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A IMPORTÂNCIA DA DISCUSSÃO COLECTIVA


NO DESENVOLVIMENTO DO SENTIDO DE
NÚMERO1

Conference Paper · September 2010

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1 43

2 authors:

Elvira Ferreira Lurdes Serrazina


Escola Superior de Educação, Portugla, Torre… Unidade de Investigação em Educação e For…
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A IMPORTÂNCIA DA DISCUSSÃO COLECTIVA NO DESENVOLVIMENTO
DO SENTIDO DE NÚMERO1

Elvira Ferreira
Escola Superior de Educação de Torres Novas
elvira127@netcabo.pt
Lurdes Serrazina
Escola Superior de Educação de Lisboa
lurdess@eselx.ipl.pt

Resumo

Esta comunicação enquadra-se numa investigação cujo objectivo é compreender como


os alunos desenvolvem o sentido de número num contexto de resolução de problemas
de adição e subtracção de números inteiros positivos. Em particular, procura-se estudar
as estratégias e procedimentos a que os alunos recorrem e as dificuldades com que se
deparam no âmbito de uma experiência de ensino. Neste estudo, foi utilizada uma
metodologia qualitativa/interpretativa, com o design de estudo de caso. Foram
participantes 4 alunos inseridos numa turma do 2.º ano de escolaridade. Nesta
comunicação será apresentado o caso de Catarina. Em particular, será analisada a
participação de Catarina na discussão das resoluções seleccionadas e apresentadas à
turma. Nesta discussão, assume particular importância a comparação que os alunos
fazem das suas resoluções com as dos colegas e a reflexão que realizam sobre
semelhanças e diferenças entre as várias estratégias e procedimentos. Os resultados
mostram que, antes da experiência de ensino, Catarina apresenta algumas limitações na
compreensão do sentido de número. Durante a experiência de ensino, apesar de Catarina
revelar alguma tendência para usar o cálculo em coluna na resolução de muitos
problemas, vai alterando gradualmente, as suas estratégias e procedimentos. Para esta
alteração parece ter contribuído a sua participação na discussão final na turma das
resoluções apresentadas pelos diferentes alunos.

Palavras-chave: sentido de número, resolução de problemas, discussão de sala de aula

Introdução

Vários autores (Wood, 1996; Cobb & Yackel, 1996; Yackel, 2000; Wood, Cobb
&Yackel, 1995; Cobb, Stephan, McClain & Gravemeijer, 2001) têm vindo a
desenvolver projectos acerca de processos de aprendizagem de matemática nos níveis
mais elementares. Estes projectos privilegiam os momentos de reflexão através de
discussões de sala de aula à volta dos vários processos de resolução que os alunos
desenvolvem nas tarefas matemáticas.

1
Comunicação apresentada no XXI SIEM (Seminário de Investigação em Educação
Matemática, Universidade de Aveiro, 2011.

1
Fosnot e Dolk (2001) e Treffers e Buys (2001) referem que é através da discussão das
resoluções das tarefas apresentadas pelos diferentes alunos e da reflexão sobre elas que
os alunos desenvolvem o sentido de número e das operações. É importante que cada
aluno apresente aos seus colegas o modo como resolveu o problema, que seja possível
compará-lo como outras resoluções e também reflectir sobre semelhanças e diferenças
entre os vários procedimentos. As práticas de sala de aula que contemplem estes
aspectos podem ajudar os alunos a raciocinar matematicamente, a desenvolver o sentido
de número e das operações e a progredir nos diferentes níveis de raciocínio matemático.

Esta comunicação insere-se num estudo mais amplo que tem como suporte uma
experiência de ensino realizada numa turma de 2.º ano de escolaridade ao longo do ano
lectivo de 2007/08, no âmbito do tema Números e Operações. O objectivo do estudo é
compreender como os alunos desenvolvem o sentido de número num contexto de
resolução de problemas de adição e subtracção de números inteiros positivos. Em
particular, procura-se estudar as estratégias e procedimentos a que recorrem e as
dificuldades com que se deparam no âmbito de uma experiência de ensino. Nesta
comunicação, apresenta-se parte da análise dos dados de uma aluna, Catarina, focada na
importância da experiência de ensino no desenvolvimento do seu sentido de número.

