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SUMÁRIO ISBN 978-85-463-0497-4

A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA
LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL

Isadora de Carvalho Correia

Ideia
João Pessoa
2019

SUMÁRIO ISBN 978-85-463-0497-4


Direitos e responsabilidades sobre textos e imagens são da respectiva autora.
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida,
transmitida ou arquivada desde que sejam levados em conta os direitos da autora.

Capa/Diagramação
Magno Nicolau

Revisão
Chico Viana

Ilustração da capa
Arquivo da editora

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD


_____________________________________________________________
C824e Correia, Isadora de Carvalho.
A evolução da escrita da língua de sinais no Brasil. / Isadora
de Carvalho Correia. – João Pessoa: Ideia, 2019.

80p.

ISBN 978-85-463-0497-4

1. Língua de sinais – Brasil. 2. Língua de sinais - escrita. 3.


Linguagem de gestos dos surdos. II. Título

CDU 81'221.24
_____________________________________________________________
Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária Gilvanedja Mendes, CRB 15/810

EDITORA
www.ideiaeditora.com.br

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NOTA

Reunimos neste livro o texto elaborado na disciplina


Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), o qual foi apresentado,
em 2016, como requisito para a obtenção do título de Graduado
no Curso de Letras/Libras da Universidade da Paraíba, e outras
produções que o complementam ou reforçam.
Da banca do TCC participaram o Professor Especialista
Valdo Ribeiro Resende da Nóbrega (UFPB), orientador, e as
professoras Me. Carolina Silva Resende da Nóbrega (UFPB) e
Me. Marie Gorett Dantas de A. M. Batista (UFPB)

A AUTORA

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SUMÁRIO

Introdução 7
1. Desenvolvimento 9
1.1 História da escrita de sinais 9
1.1.1. O SignWritting – SW 9
1.1.2. A Escrita das Línguas de Sinais - ELiS 17

2. Dicotomia da escrita de sinais – SW e ELiS 22

3. Análise dos dados 25

4. Resultados e discussões 29

5. Considerações finais 31

Anexos 35

SISTEMA DE SIGNWRITING 35

TEXTOS COMPLEMENTARES 41
Um importante passo no aprendizado da Libras 41
- Discurso de colação de grau - 41
Como o surdo aprende e adquire fluência na língua de sinais 46
Os primeiros passos da criança surda na escrita de sinais
segundo a visão interacionista 52

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APÊNDICE I 72
Comentários sobre textos produzidos por surdos tendo como base o
conceito de interlíngua 72

APÊNDICE II 79
Observações sobre a didática da LI 79

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Introdução

No Brasil, a implantação de um sistema de escrita de


sinais levou tempo para ocorrer devido a certo descaso da
sociedade para com os surdos, que só aos poucos foram
conseguindo o reconhecimento dos seus direitos. A Libras
representou uma grande conquista para a comunidade surda,
que por meio dela conseguia expressar suas experiências e
visão do mundo. Era preciso, no entanto, complementar essa
conquista com um instrumento que permitisse a eles também
escrever os sinais. Como observa STUMPF (1998, p. 79), “a
Língua de Sinais escrita pode contribuir tanto para
investigações como para o desenvolvimento da língua escrita
pelo indivíduo surdo”.
Pretendemos neste artigo apresentar os dois dos
principais sistemas de escrita da Língua de Sinais Brasileira -
Libras, destacando-lhes as características, o histórico e as
distinções entre um e outro. São eles o SignWriting e a EliS. O
primeiro foi importado e posteriormente adaptado às
peculiaridades da nossa cultura. O segundo foi criado aqui
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mesmo e visou, basicamente, dar aos surdos a possibilidade de


se comunicar por escrito em sua própria língua. A justificativa
para isso era que eles utilizavam uma língua de sinais
brasileira; assim, nada mais natural do que representar os
signos dessa língua em português.
A escrita permite uma codificação rigorosa dos signos e
tende a lhes dar perenidade, tornando mais fáceis o seu
reconhecimento e a sua transmissão. Além disso, fornece
recursos para abstrair ações, estados e conceitos que, de outro
modo, escapariam à percepção. Aumenta, também, a
capacidade de teorizar, permitindo que se amplie a
compreensão (e não apenas a representação) do mundo.
De acordo com SILVA (2013,p. 392), “uma forma escrita
para as línguas gestuais poderá representar um marco
importante na medida em que permite o armazenamento da
língua e posterior acesso à mesma e, evidentemente, a
possibilidade de averiguar a evolução da própria língua”. Isso
representa para os surdos a possibilidade de manter arquivadas
suas experiências, condição para o desenvolvimento e a
perenidade de sua cultura.

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1. Desenvolvimento

1.1 História da escrita de sinais


1.1.1. O SignWritting – SW

A escrita da língua de sinais denominada SignWriting


(SW) foi criada em 1974, na Dinamarca, pela estadunidense
Valerie Sutton. Ela antes havia criado um sistema de escrita
para descrever os passos e os movimentos da dança, chamado
DanceWriting, e na Dinamarca ensinava esse sistema em uma
escola. Depois publicou em jornal um artigo sobre essa escrita.
Pesquisadores da Língua de Sinais Dinamarquesa da
Universidade de Copenhagen, que estavam procurando uma
forma de escrever essa língua, interessaram-se pelo artigo e lhe
pediram para registrar os sinais gravados em vídeo. Ela
adaptou, então, o sistema de escrita de danças (DanceWriting)
para o da escrita das línguas de sinais (SignWriting) (Cf.
BARRETO, 2012, p. 38 e seguintes).
Ao voltar para os Estados Unidos, procurou manter
contato com professores e pesquisadores da Língua de Sinais
Americana para ajudar a desenvolver esse sistema na
organização que veio a dirigir, o DeafActionCommitee (DAC),

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sediada em La Jolla, Califórnia, USA. O SignWriting evoluiu


muito com o passar dos anos e se difundiu em cerca de 35 de
países, inclusive no Brasil.
Posteriormente o DAC divulgou sistemas
computacionais para a escrita do SignWriting, dos quais se
destacam o SignWriter e o SignPuddle, e com o passar do
tempo houve uma mudança do sistema escrito à mão para o da
escrita através do computador.Utilizando o computador,
Valerie Sutton criou o programa SignWriter para escrever as
línguas visuais, depois registrou o site do SignWriting
(www.signwriting.org) e o adaptou para o SignPuddle, que é
usado atualmente. Ele tem uma plataforma online que permite
construir dicionários bilíngues, buscar os sinais, escrever os
sinais e os textos, enviar e-mails em várias línguas de sinais em
SignWriting.
Esse sistema evoluiu muito e não tem, atualmente, a
mesma forma que o sistema criado em 1974. Sua utilização
estabelece as mudanças envolvendo várias pessoas nesse
processo, ou seja, o SignWriting apresenta as características de
evolução da escrita alfabética e padronizada. Segundo ASSIS &
FARIA (2013, p. 269), essa padronização permite escrever o
mesmo sinal usando os mesmos grafemas, pois cada pessoa

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escreve como entende que deve ser escrito. Assim, alguns sinais
são detalhistas e outros são simplistas, conforme a produção
escrita dos sinais é diferente de pessoa para pessoa. O fato é
que, conforme assinala STUMPF (2008, p.30), “o SignWriting
pode registrar qualquer língua de sinais do mundo sem a
passar pela tradução da língua falada. Cada língua de sinais vai
adaptá-lo a sua própria ortografia. Para escrever em
SignWriting, é preciso saber uma língua de sinais”.
O SignWriting é um sistema de escrita especifico para ler
e escrever as línguas de sinais. Ele representa as configurações
de mãos, os movimentos, as expressões faciais ou expressões
não manuais, as orientações de mãos, os tipos de contatos e os
pontos de articulação das línguas de sinais.
No Brasil,oSignWriting começou a ter uso quando o Dr.
Antônio Carlos da Rocha Costa entrou em contato com Valerie
Sutton, que lhe passou o site da referida escrita
(www.signwriting.org). Depois disso, ele descobriu o uso do
sistema escrito de sinais através do computador e formou o
grupo de pesquisadores da Pontifica Universidade Católica do
Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, em 1996, envolvendo
principalmente as professoras brasileiras Márcia Borba e

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Marianne Stumpf, que vieram participar desse trabalho (Cf.


