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L’ANTROPOLOGIA CRISTIANA
TRA MODERNITÀ E POSTMODERNITÀ
Ignazio Sanna –
Queriniana – Brescia (Italia) – 2001
BIBLIOTECA DI TEOLOGIA CRISTIANA –116 [BTC]
Tradução de Dom Altamiro Rossato, CSsR
CAPITULO SEGUNDO
(Pg 44-135)
A ANTROPOLOGIA DA MODERNIDADE
.
2.1.1. A antropologia da modernidade, de certo modo, propedêutica da pós-
modernidade, desenvolveu-se e foi se configurando lentamente num arco de tempo que
abraça alguns séculos e numa moldura histórico–geográfica contrassignada por ideais
específicos de racionalidade científica e filosófica e de autonomia do poder político pela
tradição religiosa. Antes de proceder à descrição das coordenadas conceituais e culturais
desta antropologia, é necessario, então, ter um quadro o mais completo possível do que
seja, em concreto, a modernidade, de qual seja seu vulto preciso, levando-se em conta o fato
de que sobre sua natureza e sobre a sua cronologa existe hoje uma grande divergência de
opiniões.(cf.Ignazio Sanna, L´Antroplogia Cristiana tra Modernità e Postmodernità, Queriniana, 2001,
pag.44, nota 1,). A própria pós-modernidade, por outro lado, enquanto ponto de chegada da
cultura ocidental, é um conceito relativo à modernidade, enquanto ponto de partida da
mesma. Também para ilustrar a antropologia da pós-modernidade, por isso, é ididspensavel
partir da precisão da natureza e dos limites temporais da modernidade à qual, de qualquer
modo, a pós-modernidade indiretamente e dialeticamente, sempre se refere.
Ora, pelo que lhe diz respeito, antes de mais nada, o nome mesmo de modernidade, o
uso do adjetivo “modernus” (de modus hodiernus, em latim, neu–Zeit, tempo novo, em
alemão) que está na base do conceito de modernidade, aparece no baixo latim no fim do V
século para caracterizar o recente mundo cristão em relação do grego-romano. A sua origem
imediata, portanto, deve-se colocar no advérbio latino ‘modo’, que significa recentemente,
agora. O primeiro significado seria, por isso, estreitamente cronológico, mesmo que não se
deva excluir uma sua certa conotação valorativa. Na Idade Média, a conotação cronológica
acabou por adquirir um significado prevalentemente depreciativo. “Modernus“ indicava o que
é recente enquanto decadente, isto é, comportava a consciência de uma velhice. A distinção
entre ‘antiqui’ e ‘moderni’ significava, de fato, uma superioridade dos antigos sobre os
modernos, superioridade ideal, pois que a antiguidade não adquiria o seu valor pelo mero fato
da distância temporal, mas era, sobretudo, o lugar dos verdadeiros valores, dos valores
eternos. No século XIV, como é sabido, o termo ‘moderno’ foi usado para para denominar a
‘via moderna’, ou seja o novo modo de fazer teologia e filosofia, em oposição a ‘via antiqua’,
representada pelo tomismo, pelo escotismo, pelo agostinismo, e por outros grupos que
seguiam os filósofos do século XII. Os pensadores da ‘via moderna’ se opuseram ao realismo
das escolas nascidas da filosofia do século XIII e foram conhecidos conhecidos como
nominalistas. Seu expoente principal tornou-se Guilherme Ockham. No fim de ulteriores
tranformações semânticas, o termo ‘moderno’ adquiriu um valor ideológico e começou a
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2.1.2.1. Além disso, pelo que diz respeito à configuração social, hoje em dia, em nível muito
geral, o termo modernidade evoca as condições de vida típicas de uma sociedade avançada
que se espelham sempre mais no que acontece no Ocidente industrializado. Isto indica as
relações sociais, os estilos de vida, os modos de agir característicos do tempo presente, que
suplantaram as formas organizativas da sociedade tradicional. Entre as suas características
constitutivas destacam-se a liberdade, que é concebida como emancipação, o progresso, que é
considerado como necessário e sem fim, o domínio progressivo sobre a natureza que é
reduzida a uma materia prima a ser transformada e utilizada, a secularização das centrais
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sociais que produzem signficados, que não são mais monopolizados pela religião, mas se
estenderam a ideologias socio-políticas e à própria economia.
Portanto o rosto, digamos assim, ‘justo’ da modernidade, hoje em dia adquire as
feições de uma sociedade dominada pelo pelos enormes progressos realizados pela
humanidade nos últimos séculos de sua história. Com o maior conhecimento das forças da
natureza e dos meios de produção, de fato, massas mais vastas de homens conseguiram
condições mais humanas de vida, categorias antes maginalizadas e ignoradas gozaram de
um contínuo estender-se dos direitos fundamentais, tomou-se sempre mais clara consciência
da igual dignidade de todos os homens, vendo-a também lá onde, até ontem, não se sabia ou
não se queria reconhece-la em formas de vida e de civilização distante dos nossos modelos.
Mas é óbvio, todavia, que há também o reverso da medalha, que existe também um
rosto social e cultural ‘negativo’ da modernidade e que também o iluminista mais convicto
não pode não dar-se conta de quão frágeis são as conquistas dos ideais da modernidade e a
luz da razão, internamente e externamente expostas a todas as idéias absurdas, a todos os
erros, a todos os devios. Na realidade, se se aceita um diagnóstico honesto e ideologicamente
neutro da realidade social contemporânea, se deve reconhecer que a modernidade por assim
dizer realizada e completada, isto é, aquela que deveria espelhar altos parâmetros sociais e
culturais, é às vezes mais virtual que real. Não se pode ignorar, de fato, que os direitos
humanos, também de mais extensos que no passado, sejam ainda terrivelmente pisados em
inumeráveis situações, circunstâncias e lugares da terra. Os delirios nacionalistas e as
arrogâncias etnocêntricas divagam quer no Ocidente quer nos paises a caminho do
desenvolvimento. A economia global está na rota de colizão com os ecossistemas da terra.
Sabemos inventar maquinas sempre mais sofisticadas, transplantar genes, viajar no cosmos,
mas falta água potável a um bilhão de pessoas, a atmosfera perdeu o equilibrio, as espécies
vivas se estinguem. A velocidade com a qual as espécies desaparecem desde que apareceu o
homem tornou-se de 1000 a 10.000 vezes superior à taxa natural de extinção, sobretudo nos
ambientes particularmente delicados como, por exemplo, as florestas tropicais Os materiais
se tornaram sempre mais complexos e melhores mas não resolvem os problemas ecológicos.
Hoje são utilizados todos os 92 elementos da táboa periódica presentes em a natureza.
Há cem anos utilizavam-se pouco mais de vinte. Os objetos era de madeira, de
cerâmica, e de metais. Este aumento torna difícil a reciclagem e introduz níveis de toxidade
muito elevada, Substancialmente, a maior eficiência conseguida no emprego dos materiais,
mesmo se relevante, permanece sempre insuficiente se o aumento do consumo requer
derrubadas de forestas, abertura de novas minas, utilização sempre maior de recusos hídricos
e poluição do ar e da água. Massas enormes de deserdados pressionam e pressionarão os
confins dos Paises ricos, com uma pressão que provavelmente se fará insustentável e
provocará situações trágicas, por que será trágico quer acolher um numero sem limites, quer
rejeitá-lo com violência. Pela primeira vez na história, o desenlvimento econômico não cria
mas frequentemente reduz os postos de trabalho, e se toma consciência de que o mercado
sozinho não garante a liberdade e melhora das condições de vida. A solidariedade
internacional, quer no campo político, quer no campo econômico, torna-se, muito
frequentemente, seletiva e, portanto, cessa de ser verdadeiramente solidariedade, como o
demonsta o fato de que para a limpeza étnica do Kosovo, no ano de 1999, se moveram todos
os países da NATO, enquanto que para as matanças análogas e os genocídios perpetrados
no mesmo ano ou nos anos precedentes nos Países da África Central, ninguém moveu um
dedo.
2.1.4. Finalmente, também pelo que diz respeito à relação entre modernidade e
cristianismo, segundo Henri de Lubac pode-se sustentar que a modernidade seja antes um
fenômeno complexo, pois não se dá uma só modernidade, não existe uma só imagem do
moderno, mas existem diversas modernidades encarnadas por personalidades e correntes bem
identificáveis. O grande jesuíta francês, mais vezes, expressou a convição de que a
modernidade existe como uma variegada realidadede de produções culturais e de praxis
históricas em cuja filigrama é possivel, ultimamente, discernir o configurar-se de duas
ordens, uma de matriz imanentista e outra, ao invés, fiel à tradição.
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intelectual que por séculos foi desconhecida pela humanidade, mas que na Europa de Galileu,
de Descartes, de Newton, coseguiu modelar as instituiçoes da pesquisa. Hoje é totalmente
normal reter que, na ciència, ver quer dizer quase exclusivamente interpretar sinais gerados
por instrumentos, e que a melhor chave interpretativa é procurada na matemática. A pesquisa
seria inconcebível sem custosos laboratórios e potentes cmputadores. Galileu, porém, não
tinha à disposição nada destes instrumentos atuais, e se construiu um ‘tubo ótico’ para
descobrir montanhas na lua, satélites de Jupiter, e um céu povoado por inumeráveis astros.
Preparou para si sozinho os aparelhos e as máquinas das quais tinha necessidade para ”fazer
violência ao senso comum”, e colher as razões matemáticas dos fenômenos que andava
investigando. “A sede de conhecer vai diretamente à realidade das coisas.
Independentemente de modelos precedentes, o homem quer ver com os seus próprios olhos,
examinar com a sua inteligência e chegar a um juízo criticamente fundado. Isto vale para a
natureza e nascem assim a moderna experimentação e a teoria racional. Vale para a tradição, e
nascem assim a crítica humanista e a ciência histórica, baseada nas fontes. Vale para a vida
social e nascem assim as novas doutrinas do Estado e do direito. A ciência, como domínio
autônomo da cultura, afirma a independência frente àquela unidade de vida e ação que fôra
determinada pela religião. Do século XVII, com Descartes, o espírito científico da matemática
estabeleceu o seu domínio em novas bases, ousando até demonstrar a existência do Deus
cristão a partir da pura razão, como um princípio matemático.
