do be- lada; se não tratada, pode levar à lesão cerebral.
bé. Um dos muitos fatores no sangue é a presença ou a ausên- O risco de danos para o feto aumenta com cada gravidez
cia de um antígeno das células vermelhas do sangue, chamado sucessiva em que uma m ã e Rh- espera um filho Rh-t-. Na maior
fator Rh porque os macacos rhesus o têm. Os humanos que parte das vezes, a placenta mantém separados os dois siste-
têm este fator são chamados Rh-h (Rh positivo), enquanto aque- mas sanguíneos, mas, durante o nascimento, normalmente
les que não o têm s ã o chamados Rh- (Rh negativo). Apenas ocorre alguma mistura. Assim, a p ó s o primeiro bebé, a m ã e
cerca de 15% dos brancos e 5% dos negros nos Estados Uni- produz anticorpos. No caso de um segundo bebé incompatível,
dos s ã o Rh-; a maioria dos asiáticos e dos americanos nativos esses anticorpos atacam o sangue dele, produzindo efeitos ne-
éRh+. gativos,
Haverá problemas se a mãe for Rh- e o bebé Rh+. Pelo fato O problema costumava ser tratado com medidas extremas,
de o Rh-i- ser dominante, um bebé com um pai Rh+ poderia her- como uma troca completa do sangue do bebé logo depois do
dar dele um gene Rh-t-, mesmo que a m ã e seja Rh-. Se o san- nascimento para remover todos os anticorpos. Felizmente, os
gue da mãe e o do bebé se misturam no útero, o corpo da m ã e cientistas descobriram um tratamento muito mais simples e se-
considera o fator Rh+ do bebé como uma substância estranha, guro. Logo a p ó s o nascimento do primeiro filho, s ã o injetados
e seu sistema imunológico tenta lutar contra ele produzindo an- anticorpos na m ã e Rh- que vão remover de seu sistema todas
ticorpos. Esses anticorpos atravessam a placenta e atacam o as células Rh-i-, para assim proteger os b e b é s subsequentes,
sangue do bebé, decompondo as hemácias e produzindo uma mesmo que eles também sejam Rh-i-,

sistemas orgânicos ocorre durante as primeiras 8 a 10 semanas de gestação, este é o perío-


do de maior risco para a maioria dos fatores teratogenicos. A Figura 2.8 (ver p. 82) mostra
os momentos m á x i m o s de vulnerabilidade das diferentes partes do corpo.
Dos muitos fatores teratogenicos, os mais críticos provavelmente sejam as drogas i n -
geridas pela m ã e e as d o e n ç a s que ela tem ou pode contrair durante a gravidez.

Existem pelo menos três mecanismos por meio dos quais uma d o e n ç a na m ã e pode afetar
o embrião ou o feto. Algumas d o e n ç a s , em particular os vírus, podem atacar a placenta, re-
duzindo os nutrientes disponíveis para o e m b r i ã o . Outras d o e n ç a s t ê m m o l é c u l a s t ã o pe-
quenas que atravessam os filtros placentários e atacam diretamente o e m b r i ã o ou feto.
Exemplos desse tipo incluem rubéola, citomegalovírus (CMV), sífilis, difteria, gripe, tifo, he-
patite sérica e varicela (catapora). O terceiro m é t o d o de t r a n s m i s s ã o ocorre durante o nas-
cimento: d o e n ç a s presentes nas membranas mucosas do canal do nascimento podem i n -
fectar o bebê. O herpes simples, por exemplo, é transmitido dessa maneira. As pesquisas
atuais sugerem que a AIDS seja transmitida tanto durante a gravidez, através da placenta,
como durante o parto. Além disso, a AIDS pode ser transmitida através do leite materno
após o nascimento (Van de Perre et lÁ., 1991). Entre as d o e n ç a s de maior risco para o b e b ê
estão a rubéola, a AIDS e o CMV.
Rubéola. O p e r í o d o crítico para u m efeito negativo da r u b é o l a ( t a m b é m chamada "sa-
rampo alemão") são as primeiras semanas de g e s t a ç ã o . A maioria dos b e b é s expostos a ela
nas primeiras quatro ou cinco sei lanas apresenta alguma anormalidade, enquanto apenas
cerca de 10% dos que foram expostos nos seis meses finais da gravidez s ã o negativamente
afetados (Moore e Persaud, 1993). Surdez, catarata e defeitos cardíacos s ã o as anormalida-
des mais comuns.
Felizmente, a r u b é o l a é evitável. Existe a vacina e ela deve ser aplicada em todas as
crianças como parte de um programa regular de imunização. As mulheres adultas que n ã o
foram vacinadas quando crianças podem fazê-lo em outros momentos, mas esse cuidado
deve ser tomado pelo menos três meses antes de uma gravidez, para garantir completa
imunidade.
Ê

84 Helen Bee

AIDS. Estima-se que existam no mundo 3 m i l h õ e s de mulheres infectadas com o HIV, o