CHAIBUE & AGUIAR, 2015, p. 18).
Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a
professora Márcia Borba trabalhava com a pesquisa relacionada
à computação, e a professora Marianne Stumpf, que é surda,
trabalhava com a pesquisa relacionada à tradução e à
transcrição do manual americano para o manual brasileiro. No
manual americano, apresentavam-se os símbolos referentes às
configurações de mãos, os movimentos e as expressões faciais
das línguas de sinais americanas.
No início esse grupo realizou o projeto SignNet,
especificado para a educação de surdos, e esse projeto foi
desenvolvido por pesquisadores da Universidade Católica de
Pelotas, como Rafael PiccinTorchelsen e Antônio Carlos da
Rocha Costa, para SW-EDIT, que é um programa
computacional para a escrita de sinais. Esse programa é um
software de editor de textos da língua de sinais, baseado no
sistema de escrita de sinais, SignWriting.
O grupo criou um manual brasileiro que esclarece como
ler e escrever os seus próprios sinais e continua trabalhando
num dicionário para facilitar a escrita dos sinais e torná-la
pública. Depois disso, surgiu a difusão do uso do Dicionário

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Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais


Brasileira, desenvolvido pelos pesquisadores Fernando César
Capovilla e Walkiria Duarte Raphael.
Stumpf apresenta uma proposta mais difundida do
sistema SignWriting no Brasil, pois infelizmente ainda não há
uma proposta oficial de escrita de língua de sinais brasileira.
Em 1997, ela começou a ensinar SW para alunos surdos do 6ª e
7ª séries em dois educandários, a Escola Especial de Concórdia,
de Porto Alegre, e a Escola Hellen Keller, de Caxias do Sul,
ambas no Rio Grande do Sul.
Eles começaram a aprender a como ler e escrever a
língua de sinais brasileira e depois se interessaram em conhecer
esse sistema, que se espalhou pelo Instituto Nacional de
Educação de Surdos, no Rio de Janeiro, por algumas escolas em
São Paulo e também por cursos da área de Libras de
universidades do Brasil, além da Universidade Federal de Santa
Catarina (Cf. ASSIS & FARIA, 2013, p. 270). Isso fez com que a
escrita de sinais fosse incorporada ao currículo da Língua
Brasileira de Sinais e veio demonstrar sua importância para o
desenvolvimento da cultura e da identidade da pessoa surda.
No Brasil, já se publicaram diversas histórias infantis e
também materiais em Escrita de Sinais, como: Uma menina

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chamada Kauana (STROBEL, 1997); Livrinho do Betinho (2002);


Cachos Dourados (STUMPF,2003); Cinderela Surda (HESSEL,
ROSA & KARNOPP, 2003); Davi (RIBEIRO, 2006ª); O menino, o
pastor e o lobo (RIBEIRO, 2006b); Noé (RIBEIRO, 2007), dentre
outros.
A estrutura do sistema de escrita para as línguas de
sinais, denominado SignWriting, é formada pelas informações
referentes às mãos, ao movimento, à expressão facial e ao corpo.
Essa estrutura do SignWriting inclui alguns parâmetros que
compõem as orientações e posições de mãos, os tipos de
contatos, as configurações de mãos, os movimentos de dedos,
os movimentos de braços e apontação (retos, curvos, flexões-
rotação, circulares), as expressões faciais, as localizações de
símbolos da cabeça, os movimentos de cabeça, as orientações de
olhar, os movimentos de corpo, os símbolos de pontuações e as
dinâmicas de movimentos.
Os elementos mais importantes representam só a
expressão facial e os movimentos para a escrita das línguas de
sinais, porque esses dois são notados e mais usados. Outros
elementos manuais também anotados por esse sistema
representam a configuração e orientação da mão e seu
movimento. Vale salientar que o sistema de notação de Stokoe e

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outros sistemas de notação não incorporam esses parâmetros


porque houve modificações da escrita da língua de sinais ao
longo tempo.
Segundo STUMPF (2008, p.24), “o sistema criado por
Stokoe não tinha o objetivo de servir para o uso comum dos
surdos, mas sim de atender a uma necessidade particular dele,
que era estudar as línguas de sinais; nesse aspecto, seus estudos
são referência para alguns pesquisadores das línguas de sinais”.
Isso significa que a professora Marianne Stumpf realizou a sua
pesquisa para utilizar as propostas de escritas de sinais atuais e
futuras. Ela pesquisou o sistema de notação criado por William
Stokoe e seu grupo de linguistas da Universidade de Gallaudet
para adaptá-lo ao sistema de escrita da língua de sinais. Assim,
o sistema do SignWriting pode se adaptar a qualquer língua de
sinais; ele conta com mais de 1900 símbolos e apresenta a forma
de escrever na vertical e no editor próprio para transportar ao
editor padrão (Cf. CHAIBUE & AGUIAR, 2015, p. 19).
Segundo pesquisas, as características das línguas de
sinais são preservadas e descritas fielmente nesse sistema, que
registra parâmetros fonológicos, como a configuração de mão, a
locação, o movimento, a orientação da mão e as expressões não

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manuais e corporais; e os sintáticos, como o uso do espaço de


sinalização e os referentes dêiticos e anafóricos.
O SignWriting passou por duas importantes
modificações entre os anos de 1986 e 1996: a passagem do ponto
de vista receptivo para o ponto de vista expressivo e a
localização gráfica dos elementos que compõem o sinal gestual.
Antes da primeira mudança, lia-se um texto em SigWriting
como se olhava uma pessoa, à frente, sinalizar. Depois dela,
passou-se a dar ênfase ao que o escritor produz conforme ele
vê, e não como um registro feito de um ponto de vista
receptivo, o que dava à escrita um caráter mais de transcrição.
A mudança na localização dos sinais gráficos, que foi
impulsionada de forma manuscrita por um grande número de
usuários, resultou no que se chama de organização
“empilhada” dos sinais. Isso mudou o sentido da leitura do
texto, que passou a ser apresentado em colunas lidas da
esquerda para a direita. Além do mais, alguns dos símbolos
usados nesta escrita são bem icônicos, o que possibilita uma
rápida associação com o que representam. No entanto,
conforme observa BARRETO (212, p. 42), o SignWriting não é
ideográfico, pois não representa semantemas e sim a viso-
espacialidade das línguas de sinais.

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1.1.2. A Escrita das Línguas de Sinais - ELiS

De 1997 a 1998, a linguista brasileira Mariângela Estelita


Barros criou o sistema de escrita das Línguas de Sinais
denominado ELiS, que é uma sigla para Escrita das Línguas de
Sinais, em sua pesquisa de conclusão de mestrado na
Universidade Federal de Goiás (UFG), em Goiânia. Depois de
concluir o doutorado, ela divulgou, em 2008, a tese Escrita das
Línguas de Sinais (ELiS) na Universidade Federal de Santa
Catarina, em Florianópolis. O resultado do seu trabalho se
espalhou pelos cursos de graduação em Letras-Libras da
Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal de
Mato Grosso (UFMT) e Universidade Federal de Grandes
Dourados (UFGD). (Cf. BARROS, 2015, p.15 e seguintes)
Também conquistou espaço nos Centros de Capacitação de
Profissionais de Educação e de Atendimento às pessoas com
Surdez (CAS), nas Associações de Surdos, nos cursos de Libras
e nos congressos de Linguística e de educação em língua de
sinais. O objetivo desse sistema é viabilizar uma forma de
expressar e escrever a língua de sinais de forma organizada e
simples.

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Esse sistema de escrita passou por modificações. Nasceu


com o nome de AlfaSig (“Alfa” de alfabético e “Sig” de
signum), mas não se desejava que esse “alfa”, de alfabético,
representasse os sons, por isto substituiu-se o radical “alfa” por
“quiro”, que se refere à mão; passou-se então a chamar o
sistema de QuiroSig, que representa os quiremas dos sinais,
segundo terminologia de Stokoe. Depois disso, percebeu-se que
estava faltando algo no nome que pudesse fazer referência à
escrita e não somente aos sinais, e substituiu-se novamente o
radical “quiro” por “scrip”, passando a chamar o sistema de
ScripSig. Finalmente, como esses três nomes com Sig
parecessem difíceis, decidiu-se renomear o sistema,
apresentando-o simples e definitivamente como ELiS.
Em 1990, Mariângela Estelita Barros começou a manter
contato com a LIBRAS, como estudante, num primeiro curso de
LIBRAS para ouvintes no Sistema Educacional Chaplin, em
Goiânia; daí surgiu a sua ideia de escrever em LIBRAS. Em
1995, ela entrou para o programa de mestrado em Linguística
da Universidade Federal de Goiás com o objetivo de pesquisar
as descrições dos sinais e criou um símbolo–palavra para cada
sinal. Ela fez pesquisas e começou a substituir as palavras em

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português por símbolos, deparando-se com a possibilidade de


identificar os elementos e atribuir-lhes uma simbolização.
Em 1997, a autora decidiu visitar a GallaudetUniversity,
nos Estados Unidos, onde conheceu um sistema americano de
escrita das línguas de sinais, o SignWriting, de Valerie Sutton, e
um sistema de notação da Língua de Sinais Americana, de
William Stokoe. Identificou-se com o trabalho de Stokoe,
porque tinha base alfabética e era linear na estrutura. Passou
então a usar os mesmos símbolos de Stokoe e depois
acrescentou outros aspectos dos sinais.
Em 2005, ela entrou para programa de doutorado em
Linguística da UFSC, em Florianópolis, a fim de desenvolver a
ELiS como sistema de escrita eficiente e experimentá-la na
prática, sob a orientação das professoras Leonor Scliar-Cabral e
Ronice Muller de Quadros. Em janeiro de 2007, fez reformas e
modificações estruturais no sistema de escrita, proposto para
alunos surdos do curso de Letras-Libras da Universidade
Federal de Santa Catarina. Essas reformas e modificações foram
criadas por várias regras grafotáticas, ou seja, resultaram da
combinação dos elementos do sistema de escrita para
representar uma língua de sinais. A EliS também tem regras

