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LITERATURA BRASILEIRA I

CLAUDIO MANUEL DA COSTA E BASÍLIO


DA GAMA (A POÉTICA DA PAISAGEM E DA
CONCILIAÇÃO)

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Olá!
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Reconhecer as principais características da obra de Cláudio Manuel

da Costa; 2. Analisar poemas e identificar neles aspectos peculiares da obra de Cláudio Manuel da Costa; 3.

Verificará que o índio surge na obra arcádica de Basílio da Gama e será importante influência para o

Romantismo. ”

1 A FORMAÇÃO DA LITERATURA BRASILEIRA


O Brasil do ciclo do ouro, o Brasil das Minas Gerais, esse é o cenário de nosso Arcadismo. Um período

considerado, para alguns, como o verdadeiro nascimento da literatura entre nós, como explica Antônio Candido,

na abertura de sua obra, Formação da Literatura Brasileira – momentos decisivos.

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2 O CENÁRIO
A vida econômica e política de nosso país se concentrava na região de Vila Rica ou Ouro Preto, como se chama

hoje.

Na verdade, o ciclo da mineração já atingira seu apogeu quando o Arcadismo despertou entre nós, e observava-

se um desgaste das relações entre Brasil e Portugal, devido à diminuição do envio de impostos relativos à

extração do ouro na região. A Inconfidência Mineira, nesse sentido, pode ser considerada como a eclosão desse

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conflito, marcando tragicamente também a história de nossas letras; afinal, boa parte de nossos inconfidentes

eram poetas.

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3 CLÁUDIO MANUEL DA COSTA
O Arcadismo teve como marco inaugural a publicação do livro de poemas Obras, em 1768, de Cláudio Manuel da

Costa, poeta que estudaremos nesta aula.

O poema apresenta os principais ideais arcádicos: o desejo de fugir da cidade e de buscar no campo a paz

almejada.

LXIII

Já me enfado de ouvir este alarido,

Com que se engana o mundo em seu cuidado;

Quero ver entre as peles, e o cajado,

Se melhora a fortuna de partido.

Canse embora a lisonja ao que ferido

Da enganosa esperança anda magoado;

Que eu tenho de acolher-me sempre ao lado

Do velho desengano apercebido.

Aquele adore as roupas de alto preço,

Um siga a ostentação, outro a vaidade;

Todos se enganam com igual excesso.

Eu não chamo a isto já felicidade:

Ao campo me recolho, e reconheço,

Que não há maior bem, que a soledade.

Como vimos na aula anterior, o Prólogo que introduz a leitura procura esclarecer escolhas temáticas e

estilísticas de um preocupado poeta a um público ainda reduzido.

Delineia-se, nesse prólogo, a afirmação de um estilo em oposição a outro, anterior, acompanhada de um pedido

de desculpas pela adesão a certo exagero ou rebuscamento de alguns versos. Trata-se da presença de aspectos

do Barroco em seus primeiros poemas.

Mas será que ele tinha razão?

Vamos reler o trecho:

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“Pudera desculpar-me, dizendo que o gênio me fez propender mais para o sublime: mas, temendo

que ainda neste me condenes o muito uso das metáforas, bastará, para te satisfazer, o lembrar-te que

a maior parte destas Obras foi composta ou em Coimbra, ou pouco depois, nos meus primeiros anos,

tempo em que Portugal apenas principiava a melhorar de gosto nas belas letras”.

(In: Prólogo ao leitor. Obras. COSTA, CM)

Observe que ele faz menção ao uso das metáforas como sendo um sinal do Barroco, mais precisamente do

cultismo. De fato, os primeiros poemas, compostos ainda em Portugal, traziam os sinais desse movimento que já

se esgotava quando o jovem poeta lá esteve para estudar.