Em primeiro lugar, apresentam-se aspectos do enquadramento teórico do estudo,


seguem-se, as principais opções metodológicas. Por último, analisa-se a participação de
Catarina na discussão final de sala de aula ao longo de vários momentos da experiência
de ensino e discute-se a sua importância no desenvolvimento do seu sentido de número.

Sentido de número: Como se desenvolve

Vários investigadores (Greeno, 1991; McIntosh, Reys & Reys, 1992; Resnick, 1987)
consideram que definir sentido de número não é uma tarefa fácil dado um conjunto de
componentes e capacidades a ele ligado. Para Hope (1989) “o sentido de número não
pode ser definido com precisão, mas situações onde claramente se nota a sua ausência
podem ser facilmente reconhecidas” (p. 12), isto é, é mais fácil verificar a sua ausência
quando um aluno é colocado perante determinadas situações.

Segundo Resnick (1987) o sentido de número depende de um conjunto de elementos


que se interligam e que dependem uns dos outros, ou seja, não vive isolado, nem se
pode definir isoladamente de todo um contexto de ensino, e, essencialmente, dos alunos.
Esta autora considera que o sentido de número é algo pessoal, por isso, difere muito de

2
aluno para aluno, requer alguma liberdade de actuação do aluno na utilização de
soluções múltiplas, na aplicação de múltiplos critérios e no trabalho com alguma
incerteza. Todas estas características precisam de ambientes e culturas de sala de aula
que proporcionem oportunidades para pensar em vez de regras e procedimentos iguais
para todos.

McIntosh et al. (1992) referem também que o termo “sentido de número” é impreciso,
difícil de compreender, pessoal e está relacionado com as ideias que cada um foi
estabelecendo sobre os números e operações. Estas ideias nem sempre são fáceis de
descrever e são muito mais evidentes em acção. Apesar desta dificuldade, estes autores
designam sentido de número como:

a compreensão geral que cada um tem de número e operações assim


como a capacidade e a disposição para usar esta compreensão de forma
flexível para fazer julgamentos matemáticos e desenvolver estratégias
úteis para manipular números e operações (p. 3).

Recentes documentos de cunho curricular (tais como, Australian Education Council,


1991; ME-DEB, 2001; Ponte et al., 2007; NCTM, 1991, 2007) realçam a importância
do sentido do número com o argumento de que a sua compreensão poderá ser muito útil
para compreender os números em geral, desenvolver estratégias úteis que envolvam
números e operações bem como contribuir para uma melhoria do conhecimento
matemático dos alunos.

Em Portugal, o Programa de Matemática para o ensino básico (Ponte et al., 2007)


introduz alterações significativas em alguns aspectos, nomeadamente, ao nível do tema
Números e Operações que defende que o seu estudo tem por base, entre outras, duas
ideias fundamentais: (i) desenvolver o sentido de número e (ii) desenvolver a fluência
no cálculo (p.7).

McIntosh et al. (1992) são de opinião que a aquisição do sentido do número é um


processo evolutivo e gradual, começando muito tempo antes do ensino formal começar.
Para Greeno (1991) o desenvolvimento do sentido de número dos alunos resulta,
essencialmente, de um conjunto de actividades da educação matemática mais do que um
subconjunto indicado de actividades especialmente projectadas, ou seja, “olhar o
sentido de número mais como um produto de outras aprendizagens do que um objectivo
de ensino directo” (p. 173).

3
Verschaffel e De Corte (1996) referem que devido à sua natureza complexa e
multifacetada o desenvolvimento do sentido de número não pode ser compartimentado
em capítulos especiais de manuais ou de unidades de ensino. No fundo, um pouco a
ideia defendida por McIntosh, Reys, Reys, Bana e Farrel (1997), de que o seu
desenvolvimento resulta de uma variedade de tarefas de educação matemática em vez
de um subconjunto de tarefas especialmente designadas para esse efeito. O essencial é
que os alunos resolvam problemas dado que “são basilares na aprendizagem dos
números e operações” (Brocardo & Serrazina, 2008, p. 100).