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grafotáticas que apresentam as possibilidades de combinação


dos visografemas.
Em 2009, surgiu o primeiro curso de Letras-Libras
presencial do Brasil, na Universidade Federal de Goiás, e nele a
ELiS entrou como disciplina curricular obrigatória. Até hoje não
houve mudança estrutural significativa; a maior parte das
mudanças foi ao quanto o design dos visografemas para
adquirir uniformidade e identidade própria. Essa mudança
ocorreu com o desenvolvimento de uma fonte digital
especificamente para a escrita da ELiS, por Dimas William
D´Oliveira, entre 2009 e 2011.
A ELiS tem fonte própria para escrita digital, que pode
ser salva na pasta de fontes do computador. Depois disso,
passou por modificações, mas elas não mudaram sua estrutura
e só tornaram suas regras mais sistematizadas e coerentes. Até
hoje, a ELiS contribui para encontrar as instruções de uso da
fonte digital. Há estruturas de dicionários desenvolvidas por
ELiS em ordem alfabética.
Segundo BARROS (2015, p. 18), a ELiS já foi testada com
usuários de Libras surdos e ouvintes. É uma escrita de língua
de sinais que traz empoderamento para a comunidade surda;
faz com que o falante tenha uma reflexão metalinguística, ou

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seja, reflita sobre sua língua, e funciona como apoio


educacional.
A ELiS determina um novo sistema de escrita para,
principalmente, a língua de sinais brasileira e atualmente conta
com 94 símbolos. Ela é universal, pois pode ser utilizada em
diferentes línguas de sinais. No Brasil, ela usa alfabeto próprio,
ou seja, possui suas próprias letras, que representam o aspecto
visual-espacial das línguas de sinais e se denominam
visografemas. Os visografemas apresentam os elementos ou
símbolos visuais, que são compostos da configuração de mãos,
da orientação de palma, do ponto de articulação ou da locação,
do movimento e das expressões não manuais ou das expressões
faciais, ou seja, esses elementos visuais usam cinco parâmetros
e depois são organizados em sequência para formar os sinais
com os quais é possível ler e escrever.
A EliS só destaca a escrita dos quatro grupos de
parâmetros porque o movimento inclui expressões não
manuais. Nela a configuração de mãos, que é um dos
parâmetros das Línguas de Sinais, se substitui pela
configuração de dedos, que é um dos parâmetros da ELiS
atualmente; Mariângela achou melhor representar a mão de
forma dividida, dedo a dedo, por isso essas configurações são

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diferentes. Essas configurações de dedos são indicadas pela


posição de cada dedo e combinadas entre si para formar as
configurações de mãos.
Assim, a estrutura da ELiS é de base alfabética, linear e
organizada a partir dos grupos visológicos formadores dos
sinais, denominados grupos de parâmetros. Esses grupos são
compostos por vários visemas, que são as formas gráficas que
representam os elementos visuais denominados visografemas.
Cerca de 95visografemas são escritos de uma forma linear e
sequencial na horizontal, da esquerda para a direita, na ordem
de Configurações de Dedos, Orientações de palma, Pontos de
Articulações e Movimentos. Na estrutura da ELiS, essa ordem
possibilita ler e escrever os sinais de forma mais natural e
simples porque essa estrutura tem as suas características de
sequencialidade e simultaneidade.

2. Dicotomia da escrita de sinais – SW e ELiS

Há diferenças estruturais entre a SignWriting e a ELiS,


respectivamente. A primeira apresenta os seus cinco

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parâmetros de forma detalhada, inalterada, ampla e complexa,


porque essa estrutura se compõe mais das configurações de
mãos, dos vários movimentos, das localizações, das orientações
e das posições de mãos e da expressão não manual, dos tipos de
contatos e outros vários. A segunda apresenta seus cinco
parâmetros de forma sintética, alterada, básica e simples, pois
essa estrutura só abrange as configurações de dedos, as
orientações da palma, os pontos de articulação, os movimentos
e as expressões não manuais. Marianne Stumpf analisou a
proposta dos trabalhos de William Stokoe (1965) e de Valerie
Sutton (1981) e optou por traduzir e adaptar o manual
americano, que apresentava os parâmetros propostos por eles,
para a língua de sinais brasileira. (STUMPF, 2013, pág. 62).
Mariângela Estelita Barros procurou desenvolver o
sistema da escrita de Stokoe (1965), que utiliza três tipos de
parâmetros, e não tentou reinventar o que já existia.
Acrescentou mais símbolos, e outros aspectos dos sinais, com a
ajuda de alunos surdos de Letras Libras de Goiás. Embora usem
um sistema de escrita linear, da esquerda para a direita, com
visual mais reduzido da língua de sinais, os parâmetros são os
mesmos.

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Em Stokoe, tem-se a Configuração de Mãos, o Ponto de


Articulação e o Movimento. Na ELiS aparecem a Configuração
de Dedos, a Orientação da Palma, o Ponto de Articulação e o
Movimento.
Enfim, a SW não foi o primeiro sistema de escrita para
língua de sinais, mas foi o primeiro a representar de modo
adequado as expressões faciais e as nuanças de postura. Ela
passou por modificações ao longo do tempo, mas tais
modificações não alteraram a sua estrutura, e suas regras têm
hoje uma forma moderna, detalhada e ampla.
O sistema de ELiS também passou por reformas,
algumas delas propostas por alunos surdos. Eles
experimentaram, por exemplo, usar o sistema na escrita de
textos, e não apenas em palavras isoladas. Tais modificações
ocorreram nos níveis fonológico e morfológico, o que redundou
na criação de novos quirografemas e na combinação de alguns
deles.
Há uma nova escrita da língua de sinais no Brasil. Ela
está em seu início e não tem sido muito praticada, sendo menos
popular do que as duas anteriores. Pode-se conhecê-la no site
http://sel-libras.blogspot.com.br.

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3. Análise dos dados

As configurações de mãos da Libras se alteraram com o


passar do tempo e se acrescentaram novas formas de mãos.
Vejam as imagens embaixo, apresentadas, respectivamente, por
Lucinda Ferreira Brito (esquerda) e Tanya Felipe (direita):

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Fonte: As configurações de mãos (46) em Lucinda Ferreira


Brito. http://image.slidesharecdn.com/parametrosdalibras-
141029085348-conversion-gate01/95/parametros-da-libras-4-
638.jpg?cb=1414572892
Fonte: As configurações de mãos (64) em Tanya Felipe.
http://docplayer.com.br/docs-
images/24/3406801/images/25-0.pn

Existem várias configurações de mãos em SW, mas


decidimos escolher algumas que fossem muito parecidas com
as configurações de dedos emELiSpara fazer a comparação. É
necessário identificar as configurações de mãos com as de
dedos para proceder a uma comparação rigorosa. Verificamos
que elas são semelhantes, mas têm formas de escrita diferentes,
já que estas se originaram dos distintos sistemas criados,
respectivamente, por Valerie Sutton (SW) e Mariângela Estelita
Barros (ELiS). Seguem, abaixo, exemplos da escrita da
configuração de mãos conforme a SW (centro) e a ELiS (direita):

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As configurações de dedos em ELiS não mudaram nada


com o passar do tempo. São modernas, constituem
configurações diferentes das do sistema de Stokoe(que têm
desde 1960as mesmas escritas de sinais) e também acrescentam
as formas de dedos às suas escritas de sinais. No quadro abaixo
representam-se, à esquerda, imagens do sistema de Stokoe, e à
direita, do sistema ELiS:

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4. Resultados e discussões

A discussão sobre os dois sistemas de escrita deve levar


em conta as peculiaridades de ambos e o que os distingue. É
inevitável ressaltar o paralelo que até aqui tem sido feito. Para a
SignWriting, Marianne Stumpf fez pesquisas a partir da
proposta do sistema dirigida por Valerie Sutton, dos EUA. Ela
observou o sistema de Notação de Stokoe, proposto por
William Stokoe, mas não aceitou segui-lo; fez traduções e
adaptações do sistema da escrita da língua de sinais americana
para o sistema da escrita da língua de sinais brasileira, aplicado
no Brasil.
Esse sistema é um tanto complexo. Sua absorção e
transcrição dos seus signos é mais demorada quando se
compara com a ELiS, que é mais ágil e prática. Na ELiS, com
efeito, Mariângela Estelita Barros aceitou as configurações de
mãos do sistema de notação de Stokoe mas fez modificações
que o tornaram mais simples e sintético. Enfim, é um sistema
bem diferente do sistema criado por William Stokoe.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 30

Marianne Stumpf, conforme foi dito, trabalhou para


traduzir o sistema da escrita da língua de sinais americana para
o da língua de sinais brasileira. Mariângela Estelita Barros
tratou de seguir as mesmas configurações de mãos propostas
por William Stokoe, mas utilizou a escrita da língua de sinais
brasileira de forma diferente do que fez Stokoe.
Não se entende por que o SignWriting difundiu-se em
todo o Brasil, mas a ELiS só se espalhou em alguns estados,
como Goiás.Pareceque a maioria de surdos está interessada só
no SignWriting, acha-o o único capaz de ser assimilado. No
entanto, a EliSchega a ser mais fácil do que SignWriting, pois é
organizada de uma forma sintética, básica e simples, e a
segunda o é de uma forma complexa, detalhada e ampla.
Percebe-se que é mais difícil escrever em língua de sinais
brasileira com a escrita adaptada por Stumpf do que com a
escrita criada por Barros. Por outro lado, é mais fácil utilizar o
sistema computacional SignPuddle, próprio da SignWriting,
para escrever os sinais e os textos, já que a EliS não foi adaptada
para a linguagem do computador. Essa diferença entre os dois
sistemas, que tem repercussões práticas, não pode deixar de ser
considerada.