2.2.4. Esta primeira etapa da ciência galileana e do racionalismo cartesiano, que adotava uma
rigidez matemático-mecanicista também na argumentação filosófica, que introduziu a
rcionalidade, o rigor lógico, a controlabilidade das asserções, a publicidade dos resultados e
dos métodos de pesquisa é substituida por uma segunda etapa na qual prevalecia o saber
histórico que ambicionava reformar, mudar e dirigir a história para um nível de bem-estar
seguro e de contínuo progresso da humanidade. “Foi, de fato, o saber hsitórico, entendido
numa nova dimensão crítica e pragmática, que dominou o horizonte do século das Luzes
como campo de prova da eficácia reformadora da Razão, e ao mesmo tempo como fonte de
novas prospectivas de interpretação da própia história da Razão e de seu eventual auto-juízo
sobre a eficácia socio-politica e de subrogação da fé
nela a respeito das velhas crenças. O século de G.W. Leibniz (1646-1716), G.B.Vico (1668-
1774), L.G.E. Lessing (1729-1781) e J.G. Herder (1744-1803) faz da história e da sociedade
humana o banco de prova e, ao mesmo tempo, o campo do eventual sucesso ou insucesso da
nova ciência e cultura toda critico-racional na tarefa de reconstrução radical do mundo
humano.
Para o fundador do saber histórico G. B. Vico, o cartesianismo, como cultura, tinha
dado uma importância quase exclusiva às disciplinas físico-matemáticas, que são reguladas
pelo critério da razão abstrata. Mas, por si, não existe somente uma cultura baseada nas
disciplinas matemáticas. Existe também uma cultura humanística e clássica, baseada na
poesia, na literatura, na arte, na história. A razão cartesiana ofereceria uma interpretação
unilaterial e, em última análise, mortificante da natureza humana. Esta, com efeito,
considerada na globalidade dos seus valores, não é somente razão, mas também sentimento,
intuição, fantasia, engenho e, em quanto razão, não é somente razão abstrata, mas é também
razão concreta, que torna razoável um âmbito bastante mais vasto que o da geometria e da
mecânica, ao qual, ao invés, o cartesianismo a restringia. O cartesianismo, na sua dimensão
filosófica, pode ser criticado quer no seu princípio, o ‘cogito’, quer no seu critério, a idéia
‘clara e distinta’. Do
Critério, que é totalmente subjetivo, não se pode tirar outra coisa senão “ceticismo
bastante disfarçado de verdade”; do principio do ’cogito’, que é presencialidade imediata e
pura constatação, não se pode atingir muita verdade para a construção da ciência reflexa e
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consciente, pois que não se obtém ciência em sentido pleno, a não ser como consciência
reflexa e mediata.
No fundo.o critério cartesiano da idéia ‘clara e distinta’,se revela inadequado porque
concebe o conhecer intelectivo na medida que é a medida do conhecer sensitivo e, isto é,como
pura constatação de um presecialidade. O verdadeiro critério se deve procurar,invés, no
sentido da possibilidade e capacidade de explicar as coisas, que são a atividade específica e
propria da inteligencia.Se explicar uma coisa siginifica conhecer a sua causa,se tem uma
explicação plena e ,portanto, uma possessão crítica da mesma,somente quando se está em
grau de revelar não só a causa,mas o mecanismo mesmo da causalidade, o processo causal
próprio de modo tal de ser capazes de produzi-lo ou reproduzilo. Uma causa a se conhece a
fundo,quando se é capz de faze-la: ‘verum ipsum factum’.É esta a famosa fórmula
‘vichiana’,na qual a produtividade ou eficiencia é conhecida na esfera cognoscitiva e não na
existencial.Fazer objeto significa possuir com a mente os elementos,de modo tal de poder
recocstruir a estrutura. Neste ato de reconstrução se adquire a certeza crítica,a verdade pela
qual o conhecer e o fazer,o ‘verum e o ‘factum se identificam.
O conhecimento histórico, precisa Vico, adquire sua dignidade e seu caráter de
ciência na medidade em que se pode aplicar a ela o critério do ‘verum-factum’. A história
pode elevar-se à dignidade e ao valor de ciência, isto é, enquanto se apresenta conjuntamente
como certeza e como verdade, ou seja, enquanto é conjuntamente averiguação do certo e
certificação do verdadeiro. O certo é o que consta, ou seja o dado, o particular; não o dado
físico que se funda na natureza, mas o dado civil, como as leis, os costumes, as línguas, que
se funda na autoridade humana. O verdadeiro é o que faz saber de verdade, ou seja a razão,
o universal. Isso significa, então, que a história é filologia e filosofia.Se a razão e o universal
na historia são a própria natureza e mente humana, a pesquisa histórica deve, através da
vicissitude histórica (filologia), manifestar a concretude da mente humana (filosofia), dar
intrínseco sigificado à vicissitude histórica (filologia). Ora, a concretude da mente humana,
como se revela numa pesquisa feita, se desdobra segundo um rítmo que Vico define senso
(sentido), fantasia, razão e que se exprime em três momentos sucessivos do devir histórico:
idade dos deuses, dos heróis, e dos homens. De fato, escreve Vico, “os homens
primeirarramente sentem sem advertir, depois advertem com o ânimo perturbado e
comovido, finalmente refletem com mente pura”. Vico sustenta ter achado com isto a lei do
devir histórico, ou seja,”a história ideal eterna sobre a qual correm ao mesmo tempo as
histórias de todas nações”. Por ela se poderá, portanto, verificar a vicissitude histórica e
introduzir aquele ”deveis, deve, deverá’, sem o qual a história não é ciência.
Da observação da história da civilização se constata, segundo Vico, de uma parte, a
existência de uma despropoção entre os fins e os meios da ação humana, que é muito limitada
e bastante rude, e, de outra parte, o grande resultado da civilização que esta mesma ação
atingiu do curso dos séculos. Vico explica a heterogênese dos fins entre o que a ação humana
pode fazer e o que realmente fez com o recurso ao conceito de uma colaboração divina, isto
é, o conceito de Providência. Esta Providência possui dois carateres: é transcendente e
natural ao mesmo tempo. Quanto ao caráter da transcendência, se reconhce que as criaturas,
enquanto tais, são diversas e distintas da substância de Deus. Ao invés, quanto à naturalidade
dos interventos providenciais na história humana, se reconhece que a Providênncia não age
na história com intervenções extraordinárias e miraculosas. Há, sim, uma história em que a
Providência usa caminhos extraodinários e milagrosos, e é a história do povo hebraico; mas
esta, justamente por esta razão, não pode ser tomada em consideração, assim como não se
pode tomar em consideração a história do cristianismo como tal, sendo esta baseada na graça
e na ordem sobrenatural. Mas, na história dos outros povos a Providência age por caminhos
naturais, através do conhecimento e da vontade humana. Pelo fato de que a mente humana
conhece, venera, teme, ama um ser superior, isto é, Deus, os homens são capazes de superar
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memo derivar do fato de que um Deus, fora e acima de nós, criou o homem à sua imagem e
o dotou, ao mesmo tempo, de liberdade de
poder se rebelar também contra a vontade de Deus, então, a existência do homem e de sua
liberdade permanece um enigma insolúvel. Frente à alternativa das possibilidades que dizem
respeito à origem do homem, ou mediante criação divina ou mediante evolução natural, Kant
escolhe a solução pratico-moral e afirma que o homem traz a própria origem de si mesmo e e
faz de si aquilo que é e deve ser autenticamente.
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Ao homem foi assinalada a tarefa de criar a si mesmo como pessoa. Ele deve e pode
fazer-se tal porque é autonomo no ato no qual se submete a lei do dever. O fato de que o
homem, e somente ele, como ser sensivel-suprassenível possa conformar a si mesmo a Deus e
possa colocar-se infinitamente acima da esfera de sua e de toda natureza, é uma
possibilidade que permanec, mas, como um enigma. Kant nunca pretendeu aclarar a
causalidade da liberdade a partir de uma outra origem; reconheceu-a como um fato que foge
à compreensão e a chamou ”o mais assombroso de todos os enigmas”. Para a reflexão crítica
kantiana, Deus, a liberdade e a imortalidade não são tanto artigos de fé, mas “matéria de fé”
da razão pura prática. Em síntese extrema, pode-se dizer que o filósofo de Königsberg
subtraiu da filosofia a sua tarefa mais alta, a possibilidade da construção de um saber
metafísico.
A única autoridade que Kant admitia no campo doconhecimento e do juízo Moral era
a razão. O seu programa era:”Sapere aude!” Ousa saber, ousa investigar, ousa compreender.
Tem a coragem de servir-te de tua inteligência! Quando a razão aparece e se afirma como
única fonte de verdade e de entendimento, deve desaparecer a revelação, para a qual resta
somente a tarefa ou o mérito de ter operado como parteira da religião. Se o Evangelho,
escrevia o filósofo de Königsberg, não tivesse ensinado já antes as leis morais em toda sua
pureza e perfeição, seguramente a razão não as teria podido colher nesta sua perfeição. Mas,
uma vez que elas foram anunciadas e consequentemente conhecidas, elas podem se impor a
cada um com a simples força da razão. Também Lessing, no “Educação do gênero humano”
(1880), sustentava que a revelação não dá ao gênero humano nada que não lhe possa dar a
razão sozinha.
2.2.5.3. G.W.F. Hegel parte do princípio de que se se quer revitalizar a fé cristã e tornar
compreensíveis e aceitáveis as verdades dogmáticas é preciso traduzí-las em conceitos
filosóficos, é preciso racionalizá-las de qualquer modo. O homem deve crer em Deus, mas
deve também ‘pensar’ Deus, deve conseguir pensar a essência lógica de Deus, deve entender
em que sentido o Absoluto seja espírito-lógos. Pode-se dizer que a religião deve tornar-se
filosofia e a filosofia deve torrnar-se religião. A filosofia, em última análise, é a única
religião capaz salvar o homem. Se Deus não devesse ser conhecido, no sentido de ser
pensado, o homem que é espirito não poderia ineressar-se por ele, mas se interessaria
somente pelas coisas não espirituais, de coisas finitas. Uma filosofia, porém, que conhecesse
somente as coisas finitas não seria mais nem mesmo filosofia, seria um simples conhecimento
do mundo e do homem, seria areal no banco da areia do temporal. Para que a filosofia seja
filosofia, e isto é religião, deve poder pensar Deus.
