Os escritores de obras dramáticas ou audiovisuais possuem, como
recursos narrativos básicos elementos sensoriais: visuais como cenários, figurinos e ações de personagens e auditivos, como os diálogos.
Quanto aos cronistas, contistas e romancistas, esses têm um recurso
extra muito vantajoso na hora de contar histórias. Trata-se do Monólogo Interior. Com essa ferramenta, o escritor de ficção literária também pode mostrar ao leitor os pensamentos dos seus personagens.
O roteirista é forçado a fazer o espectador inferir, supor quais são
esses pensamentos a partir dos atos e falas dos personagens. Ou, quando o pensamento é fundamental para o progresso da narrativa, ele é forçado a usar a voz over de um narrador, algo que não pode ser usado em excesso ou acaba parecendo forçado.
No caso do gênero épico, isso é, da literatura em prosa, o escritor
tem à sua disposição essa ferramenta do Monólogo Interior, um recurso que conecta o leitor diretamente ao cérebro dos personagens, revelando o que eles pensam.
É possível utilizar o Monólogo Interior de três maneiras:
- Citando exatamente os pensamentos dos personagens;
- Resumindo esses pensamentos; - Ou dando uma ideia geral desses pensamentos. As três opções são legítimas e devem ser usadas de acordo com a necessidade de cada momento da sua história.
O Monólogo Interior pode ser direto ou indireto.
No Monólogo Interior Direto, não aparece nenhuma intervenção do
escritor, nem mesmo travessão, aspas ou introduções e intercalações do tipo “pensava ele”, “dizia ela”.
Neste caso, o personagem expõe o conteúdo da sua mente tendo o
momento presente desse pensamento como tempo dominante. Isso dá ao texto um tom de confidência direta ao leitor.
Vou ler para você um trecho do romance “Perto do Coração
Selvagem” de Clarice Lispector, como exemplo do Monólogo Interior Direto:
“A cama desaparece aos poucos, as paredes do aposento se
afastam, tombam vencidas. E eu estou no mundo solta e fina como uma corça na planície. Levanto-me suave como um sopro, ergo minha cabeça de flor e sonolenta, os pés leves, atravesso campos além da terra, do mundo, do tempo, de Deus. Mergulho e depois emerjo, como de nuvens, das terras ainda não possíveis, ah ainda não possíveis. Daquelas que eu ainda não soube imaginar, mas que brotarão.”
Quanto ao Monólogo Interior Indireto, esse expõe a clara intervenção
do escritor transcrevendo o fluxo mental do personagem. Nesse caso, o escritor comenta, discute e explica em terceira pessoa tais pensamentos.
No mesmo “Perto do Coração Selvagem”, Clarice Lispector também
usa o Monólogo Interior Indireto. Vou ler para você um exemplo.
“O coração apertou-se-lhe devagar, abriu-se, ela não respirou um
momento esperando... Era de manhã, sabia que era de manhã... recuando como pela mão frágil de uma criança, ouviu abafado tin- dlen... tin-dlen... o sol chovendo em pequenas rosas amarelas e vermelhas sobre as casas. Deus, o que era aquilo senão ela mesma? Mas quando? Não, sempre...”
Perceba como essa importante ferramenta literária, o Monólogo
Interior, cria proximidade, intimidade entre o texto e a pessoa que o está lendo. Essa sensação de intimidade é algo fundamental para causar no leitor a experiência emocional poderosa que a boa literatura deve causar.
SANTOS, Luis Henrique. As Letras de Rap Do Movimento Hip Hop Como Desdobramento Do Processo de Segregação Sócio-Espacial. Antigamento Quilombos, Hoje Periferia