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5. Considerações finais

A comparação entre os dois sistemas revela diferenças e


também a complementaridade que existe entre ambos. Uma
complementaridade da qual não está ausente o processo
evolutivo pelo qual vêm passando. O SignWriting, que é
anterior à ELiS, constitui um sistema de escrita misto; associa os
elementos fonográficos aos pictográficos.
Com o SignWriting, o leitor é capaz de relacionar
informações novas com antigas e demonstrar habilidade para
acrescentar, interpretar e sintetizar. Seus inúmeros movimentos
de mão, contudo, possuem uma complexidade que nem sempre
o torna acessível e de fácil assimilação e/ou representação. As
várias formas de grafia para um mesmo sinal abrem
possibilidades que nem sempre são de fácil escolha. O uso
consagrará a que deve prevalecer, mas nem assim se deixam de
lado as outras possibilidades.
O confronto entre os dois tipos de escrita permite-nos
concluir que determinadas características da ELiS ampliam as
possibilidades comunicativas dos surdos. As Configurações de

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 32

Dedos, por exemplo, permitem-lhes expressar situações novas,


determinadas por circunstanciais imprevistas, assim como
referências estéticas.
Por ser em número limitado, essas configurações são
vantajosas numa escrita alfabética, que, como se sabe, conta
com um número limitado de signos e letras. Em razão disso,
tais configurações são práticas e poupam ao usuário a
necessidade de decorar as dezenas de sinais que constam nas
Configurações de Mãos. Não é ainda o sistema ideal, como
reconhece a sua criadora, e apresenta o inconveniente de não ter
seus registros computadorizados, mas tende a um
aperfeiçoamento que vem contando com a decisiva contribuição
dos usuários.
É fundamental que os surdos pratiquem a escrita de
sinais devido ao papel que ela exerce em seu desenvolvimento
cognitivo, nos processos de memorização e na ampliação da sua
capacidade representativa e expressiva. Um meio de fazer isso é
enfatizar a prática dessa escrita como hoje se estimula o uso da
Libras e a presença de professores bilíngues em sala de aula.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 33

Referências

ASSIS, Maria Cristina de& FARIA, Evangelina Maria Brito de


(organizadoras). Língua Portuguesa e LIBRAS: teorias e práticas4 – 2ª edição. –
João Pessoa: Editora da UFPB, 2013.

BARRETO, Madson& BARRETO, Raquel. Escrita de Sinais sem mistérios. Belo


Horizonte: Ed. do autor, 2012.

BARROS, Mariângela Estelita. ELiS: sistema brasileiro de escrita das línguas de


sinais. Porto Alegre: Penso, 2015.

LEI DE LIBRAS - Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Regulamentada pelo


Decreto 5.626/05. Disponíveis, respectivamente, em
http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/99492/lei-de-libras-lei-
10436-02ehttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2005/decreto/d5626.htm. Acessados em 12/08/2016.

LODI, Ana Claudia B. & HARRISON, Kathryn Marie P. & CAMPOS, Sandra
Regina L. de & TESKE, Ottmar (organizadores). Letramento e minorias. 6.ed.
Porto Alegre: Mediação, 2013.

SILVA, Fábio Irineu da.Analisando o processo de leitura de uma possível escrita


da língua brasileira de sinais: Signwriting. Dissertação defendida no Programa
de Pós-Graduação em Educação da UFSC. 2009. Site disponível em:
http://www.cultura-
sorda.org/wpcontent/uploads/2015/03/Silva_Analisando_processo_leitur

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 34

a_possC3ADvel_escrita_LBS_Signwriting_2009.pdfAcessado em
14/09/2016.

SILVA, Rafaela Cota da.SignWriting, um sistema de escrita das línguas


gestuais. Aplicação à língua gestual portuguesa. Exedra- Revista científica.
Número mero temático – dezembro de 2012. Site disponível em:
http://www.exedrajournal.com/exedrajournal/wp-
content/uploads/2013/01/31-numero-tematico-2012.pdf .

STUMPF, Marianne Rossi. SignWriting e Computação no Currículo da


Escola Especial Concórdia – ULBRA. In: Seminário Surdez, cidadania e
educação: refletindo os processos de exclusão e inclusão. Rio de Janeiro: INES,
1998.

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Anexos

SISTEMA DE SIGNWRITING:

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 36

Fonte: Configurações de mãos em SignWriting.


https://en.wikipedia.org/wiki/SignWriting#/media/File:Han
dshape_equiv2.png

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SISTEMA DE NOTAÇÃO DE STOKOE:

Fonte: Configurações de Mãos no Sistema de Notação de


Stokoe. (STUMPF,2008, p.25)

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SISTEMA DA ELiS:

Fonte: Configurações de dedos em ELiS. (BARROS, 2015, pág.


23)

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 39

Fonte: Configurações de dedos em ELiS. (BARROS, 2015, pág. 24)

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Fonte: Configurações de dedos em ELiS. (BARROS, 2015, pág.


25)

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TEXTOS COMPLEMENTARES

Um importante passo no aprendizado da Libras

- Discurso de colação de grau -

Hoje é um dia muito importante para nós. Após uma


caminhada de quatro anos, finalmente recebemos nosso
diploma de graduação em Letras/Libras. Foi um período de
estudo e muita prática, que nos fez, ao mesmo tempo, explorar
a Libras e compreender a realidade dos que a utilizam para se
comunicar e expressar a sua visão do mundo.
Quero primeiramente elogiar os que criaram este curso.
Sabemos das dificuldades que enfrentaram, e ainda enfrentam,
ao procurarem atender um grupo de pessoas que ainda sofre
preconceito e luta para conquistar o seu lugar na sociedade.
Embora muitos defendam a educação inclusiva, poucos
realmente trabalham para que as minorias tenham acesso à
educação e à cultura. Os fundadores deste curso estão entre
esses poucos. Eles foram além das palavras, do discurso, e

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providenciaram os meios de tornar a Libras objeto de estudo e


divulgação.
Isso não seria possível, contudo, sem a colaboração dos
professores, que desde o início aderiram à ideia de criar o curso
por verem nele a concretização de um ideal. A partir daí,
produziram conteúdos inovadores com base em uma
bibliografia rara e dificilmente encontrada no país. Ao mesmo
tempo exploraram novas metodologias, que associavam os
recursos tradicionais aos modernos, sempre focados nas
características do público alvo, ou seja, em nós.
Um dos objetivos deste curso, conforme se lê em seu
portal na internet, é “formar leitores críticos e produtores de
diferentes gêneros e registros linguísticos”, assim como
desenvolver habilidades linguísticas, culturais e estéticas.
Tivemos a oportunidade de vivenciar essa proposta, pois o
curso nos permitiu ampliar nosso horizonte cultural através do
contato com escritores importantes da nossa literatura. Ler
esses autores nos fez compreender melhor os problemas do país
e conhecer a alma do seu povo. Tivemos também acesso ao
universo da cultura popular, com suas histórias ricas em
fantasia. A possibilidade de ler e produzir esse tipo de texto nos
serviu de estímulo para a imaginação, ao mesmo tempo que nos

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 43

permitiu criar personagens que simbolizavam sentimentos e


desejos humanos.
Quero destacar, neste momento, a orientação que
recebemos para o desempenho na sala de aula. Fizemos vários
estágios, que nos levaram a perder o medo de enfrentar o
público e, graças ao trabalho dos supervisores, corrigir os erros
e aperfeiçoar a prática docente. Esse aperfeiçoamento foi
importante para que se pusesse em prática o objetivo geral do
nosso curso, que é o de “formar professores para atuar no
ensino da língua brasileira de sinais como primeira e segunda
língua”.
Esse objetivo tem relação direta com a proposta do
bilinguismo, que inspira o trabalho aqui desenvolvido. O
bilinguismo demonstra uma real consideração pela natureza da
pessoa surda, que tem na língua de sinais seu instrumento de
comunicação mais importante. Sem ele não se pode falar em
educação inclusiva, pois incluir significa promover a igualdade
respeitando as características de cada um. A Libras é a nossa
primeira língua, a língua natural, e o seu aprendizado deve se
completar com o conhecimento da língua portuguesa. A
reunião das duas nos permite interagir com a comunidade e ter
acesso à cultura da qual fazemos parte.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 44

Um passo importante nesse sentido foi dado com a


criação de sistemas de escrita de sinais como o SignWriting e a
Ellis. Conforme destacamos em nosso trabalho final, esse tipo
de escrita “permite uma codificação rigorosa dos signos e tende
a lhes dar perenidade, tornando mais fáceis o seu
reconhecimento e a sua transmissão. Além disso, fornece
recursos para abstrair ações, estados e conceitos que, de outro
modo, escapariam à percepção. Aumenta, também, a
capacidade de teorizar, permitindo que se amplie a
compreensão (e não apenas a representação) do mundo”.
Antes de terminar, quero fazer uma referência especial
aos meus colegas. A convivência com eles, mesmo a distância,
criou laços que vão persistir ao longo da vida. A busca da
formação profissional impõe sacrifícios, como o de deixar de
lado a família, por isso aprendemos a nos ajudar. Sem essa
ajuda mútua, não poderíamos nos dedicar aos estudos e às
demais tarefas exigidas pelo curso.
Neste momento de despedida, mas também de
recomeço, sentimo-nos cheios de gratidão e esperança. Gratidão
a todos que contribuíram para a nossa vitória. Esperança de que
possamos continuar nosso trabalho em escolas e universidades,
transmitindo as lições aqui recebidas a surdos e ouvintes.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 45

Devemos procurar aperfeiçoar as pesquisas na área de


educação para os surdos e fazer com que eles ocupem cada vez
mais espaço no universo profissional, pois disso são capazes.
Devemos também lutar para que a inclusão seja um ideal não
apenas nosso, mas de toda a sociedade, que avança na medida
em que dá voz a todos os que dela participam.
Muito obrigada!

