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REPRESENTAÇÃO ELEITORAL Nº 003/2002 – BRASÍLIA – DF

RELATORA : MIN. EMMA VON HANDENRAINNËR


REPRESENTANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROCURADOR : GABRIEL TARGARYEN SALVI
REPRESENTADOS : IBOPE/GUSTAVO GAYER
BAND PESQUISAS/MÁRCIO FRANÇA
CORREIO BRAZILIENSE/ADOLFO VIANA
ADVOGADO : CHARLES DE GAULLE

VOTO

Trata-se de ação de Representação Eleitoral proposta pelo


Ministério Público Eleitoral, representado pelo Procurador GABRIEL
TARGARYEN SALVI, em desfavor dos seguintes veículos de imprensa:
Ibope, representado por Gustavo Gayer; Band Pesquisas, representado
por Márcio França; e Correio Braziliense, representado por Adolfo Viana.
Na petição inicial, o autor alegou que os mencionados veículos de
imprensa conduziram "enquetes/pesquisas eleitorais sem autorização do
Tribunal Superior Eleitoral", configurando, assim, o descumprimento do
disposto no art. 33 da Lei nº 9.504/97, conhecida como a Lei das Eleições.
Como medida de urgência, foi pleiteada uma liminar, a qual foi deferida.
No curso do processo, o patrono da parte adversa foi regularmente
habilitado como defensor dativo nos autos. Este apresentou a contestação,
à qual o Ministério Público Eleitoral respondeu por meio de réplica.
Subsequentemente, a defesa interpôs agravo de instrumento, ao passo
que o MPE requereu a procedência da ação, com a consequente
declaração de perda de objeto do mencionado agravo.

É o relatório.

A SENHORA MINISTRA EMMA VON HANDENRAINNËR


(relatora): Senhores ministros:
Inicialmente constato que o autor é o Ministério Público Eleitoral,
que com amparo no art. 357 do Código Eleitoral, possui legitimidade para
a propositura de Representação Eleitoral.

Ao fundamentar meu voto, concentrarei a análise nos elementos


centrais apresentados nos autos, notadamente na imputação de crime
eleitoral dirigida aos veículos de imprensa e na distinção essencial entre
pesquisa e enquete. Passando das considerações iniciais.

1. A configuração de um ato como crime demanda sua previsão em


lei, e para a sua caracterização, não apenas o dolo é exigido, mas também
a culpa, princípio que não se restringe ao âmbito do ordenamento
jurídico penal, o que elimina a possibilidade de alegação de
desconhecimento da lei.

Com base nas provas apresentadas pelo autor, não há margem para
questionar a real intenção das emissoras ao realizar a sondagem, mesmo
que a defesa argumente que, para ser considerada uma pesquisa, não se
deve divulgar a identidade dos entrevistados. Em certa medida, concordo
com essa afirmação, não por uma questão de legalidade, mas de ética,
uma vez que o dispositivo que regula as pesquisas eleitorais não proíbe
claramente a identificação dos votantes.

O inciso IV do referido dispositivo impõe requisitos para a


realização de pesquisas, tais como "plano amostral e ponderação quanto a
sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização
do trabalho, intervalo de confiança e margem de erro", e aqui não
identifico uma exigência razoável para distinguir pesquisa de enquete
com base na identificação dos votantes. Portanto, suscito a intenção dos
réus, conforme claramente expresso pelo Ibope: "Pesquisa de Intenção de
voto".

Assim, observa-se que os veículos de comunicação associaram a


atividade de sondagem com o propósito de conduzir uma pesquisa
eleitoral, sugerindo desconhecimento da legislação, pois, caso contrário,
teriam registrado a pesquisa junto à Justiça Eleitoral. Da mesma forma,
percebo que, se a intenção fosse realizar enquetes, teriam denominado a
sondagem como tal.

2 A falta de uma regulamentação clara e precisa quanto à


diferenciação entre pesquisa eleitoral e enquete tem suscitado uma série
de interpretações divergentes no meio jurídico, o que contribui para a
incerteza e a inconsistência na aplicação das normas eleitorais. Enquanto
o art. 33 da Lei 9.504/97, Lei das Eleições, estabelece de forma explícita as
obrigações das empresas e entidades em relação às pesquisas eleitorais,
exigindo o registro na Justiça Eleitoral, a questão das enquetes permanece
menos clara.

O § 5º do mesmo artigo veda a realização de enquetes relacionadas


ao processo eleitoral durante o período de campanha eleitoral. No
entanto, a legislação não fornece uma definição clara do que constitui
uma enquete em contraste com uma pesquisa eleitoral. Essa lacuna
normativa tem levado a interpretações variadas e muitas vezes subjetivas
por parte dos interessados e dos operadores do direito.

É imperativo reconhecer que essa indefinição pode levar a uma


aplicação inconsistente da lei e a situações em que as práticas de
comunicação social durante o processo eleitoral não estão devidamente
regulamentadas, o que pode comprometer a lisura e a transparência do
processo democrático.

E é claro que devemos observar que nem tudo que é eleição é


processo eleitoral.

Ante o exposto, voto pela condenação dos réus pela propagação de


pesquisas eleitorais sem registro na Justiça Eleitoral, e fixo a pena em
R$50.000 (cinquenta mil reais) para cada, com base no art. 33, § 3º da Lei
9.504/97.
Voto ainda pela fixação de jurisprudência para que sejam proibidas,
até que haja uma regulamentação pelo Legislativo, as enquetes eleitorais
que visam o mesmo que as pesquisas eleitorais, isso é, reunir informações
sobre a opinião pública quanto às eleições, o processo eleitoral e os
candidatos, para o conhecimento do público.
Ministra EMMA VON HANDENRAINNËR
Relatora

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