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W A

Orçamento

Brasília
dezembro de 1994
volume 2, número 3
Presidente da República Federativa do Brasil
ITAMAR FRANCO

Ministro de Estado Chefe da Secretaria da Administração Federal


ROMILDO CANHIM

Presidente da Fundação Escola Nacional de Administração Pública


OG ROBERTO DÓRIA

Diretores da ENAP
Maria Lisboa de Oliveira
Renato Lóes Moreira
Vera Lúcia Petrucci

Coordenadora Geral do Centro de Documentação, Informação e Difusão Graciliano Ramos


Adelaide Ramos e Côrte
I1 7 M
j I >
A P nS Í alde
ADM INISTRAÇÃO

Cadernos ENAP

Planejamento e Orçamento

Centro d« Documentação, Informação « Difusão Graclllano Ramos


Brasília-DF
1994
Equipe Técnica
Diretoria Treinamento e Desenvolvimento - DTD
CELINA ROMAGNOLLI DANTAS
JOSÉ LUIZ PAGNUSSAT
JOSÉ MENDES DE OLIVEIRA
MARIA AUXILIADORA VALE SEABRA
SÔNIA NAVES DAVI D AMORIM

Coordenação Editorial
OSWALDO HENRIQUE PINTO DE FARIAS

Revisão
KELSEN DA CUNHA RAMOS
LUIZA HELENA MORAIS DA SILVEIRA MAGALHÃES
RENATO FERRAZ

Editoração Eletrônica
MILTON FURLAN

Capa
JOSÉ ANTONIO DE ARAÚJO

Fundação Escola Nacional de Administração Pública


SAIS - Área 2-A - Brasília/DF
CEP 70610-900
Fone: (061)245 7878
Fax: (061)245 5498

© ENAP, 1994

Tiragem: 1.000 exemplares


Distribuição: ENAP / Centro de Documentação, Informação e Difusão Graciliano Ramos
Fone: (061)245 6093

Planejamento e Orçamento. - Brasília : ENAP, 1994.

712p 74 p. (Cadernos ENAP; v. 2 n. 3)

Conteúdo: O processo orçamentário na constituição federal de 1988 / Fábio Chaves


Holanda -- Planejamento e administração estratégicos: uma abordagem sobre a
Administração Pública Federal / Johaness Eck -- A experiência do orçamento público federal
após a constituição de 1988 / Edson M. Tubaki - - São as propostas de reestruturação do
sistema de planejamento federal e de criação da Secretaria Federal de Controle compatíveis
com o novo paradigma do Estado? / Luís Carlos de Cerqueira Sá -- A Coordenação como
instrumento de modernização e de aperfeiçoamento do serviço público / Ciro Guarani
Pennafort - - Planejamento: objetivos, equívocos, dimensões / José Raimundo Pereira
Gomes.

I. ECK, Johaness II, GOMES, José Raimundo Pereira III. HOLANDA, Fábio Chaves
IV. PENNAFORT, Ciro Guarani V. SÁ, Luis Carlos de Cerqueira VI. TUBAKI, Edson M

CDD: 354.80072
CDU: 354.23

Cadernos ENAP é uma publicação da Fundação Escola Nacional de Administração Pública, que
coloca à disposição de estudiosos das questões ligadas a administração pública documentos produzidos
pela Escola.
Sumário

Apresentação .................................................................................................................. 5

O Processo Orçamentário na Constituição Federal de 1988, Fábio Chaves Holanda ........ 7

Planejamento e Administração Estratégicos: uma abordagem


sobre a Administração Pública Federal, Johaness E ck .................................................................. 17

A experiência do Orçamento Público Federal após a


Constituição de 1988, Edson M . T u ba ki............................................................................................... 33

São as propostas de reestruturação do Sistema de Planejamento


Federal e de criação da Secretaria Federal de Controle
compatíveis COm O nOVO paradigma do Estado?, Luis Carlos de Cerqueira Sa ....................... 41

A Coordenação como Instrumento de Modernização e de


Aperfeiçoamento do Serviço Público, C iro Guarani P ennafort...................................................... 55

Planejamento: objetivos, equívocos, dimensões, José Raim undo Pereira Gomes ................... 65
Apresentação

A. .instabilidade econômica e a arraigada cultura


centralizadora vigentes no serviço público fazem com
Já Luís Carlos Cerqueira aponta o surgi­
mento de um novo paradigma de Estado: o catalisa­
que os processos de planos e orçamentos não dor, promotor e empreendedor, que se guia pela
tenham o conceito que caracterizou o Estado- delimitação de objetivos e pela consecução de
cidadão. E não sendo, apenas, processos técnicos, resultados.
mas também políticos, devem refletir os interesses da
sociedade. Ciro Pennafort, em seu trabalho, diz que a
modernização do Estado, para capacitá-lo às funções
A partir do ponto de vista de que a que o país passou a requerer, é fundamental para sua
solução dos problemas sócio-econômicos do país própria existência.
podem ser minimizados com uma melhor alocação de
recursos públicos, em função dos objetivos governa­ Fechando o Caderno, José Raimundo
mentais a ENAP dedica um número da série de seus Pereira Gomes enfatiza que o Estado brasileiro
Cadernos às discussões sobre os diferentes aspectos somente poderá equilibrar-se se algumas dimensões
que envolvem as atividades de Planejamento e do planejamento puderem ser atingidas e tornarem-se
Orçamento. instrumentos de governabilidade.

Fábio Chaves Holanda ressalta, em seu


artigo, que a ação planejadora do Estado para a R o b e r t o ^ ò ó r ia .
manutenção de suas atividades e para a implemen­ Presidente da ENAP
tação de seus projetos se materializa, necessariamen­
te, por meio da lei orçamentária da União. Mas o
derespeito às regras constitucionais que regem a
matéria tornam o processo cético perante à
sociedade.

Johaness Eck, por sua vez, frisa que os


dirigentes da administração pública necessitam
promover reformas urgentes para desenvolver uma
capacidade de governo ajustada as demandas sociais.
Uma das vertentes necessárias, ressalta, é privilegiar a
gestão e o controle externo ao controle interno.

A o analisar a recente trajetória do orça­


mento público brasileiro, a partir da Constituição de
1 9 8 8 , Edson Tubaki conclui que um processo orça­
mentário racional e equilibrado passa, sobretudo,
pela participação efetiva da sociedade civil, como
conseqüência do exercício pleno da cidadania.
O PROCESSO
ORÇAMENTÁRIO NA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DE 1988
FABIO CHAVES HOLANDA

Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e


Assessor Econômico da Liderança do Partido dos Trabalhadores na Câmara Federal

a) a instabilidade econômica, que afeta


RESUMO
negativamente a receita tributária e
desacredita o planejamento dos
investimentos;
artigo mostra que o desmantelamento e a

O
brasileiro. A
falência do planejamento no setor público
são os Fatores responsáveis pelo ceticismo da
sociedade em relação á utilidade do processo orçamentário
Constituição promulgada em 1 9 8 8 trouxe
b) o desconhecimento das novas regras
constitucionais;

c) a não aprovação da lei complementar


avanços para o controle e transparência dos gastos públi­ das finanças públicas, prevista no § 9°
cos. M as, mesmo nao sendo prolixas ou detalhistas, as do A rt. 1 6 5 da Constituição Federal;
regras constitucionais vêm sendo derespeitadas
constantemente. d) a interpretação enviesada de alguns
dispositivos constitucionais;

e) a cultura centralizadora e fisiológica dos


1. INTRODUÇÃO diferentes poderes da república.

Tentaremos mostrar, sem desmerecer os


No Artigo "As vicissitudes do orçamen­ itens acima, que o fator primordial, responsável por
to", publicado na Revista de Economia Política, vol. todas essas frustrações orçamentárias, se chama
1 3, n° 4, out./dez. de 1 9 9 3 , o professor, José desmantelamento e falência do planejamento no setor
Serra, reconhece que a Constituição Federal de público.
1 9 8 8 promoveu importantes avanços na matéria de
orçamentos públicos, principalmente no que se refere
ao controle e transparência dos gastos públicos. No 2. O CAPITULO
entanto, a prática do processo orçamentário no Brasil ORÇAMENTÁRIO NA
não reflete em nada estes avanços constitucionais. CONSTITUIÇÃO

O professor José Serra sugere que os


reais fatores responsáveis por estas frustrações são: Mostraremos, a seguir, que toda a seção
da Constituição Federal que trata do processo orça­
mentário está montada na lógica da existência do
planejamento de curto e médio prazo na adminis­
tração federal.
O A rt. 165 da Constituição Federal alocação dos grandes gastos públicos. No entanto,
dispõe que leis de iniciativa do poder Executivo para se obter a regionalização das metas, objetivos e
estabelecerão: diretrizes, realisticamente seria necessário um mínimo
de planejamento.
a) o plano plurianual;

b) as diretrizes orçamentárias,- LEI DE DIRETRIZES


ORÇAMENTÁRIAS
c) os orçamentos anuais.
O texto constitucional dispõe que a Lei
de Diretrizes Orçamentárias - LD O - deveria definir
PLANO PLURIANUAL as metas e prioridades da administração pública fede­
ral, incluindo as despesas de capital para o exercício
O financeiro subseqüente,- deveria orientar a elaboração
plano plurianual - PPA deveria estabe­
lecer, de forma regionalizada, as diretrizes, os objeti­ da lei orçamentária,- deveria dispor sobre as modifi­
vos e as metas da administração pública federal para cações na legislação tributária,- estabelecer a política
as despesas de capital e seus custeios e para as rela­ de aplicação das agências financeiras oficiais de
tivas aos programas de duração continuada. fomento e, finalmente, qualquer concessão de vanta­
gens, aumento de remuneração, criação de cargos,
Sem dúvida nenhuma, os objetivos da alteração de carreiras ou admissão de pessoal a qual­
Constituição Federal de 1988 referentes ao PPA quer título pelos órgãos da administração direta e
são bem superiores àqueles previstos na Constituição indireta deveria ter autorização específica na LDO.
anterior referentes ao orçamento plurianual de investi­
mento. Esta estabelecia apenas as dotações financei­ Este instrumental, inovador no processo
ras (excluindo a definição de metas), além de o orçamentário, tem como objetivo maior fazer uma
PPA ser reelaborado anualmente e vigir somente por ponte entre o PPA (médio prazo) e a lei orça­
três anos. Entretanto, a nova redação do texto mentária (curto prazo), antecipando o debate dos
constitucional é extremamente confusa. A que nível grandes temas nacionais já previstos no PPA e que
de detalhe deveria ser apresentado as diretrizes, os seriam implementados no orçamento do ano
objetivos e as metas? A palavra programa se refere à subseqüente.
classificação funcional-programática ou a programas
de governo? Qual o tempo necessário para se esta­ Por considerar esta lei de fundamental
belecer que um programa tem duração continuada? importância, o constituinte, além de obrigar o poder
Todas essas perguntas estão sem respostas, tantas Executivo a enviar o projeto de lei ao Congresso no
dúvidas fez com que os projetos de leis dos PPAs prazo mínimo de oito meses e meio antes do término
votado pelo Congresso Nacional fossem uns amon­ do exercício financeiro (Item II, Parágrafo 2 o do
toados de números sem metas físicas, sem objetivos, Art. 35 do A to das Disposições Constitucionais
sem diretrizes e sem regionalização e que paradoxal­ Transitórias - ADCT), ainda proibiu a interrupção da
mente, mesmo desrespeitando o texto constitucional, sessão legislativa sem a aprovação do projeto de lei
possuem a única e exclusiva utilidade do cumprimen­ de diretrizes orçamentária (Paragráfo 2o, A rt. 5 7 ).
to da formalidade constitucional, visto que não
contribui em nada para a maior eficiência e trans­ Os projetos de lei de diretrizes orça­
parência do gasto público. mentárias enviadas pelo poder Executivo ao
Congresso Nacional se constituem em capítulos que
A certeza que temos é que o constituinte se repetem anualmente, pouco acrescentando aos
imaginava o PPA como um instrumento de médio parlamentares novas informações ou subsídios para
prazo, onde estaria discriminado a pretensão do que estes possam discutir e definir melhor a alocação
Congresso Nacional e do poder Executivo da das grandes despesas nacionais no orçamento da
União. Examinaremos, mais detalhadamente, a forma a Constituição, além do estabelecimento de inúmeras
como vem sendo apresentada a LDO, em seguida. prioridades, significando, na prática, a ausência
destas. A título de ilustração, para o próximo ano o
poder Executivo propõe como prioritário os seguin­
Disposições Preliminares tes itens: combate à pobreza, ao desemprego e à
fome; melhoria do atendimento básico nas áreas de
Em geral, este item estabelece a forma educação, saúde, saneamento, habitação e
como será apresentada a LDO e se resume na repe­ previdência; valorização do trabalhador,- proteção à
tição do texto constitucional acrescido de uns criança e ao adolescente,- melhoria da competitivida­
poucos capítulos. Como exemplo, podemos citar o de e incentivo à ciência e tecnologia,- incremento da
projeto de LDO para o ano de 1 99 5 , ora em produção e produtividade agropecuária e reforma
análise no Congresso Nacional. Este projeto de lei agrária,- recuperação e modernização da infra-
dispõe que a LDO compreenderá os seguintes estrutura,- reforma e modernização do Estado e rees­
capítulos: truturação do serviço público,- preservação, recupe­
ração e conservação do meio-ambiente, urbano e
I• as prioridades e metas da adminis­ rural. Vale dizer, não existe nenhuma hierarquia entre
tração pública federal; todos estes itens.

II - a organização e estrutura dos Este capítulo deveria ser o mais importante


orçamentos; da LDO, contendo informações de extrema
relevância para a tomada de decisão na órbita do
III - as diretrizes gerais para a elabo­ poder Executivo. Sem a definição destas metas e
ração dos orçamentos da União e prioridades, o gestor público pouco pode implemen­
suas alterações,- tar com o mínimo de eficiência e eficácia. Isto nos
leva a indagar: por que estas informações não estão
IV - as disposições relativas à dívida disponíveis, seria que o poder Executivo as esconde
pública federal; do Poder Legislativo? Não, elas simplesmente ine-
xistem, fruto da total falência do planejamento
V - as disposições relativas às despesas público.
da União com pessoal e encargos,-

VI - a política de aplicação dos recursos II - a organização e estrutura dos


das agências financeiras oficiais de orçamentos
fomento,•
Capítulo que define a forma como deverá
VII - as disposições sobre alterações na ser apresentado o projeto de lei orçamentária e quais
legislação tributária da União para o informações este deverá conter. Em geral, ele dispõe
exercício correspondente,- que o orçamento seja contituído pelo texto da lei,
pelo orçamento fiscal e da seguridade, pelo orça­
VIII - as disposições finais. mento dos investimentos das estatais, pela legislação
da receita e da despesa e por vários demonstrativos,
tais como: evolução da receita e da despesa por
I • as prioridades e metas da categoria econômica e por fontes, estoque e
administração pública federal evolução da dívida pública federal, despesas por
poder e por órgãos, despesas por programas e
Excetuando a LDO para o ano de 1 9 9 3 , subprogramas etc. Estes demonstrativos são primor­
o que vem ocorrendo é a não discriminação das diais para a real compreenção da lei orçamentária
metas físicas e financeiras, descumprindo frontalmente como um todo.
Todos o anos, são apresentadas emendas (juros e amortização, incluindo rolagem) e depen­
parlamentares, com o o objetivo de ter acesso a dendo da política monetária adotada a variável taxa
novos demonstrativos, de forma que os congressistas de juros pode desestabilizar qualquer programa de
possam decidir as metas e prioridades da adminis­ governo. Em nenhuma LDO se tentou definir níveis
tração pública com o maior número de informação e de taxas de juros desejáveis para os títulos do
com a maior transparência possível. Tesouro Nacional. Simplesmente o Tesouro Nacio­
nal se tornou refem da política monetária do Banco
Central. O Banco Central administra a política
III - as diretrizes gerais para a monetária utilizando-se dos títulos do Tesouro
elaboração dos orçamentos da União e Nacional, repassando todo o custo desta política,
suas alterações muitas vezes equivocada, para a sociedade.

