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salah.khaledjr@gmail.com
DOI: [https://doi.org/10.54415/rbccrim.v193i193.219].
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Resumo: William Stewart “Jock” Young faleceu Abstract: William Stewart “‘Jock”’ Young passed
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em 16 de novembro de 2013 em Nova York. Sua away on November 16, 2013 in New York City.
carreira acadêmica se iniciou com a conquista de His academic career began with winning a place
uma vaga na University College London para es- at University College of London to study bio-
tudar bioquímica, mas um encontro casual com chemistry, but a chance meeting with radical
o criminologista radical Steve Box o convenceu a criminologist Steve Box convinced him to switch
mudar para a sociologia. Em 1962, matriculou-se to sociology. In 1962, he enrolled at the London
na London School of Economics, onde se inspirou School of Economics, where he was inspired by
nos novos desenvolvimentos da sociologia ame- new developments in American sociology. Equal-
ricana. Igualmente significativa foi a revolução ly significant was the countercultural revolution
contracultural que ocorreu fora da universidade; that took place outside the university; and this is
e foi isso que inspirou Jock a cofundar a primeira what inspired Jock to co-found the first National
National Deviancy Conference (NDC) em 1968. Deviancy Conference (NDC) in 1968. Avowedly
Declaradamente anti-institucional e altamente anti-institutional and highly critical of orthodox
crítica da criminologia ortodoxa, a NDC instigou criminology, the NDC instigated a decade-long
uma série de conferências interdisciplinares de interdisciplinary conference series based on
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uma década com base em pesquisas emergentes. emerging research.
Palavras-chave: Desvio – Significado – Crimi- Keywords: Deviation – Meaning – Criminolo-
nologia – Criminologia crítica – Realismo de es- gy – Critical criminology – Left realism – Cultural
querda – Criminologia cultural. criminology.
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Sumário: 1. Introdução. 2. Uma entrevista com Jock Young. 3. Referências.
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1. Introdução
William Stewart “Jock” Young faleceu em 16 de novembro de 2013 em No-
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va York. Sua carreira acadêmica se iniciou com a conquista de uma vaga na Uni-
versity College London para estudar bioquímica, mas um encontro casual com
o criminologista radical Steve Box o convenceu a mudar para a sociologia. Em
1962, matriculou-se na London School of Economics, onde se inspirou nos novos
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trabalho de Jock, The New Criminology (1973, em coautoria com Paul Walton e
Ian Taylor), que infundiu a criminologia com uma agenda marcadamente crítica.
Jock era um dos vários graduados radicais da LSE que havia fugido para a Mid-
dlesex Polytechnic (agora Middlesex University), onde o departamento de ciências
sociais era um viveiro de pensamento radical e socialista. Logo depois de chegar,
ele montou um dos primeiros programas de mestrado em criminologia na Grã-
-Bretanha. Na década de 1980, dirigiu o Centro de Criminologia em Middlesex.
Durante esse período, Jock lançou as bases para uma criminologia “realista” en-
gajada. Na década de 1980, ele conduziu pesquisas sobre vítimas de crimes em
van SwaaNiNGen, René. Tradução e introdução de: Khaled Jr., Salah H.
Entrevista com Jock Young (in memoriam).
Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 193. ano 30. p. 269-278. São Paulo: Ed. RT, nov./dez. 2022.
DOI: [https://doi.org/10.54415/rbccrim.v193i193.219].
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do calmamente no bar do hotel com um copo de vinho branco seco, tivemos uma
conversa bastante séria e noturna sobre todos os camaradas do National Deviance
Conference que infelizmente faleceram no ano passado. Eu não imaginava então
que Jock seria o próximo herói a “cair”.
RvS: Você atua na criminologia há 40 anos. Geralmente, essa longevidade
é uma receita perfeita para uma atitude rotineira de “já vi tudo que tinha para
ver”. No entanto, quando leio seu trabalho recente, não sinto nada disso. Você
ainda parece muito envolvido com o que está fazendo e pela criminologia como
disciplina.
van SwaaNiNGen, René. Tradução e introdução de: Khaled Jr., Salah H.
Entrevista com Jock Young (in memoriam).
Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 193. ano 30. p. 269-278. São Paulo: Ed. RT, nov./dez. 2022.