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 46

Como o surdo aprende e adquire


fluência na língua de sinais

A partir da pergunta acima, Gladis Perlin, autora e


pesquisadora da área de educação de surdos, destaca os três
aspectos mais importantes que representam o processo de
ensino e aprendizagem da língua de sinais como primeira
língua –L1 para pessoas surdas: a diferenciação antropológica,
isto é, a diferenciação entre o sujeito surdo e o sujeito ouvinte
por meio das suas experiências distintas vividas; os recursos
didáticos; e as metodologias especificas para ensino e
aprendizagem da língua de sinais como primeira língua –L1
para surdos.
No processo de ensino e de aprendizagem da língua de
sinais como primeira língua – L1 para pessoas surdas,
abordam-se os pressupostos liguistico-teóricos e os
pressupostos culturais. Segundo os pressupostos linguístico-
teóricos, a primeira língua – L1 desempenha o papel de
ferramenta, contribuído para a construção de signos e
significados, ou seja, ela constitui uma língua natural e uma

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 47

língua materna utilizadas pela comunidade surda por meio da


modalidade visual-espacial.
A segunda língua se define como uma língua ensinada e
aprendida pelos surdos por meio da modalidade escrita. Já a
aquisição da primeira língua se dá na relação e interação entre
surdos, prioritariamente. Por exemplo: as crianças surdas
mantêm contato com adultos surdos que são fluentes na língua
de sinais, então a adquirem e se expressam por ela. Também
existe uma língua visual que representa uma língua primeira do
surdo por meio de imagens que favorecem o sentido para
facilitar a compreensão do surdo em todo o processo de
aprendizagem.
A língua de sinais também pode ser apresentada como
língua gestual-visual e língua viso-espacial. Esta língua se
distingue das outras línguas, como a língua portuguesa, que é
da modalidade oral-auditiva. Diante disso, os surdos utilizam a
interpretação visual, que se baseia no uso da experiência visual
ou do sentido natural, para descrever o objeto, o animal e o ser
humano. Esta experiência visual é uma das características
marcantes da língua de sinais. No ambiente linguístico, o surdo
pode constituir a representação do mundo por meio dos signos
visuais, isto é, do uso de uma ferramenta através da visão, o

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 48

que lhe possibilita a construção dos significados sobre os


objetos, os animais e os seres humanos, e depois se apropria da
língua de sinais.
De acordo com os pressupostos culturais, o domínio de
narrativas pertence ao sujeito surdo. Elas surgem como a
representação de uma diferença e de uma cultura. Nestas
questões, existe uma divisão distinta entre a cultura visual e a
cultura surda porque as duas são formadas pelos signos e
significados visuais mas os sentidos de ambas são distintos.
Segundo Hernández (p. 22), a cultura surda se define como o
jeito surdo de entender o mundo, de mudá-lo e adaptá-lo para
se tornar habitável e acessível, e a cultura visual é composta
pelos termos das práticas culturais relacionadas ao olhar e às
maneiras de olhar a vida conforme são utilizados pelos
ouvintes. Ela também se refere aos estudos da história da arte,
dos meios e das cinematografias, da educação visual e plástica e
da leitura das artes, entre outros. A cultura surda também se
distingue da do ouvinte por conta das modalidades diferentes.
Diante disso, a valorização da cultura surda representa a sua
identidade politica, seus poderes e suas forças próprias.
Na diferenciação antropológica entre surdo e ouvinte,
aborda-se a importância dos sistemas totêmicos que envolvem

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 49

os elementos agenciadores, operadores e organizadores


referentes ao elo natural e à representação da cultura. Eles
também se definem como símbolos de referência, que são a
visão (como a experiência visual e a acuidade visual) e as mãos,
utilizadas pelo surdo para entender o mundo e transformá-lo,
atribuindo-lhe sentido. Isso inclui as regras de convívio social, a
produção da cultura surda, a aquisição da língua de sinais e a
representação da identidade surda.
Os sistemas totêmicos, entre ouvintes, apresentam como
símbolos de referência a audição e a fala. Diante disso, os
interlocutores surdos só entendem os signos e significados
utilizados em língua de sinais próprios e produzem a cultura
surda, que resulta na identidade e na diferença. Eles
representam os conceitos subordinados à acuidade visual e
também à acuidade mental, ou seja, eles têm capacidade de
perceber a separar os signos e significados identificáveis da
língua de sinais e também ampliam os conhecimentos por meio
do uso da visão, respectivamente. Quando os surdos adquirem
estes signos e significados visuais, constroem sua subjetividade,
que se refere aos sentimentos, às ideias, aos hábitos, aos valores,
às crenças, à língua e à cultura; ela se apresenta como política
de representação.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 50

Nos recursos didáticos e nas metodologias especificas para


ensino e aprendizagem da língua de sinais como primeira
língua – L1 para surdos, surge uma pedagogia da diferença na
educação para o surdo. Uma pedagogia para surdo se apresenta
como jeito surdo de ensinar e também jeito surdo de aprender
por meio das narrativas em língua de sinais, e exige ações e
práticas pedagógicas que utilizam como base em língua de
sinais.
Os docentes fluentes em língua de sinais elaboram o
currículo para ensino e aprendizagem da língua de sinais para
surdos que representam um papel crucial como modelo do
membro da cultura e da comunidade surda e da identidade
surda. Este currículo envolve a escolha dos temas relacionados
aos conteúdos conforme os recursos adequados às
especificidades visuais.
Os docentes também utilizam as estratégias
metodológicas e os recursos didáticos com base na apropriação
da sua língua e da especificidade dos surdos, que propõem as
atividades, como, por exemplo, baralho de configuração de
mãos, escrita em língua de sinais, apresentação de teatro,
contação de piadas e de histórias em sinais, criação de diálogos
em dupla ou grupo por meio dos sinais visuais, uso de histórias

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 51

filmadas através das imagens e figuras e exibição de filmes para


adultos surdos com o auxílio das legendas para facilitar a
aprendizagem dos surdos. Também é importante conhecer o
nível de proficiência na aquisição linguística dos surdos para
avaliar-lhes o desempenho.

Referências

HERNÁNDEZ, Fernando. Catadores da Cultura Visual -


proposta para uma nova narrativa educacional. Porto Alegre:
Mediação, 2007.
PERLIN, Gladis. Gladis Perlin Histórias de vida surda:
Identidades em questão. Disponível em
http://www.porsinal.pt/index.php?ps=artigos&idt=artc&cat=
20&idart=153

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 52

Os primeiros passos da criança surda na escrita de


sinais segundo a visão interacionista

Na visão interacionista, é muito importante utilizar a


escrita de sinais para crianças surdas porque nessa escrita
existem sentidos e significados que mostram as expressões
faciais e corporais. Além disso, elas precisam aprender as
necessidades específicas e intrínsecas do mundo à sua volta.
A escrita de sinais pode ser relacionada ao mundo
porque, quando o ensino da escrita é feito de uma forma
contextual, social e interacional, isso é muito importante para a
vida da criança surda. Esse sentido de escrita está inserido ao
processo da aprendizagem e da linguagem, permitindo o
compartilhando e a interação com o mundo e a sociedade. O
surdo aprende a língua de sinais primeiro, pois ela é utilizada
pela comunidade surda e permite que ele se relacione com o
mundo e a sociedade. A criança aprende de uma forma rápida a
língua de sinais, pois sua modalidade, visual-espacial, é natural
para ela. Também ela escreve por meio da aprendizagem da
língua escrita, o que vai lhe permitir a interação com a
sociedade e o desenvolvimento cognitivo.