Além de definir o multiplicador orça­


mentário (índice que deverá corrigir os valores V - as disposições relativas às despesas
expressos no projeto de lei),- este capítulo dispõe da União com pessoal e encargos,-
sobre várias restrições, como proibição da aquisição
de veículos de representação, proibição de cons­ Este capítulo vem se repetindo há anos
trução, aquisição e locação de imóveis residenciais sem a menor utilidade, em nada contribui para o
etc,- disciplina à destinação de auxílios e subvenções esclarecimento da política de pessoal da União.
sociais à entidades públicas e privadas,- impõe Tenta apenas parecer restritivo, limitando o gasto
restrições aos estados e municípios para que estes com pessoal aos níveis do ano anterior, e ressalvan­
possam receber transferências de recursos do orça­ do desta limitação alguns itens.
mento da União,- define a atuação das operações
oficiais de crédito,- e enfim, todo o tipo de delimi­ É mais um capítulo que, apesar da sua
tação e orientação que a lei orçamentária deveria importância, nada tem a acrescentar devido a total
cumprir está posto neste capítulo. falência do planejamento das áreas de recursos huma­
nos dos órgãos federais.

IV - as disposições relativas à dívida V I - a política de aplicação das agências


pública federal financeiras oficiais de fomento

Aqui se define as características e aonde Pouco se regulamenta sobre as agências


poderão ser utilizados os recursos provenientes da oficiais de fomento. Essas agências são os bancos de
emissão de títulos públicos. Geralmente se propõe, desenvolvimento - B N A , BASA, CEF - que, por
em nome do controle da dívida e do combate ao terem recursos constitucionalmente vinculados, deve­
déficit público, que as receitas oriundas da colocação riam ser mais fiscalizados e ter direcionados os seus
de títulos públicos no mercado só possam ser utiliza­ recursos para programas de desenvolvimento e de
dos para rolar a dívida já existente, desapropriar combate as desigualdades regionais.
imóveis objetivando a reforma agrária e para o paga­
mento da equalização de taxas de juros no âmbito
do Programa de Financiamento das Exportações - V II - as disposições sobre alterações na
PROEX. É um capítulo extremamente importante e legislação tributária da União para o
pouco explorado. exercício correspondente

O conhecimento dos grandes números do O constituinte, ao propor esta atribuição


orçamento mostra claramente que cerca de setenta è LDO, objetivava, exclusivamente, informar com
por cento (7 0 % ) de todas as receitas orçamentárias antecedência mínima à sociedade futuras
são destinadas ao pagamento do serviço da dívida
modificações tributárias. É uma boa forma de se O processo de elaboração da lei orça­
tentar cumprir o princípio da anualidade. mentária é uma colcha de retalhos. Os órgãos seto­
riais encaminham para a Secretaria de Planejamento,
Na prática, este capítulo se resume a obri­ Orçamento e Coordenação da Presidência da
gar o poder Executivo a enviar ao Congresso Nacio­ República suas propostas. Normalmente, estas
nal projeto de lei de crédito adicional quando ocor­ propostas são repetições do passado, que nada tem
rer excesso de arrecadação e a condicionar a apro­ a ver com um planejamento prévio. Enquanto alguns
vação de projetos de lei que concedam anistia, setores estão em colapso total, outros não sabem o
isenção ou benefícios fiscais a indicação da estimativa que fazer com tantos recursos e assim os orçamentos
da renúncia de receitas e a anulação de despesas no anuais vão se perpetuando em função da própria
mesmo montante. inércia da administração pública. N o meio de tanto
desperdício orçamentário, o órgão responsável pelo
Várias vezes o poder Executivo desrespei­ planejamento governamental no país se satisfaz em
tou a vontade do constituinte, ao enviar propostas apenas compatibilizar os números providenciando
de aumento de tributos no final do ano, sem a devi­ cortes lineares de tal forma que a fixação das despe­
da indicação específica destas alterções na LDO do sas não ultrapasse a previsão da receita.
referido ano .
Quando a peça orçamentária chega ao
Congresso Nacional o teatro continua. Os parlamen­
VIII - as disposições finais tares federais se transformam em vereadores munici­
pais e chegam ao cúmulo de apresentar cerca de
Nas disposições finais se limita o prazo de setenta e cinco mil (7 5 .0 0 0 ) emendas ao projeto
encaminhamento por parte do poder Executivo de de lei orçamentária. Naturalmente, a quase totalida­
projetos de créditos adicionais, disciplina-se regras de das emendas são pedidos específicos de obras
de execução orçamentárias, caso o Congresso não nas suas base eleitorais, sem nehuma preocupação
vote a lei orçamentária antes do inicio do exercício, com o planejamento e a compatilização destas com o
define-se o prazo de publicação do Quadro de todo.
Detalhamento de Despesa - Q D D etc.
Dois fatores técnicos contribui prioritaria­
Todas essas informações e disposições que mente para o total descrédito da lei orçamentária.
deveriam fazer parte da LDO, como forma do Primeiro, o seu caráter autorizativo, vale dizer, o
cumprimento do texto constitucional, são, na verda­ Congresso Nacional discute e vota uma lei, porém o
de, instrumentos indispensáveis para a boa gestão do poder Executivo a executa de acordo com suas
gasto público e o poder Executivo não as dispõe. conveniências. Segundo, a não correção dos valores
fixados nas despesas que, nos níveis inflacionários em
que se encontra a economia (cerca de 4 5 % ao
LEI ORÇAMENTÁRIA mês), logo após a promulgação da lei esta já se
A N U A L - LOA encontra totalmente desatualizada monetariamente.
Depois de um ano de inflação sem correção, não
A Lei Orçamentária Anual, mais conheci­ passa de brincadeira de mal gosto.
da como o orçamento da União, apesar de ser a
mais comentada e a que mais interessa aos parlamen­ O caráter autorizativo não está determina­
tares, não deveria ter essa importância toda. Caso do em nenhuma legislação, apareceu do nada, da
fosse cumprido os dispositivos constitucionais com cabeça de tecnocratas que, ao perder o controle do
suas respectivas hierarquias, o orçamento da União planejamento e, conseqüentemente, da máquina
seria apenas uma conseqüência dos dispositivos - pública, tiveram a brilhante idéia da utilização de leis
PPA e LD O - já votados. que não determinam, apenas autorizam. Juntando o
caráter autorizativo com a teoria monetarista do
controle do déficit público, surgiu, na mão do minis­ Creche 12.710 1.655 13,02

tro da Fazenda, o tão poderoso instrumento de Custódia e 60 .796 24.845 40,87


Reintegração Social
contingenciamento. Inúmeros órgãos tornaram-se
Defesa do Int. Públ. no 97.044 9 2 .506 9 5 ,32
incapazes de realizar suas Funções básicas, porque o Processo Judiciário

ministro da Fazenda, juntamente com o secretário do Dívida Externa 4.223.155 2.4 6 8 .4 1 6 58,45

Tesouro Nacional tem o poder de decidir quais e Dívida Interna 43.642 .682 25 .1 9 0 .1 9 2 57,72

quando deverão ser realizadas todas as despesas Edificações Públicas 576.884 146.272 25,36

orçamentárias votadas e aprovadas pelo Congresso Ensino de Graduação 2.3 91.8 02 1.5 34.4 52 64,15

Nacional. Ensino de Pós-Graduação 442.903 194.205 43,85

Ensino Regular 1.0 42.6 80 548.83 9 52,64

Erradicação do 9 2 .820 12.111 13,05


A utilização freqüente deste instrumento
Analfabetismo
proporcionou uma situação inusitada: os parlamenta­
Estoques Reguladores 392.791 48.181 12,27
res aprovam qualquer tipo de emenda, inclusive com
Execução da Política de 3.127.606 1.245.331 39,82
o apoio de parlamentares governistas, e o poder Preços Agrícolas

Executivo não tem a menor preocupação em barrar Ferrovias 962 0 0

este tipo de iniciativa, pois tem a certeza que essas Habitações Urbanas 457.478 83.465 18,24

emendas não serão executadas. É um jogo viciante Informática 6 7 7.19 9 497.247 73,43

que já está gerando conseqüências nefastas ao plane­ Livro Diditico 64.904 109.175 168,21

Operações Aéreas 1.571.185 207.985 13,24


jamento e a execução orçamentária da União.
Operações Navais 6 0 1.46 0 817.22 6 135,87

Operações Terrestres 77 .520 279.671 360,77


A seguir, mostraremos uma tabela onde se
Ordenamento 1.225.019 893.41 9 72,93
compara a previsão e a execução de alguns subpro- Econômico-Financeiro
gramas orçamentários, e vê-se claramente o caráter Participação Societária 1.690.576 97 8.12 2 57,86
autorizativo da lei. Pesquisa Aplicada 540.002 151.050 27,97

Planejamento e 67.615 25.501 37,71


Orçamentação
P R E V IS Ã O E A EX E C U Ç Ã O DE A L G U N S
Previdência Social a Inati­ 7.7 94.7 37 5.4 86.8 65 70,39
S U B P R O G R A M A S O R Ç A M E N T Á R IO S
vos e Pensionistas

Produtos Profiláticos e 1.020.718 297.88 6 29,18


Valorei em US$1.000
Terapeuticos
Projeto de Lei Execução
Proteção è Flora e 1 77.158 14.951 19,38
A N O DE A N O DE % Fauna
Nome do Subprograma
1991 1991
Reforma Agrária 884.423 249.865 28,25
(A ) (B) (B /A )
Restauração de Rodovias 69 2.00 2 201.847 29,17
Abastecimento D'água 242.46 6 26.154 10,79
Saneamento Geral 554.668 101.662 18,33
Ação Judiciária 1.280.605 '1 .0 5 6 .8 5 7 82,53
Supervisão e Coorde­ 21.968 5.832 26,55
Ação Legislativa 551.865 394.871 71,55 nação Superior
Administração de Receitas 813.51 8 220.923 27,16 Transferências Fin. a Est. e 15.206.586 9 .8 63.2 14 64 ,86
Administração Geral 8.4 02.4 18 4 .3 79.6 79 52,12 Municípios

Alimentação e Nutrição 1.197.475 443.337 Vigilância Sanitária 49.691 9.308 18,73


37,02
Toui 184.916.151 67 .406 .588 53,96
Assistência i Velhice 49.795 19.375 38,91

Assistência ao Menor 6 5 8.21 7 244.491 37,14 Fonte: Lei Orçamentária de 1991 e trabalho do PRODASEN.

Assistência Financeira 9 .1 98.8 88 2.955.114 32,12 Obs: a existénáa de valores executados maiores do que os valores autorizados
deve-se a créditos adicionais/ que não estão computados.
Assistência Médica e 11.443 .982 5.2 11.1 49 45,54
Sanitária

Conservação de Rodovias 9 2 .318 60.074 65,07 Em média se executou somente cerca de


Cortstrução e 266.14 5 120.374 45,23 5 4 % das despesas autorizadas e com uma variância
Pavimentação de Rodovias
enorme. Enquanto o subprograma Operações Terres­
Controle das Doenças 9 4 1 .5 0 6 289.10 0 30,71
tres executou todos os recursos previstos e ainda
Transmissíveis

Controle Externo 88 .278 75.132 85,11


teve créditos suplementares, o subprograma Ferrovias
Controle Interno 4.2 50 1.357 31,93
teve sua execução zerada.
Um fato importante aconteceu no ano de 6 - Supressão do orçamento de investi­
1 9 9 3 , o qual exemplifica com muita precisão o mento das estatais.
desvirtuamento de todo o processo constitucional
orçamentário pelos tecnocratas aversos ao planeja­ 7 - Transformação do orçamento da
mento governamental. A lei orçamentária foi votada seguridade social em orçamento da
e aprovada desrespeitando claramente a regionali­ previdência social.
zação dos investimentos prevista na LDO. A o ser
argüida a inconstitucionalidade do orçamento, o 8 - Eliminação do critério populacional
Ministério da Fazenda produziu um parecer defen­ para o combate às desigualdades
dendo a idéia de que não existe hierarquia definida regionais.
entre a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei
Orçamentária Anual, visto que juridicamente as duas 9 - Introdução de mecanismos de parti­
são leis ordinárias. Portanto, como o orçamento cipação da sociedade na elaboração
sempre é votado após a LDO, este pode dos planos e orçamentos.
desrespeitá-la. Se assim fosse, para que serve todo o
capítulo orçamentário na Constituição Federal? 10 - Estabelecimentos de prazos para a
elaboração e aprovação da lei
orçamentária.
3. O PROCESSO
ORÇAMENTÁRIO NA 11 - Hierarquização do PPA, LDO e
REVISÃO L O A , por intermédio da aprovação
CONSTITUCIONAL por maioria absoluta do PPA e da
LDO.

Por conta da Comissão Parlamentar Mista


1 2 - Proibição de apresentação de emen­
de Inquérito do Orçamento, foram apresentadas
das retirando recursos de benefícios
mais de mil emendas aos artigos constitucionais que
previdenciários.
tratam da matéria orçamentária. A seguir as principais
intenções dos parlamentares:
13 - Realização de audiências públicas
para apreciação das propostas
1- Extinção da comissão mista de
orçamentárias.
orçamento.

14 - Umitação de número de emendas


2 - Supressão da lei complementar que
por parlamentar.
disporá sobre finanças públicas, dívi­
da pública, emissão e resgate de
15 - Previsão de indexação do
títulos públicos, concessão de garan­
orçamento.
tias pelas entidades públicas.

16 - Atribuição à Comissão Mista de


3 - Ampliação do conteúdo da Lei de
Orçamento para elaboração e divul­
Diretrizes Orçamentárias, de forma
gação do relatório de execução
que esta estime a receita e fixe a
orçamentária.
despesa de forma agregada.

17 - Estabelecimentos de pisos para as


4 - Submissão da aprovação do PPA
despesas de capital no PPA.
ao referendum popular.

5 - Supressão da LDO da
Constituição.
18 - Condicionamento do inicio de constante às regras constitucionais e legais é o princi­
programas e projetos à existência de pal fator que tem criado um certo ceticismo na socie­
disponibilidades de recursos. dade com relação a utilidade do processo orça­
mentário. Atitudes e opiniões dos representantes do
1 9 - Proibição de paralização de obras governo só agravam este quadro.

que já tenham sido executadas em


Enfim, a ação planejadora do Estado com
mais de 30% .
relação a manutenção de suas atividades e a imple­
mentação dos seus projetos se materializa por meio
2 0 - Proibição da utilização de medidas
da lei orçamentária da União. Este, sem dúvida
provisórias em matéria orçamentária.
nenhuma, é o principal instrumento que dispõe o
governo para expressar à sociedade o seu programa
21 - Atribuição à LDO da competência de ação, os seus planos e objetivos, tanto com
para fixar percentuais mínimos de relação à origem dos recursos, como na alocação da
arrecadação de impostos que devam despesa. Todavia, nunca é demais lembrar que o
ser aplicados no setor saúde. PPA, a LDO e a L O A são apenas instrumentos
legais e que, sem um planejamento mínimo, de nada
22 - Determinação de que, enquanto não adiantarão.
forem aprovados os planos nacionais
de desenvolvimento, deva prevale­ Como já dizia o ditado chinês: "nenhum
cer a regionalização da lei orça­ vento lhes será favorável, se tu não sabes seu porto
mentária e do PPA. de destino". Sem a reestruturação do planejamento
no país, não chegaremos a lugar nenhum.