vírus que causa a AIDS, e o n ú m e r o de mulheres infectadas, em idade de procriar, é cada
vez maior Nos Estados Unidos, o n ú m e r o é de 1,7 em cada m i l mulheres. (Centers for Di-
sease Control, 1995b). Em áreas com uma grande p o p u l a ç ã o de u s u á r i o s de drogas, como
as favelas, 3 a 5% de todas as mulheres g r á v i d a s e s t ã o infectadas pelo HIV. Aproximada-
mente 7 m i l b e b é s nascem anualmente de m ã e s infectadas (Centers for Disease Control,
1996c).
Estes n ú m e r o s sombrios s ã o c o n t r a b a l a n ç a d o s por algumas boas notícias. Em primei-
ro lugar, já sabemos que apenas u m quarto dos b e b é s nascidos de m ã e s infectadas com o
HIV é infectado (Abrams et al., 1995; Newell e Peckham, 1994). A t r a n s m i s s ã o parece ser
muito mais provável quando a m ã e desenvolveu os sintomas da d o e n ç a do que quando ela
é HIV positivo, mas ainda n ã o apresenta sintomas (Abrams et al., 1995).
Ainda mais encorajador é o achado de que as mulheres infectadas tratadas com a dro-
ga AZT (tecnicamente chamada zidovudina] durante a gravidez correm um risco muito me-
nor de transmitir a d o e n ç a para o b e b ê - cerca de 8% (Centers for Disease Control, 1994b;
Fícus et al., 1996). Como a maioria das mulheres H I V positivo é a s s i n t o m á t i c a e n ã o sabe
que está infectada, os Centers for Disease Control recomendam como rotina o aconselha-
mento sobre o H I V e a testagem voluntária para todas as mulheres g r á v i d a s no início da
Pensamento Crítico
gestação, para que possam c o m e ç a r u m tratamento com AZT caso seja necessário.
Deveria ser exigido que todas as
CMV. Uma d o e n ç a bem menos conhecida, mas surpreendentemente alastrada e poten-
mullieres grávidas fizessem o teste
cialmente séria é o citomegalovírus (CMV), u m vírus do grupo do herpes. Ele, nos dias de
de HIV? A ética médica tem
hoje, é considerado a causa infecciosa conhecida mais importante de retardo mental e de
apresentado sólidos argumentos a
surdez c o n g é n i t a . O C M V causa poucos, se é que causa algum, sintomas no adulto. Na
favor e contra essa posição. O que
maioria dos casos, a pessoa afetada nem sequer sabe que possui o vírus, embora, em uma
você acha?
fase ativa, ele, às vezes, provoque sintomas semelhantes aos da mononucleose, incluindo
gânglios intumescidos e uma febrícula. Todavia, nos b e b é s infectados na fase pré-natal ou
durante o nascimento, o vírus pode provocar sérias incapacidades.
Quase a metade de todas as mulheres em idade de procriar t ê m anticorpos para o CMV
(Spector, 1996), indicando que foram infectadas em algum momento no passado. Talvez 2%
dos b e b é s cujas m ã e s possuem anticorpos para o C M V sejam infectados antes de nascer, o
que significa que cerca de 1 em cada 100 b e b é s é infectado congenitamente. Quando a mãe
é infectada durante a gravidez, o índice de t r a n s m i s s ã o é muito mais alto - na ordem de
40% (Nelson e Demmler, 1997). Nos Estados Unidos, esses diferentes índices de infecção
significam que por volta de 40 mil b e b é s nascem a cada ano apresentando resultado positi-
vo para este vírus. Desses 40 mil nascimentos, de 10 a 20% apresentam a s í n d r o m e congé-
nita no nascimento ou no primeiro ano de vida, a qual inclui vários sintomas de dano neu-
rológico, entre os quais retardo mental, tamanho pequeno da cabeça e calcificações no cé-
rebro. Surdez, problemas de visão e problenias d e n t á r i o s t a m b é m s ã o comuns. Cerca de
30% dos b e b é s que apresentam essa s í n d r o m e m o r r e m no p e r í o d o de b e b ê (Hagay et al.,
1996).
A t r a n s m i s s ã o parece seguir os mesmos três caminhos que vimos no H I V durante a
gravidez, durante o parto e durante a a m a m e n t a ç ã o . Todavia, diferentemente do que acon-
tece na infecção do HIV, os pesquisadores ainda n ã o encontraram nenhum tratamento efe-
tivo para o CMV na gravidez e ainda n ã o se recomenda qualquer forma de p r o t e ç ã o para a
grávida.
Tomadas juntas, essas informações sobre o C M V podem ser apavorantes para as mu-
lheres que estão g r á v i d a s ou que planejam engravidar: esta é uma d o e n ç a comum, que po-
de ter efeitos negativos c o n s i d e r á v e i s sobre o b e b ê , e n ã o h á nada que possamos fazer a
respeito. (Está sendo desenvolvida uma vacina, mas ela ainda n ã o está disponível [Nelson e
Demmler, 1997].) Entretanto, vejam as estatísticas: se a d o e n ç a da m ã e n ã o está ativa, me-
nos de 1 % dos b e b é s é infectado. Entre os que s ã o infectados, apenas 10 a 20% apresentam
sintomas da d o e n ç a - o que significa que no m á x i m o quatro de cada mil b e b é s cujas mães
possuem um anticorpo inativo a p r e s e n t a r ã o algum efeito. Até a l g u é m encontrar um trata-
mento ou desenvolver uma vacina, n ã o posso ser mais otimista do que isso.
Herpes Simples. Como o CMV, o vírus do herpes pode ser transmitido ao feto durante o
parto se a d o e n ç a da m ã e está na fase ativa naquele momento. A criança n ã o só terá perio-
dicamente as lesões genitais características da d o e n ç a , como t a m b é m s ã o possíveis outras
complicações, em particular uma inflamação potencialmente séria do c é r e b r o e da medula
A Criança em Desenvolvimento

espinal, chamada meningoencefalite. Em virtude desse risco maior, muitos m é d i c o s reco-


mendam o parto cirúrgico (cesariana) dos b e b é s de m ã e s com herpes, embora o parto va-
ginal seja possível se a d o e n ç a estiver inativa.

Drogas Usadas pela Mlàe


Na atualidade, existe uma vasta literatura sobre os efeitos das drogas pré-natais, envolven-
do tudo, da aspirina aos antibióticos, do álcool à cocaína. Identificar os seus efeitos tem si-
do uma tarefa bastante desafiadora, n ã o só porque é impossível designar mulheres de for-
ma aleatória para vários grupos de u s u á r i o s de drogas para testar os efeitos experimental-
mente, mas t a m b é m porque, de fato, muitas mulheres usam múltiplas drogas durante a
gravidez. Por exemplo, as mulheres que fazem ingestão de bebidas alcoólicas t a m b é m apre-
sentam maior probabilidade de fumar; as que usam cocaína t a m b é m tendem mais a usar
outras drogas ilegais ou a fumar ou a beber em excesso. A tarefa fica ainda mais difícil pelo
fato de os efeitos das drogas serem sutis, visíveis apenas muitos anos a p ó s o nascimento da
criança, na forma de dificuldades de aprendizagem ou de maior risco de problemas de
comportamento. No entanto, estamos nos aproximando de algumas c o n c l u s õ e s bastante
claras em várias á r e a s . Vejamos alguns exemplos.
Cigarro. Um resultado consistente se destaca do grande corpo de pesquisas sobre os
efeitos do cigarro: os b e b é s de m ã e s que fumam são, em média, 250 gramas mais leves no
nascimento do que os b e b é s de m ã e s n ã o - f u m a n t e s (Floyd et al., 1993) e é duas vezes mais
provável que n a s ç a m com menos de 2.500 gramas, a definição comum de baixo peso no
nascimento. Quanto mais a m ã e fumar, maior será o impacto negativo sobre o peso do be-
bé (Nordentoft et al., 1996) e quanto mais velha a mãe, mais provável que o cigarro esteja l i -
gado ao baixo peso no nascimento (U.S. Bureau of the Census, 1997). O mecanismo causal
parece funcionar desta maneira: a nicotina contrai os vasos s a n g u í n e o s , diminuindo o flu-
xo de sangue e a n u t r i ç ã o para a placenta. O resultante baixo peso no nascimento tem vá-
rias possíveis c o n s e q u ê n c i a s negativas, sobre as quais falarei depois.
A ideia parece clara: o mais seguro é n ã o fumar durante a gravidez. Se você fuma, pa-
re de fumar assim que souber que está grávida. As fumantes que abandonam o cigarro no
início da gravidez apresentam os mesmos índices de b e b é s com baixo peso que as não-fu-
mantes (Ahlsten et al., 1993). As pesquisas ainda mostram uma relação entre a "dose" (a
quantidade de nicotina ingerida) e a gravidade das c o n s e q u ê n c i a s para a criança. Portanto,
se você n ã o conseguir parar completamente, pelo menos reduza o uso do cigarro.
Álcool. Qs trabalhos recentes sobre os efeitos da i n g e s t ã o materna de álcool sobre o
desenvolvimento pré-natal e pós-natal t a m b é m transmitem uma clara mensagem - a mes-
ma mensagem que tentei transmitir à minha nora: por s e g u r a n ç a , n ã o beba durante a gra-
videz.
Os efeitos do álcool sobre o feto em desenvolvimento variam de moderados a graves.
Em uma extremidade do c o n t í n u o estão as crianças que apresentam a s í n d r o m e a l c o ó l i -
ca fetal (SAF), a qual afeta de 0,5 a 3 em cada mil b e b é s nos Estados Unidos (Stratton et al.,
1996). Projetando esses n ú m e r o s para todas as crianças nascidas nos Estados Unidos, isso
significa que, a cada ano, nascem de 2 a 12 mil crianças com SAF. Essas crianças, cujas m ã e s
são usuárias crónicas ou alcoolistas, em geral, s ã o menores que o normal, com c é r e b r o s
menores e, muitas vezes, com anomalias ou deformidades físicas claras (Swayze et al., 1997).
Elas frequentemente t ê m defeitos cardíacos, e seus rostos compartilham certas caracterís-
ticas (visíveis nas duas fotos da Figura 2.9, p. 86), como nariz e ponte nasal achatados, e,
muitas vezes, um e s p a ç o incomumente longo entre o nariz e a boca. Como crianças, adoles-
centes e adultos, eles s ã o sempre menores que o normal, t ê m cabeça menor e escores de QI
no intervalo de retardo mental leve. Na verdade, a SAF é a maior causa conhecida de retar-
do nos Estados Unidos, superando inclusive a s í n d r o m e de Down (Streissguth et al., 1991).
Os adultos com SAF apresentam índices muito elevados de d o e n ç a mental e t a m b é m pro-
blemas com a lei, com drogas e álcool, entre outras dificuldades (Streissguth, 1997).
Evidências recentes apontam ainda para efeitos mais leves da i n g e s t ã o moderada ou
"social" de álcool, tal como dois copos de vinho por dia. Os filhos de m ã e s que consomem
esse nível de álcool durante a gravidez apresentam uma probabilidade maior de terem QI
inferior a 85 e dificuldade de c o n c e n t r a ç ã o . No Relato de Pesquisa (p. 87), darei alguns deta-
86 Helen Bee