Opções metodológicas

Tendo em conta os objectivos enunciados, optou-se por uma abordagem qualitativa e


interpretativa que procura “compreender o mundo complexo da experiência vivida do
ponto de vista daqueles que a vivem” (Schwandt, 1994, p. 118), ou seja, do ponto de
vista dos seus intervenientes. Dado o objectivo e as características deste estudo, optou-
se por realizar estudos de caso, procurando compreender em profundidade o “como” e o
“porquê” de uma entidade bem definida – o caso – evidenciando a sua identidade e
características próprias. O estudo de caso é indicado quando o investigador tem pouco
controlo sobre os acontecimentos, e “que se debruça sobre uma situação específica que
se supõe ser única ou especial, procurando descobrir o que há nela de mais essencial e
característico e assim contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de
interesse” (Ponte, 2006, p.2).

Este estudo tem como base uma experiência de ensino que decorreu no ano lectivo de
2007/08, numa turma do 2.º ano de escolaridade com 24 alunos. Destes, foram
seleccionados quatro alunos a partir do desempenho manifestado na resolução de
problemas de adição e subtracção apresentados inicialmente com o objectivo de fazer o
diagnóstico da forma como os alunos encaravam esses problemas. Para a recolha de
dados, recorreu-se à observação participante, fizeram-se entrevistas, recolheram-se
documentos produzidos pelos alunos e fizeram-se gravações em vídeo e áudio. Os
dados recolhidos são, essencialmente, de natureza descritiva, procurando-se
compreender e interpretar a trajectória de aprendizagem em cada caso.

A análise dos dados relativos às estratégias e procedimentos usados pelos alunos tem
como referência o quadro teórico proposto por Beishuizen (1993, 1997) que identifica
três procedimentos de resolução nos problemas de adição e subtracção, o método dos

4
saltos quando as dezenas são adicionadas ou subtraídas a partir do primeiro número em
causa. Estes procedimentos são referidos por esta autora pelos acrónimos N10, N10C e
A10; o método da decomposição, quando as dezenas e as unidades são separadas e
tratadas isolada e independentemente. Estes procedimentos são referidos pelos
acrónimos 1010 (pronunciado como dez-dez) e 10s; método da compensação.

Para a análise das componentes do sentido de número recorre-se ao modelo proposto


por McIntosh et al. (1992) da qual fazem parte cinco componentes: compreensão do
significado dos números e operações; compreensão do uso de múltiplas representações
dos números; reconhecimento da grandeza relativa dos números; reconhecimento da
razoabilidade dos resultados e uso adequado do sistema de referências.

Experiência de ensino

Esta experiência de ensino tem subjacente uma perspectiva que tenta fazer uma ligação
entre as teorias construtivistas cognitiva e social, defendida por Cobb e Yackel (1996)
como perspectiva emergente. De acordo com Cobb (1991), nesta perspectiva
emergente, as verdades matemáticas são construídas interactivamente dentro da
comunidade de sala de aula. Ao longo da discussão das várias estratégias e
procedimentos desenvolvidos pelos alunos estabelecem-se normas sociais. Estas
normas resultam da interacção que aí tem lugar, que além do professor e dos alunos
envolve toda a turma e reflectem uma visão de que a aprendizagem da Matemática é
tanto um processo de construção activa individual como um processo de aculturação
das práticas matemáticas (Yackel & Cobb, 1996).

Através de processos de interacção com os seus pares, e através de processos de


reconceptualização do conhecimento, a partir das explicações dos outros, os alunos vão
construindo, gradualmente, o seu significado matemático. No entanto, na discussão
matemática que é específica à actividade matemática dos alunos, é necessário atender a
questões específicas, ou como definiram Cobb e Yackel (1996) normas
sociomatemáticas que analisam o que conta como uma explicação e justificação
matematicamente aceitável, ou seja, standards estabelecidos pela comunidade de sala
de aula para avaliar esses argumentos e contra-argumentos. Estudos recentes sugerem
que o desenvolvimento de estratégias e procedimentos de cálculo pelos alunos é
influenciado pelo ambiente social e sociomatemático em que estão envolvidos

5
(Verschaffel, Greer & De Corte, 2007; Torbeyns, De Smedt, Ghesquière & Verschaffel,
2009).