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 53

De acordo com Smolka (2013), as crianças surdas não


conseguiam escrever por não conseguirem expressar ideias nem
documentar um fato; sempre copiavam palavras de outras
pessoas, mas sem entender o contexto e o sentido. Ou seja, a
criança escrevia apenas para registrar as palavras, sem entender
o significado. As as palavras vão obtendo sentido de acordo
com a compreensão; e as interpretações vão ganhando
significado nas interações ambientais visíveis na sociedade.
Para compreender essas interações, é importante começar com a
escrita de sinais.
Em pesquisa sobre a aquisição da escrita, Smolka (ibidem)
constatou que constatou que “(...) as crianças não escreviam
para registrar uma idéia, nem para documentar um fato, nem
por necessidade ou prazer de comunicar ou interagir com
alguém. As crianças copiavam palavras soltas, provavelmente
com algum significado para elas, mas sem articulação e sem
sentido”. Segundo a autora, a leitura e a escrita produzida na
escola têm pouca relação com suas experiências de vida e de
linguagem.
Emília Ferreiro (Cf. Mello, 2015), em seus estudos
epistemológicos baseados no Construtivismo de Piaget sobre a
alfabetização, busca observar os diferentes níveis desse

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 54

processo, em que as crianças, interagindo com a escrita, passam


a construir hipóteses e relações de significação que parecem ser
comuns a todas as crianças. A autora afirma que, “quando
escreve tal como acredita que poderia ou deveria escrever certo
conjunto de palavras, (a criança) está oferecendo um
valiosíssimo documento que necessita ser interpretado para
poder ser avaliado”. No entanto, observa a autora, as escritas
infantis têm sido consideradas, displicentemente, como
garatujas, "puro jogo". Aprender a lê-las - isto é, interpretá-las -
é um longo aprendizado que requer atitude teórica definida
(...). (p. 17)
Na alfabetização de surdos, toda a energia está canalizada
na observação dos níveis propostos por Ferreiro e Teberosky
(1987), os quais se baseiam em sistemas de escrita alfabética.
São os níveis pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e
alfabético (com suas subdivisões). Vários professores
alfabetizadores de crianças surdas procuraram visualizar esse
mesmo processo, mas quando procuram respostas para o
desenvolvimento da alfabetização baseados encontram um
buraco-negro.
Segundo Ferreiro (ibidem), “(...) a escrita alfabética da
língua portuguesa no Brasil não serve para representar

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significação com conceitos elaborados na Libras, uma língua


visual e espacial. Um grafema, uma sílaba, uma palavra escrita
no português não apresenta nenhuma analogia com um
fonema, uma sílaba e uma palavra na LIBRAS, mas sim com o
português falado. A língua portuguesa não é um a língua
natural da criança surda. (p. 5).”
Outra dificuldade está em que, segundo Teberosky (in
Ferreiro, Terebovski e Palácio, 1987), a escola considera a
construção da escrita como uma atividade individual, que
enfatiza o "para si" do sujeito. Esquece ela é o resultado “do
esforço coletivo da humanidade, cuja função é social. O modo
como a criança aprende a escrever segue o caminho da
apropriação individual de um fenômeno social (...). (p. 125)”.
Segundo Goldman (in Ferreiro, Terebovski e Palácio,
1987), há provas "de que crianças criadas em culturas que
possuem outras formas de sistema de escrita produzem
garatujas diferentes; suas quase-letras se parecem muito mais
ao sistema de escrita próprio de sua cultura, e escrevem na
direção convencional dessa cultura" (p. 92).
Podemos aplicar tais considerações à de crianças surdas, já
que é preciso levar em consideração que os processos de
alfabetização dessas crianças devem ocorrer mediante uma

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escrita condizente com a construção do seu pensamento e de


sua linguagem natural e que seja representada com grafemas,
sílabas e palavras que representem a Língua Brasileira de
Sinais.
Os signos (gestos, linguagem falada e escrita, desenho,
matemática, etc.) constituem um instrumento cultural
fundamental. É por meio deles que as novas formas de
comportamento, relacionamento e pensamentos humanos vão
sendo desenvolvidas e elaboradas. Considera ainda o
estudioso que, na escrita, os instrumentos são dirigidos ao
mundo externo, ou seja, eles conduzem o homem para o objeto
de sua atividade. Assim, a natureza é transformada como signo
(neste estudo, a linguagem escrita), que, além de construir a
relação entre os seres humanos, ainda influi psicologicamente
na conduta do próprio sujeito, capaz de alterá-la e configurá-la
como meio de atividade interna dirigida.
Transpondo essas ideias para a alfabetização de crianças
surdas, Silva (2012) observa que “a língua que o surdo tem
como legítima e usa não é a mesma que serve como base ao
sistema escrito, por ser um sistema visuomanual, portanto
muito diferente do oral auditivo” (p. 48).

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Smolka (2013) salienta que a alfabetização, no caso de


crianças ouvintes, não implica somente na aprendizagem da
escrita de letras, palavras e orações, nem envolve somente a
relação que há da criança com a escrita, mas sim, “a gênese, a
constituição do sujeito”. A autora sugere, baseada nas
premissas de Vygotsky, que o sistema de escrita, enquanto
presente na situação de fala social, está “parcialmente alheio à
criança, que trabalha para torná-lo próprio, para torná-lo um
modo ‘apropriado’ de dizer”.
Assim, não podemos referir-nos à aquisição da escrita
através da língua portuguesa em crianças surdas assim como é
para crianças ouvintes, pois nestas ela se dá na modalidade
auditiva e fonoarticulatória, enquanto que a língua de sinais se
dá de forma natural e primária do surdo como modalidade
visual e quiroarticulatória.
A escrita de sinais é um sistema de escrita direta de
sinais, ou seja, a representação do sistema primário de
comunicação da Língua Brasileira de Sinais, que é constituído
por gramática, semântica, pragmática, sintaxe e outros que a
fazem um instrumento lingüístico pleno para os surdos.
A criança surda encontra-se numa situação peculiar de
descontinuidade entre os sistemas primário e secundário de

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representação lingüística, entre a sinalização interna visual e


quiroarticulatória, com que ela faz o processamento interno, e o
sistema de escrita alfabético fonológico, com que se espera que
ela se expresse.
Para Stumpf (2005), as crianças surdas, que se comunicam
através de sinais, precisam representar pela escrita sua fala, que
neste caso é visuoespacial. Quando conseguem aprender uma
escrita que é a representação de sua língua natural, têm a
oportunidade de melhorar seu desenvolvimento cognitivo. A
autora salienta que a “(...) criança transfere para sua nova
língua o sistema de significados que já possui na sua própria
língua e, quando ela aprende a ver sua língua como um sistema
específico entre muitos, passa a conceber seus fenômenos
dentro de categorias mais gerais e isso leva à consciência das
operações lingüísticas (p. 45).

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Referências

FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, A. e PALÁCIO, M. G. Os


processos de leitura e escrita: novas perspectivas. Porto Alegre:
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GESUELI, Zilda Maria. Lingua(gem) e identidade: a surdez em


questão. In: Educação & Sociedade, Campinas, vol.27 n.94, jan.-
abr. 2006.

MELLO, Márcia C. de O. Emilia Ferreiro Me a psicogênese da


língua escrita. In: MORTATTI, MRL., et al., orgs. Sujeitos da
história do ensino de leitura e escrita no Brasil [online]. São
Paulo: Editora UNESP, 2015, pp. 245-275. ISBN 978-85-68334-36-
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QUADROS, Rocine Muller, KARNOPP, Lodenir Becker. Língua


de Sinais Brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed,
2004.

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SMOLKA, Ana L. Bustamante. A criança na fase inicial da


escrita: alfabetização como processo discursivo. São Paulo:
Cortez, 2013.

SILVA, Rafaela Cota da. SignWriting, um sistema de escrita das


línguas gestuais. Aplicação à língua gestual portuguesa.
Exedra- Revista científica. Número mero temático – dezembro
de 2012. Site disponível em:
http://www.exedrajournal.com/exedrajournal/wp-
content/uploads/2013/01/31-numero-tematico-2012.pdf .

STUMPF, Marianne Rossi. Língua de sinais: escrita dos surdos


na Internet. V Congresso Iberoamericano de Informática
Educativa, Viña del Mar, Chile, 2005. Disponível em
http://www.porsinal.pt/index.php?ps=artigos&idt=artc&cat=
15&idart=109

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Tópicos sobre a escrita da língua de sinais*

Introdução

Antes de tecer considerações sobre a Literatura Visual, o


que será feito no tópico seguinte, queremos destacar a
importância do seu ensino. Ao abordar essa literatura em sala
de aula, os professores passam alguns conhecimentos sobre a
cultura do povo surdo e, ao mesmo tempo, abordam a língua
de sinais para estudantes surdos ou ouvintes. Além disso,
incentivam novas produções de textos sinalizados pelos sujeitos
surdos.
O ensino da Literatura Visual deve ser incentivado nas
escolas como uma forma de promover a integração entre surdos
e ouvintes. Ao transmitir aos ouvintes aspectos da sua cultura
através de poemas e outras produções literárias, o surdo chama
a atenção para as particularidades da sua visão de mundo.
Também demonstra a sua capacidade de produzir e decodificar
imagens que provocam emoções, revelando sensibilidade para
o belo expresso na arte. Dessa maneira, afirma o seu lugar no
mundo, o que concorre para reduzir o preconceito.

