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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE BIOLOGIA

O dilema ético da utilização de ferramentas de edição gênica


em embriões

BIOB66 – Bioética

Laryssa Cardoso Calmon


Mila Oliveira Nascimento
Tatiely Souza dos Santos
Thalia Dos Santos Silva

Salvador, BA - 2023
A engenharia genética ganhou diversas inovações de suas técnicas nas últimas
décadas, nesse sentido, é possível pensar na utilização de técnicas de biologia molecular
para promover a edição gênica, formando os denominados Organismos Geneticamente
Modificados - OGMs Instituto Nanocell (2016). Essas modificações genéticas são realizadas
por técnicas de biologia molecular e consistem em mecanismos de retirada ou adição de
genes de um determinado organismo, utilizando por exemplo a tecnologia do DNA
recombinante, tendo como objetivo adicionar ou retirar características desejáveis desse
organismo final Souza (2021). Uma dessas técnicas é chamada de Tecnologia CRISPR, a
qual foi descoberta a partir de mecanismos fisiológicos de células bacterianas. Consiste
basicamente em uma molécula de RNA que funciona como uma sonda, se ligando de forma
complementar a região a qual for específica, esse ácido nucleico age com uma enzima do
tipo endonuclease, que realiza clivagem de bases nitrogenadas onde o RNA se ligou de
forma complementar Alvarez (2017). Essa técnica que vem sendo muito estudada pode ser
a chave para realizar o processo de edição genética em células vivas, já existem testes com
plantas a fim de adicionar características desejáveis, ademais, foram feitos testem em
embriões não viáveis, o objetivo da técnica em si seria corrigir o conjunto de genes dessas
células para adicionar ou retirar as características desejáveis Passos et al( 2016).
Paralelo a isso, a utilização dessa técnica pode ter grande importância médica, pois
pode-se pensar na utilização delas tanto para estudar patologias, quanto até para tratá-las.
Assim como dito por Belo (2020), a técnica pode ser uma aliada para estudar doenças que
não tem cura com o HIV e o câncer, ou até mesmo criar organismos que possuem certa
resistência a pragas no campo da agropecuária. Uma outra possibilidade de estudo são as
doenças genéticas cromossômicas, que são investigadas ainda durante o desenvolvimento
embrionário Costa et al.( 2021).
Nesse cenário, a engenharia genética tem avançado, como na área de células
tronco, porém, existem outras finalidades para essa técnica, como o aperfeiçoamento
humano, no qual o indivíduo seria perfeito, livre de doenças, com uma inteligência acima da
média e uma estética superior Santos (2019). Conforme pensa Souza (2021), a ideia de
realizar edições no código genético e selecionar características em um feto humano é
revolucionária e ao mesmo tempo, pode ser problemática. Alguns dilemas éticos permeiam
a utilização dessa técnica, pois a possibilidade de se ‘editar’ um embrião em estágio de
desenvolvimento pode criar diversos conflitos de interesses, assim como foram citados por
Menzel (2019), dentre eles temos: Quais doenças essa técnica poderia ser utilizada como
medida de tratamento? Em quais características do embrião poderiam ou não ser alteradas
nesse processo? O ser humano perderia a sua identidade genética familiar? Estaríamos
diante da coisificação humana? Poderíamos comprar seres humanos feitos em laboratório?
A técnica seria realmente uma medida viável e acessível a toda população? A utilização da
ferramenta para edição de caracteres fenótipos em embriões envolve um grande problema
e pode desencadear um problema social baseado no preconceito racial, o qual seria a
seleção de características que apenas se aproximem de um ‘padrão’ idealizado como ideal
para ser humano.
Nesse sentido, Giansante (2017), expressa sua preocupação quanto a aumento de
desigualdade social que as alterações de embrião podem gerar, pois acredita-se que serão
procedimentos de alto custo, logo, pessoas com mais condição financeira irão se manter no
topo da sociedade, pois estarão em “vantagem” diante do resto da população e a parcela da
população mais pobre terá mais uma “desvantagem”. Conforme Santos e Menzel ( 2019) ,
ao analisarmos a civilização ao decorrer da história, é notório a existência da ideia de
superioridades entre seres humanos que variam entre sí, seja por questões de etinia, cor,
sexo ou condição social, o que acarreta em situações de preconceito e descriminalização. A
ideia de que haverá características que serão escolhidas em detrimentos de outros, pode
ser observada com um evento que já ocorre que é a escolha do sexo dos bebês, segundo
Santos (2019), em alguns locais da América onde esse evento é permitido já é observado
uma prefêrencia no sexo femino, algo que pode ser um problema a longo prazo pois
acarretaria em um desequilibro demografico entre os sexos.
Para além disso, algumas condições cromossômicas como a Síndrome de Down