23 - Proibição de modificação do proje­


to de lei orçamentário pelo poder
Executico, após o seu envio ao
Congresso Nacional.

24 - Transferência para o poder Legislati­


vo da competência para elaborar o
orçamento, caso este não seja apre­
sentado no prazo constitucional (31
de agosto).

Muitas dessas emendas tentam corrigir


problemas surgidos, frutos muito mais do descumpri-
mento da norma constitucional do que da falha teóri­
ca do legislador.

4. CONCLUSÃO

A Constituição Federal, no capítulo rela­


cionado à matéria orçamentária, não é prolixa, nem
detalhista. O único dispositivo legal que ainda falta
regulamentar é o § 9 o do Artigo 165. Esta lei
complementar disporá sobre o exercício financeiro, a
vigência, os prazos, a elaboração e a organização do
PPA e da LDO. No entanto, o desrespeito
5. BIBLIOGRAFIA

SERRA, José. A Constituição e o Gasto Público.

SERRA, José. As Vicissitudes do Orçamento.


Revista de Economia Política, Vol. 13, n°1 4,
out./dez./93.

RABELO, Hamilton. Princípios Orçamentários:


acolhimento constitucional e operacionalidade.

TAVARES, José Fernando Cosentino. Matéria


Orçamentária na Revisão Constitucional.
PLANEJAMENTO E
ADMINISTRAÇÃO
ESTRATÉGICOS
Uma abordagem sobre a
Administração Pública Federal
JOHANESS ECK

Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e


Gerente de Programa do M inistério do M e io Am biente e da Amazônia Legal

Teorias sobre a gestão moderna de organi­


RESUMO
zações vêm sendo explicitadas na literatura adminis­
trativa com base em experiências bem sucedidas de
organizações privadas. Algumas vezes, elas têm sido
ste estudo pretente explorar as características objeto de tentativas de aplicação ao setor público,

E marcantes que têm im pedido a implantação de um


processo de administração estratégica nos órgãos
da administração pública direta federal, mediante compa­
quase sempre com resultados poucos significativos.
Essas tentativas normalmente acabam por sucumbir a
barreiras construídas historicamente, que têm resistido
à ação daqueles que se investem da vontade de
rações com a iniciativa privada e discutir estratégias alternati­
vas que resultem na reForma do quadro decadente em vigor. superá-las.

O conceito de administração estratégica


implica na combinação de três processos: o planeja­
1. INTRODUÇÃO mento estratégico, o planejamento do potencial de
gestão e a administração do processo geral de
mudança estratégica.
Após décadas em que o Estado brasileiro
foi capaz de alavancar um processo de crescimento A razão do presente estudo dedicar parte
econômico no país, particularmente a partir dos anos significativa na abordagem da viabilidade da
30, os últimos anos têm evidenciado uma incapaci­ existência de processos de planejamento estratégico,
dade em retomá-lo, ao mesmo tempo em que é é por ele se constituir em passo necessário à implan­
possível detectar uma deterioração crescente de sua tação da administração estratégica nas organizações
capacidade de conduzir as políticas públicas para a públicas.
diminuição das desigualdades internas e promoção
de melhores condições de vida à população como
um todo. 2. CONSIDERAÇÕES
SOBRE
Enquanto se assiste a ocorrência de um ADMINISTRAÇÃO
movimento de modernização atingindo parcelas cada ESTRATÉGICA
vez maiores de empresas privadas, à excessão de
raras experiências na administração indireta, as organi­
zações públicas não são identificadas como exemplo A administração estratégica não se
de ajustamento è realidade social do país, neste final compõe unicamente pelo processo de planejamento
de século. estratégico, conforme aponta Ansoff. O planejamen­
to estratégico " é apenas um dos três processos que
devem ser combinados, para assegurar uma adap­ decorrer do documento, referem-se ao conceito
tação estratégica efetiva. Os outros dois processos expresso naquele Decreto-Lei.
são: o planejamento do potencial de gestão e a
administração do processo geral de mudança Embora a realidade dos governos no Brasil
estratégica."(1) seja repleta de exemplos de desprezo a processos
de planejamento estratégico, sua importância vem-se
O mesmo autor acrescenta: "a adminis­ consolidando no âmbito da organizações privadas.
tração estratégica é, sobretudo, administração da
mudança e o planejamento estratégico deve ser Por outro lado, mesmo tenuamente, vem
considerado como um elemento, e não necessaria­ sendo recuperada a consciência da importância de se
mente o mais importante da transformação incorporar à prática da administração pública proces­
cultural. "(1 ) sos de planejamento estratégico. Embora argumentos
existam, como os disseminados por Carlos Matus:
Embora os conceitos de administração Necessidade de "mediação entre o futuro e o
estratégica e de planejamento estratégico possam-se presente...,- mediação entre o passado e o futuro...,
aproximar em alguns pontos, o quadro a seguir esta­ mediação entre conhecimento e ação...; prever
belece as principais diferenciações entre um e outro quando a predição é impossível...; capacidade de
conceito: reação planejada ante às surpresas...; coerência
global frente às ações parciais dos atores sociais..."
Planejamento Administração (2 ), uma série de fatores vem colaborando para que
Estratégico Estratégica não se efetivem.
Processo analítico e Processo de ação orga­
estabelece uma relação nizacional e acresce A análise das características próprias das
ao ambiente capacitação estratégica organizações, em suas respectivas esferas, pode vir a
Preocupa-se com a Preocupa-se com indicar caminhos que tornem crível a possibilidade de
tomada de decisões produção de resultados se reformar a administração pública direta, por meio
estratégicas estratégicos da implantação da administração estratégica.
Lida com fatos, idéias, Adiciona aspirações
probalidades, concen­ das pessoas e lida com A bibliografia sobre planejamento
trando-se em variáveis mudanças rápidas do
estratégico em empresas privadas vem sendo desen­
empresariais, econômi­ ambiente e da empresa
cas e tecnológicas volvida há décadas, mas pouco dela tem-se transfor­
mado era ações aplicáveis à realidade dos órgãos
Termina com um plano Termina com um novo
estratégico comportamento públicos, notadamente os da administração direta.

Caracteriza-se como Incorpora ao sistema


sistema de planeja­ de planejamento o O planejamento estratégico pode se defi­
mento sistema de ações nido como um "processo contínuo e sistemático de
olhar para fora e para a frente da organização traçan­
do rumos para o futuro, e enfrentando riscos e
incertezas"(3), demandando, pois, das organizações,
3. O PLANEJAMENTO
capacidades quanto a delinear o futuro, adaptar-se
ESTRATÉGICO E
às condições do ambiente, flexibilidade estrutural,
ORGANIZAÇÕES
habilidade para o convívio com ambigüidades e
PÚBLICAS
mudanças rápidas.

Comparada à empresa privada, a organi­


Este texto pretende referenciar-se na reali­
zação pública apresenta diferenças substantivas,
dade da administração pública direta, conceituada
conforme aponta Motta:
conforme o Decreto-Lei 2 0 0 , de 1 96 7 , como os
serviços integrados na estrutura administrativa da
"1 . A sobrevivência e a ação independem
Presidência da República e dos ministérios. Desta
dos mecanismos de mercado ou da
forma, expressões como setor público, administração
existência de lucro ou superávit.
pública, organizações públicas etc, empregadas no
2. A remuneração global independe, em c) a eficácia das organizações privadas
grande parte, do preço do serviço depende de sua capacidade de
pago pelos clientes. respostas às demandas em permanente
mutação, enquanto as públicas "têm
3. Os objetivos são baseados em interes­ dificuldade em justificar mudanças,
ses comunitários mais amplos, cujo repentinas devendo, normalmente,
alcance ultrapassa os limites da satis­ deixar transparecer continuidade,
fação de seus interesses particulares. coerência e estabilidade".(3 )

4. A cultura organizacional tende a se A necessidade de transparecer esta


caracterizar por forte senso de identi­ imagem para todas as suas áreas e ações explica-se
dade e de aderência à missão pelo fato de que se espera do Estado a capacidade
sócio-econômica."(3) de articular, agregar e processar eqüitativamente as
diferentes demandas sociais. Ambigüidades que são
Algumas premissas fundamentais, que aceitas nas empresas privadas, nas organizações
apontam um elenco de dificuldades para a aplicação públicas podem transparecer opções de preferência
de processos de planejamento estratégicos nas orga­ clientelista.
nizações públicas merecem ser consideradas:
Sendo o planejamento uma "forma de
a) a organização privada vive um ambiente estabelecer prioridade e ressaltar ambigüidades...
competitivo, onde seu desenvolvimen­ hierarquizar objetivos e... estabelecer formas de
to só é possível com base na conquista concentração de recursos, buscando... distribuí-los
e manutenção de mercados. Dadas as desigualmente"(3), há dificuldade de conciliá-lo com
características históricas do mercado no essa imagem pretendida e, freqüentemente,
Brasil, essa afirmação deve ser relativi- justificam-se as ações das organizações públicas na
zada para muitos casos, porém pode- sua tradição, no seu passado, e não em função de
se considerá-las em sua essência válida. incertezas do futuro.
Diferentemente, as empresas públicas
não têm " sua estratégia de crescimento Com isso, é possível elencar-se algumas
baseada na competição, nem são admi­ características que tendem a diminuir a eficácia do
nistradas ou avaliadas por um sistema planejamento nas organizações públicas:
de ganhos e perdas no sentido
mercadológico"(3). Sua estratégia de Reconciliação contínua com o passado
desenvolvimento baseia-se no alcance
de seus objetivos sociais, que justificam A agregação organizacional, baseada
sua existência na sociedade,- fundamentalmente na missão institucional,
tente a valorizar continuamente as reali­
b) o planejamento global da empresa zações passadas, que construíram a
privada, "mediante um processo racio­ imagem do ministério ou secretaria. Essas
nal de análise de oportunidade e realizações, consideradas conquistas,
ameaças, garante não só um maior tendem a ser justificativas para projetar
domínio gerencial da organização sobre propostas que se baseiam na crença de
seu ambiente como também sua sobre­ uma capacidade infinita de se direcionar o
vivência a longo prazo"(3). Quanto às futuro conforme os interesses do Estado e
organizações do setor público, o não na capacidade deste em se adequar a
processo decisório segue outra raciona­ novas demandas da realidade social.
lidade, não sofrendo os mesmos tipos Mudanças que fujam à experiência passada
de ameças, nem a busca das mesmas normalmente não encontram amparo
oportunidades. Sua direção não goza, interno.
via de regra, de autonomia e sua
sobrevivência prescinde desta autono­
mia gerencial sobre o ambiente;
Reações a crises e pressões externas processos administrativos já
estabelecidos,-
O esforço gerencial concentra-se em
manter a organização estável, buscando-se, - a atividade de planejamento tende a
pois, a articulação externa com aqueles ser considerada duvidosa, razão pela
elementos que a reforcem. O planejamen­ qual a direção, normalmente, se afasta,
to estratégico, como envolve a análise de delegando-a a comissões, assessorias,
elementos externos não controláveis e grupo etc,-
pertubadores da estabilidade, só é
mencionado quando da ocorrência de - os dirigentes, por outro lado, preferem
crises, caracterizando-se, pois, como um associar-se ao processo decisório, em
processo descontínuo. detrimento de uma aproximação com o
operacional, reforçando a dessintonia
Assim, a organização fragiliza-se em entre planejamento a ação,-
relação às pressões externas, principalmen­
te político-partidárias, sendo normal que - as próprias premissas do planejamento,
se adicionem programas e projetos em sua que indicam a necessidade das orga-
programação, que acabam por ser aceitos nizções possuirem setores que "estejam
como ônus para sua sobrevivência. frente aos demais, que critiquem as
condições atuais e sejam capazes de
Planejamento por minianálise produzir idéais novas para o
futuro"(3), nas organizações públicas,
A descontinuidade do processo de plane­ são fatores adicionais da separação
jamento gera a ausência de informações excessiva das áreas de planejamento e
necessárias ao processo decisório, criando de execução. Assim, as áreas de
situações onde as direções tomam suas planejamento acabam por se constituir
decisões com base em informações restri­ em espaços de luta de poder, para
tas. Assim, há a tendência de que as que as áreas de execução influam
crenças, valores e hábitos já estabelecidos menos no processo decisório.
prevaleçam, reforçando a inércia contra
mudanças. Controle remoto

A o nível técnico generaliza-se, então, a Sendo uma atividade esporádica, o plane­


convicção de que a produção de infor­ jamento exercerá controle igualmente
mações para o planejamento é tarefa inútil, esporádico e remoto sobre os objetivos
o que compromete todos dos níveis de que a organização pretende atingir.
articulação interna e externa com outros
agentes, que não têm referências objetivas Receio de problemas
para suas decisões.
Tentando compatibilizar a necessidade em
Isolamento do planejamento inovar, portanto criticar a ordem existente,
e manter as aparências de uniformidade e
Paulo Motta aponta quatro razões para estabilidade organizacionais, o planejamen­
que o planejamento se torne atividade to tende a "ser analisado gerencialmente
isolada nas organizações públicas: mais no sentido de se evitar males"(3),
sendo comum ressaltarem-se aspectos
- o planejamento, trabalhando com negativos de planos propostos.
dados sobre o futuro, isto é, incertos e
especulativos", dissocia-se das áreas
encarregadas da implentação das
ações, que se baseiam em dados
concretos retirados da realidade e dos
4. PLANEJAMENTO c) nesse contexto, manter a motivação
ESTRATÉGICO PARA dos recursos humanos é praticamente
A MUDANÇA impossível, pela falta absoluta de
instrumentos para recompensar a
competência, represando ainda mais a
A GERÊNCIA DA ESCASSEZ potencialidade de criatividade nas
ações,-
Embora no processo de planejamento
estratégico ressaltem-se dimensões como criatividade, d) em épocas de escassez, quando mais
inovação, desenvolvimento organizacional, mobili­ se tornam necessários conhecimentos e
zação de recursos etc, as condições apontadas pela instrumentos analíticos para minimizar
conjuntura, de que durante os próximos anos o setor riscos e erros, não há recursos para
público conviverá com uma real escassez de recursos buscá-los,•
financeiros e humanos, poderão inibir o desenvolvi­
mento dessas dimensões. e) adequar a estratégia empresarial para
tempos de não-expansão constitui-se
Assim, provalmente, vai-se conviver, além em dificuldades acentuada, o que
da escassez, com a ineficiência hoje existente. Em compromete a capacidade do órgão
muitas organizações prevalecerá um clima de imobilis­ em bem equacionar os problemas que
mo, reforçado pela idéia de crise e de im potência podem ser temporários, prejudicando a
para solucionar problemas, abafando iniciativas retomada do crescimento no futuro.
criadoras.

