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https://doi.org/10.4322/cobramseg.2022.

0815 ISBN: 978-65-89463-30-6

XX Congresso Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica


IX Simpósio Brasileiro de Mecânica das Rochas
IX Simpósio Brasileiro de Engenheiros Geotécnicos Jovens
VI Conferência Sul Americana de Engenheiros Geotécnicos Jovens
15 a 18 de Setembro de 2020 – Campinas - SP

Uma Proposta Alternativa Para a Avaliação da Segurança de


Taludes
André Kazuhiro Shiotani
Docente, Universidade Paranaense, Umuarama, Brasil, andreks@prof.unipar.br

Jeselay Hemetério Cordeiro dos Reis


Docente, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Brasil, jhcreis@uem.br

RESUMO: As exigências normativas no brasil quanto à segurança das estruturas, em particular estabilidade
de taludes, não são suficientes para que o engenheiro realize uma análise de risco adequada para sua obra. A
análise de confiabilidade já foi incorporada em algumas normas internacionais e se mostra uma poderosa
ferramenta na avaliação da probabilidade de ruína. Este trabalho propõe a avaliação das variabilidades dos
parâmetros de resistência e solicitação dos solos nos cálculos de segurança de taludes. Foram analisados dois
taludes, um com inclinação de 1:1 e outro de inclinação 1:0,3, ambos com o mesmo desnível e situadas na
região de Curitiba. Foi verificado que existe uma probabilidade ruína considerável para os taludes mesmo que
estes atendam aos valores normativos do coeficiente de segurança exigidos pela norma.

PALAVRAS-CHAVE: Estabilidade de encostas, confiabilidade estrutural, probabilidade de ruína.

ABSTRACT The normative requirements in Brazil regarding the safety of structures, slope stability, are not
sufficient for the engineer to carry out an adequate risk analysis for his work. Reliability analysis has already
been incorporated into some international standards norms and proves to be a powerful tool in assessing the
failure probability. This paper proposes the evaluation of the variability of the resistance of soil parameters
and loads variability in the slope security calculations. Two slopes were analyzed, one with a 1: 1 ratio slope
and the other with a 1: 0.3 ration slope, both with the same total height and located in the region of Curitiba.
It was found that there is a considerable probability of ruin for the slopes even if they meet the normative
values of the safety coefficient required by the norms.

KEYWORDS: Slope stability, structural reliability, failure probability.

1 Introdução

A verificação da estabilidade externa de taludes normalmente está associada aos coeficientes de


segurança recomendados pelas normas brasileiras vigentes. A norma ABNT NBR 11682 (2009) indica a
utilização do método de valores de projeto adotando coeficientes de segurança parciais para a verificação da
segurança de encostas, baseando-se no equilíbrio-limite.
Em sua metodologia apresentada, a norma admite que o valor do fator de segurança pode variar em
função do dano potencial devido â ruptura do talude, no que diz respeito ao risco à vida humana, danos
materiais e danos ao meio ambiente, e tem relação direta com a resistência ao cisalhamento do material do
talude (ABNT NBR 11682, 2009). No entanto, nada se refere à variabilidade das ações e dos fatores que podem
influenciar na resistência dos materiais nas verificações de segurança.
Nota-se que esta verificação determinística pode não retratar corretamente a segurança de obras em
terra, muito menos a probabilidade de falha de taludes. Em toda obra geotécnica, haverá um risco de ruína,
mesmo atendendo aos fatores de segurança. Portanto, é necessário adotar uma probabilidade de ruína máxima
para fazer os cálculos de modo a satisfazer esse risco inerente dos sistemas estruturais (CINTRA; AOKI, 2010).
Algumas normas internacionais, tais como o Eurocode e a ACI-318 já trazem recomendações para o uso
da análise de confiabilidade, conceito mais abrangente de segurança de ferramenta poderosa para o cálculo do
risco de ruína.

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A análise de confiabilidade avalia a densidade de probabilidade da resistência e da solicitação nas


verificações de segurança e permitem a obtenção da probabilidade de falha. Nesta abordagem, além dos valores
médios (fator de segurança global) ou de característicos (fator de segurança parcial) terem de respeitar os
valores de normativos das fatores de segurança, a variabilidade das ações e resistências, margem de segurança
e o índice de segurança são levados em consideração nos critérios de avaliação da segurança das obras
(CINTRA; AOKI, 2010).

2 Objetivo

Propor uma abordagem baseada na análise de confiabilidade utilizando as recomendações da NBR


11682 (2009) para a verificação da estabilidade com a ruptura global de taludes.

3 Metodologia

3.1 Caracterização do Solo

Neste estudo foram estudados dois taludes com desnível de 8 metros e diferentes inclinações localizado
n região de Curitiba, PR. Os taludes foram denominados Talude 1, com inclinação na proporção de 1:1, e
Talude 2, com inclinação na proporção de 1:0,3.
Os dados do solo foram obtidos por meio de 4 sondagens de simples reconhecimento com ensaio de
penetração dinâmica, cujos resultados são apresentados na Figura 1 por meio de um perfil geotécnico.