Ora, quem pode pensar Deus que, só ele, é verdadeiro e eterno; que, enquanto Espirito
e Absoluto, não comparece na natureza, a qual é somente qualquer coisa de casual, de caduco,
é um nada em si e por si, um agregado de finitudes, que não possui em si mesmo um ser
verdadeiro e eterno? O animal, em realidade, não tem religião, porque não possui o
pensamento.Quem pensa se eleva ao sobre-sensível, ao universal, ao espiritual, e o animal não
pode elevar-se a tanto, porque permanece no âmbito da intuição e da observação sensivel do
ambiente circunstante.O animal não pensa, não pensa a si mesmo e, portanto, não pode pensar
nem mesmo Deus e o mundo. Somento o homem pode pensar Deus porque somente o
homem é espírito, é um ‘eu’ consciente que pode abstrair o particular do todo, e ate da própria
vida. Somente o homem pode deixar tudo, até mesmo a própria vida, pode cometer suicídio.
O animal não o pode. O homem enquanto espirito, está em condições de se opor ao instinto
natural de autoconservação da própria vida. Como ser espiritual pode sair de si, ou ‘ex-sitere’
e retornar de novo a si. Este sair de si em uma materia extrinseca se realiza em toda sua
atividade com a qual ele cultiva a matéria, a transforma segundo um seu projeto, uma sua
idéia. O animal não transfigura nada,não transforma nada, mas cosume tudo.Os animais não
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então, ela deveria compreender a si mesma como uma quinta essência do que por si não
deveria ser. Então seria uma especie de culpa cultural objetiva”. A tese de Hans Blumenberg
é que, ao contrário, através da evolução da idéia cristã de Deus na tardia Idade Média,
desembocada num absolutismo teológico, o homem teria sido colocado em meio a tantos
apuros, que deveria se revoltar, num ato de autoafirmação humanística, contra o Deus cristão.
A exaltação da idéia de onipotência da doutrina ockamista do poder absoluto de Deus, unida
à discricionalidade da predestinação divina, teria privado o homem de toda colocação sensata
no contexto do mundo, assim que, ao homem teria permanecido somente a alternaiva da
rebelião contra este Deus. A qualidade espiritual da “curiositas” poderia ser um vício para o
homem da Idade Média, porque o distraía da contemplação de Deus, mas é certamente uma
vitude para o homem moderno, porque constitui a mola secreta da vontade de saber, de
querer, de construir.
Esta controversia sobre a legitimiidade ou não da modernidade continua
ainda hoje e existe ainda muita incerteza, por exemplo; na avaliação se foi a secularização que
produziu o nihilismo ou se foi o nihilismo que trouxe a secularização. Em outros termos
pergunta-se: é a secularização que produz o niilismo ou o nihilismo que revela a
secolarização?
Para o filósofo F.Botturi, segundo uma primeira interpretação, se admite que a
secularizan não nasça como antítese ao cristianismo, mas, sim, como sua deslocação em
relação a interesses vitais, não percebidos mais, existencialmente e depois teoricamente,
como representados pela fé cristã. Poder-se-ia dizer que ela nasce como projeto de um
humanismo paralelo e depois alternativo ao cristão, em seguida ao fenômeno epocal da “crise
da consciência européa’ que contibuiu para não mais poder identificar no humanismo
cristocêntrico o modelo e a garantia da identidade e da universalidade do humano. Deste
ponto de vista, a grande epopéia do racionalismo moderno, de Descartes a Hegel, pode ser
lida como procura progressiva e invenção de figuras alternativas ao humanismo teológico, na
crescente consciência da necessidade de uma recompreensão especulativa do crisianismo, ou
de sua transcrição em termos primeiro éticos (como em Lessing e Kant) e depois metafísicos
(como em Hegel). A secularização atinge assim o seu apice de um modo ainda religioso, mas
já segundo uma chave ética e metafísica, que se quer superior e, por isso, capaz de ‘demitizar’
a sacralidade resídua da religiosidade tradicional para salvar o essencial compatível com a
racionalidade moderna. O humanismo cristão seria derrubado : Cristo não é mais sacramento
de salvação do homem, mas figura do humanismo realizado. O que é de Cristo e de sua
Igreja pode ser atribuido à razão e ao seu devir histórico como espírito.
Segundo uma outra interpretação, a secularização pode ser, por isso, também
manifestação do nihilismo, quando este assumir o papel de figura originária do Ocidente,
produzida e concebida pela vicissitude da aparente contraposição do religioso hebraico-
cristão e do cientifico-técnico moderno. Nihilística é pretenção do ‘platonismo’ da
consciência ocidental de objetivar metafisicamente o divino e de dominar tecnicamente o
mundo. Objetivação e dominação que sobrepõem constantemente ao longo da história do
Ocidente, e especialmente por obra do cristianismo, qual potente gerador de objetivismo
teológico e, por obra da nova ciência e do corolário tecnológico, como fatores de produção
expansão da atitude dominativa do homem.
moderna da distinção própria da Reforma entre reino temporal e espiritual, com limitação da
Igreja à sua tarefa espiritual. Max Weber teria colocado as raízes do capitalismo na
secularização da ética calvinista, na sua subordinação a uma aspiração puramente profana ao
sucesso.
Todavia todas estas tentativas, seja por Pannenberg, seja por outros
motivos, pelo já citado históriador alemão Reinhart Koselleck, devem ser considerdas falidas.
O teólogo luterano de Munich da Baviera, sustém de modo particular que “foram as
consequências não queridas pela Reforma no plano da história mundial que criaram a posição
de partida para o nascimento do universo cultural secular da modernidade. A ruptura da
unidade da Igreja desembocou emn um período de guerras por motivos confessionais e por
contrastantes interesses civis, as quais após um prelúdio na Alemanha, a guerra de Smalcalda
dos anos 1546-1547, passando pelas guerras dos huguenotes na França e pela guerra
começada em 1566 nos Países Baixos, durou até o fim da guerra dos Trinta Anos na
Alemanha. Durante a fase final da guerra dos Trinta Anos teve lugar na Inglaterra, a partir de
1640, a revolução puritana que levou à execução capital do rei inglês Carlos I e à devastadora
campanha para a submissão da Irlanda nos anos de 1649 a 1650”. Ora, uma das consequências
mais importantes destas guerras de religão foi a convicção de que a unidade da religião não
mais podia ser a base eficaz da paz social, e que esta base precisava, então, ser procurada
alhures. Ugo Grotius, por exemplo, procurou individuar a base da ordem social e também da
paz entre os estados no direito natural e, em conexão com isto, em uma religão natural
comum a todos os homens. Nascia o que Wilhelm Dilthey chamou de “sistema natural” das
ciências do espírito: os conceitos fundamentais do direito, da religião, da moral e da política
viriam reformulados sobre o terrenos da pergunta sobre “o universalmente humano”, sobre a
“natura” do homem. Em lugar da religião, que estava fundamentada sobre uma autoridade
transmitida, deveria tornar-se a base da ordem pública e da paz social aquilo que é comum a
todos os homens, isto é, a “natura” do homem. Esta evolução no modo de considerar a
natureza humana e a religião tornar-se-ia o ponto de partida do desenvolvimento de uma
cultura secular na Europa.
2.3.4. Pannenberg, ao sustentar esta tese sobre a origem da cultura secular européia, fazsua a
aanálise do historiador americano Theodore K. Rabb, da universidade de Princeton, o qual
apresentou em 1975 uma pesquisa sobre os estudos que,, a partir da II Guerra Mundial, se
ocuparam com os fenômenos de crise nos séculos XVI e XVII na Europa, e com a virrada
epocal e o novo início depoisda metade do ´sculo XVII. O ressultado desta pesqueisa foi que
afase das guerras de religião, que termina no segundo terço do século, e especialmente, o
período da Guerra dos Trinta Anos na Alemanha constitui um profundo corte no curso de toda
a históoria européia. Em seguida a este rompimento o comportamento dos homens assume
uma atitude radicalmente nova, determinada sobretudo pelo regresso da intolerância religiosa.
so de toda a hstória européia. E seguido a esta censura ocomportamento dos homens assumiu
uma atitude radical . Até aproxximadamente 1631 teria sido ainda uma coisa totalmente
impensável que se formassem coalizões políticas com o adversário da própria parte
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confessonal. Mas quando, algum ano mais tarde, o cardeal católico Richelieu se aliou com o
protestante Gustavo Adolfo da Suécia, a voz de protesto de Inocêncio X contra a paz de
Westfalia de 1648 foi inteiramente não ouvida. Dede então toda intromissão da religião na
política estaria destinada a fracasso seguro. A revogaçâo do Edito de Nantes na França
em1685 e conexa repressão aos huguenotes foram uma ultima explosão de intolerância
religiosa.
sempre mais alto de progresso e de bem-estar material; sob perfil social, é mobilidade e
mudança contínua, é incessante superação e renovamento dos modelos anteriores, é cultura
de massa mediante a difusão capilar e gigantesca dos meios de comunicação social; é
dissolução da família patriarcal e redução da fecundidade; é passagem da civilização
colonial, rural, à civilização industrial, urbana”.( Cf. La Civiltà Cattolica, La fede cristiana nel
póstmoderno, in L’uomo e il suo destino,cit, 288 Il sociologo della politica contemporânea Luciano Pellicani,
nel saggio Modernizzazione e secola-rizzazione, Il Sagggiatore 1997).