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A Literatura Visual é criada por meio da língua de sinais,


que pertence ao povo surdo, que tem sua cultura própria, sua
história própria, sua identidade própria, entre outros. Também
é a forma de produzir os textos literários que utilizam a visão
como principal fonte de captação de informação, ou seja, é o
modo de traduzir a memória das vivências surdas por meio das
várias gerações dos povos surdos e criar textos sinalizados
como poesias, histórias de surdos, contos, piadas, fábulas,
clássicos, romances, lendas, literaturas infantis e outras
manifestações culturais.
Essa literatura expressa a importância da língua de
sinais, a questão da identidade surda e da cultura surda
presentes na narrativa. Ela é também registrada em vídeos
atualmente por causa do desenvolvimento tecnológico. Há três
tipos de produções literárias visuais que apresentam a tradução
dos textos literários escritos para a língua de sinais: a adaptação
dos textos clássicos para a realidade dos surdos, que
representam o resgate da literatura surda; a produção ou
criação de textos em prosa; e a produção em versos.
Procedimentos de avaliação
Avaliamos duas aulas. A aula1, ministrada pelo
professor surdo K na Escola 1, apresenta o tema “Os Três

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 63

porquinhos” em escrita de sinais, em língua de sinais e língua


portuguesa para os alunos surdos do Ensino Fundamental, as
quais são da modalidade espacial-visual. Essa aula também
apresenta a história “Os Três Porquinhos” em língua
portuguesa e em língua de sinais para os alunos ouvintes do
Ensino Fundamental, que são da modalidade oral-audtiva.
Quando inicia a aula, primeiramente o professor apresenta o
seu nome e o sinal em língua de sinais e em escrita de sinais,
conforme indicam os slides, por meio de datashow.
O professor ensina a história dos “Os Três Porquinhos”
por meio de língua de sinais. Primeiro, conta essa história de
acordo com as imagens e também as ilustrações em sinais para
crianças ouvintes, a fim de facilitar-lhes o aprendizado de
sinais. É interessante o professor K utilizar essa história infantil
escrita em português e traduzida em língua de sinais para
ouvintes, porque os alunos já conhecem essa historia e por isso
é mais fácil compreendê-la em língua de sinais. Essa
metodologia é divertida, dinâmica e contextualizada.
Depois, o professor K ministra a aula sobre o tema de “Os
Três porquinhos” em escrita de sinais, em língua de sinais e
língua portuguesa para as crianças surdas, que são da
modalidade espacial-visual, porque elas conhecem a escrita de

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sinais e podem escrever na sua própria língua. Essa história é


adaptada linguística, cultural e socialmente da comunidade de
ouvintes para a cultura surda. Essa adaptação faz as crianças
surdas se identificarem com as personagens. A história é
(re)criada e compartilhada na comunidade surda. Além disso, o
professor ensina essa história falando em bilinguismo e
oralismo. Mostra que a historia pode ser escrita pela pessoa
surda porque ela foi adaptada para a comunidade surda e sua
cultura. Também ministra o bingo de escrita de sinais para os
alunos responderem e tirarem dúvidas.
Esses textos de “Os Três Porquinhos”, escritos por
ouvintes e traduzidos para a língua de sinais, são importantes
para a acessibilidade das pessoas surdas, que ganham
experiência nas duas culturas. A tradução ajuda a desenvolver
o conhecimento de textos da cultura de ouvintes por parte da
criança surda, que conhece a mesma história infantil que uma
criança ouvinte porque tem o direito de acessibilidade. Então, é
muito importante para qualquer professor ensinar e utilizar a
literatura visual/surda.
Enfim, identifico esse conto utilizado pelo professor surdo
K como a tradução e adaptação dos textos sinalizados criados
pelo próprio surdo, que são dois tipos de Literatura Visual.

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A aula 2, ministrada pelo professor surdo E na Escola 2,


apresenta o tema “O Pinóquio” em vídeo traduzido por Nelson
Pimenta para a língua de sinais para alunos surdos do Ensino
Fundamental. Felizmente, nessa escola existe um espaço
disponível para crianças surdas, no qual existem a televisão, o
quadro verde, os materiais didáticos adaptados em língua de
sinais, entre outros.
O professor ensina essa história infantil traduzida em
imagens para as crianças surdas. Utiliza recursos didáticos
como cartazes, lápis, tesouras, colares, papéis coloridos, figuras
ou imagens relacionadas com “O Pinóquio” para avaliar se
essas crianças já aprenderam ou não a escrita de sinais dessas
imagens ou figuras. Essas crianças fizeram atividades, bem
como a avaliação prática, conforme as imagens e as escritas de
sinais, e depois se expressaram em sinais. Essa reação dos
alunos é ativa porque eles prestam atenção na televisão e
depois têm a facilidade de fazer atividades sem ajuda por meio
da modalidade visual-espacial. Essa metodologia é divertida,
contextualizada e dinâmica, o que é importante para os surdos
terem a habilidade de aprender de forma clara e fácil já que eles
visualizam as imagens e depois as escritas de sinais.

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Identifico esse conto utilizado pelo professor surdo E


como a tradução do texto sinalizado criado pelo próprio surdo,
que é um dos tipos de Literatura Visual.
Achei as duas aulas muito produtivas. Elas mostraram o
significado das obras avaliadas, com todo o seu simbolismo, e
permitiram a comunicação entre surdos e ouvintes. Os
procedimentos didáticos estiveram à altura dos objetivos, o que
é fundamental. Sugiro que novas histórias sejam trabalhadas
em classe, pois esse é um meio importante de ampliar o
universo cultural dos surdos e promover a sua integração.
Para esse tipo de trabalho, há algumas obras literárias
que são altamente recomendáveis, pois traduzem e adaptam os
textos clássicos da literatura universal e/ou brasileira infantis
para LIBRAS, cuja temática é sobre a surdez, a língua de sinais,
o mundo dos surdos, conforme referem Tibi e Joca (Bisol, 2001),
Entre essas obras estão “A cigarra e as formigas”
(Oliveira:Boldo, 2003), “O Som do Silêncio” (Cotes, 2004),
Cinderela Surda (Hessel; Rosa; Karnopp, 2003), “Rapunzel
Surda” (Silveira; Rosa; Karnopp), “Adão e Eva” (Rosa;
Karnopp,2005) e “Patinho Surdo” (Rosa; Karnopp, 2005).
O estudo da literatura surda, com a metodologia
empregada nas aulas avaliadas, contribui para a possibilidade

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 67

de se ter mais acesso a narrativas brasileiras autenticamente


surdas registradas em livros ou vídeos, futuramente, e também
para a possibilidade de realizar trabalhos desenvolvidos sob a
temática da Literatura Visual nas escolas, nas universidades e
nas associações de surdos. Esses trabalhos devem se relacionar
com as diferentes maneiras de utilizar o ensino da LIBRAS e
também com outros conteúdos presentes no currículo escolar. É
necessário reconhecer o valor da literatura na vida das pessoas
surdas e ouvintes.
Considerações finais
O ensino de Literatura Visual é um dos desafios que
todos nós estagiários enfrentamos para alcançar as metas
pretendidas e superar as dificuldades de nos tornarmos
profissionais qualificados e fluentes em Libras. Esse desafio é
real, e mesmo com a luta da comunidade surda para garantir a
cidadania, os direitos e os deveres, ainda existe muito a ser
conquistado na área da educação.
Com base na avaliação do estágio, observa-se que o
incentivo à produção de livros didáticos para o ensino de
Literatura Visual é uma das principais carências observadas e
necessita de maior intensificação. Felizmente, nesta escola, há o
uso dos recursos didáticos como as obras em língua de sinais

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 68

registradas em vídeos expostos por meio da televisão ou


datashow. Além disso, em toda a escola, há possiblidade de
produzi-los.
Percebe-se que o que vem sendo conquistado pelos
profissionais da educação é fruto do esforço de professores
compromissados com a causa da comunidade surda, os quais,
por pesquisas particulares, têm conseguido trazer uma nova
estratégia de ensino e alternativas lúdicas para melhor
aquisição da língua por parte dos estudantes. Também alguns
recursos artesanais, como obras registradas em língua de sinais,
têm sido utilizados para a exposição das aulas.
Diante disso, é importante que a maioria dos professores
de Libras mantenha contato com a comunidade surda através
das várias gerações dos povos surdos e interaja com ela para
que adquira conhecimentos sobre sua cultura, sua identidade,
sua língua etc.
O ponto positivo é que há o estimulo artístico e também
o esforço e o compromisso de alguns professores de Libras. O
ponto negativo é que há falta de estrutura física e ambiental,
pois o clima atrapalhou um pouco a concentração e o
aprendizado por parte dos alunos bem como dificultou o
desempenho do professor em sala de aula. Mudanças nesse

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 69

aspecto serão conquistadas com o tempo através de políticas


públicas. No entanto, a fluência em Libras e a capacidade dos
profissionais analisados no corpus são consideradas suficientes
para o papel executado na escola.
Para a minha carreira profissional, o estágio mostrou a
importância de se dedicar à produção de obras que contenham
particularidades da comunidade surda, como o apoio visual e o
recurso aos estímulos visuais.
Sugerimos que, em sala de aula, se explorem as obras
produzidas em língua de sinais por meio de ilustrações
(imagens, fotos ou figuras) que contem as histórias e os contos
em vídeos para os alunos surdos e ouvintes. Depois de passar
esses vídeos, os professores farão os questionamentos aos
alunos e procurarão interagir com eles, levando-os a conhecer o
mundo dessas obras literárias surdas originais e fazendo com
que se identifiquem com os personagens inclusive por meio do
treinamento teatral.
Nas escolas e nas universidades, podem utilizar a
internet para mostrar os livros registrados em vídeos que
apresentam os textos clássicos da literatura em LIBRAS, os
quais constituem tradução, adaptação e ou recriação de obras
como “A Cinderela surda”, “O Rapunzel surdo”, a “Tibi e

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 70

Joca”, “O patinho surdo”, entre os outros. Enfim, os professores


precisam incentivar a produção de obras surdas originais nas
escolas e nas universidades, para que ocorra no futuro, também
no nível literário, a valorização da língua e da cultura surda.