4 AS INFLUÊNCIAS DE CLÁUDIO MANUEL DA COSTA


Como também vimos na aula anterior, no século XVIII, o Brasil ainda não contava com faculdades, tal fato

obrigava os filhos de famílias abastadas a terminarem sua formação em Coimbra ou Lisboa, ou seja, na

metrópole.

Os anos passados na Europa marcaram profundamente Cláudio Manuel da Costa, a ponto de colocar em relevo a

discrepância entre a sofisticação dos salões, a interlocução com os intelectuais e, por outro lado, a rudeza de sua

terra natal, o Brasil.

No soneto a seguir, podemos conhecer os sentimentos contraditórios evidenciados pela referência ao par

rudeza/ternura.

O Soneto

XCVIII

Destes penhascos fez a natureza

O berço, em que nasci! oh quem cuidara,

Que entre penhas tão duras se criara

Uma alma terna, um peito sem dureza!

Amor, que vence os tigres por empresa

Tomou logo render-me; ele declara

Contra o meu coração guerra tão rara,

Que não me foi bastante a fortaleza.

Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,

A que dava ocasião minha brandura,

Nunca pude fugir ao cego engano:

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Vós, que ostentais a condição mais dura,

Temei, penhas, temei; que Amor tirano,

Onde há mais resistência, mais se apura.

No soneto, observa-se a advertência que o eu lírico faz à natureza para que ela se proteja da força do Amor. A

beleza da composição decorre não apenas da antítese mencionada, mas também da riqueza melódica dos versos.

Segundo Antônio Candido, “(...) esta presença da rocha aponta nele para um anseio profundo de encontrar

alicerce, ponto básico de referência, que a impregnação da infância e adolescência o levam a buscar no elemento

característico da paisagem natal. Quando quer localizar um personagem, é perto, ou sobre uma rocha que o

situa”.

Saiba mais
Segundo Laura de Mello e Souza em Cláudio Manuel da Costa: o letrado dividido (São Paulo:
Companhia das Letras, 2011), o poeta teria obsessão por mapas: “Cláudio guardava duas
imagens de santos dentro de redomas de vidro, que ficavam em cima de algum móvel ou
dentro de um oratório, ou ainda quem sabe ao pé da cama: as paredes, ele reservava para uma
de suas paixões, os mapas” (p.144).
Esse acréscimo contribui para explicar o interesse do poeta pelos acidentes geográficos,
marcos importantes em mapas geográficos.

5 AS REFERÊNCIAS DE SUA TERRA NATAL


A natureza de sua terra natal está presente em algumas de suas produções poéticas, seja pela referência às

rochas ou ao Ribeirão do Carmo.

No soneto abaixo, é interessante notar que também aqui o eu lírico compara a natureza de sua terra à natureza

idealizada do Arcadismo. Não há, nesse cenário, ninfas nem gado pastando, menos ainda uma cálida sombra na

margem do rio; nele a presença do ouro anima a ambição dos homens, nele o Sol – o planeta louro – ilumina seu

leito, como veias de um corpo vivo que fecunda a terra.

Leia o soneto e observe as características mencionadas.

O Soneto

II

Leia a posteridade, ó pátrio Rio,

Em meus versos teu nome celebrado;

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Por que vejas uma hora despertado

O sono vil do esquecimento frio:

Não vês nas tuas margens o sombrio,

Fresco assento de um álamo copado;

Não vês ninfa cantar, pastar o gado

Na tarde clara do calmoso estio.

Turvo banhando as pálidas areias

Nas porções do riquíssimo tesouro

O vasto campo da ambição recreias.

Que de seus raios o planeta louro

Enriquecendo o influxo em tuas veias,

Quanto em chamas fecunda, brota em ouro.

REFLEXÃO

A deliberada escolha pela tematização da natureza de sua terra poderia representar um afastamento em relação

aos ideais arcádicos, mas é importante lembrar que a poesia de Cláudio é atravessada por várias influências,

como a poética do Quinhentismo e do Barroco.