Figura 2.9
Estas duas crianças, de raças e de países diferentes, foram diagnosticadas como tendo síndrome alcoólica fetal (SAF). Ambas são mentalmente
retardadas e possuem a cabeça relativamente pequena. Observem também o nariz curto e a ponte nasal baixa, típica das crianças com SAR (© de
George Steinmetz.)

lhes sobre um dos melhores estudos nesta área, para que vocês tenham uma ideia de como
os investigadores t ê m estudado tal problema.
Ainda n ã o sabemos se existe um nível seguro de consumo de álcool durante a gravi-
dez, embora a maioria dos pesquisadores que trabalham nesse campo esteja convencida de
que existe uma relação linear entre a quantidade de álcool ingerida (a "dose") e o risco para
o b e b ê . Isso significa que, mesmo uma i n g e s t ã o pouco freqiiente, em uma dosagem baixa,
aumenta o risco. Bebedeiras ocasionais, como cinco ou mais doses em uma mesma ocasião,
são significativamente mais perigosas (Olson et a l , 1992; Streissguth et al., 1990). Diante da
nossa atual ignorância, a atitude mais segura é n ã o beber nada.
Cocaína. U m n ú m e r o significativo de mulheres g r á v i d a s nos Estados Unidos (e, presu-
mivelmente, em outros lugares do mundo) t a m b é m utiliza várias drogas ilegais, sobretudo
a cocaína. As estimativas atuais mais exatas s ã o de que quase 3% de todos os b e b é s nasci-
dos nos Estados Unidos tenham sido expostos à cocaína antes do nascimento. Em alguns
hospitais de zonas pobres, cerca de 50% das parturientes usaram cocaína ou crack durante
a gravidez (Shore, 1997).
A cocaína parece atravessar com rapidez a barreira placentária. Cerca de um terço dos
b e b é s expostos à cocaína nasce prematuramente e, entre aqueles que nascem a p ó s um pe-
ríodo normal de gestação, muitos t ê m um peso abaixo do normal no nascimento. Além dis-
Pensamento Crítico so, os b e b é s expostos à cocaína correm um risco três vezes maior de terem uma circunfe-
Uma outra questão envolvendo rência pequena de c a b e ç a ou algum sinal de anormalidade n e u r o l ó g i c a (Needlman et al.,
ética médica para você refletir: 1995; Singer et al., 1993). Alguns (mas n ã o todos) apresentam ainda sintomas significativos
atualmente existem muitos casos de abstinência da droga após o nascimento, como irritabilidade, inquietude, choro estriden-
de mulheres grávidas sendo te e tremores. O que ainda n ã o está claro é se alguma consequência, a longo prazo, pode ser
mantidas em custódia para evitar claramente atribuída à exposição à cocaína na fase pré-natal. Alguns estudos apontam efei-
que bebam em excesso ou que tos negativos a longo prazo (por exemplo, Bender et a l , 1995), enquanto outros n ã o o fazem
usem drogas, pois o tribunal teria a (Griffith et al., 1994; Richardson e Day, 1994). O mais provável é que a exposição pré-natal à
responsabilidade de evitar danos cocaína, como a exposição pré-natal ao álcool, tenha efeitos permanentes sobre a criança,
para o bebê. O que você acha mas esses efeitos s ã o sutis e, portanto, difíceis de identificar Por enquanto, n ó s apenas não
disso?
sabemos quais podem ser esses efeitos a longo prazo (Lester et al., 1995).
A Criança em Desenvolvimento 87

O Estudo de Streissguth sobre a Exposição Pré-Natal ao Álcool

o melhor estudo das consequências da exposição pré-natal ao Streissguth, além disso, teve o cuidado de obter informa-
álcool foi realizado por Ann Streissguth e seus colegas (Olson et ções sobre outras drogas usadas durante a gravidez, incluindo
al., 1992; Streissguth et al., 1980, 1981, 1984, 1989, 1990, o cigarro, e perguntou à s m ã e s sobre sua dieta, sobre seu grau
1995), que acompanharam um grupo de mais de 500 mulheres de instrução e sobre seus hábitos de vida. Ela descobriu que
e crianças desde o início da gravidez. Como o estudo foi inicia- essa ligação entre o consumo de álcool e os resultados prejudi-
do antes dos alertas sobre o possível impacto do álcool duran- ciais para a criança existe, mesmo quando todas essas outras
te a gravidez, a amostra inclui muitas mulheres com bom nível variáveis s ã o controladas estatisticamente.
de instrução, de classe média, com boas dietas, as quais não fi- Deixando de lado aqueles casos em que a criança foi diag-
zeram uso recreativo de outras drogas, mas fizeram uso de be- nosticada com a síndrome alcoólica fetal completa, os efeitos de
bidas alcoólicas de forma moderada ou acentuada enquanto níveis moderados de álcool durante a gravidez não s ã o grandes
estavam grávidas - uma série de condições que seria impossí- em termos absolutos, mas têm consequências práticas significa-
vel duplicar atualmente, pelo menos nos Estados Unidos ou em tivas. Por exemplo, a diferença nos escores de QI aos 7 anos de
outros países onde os riscos foram bastante apregoados. idade entre os filhos de mães abstêmias e os filhos de mães que
Streissguth testou repetidas vezes as crianças, c o m e ç a n d o bebiam 30ml ou mais de álcool por dia durante a gravidez (mais
imediatamente após o nascimento, mais uma vez no período de ou menos equivalente a 60ml de bebidas destiladas com alto
bebê, aos 4 anos de idade, em idade escolar e, novamente, aos teor alcoólico ou 240ml de vinho) foi de aproximadamente 6 pon-
11 e aos 14 anos. Ela descobriu que o consumo materno do ál- tos, apenas, na amostra de Streissguth (Streissguth et al., 1990).
cool na gravidez estava associado à lentidão e a um sugar mais Contudo, essa diferença absoluta relativamente pequena signifi-
fraco no período de bebê; escores mais baixos em medidas de ca que três vezes mais crianças expostas ao álcool têm QI infe-
inteligência aos 8 meses, 4 e 7 anos; problemas de atenção e rior a 85 se comparadas aos filhos das m ã e s abstêmias. As
vigília aos 4 , 7 , 1 1 e 14 anos. Os professores também avaliaram crianças expostas ao álcool estão, desse modo, muito mais re-
as crianças de 11 anos em relação ao desempenho escolar glo- presentadas nas classes especiais das escolas e, provavelmen-
bal e a outros problemas de comportamento, e, em ambas as te, também aparecem em números muito maiores entre os que
medidas, as crianças cujas m ã e s haviam consumido mais ál- abandonam a escola no ensino médio e os desempregados na
cool durante a gravidez tiveram uma avaliação significativamen- idade adulta - embora essa ligação precise ser confirmada por
te inferior. estudos longitudinais mais prolongados.