Referências

ADRIANO, Nayara de A. & PEIXOTO, Janaína A. Língua


Portuguesa e LIBRAS: teorias e práticas 3. João Pessoa: Editora
da UFPB, 2013.
------. Língua Portuguesa e LIBRAS: teorias e práticas 7. João
Pessoa: Editora da UFPB, 2013.
FALCÃO, Luiz A. Barbosa. Surdez, Cognição Visual e Libras:
estabelecendo novos diálogos. 4ª ed revisada e ampliada.
Recife: Ed. do Autor, 2014. pp. 356-64.
STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda.
2ª ed.rev.- Florianópolis: Ed. da UFSC, 2009. pPp. 61-7.

*O presente texto nasceu do relatório referente às atividades


desenvolvidas durante o Estágio de Observação do curso de

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Licenciatura plena em Letras/LIBRAS – UFPB, da disciplina


Estágio Supervisionado III (Observação do Ensino da Literatura
Visual no Ensino Fundamental), ministrada pela professora
Doutora Janaína Aguiar Peixoto, como cumprimento da
exigência da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº
9394/96). O estágio foi realizado em Escolas da Paraíba.

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APÊNDICE I

Comentários sobre textos produzidos por surdos tendo


como base o conceito de interlíngua

Em sua tese sobre a escrita dos surdos, Brochado analisa


textos produzidos por surdos tendo como base os conceitos e as
características da interlíngua (Cf. BROCHADO, Sônia M. D. A
apropriação da escrita por crianças surdas usuárias da língua
de sinais brasileira. Uesp: 2003.) Esses conceitos de interlíngua
são originados pela articulação das propriedades e
características da língua nativa e da língua-alvo. Os textos
escritos por surdos estão em estágios intermediários do
processo de aprendizagem de uma segunda língua, ou seja, em
estágios de interlíngua.
A análise dos textos escritos por surdos em português,
observada em alguns estudos sobre escrita de surdos, mostra
que eles apresentam alguns elementos referentes às
características da interlíngua.

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O primeiro Texto I, elaborado pelo aluno “R”, presenta os


seguintes elementos da interlíngua:
- Aparecimento de algumas construções de frases na ordem
SVO, mas também de outras construções tipo tópico-
comentário;
- Falta de preposição;
- Falta de conjunção;
- Frases curtas;
- Emprego de verbo de ligação (ser) com correção uma vez;
- Ausência de verbo de ligação (ser);
- Emprego de alguns verbos flexionados;
- Repetição de nomes próprios;
- Uso de artigos, algumas vezes concordando com os nomes
que acompanham;
- Repetição de verbo flexionado (ter);
- Demonstração de vocabulários reduzidos;
- Uso de acentuação com frequência;
- Existência de um erro ortográfico;
- Predomínio de algumas palavras de conteúdo (substantivos,
adjetivos, verbos);

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O segundo texto, produzido pelo surdo “R1”, apresenta os


seguintes elementos considerando-se as características da
interlíngua:
- Estrutura de frases muito semelhante à Língua Brasileira de
Sinais (L1), apresentando poucas características do Português
(L2);
- Falta de ou inadequação de elementos funcionais (artigos,
preposição e conjunção);
- Uso de verbos no infinitivo;
- Repetição de algumas palavras;
- Falta de acentuação;
- Existência de um erro ortográfico;
- Utilização de período simples sem subordinação;
- Falta de preposição;
- Falta de flexão do nome em gênero, número e grau;
- Presença artigos, às vezes, sem adequação quanto ao uso;

O mesmo aluno, dois anos depois, apresentava os


elementos seguintes, considerando-se as características da
interlíngua:
- Falta de conjunção;

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A EVOLUÇÃO DA ESCRITA DA LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL | 75

- Uso de artigos, algumas vezes concordando com os nomes


que acompanham;
- Ausência de preposição;
- Emprego de verbos flexionados;
- Repetição de algumas palavras como Lebre e Tartaruga;
- Frases e palavras justapostas confusas, que não resultam em
efeito de sentido comunicativo;
- Muitas vezes, não se consegue apreender o sentido do texto,
parcial ou totalmente, sem o conhecimento anterior da história
ou do fato narrado.

De modo geral, obtiveram-se as seguintes respostas:


• Estrutura de frases muito semelhante à Língua Brasileira de
Sinais (L1), apresentando poucas características do Português
(L2).
• Aparecimento de construções de frases na ordem SVO, mas
maior quantidade de construções tipo tópico-comentário.
• Predomínio de palavras de conteúdo (substantivos, adjetivos,
verbos).
• Falta ou inadequação de elementos funcionais (artigos,
proposições, conjunção).
• Uso de verbos, preferencialmente, no infinitivo.

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• Falta de flexão dos nomes em gênero, número e grau.


• Pouca flexão verbal em pessoa, tempo e modo.
• Uso de artigos, às vezes, sem adequação quanto ao uso.
• Pouco emprego de preposição e/ou de forma inadequada.
• Pouco uso de conjunção e sem consistência.
• Semanticamente, é possível estabelecer sentido para o texto.
• Frases e palavras justapostas confusas, não resultam em efeito
de sentido comunicativo.
• Emprego de elementos funcionais, predominantemente, de
modo inadequado.
• Muitas vezes, não se consegue apreender o sentido do texto,
parcialmente ou totalmente, sem apoio do conhecimento
anterior da história ou do fato narrado.
Isso nos levou às seguintes conclusões, que podem nortear
o ensino da escrita de sinais e sugerir propostas
pedadogicamente produtivas:
1 - Geralmente os alunos omitem as preposições;
2 - Muitos verbos são utilizados do forma inadequada e,
geralmente, são utilizados sem a devida flexão, sendo escritos
prioritariamente no infinitivo;
3 - Não exploraram os elementos da narrativas ao fazer o
reconto solicitado das histórias;

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4 - Geralmente utilizaram períodos simples sem subordinação;


5 - Demonstrar tem domínio de um vocabulário reduzido da
língua portuguesa;
6 - Não construíram uma narrativa, conforme foi solicitado na
consigna das atividades, mas tenderam por explorar a tipologia
descritiva (descrição das personagens) em suas produções
textuais;
7 - A maioria das frases apresentadas não estabeleciam
concordância com as frases que vinham em seguida;
8 - Houve a troca de letras em algumas palavras escritas;
9 - Nota-se um pouco uso, por parte dos surdos nos textos
analisados, de conjunções e de outros elementos coesivos;

10 - É possível de se identificar a inversão da ordem de alguns


elementos sintáticos;
11 - No caso do texto 05 (reconto da fábula "A Lebre e a
Tartaruga"), foi apresentado elementos lexicais dentro do
contexto da fábula a ser recontada;
12 - Quando os verbos utilizados não estavam no infinitivo
estavam no presente, ao invés de se colocar no tempo pretérito
conforme se pede em uma narrativa;

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13 - Em sua maioria apresentaram coerência textual, pois os


sentidos que emergiram do texto possibilitaram uma visão
global do que se estava querendo expressar através da escrita.
Por outro lado, ficou notório que os surdos em questão
possuem dificuldades com a coesão textual.

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APÊNDICE II

Observações sobre a didática da LI

Seguem alguns recursos desenvolvidos em sala de aula


que tornam mais produtivo o ensino de LI
- Relato de estórias, que inclui produção espontânea das
crianças e do professor, ou produção de contos e piadas que
passam de geração em geração e são relatadas por contadores
de estórias em encontros informais como associações de surdos
e produção de literatura infantil em sinais. Interação
espontânea da criança com outras crianças e adultos.
- Utilizando as configurações de mão, movimentos, expressões
faciais gramaticais, localizações, movimentos do corpo, espaço
de sinalização, orientações de mão, direções do olhar e
classificadores são recursos discursivos que devem ser
explorados para o processo de alfabetização.

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- E as relações cognitivas relacionadas à capacidade da


criança em organizar suas ideias e pensamento por meio de
uma língua na interação com os outros colegas e adultos.
- Explorando a produção de vídeos de obras literárias de
adultos em sinais.
- O sistema escrito de sinais utilizado pelas crianças surdas
que dominam a língua de sinais utilizada no país. Este
sistema envolve a composição das unidades mínimas de
significado da língua, compondo estruturas em forma de
texto.
- Reconhecer as relações gramaticais complexas no texto
escrito e falar sobre elas.
- Participar da comunidade surda enquanto membro critico e
criativo.
- Apreciar a Libras como língua espacial-visual por meio de
produções artísticas.
- Desenvolver a habilidade de reconhecer as variações e
dialetos da própria língua.
- Também ler sinais e relações de significação que
estabelecem com o mundo.
- desenvolver o uso de estratégias específicas para resolução
de problemas, exercitar o uso de jogos de inferência,
trabalhar com associações, desenvolver as habilidades de
discriminação visual, explorar a comunicação espontânea,
ampliar constantemente o vocabulário, oferecer
constantemente literatura impressa na escrita em sinais,
proporcionar atividades para envolver a criança no
processo de alfabetização como autora do próprio processo.
- Manter uma videoteca.

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