Figura 1. Perfil geotécnico do solo analisado

Trata-se de uma bacia dividida em três agrupamentos distintos: Embasamento cristalino, constituído por
um complexo de rochas metamórficas do pré-cambriano; depósitos sedimentares do terciário (cenozoicos); e
depósitos sedimentares mais recentes (holocênicos), depositados pelos rios e riachos que cortam a bacia de

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Curitiba (VIANNA, 2000). Esta sequência de sedimentos Cenozoicos da bacia de Curitiba foi denominada
Formação Guabirotuba (BIGARELLA; SALAMUNI, 1962).
Os solos da região de Curitiba são caracterizados por serem argilas-siltosas ou siltes-argilosos com
intercalações de lentes de areia e arcosianas, cuja consistência varia de rija à dura. Trata-se de um solo
altamente plástico e de elevada expansibilidade, devido à presença predominante de argilominerais do grupo
de esmectitas e pelo fato de ser pré-adensado (VIANNA, 2000).
Para a realização do ensaio cisalhamento direto, foi retirado uma amostra de solo indeformada à uma
profundidade de 4 metros. Justifica-se a retirada da amostra por estar à uma profundidade intermediária ao
desnível total do talude, 8 metros. A envoltória de resistência foi obtida utilizando o critério de Mohr-Coulomb
e os valores de coesão e ângulo de atrito interno são apresentados pela Equação (1).

𝜏 = 7 + 𝜎. 𝑡𝑔31° (1)

3.2 Análise das Variáveis

De posse do perfil geotécnico, foram utilizadas correções matemáticas propostas por Teixeira e Godoy
(1996) para a obtenção dos valores da coesão e, para o ângulo de atrito interno, foi utilizado a correlação
proposta por Teixeira (1996), apresentadas pelas equações (2) e (3), respectivamente.

𝑐 = 10. 𝑁 (2)
∅= 20. 𝑁 + 15° (3)

Para a mesma profundidade de retirada da amostra indeformada (Caso 1), foram utilizados os valores
de NSPT para obter os valores correlacionados do ângulo de atrito interno e coesão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1. Valores obtidos do ângulo de atrito interno e coesão por meio de correlações para a
profundidade de 4 m (Caso 1)
Desvio
SM19 SM20 SM21 SM22 Média Variação
Padrão
Ângulo de atrito interno (°) 21,3 25,0 27,6 21,3 23,8 3,1 0,129
Coesão (kPa) 20,0 50,0 80,0 20,0 42,5 28,7 0,676

Contudo, a amostragem limitada à apenas uma profundidade pode não representar a variabilidade dos
parâmetros ao longo da profundidade do talude. Para realizar esta avaliação, as médias dos valores do ângulo
de atrito interno, bem como seus desvios padrão e coeficiente de variação foram determinados para a
profundidade total de 8 metros (Caso 2). A partir destas informações, os gráficos apresentados pela Figura 2 e
Figura 3 foram confeccionados.
Analogamente, foram determinadas as médias, desvio padrão e variação referentes aos valores
correlacionados da coesão (Figura 4 e Figura 5).

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Ângulo de atrito interno (°) Desvio padrão


20,00 25,00 30,00 35,00 1,50 2,00 2,50 3,00 3,50
2 8,0

3 7,0

4 6,0

Profundidade (m)
Profundidade (m)

5 5,0

6 4,0

7 3,0

8 2,0
0,060 0,080 0,100 0,120 0,140
SM19 SM20 SM21
Variação
SM22 Média Amostragem Desvio Variação
Figura 2. Valores do ângulo de atrito interno em Figura 3. Variabilidade do ângulo de atrito interno
função do NSPT

Desvio Padrão
Coesão (kPa) 0,00 20,00 40,00 60,00
0,00 50,00 100,00 150,00 200,00 2,0
2,0

3,0
3,0

4,0
Profundidade (m)

4,0
Profundidade (m)

5,0 5,0

6,0 6,0

7,0 7,0

8,0 8,0
0,000 0,200 0,400 0,600 0,800
SM19 SM20 SM21
Variação
SM22 Média Ensaio Desvio Variação
Figura 4. Valores da coesão em função do NSPT Figura 5. Variabilidade da coesão

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3.3 Verificação da Estabilidade Global

As verificações de estabilidade global dos taludes foram realizadas no software GEO5, obtidos pelo
método de Bishop configurado para obter uma superfície de ruptura circular e otimizada para determinação
dos coeficientes de segurança (Figura 1).

Figura 6. Modelo numérico do Talude 1

O solo atribuído ao modelo apresenta um peso específico γ = 14 kN/m³, e peso específico saturado γ =
19 kN/m³. Nestas análises foram atribuídos os parâmetros das envoltórias obtidas no ensaio de cisalhamento
direto. De forma análoga, foram realizadas as verificações de segurança para o Talude 2.