Veja abaixo um trecho de Afrânio Coutinho que assegura a existência dessas influências no trabalho Cláudio

Manuel da Costa.

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6 A PARTICIPAÇÃO NA INCONFIDÊNCIA MINEIRA
A participação do poeta, na Inconfidência Mineira, teve trágico fim. Embora apenas Tiradentes tenha recebido a

sentença de enforcamento, os demais foram deportados, exceto Cláudio Manuel da Costa.

Oficialmente, noticiou-se à época que ele teria se suicidado, no entanto há suspeitas de que tenha sido

assassinado, pois poderia comprometer figuras políticas importantes.

Cláudio Manuel da Costa ainda escreveu Vila Rica, uma epopeia inspirada em O Uraguai, de Basílio da Gama –

poeta que conheceremos a seguir.

7 BASÍLIO DA GAMA- O URAGUAI, O ÍNDIO ARCÁDICO


O poeta José Basílio da Gama publicou o poema O Uraguai em 1769. Embora os críticos afirmem que o tema da

obra tenha servido aos propósitos do autor, procurando ganhar a simpatia do Marquês de Pombal (um dos

principais responsáveis pela expulsão dos jesuítas de Portugal e das suas colônias) - uma vez que estudava em

colégio jesuíta quando foi promulgada a expulsão dos padres – é inegável a qualidade de sua obra.

Observa Antônio Candido:

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O assunto é a expedição mista de portugueses e espanhóis contra as missões jesuíticas do Rio

Grande, para executar as cláusulas do Tratado de Madrid em 1756; a intenção ostensiva, fazer um

panfleto antijesuítico para conciliar as graças de Pombal. Mas a análise revela que também outros

intuitos animavam o poeta, notadamente descrever a ordenação racional da Europa e o primitivismo

do índio.

Ao contrário do que se dá em Cláudio, sentimos a cada passo certa indecisão entre ambos, como se o

encantamento pelo pitoresco levasse o poeta a lamentar intimamente a ruptura do ritmo agreste

pela civilidade imposta. (p. 112)

LEITURA

Veja abaixo alguns trechos do poema O Uruguai que será analisado a seguir.

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8 ANÁLISE DE TRECHOS DO POEMA
Nesse trecho, conhecemos um pouco do enredo que trata da relação entre os portugueses, os índios e os jesuítas.

Da relação do padre Balda com uma índia nasceu Baldeta, que era mal visto pela aldeia.

Para recuperar sua imagem perante a aldeia, o padre almejava casar o filho com Lindoia, esposa de Cacambo,

que, por isso, é enviado a missões impossíveis, das quais sempre retorna.

No entanto, percebendo que seria desmascarado, o padre envenena Cacambo e Lindoia se deixa picar por uma

cobra venenosa.

A figura do índio, em Basílio da Gama, se aproxima à do pastor arcádico, e não ao indígena do Romantismo, como

esclarece Antônio Candido:

“Devido ao tema do índio, durante todo o Romantismo o nome de Basílio da Gama foi talvez o mais

frequente na pena dos escritores, quando se tratava de apontar precursores da literatura nacional.

Convém, todavia, distinguir nele o nativismo do interesse interior pelo exótico, parecendo haver

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predomínio deste, pois o Indianismo não foi para ele uma vivência, como para os românticos; foi

antes um tema arcádico transposto em roupagem mais pitoresca.”

(Candido, A. Formação da literatura brasileira. Momentos decisivos. Candido, Antônio.1750-

1880.11ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2007. p. 133-134)

O que vem na próxima aula


• A poética de Tomás Antônio Gonzaga
• A sátira de As Cartas Chilenas;
• A poesia de Santa Rita Durão e Silva Alvarenga;

CONCLUSÃO
Nesta aula, você:
• Reconheceu a obra de Cláudio Manuel da Costa;
• Analisou alguns de seus poemas;
• Aprendeu as principais características de sua obra.
• Reconheceu a obra de Basílio da Gama.

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