poderiam ser vistas como patologias, e assim os embriões seriam editados para remover a
condição, considerando que pessoas com a síndrome sofrem preconceito e podem ser
vistas sob uma ótica estereotipada de ‘deficientes’, o apagamento genético desta população
reforçaria ainda mais os estigmas. Portanto, a utilização da técnica apresenta benefícios no
estudo e aplicação contra doenças, porém existem dilemas que poderiam afetar a bioética
humana. Sendo a bioética definida por santos (2019), como uma forma de regulamento da
ciência que tem como objetivo preservar a moral humana mesmo diante dos avanços
científicos. A situação concreta acerca da técnica e a sua utilização possui ainda alta
restrição e aplicações direcionadas apenas a estudos e embriões não viáveis, de forma que
alguns conselhos de ética da UNESCO já vetaram algumas aplicações da técnica que
apresentassem risco a dignidade humana, como a clonagem de seres humanos. Além do
mais, é válido pensar na inflûencia que as pessoas famosas possuem sob a estética da
população que ela influencia, nesse viés, Menzel (2019), afirmou que da mesma forma em
que a forma que essa parcela da sociedade se veste é imitada e tida como um estereótipo a
ser seguido, as suas características físicas também serão uma preferência.
Apesar de todas as controvérsias envolvendo as modificações genéticas, Savulescu
apud Belo (2020), afirma acreditar que deve ter experimentação com embriões humanos,
pois não utilizá-los seria ignorar experimentos que podem render conclusões com potencial
de salvar vidas no futuro, de modo que para essa linha de pesquisa seria se responsabilizar
por mortes que poderia ter sido evitadas através destes experimentos. No entanto, é preciso
ter em foco que efeitos colaterais são uma realidade e são imprevisíveis, sendo esse um
ponto utilizando como um argumento negativo contra a engenharia genética, como afirma
Giansante (2017), ao utilizar o exemplo do rato que foi modificando visando melhorar a sua
memória, porém, essa alteração afetou um gene que o deixou extremamente sensível à
dor. Nesse viés, uma outra questão a ser discutida é que diante de efeitos colaterais ou
resultados não satisfatórios, embriões humanos não podem ser descartados tal qual ocorre
com bactérias e/ou plantas Belo( 2020). Diante desse cenário, foi proposto por Hyun apud
Belo (2020), que houvesse um limite de 14 dias para realizar experimentos e após esse
período seria preciso interromper o desenvolvimento do embrião, essa ideia é uma
realidade em alguns países.
No sentido de legislação, existe um ramo denominado “biodireto”, o qual envolve
buscar um equilíbrio entre a bioética e a engenharia genética Giansante (2017). A lei
brasileira, conforme afirma, Santos (2019), não permite que haja a escolha de sexo do
embrião ou qualque característica pelos genitores. De modo que a única permissão que
tem-se no país similar, é para questões medicamentosas, quando pais geram outro filho
para auxiliar no tratamento de algum outro, como no caso da anemia falciforme, porém,
essa questão também tem um viés problemático que não será explorado neste trabalho
Santos (2019). A vista disso, é válido ressaltar que a dignidade humana, a qual é válida
desde a concepção, é um fundamento jurídico que consta na Constituição Federal de 1988
Santos (2019). Dessa maneira, conforme Giansante (2017), “são apresentadas três
questões para se considerar no debate sobre a engenharia genética: a) o direito de um ser
humano a ser humano; b) a dignidade de um ser humano, que seria diminuída por
deliberada manipulação genética; e c) a preservação da natureza humana”
Nesse cenário, é válido pensar que, como dito por Menzel( 2019), a técnica se faz
importante para o estudo e criação de metodologias de cura contra doenças consideradas
até incuráveis e genes defeituosos. Assim, deve sim ser utilizada, mas apenas para esses
fins de tratamentos e pesquisas de patologias. Além disso, ainda consoante a menzel
(2019), essa técnica e os seus resultados positivos para a medicina não devem ficar
limitados apenas a uma parcela restrita da sociedade, assim, a assistência da utilização
dessas técnicas devem atingir a toda sociedade, para assim evitar que os benefícios fiquem
limitados a apenas uma parcela de pessoas, para que assim não afete a dignidade da
pessoa humana. Todavia, essa manipulação genética deve ser feita com fiscalização e
sempre respeitando os comitês de bioética atribuídos, devendo proibir o uso da técnica para
edição de caracteres fenótipos com embasamento meramente estético, e devendo também
preservar a originalidade e naturalidade de cada ser humano e seus respectivos genomas.
Logo algumas condições como a Síndrome de Down e o albinismo não devem ser alvo
dessas técnicas, pois isso criaria uma tendência a evitar pessoas com essas condições,
reforçando comportamentos preconceituosos e antiéticos sociais.
Referências Bibliográficas