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nos que três revoluções paradigmáticas. Com The New Criminology (TAYLOR
ET AL., 1973), a criminologia crítica foi colocada firmemente no mapa. Por vol-
ta de 1980, o Realismo de Esquerda surgiu com títulos de livros militantes como
Losing the Fight against Crime (KINSEY ET AL., 1986) e What Is to Be Done about
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Law and Order? (LEE E YOUNG, 1984). E nos últimos anos você se apresenta,
com títulos como The Vertigo of Late Modernity (YOUNG, 2007) e Criminologia
Cultural: Um Convite (FERRELL; HAYWARD; YOUNG, 2008),1 como um crimi-
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nologista cultural. Até que ponto você voltou ao ponto em que começou no iní-
cio dos anos 1970?
JY: Deixe-me começar dizendo que não percebo essas revoluções paradigmá-
ticas. Eu vejo principalmente continuidade no meu trabalho. Claro que há mu-
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danças no que você escreve, porque o tempo no qual você escreve mudou. The
Drugtakers (YOUNG, 1971) imediatamente foi um enorme sucesso. Surgiu do
meu trabalho de campo em Notting Hill, que então era o centro de tudo o que que-
ria ser moderno em Londres. O fato de que jovens que não fizeram nada errado
foram presos por tolices como usar maconha foi a faísca que incendiou a ideia de
“pânicos morais”. E, de qualquer forma, 1968 foi a época em que nós – e isso foi
Unidos nos dias da Guerra Fria de McCarthy. Durante a atual camisa de força
neoliberal, em que a contagem de publicações se tornou muito mais importante
do que realmente lê-las, o livro soou alarmantemente pertinente. Mills foi muito
crítico com os acadêmicos americanos em massa se adaptaram às exigências de
McCarthy e de seus cúmplices na academia. E: está acontecendo de novo! Meu
Deus, como são dóceis os acadêmicos de hoje, e criminologistas em particular,
para com todos esses gerentes, controladores e avaliadores! Tomemos o exemplo
de Mills quando ele, em The Sociological Imagination (1959), delineia a relação
entre a própria experiência, a imaginação para mudar as coisas e a estrutura em
que isso deve ocorrer. Na verdade, é bem revelador sobre nossos tempos que uma
van SwaaNiNGen, René. Tradução e introdução de: Khaled Jr., Salah H.
Entrevista com Jock Young (in memoriam).
Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 193. ano 30. p. 269-278. São Paulo: Ed. RT, nov./dez. 2022.
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nologia cultural. A criminologia crítica britânica mostra uma tradição mais for-
te a esse respeito. Com isso, penso principalmente na Escola de Birmingham de
Stuart Hall, Tony Jefferson e Paul Willis: sinto-me muito próximo deles agora.
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Mas, estamos falando sobre uma época muito diferente. A criminologia cultural
de hoje é muito mais anarquista em sua reação ao neoliberalismo do que uma es-
trutura explicativa neomarxista das relações sociais. Nos EUA há uma tradição
etnográfica muito mais forte. Pense na obra de Philippe Bourgois ou Ilijah Ander-
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son, que forma a base da criminologia cultural. O risco de descarrilar para uma
“criminologia zookeeping” nos EUA é muito mais real do que na Grã-Bretanha.2
2. N.T. Sobre essa questão, importante referir que em Crimes de Estilo: o grafite urbano e as
políticas da criminalidade (Emais, 2021), Jeff Ferrell situa as dinâmicas de significado
negociado, expressividade e estilo da grafitagem em estruturas maiores de injustiça,
além de explicitar o caráter indiscutivelmente político da resistência por meio do grafi-
te, ainda que aqueles que o pratiquem possam não estar diretamente conscientes dele.
Não só não há uma falta de atenção quanto ao “significado político” dessa atividade, co-
mo ela é fortemente vinculada por Ferrell a uma tradição intelectual que por definição
RvS: Até que ponto a criminologia cultural tem uma metodologia específica?
Por que você é sempre tão hostil em relação à pesquisa quantitativa?
JY: A metodologia é bastante superestimada na criminologia atual. Uma atitu-
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de acadêmica é muito mais importante do que metodologia. A maioria das pesqui-
sas criminológico-culturais é baseada em observação participante e etnografia.