A planificação desta experiência de ensino teve por base os pressupostos anteriores, a


fundamentação teórica sobre o desenvolvimento do sentido de número, na resolução de
problemas de adição e subtracção envolvendo os seus vários significados, bem como as
orientações curriculares portuguesas (ME- DGEBS, 1990; ME-DEB, 2001; Ponte et al.,
2007) e outros documentos curriculares (NCTM, 1991; 1994; 2007).

Durante a experiência de ensino, a sequência da aula desenrolou-se em quatro fases


distintas: 1) apresentação do problema; 2) resolução de problemas pelos alunos, umas
vezes individualmente, outras a pares; 3) depois dos alunos, ou quase todos, terem
resolvido o problema, a discussão com toda a turma; 4) no final, a síntese procurando
salientar as estratégias e procedimentos mais eficientes.

Nesta comunicação, vão ser apresentados momentos de discussão que fazem parte desta
experiência de ensino e que parecem ter sido significativos no percurso de Catarina.

O percurso de Catarina

Catarina foi seleccionada por ter sido uma das alunas da turma que, inicialmente,
apresentou algumas dificuldades em usar os números e as suas relações nos problemas
apresentados na sessão de diagnóstico. Estas dificuldades indiciavam, por um lado,
algumas limitações na compreensão do seu sentido de número, por outro lado, havia
alguma evidência de que estas dificuldades podiam estar relacionadas com alguma
insegurança manifestada e não com a sua falta de capacidade matemática. Por estes
motivos, pareceu-me interessante acompanhar o seu percurso.

Durante a experiência de ensino pretendia-se que os alunos desenvolvessem o seu


sentido de número tendo por base a realização de um conjunto de problemas de adição e
subtracção envolvendo os vários significados destas operações. Como referido na
metodologia, um dos momentos que privilegiámos nesta experiência de ensino
corresponde à discussão final da aula das várias estratégias e procedimentos usados
pelos alunos na resolução dos respectivos problemas.

Nesta comunicação, serão apresentados três momentos de discussão de sala de aula e a


participação de Catarina nessa discussão. O primeiro momento diz respeito à resolução

6
dum problema de adição com significado juntar, realizado na 2.ª sessão da experiência
de ensino “Se a mãe do João Pedro lhe comprar os matraquilhos (58€) e o xilofone
(25€), quanto gastará?”. Catarina resolve-o do seguinte modo (figura 1):

Figura 1: Resolução do problema As prendas do João Pedro

Catarina começa por registar 58 + 25, relacionando o contexto do problema e a


operação apropriada. Após este registo, decompõe 58 em 50 + 8 e 25 em 20 + 5,
colocando igual a 83. Este registo parece indicar que vai recorrer ao procedimento 1010,
mas, novamente, adiciona 50 + 8 e 20 + 5 e regista 83. Também faz registos do lado
direito da folha, mas não se compreende para que os executa.

Analisando estes registos, não se compreende como Catarina chega ao resultado do


problema, embora seja de realçar que parece compreender a estrutura decimal dos
números e o seu valor de posição, mas não parece usá-los para realizar os cálculos
referentes ao resultado que apresenta. Solicitada pela professora a explicar como
executou os cálculos, Catarina fica aflita e não consegue explicar o aparecimento do
resultado, 83.

Após os alunos terem resolvido o problema, a professora selecciona três resoluções


diferentes e regista-as no quadro com os nomes dos respectivos alunos. Esta selecção
teve em conta serem estratégias e procedimentos diferentes, tentando partir das
resoluções mais informais. A primeira resolução que regista é a da Leonor (figura 2)

Figura 2: Resolução do problema As prendas do João Pedro pela Leonor

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Seguidamente, regista a do Samuel (figura 3), a do João Lopes (figura 4) e, por último,
a do Daniel (figura 5):

Figura 3: Resolução do Samuel Figura 4: Resolução do João L. Figura 5: Resolução do Daniel

Após todos os alunos terem explicado como realizaram os seus cálculos, a professora
suscita o debate de modo a que identifiquem as diferentes estratégias e procedimentos
apresentados. Neste debate, e perante as resoluções expostas, a professora tenta que os
alunos identifiquem as estratégias e os procedimentos mais eficazes, numa perspectiva
de que, gradualmente, as possam adoptar no futuro.