Outros fatores teratogenicos incluem quantidades excessivas de vitamina A, a droga dieti-


lestilbestrol, o m e t i l m e r c ú r i o e o chumbo. Suspeitamos que muitas outras drogas ou subs-
tâncias químicas s ã o fatores teratogenicos, mas temos informações insuficientes sobre elas
para termos certeza disso. A última categoria inclui a m e d i c a ç ã o anticonvulsivante tomada
por epiléticas, os bifenis policlorinados (PCBs, compostos amplamente utilizados em trans-
formadores elétricos e tintas), a radiação em altas doses, a aspirina, alguns antidepressivos
e outras medicações prescritas, alguns h o r m ô n i o s artificiais e alguns pesticidas (Vorhees e
Mollnow, 1987). N ã o há e s p a ç o para entrar em detalhes sobre o que sabemos (ou n ã o sabe-
mos) em cada caso, mas eu gostaria de dizer apenas algumas palavras sobre os itens mais
significativos dessa lista em termos práticos.
Dietilestilbestrol (DES). O DES é um e s t r ó g e n o sintético que, em certa época, era comu-
mente administrado a mulheres g r á v i d a s para evitar abortos. As filhas dessas mulheres
apresentaram índices mais elevados de alguns tipos de câncer; os filhos do sexo masculino
apresentaram índices mais altos de malformações congénitas da genitália. Algumas pesqui-
sas - mas n ã o todas - sugerem que os filhos t a m b é m apresentam índices mais altos de i n -
fertilidade (Rosenblith, 1992, Wilcox et al., 1995).
Vitamina A. Essa vitamina, em pequenas doses, é essencial para o desenvolvimento do
embrião; entretanto, quando ingerida em doses muito grandes durante os primeiros dois
meses de gravidez - 1 0 mil Unidades Internacionais (UI) ou mais por dia - pode aumentar o
risco de defeitos c o n g é n i t o s , em particular m a l f o r m a ç õ e s da cabeça, do rosto, do c o r a ç ã o e
Helen Bee

do sistema nervoso (por exemplo, Rothman et al., 1995). A dose diária recomendada de vi-
tamina A é de 2.700 U I . A maioria das pílulas de vitamina c o n t é m 4 mil ou 5 mil unidades,
mas algumas marcas chegam a 10 mil, e c á p s u l a s de vitamina A pura podem conter até 25
mil unidades. Se você está grávida ou planejando uma gravidez, verifique sua ingestão des-
sa vitamina.
Aspirina. Entre as drogas de uso mais amplo, a aspirina é t e r a t o g ê n i c a em animais
quando administrada em doses elevadas. Os seres humanos poucas vezes tomam doses ele-
vadas o suficiente para produzir diretamente esses efeitos, mas parece que a aspirina, em
quantidades moderadas, pode ter efeitos negativos sobre o feto humano se ingerida junto
com o ácido benzóico, uma s u b s t â n c i a química muito utilizada como conservante alimen-
tar, como no ketchup. Essa c o m b i n a ç ã o , em especial no primeiro trimestre, parece aumen-
tar o risco de malformações físicas no embrião/feto.
Chumbo. Na maioria dos países industrializados, os adultos estão expostos a dosagens
bastante altas de chumbo, embora a i n t r o d u ç ã o da gasolina sem chumbo tenha ajudado
significativamente a diminuí-las. O mesmo aconteceu com a eliminação de tintas à base de
chumbo em 1978 nos Estados Unidos, embora as casas c o n s t r u í d a s antes de 1978 provavel-
mente ainda possuam pelo menos alguma tinta à base de'chumbo. As crianças podem ser
expostas ao chumbo antes do nascimento (através dos níveis de chumbo no sangue da mãe)
ou depois do nascimento pelo contato com tintas à base de chumbo (respirando poeira de
tinta em uma casa mais antiga, mordendo o peitoril pintado de uma janela com essa tinta),
pelo cano de escapamento do carro ou pelo fato de morar perto de uma fábrica que emita
altos níveis de chumbo.
Tendo em vista que a maioria das crianças expostas a altos níveis de chumbo antes do
nascimento também é exposta a altos níveis desse meta! depois de nascer, é muito difícil
distinguir o impacto do chumbo na fase pré-natal. As melhores informações v ê m de exce-
lentes estudos longitudinais que acompanharam c r i a n ç a s durante a infância, a partir do
nascimento (por exemplo, Baghurst et al., 1992, 1995; Dietrich et al., 1993). Esses pesquisa-
dores encontraram uma relação pequena, mas consistente, entre níveis elevados de chum-
bo no sangue de r e c é m - n a s c i d o s e escores mais baixos de QI durante a infância. A exposi-
ção a níveis elevados de chumbo durante a infância parece ter um efeito negativo ainda
maior, n ã o só sobre os escores de QI, como t a m b é m sobre a distratibilidade e (talvez) a
agressividade (Needleman et al., 1996). Mesmo em níveis bastante baixos - níveis previa-
mente classificados como "seguros" pela o r i e n t a ç ã o federal americana e encontrados em
crianças que vivem em casas pintadas com tinta sem base de chumbo - n ó s observamos
efeitos negativos. Até recentemente, por exemplo, u m nível de 20 microgramas por decili-
tro era considerado aceitável; pesquisas atuais mostram que as crianças com esse nível de
chumbo apresentam escores de QI em média 2,6 pontos mais baixos que aquelas com ape-
nas 10 microgramas de chumbo por decilitro de sangue (Schwartz, 1994). Em virtude des-
sas novas evidências, os Centers for Disease Control mudaram sua orientação, definindo 10
microgramas como o limite m á x i m o desejável.
A Criança em Desenvolvimento

Pelas estimativas atuais, de 3 a 6% dos b e b é s e das crianças norte-americanos apresen-


tam niveis s a n g u í n e o s de chumbo que excedem esta quantidade (Centers for Disease Con-
trol, 1977b), sendo que a maior porcentagem é encontrada entre as crianças negras ou lati-
nas vivendo em bairros pobres (Berney, 1996). Sendo assim, a exposição ao chumbo pode
ser um dos muitos pequenos fatores que contribuem para que os escores m é d i o s de QI se-
jam inferiores nas crianças que vivem na pobreza.
À medida que os estudos sobre fatores teratogenicos se ampliam, os psicólogos perce-
bem que o desenvolvimento pré-natal é menos insulado, menos protegido do que p e n s á v a -
mos a princípio. Em especial, muitas substâncias químicas associadas às sociedades indus-
triais modernas podem ter efeitos imprevistos sobre o feto.