A escassez, típica de países subdesenvol­ A R E A T IV A Ç Ã O D O


vidos, apresenta-se em maiores dimensões devido P LA N E JA M E N TO
aos anos sem crescimento econômico do país. Os
cortes nos orçamentos dos órgãos da administração A (re)ativação do processo de planeja­
pública tornaram-se tão comuns que suas progra­ mento nas organizações públicas necessita da super­
mações tendem a ser definidas para espaços de ação de comportamentos conseqüentes de crenças
tempo cada vez mais restritos. como a de que a superação dos problemas principais
encontra-se em fatores externos - sobre os quais a
Os problemas gerenciais internos, gerados organização não pode interferir, e de solução a longo
numa situação como a descrita, são os seguintes: prazo, portanto, deixando o presente e o curto
prazo sem perspectivas. Assim, justifica-se o imobilis­
a) com a tendência da falta de recursos a mo para a aplicação do planejamento, gerando,
gerar uma imagem de declínio, incapa­ segundo Motta, as seguintes formas
cidade e ineficiência dos órgãos, comportamentais:
realizam-se esforços no sentido de
buscar transparecer outra situação, a) redução de alternativas a curto prazo:
relegando-se a segundo plano o ataque se a perspectiva de solução dos
a fatores estratégicos para a mudança problemas se concentra no médio e
do quadro,- longo prazos, o dirigente acaba por
não decidir sobre o presente, inibindo
b) justificar cortes na programação de que resultados parciais sejam alcança­
órgãos e suas unidades é tarefa difícil dos a curto prazo,-
de ser empreendida pelos dirigentes,
pois significa indícios da perda de b) não-aceitação do planejamento: princi­
importância da ação setorial, estabele­ palmente porque sua existência, prova­
cendo conflitos pelo acesso aos velmente, detectaria incompetências
recursos,- decorrentes da ação baseada na expe­
riência e em hábitos disseminados
pelos dirigentes,-
c) percepção de falta de controle sobre Um exemplo que se encaixa na segunda
os objetivos organizacionais: a má defi­ categoria é o Ministério do Meio Ambiente e da
nição ou inexperiência de referências Amazônia Legal, que, criado inicialmente como
sobre os objetivos organizacionais Secretaria da Presidência, não foi fruto de uma cons­
conduz a discrepância setoriais, tornan­ ciência coletiva que determinasse sua existência. Não
do o controle sobre os resultados obstante, no futuro poderá provar a sua validade
tênue. A existência deste quadro gera como instrumento a serviço do desenvolvimento da
a idéia de que o planejamento será sociedade brasileira.
inócuo, porque não há condição de se
controlar decisões e ações,- Se, no universo singular de cada órgão,
podem surgir dificuldades quanto à definição de sua
d) numa organização sem objetivos defini­ respectiva missão, pelos fatores acima apontados,
dos, não há referências de desenvolvi­ dever-se-ia igualmente considerar que, no exercício
mentos pessoal de seus membros, de um Estado democrático, com a possibilidade de
gerando pessimismo e frustação,- alternâncias de forças políticas distintas no comando
do governo, as missões serão reformadas e, em
e) neste quadro, a dificuldade para mobi­ alguns casos extremos, organizações serão extintas.
lizar apoios é significativa, havendo
maior necessidade de envolvimento da Acrescente-se a estas dificuldades o fato
organização. Depara-se com obstáculos de que, nos últimos anos, houve um crescente ques­
constituídos por interesse cristalizados tionamento interno e externo sobre os papéis que o
de setores importantes da organização. Estado moderno deve desdenhar, atingindo argu­
mentações extremas que, em vez de contribuir para a
elevação da consciência coletiva sobre o tema,
5. PLANEJAMENTO nublaram a visão da sociedade.
ESTRATÉGICO:
PASSOS O problema estratégico, no âmbito da
METODOLÓGICOS administração pública, " p r e c is a ser discutido a partir
do entendimento do papel do Estado na
sociedade"(5). O Estado, núcleo do problema
D E F IN IÇ Ã O DE M IS S Ã O político, não deixa de ser um problema estratégico.
IN S T IT U C IO N A L E O BJE TIV O S
O R G A N IZ A C IO N A IS Assim, poder-se-iam classificar as organi­
zações públicas da administração direta em grupos
Definir a missão institucional de uma orga­ segundo o grau de clareza de suas missões,
nização, a razão de sua existência na sociedade, é o considerando-se sempre uma perspectiva de médio e
ponto de partida da atividade de planejamento longo prazos.
estratégico. Se para algumas organizações públicas
essa missão é razoavelmente clara, como, por exem­ Portanto, a convivência com a amplitude,
plo, os ministérios da Saúde, da Educação, da ambigüidade e intangibilidade das missões resultará
Previdência Social, em outras é difícil detectar-se numa dificuldade de se definir os respectivos
tentativas de institucionalização de órgãos sem uma objetivos.
base social legitimadora. Nesta situação, podem-se
enquadrar desde órgãos criados para acomodar Quando estabelecidos, há dificuldade de
pressões político-partidárias até aqueles que, embora operacionalizá-los, pois a própria estrutura da organi­
resultantes do formalismo do Estado -conforme zação não se construiu sobre esta base, sendo usual
Guerreiro Ramos reconhece -, representam "um fato o surgimento de centros de poder irreconciliáveis,
normal e regular, que reflete a estratégia global pela própria fragilidade da definição da missão
dessas sociedades (caracterizadas por grandes central e dos objetivos. O crescimento dos obstácu­
contrastes sociais e econômicos) no sentido de los estruturais, que dificultam a consecução dos obje­
superar a fase em que se encontram"(4). tivos, faz crescer a demanda por reformas na própria
estrutura, situação que conflita com a necessidade da
manutenção de uma imagem organizacional, detento­ organização pública de que se esteja tratando, já
ra de valores como a coerência e a coesão, com apresenta uma dificuldade estrutural à qual o planeja­
vistas a preservar o processo de legitimação social da dor deve procurar se adaptar e saber encaminhar uma
entidade pública. metodologia própria a cada uma.

Mesmo não sendo possível operacionalizar


gerencialmente os objetivos estabelecidos, estes D E L IN E A M E N T O D O
tornam-se referência formal para justificar a continui­ EC O SSISTEM A
dade dos trabalhos desenvolvidos pela organização
e, em época de 'c rise, servem para agregar sentimen­ Uma breve caracterização do ambiente em
tos corporativos calcados no instinto de que operam órgãos da administração pública direta
sobrevivência. federal indica a existência de um grande número de
agentes que pressionam suas direções políticas,
Como característica deste processo, a falta conformando um ecossistema de complexidade eleva­
ou indefinição de objetivos gera a ausência de indi­ da, composto, normalmente, pelos seguintes
cadores de desempenho da organização, pois aque­ elementos:
les formalmente estabelecidos são tão gerais que não
permitem se constituir em referência. Fica, assim, a a) governos dos países capitalistas
direção, a corporação e, também, a sociedade sem centrais: que pressionam no sentido de
parâmetros para avaliar a necessidade da existência que as políticas internas sejam
de determinado ministério ou secretaria. compatíveis com aquelas geradas
naqueles países, perpetuando relações
Conforme assinala Motta, "como a maioria de dominação,-
das organizações públicas têm uma sobrevivência
relativamente garantida, devido ao apoio e facilidade b) agências financiadoras governamentais
que as cerca, seu crescimento é naturalmente conce­ ou privadas, nacionais e internacionais:
dido pela ambiência. Crescem, assim, sem necessida­ que tentam influenciar para que a
de de uma análise concreta de relevância em cada elaboração de políticas públicas esteja
estágio de sua evolução"(3). de acordo com a capacidade de paga­
mento das dívidas governamentais,-
N o princípio de sua existência, as organi­
zações públicas desenvolvem-se sem maiores questio­ c) grupos econômicos ligados à produção
namentos, aumentando, gradativamente, seus custos de bens e serviços, nacionais e interna­
fixos. Isto pode gerar, no futuro, pressões sobre a cionais: que buscam pressionar o
administração financeira, abrindo caminho para a governo para que suas políticas resul­
introdução de uma mentalidade empresarial, que tem melhores condições para a
permita a sobrevivência (ou sobrevida) organizacio­ expansão de seus negócios, principal­
nal. Não se constituiria, pois, num processo com mente quando fornecedores do
fôlego para reorganizar a instituição, nem (re)colocá- próprio governo,-
la em trajetórias sociais substantivas.
d) governos latino-americanos: aumentan­
O controle das ações da instituição públi­ do seus vínculos com o governo brasi­
ca acaba por não ter referência eficaz no arcabouço leiro, principalmente em função do
definidor da sua missão e objetivos, uma vez que se surgimento de blocos multinacionais,-
caracteriza pela generalidade e ambigüidade, restan­
do as regras administrativas, de caráter formal e e) agências de cooperação internacionais:
processual, como parâmetros marcantes do seu principalmente aquelas ligadas à
processo de trabalho, o que conduz a uma série O N U , que podem oferecer apoio
emaranhada de disfunções. material e técnico para a gestão dos
orgãos,-
Diante deste quadro, o processo de
planejamento estratégico, dependendo da
f) governos estaduais e municipais: pres­ cenários não tem como objetivo escolher um. Todos
sionando por recursos financeiros e, os cenários têm sua contrapartida em planos."
eventualmente, demandando serviços
da administração federal,- Assim, a elaboração de dois cenários
extremos, resumidos na página seguinte, deve ser
g) partidos políticos: que, historicamente, considerada uma referência sobre os limites dentro
em sua maioria, vêem na apropriação dos quais vão agir os órgãos públicos, nos próximos
do aparelho estatal a melhor forma de anos.
crescimento, e, salvo exceções,
desvinculando-a do atendimento das Outros cenários intermediários podem ser
demandas sociais,- elaborados e, certamente, não estarão isentos de
erros, sendo a solução "revisar e refazer constante­
h) órgãos do poder Judiciário: que têm mente os cenários de cálculo, a fim de ajustar o
exercido cada vez mais poder de espaço dos cenários considerados possíveis ao
controle das ações do poder desenvolvimento da mudança situacional."(6)
Executivo;

i) servidores públicos: que, além de se


constituírem na força de trabalho è
disposição do governo, algumas vezes
tornam-se clientes do Estado, especial­
mente pela capacidade de pressão de
algumas corporações,-

j) a população em geral e suas formas de


associação não-partidária: constituindo-
se na clientela ampla do Estado, mas,
normalmente, somente pequenas parce­
las acabam por se constituir, efetiva­
mente, em interlocutores.

C E N Á R IO S

A modernização do .Estado brasileiro,


entendida como um processo gradual de aumento de
sua capacidade em atender as demandas sociais mais
graves, constitui-se, hoje, em um dos temas mais
repetidos entre estudiosos e políticos. Qualquer
órgão da administração direta, isoladamente, ou em
conjunto com os demais, deverá enfrentar tal desafio,
para que não se ampliem desmesuradamente os
problemas sociais, tornando-se cada vez mais difíceis
de solucionar.

Como adverte Matus (6 ), "a técnica de


cenários, para ser bem manejada, requer bastante
experiência... O desenho dos cenários visa esclare­
cer possibilidades ou dificuldades e, com base nisso,
dispor de planos previamente elaborados para tais
contingências. Por conseguinte, a exploração de
E LE M E N TO S D O C E N Á R IO C E N Á R IO D E SFAVO R ÁVEL C E N Á R IO F A V O R Á V E L

D E N O M IN A Ç Ã O aprofundamento da "crise do Esta­ modernização de estado para a


do" elevando-se sua ineficiência e retomada do processo de desen­
ineficácia. volvimento do país.
C A R A C T E R IZ A Ç A O aprofundamento da crise econômi­ implementação de política eco­
ca, gerando instabilidade política nômica exitosa no combate à
e incapacidade do estado em inflação, gerando nova fase de
equilibrar suas finanças para inves­ crescimento econômico,- aumento
tir em políticas sociais. de arrecadação e capacidade de
investimento do estado na área
social.
TRAÇOS M ARCANTES impossibilidade de renegociação negociação em bases mais
mais favorável das dívidas interna favoráveis das dívidas interna e
e externa,- externa,-
não aprovação da reforma fiscal; aprovação da reforma fiscal no
manutenção da atual legislação e congresso,-
situação partidárias, com ênfase no reforma da legislação partidária,
fisiologismo; com o estabelecimento de novas
crescimento das manifestações regras quanto à representação e
populares de protesto contra o fidelidade partidária;
governo,- maior organização popular e
perda maior da capacidade de capacidade de diálogo com o
investimento por parte do governo,-
governo,- aumento da capacidade de inves­
incapacidade aumentada quanto à timento do governo,-
gestão de recursos humanos,- gestão de recursos humanos,-
processos de descontinuidade estabilidade política e adminis­
administrativa. trativa.
PRO M OTORES governos e credores externos melhoria no diálogo norte-sul,-
exigindo o pagamento da dívida investidores nacionais e estrangei­
draconianamente,- ros instalando-se no país,-
investidores nacionais e estrangei­ crescente influência de políticos
ros instalando seus negócios em responsáveis;
outros países,- menor influência de lobbies nas
hegemonia dos políticos fisioló­ decisões de governo,-
gicos,- crescimento da visão social do
crescente influência de lobbies estado nas associações de
econômicos nas decisões de funcionários públicos.
governo,-
crescimento da cultura corporati-
vista nas associações de funcioná­
rios públicos.
A N Á L IS E DE IM P A C T O S aprofundamento do processo o êxito da promoção de políticas
inflacionário associado à incapaci­ de estabilidade econômica, a
dade do governo em equilibrar aprovação da reforma fiscal, o
suas finanças, a pressão pelo controle das finanças públicas e a
pagamento das dívidas interna e melhoria do sistema partidário
externa e a manutenção do atual resultarão na modernização do
sistema partidário gerarão a estado brasileiro.
processos de deterioração total
de Estado no Brasil.
A N Á L IS E A M B IE N T A L EXTERNA: significado econômico, deverá continuar existindo, o
A M E A Ç A S E O P O R T U N ID A D E S que, aliás, não se constitui em privilégio brasileiro.