As passagens que caracterizam a modernidade, assim como elencadas pela descrição da
revista dos jesuítas, seriam: com o Renascimento, a passagem de uma visão teocêntrica,
religiosa e sobrenatural a uma visão antropocêntrica, terrestre e naturalistica; com Copernico,
de uma visão do universo tendo no centro a terra a uma visão tendo como centro o sol; com
Gallileu, passagem do critério de verdade baseado na autoridade àquele baseado na
experiência e na experimentação cientifica;
com Bacon, do saber como contemplação e como prcura da verdade ao saber como poder
sobre natureza; com Macchiavell, passagem da política sejeita a lei moral à política
desvinculada de toda norma moral; com a Reforma, de uma religião objetiva da Igreja ao
subjetivismo religioso de cada um. Num estágio sucessivo, que abraça os séculos XVII e
XVIII, a modernidade é caracterizada por quatro grandes revoluções: a cultural que,
assumindo os movimentos de Descartes e indo até Kant, possui a máxima expressão no
movimento do iluminismo, que opõe a luz da razão à obscuridade do mistério e do dogma e
faz da razão humana a norma única suprema do verdadeiro e do justo; a revolução científica,
inaugurada por Galilleu com as descobertas no campo físico e astronômico, e sobretudo por
Newton, com a formulação da gravitação universal; a revolução política, cujo núcleo central
está na mudança da fonte e da legitimação do poder político, enquanto quem funda e ligitima
o poder não é mais Deus, como era na teoria do poder divino dos reis, mas o povo, tornado
nação através um contrato social. Esta revolução política encontra a sua expressão histórica
nos últimos trinta anos do período setecentista com a revolução americana (1776) e com a
francesa (1789); a revolução industrial, iniciada na segunda metade do século dezessete na
Inglaterra com a introdução, na atividade produtiva, de novas máquinas (a máquina a vapor),
de novas fontes de energia (o carvão fóssil) e de novos meios de transporte (a ferrovia), e
com a nova organização do trabalho (a fábrica capitalista), que levou à concentração nas
cidades de numerosos assalariados provindos dos campos (urbanização) e, portanto, à
criação de um vasto proletariado urbano.
De nossa parte, porém, queremos propor algumas leituras transversais da mesma, de
caráter ontológico, ético-histórico, escatológico, das quais salta com toda evidência como,
com efeito, se confirma a já ilustrada pluralidade de registros para interpetrar e datar este
importante fenômeno histórico e cultural.
natural do mundo; dos territórios da ética para aqueles da arte; da filosofia para para a política
e assim por diante. Diminui aquela desenvoltura que permitia aplicar os critérios e as regras
de um setor a outros, e de colher resultados e conquistas de uma certa forma de aproximação
à realidade em outras.
Guardini, com uma leitura sincrônica da história do pensamento filosófico ocidental,
individua os elementos fundamentais da imagem moderna da existência no modo
característico de conceber a natureza, a subjetividade, a cultura: “à pergunta em que modo
exista o ser, escreve ele, a consciência moderna responde: como natureza, como sujeito e
como cultura. A estrutura destes três momentos indica alguma coisa de radical, além da qual
não é possível colher mais nada. É autônoma, não tem necessidade de justificação e não tolera
norma acima de si. Tal resposta vem de um conjunto da idade moderna e não depende por
isso de pensadores individuais. Ela exprime uma atitude geral de vida e de pensamento
dentro do qual o singular nasce e de fronte do qual é chamada a decidir. Semelhante a um
‘habito’ preexitente de sensibilidade comum ou a uma comum posse hereditária, ela incide na
consciência de cada um até quando se a rejeita. Vejamos um pouco mais de de perto estes
três absolutos da modernidade.
2.4.1.1. O conceito moderno de ‘natura’ começa a partir da Idade Média tardia, isto é, a
partir do momento no qual se iniciou a dissolução da estrutura medieval no Renascimento, e
atingindo o seu comprimento no século dezassete. A partir do Renascimento, a natureza é
compreendia como “uma unidade fechada‘ da existência e de sentido, como totalidade em si
estante (autônoma) e por si suficiente (autárquica). Assim, como dado singular, diante do
qual não somente é impossível, mas não é permitido nenhum recurso a outro: ao invés, é
pedido voltar-se totalmente a ele”. A natureza “designa a totalidade das coisas, de tudo o que
existe. Mais exatamente: de tudo o que existe antes do homem fazer alguma coisa. E portanto:
as estrelas, a terra, as suas plantas, os seus animais, e também o homem enquanto realidade
orgânica e espiritual. Tudo isto se oferece à experiência como qualquer coisa de profundo, de
potente, de magnífico: como uma plenitude de vida à disposição” (ibid.). A observação, a
experimentação e a interpretação dissolvem a idéia medieval de um mundo religiosamente
ordinário, e, ao contrário, emerge a concepção de um mundo ’natural’, científicamente
compreensível e tecnicamente dominável”.
Guardini nota que o carácter simbólico da criação na Idade Média era sentido tão
vivamente que a realidade das coisas arriscava, de fato, de não ser tomada em consideração.
Consequentemente, para o homem medieval o finito não era senão inautêntico reflexo do
Absoluto, e o tempo não era senão um limiar não essencial da eternidade. O Absoluto é tido
de tal modo importante e decisivo que o finito passava sempre para segunda ordem e não
tinha nenhum valor próprio. A consciência revaloriza o valor da realidade finita e temporal e
acompanha esta valorização do finito com tomada de consciência de que o mundo já foi
confiado à mão do homem; Com o início de era moderna o homem deu um passo irreversível
para uma nova responsabilidade a respeito do mundo. Pode-se afirmar que, em relação ao
mundo, em relação ao mundo, o homem moderno já está maduro.
Na concepção de Guardini da mordenidade, a natureza indica o que é ‘natural’, ou
seja, o justo, o são, o perfeito e é contraposta ao ‘inatural’, que é artificial, desviado, malsão,
corrompido. A natureza é o dado por excelência e, justamente por isto, é o dado exclusivo, é a
norma ‘tout court’, o natural. Consequentemente existe na modernidade uma vida segundo a
naturza representada na história pelo espírito do conceito de ’bonnête homme’ (a idéia do
homem justo) dos séculos XVI e XVII, do coinceito do ‘homme de la nature’ de Rouseau, do
conceito de vida ‘racional’ do iluminismo, e da beleza ‘natural’ do classicismo. Além disso, o
conceito moderno de natureza exprime algo de supremo e de radical: tudo o que é deduzido
da natureza é considerado definitivo, é tudo que se funda sobre ela já é justificado em si. E
19
porquer anatureza carrega em si um arcano caráter de principio de fim, tem uma grande
dimensão de mistério e torna-se o “Deus-natureza”, objeto de religiosa veneração. Ela é
louvada como criadora, sábia, bernigna; é a “mãe-natureza”, à qual o homem deve se
abandonar com absoluta confiança. portanto, o que é natural é sagrado e religioso a mesmo
tempo.
Um último caráter da natureza como é concebida na época moderna é a
autosuficincia. Ela subsiste em si mesma e por si mesma; na prática, não tem causa. A
causalidade, enquanto tal, vige somente no interno de cada componente da natureza, nos
processos da natureza, não na natureza como totalidade. Além da natureza, não há nada pelo
simples motivo de que ela, como tudo, não tem nenhuma causa, mas simplesmente é, existe.
Os conceitos de criação e de senhorio divino não mais servem para explicar a origem das
coisas. Deus vem absorvido no próprio mundo como seu fundamento e seu mistério e,
portanto, o mundo pode se considerar como fundado em si mesmo. “Na prrimeira impressão,
escreve Guardini, Deus aparece como desponteciado (sem poder). Para a experiência
imediata, Ele frente ao mundo perde valor de realidade, imponência e força de significação.
Em compensação, este mundo, aparentemente finito, aparentemente absoluto, começa a se
sentir autosuficiente”. O homem modernio parece estar convencido de que “nem na periferia
do mundo existe um espaço livre onde haja alguma coisa de supramundano, nem no íntimo
do mundo haja uma lacuna, onde possa entrar qualquer coisa de extramundano.” Para a
consicência religiosa anterior à epoca moderna, a representação da periferia e da lacuna eram
a representação de um espaço vazio do mundo no qual entrava Deus, mas não é assim para a
consciência moderna”.
Em síntese, o conceito de natureza, segundo o pensador ítalo-alemão, exprime
qualquer coisa de supremo, além do qual não se pode ultrapassar. O que se pode deduzir
disso é considerado definitivo. O que tem um fundamento natural é justificado de per si. Tudo
isto, porém, não signfica que a natureza possa ser compreendida em si. Ela possui um caráter
misterioso de causa originária e de fim último. Ela é ‘Deus-natureza’, como já vimos, e
objeto de grande respeito e religiosa veneração.
2.4.1.2 Além do conceito de natureza, nascida nos tempos modernos, também mudou
radiclmene a visão do homem, isto é, do ”sujeito”. Enquanto a antropologia medieval
interpretava o homem como criatura de Deus, a moderna procura libertar o ser humano de sua
ligação com o Criador. O conceito-cheve da moderna visão do homem é o conceito de
autonomia que, segundo Guarnini,suge no renascimento. A autodeescoberta do homem, a
consciência da liberdade e da força criativa levam ao sentimento de que o homem seja medida
de si mesmo e de seu agir, senhor de seu ser. Para a verdade, já para o fim d Idade Média,
existiam os pressupostos da idéia de autonomía, então a subjetividade começou a aparecer
antes de mais nada como ’personalidade’ e o homem começou a se compreeder de maneira
nova, como algo de importante e interessante, como dono de si. A ‘personalidade’ adquiriu
um papel autojustificante, diante do qual as normas éticas perdiam o caráter de absoluto e se
tornavam relativas. Os grandes perssonagem pensavam ter em si a lei da própria existência, de
serem, de algum modo, leis por si mesmos.
De qualquer maneira, no sistema kantiano a definição de autonomia adquire a sua
maior clareza. “Nela encontramos a expresão mais aguda na filosofia de Kant, escreve
Guardini, pela qual o sujeito lógico, ético e estetico é um elemento primordial, além do qual
não se pode conceber nada mais. Ele possui o caráter de autonomia, está fundado em si
mesmo e estabelece o sentido da vida do espírito”. Este conceito kantiano de sujeito lógico,
ético e estético se insere no mais amplo contexto do espírito iluminista, que visava levar o
homem à emancipação, à autonomia do pensamento, e encontra a sua elaboração
respectivamente nas três grandes Críticas, a da razão pura, a da razão prática e a do juízo.
20
espécie de equilibrio entre a razão, o instinto e a imaginação. Este equilibrio se rompeu pela
metade do século XIX. Até então, de fato, a obra da cultura humana não alterava a natureza
no seu profundo significado, não a destruía. Ela permanecia de certo modo quase ‘natural’, e
tinha o poder de unir-se à natureza sem, de outra parte confundir-se com ela, pois natureza e
cultura são duas coisas distintas e como tais devem permanecer. Da metade do século XIX em
diante, a obra cultural cessou de orientar-se para o ‘orgânico’, e o seu ponto de partida tornou-
se a força natural isolada, concebida racionalmente e tornada eficaz em virtude da máquina.
Esta última outra coisa não é senão a razão traduzida em aparelho. A medida humana e
natural é substituída por uma lógica racional e mecânica.