No final da discussão na turma, quando se pede aos alunos para seleccionarem uma
resolução diferente da sua e justificar porque é diferente, Catarina regista a da Leonor.
Nesta sua opção, Catarina parece ser capaz de a comparar com a sua resolução e
identificar a diferença existente, indicando a natureza dessa diferença “Esta é diferente
porque eu decompus os números e a Leonor fez logo tudo directo” isto é, parece
reconhecer a maneira como podem ser manipulados os números.

A escolha de Catarina desta resolução pode estar relacionada com o que manifestou
durante a discussão, afirmando “A maneira como a Leonor fez é aquela que eu
compreendo melhor”, apesar da maioria dos colegas terem reconhecido que era muito
“demorada”. Esta manifestação de Catarina pode indicar que, apesar de, aparentemente,
saber decompor os números ainda não os consegue manipular tendo em atenção essa
decomposição. Provavelmente, ainda não se apropriou de todo o processo que envolve

8
lidar com os números, isto é, ainda não os compreende como objectos mentais e, talvez
por este motivo, ainda tenha alguma dificuldade em realizar os cálculos.

Quase no final da experiência de ensino foram apresentados, na mesma sessão, dois


problemas de subtracção. O primeiro, com significado comparar diferença
desconhecida “O Afonso, um coleccionador de cromos Duel Masters, tem na sua
colecção 202 cromos. O seu amigo Rui Pedro tem 105 cromos da mesma colecção.
Como são muito amigos, concordaram em ficar com o mesmo número de cromos.
Quantos cromos faltam ao Rui Pedro para ter tantos como o Afonso?”.

Inicialmente, Catarina revela alguma indecisão. Primeiro regista 105 +, mas risca,
parecendo ir recorrer a uma estratégia aditiva. Depois, regista 202 - 2 = 200 e 200 -, mas
também não continua (figura 6):

Figura 6: Resolução do problema A colecção de cromos do Afonso

Por fim, começa em 202 - 2, usando uma estratégia subtractiva e o procedimento de


cálculo A10, aproximação à centena mais próxima. Estes registos, apesar de alguma
indecisão inicial, demonstram uma melhor manipulação dos números, aspecto relevante
dado estar a subtrair.

Para a discussão final das estratégias e procedimentos usados pelos alunos, a professora
selecciona três resoluções, duas com estratégias aditivas (figuras 7 e 8) e uma
subtractiva (figura 9).

David João Lopes Gonçalo

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Figura 7: Resolução do David Figura 8: Resolução do João L.
Figura 9: Resolução do Gonçalo

Após a discussão destas estratégias e procedimentos, a


professora questiona Catarina para que identifique as
diferenças e semelhanças existentes nas três resoluções:

Catarina: O David e o João Lopes fizeram de somar.


Começaram os dois em 105 e fizeram os dois 3
contas. O Gonçalo fez de menos.

A visualização, a identificação e o reconhecimento de diferentes estratégias e


procedimentos para resolver o mesmo problema foram importantes para Catarina,
parecendo ajudá-la a compreender e apropriar-se da relação entre as operações e no
estabelecimento de outras relações entre os números. Esta identificação e este
reconhecimento também parecem importantes dado que Catarina raramente usa a
estratégia aditiva na resolução de problemas de subtracção com outros significados, e
estabelece, com frequência, relações com números mais pequenos.
No final da discussão na turma, Catarina selecciona uma resolução diferente da sua, a
do David (figura 10):

Figura 10: Registo de uma resolução diferente da sua

Na sua justificação, Catarina é capaz de comparar a sua estratégia com a do colega,


indicando a natureza dessa diferença “Esta estratégia é diferente da minha porque o
David fez de somar e eu fiz de subtrair”. A discussão final na turma parece ter ajudado
Catarina a compreender a relação entre as operações, observando-se também uma

10
alteração na linguagem matemática, essencialmente, quando refere “subtrair”,
geralmente referia “de menos”.

O segundo problema realizado corresponde ao significado comparar referente


desconhecido “No dia Mundial da Criança, a Câmara Municipal vai oferecer uma ida
ao cinema a todos os alunos da escola da Leonor e da escola do João. Da escola da
Leonor foram 303 alunos que são mais 45 alunos do que os alunos da escola do João.
Quantos alunos da escola do João foram ao cinema?”.