Embora a demanda por um Estado eficien­ Ainda assim, pode-se observar alguns
te cresça à medida em que aumentam as desigualda- sintomas de que outros fatores poderão alavancar
des e injustiças sociais, tal tarefa torna-se cada vez processos de renovação e qualificação da adminis­
mais complexa e difícil para os dirigentes dos órgãos tração pública no Brasil.
da administração pública direta, justamente, porque a
falta de recursos e de instrumentos vai-se multiplican­ A continuidade do processo democrático
do nesta conjuntura de crise econômico-financeira. vem criando condições para o amadurecimento políti­
co dos atores sociais, alguns dos quais, até há pouco
As ameaças, frente às quais a adminis­ tempo, se encontravam marginalizados das decisões
tração pública se deparará a curto e médio prazos, políticas mais importantes. Cresce com isso a possibi­
deverão ser, basicamente, as mesmas hoje identi­ lidade de alianças entre interesses diferenciados para
ficáveis, podendo surgir novos riscos em função de a construção de uma realidade econômica e social­
eventual agravamento nas relações econômicas e mente mais justa que a atual.
políticas internacionais ou das tensões internas.
A própria campanha presidencial de
As transformações econômicas e sociais se 1 994, dependendo de quais candidatos concor­
processam em velocidades cada vez maiores, haja rerão e de suas respectivas estratégias eleitorais (ou
vista os acontecimentos do Leste Europeu nos últi­ eleitoreiras), poderá elevar o nível de consciência
mos anos, imprevisíveis até a véspera de sua política de parcelas significativas de brasileiros.
ocorrência.
A instalação do futuro governo, se dota­
A questão do pagamento das dívidas do de elevados propósitos éticos e políticos e com
externa e interna deverá continuar ameaçando a capa­ capacidade de governar, poderá mobilizar intensiva­
cidade de investimento do Estado em obras de infra- mente recursos humanos, econômicos e políticos para
estrutura e em programas sociais. A título de exem­ promover o desenvolvimento social.
plo o Orçamento da União para 1993 destinou
mais da metade dos recursos para o pagamento dos Poderá haver, ainda, reflexos sobre o
compromissos delas derivados. debate acerca do sistema federativo e do sistema
partidário, com propostas para sua modernização nos
A formação de blocos econômicos, quantitativos e forma de representação. Outras
mesmo com a participação brasileira em um deles, o formas de associações de indivíduos e de segmentos
MERCOSUL, pode significar a ampliação das sociais deverão participar cada vez mais de
disparidades hoje presentes nas relações Norte-Sul, discussões sobre as políticas que lhes são diretamen­
inibindo processos de crescimento econômico, sem o te afetas.
que a administração pública, dificilmente, terá
condições de reverter o atual quadro em que se Também a discussão sobre as políticas
encontra. públicas se processa hoje de forma mais ampla e
aberta, o que permite seu aprimoramento na busca
A difícil e lenta transformação dos hábitos de maior eficácia. Esta prática torna mais visível o
políticos no Brasil, herdados de uma cultura secular funcionamento do aparelho estatal, tornando-o mais
de assalto ao aparelho estatal, talvez seja a maior sujeito a críticas, o que é base fundamental para sua
ameaça e a mais penosa de ser contornada. A ine­ qualificação.
xistência de partidos ideologicamente consistentes
constitui-se em caminho aberto a propostas populis­ O crescente fortalecimento do Judiciário,
tas e demagógicas que aprofundariam a crise já embora possa significar, em alguns casos, interferência
existente. excessiva sobre o Executivo, é, sem dúvida, fator
positivo para o respeito ao arcabouço jurídico do
A investida de grupos poderosos no país. Este fato também poderá neutralizar as pressões
sentido de controlar as políticas públicas de maior indevidas de pessoas e grupos sobre a administração
pública, além de fortalecer os instrumentos legais à A legislação que regula as relações admi­
disposição do Estado. nistrativas pode ser escalada no conjunto de pontos
fracos, uma vez que tem como característica básica a
A renovação positiva do Legislativo nas exagerada preocupação com processos de controle
próximas eleições poderá fortalecer um futuro de todos os tipos, em detrimento de condições faci-
processo de discussão e de implantação de políticas litadoras da gestão. Isto também é resultado da
públicas adequadas às demandas sociais mais críticas. síndrome da corrupção, que, muito embora a realida­
de ateste fartamente sua existência nas relações admi­
nistrativas, não justificaria a opção pelo apego
A N Á L IS E A M B IE N T A L IN T E R N A : desmensurado aos aspectos formalísticos dessas
P O N T O S FORTES E FRACOS relações.

O ponto crítico a ser destacado na análise Quanto a pontos fortes, deve-se ressaltar
interna é a desqualificação dos recursos humanos à a existência de profissionais qualificados, mas que
disposição da administração pública direta. Resultado não contam, muitas vezes, com respaldo político
de processos históricos, derivados do patrimonialis- para alcançar espaços de trabalho privilegiados, seja
mo, do clientelismo explícito e de má gestão, o ao nível operacional ou ao nível decisório. Mesmo
quadro atual demonstra, salvo exceções, uma inade­ não havendo como quantificá-los, haveria a possibili­
quação bastante acentuada entre as demandas dos dade de que, por meio de um processo adequado,
órgãos e a qualificação de seus funcionários, seja nas pudessem ser reunidos em projetos específicos para
áreas operacionais ou gerenciais. servirem de agentes multiplicadores de ações moder-
nizadoras do serviço público.
Tal desqualificação é obstáculo significati­
vo a quaisquer processos de modernização adminis­ Outro ponto positivo a ser destacado é a
trativa, pelo próprio risco de que a alternativa de consolidação de legislações, complementares à
resolução do problema possa vir a indicar o afasta­ Constituição, que exigem o ingresso no serviço
mento de grandes contingentes de servidores. público somente por concurso público. Concursos
públicos podem não garantir, necessariamente, uma
Esta questão tem rebatimentos políticos seleção adequada, porém possuem o mérito inegável
importantes, na medida em que é bastante delicado de estancar movimentos de fundo clientelístico que
para qualquer agrupamento político sustentar propos­ tão mal causam à administração de qualquer organi­
tas de caráter mais efetivo, quanto à redução de zação pública ou mesmo privada.
contingentes, sem pagar altos preços no mercado
eleitoral. Ainda mais numa conjuntura de crise A própria organização crescente dos
econômica, onde a defesa de empregos é bandeira funcionários públicos em associações deve trazer a
das mais fáceis de encontrar adeptos. elevação do debate em torno de sua caracterização
como trabalhadores do serviço público e de suas
Outro destaque como ponto fraco é o responsabilidades sociais. Talvez este seja o maior
corporativismo. Conforme pesquisa elaborada pela potencial identificável para, a médio prazo, tornar a
ENAP: "pode-se dizer até que a burocracia pública administração pública mais profissional e menos sujei­
federal, ao longo dos últimos dez anos, foi abando­ ta a turbulências político-administrativas.
nada a sua própria sorte. A falta de ações efetivas
na área de Recursos Humanos da administração
pública tem como contrapartida o crescimento do D E L IN E A M E N T O DE
corporativismo dos servidores"(7). ESTRATÉGIAS

Outro componente que fortalece a menta­ Segundo Ansoff, estratégia "é um dos
lidade corporativista é o próprio desemprego no vários conjuntos de regras de decisão para orientar o
país, o que, muitas vezes torna os servidores públi­ comportamento de uma organização"(8). Normal­
cos em autênticos clientes do Estado. mente é confundida com p o lítica , termo conceituado
pelo mesmo autor como sendo "uma decisão
condicionada"(8), a qual pode ser delegada a níveis
hierárquicos inferiores. A definição da primeira a) definir objetivos, metas e indicadores
envolve condições de risco e incerteza, diferente­ de sua produtividade ou eficácia
mente da segunda. social, para a implantação de contratos
de gestão ou instrumentos seme-
Na administração publica direta, talvez a Ihantes;
maior dificuldade, para grande parcela dos órgãos,
seja estabelecer a chamada estratégia de negócios:, b) reduzir custos nas áreas-meio e nos
ou seja, “regras para o desenvolvimento da relação órgãos centrais (quando descen­
da empresa com seu ambiente"(8), uma vez que tralizados);
suas históricas não são as mesmas: alguns órgãos defi­
niram razoavelmente bem suas missões e objetivos, c) utilizar seu sistema de informações para
encontrando aceitação social, enquanto outros vivem disseminá-las na sociedade,-
em permanente questionamento.
d) incentivar a co-gestão de programas e
Em se tratando dos primeiros, seus corpos projetos com órgãos públicos de
dirigentes podem tomar decisões sobre os meios outras esferas e com associações civis,-
para alcançar os objetivos propostos, sem que estes
mudem constantemente sob diferentes conjunturas e) elevar a qualificação dos recursos
políticas. Já, para os outros, os objetivos variam com humanos, bem como profissiona­
a alternância de seus dirigentes, implicando grandes lizá-los.
transformações, chegando ao extremo da substituição
da clientela que vinha sendo atendida por uma nova. A concepção de programas, projetos e
Embora, muitas vezes, sua existência se justifique, atividades e formas de avaliação deve-se processar
conforme razões apontadas anteriormente, estas orga­ nos limites indicados pelas diretrizes citadas, variando
nizações tendem a conviver com uma instabilidade conforme as características próprias de cada órgão.
constante. Como conseqüência, estarão mais
suscetíveis à extinção ou à incorporação ou fusão
com outros órgãos, tornando ainda mais difícil que 6. PLANEJAMENTO DO
seu desenvolvimento se faça articulado às demandas POTENCIAL DE
sociais. GESTÃO
Conforme aborda Ansoff, quando a orga­
nização se defronta com descontinuidades, dois Referindo-se à empresa privada, Ansoff
problemas importantes devem ser enfrentados: a prognostica que seu êxito está associado ao ajuste
escolha da nova direção, entre algumas possíveis, e entre "a agressividade de seu comportamento opera­
"como reunir as energias de grande número de cional e estratégico à mutabilidade dos desafios
pessoas na nova direção escolhida" (8 ). ambientais, definido como nível de "turbulência
ambiental"(8).
Ainda segundo o mesmo autor, "as
respostas a essas questões constituem a essência da Enquanto a sobrevivência da empresa
formulação e implantação de estratégias"(5). Há a privada exige que quanto maior a turbulência mais
necessidade de formulação de estratégias explícitas agressiva deve ser sua reação, os órgãos públicos
nas conjunturas intensamente mutantes. Por isso, as vêm, na maioria dos casos, respondendo inversamen­
organizações de governo necessitariam cada vez mais te aos estímulos ambientais e, não raro, este proces­
introduzir o planejamento estratégico em sua gestão. so resulta em situações críticas que acabam por afas­
tar seus dirigentes.
Para as organizações da administração
direta, pode-se apontar um tronco comum de diretri­ Nestas organizações, na maioria das vezes,
zes estratégicas, para aumentar sua capacidade de encontram-se manifestações de que tanto a posição
adaptação às novas realidades: estratégica no ambiente quanto as potencialidades
precisam ser alteradas, o que implica que, além de
processos de planejamento estratégico falhos, elas
negligenciam ações para alterar a cultura interna e
suas potencialidades para o futuro. Se pela dimensão social há demanda por
mudanças rápidas, o que poderá sugerir práticas
A predominância da visão de curto prazo, coercitivas, a dimensão política, especialmente em
principalmente pelo volume crescente de demandas período pós-eleitoral, normalmente traz complacência
sociais, dificulta a existência de esforços para visuali­ por parte da opinião pública e certo respeito pela
zar a organização no seu ambiente num horizonte de burocracia. Assim, pode-se caracterizar condições de
tempo maior, tornando a questão do diagnóstico de urgência moderada (8 ) para a efetivação de
potencialidades e do seu ajuste vazia. mudanças.

Realizar reformas no âmbito da adminis­


7. ADMINISTRAÇÃO DO tração pública direta constitui-se em tarefa extrema­
PROCESSO DE mente delicada, porque a dimensão da luta pelo
MUDANÇA poder é mais dramática do que nas organizações
ESTRATÉGICA privadas, o que torna o processo de aparecimento e
desenvolvimento de resistências muito complexo.

O diagnóstico de potencialidades, embo­ Como agravante, deve-se considerar fato­


ra identifique mudanças necessárias, não é suficiente­ res como a formação do quadro de pessoal civil da
mente específico para que sejam tomadas União, em sua maioria por meio de práticas cliente-
providências pela administração. listas e sua baixa qualificação.

Há necessidade de que a distância exis­ Desta forma, as propostas de mudanças


tente entre a situação identificada e as potencialida­ gerarão resistências nos potenciais agentes de sua
des desejadas sejam eliminadas por meio de progra­ efetivação, principalmente pelo receio de que elas os
mas de treinamento, reforma de estrutura, de siste­ tornem não necessários e cortem vínculos de poder
mas etc. existentes.

Para isso, deveriam ser elaborados planos A política de recursos humanos deverá
de desenvolvimento de potencialidades. Ainda mais, merecer um cuidado cada vez maior por parte de
pela demora crescente com que a administração novos dirigentes, procurando o trabalho conjunto
pública direta vem respondendo, e muitas vezes de entre direção e quadro permanente: "onde a formu­
forma apenas parcial, às demandas sociais, avolumam- lação da estratégia é uma atividade elitizada é muito
se razões para que mudanças de estratégias e poten­ difícil se produzir estratégias realmente criativas''(5).
cialidades dos seus órgãos se processem em prazos
cada vez menores. Haverá necessidade de uma série de
iniciativas para o convencimento de amplas parcelas
O cotejamento destas condicionantes com de servidores e da população em geral em mudar o
o fato de que as direções têm prazos máximos de quadro, atacando valores culturais extremamente
gestão de quatro anos, o que, transformado em arraigados.
tem po p o lític o , representa praticamente três anos,
faz com que seja plausível admitir-se uma gestão de Processos puramente incrementalistas
mudança na forma de resistência adm inistrada (8 ), poderão não ser eficazes.
como a mais adequada também para a administração
pública direta.
8. CONCLUSÃO
Embora possa-se admitir o emprego de
processos coercitivos, principalmente se a gestão
estiver se iniciando, a perspectiva mais provável é a Para o futuro, haverá crescente aproxi­
de que não o venham a ser, ainda mais tendo em mação entre as formas de gestão de órgãos públicos
vista os maus resultados da recente experiência e das empresas privadas. Os primeiros introduzirão
promovida pelo Governo Collor. paulatinamente tecnologias de gestão consolidadas
no meio privado, enquanto as últimas incorporarão áreas onde o ingresso se processou de forma
maiores preocupações sociais ao processo de diferente.
produção de bens e serviços.
O que se busca, portanto, é a dissemi­
Por ora, experiências de modernização de nação de uma consciência de que os servidores são
gestão no âmbito público praticamente só têm atingi­ antes de mais nada cidadãos brasileiros investidos
do as chamadas empresas estatais. numa missão pública e não clientes do Estado.

Guardadas as necessárias diferenças, prin­ Quanto à segunda vertente, o processo


cipalmente quanto ao compromisso com o controle democrático precisa atingir de forma mais eficaz o
público, com a visibilidade e o sentido ético das Estado, para que este seja eficaz e efetivo para a
suas ações, os dirigentes da administração pública sociedade.
direta deverão promover reformas urgentes, principal­
mente em duas vertentes, para desenvolver uma Em lugar de se estimular a criação e o
capacidade de governo ajustada às demandas sociais: crescimento de órgãos e unidades de controle inter­
no, pois constituem-se, pela própria origem, em
a) desenvolver o potencial, mobilizar e agentes relativamente incapazes de visualizar os
capacitar os recursos humanos sob processos estrategicamente danosos à administração
critérios éticos,- pública, deve-se incentivar o controle externo,
mediante a convocação de segmentos sociais e
b) privilegiar a gestão e o controle exter­ mesmo de pessoas de reconhecida competência e
no ao controle interno. idoneidade, para se engajar no processo de avaliação
e controle das ações do Estado.
A política de recursos humanos a ser
desenvolvida deverá considerar inexoravelmente o Abrir e se tornar visível permitirá, em
processo de formação histórica do quadro de compensação, que os órgãos de Estado possam
pessoal, reconhecendo as desigualdades existentes, contar com maiores graus de flexibilidade de gestão,
para dar tratamento diferenciado aos desiguais. característica mais do que reconhecida como
necessária, para que as organizações convivam fortes
Segmentos mais capacitados, devidamente no meio em que atuam.
aprimorados, devem-se constituir em núcleos irradia­
dores de uma profunda reforma ética junto a toda a Desta forma, uma série de instrumentos de
administração. planejamento poderão ser geridos, em algum grau
pré-estabelecido, pelas próprias instituições
O aprimoramento desses segmentos deve responsáveis pela elaboração e implementação das
visar, juntamente com processos de formação de diferentes políticas públicas. O orçamento, principal­
quadros, à constituição do que Matus chama de mente, deixaria de ser uma peça rígida, que submete
nível tecnopolítico, capaz de articular as instâncias as ações estatais a uma lógica muitas vezes prejudicial
política e técnica. à sociedade, para tornar-se ferramenta útil ao atendi­
mento de suas demandas.
Por outro lado, todo o quadro de servi­
dores deve-se submeter a reformulações que aproxi­ A contrapartida da necessária flexibilização
mem sua realidade com a de todos os trabalhadores das gestões de órgãos públicos para a modernização
do país, estabelecendo-se novos compromissos do Estado é o resgate do seu sentido público, ou
políticos com a sociedade, a fim de que sejam resga­ seja, acessível aos cidadãos e sem donos ou capata­
tados a dignidade profissional e o respeito da popu­ zes privilegiados.
lação ao serviço público.