Outras Inflyênoías sobre o Deseri¥o!¥imeiito


Pré-Natal
Dieta
Outro fator significativo no desenvolvimento pré-natal é a dieta da mãe. Tanto a a d e q u a ç ã o
geral da dieta, medida em termos de calorias, como a p r e s e n ç a de certos nutrientes-chave
são essenciais.
Má Nutrição. No m í n i m o , a m ã e precisa de calorias e p r o t e í n a s suficientes para preve-
nir a má nutrição. Quando a mulher experimenta uma grave m á nutrição durante a gravi-
dez, especialmente nos trés meses finais da g e s t a ç ã o , ela corre um risco maior de o b e b é
nascer morto, de ter baixo peso no nascimento ou de morrer no primeiro ano de vida (Stein
et al., 1975). O impacto parece ser maior sobre o sistema nervoso central - u m p a d r ã o en-
contrado em estudos sobre seres humanos e outros mamíferos. Por exemplo, ratos cuja i n -
gestão calórica fora substancialmente restrita tanto durante o p e r í o d o fetal como depois do
nascimento mostraram um p a d r ã o descrito como parada no desenvolvimento cerebral, re-
sultando em c é r e b r o s mais leves, com menor desenvolvimento dendrítico, e mais pobres
em formações sinápticas (Pollitt e Gorman, 1994).
Nos seres humanos, observamos efeitos semelhantes quando a má nutrição pré-natal
foi suficientemente grave para causar a morte do feto ou do r e c é m - n a s c i d o . A u t ó p s i a s
apontam que esses b e b é s possuem c é r e b r o s menores, com células cerebrais menores e em
menor quantidade que o normal (Georgieff, 1994).
O que está bem menos claro é se efeitos duradouros sobre o desenvolvimento cerebral
ocorrem igualmente nos casos de subnutrição pré-natal, como na crónica m á nutrição de
proteína-energia comum em muitas p o p u l a ç õ e s no mundo todo. Em primeiro lugar, é pos-
sível que essas crianças com s u b n u t r i ç ã o pré-natal continuem tendo uma nutrição insufi-
ciente depois do nascimento, em geral acompanhada por baixos níveis de estimulação em
casa. Isso torna muito difícil separar os efeitos da nutrição p r é - n a t a l dos efeitos das insufi-
ciências pós-natais. No momento, a maioria dos especialistas desta área abandonou a ideia
de que níveis comuns de subnutrição pré-natal t ê m efeitos negativos diretos e irremediáveis
sobre o desenvolvimento cerebral (Pollitt et al., 1996; Ricciuti, 1993). Em vez disso, o que pa-
rece acontecer é alguma variação do p a d r ã o de interação I que descrevi no Capítulo 1 (ver
Figura 1.3, p. 43): a s u b n u t r i ç ã o pré-natal pode tornar o b e b ê mais "vulnerável", talvez por
deixá-lo menos responsivo, com menos energia ou com menor capacidade de aprender com
suas experiências. Em um meio ambiente n ã o - e s t i m u l a n t e ou em um ambiente em que a
subnutrição se mantenha, essa criança vulnerável provavelmente n ã o a p r e s e n t a r á um pro-
gresso considerável. Mas um meio ambiente estimulante pode fazê-la superar a vulnerabili-
dade.
Este p a d r ã o está adequadamente ilustrado nos resultados de um pequeno estudo de
Philip Zeskind e Craig Ramey (1981). Eles observaram os resultados em um pequeno grupo
de 10 b e b é s , todos nascidos de m ã e s de origem pobre e todos muito magros ao nascer -
muitas vezes, u m sinal de m á n u t r i ç ã o pré-natal. Metade desses b e b é s foi designada, aos
três meses de idade, de forma aleatória para uma creche com um programa especial enri-
quecido. Os outros cinco b e b é s malnutridos receberam suplementos nutricionais, mas fo-
ram criados em casa, em circunstâncias bem menos estimuladoras. Outras crianças da cre-
che haviam tido peso normal no nascimento, assim como as crianças criadas em casa i n -
90 Helen Bee

Escores de QI das Crianças aos 3 Anos de


Idade
Estado Nutricional Pré-natal
Experiência após o Nascimento Mainutridas Bem-nutridas
Creche com ambiente enriquecido 96,4 98,1

Criadas em casa 70,6 87,7

Fonte: Z e s k i n d e R a m e y , 1 9 8 1 , p. 2 1 5 .

cluídas no estudo. A Tabela 2.5 apresenta os escores de QI desses quatro grupos de crian-
ças aos 3 anos de idade. Como v o c ê s podem ver, os resultados combinam muito bem com
o modelo de Horowitz. Os b e b é s malnutridos a l c a n ç a r a m resultados satisfatórios no am-
biente estimulador da creche, mas o oposto ocorreu em um ambiente que oferecia menor
suporte. Os b e b é s bem-nutridos t a m b é m s o b r e s s a í r a m melhor na creche do que em casa,
mas as diferenças n ã o foram t ã o grandes. Assim, parece que a m á n u t r i ç ã o criou uma "vul-
nerabilidade" que somente p ô d e ser superada por u m ambiente enriquecido.
Ácido Fólico. O ácido fólico é u m nutriente específico vital, cuja importância durante a
gravidez só em anos recentes ficou clara. Ele é uma vitamina B encontrada principalmente
no fígado, no feijão, nos vegetais verdes folhosos, no brócolis, no suco de laranja, nos ce-
reais enriquecidos para o café da m a n h ã e nos produtos com grãos, em especial o germe de
trigo. Quantidades inadequadas deste nutriente estão claramente ligadas ao risco de defei-
tos no tubo neural, como a espinha bífida, deformidade em que a parte inferior da coluna
vertebral n ã o se fecha (Butterworth e Bendich, 1996). Quases todas essas crianças são retar-
dadas; a maioria tem alguma paralisia na parte inferior do corpo. Pelo fato de o tubo neural
se desenvolver principalmente nas primeiras semanas da gravidez, antes talvez de a mulher
saber que está grávida, é importante que quem planeja uma gravidez atinja e mantenha pe-
lo menos o nível m í n i m o de ácido fólico: 400 microgramas por dia. No entanto, muitas mu-
lheres n ã o recebem ácido fólico suficiente das fontes alimentares comuns ou de pílulas mul-
tivitamínicas para atingir esse nível m í n i m o (Daly et al., 1997). Para ajudar a aumentar a in-
g e s t ã o normal acima do nível desejado, o novo regulamento da Food and Drug Administra-
tion nos Estados Unidos exige que 140 microgramas de ácido fólico sejam acrescentados a
cada 100 gramas de farinha enriquecida, o que aumenta bastante a probabilidade de a
Pensamento Crítico maioria das mulheres receber quantidades suficientes de ácido fólico.
Que tipo de estudo você teria de Ganho de Peso. As necessidades calóricas da mulher aumentam de 10 a 20% durante a
fazer para saber se é bom que uma gravidez para sustentar o ganho de peso necessário. Nos Estados Unidos, até a década de
mulher grávida mantenha um alto 60, os m é d i c o s aconselhavam as mulheres g r á v i d a s a engordarem de 7 a 9 quilos; engordar
nível de exercício, como correr 48 mais que isso aumentaria o risco de anormalidades no trabalho de parto e de outros proble-
quilómetros por semana? mas. Entretanto, na d é c a d a de 70, novas pesquisas demonstraram que esse baixo ganho de
peso estava associado a um risco maior de baixo peso no nascimento e a dano neurológico
no b e b ê (Carmichael e Abrams, 1997; Hickey et al., 1996; Zhou e Olsen, 1997). Isso levou a
novas r e c o m e n d a ç õ e s sobre o ganho de peso. A o r i e n t a ç ã o mais recente, publicada em
1990 pelo National Institute of Medicine, baseia o ganho de peso recomendado para a mu-
lher em relação à altura antes da gravidez, como mostra a Tabela 2.6 (ver p. 91).
Infelizmente, as mulheres que correm u m risco maior de vários tipos de problemas, in-
cluindo ter um b e b ê de baixo peso no nascimento, s ã o as que costumam ter ganho insufi-
ciente de peso na gravidez: mulheres muito magras para a sua altura antes da gravidez, mu-
lheres com mais de 35 anos, mulheres com pouca i n s t r u ç ã o e mulheres afro-americanas,
para as quais níveis mais elevados de ganho de peso durante a gravidez parecem ótimos
(Abrams, 1994; Centers for Disease Control, 1992).
Ao mesmo tempo, t a m b é m existem riscos associados ao ganho excessivo de peso. As
mulheres que engordam mais do que o recomendado na tabela correm u m risco maior de
precisarem se submeter a uma cesariana (Abrams, 1994; Brost et al., 1997); elas t a m b é m são
candidatas à obesidade p ó s - p a r t o , o que traz uma série de outros riscos para a saúde, in-
cluindo d o e n ç a s cardíacas e diabetes (Johnson e Yancey, 1996). U m ganho de peso que se
situe dentro dos intervalos recomendados parece ótimo, embora haja grande variação de
uma mulher para outra.
A Criança em Desenvolvimento 91

Tabela 2.6 Gar^ho de Peso Recomendado Atualmente Durante


a Gravidez
Categoria de Peso Pré-Gravidez Ganlio de Peso Recomendado
Abaixo do norival
(90% ou menos do
peso recomendado para a altura) 1 2 - 18 quilos

Normal 1 1 - 1 6 quilos

Acima do peso (de 120 a 135% do


peso recomendado para a altura) 7 - 1 1 quilos

Obesa (135% ou mais do peso


recomendado para a altura) 7 quilos aprox.