Mas esses estudos qualitativos também constroem certa visão da “realidade”, su-
gerindo um “significado” e uma “coerência” que os dados não necessariamen-
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te prescrevem. Eu diria que nós, como criminologistas culturais, não devemos
imitar os positivistas a esse respeito, mas dar amplo espaço para contradições e
dúvidas. Nesse sentido, sou extremamente a favor do naturalismo e do empiris-
mo. O problema não está na metodologia, mas, sim, em todos aqueles chamados
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“fatos concretos” que deixaram de lado o debate acadêmico e a reflexão. Se Ro-
bert K. Merton apresentasse hoje seu famoso ensaio de 1938, “Estrutura social e
anomia”, para a American Sociological Review, muito provavelmente seria rejei-
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tado por falta de provas concretas. Eu aponto minhas baterias tantas vezes pa-
ra pesquisadores quantitativos porque são eles, em sua maioria, que sufocam as
inovações acadêmicas com tais argumentos; não porque há algo de errado com
seus métodos como tais. Uma boa pesquisa quantitativa pode oferecer muitos in-
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sights, mas porque tantos quants agem como robôs alegres, que já estão perfeita-
mente felizes se tiverem ordenhado conjuntos de dados de segunda ou terceira
categoria e abriram algumas portas, eu digo aos seus financiadores: vocês estão
desperdiçando seu dinheiro! Parem o fornecimento de sangue a essas pessoas!
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de muito dinheiro. Dinheiro para viver e para comprar uma caneta e um cader-
no é suficiente.
RvS: A criminologia cultural precisa ter algum significado político ou social
de acordo com você? Quando o Realismo de Esquerda surgiu você sentiu que a
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é política, o anarquismo. Para além disso, como refere Hayward “se em um primeiro
momento a versão norte-americana da CC estava preocupada predominantemente com
questões de significado, a adaptação europeia – por causa de suas raízes na criminologia
crítica e no pensamento neomarxista de forma mais geral – foi muito mais movida por
uma preocupação com o poder” (HAYWARD, Keith. Criminologia cultural: reescre-
vendo o roteiro. In: FERRELL, Jeff; HAYWARD, Keith; KHALED JR, Salah H; ROCHA,
Álvaro Oxley da. Novas aventuras em criminologia cultural. Belo Horizonte: Letramento,
2021. p. 12-13).
das” estão em lugares altos. Infelizmente, neste ponto estou muito mais pessi-
mista hoje do que era na década de 1980. Eu certamente acho que ainda existem
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muitas pessoas de boa vontade que trabalham dentro da polícia, do sistema legal
ou ministérios, mas o alcance dentro do qual eles têm que operar tornou-se, com
todo aquele fetichismo de “alvo” e “saída”, muito mais estreito. Há muito me-
nos espaço para os funcionários públicos se desviarem da linha do partido hoje.
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3. Referências
FERRELL J.; HAYWARD K.; YOUNG J. Cultural Criminology: An Invitation. Lon-
don: SAGE, 2008.
GOULDNER, A. W. The Sociologist as Partisan: Sociology and the Welfare State.
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van SwaaNiNGen, René. Tradução e introdução de: Khaled Jr., Salah H.
Entrevista com Jock Young (in memoriam).
Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 193. ano 30. p. 269-278. São Paulo: Ed. RT, nov./dez. 2022.
DOI: [https://doi.org/10.54415/rbccrim.v193i193.219].
278 Revista Brasileira de Ciências Criminais 2022 • RBCCrim 193
KINSEY, R.; LEA, J.; YOUNG, J. Losing the Fight against Crime. Oxford: Basil
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Penguin Books, 1984.
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1959.
SUMNER, C. The Sociology of Deviance: An Obituary. Buckingham: Open Univer-
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xc
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Deviance. London: Routledge, 1973.
THE GUARDIAN. Jock Young Obituary. Disponível em: [www.theguardian.com/
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YOUNG, J. The Drugtakers: The Social Meaning of Drug Use. London: Paladin,
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YOUNG, J. Working-class criminology. In: TAYLOR, I.; WALTON, P.; YOUNG, J.
(Ed.) Critical Criminology. London: Routledge and Kegan Paul, 1975.
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IB
n. 3, p. 388-414, 2003.
YOUNG, J. The Vertigo of Late Modernity. Los Angeles, CA: SAGE, 2007.
YOUNG, J. The Criminological Imagination. Cambridge: Polity Press, 2011.
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