Os quadros técnicos e de apoio necessita­


riam submeter a legitimidade de sua condição a
processos públicos de seleção (ou confirmação), nas
9. BIBLIOGRAFIA

ANSOFF, H. Igor, et alii. Do Planejamento


Estratégico à Administração Estratégica. São
Paulo, Editora Atlas, 1981.

M A TU S , Carlos. Adeus, Senhor Presidente. Reci­


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RAMOS, Alberto Guerreiro. Administração e


Contexto Brasileiro: esboço de uma teoria
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PONTES, Henrique J.L. Administração Estratégica


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Coordenação de Pós-graduação do Departa­
mento de Ciências Administrativas e
Contábeis da Universidade de Brasília,
1 99 2 .

M A TU S , Carlos. Política, Planejamento e Gover­


no. Brasília, IPEA, 1 99 3 .

Fundação Escola Nacional de Administração Pública


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Executivo, [organizado por Régis de Castro
Andrade e Luciana Jaccoud]. Brasília, Centro
de Documentação, Informação e Difusão
Graciliano Ramos, 1 99 3 .

ANSO FF, H. Igor. A Nova Estratégia Empresa­


rial.São Paulo, Editora Atlas, 1990.
.

.
A EXPERIENCIA DO
ORÇAMENTO PÚBLICO
FEDERAL APÓS A
CONSTITUIÇÃO DE 1988
EDSON M. TUBAKI

Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e


Assessor de Orçamento e Fiscalisação Financeira da Câmara dos Deputados

parâmetros e diretrizes para a correta aplicação dos


RESUMO
recursos.

No Brasil, a Constituição de 1 8 2 4 defi­


presente trabalho pretende estabelecer algu­ niu as competências dos poderes em questão orça­

O mas reflexões a respeito da recente trajetória


do orçamento público, verificada a partir das
alterações introduzidas pela Constituição de 1 9 8 8 , buscan­
do delim itar o campo de interesse do trabalho, principal­
mentária e tributária. Enquanto o Executivo tratava
da elaboração da proposta, a Assembléia Geral
(Senado e Câmara) cuidava da aprovação da lei,
competindo ainda a responsabilidade pela iniciativa
mente, a uma análise crítica da participação do poder Legis­ das leis dos impostos à Câmara dos Deputados.
lativo na elaboração orçamentária da União.
A Constituição de 1891 modificou a
Neste sentido, procurou-se traçar, inicialmente, a trajetória distribuição das competências. O Congresso Nacio­
da organização do orçamento público no Brasil, através de nal (Câmara dos Deputados) passou a ter
suas Constituições. Buscando melhor situar as discussões competência exclusiva sobre a elaboração do orça­
subseqüentes, apresenta-se, em seguida, uma descrição mento, assim como sobre o exame das contas do
sintética do chamado processo orçamentário. Passa-se, Executivo, com o auxílio de um tribunal de contas.
então, a analisar a experiência do orçamento público sob a Na prática, entretanto, o Executivo sempre acabava
égide da Constituição de 1 9 8 8 , onde se constata a neces­ enviando ao Legislativo, a pedido deste, um esboço
sidade de aperfeiçoamento dos instrumentos em vigor. do orçamento.

Com a Constituição de 1934, a


competência da elaboração da proposta orçamentária
retorna ao poder Executivo, cabendo ao Legislativo
1. O ORÇAMENTO não só a sua votação como também a proposição e
PÚBLICO NAS aprovação de emendas. Durante o Estado Novo, o
CONSTITUIÇÕES Executivo concentrou em suas mãos a elaboração e a
BRASILEIRAS aprovação da peça orçamentária.

Na Constituição de 1 9 4 6 , o Legislativo
A evolução histórica do orçamento públi­ recupera suas atribuições no tocante ao exame e
co sempre esteve relacionada à necessidade do aprovação da proposta. N o entanto, críticas são
controle legislativo sobre os atos do poder Executi­ realizadas a esse texto constitucional pela excessiva
vo, seja estabelecendo dispositivos para limitar a abertura que concedeu à possibilidade de aprovação
cobrança abusiva de tributos, seja determinando de emendas de cunho predominantemente local e
dientelista, abrindo caminho para a pulverização 2. A CONSTITUIÇÃO DE
excessiva dos recursos e para a descaracterização do 1988
orçamento como instrumento de política econômica
uniforme e coerente.
Uma das principais alterações promovidas
Já a Constituição de 1967 limitou drasti­ pela Carta de 1988 diz respeito à abrangência dos
camente as prerrogativas do poder Legislativo, orçamentos que devem ser encaminhados pelo
reduzindo-o a um papel meramente decorativo, a Executivo ao Legislativo. A o contrário das Consti­
quem competia apenas homologar a proposta orça­ tuições anteriores, criou-se a obrigatoriedade de,
mentária, encaminhada pelo Executivo. O § 1o do além do Orçamento Fiscal, o Executivo enviar os
A rt. 67 estabelecia que "não serão objeto de deli­ orçamentos da Seguridade Social e de Investimento
beração emendas de que decorra aumento de despe­ das Empresas Estatais.
sa global ou de cada órgão, projeto ou programa,
ou as que visem a modificar o seu montante, natureza No § 5o do A rt. 165, a Constituição
e objetivo". estabelece que "a lei orçamentária anual
compreenderá:
A Constituição de 1 98 8 trouxe algumas
alterações e inovações relevantes como a recuperação I- o orçamento fiscal referente aos
por parte do Legislativo da atribuição de apreciar e poderes da União, seus fundos,
votar a lei orçamentária, a abrangência dos orçamen­ órgãos e entidades da administração
tos, a instituição do Plano Plurianual (PPA) e a direta e indireta, inclusive fundações
criação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LD O ). instituídas e mantidas pelo poder
Público,-

A T R IB U IÇ Õ E S D O C O N G R E S S O II - o orçamento de investimento das


N A C IO N A L E M M A T É R IA empresas em que a União, direta ou
O R Ç A M E N T A R IA indiretamente, detenha a maioria do
capital social com direito a voto,-

C O N S T IT U IÇ Ã O
III - o orçamento da seguridade social,
abrangendo todas as entidades e
A T R IB U IÇ Ã O 46 67 88
órgãos a ela vinculados, da adminis­
V otar o Orçamento Fiscal sim sim sim tração direta ou indireta, bem como
A b rir créditos novos sim não sim (*) os fundos e fundações instituídos e
Fixar vantagens para servidores sim não não
mantidos pelo poder Público."
Conceder subvenções além das já sim não não
Fixadas
Criar despesas novas ou aumentar as já sim não sim (*) Dessa maneira, o Congresso passou a
propostas
analisar o mérito e as condições de financiamento de
Transpor recursos de uma dotação sim não sim
para outra todas as despesas públicas, exceto as de custeio das
Conceder créditos ilimitados não não não empresas estatais.
Rejeitar parcialmente ou emendar o sim não sim
projeto
Rejeitar totalmente o projeto sim sim sim A o mesmo tempo, o texto constitucional
A utorizar abertura de créditos sim não estabeleceu que o orçamento fiscal deveria ser acom­
suplementares
panhado de demonstrativo, de forma regionalizada,
V otar o Plano/Orçamento Plurianual não não sim
do impacto das isenções, anistias, subsídios e
V otar o Orçamento da Seguridade não não sim
Social benefícios tributários e creditícios que produzissem
.Votar o Orçam ento das Estatais não não sim reflexos sobre as receitas e as despesas.
( * ) m indicjr a pfoveniênài dos recuisos necessários

( * * ) sob condições (A rt. 167 d« C.F.) A atual Constituição introduziu ainda duas
inovações importantes, buscando não apenas ampliar
a abrangência da ação do Legislativo, mas também
estabelecer critérios e parâmetros que orientassem e
balizassem a elaboração da lei orçamentária, quais alterações na legislação tributária e estabelecerá a
sejam o plano Plurianual e a Lei de Diretrizes política de aplicação das agências financeiras oficiais
Orçamentárias. de fomento".

O Plano Plurianual (PPA), estabelecido Enquanto os prazos para encaminhamento


através de lei de iniciativa do poder Executivo, do projeto de LD O ao Legislativo não forem defini­
contém diretrizes e metas para as despesas de capital dos por lei complementar, o inciso II do § 2 o do
da administração pública federal e se diferencia do A rt. 35 do A to das Disposições Transitórias esta­
Orçamento Plurianual de Investimentos (O P I), belece que este deverá ser encaminhado até oito
previsto na Constituição anterior, na medida em que meses e meio antes do encerramento do exercício
incorpora não apenas diretrizes para os investimen­ financeiro (1 5 de abril) e devolvido para a sanção
tos, mas também as despesas de custeio deles até o encerramento do primeiro período da sessão
decorrentes. N o entanto, a distinção mais importante legislativa (3 0 de junho).
residiu no fato de que o PPA deixaria de ser um
mero instrumento, uma vez que passaria a determinar Procurando evitar os extremos das Consti­
metas físicas para a administração pública federal e tuições de 1 9 4 6 e 1 9 6 7 , a Constituição de
não apenas dotações financeiras, que se desatualiza­ 1988 abriu espaço para a proposição e a aprovação
riam em função do processo inflacionário, inviabilizan­ de emendas pelo poder Legislativo, estabelecendo,
do a ligação entre o orçamento anual e o orçamento entretanto, algumas restrições.
plurianual.
Assim, em seu A rt. 1 6 6 , § 2o, dispôs
Se o antigo OPI tinha a duração de três que "as emendas ao projeto de lei do orçamento
anos, sendo reelaborado anualmente, o atual PPA anual ou dos projetos que o modifiquem somente
tem duração equivalente ao período de mandato de podem ser aprovadas caso:
governo, sendo aplicado a partir do segundo ano da
administração que o elabora até o final do primeiro a) sejam compatíveis com o PPA e com
ano do governo seguinte, podendo ser modificado a LDO;
por lei durante a sua vigência.
b) indiquem os recursos necessários,
Enquanto os prazos para encaminhamento admitidos apenas os provenientes de
do projeto do PPA ao Legislativo não forem defini­ anulação de despesa, excluídas as que
dos por lei complementar, o inciso I do § 2o do incidam sobre dotações para pessoal e
Artigo 35 do A to das Disposições Transitórias esta­ seus encargos, serviço da dívida e
belece que este deverá ser encaminhado até quatro transferências tributárias constitucionais
meses antes do encerramento do primeiro exercício para estados, municípios e Distrito
financeiro (31 de agosto) e devolvido para a sanção Federal;
até o encerramento da sessão legislativa (31 de
dezembro). c) sejam relacionadas com a correção de
erros ou omissões, ou com dispositi­
A LDO , de outra parte, constituir-se-ia vos do texto do projeto de lei.
no elo entre o PPA e os orçamentos anuais, fixando
parâmetros para a elaboração destes e zelando pela
aplicação do Plano. Na prática, porém, tem-se 3. O PROCESSO
constituído basicamente numa lei de aspectos qualita­ ORÇAMENTÁRIO
tivos restritivos orientadores.