3.4 Probabilidade de Ruína

De posse dos coeficientes de segurança dos taludes (FS) e dos coeficientes de variação dos parâmetros
do solo (υR, coeficiente de variação da resistência, e υS, coeficiente de variação da solicitação), as análises de
probabilidade de ruína foram realizadas. Para tanto, assumiu-se que os coeficientes de variação da resistência
e da solicitação são os mesmos, uma vez que o maciço de solos gera a própria solicitação e,
concomitantemente, a própria resistência.
O índice de confiabilidade (β) foi obtido para cada coeficiente de varrição dos parâmetros utilizando-se
a equação (4) (CINTRA; AOKI, 2010).

1 − 1/ 𝐹
𝛽= (4)
𝜈 + (1⁄𝐹 )²𝜈

Finalmente, as probabilidades de ruína pf foram obtidas para cada índice de confiabilidade obtido
anteriormente aplicando-se a equação (5) (CINTRA; AOKI, 2010).

𝑝 = 1 − Φ(𝛽) (5)

Onde Φ é a função de distribuição normal dependente do índice de confiabilidade e pode ser obtido em
tabelas ou meios computacionais.

4 Resultados e Análises

As análises de estabilidade realizadas no GEO5 resultaram em um coeficiente de segurança de 1,58 para


o Talude 1 e 1,04 para o Talude 2.
Ao avaliar os valores do ângulo de atrito, correlacionados com o Nspt para a profundidade de 4 metros
(Caso 1), obteve-se o valor médio de 23,82°, desvio padrão de 3,08° e coeficiente de variação de 0,129. Já

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para as correlações da coesão para a mesma profundidade, obteve-se o valor médio de 42,50 kPa, desvio padrão
de 28,72 kPa e coeficiente de variação de 0,676.
Já na avaliação da variabilidade do ângulo de atrito ao longo da profundidade do talude (Caso 2), obteve-
se um valor médio de 27,24°, desvio padrão de 2,29° e coeficiente de variação de 0,084. Para a coesão um
valor médio de 82,81 kPa, desvio padrão de 26,15 kPa e coeficiente de variação de 0,316.
De posse dessas informações, as probabilidades de ruínas de cada talude foram determinadas para cada
caso considerado e os resultados são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2. Valores do índice de confiabilidade de probabilidade de ruína para o Caso 1 e Caso 2


Ângulo de atrito interno Coesão
Caso 1 Caso 2 Caso 1 Caso 2
β pf β pf β pf β pf
Talude 1 2,39725 0,00825 3,68879 0,00011 0,45896 0,32313 0,98231 0,16297
Talude 2 0,21427 0,41517 0,32971 0,37081 0,04102 0,48364 0,08780 0,46501

As probabilidades de ruína obtidas para o Talude 1 foram menores do que para o Talude 2. Esses
resultados são coerentes uma vez que o coeficiente de segurança verificado pela análise de segurança global
foi superior ao do Talude 2.
No entanto é evidente que, mesmo atendendo aos requisitos de segurança normativos, ainda há uma
probabilidade de ruína do Talude 1. Considerando a baixa variabilidade do ângulo de atrito, há uma
probabilidade de ruína de aproximadamente muito baixa para ambos os casos. Já para a coesão, como a
variabilidade é maior foram calculadas probabilidade de ruína muito maiores.
Para o Talude 2, o coeficiente de segurança muito baixo ressalta ainda mais a insegurança do maciço ao
avaliar as probabilidades de ruína elevadas para todos casos, tanto para a variabilidade do ângulo de atrito
quanto para a coesão.

5 Conclusões

De acordo com a abordagem utilizada, conclui-se que é possível se obter a probabilidade de ruína e
índice de confiabilidade no cálculo de estabilidade de taludes usando ferramentas convencionais e ensaios de
campo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRAS DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 11682 - Estabilidade de EncostasRio de


Janeiro, 2009.
BIGARELLA, J. J.; SALAMUNI, R. Caracteres texturais dos sedimentos da Bacia de Curitiba. Boletim da
Universidade Federal do Paraná. Instituto de Geologia, n. 7, p. 1–164, 1962.
CINTRA, J. C. A.; AOKI, N. Fundações por Estacas - Projeto Geotécnico, 2010.
TEIXEIRA, A. H. Projeto e execução de fundações. Seminário de Engenharia de Fundações Especiais e
Geotecnia. Anais...São Paulo: 1996
TEIXEIRA, A. H.; GODOY, N. S. Análise, projeto e execução de fundaões rasas. São Paulo: Pini, 1996.
VIANNA, A. Análise de Provas de Carga Estática em Estacas Pré-Moldadas Cravadas na Cidade de
Curitiba e Região Metropolitana. [s.l.] Universidade de São Paulo, 2000.

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