F o n f e ; Taffel e t a l . , 1 9 9 3 .

Por fim, as mullieres que estão acima do peso antes de engravidar correm alguns ris-
cos adicionais, independentemente do ganho de peso durante a g e s t a ç ã o . Elas t ê m uma
probabilidade duas vezes maior de terem b e b é s com defeitos no tubo neural, ingerindo ou
não ácido fólico (Shaw et al., 1996; Werler et al., 1996) - u m achado que d e p õ e a favor da
perda de peso antes da gravidez no caso de mulheres classificadas como obesas.

A Idade da M ã e
Uma das t e n d ê n c i a s particularmente interessantes na vida familiar moderna nos Estados
Unidos e em muitos outros países industrializados é a crescente probabilidade de as mu-
lheres adiarem a primeira gravidez para o final dos 20 anos ou início dos 30. Em 1994,
22,1% dos primeiros partos realizados nos Estados Unidos foram de mulheres com idade
acima de 30 anos, mais que o dobro do índice de 1970 (U.S. Bureau of the Census, 1996). É
evidente que existem muitas razões para a mulher adiar o momento de ter filhos. Uma das
mais importantes é a crescente necessidade de uma segunda rendS na família e o desejo da Mães em idade avançada como esta
mulher de completar a formação profissional e dar os primeiros passos na carreira antes de estão se tornando muito mais comuns
ter filhos. Não vou debater aqui todos os p r ó s e contras de uma decisão dessas, mas gosta- nos Estados Unidos e em outros
ria de explorar a q u e s t ã o que é relevante para o assunto deste capítulo: o impacto da idade. países industrializados. As mães com
materna sobre a experiência de gravidez da m ã e e sobre o feto em desenvolvimento. mais de 30 anos (especialmente mais
As pesquisas atuais afirmam que o momento ideal para se ter filhos é por volta dos vin- de 35) e seus bebés apresentam riscos
te anos. As m ã e s com mais de 30 anos (em especial mais de 35) correm u m risco maior de um pouco maiores de problemas
ter vários problemas, incluindo aborto, natimorto, complicações da gravidez (como hiper- durante a gravidez e durante o parto,
tensão arterial ou sangramento), parto por cesariana e morte durante a gravidez ou o par- aspecto a ser considerado se você
to (Berkowitz et al., 1990; Hoyert, 1966; McFalls, 1990; Peipert e Bracken, 1993). decidir adiar o momento de ter filhos.

Além disso, b e b é s nascidos dessas m ã e s em idade a v a n ç a d a parecem estar mais ex-


postos a problemas. Vários estudos, em diversos p a í s e s industrializados, mostram que o
risco de morte fetal - por uma variedade de causas - é maior quando a m ã e tem mais de 35
anos, mesmo quando elas recebem bons cuidados p r é - n a t a i s (Cnattingius et al., 1993;
Pratts et a!., 1995). Fora os riscos bem-estabelecidos de s í n d r o m e de Down, as crianças nas-
cidas de m ã e s com idade superior a 35 anos n ã o parecem correr u m risco maior de anoma-
lias congénitas, mas a gravidez adiada continua, de modo evidente, trazendo alguns riscos
adicionais tanto para a m ã e como para a criança, apesar do aprimoramento no atendimen-
to pré-natal e neonatal. Os riscos para a m ã e e para o b e b ê t a m b é m s ã o maiores na outra
extremidade do contínuo de idade, ou seja, entre as m ã e s muito jovens. Como a maioria das
mães adolescentes é pobre e n ã o recebe cuidados p r é - n a t a i s adequados, fica mais difícil
identificar os fatores causais. Entretanto, u m estudo extraordinariamente bem-planejado
torna a ligação bastante clara.
Alison Fraser e colegas (1995) estudaram 135.088 adolescentes e mulheres brancas, de
13 a 24 anos, que deram à luz em Utah entre 1970 e 1990. Esta é uma amostra incomum nos
estudos sobre esse assunto: quase dois t e r ç o s das m ã e s adolescentes desse grupo eram ca-
sadas, a maioria recebia cuidados pré-natais adequados e 95% delas continuavam na esco-
Helen Bee

la. Essas condições especiais permitiram que Fraser separasse os efeitos de etnicidade, po-
breza, estado civil e idade da m ã e - tudo isso, muitas vezes, é confundido nos estudos de
gravidez adolescente. No geral, Fraser encontrou índices mais altos de resultados adversos
na gravidez entre as m ã e s com menos de 17 anos do que entre as m ã e s acima de 20 anos. O
índice de nascimento p r é - t e r m o era duas vezes maior; a incidência de baixo peso no nasci-
mento era quase duas vezes maior E essas diferenças foram encontradas mesmo quando
Fraser considerava apenas m ã e s adolescentes que eram casadas, que estavam na escola e
que recebiam cuidados p r é - n a t a i s adequados. Os riscos eram ainda maiores no caso das
m ã e s adolescentes que n ã o recebiam cuidados pré-natais adequados; entretanto, bons cui-
dados, apenas, n ã o eliminam o risco maior de problemas vinculado à gravidez adolescente.
Ainda n ã o está totalmente claro por que existe esse risco maior para as m ã e s adoles-
centes. A hipótese mais provável é que a gravidez traga alguma c o n s e q u ê n c i a biológica ne-
gativa para a menina cujo p r ó p r i o crescimento ainda n ã o está completo.

Estresse e Estado Emociop.al


A ideia de que estresses emocionais ou físicos estão ligados a conseqíJências negativas na
gravidez está firmemente estabelecida no folclore, mas "seus fundamentos na ciência são
bem menos seguros" (Crimes, 1996). Os resultados de estudos com animais são claros: a ex-
posição da fêmea g r á v i d a a estressores como calor, luz, barulho, choque ou a g l o m e r a ç ã o
aumenta de forma significativa o risco de baixo peso no nascimento, assim como problemas
posteriores nos filhotes (Schneider, 1992). Os estudos com seres humanos, no entanto, são
mais difíceis de ser interpretados, porque necessariamente envolvem planejamentos quase
experimentais em vez de distribuição aleatória dos sujeitos. As mulheres que experienciam
níveis elevados de estresse, é quase certo, t a m b é m diferem em outros aspectos das que não
experienciam, de modo que é difícil descobrir c o n e x õ e s causais claras. No entanto, vários
estudos recentes mostram, de fato, que eventos estressantes do dia-a-dia, que p e r t u r b a ç ã o
emocional e que estresse físico estão ligados a um pequeno aumento de problemas na gra-
videz, como baixo peso no nascimento, p r e s s ã o arterial materna elevada e certos problemas
físicos no bebê, como fenda palatina ou problemas r e s p i r a t ó r i o s (Hedegaard et al., 1996;
Henriksen et al., 1995; Sandman et al., 1997). O efeito parece ser pequeno, mas a minha con-
clusão, depois de ler tais obras, é de que o estresse realmente tem um efeito prejudicial.