Segundo o § 2 o do A rt. 1 65 da Consti­ O processo orçamentário pode ser carac­


tuição, "a lei de diretrizes orçamentárias compreen­ terizado de maneira sucinta pelas seguintes etapas:
derá as metas e prioridades da administração pública
federal, incluindo as despesas de capital para o a) Elaboração, pelo poder Executivo,
exercício financeiro subseqüente, orientará a elabo­ da proposta de Lei Orçamentária
ração da lei orçamentária anual, disporá sobre as Anual (L O A ).
Inicialmente, os órgãos de planejamento e Quanto à estrutura de assessoramento, a
de gestão das receitas públicas avaliam as condições presidência da Comissão Mista designa um assessor-
macroeconômicas, estimam a receita para o exercício geral, pertencente ao quadro de funcionários de uma
subseqüente e fixam os parâmetros que orientarão a das Casas, para a direção dos trabalhos de assesso­
elaboração dos orçamentos. ramento, e um coordenador-geral da Comissão na
outra Casa.
Em seguida, o órgão central do sistema de
orçamento, Secretaria de Orçamento Federal A Comissão é assistida e assessorada por
(SO F), determina as condições em que deverão ser funcionários lotados na Assessoria de Orçamento e
elaboradas as propostas setoriais, estipulando os Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados e
tetos de programação. na Subsecretaria de Orçamento do Senado Federal
que, em conjunto, constituem cerca de 30
As propostas das unidades orçamentárias assessores.
de cada órgão são consolidadas na unidade setorial
de orçamento e finanças e encaminhadas à SOF para Dando seqüência ao processo legislativo,
consolidação geral e os ajustes necessários. é escolhido então um relator-geral, que elabora e
submete à Comissão um parecer preliminar, onde são
O resultado deste processo é submetido à fixados parâmetros que orientarão a formulação de
consideração do presidente da República, que o emendas e a apreciação do projeto pelos relatores
encaminha ao Congresso Nacional para apreciação. parciais e setoriais. Após, são escolhidos os relatores
parciais e setoriais, aos quais compete a apreciação
Tramitação do projeto no Legislativo de partes da proposta, correspondentes a um ou
mais órgãos e unidades orçamentárias.
No Legislativo, após a leitura da mensa­
gem do presidente da República em sessão do Seguem-se a apresentação de emendas
Congresso Nacional, o projeto de lei é remetido à pelos parlamentares, a discussão e votação dos
Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e relatórios parciais e setoriais pelas subcomissões, a
Fiscalização para apreciação, nos termos da Consti­ discussão e votação do relatório geral pelo Plenário
tuição e da Resolução n° 1/91 -CN. da Comissão, o encaminhamento do texto aprovado
pela Comissão à Mesa do Congresso Nacional para
O A rt. 166, § 1°, da Constituição,
sua discussão e votação pelo plenário do Congresso.
estabelece que caberá a uma comissão mista perma­ Por último, aprovada a redação final, tem lugar o seu
nente de senadores e deputados: encaminhamento à sanção do presidente da
República.
a) examinar e emitir parecer sobre os
projetos relativos ao PPA, à LDO, O presidente da República, no prazo de
ao orçamento anual e aos créditos 1 5 dias úteis, contados do recebimento, se conside­
adicionais e sobre as contas do presi­ rar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional
dente da República,- ou contrário ao interesse público, poderá vetá-lo,
total ou parcialmente, comunicando, dentro de 48
b) examinar e emitir parecer sobre os horas, ao presidente do Senado os motivos do veto
planos e programas nacionais, regio­ (A rt. 6 6, § 1o da C.F.).
nais e setoriais previstos na Consti­
tuição e exercer o acompanhamento e Havendo o veto, este será apreciado em
a fiscalização orçamentária. sessão conjunta do Congresso Nacional, dentro de
30 dias a contar de seu recebimento, só podendo
Sua composição atual inclui 84 parlamen­ ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos
tares, sendo 63 deputados e 21 senadores, indica­ Deputados e Senadores em escrutínio secreto (A rt.
dos proporcionalmente ao tamanho das bancadas 66, § 4o da C.F.).
dos diferentes partidos. Quanto à indicação do
presidente da Comissão e do relator-geral, verifica-se
a alternância entre Senado e Câmara.
Execução orçamentária relativo ao processo orçamentário, emanado dos
ditames do referido texto constitucional.
A execução orçamentária, de forma
bastante esquemática, compreende basicamente os A propósito, percebe-se claramente que,
seguintes procedimentos: não obstante as alterações e inovações processadas
pela citada Carta no sentido de buscar o aperfeiçoa­
a) elaboração e publicação, pela mento do arcabouço orçamentário, o processo ainda
SOF, dos quadros de detalha­ carece de aprimoramentos, seja pela utilização não
mento da despesa (Q D D ) por plena de alguns instrumentos, seja pela necessidade
unidade orçamentária de cada de adequação nas relações político-institucionais.
órgão, fundo e entidade,-
Um primeiro comentário decorre do
b) registro no Sistema de Adminis­ chamado pacto federativo, ou, em outras palavras,
tração Financeira (SIAFI) dos da forma de repartição de recursos, competências e
créditos e respectivas dotações, encargos entre a União, estados e municípios. A
aprovados na lei orçamentária,- Constituição extinguiu alguns impostos federais e
aumentou o volume de transferências intergoverna-
c) realização de licitação, convênio, mentais da União para estados e municípios, sem
acordo, ajuste ou outro instru­ empreender a correspondente transferência de
mento congênere, quando for o encargos.
caso,-
De um ponto de vista técnico, a despeito
d) empenho da despesa,- das conhecidas dificuldades políticas envolvidas,
parece fundamental definir urgentemente a responsa­
e) programação financeira de bilidade de cada esfera de governo em relação a
desembolso,- cada tipo de ação governamental, de forma a evitar
que recursos federais sejam carreados para despesas
f) liquidação da despesa,- que, por sua natureza, são típicas de administrações
estaduais ou municipais e, assim, reduzir drasticamen­
g) pagamento da despesa. te as chamadas transferências voluntárias da União
para estados e municípios, limitando tais iniciativas a
d ) Acompanhamento, avaliação e ações de nítida competência federal.
controle interno da execução orça­
mentária pelo sistema de controle Outro ponto a ser observado é a não-
interno dos três Poderes. institucionalização do PPA e, em menor grau, da
própria LDO, como instrumentos importantes para o
e) Controle externo da execução orça­ efetivo exercício das funções de planejamento e
mentária, a cargo do Congresso orçamento e para a racionalização do gasto público.
Nacional e com o auxílio do Tribu­ A revisão do PPA para o período 1 9 9 4 /9 5 ainda
nal de Contas da União. não foi sequer apreciada. Em conseqüência, sua
execução não tem sido acompanhada muito menos
avaliada.
4. A EXPERIÊNCIA DO
ORÇAMENTO APÓS Quanto à LDO , desde 1 9 8 9 tem-se
A CONSTITUIÇÃO DE mantido basicamente como uma lei de aspectos
1988 qualitativos restritivos e que disciplina, a cada ano, a
elaboração e a execução do orçamento. Conforme
salienta Tavares (1 ), “não se deu sentido prático à
Passados cinco anos da promulgação da determinação de que a lei de diretrizes orçamentárias
Constituição de 1 9 8 8 , já se pode realizar uma disponha sobre as alterações da legislação tributária.
avaliação preliminar do referencial técnico-institucional A matéria tributária tramita à parte, fora da comissão
mista e a legislação pode ser modificada até o último
dia do ano para ter efeitos no exercício subseqüen­ raras vezes, não se empenha na aprovação do orça­
te". Em conseqüência, não raras vezes, o processo mento no Legislativo, como o faz, aliás, em outras
de apreciação da proposta no Legislativo sofre inter­ matérias de seu interesse imediato. Isto traz, de outra
rupções ou modificações à conta de alterações na parte, o empobrecimento da discussão orçamentária
legislação tributária, realizadas nos últimos dias do durante o processo legislativo, onde o debate acerca
ano em curso. dos grandes agregados do orçamento, de sua reper­
cussão econômica e das prioridades nacionais acaba
Por outro lado, parece haver razoável cedendo lugar a discussões de caráter mais setorial e
concordância nos meios técnicos quanto à necessida­ localizado, o que pode contribuir, inclusive, para
de de a LD O estabelecer as despesas dos orçamen­ criar um ambiente propício à ocorrência de
tos de forma quantitativa, seja por meio de tetos, ou distorções como apurou, recentemente, uma
por meio de percentuais, seja ao nível de órgão, de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada pelo
função, ou de programa, mas que permita induzir o Congresso Nacional com tal finalidade.
debate parlamentar acerca dos grandes números do
orçamento. Ademais, a experiência acumulada parece
indicar que, como observa Tavares (3 ), "a
A situação atual do processo orçamentário competência hoje tão ampla da Comissão Mista de
brasileiro pode ser debitada, também, em certa Orçamento deve ser reexaminada. Não caberia no
medida, ao período em que, sob a égide da Consti­ texto constitucional prever minuciosamente como se
tuição de 1 9 6 7 , o Congresso viu-se impedido de articulariam as duas Casas do Congresso e suas
emendar e apreciar efetivamente o orçamento. comissões temáticas para fins de apreciação dos
projetos admitindo-se tratar de matéria regimental".
A não-participação do Congresso no
processo orçamentário, durante cerca de duas déca­ Apenas à guisa de breve comparação, no
das, acostumou mal os dois poderes. Fruto direto Congresso norte-americano a proposta é inicialmente
desse período é a aceitação implícita, tanto por submetida è deliberação das Comissões de Orça­
parte do Executivo como do Legislativo, do fato de mento da Câmara e do Senado. Através de reso­
que o orçamento é mera peça de ficção. O Executi­ lução, estas comissões definem os parâmetros de
vo habituou-se a executar o orçamento, segundo sua gasto. Uma vez aprovada a Resolução Conjunta, o
vontade, através de mecanismos de contingenciamen- orçamento é submetido à análise das Comissões de
to ou mesmo através da premeditada intenção de Alocação (treze subcomissões em cada Casa),
acertar, posteriormente, a programação encaminhan­ primeiramente na Câmara e depois no Senado,
do mensagens propondo créditos adicionais. sendo constituídas Comissões Conjuntas para
compatibilizar eventuais diferenças. Além dos limites
Acrescenta Tavares (2 ) que "o Legislati­ da Resolução, as comissões somente podem alocar
vo, na prática participa, pouco da destinação dos recursos em programas previamente aprovados pelas
recursos públicos. Principalmente dois fatores tornam Comissões Permanentes ou Autorizativas.
possível que o Executivo subtraia prerrogativas ao
Legislativo e possa executar os gastos em desacordo
com o programado no orçamento... O primeiro é a 5. CONCLUSÃO
inflação. O segundo é a natureza autorizativa da lei
orçamentária, onde os valores fixados para as despe­
sas são entendidos como tetos. Nessas condições, A primeira vista, o processo orçamentário
despesas computadas no orçamento aos preços ultrapassou as mesmas etapas em diferentes países,
médios (estimados) do exercício podem, a critério quais sejam momentos em que o Legislativo deteve
do Executivo, ser antecipadas ou adiadas em relação maior influência sobre o processo de definição de
a esses preços médios, simplesmente ignoradas, ou prioridades dos gastos públicos e momentos em que
suplementadas, por caber a este poder a iniciativa de o Executivo reteve a supremacia na discussão do
leis em matéria de orçamento." assunto.

Daí decorre que o governo, ciente desta Isto, certamente, verificou-se no Brasil,
sua faculdade durante a execução dos gastos, não onde a Constituição de 1 98 8 cuidou de restituir as
prerrogativas do Legislativo no tocante à apresen­ indicar que um processo orçamentário racional e
tação e aprovação de emendas durante o processo equilibrado passa, sobretudo, pelo fortalecimento e
de apreciação da proposta orçamentária. Face às amadurecimento das instituições democráticas, pelo
imperfeições apontadas no item anterior, a pergunta, efetivo equilíbrio e harmonia entre poderes e pela
que se coloca, indaga o porquê de outros países fiscalização e participação da sociedade civil como
terem logrado maior sucesso no tocante à eficiência conseqüência do exercício pleno da cidadania.
deste processo de alocação de recursos.

Cotejando o processo brasileiro e o 6. REFERÊNCIAS


processo norte-americano, por exemplo, algumas BIBLIOGRÁFICAS
questões mostram-se de forma clara. Nos Estados
Unidos, a peça orçamentária não é considerada peça
de ficção, inclusive porque apresenta caráter (1 ) TAVARES, José Fernando Cosentino. A
mandatório e não apenas autorizativo. Isto obriga, Matéria Orçamentária na Revisão Constitu­
entre outros aspectos, a que os poderes se vejam na cional. Tributação em Revista. A no 2, n° 6,
necessidade de se articular e de se empenhar conjun­ p. 1 3. Brasília: 1 9 9 3 .
tamente em produzir, efetivamente, uma lei orça­
mentária executável. (2 ) ibidem, p.6.

Vale mencionar também a complexidade e (3 ) ibidem, p. 14.


o tempo de duração do processo norte-americano
(1 8 meses), diferentemente do Brasil onde, não
raras vezes, o processo é conduzido "a toque de
caixa”, ao apagar das luzes da sessão legislativa.

Outro aspecto importante é a estrutura de


assessoramento envolvida nos dois países. Enquanto
no Brasil o assessoramento é realizado pelas assesso-
rias da Câmara e do Senado que, em conjunto, tota­
lizam cerca de 30 assessores, nos Estados Unidos só
o Congressional Budget Office dispõe de aproxima­
damente 1 8 6 assessores.

Iniciativas, também, dignas de destaque


no processo norte-americano são a participação das
comissões permanentes na análise dos orçamentos de
cada setor de governo e a abertura para a partici­
pação da sociedade via realização de audiências
públicas.

Parece, portanto, que a resposta não está


associada, simplesmente, à boa técnica orçamentária,
muito embora esta se constitua em elemento impres­
cindível no sentido de viabilizar um processo orça­
mentário racional e efetivo, uma vez que a discussão
orçamentária é, antes de tudo, uma discussão política
acerca de quais prioridades governamentais a socie­
dade pretende ver concretizadas a partir da utilização
dos recursos públicos.

Nesse sentido, as experiências de outros


países, em especial da norte-americana, parecem
7. BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição: República Federativa do


Brasil. Congresso Nacional. Brasília: 1988.

TUBAKI, Edson M . Processo de Elaboração,


Execução e Acompanhamento Orçamentário da
União. Monografia apresentada è Escola Nacio­
nal de Administração Pública - ENAP. Brasília:
1989.

G R E G G IA N IN , Eugênio. O Aperfeiçoamento do
Processo Orçamentário no Brasil. Monografia
apresentada à Escola Nacional de Adminis­
tração Pública - ENAP. Brasília: 1 9 89 .

PISCITELLI, Roberto B. O Projeto da Lei de Dire­


trizes Orçamentárias. Informativo Dinâmico
IOB, ano XIII, n° 49, 1989.

SANCHES, Osvaldo M . Relatório da Viagem de


Estudos aos EUA. Assessoria de Orçamento e
Fiscalização Financeira. Câmara dos Deputados.
Brasília: 1 9 9 3 .

TAVARES, José Fernando Cosentino. A Matéria


Orçamentária na Revisão Constitucional. Tribu­
tação em Revista. Ano 2, n° 6. Brasília:
1993.
SÃO AS PROPOSTAS DE REESTRUTURAÇÃO
DO SISTEMA DE PLANEJAMENTO FEDERAL
E DE CRIAÇÃO DA SECRETARIA FEDERAL
DE CONTROLE COMPATÍVEIS COM O
NOVO PARADIGMA DO ESTADO ?

LUIS CARLOS DE CERQUEIRA SA

Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e


Chefe da Divisão de Assistência Social da Secretaria de Planejamento e Avaliação da SEPl_AN/PR

atividades de planejamento, orçamento,


RESUMO
acompanhamento, avaliação, controle e fiscalização.

Não se pode negar a importância da


ste trabalho tem, pois, por objetivo analisar as reformulação e integração destes segmentos da ativi­