A orientação cultural da modernidade se separou e se afastou gradualmente da
Revelação. Na medida em que o mundo cessou de ser criação e tornou-se natureza, a obra do
homem cessou de ser um serviço a Deus e tornou-se manipuaçõa de objetos. O homem, de
servidor tornou-se criador e se fez senhor da própria existência. Na sua vontade de cultura, ele
emprendeu a construção da existência como obra própria. A cultura começou ser
compeendida como um todo autônomo e autarquico. Consequentemente, com o início dos
tempos modernos, se desenvolveu um vasto e autônomo setor de cultura (ciência, economia,
política, arte, pedagogia), que se desvinculou dos laços com religião e proclamou a sua
independência diante de Deus e da Revelação. Os diferentes setores do conhe-cimento, da
ação e da criação construíram suas própias leis.
A obra do homem progressivamente absorveu e reivindicou para si o significado que
antes era atribuído à presença e obra de Deus no mundo. De Galileu em diante, a criatividade
não se referiu mais à inteligência criadora superior, mas ao homem que se colocou no lugar do
Criador e se autoconstituiu como criador. A Revelação cristã, então, cessou de ser
concebida como base da existência humana, e não mais determinou de maneira decisiva o
desenvol-vimento da cultura e da história. A autonomia da cultura consiste no fato de que
toda a atividade cultural se desenvolve fora da relação de obediência a Deus, e declarada
como uma criação idependente e soberana. E, não obstante, a ciência, a técnica e tudo o que
delas deriva, foram possíveis somente por meio do cristianismo. “Somente porque o homem
vem ao ser por chamado de Deus e subsiste em tal chamado; porque ele é o ‘tu’ evocado por
Aqule que chama a si mesmo ‘Eu sou’, se dá a possibilidade de que possa crer-se um ‘eu’
autônomo. Somente porque o Deus Criador realmente colocou mão na obra do mundo, o
homem pôde chegar a pensar de ter a construir uma autônoma cultura.” (Cf. Guardini,
Mondo e persona, cit.Ignázio Sanna, Antropologia cristiana tra modernità e posmodernità, Queriniana, Brescia,
2001, p.19; idem p.83). Segundo Guardini, nada é mais falso do que a opinão segundo a qual o
domínio moderno do mundo no campo do conhecimento e da técnica deva ser alcançado
lutando em contradição com o cristianismo. O contrário é verdadeiro. “O enorme risco da
ciência e da técnica moderna tornou-se possível somente sobre o fundamento daquela
independência pessoal que Cristo deu ao homem. Somente Cristo dá ao homem uma outra
posição a respeito do mundo. A partir desta posição o mundo será relativizado e se abre
caminho para o domínio sobre ele.”
Guardini não deixa de fazer notar que, pelo que diz respeito ao princípio da
autonomia, a cultura moderna não diverge muito da cultura pós-moderna. Esta última, porém
favoreceu o afirmar-se de fenômenos, como a técnica e o poder, que representam uma
verdadeira ameaça para humanidade. O pensamento técnico racional, de fato, fez desaprecer
da existência do homem o elemento ‘natureza’ e fez tudo tornar-se ‘história’, isto é, obra do
homem. Por um lado, tornou-se sempre mais insignificante o que vem de si e, por outro lado,
tornou-se sempre mais forte o que brota da iniciativa do homem. A existência humana
adquiriu sempre mais um caráter artificial, e o homem passou de um mundo a ele dado e a ele
preexistente, a um mundo criado e determinado por ele. Enquanto o homem moderno baseava
as normas da técnica na utilidade, o homem pós-moderno não se interessa tanto da utilidade
22
modernidade. Segundo Taylor, o primeiro a excluir das coisas todo tipo de sentido ou ‘logos’
ôntico, a promover o desencanto do mundo, de tal modo que o verdadeiro significado das
coisas seja aquele linguistico, reconhecido racionalmente, este foi, sem dúvida, Descartes. Na
concepção cartesiana das coisas, a evidência da verdade e do bem são filtrados pelo
procedimento metódico e, com isso, se origina uma cocepção procedural e não mais
substancial da razão. Também as “paixões da alma’ terminam por ser consideradas como
energias puramente instrumentais e objetivas, que a razão utiliza assim como se utiliza em
qualquer objeto externo. Locke estendera este método de observação externa e de descrição
das experiências pessoais também ás ideias e à motivações interiores.
os mesmos pressupostos epistemológicos que utiliza nas ciências naturais. E, na base destes,
as intenções e os sentimentos do homem não são valorizados em si mesmos, pelo que são e
pelo que eles valem, mas somente segundo a ‘explicação melhor’ e a compreensão melhor
que eles podem oferecer da realidade.humana.
Definitivamente, segundo Taylor, a identidade da modernidade pode ser resumida em
três caracteristicas que correspodem a outros tantos “incômodos”: a perda de sentido, com a
diminuição dos horizontes morais; o eclipse dos fins diante da estensão da razão
instrumental; uma perda de liberdade.
Relativamente à perda de sentido, Taylor observa que se vive num mundo no qual os
homens possuem direito de escolher por si o modo próprio de vida, de decidir em plena
liberdade de consciência quais convicções abraçar, de forjar a sua vida em mil diversas
maneiras sobre os quais os seus antepassados não tinham nenhum controle. E, geralmente,
estes direitos são defendidos pelos modernos sistemas jurídicos. Em linha de princípo os
seres humanos não são mais sacrificados às exigências de ordenamentos presumidamente
sacros que os transcendem. No passado os homens costumavam ver-se como parte de uma
ordem mais ampla. Em alguns casos tratava-se de uma ordem cósmica, de uma grande
’Corrente do Ser’, na qual os homens figuravam no lugar que lhes cabia, ao lado dos anjos,
dos corpos celestes e de outras criaturas terrestres, a eles semelhantes. Este ordenamento
hierárquico do universo se refletia na hierarquia da sociedade humana. Os homens se
encontram muitais vezes confinados em um dado lugar, em um papel e em uma condição que
eram propriamente os seus e dos quais praticamente era impensável afastar-se. A liberdade
moderna nasce do descrédito em que caíram estes ordenamentos, e, em seguida ao descrédit
o destes ordenamentos os homens não têm mais o sentido de um escopo superior, de
alguma coisa pela qual valha a pena morrer. Eles aspiram aos prazeres ”pequenos e vulgares”
próprios da época da democracia, segundo Tocqueville; sofrem uma falta de paixão, segundo
Kierkegaard; não aspiram outra coisa a não ser a um miserável “bem-estar”, segundo
Nietzsche. Em última análise, o lado escuro do individalismo é o seu centrar-se sobre o eu,
que ao mesmo tempo esconde e restringe a vida humana, empobrece o seu significado e a
afasta do interesse pelos outros e pela sociedade. O individuaismo leva à sociedade
permissiva, da “me generation” do narcisismo. Enquanto os grandes ordenamentos davam
um sentido ao mundo e à atividade da vida social, as coisas que nos circundam não eram mera
matéria prima ou simples instrumentos potenciais dos nossos projetos, mas tinham o
sigificado que lhe era conferido pelo o lugar que ocupavam na ’Cadeia do ser’. O descrédito
destes ordenamentos foi chamado de o desen-cantamento do mundo. Com isso as coisas
perderam uma parte de sua magia.
A racionalide instrumental ou mecanicista é aquela que calcula a apli-cação mais
econômica dos meios disponíveis para alcançar um determindo fim e cujo parâmetro de
medida é a tomada em consideração da melhor prestação e da melhor relação custo-produção.
Tudo é materializado e quantificado, porque é medido na base de seu valor econômico. Por
exemplo, a vida humana não é medida por seu valor intrínseco, mas pela quantidade de
dólares de que ela precisa para ser vivida, para ser defendida, para ser salva. Isto importa o
desaparecimento de finalidades independentes, de significados espirituais e a afirmação de
critérios de ação puramente econômicos e eficientes. A razão instrumental, ao perseguir seus
fins e ao realizar as suas ações, adota a solução tecnológica mais adequada e não se interroga
sobre os significados de sua ação e sobre sua liceidade moral ou humana ‘in genere’. No
campo da medicina, de modo particular, a oferta tecnológica para a cura do paciente é
preferida à oferta humana. A liceidade moral de uma determinada interveção, por isso, não é
determinada pelo seu factível humano, mas pela sua realizabilidade técnica.
25
manifestação permanente de Deus, nas três pessoas da Trindade, se comporta como quem,
tendo subido à uma ’specula montis’ e tendo contemplado a história passada e a presente,
pôde estabelecer que já passaram duas idades e uma ainda está por vir, aquela na qual se
manifestará a pessoa do Espirito Santo.
poucos, mas que constitui a razão e também a natureza, por assim dizer, ‘meta-histórica” da
história. Segundo a sugestiva imagem de Ranchetti, Taubes faz correr o pêndulo do
apocalipse, escatologismo, messianismo spbre a história de Ocidente e,quase como uma vara
de rabdomante, registra as vibrações do terreno para individulizar a preseça de um veio
sensível a estas categorias. Taubes, todavia, na sua pesquisa histórica, não interroga um dos
termos do percurso, isto é, o êxito final, que permite a compreensão da história ’secundum
finem’, embora de maneira traumática, interrogue também o primeiro termo do mesmo
percurso, isto é, a origem. “Assim, a pergunta inaugural do livro não pode senão colocar-se
fora da história e, portanto, dar à narração, cronologicamente ordenada, variantes que ela
apresenta um caráter, num certo sentido, anti-histórico.
Delineado, agora, com relativa suficiência, o vulto ou, como temos precisado, os vultos da
modernidade, e configurado, portanto, o quadro de referência histórica e conceptual de sua
antropologia, devemos passar a descrever mais propriamente esta antropologia que, por um
lado, animou os ideais comuns da cultura ocidental e, por outro lado, teve raizes muito
distantes e nem sempre unanimemente reconhecidas. Ela é, de fato, toda centrada na
capacidade do homem de conhecer as coisas e na sua autonomia e liberdade de juízo e de
ação. Se, de qualquer forma, queremos prescindir de interpretações mais ou mesnos
ideológicas da modernidade e nos atemos simplesmente aos dados da sua cronologia, causa e
natureza, que até aqui expusemos, podemos resumir a antropologia desta época histórica em
algumas características fundamentais, comumente definidas também como “absolutos
terrestres”.
fez mais frio? Não continua a vir noite, sempre mais noite? Não devemos acender lanternas
pela manhã?”