Um Resumo dos Riscos e das Consequências a


Longo Prazo dos Problemas Pré-Natais
Sempre que escrevo este capítulo, tomo consciência de que a lista de itens que podem dar
errado parece ficar cada vez mais longa e mais assustadora. Os m é d i c o s , os biólogos e os
psicólogos estão aprendendo sempre mais sobre os efeitos graves ou sutis das variações
ambientais pré-natais, de modo que o n ú m e r o de alertas para as mulheres g r á v i d a s parece
aumentar anualmente, se n ã o mensalmente. Uma das ironias disso é que a p r e o c u p a ç ã o ex-
cessiva com essas c o n s e q u ê n c i a s potenciais pode deixar a mulher ainda mais ansiosa, e a
ansiedade está na lista de alertas! Portanto, antes de você c o m e ç a r a se preocupar demais,
deixe-me colocar essas informações em perspectiva.
Em primeiro lugar, quero dizer mais uma vez que a maioria das gravidezes é normal,
sem maiores acontecimentos, e a maioria dos b e b é s é normal e sadia no nascimento. Em se-
gundo lugar, há medidas preventivas específicas que qualquer mulher pode tomar para re-
duzir os riscos para si mesma e para seu filho que está por nascer Ela pode ser adequada-
mente imunizada; pode deixar de fumar e de beber (já que a SAF e seus primos mais ame-
nos podem ser evitados em sua totalidade se a mulher se abstiver do álcool); pode cuidar de
sua dieta e assegurar-se de que o aumento de peso está sendo suficiente; ela e o pai da
criança podem receber um aconselhamento genético. Além disso, a futura m ã e pode rece-
ber um atendimento pré-natal regular, desde o início da gravidez. Muitos estudos demons-
tram que a m ã e que recebe cuidados pré-natais adequados reduz os riscos para si mesma e
para o b e b ê (Hoyert, 1996). Apenas um exemplo: Jann M u r r a y e Merton Bernfield (1988),
em um estudo de mais de 30 mil nascimentos, descobriram que o risco de dar à luz um be-
bê de baixo peso era mais de três vezes maior entre as mulheres que haviam recebido cui-
A Criança em Desenvolvimento

dados pré-natais inadequados do que entre as que haviam recebido um atendimento ade-
quado, e tal p a d r ã o se mantinha entre mulheres negras e brancas. A porcentagem de mu-
lheres que recebem cuidados pré-natais adequados tem aumentado ultimamente nos Esta-
dos Unidos, mas ainda temos u m bom caminho a percorrer Em 1996, de todas as m ã e s ,
18,2% n ã o tiveram nenhum atendimento pré-natal no segundo trimestre, e 4,1%) ou nunca
receberam atendimento ou só o receberam nos últimos meses (Guyer et al., 1996). Os cui-
dados inadequados eram duas vezes mais comuns entre as m ã e s negras do que entre as
mães brancas e, em ambos os grupos, os cuidados inadequados eram mais comuns entre
as mães que viviam na pobreza e entre as m ã e s adolescentes.
Dadas essas estatísticas, talvez n ã o surpreenda que os Estados Unidos continuem tendo
uma taxa de m o r t a l i d a d e i n f a n t i l - definida como morte no nascimento ou no primeiro ano
de vida -relativamente alta. A boa notícia é que este índice tem diminuído com regularidade
nas últimas décadas, caindo de 20 b e b é s mortos por mil nascimentos em 1970 para 7,2 por mil
nascimentos em 1996 (Guyer et al., 1997). A má notícia é que a mortalidade infantil é duas ve-
zes maior para os negros do que para os brancos (respectivamente 14,6 e 6,3 em 1996), e mes-
mo um índice global de 7,2 coloca os Estados Unidos em 21° lugar no mundo. Quase todos os
países europeus, onde o atendimento pré-natal costuma ser gratuito ou barato e universal-
mente disponível, t ê m índices mais baixos de mortalidade infantil, assim como o J a p ã o (com
o índice mais baixo do mundo), Hong Kong e Singapura.
Por conseguinte, os Estados Unidos ficam mal nessa c o m p a r a ç ã o , em parte porque na-
quele país realmente h á mais b e b é s de alto risco, em particular aqueles com peso muito bai-
xo no nascimento (desproporcionalmente mais b e b é s afro-americanos). Ao mesmo tempo, as
estatísticas comparativas tradicionais t a m b é m pesam contra os Estados Unidos, porque s ã o
contados todos os b e b é s que vivem pelo menos alguns minutos como um nascimento vivo,
ao passo que muitos outros países n ã o fazem o mesmo. Isso significa que alguns dos b e b é s
muito pequenos que morrem algumas horas ou alguns dias após o nascimento s ã o contados
como mortes de bebê nos Estados Unidos; de outra parte, são contados como natimortos ou
alguma outra categoria em outros países (Sachs et al., 1995). Todavia, mesmo que as estatísti-
cas norte-americanas fossem ajustadas, excluindo-se todas as mortes na primeira hora depois
do nascimento, o índice de mortalidade infantil ainda seria mais alto do que em outros 17 paí-
ses (Wegman, 1996).
A diferença negro/branco na mortalidade infantil nos Estados Unidos t a m b é m preocupa
e merece maior atenção. Somado a isso, existe um risco um pouco aumentado para os b e b é s
americanos nativos, mas não para os b e b é s latinos, e esses achados suscitam várias questões
(Singh e Yu, 1995). A diferença negro/branco existe desde que c o m e ç a r a m a ser feitos regis-
tros (em 1915), e não diminuiu. Ela é encontrada mesmo quando os pesquisadores comparam
apenas b e b é s nascidos de m ã e s com formação universitária (Shoendorf et al., 1992). Os médi-
cos e os fisiologistas ainda n ã o entendem todas as razões para tal discrepância, mas um fator
significativo é que os b e b é s das m ã e s afro-americanas tendem muito mais a nascer antes que
se complete o período gestacional, tendo assim baixo peso no nascimento. Quando são com-
parados apenas b e b é s a termo, de peso normal, a mortalidade infanhl é aproximadamente a
mesma nos dois grupos. No entanto, dizer isso apenas faz a explicação recuar mais um passo.
Nós ainda precisamos saber por que as afro-americanas t ê m mais b e b é s pré-termo, com bai-
xo peso no nascimento, pois a resposta ainda n ã o está clara.
Um terceiro aspecto básico dos problemas pré-natais é que, se algo d á errado, há boas
chances de as consequências negativas para a criança terem curta duração, em vez de serem
permanentes. Além disso, muitos defeitos físicos podem ser tratados com sucesso depois do
nascimento.
Evidentemente, algumas das c o n s e q u ê n c i a s negativas são permanentes e t ê m conse-
quências a longo prazo para a criança. As anomalias cromossômicas, incluindo a síndrome de
Down e os desvios nos p a d r õ e s do cromossomo sexual, são permanentes e quase sempre es-
tão associadas a um retardo mental ou a dificuldades escolares duradouras. Alguns fatores te-
ratogenicos t a m b é m t ê m efeitos permanentes, como a s í n d r o m e alcoólica fetal e a surdez re-
sultante da rubéola. Como vocês verão no Capítulo 3, b e b é s com peso muito baixo no nasci-
mento (aqueles com menos de 1.500 gramas) estão mais expostos a riscos, os quais podem ser
persistentes e terem longa duração, problemas de aprendizagem ou de baixo QI, independen-
temente da riqueza do ambiente em que s ã o criados.
Helen Bee

Por outro lado, muitos dos efeitos sobre os quais falei neste capítulo só serão detectáveis
nos primeiros anos de vida da criança e t a m b é m apenas em determinadas famílias. A relação
entre os problemas pré-natais e as c o n s e q u ê n c i a s a longo prazo, de fato, geralmente segue o
mesmo p a d r ã o que mencionei referente à m á nutrição: são mais prováveis problemas persis-
tentes se a criança for criada em um ambiente não-estimulador e não-apoiador do que se ela
crescer em uma situação familiar melhon Claire Kopp (1994, p. 19) coloca a questão da seguin-
te maneira:

Usando uma analogia, alguns riscos perinatais (por exemplo, infecções, anoxia, bab<o
peso no nascimento) parecem agir como um solavanco no sistema, machucando-o sem
danificá-lo irreparavelmente. Com cuidado e atenção, o sistema pode ser curado por
completo depois de um tempo, ao passo que, na ausência de cuidado adequado, o siste-
ma se recupera apenas em parte.