ÁLVAREZ, Angela Bernardo. La revolución de CRISPR-Cas9: una aproximación a


la edición genómica desde la bioética y los derechos humanos. Revista
Iberoamericana de Bioética; nº 03, Espanha, 2017.
BELO, Thiago Caetano Andrade; PAIVA, Priscila Moraes Henrique; DELÚ FILHO,
Nelson. A aplicação da técnica de Edição de Genomas CRISPR-CAS9 na Engenharia
Genética: benefícios à ciência e sociedade e impasses éticos frente ao desconhecido, em
especial na edição embrionária humana. -, 2020.
DA COSTA, Marília Marques; DE CAMPOS BRITO, Thaís Martins; DE CASTRO,
Frederico Augusto Vieira. Discussões éticas para a tecnologia CRISPR-Cas9. Episteme
Transversalis, v. 12, n. 2, 2021.
GIANSANTE, Ana Letícia Valladão; NOJIRI, Sérgio. “DESIGNER BABIES”:
ASPECTOS BIOÉTICOS DA SELEÇÃO EMBRIONÁRIA NA REPRODUÇÃO HUMANA
ASSISTIDA. Revista de Biodireito e Direito dos Animais, v. 3, n. 1, p. 92-108, 2017.
MENZEL, Francisca Reis Da Silva Barros. Manipulação genética e dignidade da
pessoa humana. 2019. Dissertação de Mestrado.
O JORNAL ELETRÔNICO DO INSTITUTO NANOCELL. Disponível em:
<http://www.nanocell.org.br/crispr-a-tecnica-de-engenharia-genetica-que-pode-muda
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PASSOS, Geraldo Aleixo, et al. Aplicações da Técnica. In: PEREIRA, Tiago
Campos. Introdução à Técnica de CRISPR. Sociedade Brasileira de Genética, São
Paulo, Brasil, 2016.
SANTOS, Bruna Pereira Costa dos. MANIPULAÇÃO GENÉTICA: ÉTICA,
BIODIREITO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 2019.
SOUZA, Eduardo F. et al. MANIPULAÇÃO GENÉTICA DO EMBRIÃO E O DIREITO
DA PERSONALIDADE. 2021.
UNESCO -A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura. Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos.
Disponível em:<https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000122990_por>. Acesso: 28
mai. 2019.

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