2.5.2.2 O preço da vitória da razão, entre outros, foi colocado em trágico relevo por Franz
Rosenzweig, o qual escreveu : “A razão venceu, o fim releva o início, o objeto supremo do
pensamento é o mesmo, não tem nada de inacessível à razão; o próprio irracional é somente
o seu limite, não um além. Vitória, portanto, em toda linha, mas a que preço! O grande
edifício da realidade está destruído: Deus e o homem volatizados no conceito limite de um
sujeito do conhecimento; mundo e homem, de outro lado, no conceito limite de um puro e
smples objeto deste sujeito, e o mundo[…] tornou-se uma simples ponte entre estes conceitos
limites.
Também para primado da razão, todavia,vale quanto foi dito para primado do sujeito, isto é,
que o uso da razão, enquanto tal, não deve ser considerado negativamente, mas positivamente,
porque é doutrina comum da tradição cristã, a partir de santo Agostinho, para passar através
de S.Ansermo e Santo Tomás, que a fé procura ser entendida com inteligência e a inteligência
procura a razão da fé. O Vaticano I precisou que “embora a fé esteja acima da razão, não
poderá haver verdadeira divergência entre fé e razão, porque o mesmo Deus que revela os
mistérios e comunica a fé, coloca também no espirito humano o lume da razão, este Deus não
poderia negar a si mesmo, nem a verdade contradizer o verdadeiro” (DS 3018).; “e não só a
fé e a razão não podem nunca estar em contradição entre si, mas podem dar-se um mútuo
auxílio: a reta razão, de fato, demonstra os fundamentos da fé e, iluminada por sua luz, pode
cultivar a ciência das coisas divinas; a fé, ao invés, libera e protege a razão dos erros e a
enriquece de muitos conhecimentos” (DS 3019).A enciclica woitiliana “Fides et ratio”,está
toda dedicada a demostrar a integibiligidade da fé e a necessidade de pensar esta última, para
poder vivê-la e testemunhá-la com a vida .”A filosofia, escreve João Paulo II, se configura
como uma das tarefas mais nobres da humanidade, pois que a é próprio da filosofia manter
vivas as perguntas de fndo que caracterizam o percurso da existência humana: Quem sou?
De onde venho? E para onde vou?, porque a presença do mal?, que coisa nos acontecerá
depois da vida? ”A encíclica, todavia, mesmo insistindo sobre os poderes da razão humana,
acentua mais vezes também os limites. De fato, é convicção condividida de que a salvação
não pode vir da razão. A razão humana coloca perguntas existenciais às quais só Cristo
oferece uma resposta satifatória. De fato, onde o homem poderia procurar a resposta às
dramáticas perguntas, como aquelas sobre a dor, o sofrimento do inocente e a morte, a não ser
na luz que provém do mistério da paixão, morte e ressurreição de Cristo? A razão não pode
esvaziar o mistério do amor que a cruz repesenta, enquanto a cruz pode dar à razão a resposta
última que ela procura”.
daquela empresa temerária foi a aquisição de um novo modo de pensar e de uma mentalidade
científica moderna, pela qual os filósofos positivistas do Círculo de Viena podiam considerar
a ciência experimental como a forma mais pura do conhecimennto raconal e os cientistas de
hoje podem afirmar de querer saber alguma coisa para poder fazer alguma coisa. A
racionaliade cientifica já de muitos filósofos e pesquisadores é cosiderada como a única
produtora de verdade, poque se admite que somente aquilo que científico é o verdadeiro e
somente a realidade física é a verdadeira realidade.
A ciência moderna, de fato, nasceu na cristandade e, também, como expansão dela..
Galileu e Newton, nas suas ntenções, acrescentaram novas perspectivas ao conhecimento
cristão, como Cristóvão Colombo tinha acrescentado novas terras à cristandade. A nova física,
de Kepler a Galileu e a Newton, foi inaugurada por cristãos que admitiam conhecer a mente
divina justamente mediante a análise racional dos fenômenos. Galileu pensava que a nova
física tivesse alcançado o modo divino de conhecer as coisas, Newton admitia que o tempo e
o espaço fossem a presença divina no universo. As coisas estão presentes a Deus mediante
estas demonstrações que incluem as coisas e não somente as coisas.
Mas com o afirmar-se a mentalidade científica moderna, se esqueceu
facilmente esta origem cristã, ‘l’esprit de finesse’ cedeu o passo ao ‘esprit de geometri’, se
rejeitou, como critério de conhecimento, quer o recurso às fontes da Escriturs, quer da
Tradição. O método científico moderno, derivado diretamente da aplicação da racionalidade
científica, tornou-se exemplar para cada procura da verdade e comportou, de fato, uma
restrição do conceito de verdade e, antes, um compreenção má da experiência do verdadeiro,
que também se dá no câmbito extra-cientifico. O estatuto da London Royal Society, no 1660,
podia proclamar que ela teria presciindido de toda discussão de religião, retórica, metafísica,
moral e política; não teria pressusposto dogma algum; não teria formulado hipóteses; teria
conhecido a natureza unicamente atrvés da experiência. E Ernest Renan disse no seu tempo
que a ciência, e somente a ciência, pode dar à humanidade aquilo o sem o qual ela não pode
viver.
Esta confiança na ciência levou rapidamente a uma forma de otimismo científico,
porque foi conferido ao homem o poder de conhecer o universo,desde a menor célula do
organismo humano até a maior galáxia do firmamento, o poder da manipulação da matéria e
das fontes da vida, graças ás tecnologias muito avançadas, para eliminar os males da pobreza,
da doença, da ignorância, da opressão. Foi-lhe favorecida a vontade de estar bem, porque se
conserva a beleza por mais tempo, se envelhece sempre mais tarde, porque pode viver com o
coração de um outro, com um pulmão artificial,se fazem filhos além de qualquer barrera da
biologia, porque se poder tornar-se mãe aos 60 anos. A pesquisa cientifica abriu tais e tantas
possi-bilidade de bem estar físico que a expectativa de um mundo sem doenças, já parece a
muitos mais que legítima, mesmo se, de um ponto de vista concreto, a derrota de fantasmas
como o cancer, a Aids, ainda está longe para ser uma realidade, porque o cancer continua
sendo a principal causa de morte nos paises ocidentais e, embora o desafio para cronicizar o
virus da Aids tenha dado bons resutados, não se dispõe ainda das relativas vacinas. Mas a
ciência concientizou que os remédios, a cirurgia, as técnicas podem fazer muito pelo nosso
corpo e fazem nascer um otimismo irracio-nal de preferência. Por exemplo, o pesquisador
italiano Pier Giuseppe Pellicci, diretor do IEO, (Instituto Europeu de Oncologia) de Milão,
em Dezembro de 1999, afirmou ter escoberto p66shc, acima citado, por brevidade, ‘scic’, o
genes da vida, responsável pelo envelhecimento da celula, e afirmou que cietificamente não
existem provas que a morte seja geneticamente determinada por uma necessdade biológica.
2.5.3.2. Nos últimos decênios, a confiança irracionaal no poder da ciência começou a trincar-
se, sobretudo depois que os limites do absolutismo científíco foram postos em evidência
pelos filósofos da Escola de Franckfurt e pela controvertida epistemo-logia de Karl R.
34
Popper. Este último fez notar que as teorias cientificas vão e vêm, são e permanecem
desmentíveis. Além disso, lentamente convenceram-se de que os discursos não científicos,
como as teorias filosóficas, não são de fato insensatos como pretendem os neopositivistas; que
o cérebro não explica a mente; que o determinismo não é sustentável; que também não é
sustentável o consequente fatalismo, porque o futuro permenece fundamentalmente aberto
para as nossas escolhas e para o nosso empenho de cidadãos livres e responsáveis numa
sociedade aberta. Para algns seria exatamente um correspondente ‘científico’ do nihilismo
religioso ou filosófico pelo fato de que muitos cientistas têm a sensação que a empresa
científica poderá desenbocar no nada. “Existe, de fato, uma consciência crítica, ‘na ciência’,
da possibilidade de um fracasso da razão E esta consciência não é apenas colocada
historicamente nos momentos de introspecção e de revisão crítica dos princípios, como foi,
por exemplo, pela crise dos fundamentos da matemática do começo do século XX. Pode-se
perceber um sentido de perigo e de ameaça também nas palavras de cientistas empenhados em
grandiosas inovações, que parecem emanar um sentido de poder e de otimismo mais do que
fraqueza ou de crise. Ao contrário, existe frequetemente, uma consciência, na própria
atividade científica, do nihilismo silenciosamente operante por trás das grandes conquistas da
religião”.
Em nossos dias, de qualquer modo, ninguém mais coloca em dúvida que as realidades
terrenas sejam autônomas e temos o leis próprias e estatutos próprios epistemológicos, que
devem ser respeitados por todos aqueles que estão empenhados em uma profissão civil. A
pesquisa científica e a atividade humana em geral, se desenvolvem segundo as próprias leis e,
em relação às normas morais, não se opõem nunca à fé, porque “as realidades profanas e as
realidades da fé possuem origem no mesmo Deus” (GS 36). A este propósito, o Vaticano II,
citando o caso de Galileu Galilei, deplorou a atitude daqueles cristãos que, no passado, não
perceberam nem aceitaram a legítima autonomia da ciência e confundiram a mensagem
religiosa revelada com uma visão particular do mundo no qual ela foi expressa. (GS 36). João
Paulo II acentuou que a Igreja nutre grande estima pela pesquisa científica e técnica, já que
constiuem uma signficativa expressão do domínio do homem sobre a criação. (C.da Ig.Católica,
n.2293) e um serviço à verdade, ao bem e à beleza”.
Mas, de qualquer maneira, é evidente que não será nunca a ciência que nos dirá aquilo
que devemos fazer; nem será a ciência que nos ensisnará em que coisa nós podemos esperar.