Portanto, n ã o é o problema pré-natal em si que constitui a causa de dificuldades poste-


riores: é a c o m b i n a ç ã o do problema pré-natal e de um ambiente inicial relativamente pobre,
o que parece produzir efeitos negativos prolongados. Assim, n ã o se desesperem quando le-
rem a longa lista de alertas e problemas potenciais. A princípio, a história n ã o é t ã o sombria
quanto parece.

Diferenças Sexuais no Desenvolvimento


Pré-Natal
Como quase todo o desenvolvimento pré-natal é controlado por seqiiências maturacionais
que s ã o as mesmas para todos os membros da nossa espécie - igualmente para homens e
mulheres - n ã o existem muitas diferenças sexuais no desenvolvimento pré-natal. Contudo,
há algumas, e elas criam o c e n á r i o para algumas diferenças físicas que observaremos em
idades mais a v a n ç a d a s .

• Em algum momento, entpe a 4^ e a 8^ semana a p ó s a concepção, o h o r m ô n i o mas-


culino testosterona c o m e ç a a ser segregado pelos testículos rudimentares do em-
brião masculino. Se esse h o r m ô n i o n ã o for segregado ou for segregado em quan-
tidade inadequada, o e m b r i ã o será "desmasculinizado", inclusive a ponto de desen-
volver uma genitália feminina. O e m b r i ã o feminino n ã o parece secretar um hormô-
nio equivalente na fase pré-natal. No entanto, a p r e s e n ç a acidental do h o r m ô n i o
masculino, no momento crítico (por alguma droga que a m ã e tenha tomado ou pe-
la d o e n ç a genética chamada hiperplasia congénita da supra-renal), vai "desfemini-
lizar" ou masculinizar o feto feminino, resultando, às vezes, em uma genitália seme-
lhante à do homem e, com freqiiência, em um comportamento posterior masculini-
zado, como gostar de brincadeiras mais brutas (Collaer e Hines, 1995).

• Os vários h o r m ô n i o s que afetam o desenvolvimento da genitália na fase pré-natal


(em particular a testosterona nos homens) t a m b é m parecem afetar o p a d r ã o do
desenvolvimento cerebral, resultando em diferenças cerebrais sutis entre homens
e mulheres, as quais, por sua vez, afetam os p a d r õ e s de s e c r e ç ã o do h o r m ô n i o de
crescimento na adolescência, os níveis de a g r e s s ã o física e o d o m í n i o relativo dos
hemisférios direito e esquerdo do c é r e b r o (Ruble e Martin, 1998; Todd et al., 1995).
As evidências de pesquisa nessa área ainda s ã o incertas. Está claro que o papel de-
sempenhado pelos h o r m ô n i o s p r é - n a t a i s na arquitetura e no funcionamento do
c é r e b r o , seja ele qual for, é bastante complexo, mas as pesquisas iniciais levanta-
ram q u e s t õ e s intrigantes.

• As meninas s ã o u m pouco mais r á p i d a s em alguns aspectos do desenvolvimento


pré-natal, em especial no desenvolvimento esquelético. A o nascer, elas estão de 4
a 6 semanas à frente dos meninos em desenvolvimento ósseo (Tanner, 1990).
A Criança em Desenvolvimento

• Apesar do desenvolvimento mais r á p i d o das meninas, os meninos s ã o um pouco


mais pesados e compridos no nascimento, com mais tecido muscular e menos cé-
lulas de gordura. Nos Estados Unidos, por exemplo, os dados mostram que a m é -
dia de comprimento e peso no nascimento é de 51cm e 3.260 gramas para os me-
ninos, comparados a 49cm e 3.150 gramas para as meninas (Needlman, 1996).

• Os meninos s ã o bem mais vulneráveis a todos os tipos de problemas pré-natais


que as meninas. São concebidos muito mais meninos que meninas - na ordem de
120 a 150 e m b r i õ e s do sexo masculino para cada 100 do sexo feminino - , mas mais
homens são abortados espontaneamente. No nascimento, há cerca de 105 homens
para cada 100 mulheres. Além disso, é mais provável que os meninos sofram da-
nos no nascimento (talvez por serem maiores). Eles ainda apresentam mais mal-
formações c o n g é n i t a s (Zaslow e Hayes, 1986).

A surpreendente diferença sexual na vulnerabilidade é particularmente fascinante, em


especial porque parece persistir por toda a vida. Os homens t é m uma expectativa de vida
menor, índices mais elevados de problemas de comportamento, mais dificuldades de
aprendizagem e, em geral, mais respostas negativas a estresses importantes, como um d i -
vórcio. Uma explicação possível, pelo menos para algumas dessas diferenças sexuais, pode
estar na diferença genética básica. A c o m b i n a ç ã o XX protege mais as meninas da s í n d r o m e
do X Frágil e dos genes "maus" que podem estar presentes no cromossomo X. Por exem-
plo, os geneticistas descobriram que, no cromossomo X, existe um gene que afeta a susce-
tibiiidade a d o e n ç a s infecciosas (Brooks-Gunn e Matthews, 1979). Pelo fato de os meninos
terem apenas um cromossomo X, é muito mais provável que esse gene seja expresso feno-
tipicamente em um menino.

Diferenças de Classe Social


No Capítulo 14, falarei muito mais sobre o impacto da pobreza e das outras diferenças de
classe social no desenvolvimento, mas n ã o posso acabar este capítulo sem dizer algo acer-
ca do impacto da classe social sobre os riscos na gravidez e no parto.
A seqtjência básica do desenvolvimento fetal é evidentemente igual para as crianças
nascidas de m ã e s pobres e para as nascidas de m ã e s de classe média, mas muitos dos pro-
blemas que podem ter efeitos negativos no desenvolvimento pré-natal são mais comuns en-
tre as pobres. Por exemplo, nos Estados Unidos, as m ã e s que n ã o concluíram o ensino m é -
dio apresentam uma probabilidade duas vezes maior que as m ã e s com f o r m a ç ã o universi-
tária de terem um b e b ê com baixo peso no nascimento ou um b e b ê natimorto. As mulheres
pobres t a m b é m costumam ter sua primeira gravidez quando ainda são bem jovens e mais
gravidezes no total, e é menos provável que sejam imunizadas contra d o e n ç a s como a r u -
béola. Somado a isso, é menos provável que busquem atendimento pré-natal ou o buscam
tardiamente em sua gravidez. Uma parte significativa dessa diferença poderia ser superada
nos Estados Unidos se houvesse d i s p o s i ç ã o a destinar os recursos n e c e s s á r i o s para um
atendimento pré-natal de c a r á t e r universal e de boa qualidade. Poderia ser reduzido signi-
ficativamente n ã o apenas o índice de mortalidade infantil, como t a m b é m o índice de anor-
malidades físicas e, talvez, inclusive de retardo mental. Porém, o acesso igual ao atendimen-
to não é a única resposta. Nos países nórdicos, por exemplo, onde esse cuidado está univer-
salmente disponível, permanecem as diferenças de classe social no baixo peso ao nascer e
nos índices de mortalidade infantil (Bakketeig et al, 1993). No entanto, ainda estou conven-
cida de que o acesso a um atendimento pré-natal de boa qualidade é uma meta mínima. En-
tre outros ganhos, isso traria uma economia de custos a longo prazo, porque é bem menos
oneroso oferecer cuidados pré-natais do que tratar um b e b ê com baixo peso no nascimen-
to ou uma criança com dificuldades de aprendizagem significativas. Em última análise, o ar-
gumento é mais amplo: toda criança, na minha opinião, tem o direito de c o m e ç a r a vida da
melhor maneira possível.

Você também pode gostar