Após os alunos resolverem o problema, a professora propõe que sejam eles a


seleccionarem a sua resolução para apresentar à turma, depois de verificarem que a sua
é diferente da registada no quadro. Catarina é a segunda aluna, após a Beatriz, a
oferecer-se para apresentar a sua resolução (figura 11):

Figura 11: Resolução do problema O dia Mundial da criança

Ao oferecer-se para ir ao quadro a seguir à Beatriz, reconhece, de imediato, que a


resolução da colega é diferente da sua, o que se verifica. A sua explicação e os seus
registos mostram que Catarina usa uma estratégia aditiva, uma alteração em relação a
resoluções anteriores, dado ter usado, preferencialmente, estratégias subtractivas.

É de realçar que Catarina usa números maiores do que os apresentados em resoluções


anteriores, o que lhe facilita os cálculos e os torna mais eficientes. Mostra também uma
melhor compreensão dos números como objectos mentais, aspecto que influencia o seu
desempenho e que parece dar-lhe segurança e gosto em fazer matemática.

Após a discussão final na turma, Catarina selecciona a resolução de Beatriz, depois


desta ter sido reformulada com sugestões dadas pelos colegas quando da sua
apresentação à turma (figura 12). Na sua justificação Catarina é capaz de comparar e
identificar a sua estratégia com a de Beatriz e indicar a natureza dessa diferença “Esta

11
estratégia é diferente da minha porque a Beatriz fez de subtrair e eu fiz de somar”. Esta
identificação é um aspecto que Catarina tem vindo a melhorar e que parece influenciar o
seu desempenho e o desenvolvimento do seu sentido de número.

Figura 12: Resolução do problema O dia Mundial da criança pela Beatriz

Considerações finais

Dos dados aqui apresentados, bem como da análise já realizado de outros dados do
estudo, pode afirmar-se que o desempenho de Catarina revela, que à medida que a
experiência de ensino decorre, há um desenvolvimento positivo do seu sentido de
número. Aspectos como a visualização e discussão de outras estratégias e
procedimentos, a visualização e discussão do estabelecimento de outras relações entre
os números, a observação do recurso à estratégia aditiva na resolução de problemas de
subtracção e a sua participação na discussão parecem ter contribuído para que Catarina,
gradualmente, alterasse as suas estratégias de resolução dos problemas de subtracção,
recorrendo com mais frequência à estratégia aditiva, e usasse novas relações entre os
números as operações. Estes resultados parecem confirmar estudos recentes (Kilpatrick,
Swafford, & Findell (2001); Verschaffel, Greer, & De Corte (2007) que sugerem que o
desenvolvimento de estratégias e procedimentos pelos alunos é influenciado pelo
ambiente social e sociomatemático em que estão envolvidos.

A discussão de sala de aula parece ter proporcionado também uma evolução na


compreensão do significado dos números, contribuindo para uma evolução do cálculo
mental de Catarina, o que está de acordo com resultados de outros estudos que afirmam
que a competência no cálculo mental e a compreensão dos números se desenvolvem
juntas (Marcovits & Sowder, 1994).

A participação de Catarina na discussão final da aula, comparando as suas resoluções


com as dos colegas e a reflexão sobre as semelhanças e diferenças entre as várias

12
estratégias e procedimentos foi particularmente importante no percurso de Catarina,
tendo proporcionado o desenvolvimento da sua comunicação escrita, parecendo tê-la
ajudado a “consolidar o seu pensamento, uma vez que a obrigou a reflectir sobre o seu
trabalho e a clarificar as suas ideias acerca das noções desenvolvidas na aula” (Boavida,
Paiva, Cebola, Vale & Pimentel, 2008, p. 68).

Em síntese, considera-se que esta experiência de ensino, a forma como foi planificada,
dando especial atenção ao momento da discussão final e à síntese da aula, contribuiu
para a evolução do sentido de número de Catarina, apropriando-se gradualmente de
outras estratégias e outros procedimentos. Embora estes processos sejam lentos, o
ambiente criado parece ter encorajado Catarina a ganhar mais confiança, a ser menos
ansiosa e a gostar mais de fazer matemática.

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