Ela, por principio, não responde às perguntas mais importantes e decisivas da existência
humana, porque pára na explicação do ‘como’ da realidade e não pode dizer nada sobre o
“porque” da mesma realidade. A encíclica “Fides et Ratio”, assim como colocou em guarda
contra do absolutismo racionalístico, colocou também em guarda contra o absolutismo
científico e denunciou o fato de que a concepção filosófico-científica se recusa em admitir
como válidas as formas de conhecimento diversas daquelas que são próprias das ciências
positivas, relegando aos confins da mera imaginação, quer o conhecimento religioso e
teológico, quer o saber ético e estético. Para o cientismo, os valores são relegados a smples
produtos da emotividade e a noção do ser é posta de lado, para dar espaço à pura e simples
factualidade. A ciência domina todos os aspectos da existência humana através do progresso
tecnológico e a mentalidade cientista conseguiu fazer aceita por muitos a idéia, segundo a
qual, o que tecnicamente factível se torna, por isso mesmo. também moralmente admissível
(Fides et Ratio,88).
2.4.1. Uma
antropologia fundada nos ideais de liberdade e de democracia.
2.4.2. Segundo
HEGEL, a liberdade é o sinal distintivo da idade moderna, com a qual o homem entrou no
35
“período do espirito em que se sabe livre, enquanto quer o que é verdadeiro, eterno, universal
em si e por si”. Esta liberdade nutriu a aspiração e a esperança de todo o século das luzes,
inspirou os ideais dos teóricos da perfectibilidade indefinida do homem, como Jean-Antoine
Condorcet, que escreveu o famoso ensáio sobre confiança absoluta no progresso do homem.
A revolução francesa e, depois dela, todas as outras que se sucederam em lugares e tempos
diversos, proclamaram, ao menos formalmente, os ideais da liberdade, da fraternidade e da
igualdade, como a base de toda forma de convivência civil e de toda orgnização democrática.
O primeiro artigo da Declaração dos direitos do homem e do cidadão, de 26 de agosto de
1789, que afirma que “os homens nascem e permanecem livres e iguais”, pode ser consi-
derado como o início do longo caminho da emancipaçao que percorreu a moderna civilização
ocidental. Os últimos séculos da história ocidental, de fato, foram caracterizados por
processos de emancipação e de liberdade que mudaram o aspeto e a configuração da
sociedade. Pense-se na emancipação do sujeito, promovida pela correntes filosóficas do
iluminismo, na emancipação do cidadão, inaugrada e defendida pela revolução francesa, na
emancipação da classe operária, inspirada pelas teses revolucionárias do marxismo, na
emancipação da mulher, na defesa dos diversos movimentos feministas, na emancipação dos
critérios morais divergentes, proposta pela cultura radical mais libertária, pela qual existe
somente a liberdade da e a liberdade de, mas não a liberdade para.
A antrologia imanentista na qual aproaram estas correntes de pensamento, todavia, fruto
direto da eliminação e da rejeição de toda forma de transcendência, levou a considerar o
homem como o centro absoluto da realidade, fazendo-o ocupar artificialmente o lugar do
próprio Deus. O ter enfraquecido Deus, ou pior ainda, o ter esquecido Deus abriu um
vastíssimo espaço para o livre desenvolvimento do nihilismo no campo filosófico, do
relativismo no campo do conhecimento e, no campo moral, do pragmatismo e até do
edonismo cínico na configuração da vida quotidiana. Seguiu-se o sonho de construir um
mundo verdaderamente humano num único fundamento das puras potecialidades do homem.
O eclipse de Deus na consciência moderna levou a uma visão desmedida da subjetividade
como fonte última e fundamento da verdade. Neste quadro, a liberdade, entendida como fonte
última de toda a verdade, acabou por ser considerada dona e soberana do mundo, desprovida
de outra lei que não seja o seu próprio projeto. Tudo isso levou não somente a uma particular
violação dos direitos das pessoas, mas também à concepção e à praxe do ‘estado tirano’, livre
de qualquer valor e norma que não seja a pópria soberania. O nacional-socialismo e o
comunismo foram as manitestações mais nefastas deste conceito de estado. Mas, no Ocidente
e no Oriente, nem mesmo as democracias se subtrairam da ameaça de serem manipuladas e de
se transfomarem, assim, em receptáculo de atos e atitudes sociais que colocam em perigo,
quando não os violam diretamente, os direitos invioláveis da pessoa humana e das instituições
originárias que a protegem. A passagem de uma lógica de normas e de limites a uma lógica na
qual tudo é negociável e opinável, produziu uma sociedade da incerteza na qual se combinam
técnicas de controle ou de consenso sobre pessos e formas violência gratuita, da qual
dificilmente se sai com resignação do incômodo ou com a forte proclamação da tolerância
zero.
2.5.4.2 Uma dimensão muito importante dos ideais de democracia e de liberdade que
contradistinguem a visão antropológica da modernidade é seguramente a concepção da
tolerância. Da idade moderna em diante, de fato, o sentido da identidade e superioridade
adquirido pelos cristãos europeus, que chegava a justificar deveras a pena de morte para os
hereges internos e a guerra de religião para os hereges externos, deveria se confrontar com a
presença de mais cristianismos, cada um dos quais apresenta a pretensão de possuir uma
verdade sua, e está disposto a usar a força para defender esta sua verdade e eliminar
fisicamente o adversário. A Reforma protestante tinha reduzido a cacos a unidade dogmática,
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Pelo que diz respeito ao aspecto político da questão, a afirmação, nas sociedades
democráticas, de um pluralismo não só de idéias e de valorers mas também de gupos que
possuem ‘status’ diferenciados, que coexistem e reivindicam uma visibilidade pública,
deslocou o debate da filosofia política das temáticas da justiça distributiva dos anos setenta e
oitenta (do século XX) para as temáticas do pluralismo. A perspectiva mais significativa foi
elaborada pelo filósofo americano J. Rawls, que propôs a radicalização da noção Stuart Mill
de tolerância através da idéia da neutralidade do Estado. Na base da distinção entre
concepção do justo e concepção do bem, Rawls teorizou uma completa indiferença da parte
da autoridade pública nos confrontos das diversas e contrastantes concepções do bem que
cada grupos de cidadãos pode condividir. Em situações de pluralismo acentuado como as da
sociedade multiétnica contemporânea, a legitima política pode ser definida somente pelo
consenso. Este consenso exigido pela legitimidade é constituido, pois, por principios neutros
comuns, no sentido de que o que pode ser condividido numa sociedade pluralista, não pode
ser senão neutral e o êxito do acordo deve ser, por sua vez, neutral, sob pena de tratar de
modo discriminatório as diferenças morais. Os principios teóricos e operativos para obter o
consenso são um pluralismo razoável e um´’consenso por sobreposição’. Na base do gozo
comum dos direitos da palavra, da religião, da associação, da liberdade de imprensa, os
homens raciocinam e decidem de modo diverso e o fruto de seus raciocínios e das suas
decisõe pode ser acolhido, justamente, por um pluralismo razoável e por um consenso por
superposição
(1981). Popper, como se sabe, possui uma concepção problemática da verdade e sustenta
que, dado o caráter inevitavelmente congetural da ciência, a procura pública da verdade
deva adevir não com a imposição, mas com o diálogo, baseado em argumentos racionais e
condivisíveis.
Uma vez delineado o rosto da modernalidadee e uma vez configurada antropolgia com
as características que acabamos de descrever no último capítulo, nos resta ver como o
cristianismo se tem ralacionado com esta antropologia ao longo dos séculos passados e como
se relaciona ou deve se relacionar com ela em nossa situação da pós-modernanidade.
2.6.1. Partimos do fato inconteste de que a cultura cristã é, sem dúvida, o berço da
modernidade ocidental. Quer sob o ponto de vista histórico quer geográfico, quer do ponto de
vista espiritual quer intelectual, o nascimento e o desenvolvimento do mundo moderno
afundam as raízes na cristianidade. A própria a noção de Ocidente, assim como a de
mordernidade, estão ligadas ‘conteudisticamente’ à uma relação negativa ou positiva com a
cristianidade. O Ocidente, com efeito, etimologicamente, indica uma civilizção em declínio,
ou seja, o estado da civilização cristã como existe depois do moderno, isto é, depois da
tentativa de sua laicizização e depois da de sua destruição por obra do totalitarismo. A noção
de modernidade, ao invés, baseada numa indicação cronológica, está essencialmente ligada
ao desenvolvimento do tempo em sentido progressivo, introduzido na cultura ocidental pela
tradição hebraico-cristã. Foi Santo Agostinho, como já vimos, que transformou o tempo
cíclico dos gregos, concebido como um contínuo retorno ao idêntico, num percurso da alma;
que deu a este um valor e a espessura de história, porque o ligou à realização de uma
promessa de salvação futura. Foi sempre o mesmo Agostinho que assinalou um papel
determinate à antropologia nos processos do conhecimento da verdade da fé e que inaugurou
a virada antropológica, muito tempo antes de que ela fosse tematizada pela filosofia e
teologia contemporâneas, quando propôs como itinerário para chegar concepção de Deus Uno
e Trino, a interioridade humana, em substituição à exterioridade do mundo da natureza. Não
obstante algumas tentativas tenazes de tirar toda referência cristã à medida do tempo, nós
vivemos um tempo histórico estruturado pelo advento de Cristo. O calendário cristão, que
mede o tempo a partir do conhecimento de Cristo, se impôs a todos os outros calendários e a
história universal, de fato, é medida por um valor cristão anônimo mas real e eficaz.
Por outra parte, pense-se como a Bíblia marcou profundamente a história e a cultura do
Ocidente, a ponto ter sido definida o grande código da cultura ocidental. Arquitetura, pintura,
escultura, música, teatro, cinema buscam nas Esrituras temas, perguntas, propostas; e artistas
do calibre de Giotto e Cimabue inventaram o alfabeto da linguagem artística ocidental. Pense-
se, ainda, na contribuição fundamental que o monaquismo deu ao desenvolvimente da
agricultura, além da arte e da liturgia. Monges como Bento, Beda, Desiderio e Gregório
Magno, São Bernardo, Sâo Romualdo fizeram a Europa. A mesma concepção blíblica de
Deus teve profundas consequências para a concepção do homem e do mundo. A Biblia, com
efeito, cultivou sempre um rígido monoteísmo e apresentou e defendeu a divindade do único
Deus e Senhor ”criador de todas coisas” (Gn 10,16). A consequência direta e imediata da
defesa deste monoteísmo foi a mundanização do mundo. Pode-se sustentar que a teologia da
criação foi, com efeito, o primeiro pressuposto de uma autêntica secularização, porque na
medida em que se afirma que o mundo foi criado por Deus, se afirma que ele não é divino,
mas finito, secular, mundano. O mundo é o não-divino e, como tal, se contrapõe a Deus, numa
relativa autonomia. Justamente a reafirmação da dimensão mundana do mundo e da afirmação
criatural da criatura levou a dizer que as modernas ciências naturais e a técnica, e em gral e
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a moderna consciência secularizada, são, ‘de fato e de direito’, uma consêquencia de uma
revelação hebraico-cristã a respeito da criação. Ela, com efeito, reduz o mundo a ser objeto
de pesquisa teórica e do domínio prático do homem. A fé na criação confiou o mundo,
como pofano mundo mundano, ao saber investigador e à vontade plasmadora do homem,
porque, quer o Antigo Testamento quer o Novo Testamento, já desde sempre atuaram uma
fundamental e densa demitologização do mundo.
Tudo isto não quer dizer, porém, que a relação entre cristianismo e modernidade, no
curso dos séculos tenha estado sempre tranquila e isenta de conflitos. Se, com efeito, levando
em conta a multiplicidade dos aspetos da modernidade, se quer examinar como o cristianismo
se tenha relacionado com ela, antes demais nada é preciso constatar que o surgir e a
afirmação de muitas idéias modernas, como a liberdade individual e religiosa, a democracia,
a autonomia da pesquisa científica, inicialmente, tornaram a Igreja e os cristãos muito
suspeitos. Sobretudo a defesa da autonomia absoluta da razão humana era considerada como
ante-câmara da rejeição da fé em Deus e de toda referência transcendente. “É conhecido,
escreve Metz, que a Igreja católica e a tendência de fundo de sua teologia acompanharam a
história européia moderna com uma atitude mais ou menos defensiva. Assim, por exemplo,
ela não participou de um modo verdadeiramente produtivo da ‘história de liberdade’ da idade
moderna e, sobretudo, dos processos do iluminismo burguês e pós-burguês, frente aos quais,
ao contrário, o mais das vezes se fechou, Os assim chamados ‘tempos católicos’ da idade
moderna, sobretudo do iluminismo em diante, quase sempre, foram substancialmente tempos
‘contra’ : os tempos da contra-reforma, os tempos do contra-iluminismo, os tempos da
contra-revolução, os tempos da restauração política e do romantismo. Certamente, podemos
ver também uma notável sensibilidade pelas profundas contradições que agitavam o espírito
europeu do tempo e a sua história de liberade, e se pode reconhecer uma intuição da dialética
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Galileu Galilei, em 1663, foi obrigado a retratar diante do Santo Ofício a doutrina do
movimento da terra. A Sorbone de Paris, em1747, viu como um atentado à verdade do
Gênesis a teoria da terra de Georges Louis Leclerc, conde de Buffon, na qual se explicava
que as estruturas geológicas, que se podem observar no terreno, são o resultado de uma longa
história, e que a geologia é antes de tudo ciência histórica, dominada pelas relações entre a
terra emersa e o mar. No setor de biologia é bem conhecida a aversão inicial do cristianismo
contra a prática da medicina, porque se pensava que os doentes não deviam ser curados pois
a doença era fruto da vontade de Deus e preço de sofrimento a pagar pelo pecato original.
Não por acaso, durante toda a Idade Média os grandes médicos são de religião hebraica e
muçulmana, como o hebreu Moisés Maimonede (1135-1204) e o árabe Avicena (980-1037).
E a primeira escola medieval de medicina em Montpellier foi obra de médicos hebreus. A
Igreja católica se mostrou reticente nos confrontos com a medicina árabe e hebréia da Idade
Média e a ela prefria a medicina de Galeno, por toda uma serie de convicções, como, por
exemplo, aquela de que o corpo é sagrado, o sangue detestável, a dissecação suspeita e os
órgão genitais proibidos. A partir de 1131, proibiu-se aos clérigos a prática da medicina e
esta proibição permaneceu em vigor até a reforma conciliar do Código de Direito Canônico
de 1983. No início do século XIX, depois da derrota de Napoleão, a Igreja se opôs à
vacinação anti-varíola, sustentando que Deus poupa quem quer, fez a natureza com as
epidemias e não é tarefa do homem retificar a criação. A vacinação foi proibida no Estado
Pontifício e a epidemia de cólera de 1832 foi apresentada pela Igreja como uma punição
divina da revolução de 1830. Finalmente, a teoria da evolução biológica da espécie humana,
proposta pela primeira vez por Lamarck (1744-1829) e divulgada sobretudo pelas as obras de
Charles Darwin (1809-1882), foi condenada por todas as Igrejas, sem nenhuma ezitação.
muito bem existir ‘etsi Deus non daretur’. O cristianismo ocidental de algum modo foi
constrangido a se tornar anti-moderno,”na medida na qual a razão do Iluminismo tirava o
apoio (descalçava) à autoridade da revelação e da tradição e na qual o advento das sociedades
democráticas contestava diretamente o princípio hierárquico da sociedade-igreja”. A
resposta histórica proposta para manter a integridade da tradição cristã diante pretensões
sacrílegas da modernidade foi o “catolicismo intransigente”.
Ao Ressurgimento italiano faltou um grande herói popular como, por exemplo, foi
Papa Pacelli (Pio XII) nos anos 1940-1945 da segunda guerra mundial. Neste quinquênio Pio
XII foi verdadeiramente o único ponto de referência para o País desanimado e humilhado.
Um Papa bom, presente, que manchou o hábito de sangue andando entre a gente
bombardeada.Um papa que soube assumir sobre si a respeitabidade que todos os outros
políticos e eclesiásticos tinham perdido.
Augusto Del Noce apresenta a seguinte interpretação da modernidade. Segundo diz este
filósofo católico que embora a modernidade afirme a autonomia do homem, não seria por si,
um afastamento de Deus, não seria um ateísmo, por que no mundo moderno existe uma linha
de pensamento dirigida à recuperação e ao afinamento do pensamento metafísico e religioso
tradicional. Del Noce afirma o seguinte: não se deve dar um valor axiológico à idéia de
modernidade. Esta não deve ser entendida como uma visão do homem e do mundo que possui
mais valor e que, portanto, é melhor que aquela do passado. Não é necessário definir a
modernidade a partir da contraposição moderno-anti-moderno. A idéia de modernidade é
historizada e problematizada. E, consequentemente, são reconhecidos os valores da
civilização moderna, pelo que eles representam em si mesmos e não porque se afirmam em
oposição ao passado. Para cancelar o valor axiológico da idéia de modernidade, Del Noce se
refere, de modo particular, a Descartes, habitualmente considerado como iniciador do
pensamento moderno e, distinguindo-se dos outros filósofos, dá uma valorização ‘histórica’
do seu racionalismo. Descartes, se encontra diante de dois adversários, o protestantismo e o
ceticismo libertino, que tinham um ponto em comum: a depreciação da capacidade da razão
de compreender a verdade. Descartes propôs, então, a revalorização da dignidade da razão
sob forma do argumento do ‘cogito’, o qual exprime a convicção de que existe um método de
pensamento que leva à compreensão da realidade. Este método consiste em seguir a
evidência, a partir da evidência do ser do próprio “eu”. Neste modo, o racionalismo
cartesiano é avaliado na sua precisa função histórica e não é utilizado ou instrumentalizado
para contrapor uma ‘época boa’ à uma ‘época má’.
Não obstante, porém, a história da relação entre cristianismo e modernidade tenha sido
muito articulada e não tenha procedido nunca num sentido único, e apesar da positiva
interpretação historizada da modernidade da parte de Del Noce, a versão hodierna mais
frequente desta relação aceita por vários intérpretes da cultura ocidental, infelizmente, é a de
sua recíproca exclusão. Segundo alguns críticos, a história da modernidade é lida como
progressiva perda de Deus, a modernidade frequetemente identificada como uma antropologia
anticristã e antireligiosa, a autonomia do homem e da razão como um abandono da teonomia.
A modernidade teria teorizado a rebelião contra Deus ou pelo menos a tomada de distância
Dele, teria consumado a traição da natureza humana e procurado a decadência de toda forma
de humanismo. É óbvio que, se se levam em conta os tons particulares que a problemática
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moderna da autonomia assumiu nas obras de autores como Feuerbach, Marx e sobretudo
Nietzsche, se entende a razão profunda pela qual a teologia, ao menos inicialmente e por
instinto, tenha julgado um dever salvar a própria integridade com a regeição da moderna
pretenção à autonomia. Mas este autores, de fato, representam a face negativa da
modernidade, a radicalização das dimensões, por outro lado, positivas da autonomia da ação
e da racionabilidade do pensamento.
É possivel chegar a uma reconciliação do cristianismo com a modernidade sem que isto
signfique cair no vitu-perado totalitarismo da razão e no neotradicionalismo religioso? Na
história da teologia passada e recente, existiram diversas tentativas desta reconciliaçâo, nas
quais a teologia protestante e a teologia católica seguiram itinerários diferenciados, porque
eram diversos os pontos de partida, diversas eram as resistências das respectivas comunidades
e tradições, diversos os instrumentos de ação e de pensamento utilizados para atingir o
objetivo do diálogo e da reconciliação. É necessário, então, acenar, ainda que brevemente, à
sua colocação (impostação) e ao seu êxito histórico.
modernidade cientifica e quase para identificar-se com elas. Basta pensar como o teólogo
Paul Tillich considerava os duzentos anos de pesquisas histórico-critica no campo bíblico:
“nenhuma religião na história humana jamais demonstrou semelhante audácia e nunca
percorreu semelhante risco. Nem o islamismo, nem a ortodoxia hebraica, nem o catolicismo
romano nunca fizeram outro tanto”. As resistências, porém, que a teologia protestante, no
início do Século das Luzes, teve que enfrentar e vencer para aceitar a modernidade, foram
muito importantes A primeira delas, em ordem de importância, era a interpretação literal da
Sagrada Escritura, própria da ortodoxia luterana. A aplicação do método historico-crítico à
leitura e à interpretação literal da palavra de Deus, de fato, tornava esta última uma verdade
profana sujeita à relatividade histórica e colocava de um modo totalmente novo a questão
hermenêutica do sentido. As assim chamadas ”teologias da reconciliação”, por outro lado, no
recurso ao uso do metodo histórico-crítico,e tembém na pesquisa autônoma do sentido,
adotavam necessariamente uma lógica antropocêntrica e imanente, que colocava em discussão
a lógica transcendente da fé e assignava um lugar prioritário à hermenêutica.