E propostas governamentais de reestruturação do


Sistema de Planejamento Federal e de GiaçSo da
Secretaria Federal de C ontrole à luz do mais recente para­
dade governamental. Não se pode deixar de reco­
nhecer que a desmontagem e desestruturação dos
sistemas de planejamento, orçamento e controle foi
digma acerca da atividade d o Estado, o qual foi desenvolvi­ antecedente indispensável para a ocorrência dos
do a partir de estudos sobre experiências inovadoras, reali­ desmandos apurados. Diante do quadro de tamanhas
zados por autores como David O sbom e e John Friedmann. irregularidades, é preciso tapar os ralos da R epúbli­
Este novo paradigma do Estado, que pode ser chamado de ca. Por outro lado, não se pode esquecer que o
paradigma do Estado Empreendedor e Catalisador, mais moderno referencial teórico acerca da reformu­
contrapõe-se ao paradigma tradicional do Estado Burocráti­ lação do Estado inclui elementos inequívocos de
co, de origem W eberiana. Investiga, também, se as propos­ descentralização de decisões, de flexibilização de
tas governamentais são compatíveis com as premissas do controles e de gestão participativa. O anúncio
novo paradigma, além de elencar sugestões para a sua maior destas medidas numa época de protesto público
conformidade com o novo arcabouço conceituai. diante da corrupção pode suscitar a idéia de que as
mesmas constituem aquele tipo de resposta anacrôni­
ca dos Estados burocratizados e ineficientes: fortale­
cer cada vez mais o centro governamental, concen­
1. INTRODUÇÃO trando competências e recursos, centralizando as
decisões e os controles, diante da ameaça de qual­
quer crise. Estar-se-ia, assim, mais uma vez, na
O governo federal prepara-se para editar contramão da história?
medidas no sentido da reestruturação do Sistema de
Planejamento Federal e da criação da Secretaria Antes de proclamar a inoportunidade
Federal de Controle. Estas ações são uma resposta, destas ações, ou diagnosticar seu caráter irremedia­
dentre outras causas, à grave crise provocada com a velmente corporativista e burocratizante, há que
comprovação de irregularidades no gasto público por estudá-las mais profundamente, à luz do novo para­
parte da CPI do Esquema PC e da CPI do Orça­ digma da atividade estatal, o qual foi produzido
mento. Procura, deste modo, o governo tratar da recentemente com base em estudos sobre tendências
matéria de acordo com o conceito integral do ciclo inovadoras. Muitas contradições aparentes podem
da gestão dos recursos públicos, que compreende as desfazer-se após uma leitura menos apressada deste
referencial, ou depois de uma adaptação do mesmo
à realidade nacional. Pode-se, ainda, sugerir capacidade de gestão para efetivamente levar a bom
correções e ajustes às propostas governamentais, a termo as funções identificadas"(1). O eixo da
fim de melhor compatibilizá-las com as últimas questão, portanto, é a busca da compatibilização
tendências. entre o projeto político da sociedade e a capacidade
de governo. Há que se encontrar um equilíbrio
dinâmico entre os anseios de uma sociedade cada
2. REFERENCIAL vez mais diversificada e a capacidade de resposta do
TEÓRICO ACERCA aparelho estatal. Em outras palavras, é preciso
DA REFORMA DO aumentar a produtividade do sistema político.
ESTADO
O CONTEXTO D A
D IM E N S Ã O P O L ÍT IC A X G O V E R N A B IL ID A D E
D IM E N S Ã O G E R E N C IA L
Evidentemente, o movimento de reforma
O debate sobre as mudanças do Estado do Estado não se dá no vácuo. O perfil do Estado
tem evoluído incessantemente. A té há pouco tempo, desejável depende de requisitos de governabilidade
tratava-se da questão de forma superficial, sob os quais não se tem total controle. Há que se
entendendo-se a reforma do Estado como uma mera levar em conta as transformações por que passam a
reforma administrativa, de caráter exclusivamente estrutura social, a organização política, a conjuntura
técnico e burocrático. Logo verificou-se que a verda­ econômica e os padrões culturais. Pode-se enumerar
deira reforma estatal tem, além do aspecto gerencial, algumas das variáveis que devem ser consideradas: o
um importante compontente político-institucional. O progresso tecnólogico, a crise econômica, a globali­
que se tem por objetivo não é a mera modificação zação da economia, a democratização, a polarização
dos aspectos puramente administrativos; busca-se a entre ricos e pobres, a urbanização e a substituição
transformação do aparato político básico do Estado da sociedade de massas pela sociedade da infor­
em seu conjunto. Não se trata apenas de fazer ajus­ mação. Este contexto exige mudanças na estrutura e
tes técnicos modernizadores; há que se pensar no funcionamento do aparelho estatal, tais como a
também na revisão de prioridades e no estabeleci­ flexibilidade de gerenciamento, a descentralização de
mento de um projeto político nacional. competências, a gestão participativa e a parceria com
o setor comunitário. Como coloca Dowbor, "os
Infelizmente, as reflexões a respeito do problemas se deslocaram, mas não o sistema de
tema têm enveredado para a discussão estéril sobre o decisão correspondente. Assim, o que temos hoje é
tamanho do Estado. M uito se tem debatido sobre um conjunto de problemas modernos e uma máquina
quanto governo devemos ter, e não sobre que tip o de governo característica das necessidades institucio­
de governo é eficaz. As opiniões têm-se polarizado nais da primeira metade do século"(2).
nas máximas Estado/planejamento X setor priva­
do/mercado. Os privatistas se apegam à mística da Além disso, os próprios padrões da
minimização do Estado como recurso infalível para modernidade pretendida vêm sendo revisados. Não
incremento da eficiência. Os defensores da estati- há mais espaço para uma modernidade puramente
zação criticam as regras do mercado e defendem uma técnica. Busca-se a construção de uma modernidade
atuação firme do Estado contra o fantasma dos ética, que venha guiar a escolha das prioridades e
monopólios. permitir a incorporação dos setores excluídos do
processo de desenvolvimento. Em lugar da ética do
Entretanto, o problema não se resume a comportamento ou dos procedimentos, surge a ética
Estado de mais ou Estado de menos, mas sim ao das prioridades, a qual é guiada pela ênfase na
tipo de Estado desejável. Como demonstra Kliks- consecução dos fins e não na supervalorização dos
berg, o tema real “não parece ser o do tamanho do meios,- e o fim último do sistema político é a implan­
Estado... mas sim o de reanalisar o papel histórico tação da equidade, com a supressão das barreiras do
do Estado... e chegar a conclusões concretas sobre apartheid social.
o perfil de Estado desejável. A par desta questão
do perfil, a outra dimensão real do tema é a
Todos estas transformações levam a uma status. Estas funções são, essencialmente, aquelas
explosão de com plexidade, com a proliferação dos relacionadas com a catálise e orientação de todos os
atores e a particularização das necessidades e segmentos sociais, visando a ação conjunta destes na
demandas(3). Mais do que nunca, cabe ao Estado resolução dos problemas comuns. O Estado deve,
promover a estabilidade na interação entre os diver­ antes de mais nada, desenvolver o conjunto particu­
sos atores sociais. Urge "desenhar mecanismos capa­ lar de capacidades de inteligência exigidas para este
zes de selecionar o interesse comum nessa avalanche papel de promotor social.
de solicitações, capazes de unir muitos grupos distin­
tos para elaborar uma visão coletiva de futuro"(4).
O Estado assume cada vez mais o papel de prom o­ R E D E FIN IN D O A A T IV ID A D E
to r socia l, ou seja, de orientador e catalisador dos E S TA TA L - A S FUNÇ Õ ES
agentes e recursos sociais. INTELIGENTES

A fim de poder se adaptar ao ambiente


G E R IN D O A M U D A N Ç A de mudanças e cumprir seu papel de catalisador
social e de indutor da inovação, o Estado deve se
O que se pode afirmar com certeza é que preparar para o pleno exercício de suas funções inte­
acabou o tempo da estabilidade. Governar é antes ligentes. Estas funções dizem justamente respeito ao
de mais nada gerir mudanças. Como bem colocou conjunto de capacidades necessárias para orientação
Osborne, "o surgimento de uma economia global dos agentes sociais e a modificação de seu compor­
pós-industrial, baseada no conhecimento, abalou tamento. Além disso, incluem os requisitos
velhas realidades em todo o mundo, criando oportu­ necessários para a definição das políticas públicas e a
nidades maravilhosas e problemas espantosos"(5). A avaliação dos resultados efetivamente alcançados.
cada dia, novas variáveis se tornam importantes, ao
passo que outras perdem relevância. O equilíbrio da O pleno exercício das funções inteligentes
governabilidade não é estático e sim dinâmico: a do Estado pressupõe a "des mistificação dos
síntese das necessidades e demandas dos diversos meios"(7), ou seja, mais importante do que o modo
atores assume contornos diversos a cada momento. como as coisas devem ser feitas, mais importante do
O aparelho estatal deve ser cada vez mais flexível, que o controle da ação estatal, são os objetivos deli­
adaptável, pronto a produzir novas respostas, quan­ neados e os resultados produzidos. Não se pode
do as condições as exigirem. divorciar a atividade estatal do Projeto Nacional,
deslocando os procedimentos e controles gerenciais
Uma postura crítica neste sentido é a para a condição de fins em si mesmos. O esforço
adoção de uma orientação para a inovação. O Esta­ para normatizar e controlar a intervenção estatal não
do deve adotar mecanismos estimulantes de compor­ pode fazer com que se perca de vista os resultados
tamentos e práticas inovadoras. As normas rígidas alcançados. Pelo contrário, a mensuração cuidadosa
devem ser substituídas pela capacidade de reflexão e dos resultados pode minimizar a necessidade de
de adaptação de modelos ao caso concreto. Melhor regras e controles.
dizendo, não existem mais modelos pré-fabricados
de intervenção estatal. Dependendo da situação, o As funções inteligentes do Estado pres­
Estado deve procurar, dentre os vários instrumentos supõem também a existência de um quadro de servi­
de que dispõe, o melhor método disponível para dores altamente qualificados. Aliás, não se pode
atingir os seus objetivos. pensar em qualquer reforma do Estado sem a consi­
deração do elemento humano que a implementa. É
Surge o Estado Empreendedor, aquele preciso dotar o aparato estatal de massa crítica sufi­
capaz de empregar recursos de formas inovadoras, ciente para o bom desempenho de suas funções. O
para maximizar a eficácia e a eficiência(ó). Está aber­ Estado deve ser democrático também para dentro,
ta a temporada da criatividade, da agilidade e da desenvolvendo mecanismos que possibilitem a parti­
flexibilidade. As regras burocráticas perdem espaço cipação dos servidores no processo decisório e a
para o senso de oportunidades e para o bom senso liberdade de ação gerencial. Além disso, há que
em geral. A o lado das funções tradicionais, as estimular a conduta inovadora e criativa destes servi­
funções inteligentes do Estado ganham importante dores, reduzindo ao mínimo os controles e
procedimentos pré-estabelecidos. Evidentemente, a para os níveis mais próximos dos problemas. Antes
delegação de responsabilidades deve ser acompanha­ de mais nada, significa reconhecer os cidadãos como
da de mecanismos efetivos de avaliação de clientes da atividade estatal, ou seja, participantes
desempenho. dotados de opinião e exigentes quanto à qualidade
dos serviços prestados.
Num quadro de rápidas transformações,
função inteligente por excelência é a capacidade de Evidentemente, o Estado não poderá
previsão. Cada vez mais é importante prever o futu­ simplesmente abandonar a prestação burocrática de
ro, antecipar oportunidades e problemas, ao invés serviços e obrigar que a sociedade civil a assuma.
de simplesmente reagir a cada crise. Como afirma Isto não se faz automaticamente. Há necessidade de
Tofler, “na era da informação, a pressão por um conscientizar e estimular as comunidades organizadas
sistema ágil de tomada de decisões fica seriamente a gerir e controlar os serviços que são prestados.
restrita pela complexidade e a pouca familiaridade Além disso, mesmo quando o Estado transfere o
das circunstâncias sobre as quais se deve decidir. O controle sobre determinado serviço, a sua responsa­
resultado é uma sobrecarga esmagadora sobre as bilidade não cessa. Cabe a ele zelar para que o
tomadas de decisões - em essência um choque políti­ serviço seja prestado dentro dos padrões de qualida­
co do futuro"(8). Dentro de um ambiente de exigidos. Em nenhuma hipótese pode o Estado
democrático e face a particularização de demandas, o abdicar de seu papel orientador.
Estado deve ser capaz de prever os movimentos dos
diversos atores sociais, preparando-se antecipada­ Dentro deste quadro, assume importância
mente para sinalizar e corrigir eventuais desequilíbrios o chamado terceiro setor, o conjunto das organi­
ou desvio de rumos. Na verdade, está se caminhan­ zações não-governamentais voluntárias e não-
do para o que Tofler chamou de "Democracia Ante- lucrativas (O N G s). Este setor é composto por enti­
cipatória" (9 ). dades sob o controle privado, mas que existem para
atender a necessidades públicas ou para fornecer
bens coletivos. A fim de poder cumprir seu papel
A S N O V A S RELAÇÕES catalisador, o Estado vem se retirando cada vez mais
E S T A D O -C ID A D A N IA da prestação direta de serviços, confiando sua
execução a este setor voluntário.
Como não poderia deixar de ser, os
requisitos de governabilidade, o rápido ritmo de
mudança do contexto social e as novas funções do O N O V O P A R A D IG M A D O
aparelho estatal exigem uma reformulação total das ES TA D O
relações Estado/cidadania. O Estado não pode ser
mais um mero prestador de serviços para uma popu­ Todas essas mudanças na atividade estatal
lação passiva e desorganizada. Pelo contrário, a ativi­ leva-nos a uma certeza: está-se diante de uma crise
dade estatal deve incorporar mecanismos que incenti­ do paradigma tradicional do Estado. Parece ser a
vem a capacidade de ação econômica e política da concretização das profecias de Drucker acerca da
sociedade civil. Formas inovadoras de parcerias entre falência da burocracia(11). O paradigma do Estado
o setor público e o setor privado devem ser desen­ Burocrático, tão influenciado por Max Weber, não
volvidas, tais como a as agências de orientação, a mais explica com exatidão os novos contornos que
terceirização, as franquias vinculadas, os vouchers, as assumem as funções e as estruturas estatais. O Esta­
taxas de utilização e as recompensas. do Prestador de Serviços, guiado por regras e
procedimentos rígidos e inflexíveis, e impregnado de
É preciso promover a participação da mecanismos de controle por toda parte, não mais
cidadania na formulação de objetivos e desenvolver existe,- ou pelo menos, não deveria.
um sistema de gestão participativa. Sem dúvida, é
necessário dar poder aos cidadãos, ao invés de O novo paradigma passa por um Estado
simplesmente serví-los(10 ). Dar poder significa promotor e catalisador, empreendedor e inovador,
delegar atribuições e substituir controles burocráticos além de parceiro da sociedade civil. A o invés de
pelo controle direto das agênciais estatais por parte prestar diretamente serviços, o novo Estado procura
da comunidade; significa descentralizar a autoridade preferencialmente catalisar e orientar as forças
produtivas do próprio tecido social, delegando Evidentemente, a aplicação deste paradig­
competências, descentralizando a autoridade e ma ao Estado brasileiro, por exemplo, requer algu­
permitindo a gestão participativa. O novo Estado mas adaptações, já que o mesmo foi elaborado com
cria mecanismos democráticos internos, franqueando base em observações sobre países desenvolvidos.
a livre participação de seus servidores e estimulando Neste caso é interessante adicionar alguns elementos,
a inovação no exercício da atividade pública. Subsiti- sugeridos por Kliksberg, em seu livro Como Transfor­
tui o controle minucioso de todas operações pela mar o Estado: para além de m itos e dogmas, uma
atuação livre mas responsável destes servidores. Para vez que sua análise é orientada para os países latino-
ele, o mais importante é a realização dos objetivos e americanos. O autor lembra que países como o
a consecução de resultados desejados, não o fiel Brasil atravessam um período de grave crise econômi­
cumprimento de normas. É o Estado que leva em ca dentro de um processo de democratização políti­
consideração a opinião dos cidadãos e procura ca. A combinação destes dois fatores cria demandas
desempenhar suas funções dentro de padrões social­ específicas sobre o perfil de Estado desejável(1 3).
mente aceitos de qualidade. Além disso, é o Estado Nestes países, ainda não se completou o precesso
preventivo, que procura induzir os atores sociais a de legitimação e estabilização das instituições. Além
aproveitar oportunidades inesperadas e enfrentar disso, a sociedade civil não se encontra em níveis
crises imprevistas, sem precisar aguardar por ordens desejáveis de organização e de capacidade de ação
vindas de cima. econômica e política. Pode-se citar algumas das
demandas específicas nos países em
Esquematicamente, e socorrendo-se do desenvolvimento:
arcabouço conceptual de David Osborne, pode-se
desagregar o novo paradigma do Estado nos seguin­ 1 - Grande pressão para tornar produtivo
tes componentes (1 2): o gasto público.

1- Estado catalisador e promotor 2- Maior necessidade de sistemas inte­


social. grais de controle da gestão estatal
diante da incapacidade da sociedade
2- Estado controlado pela sociedade civil de exercer um efetivo controle
civil. direto.

3- Estado competitivo e aberto a várias 3- Maior necessidade de capacidade


parcerias com o setor privado e o preventiva e de estratégia seletiva em
setor comunitário. função da escassez de recursos.

4- Estado orientado por missões e não 4- Maior preocupação com a arbitrarie­


por normas e procedimentos. dade burocrática e com a garantia da
igualdade.
5- Estado avaliador de resultados e
não de processos. 5- Maior demanda pela utilização de
programas multi-institucionais.
6- Estado sensível às demandas de seus
cidadãos. 6- Maior compromissio social do
Estado.
7- Estado empreendedor.
Certamente, as peculiaridades dos países
8- Estado preventivo. em desenvolvimento exigem que a passagem do
paradigma antigo para o novo seja mais lenta. Não
9- Estado descentralizado. se pode passar, da noite para o dia, de um Estado
centralizado e burocrático para um Estado orientaG(or
10- Estado sinalizador do mercado. e indicativo sem os requisitos mínimos de educação
política, de legitimação institucional e de organização
da sociedade civil. Nestes países, a reforma do
Estado se dá paralelamente à construção da Mesmo nas décadas de sessenta e seten­
cidadania. ta, ápice de sua utilização, o planejamento não
chegou a constituir um sistema. Havia, isto sim; um
planejamento normativo, centralizado, de cima para
3. ANÁLISE DA baixo, onde não havia uma verdadeira troca de infor­
PROPOSTA DE mações com os órgãos setoriais; estes já recebiam o
REESTRUTURAÇÃO plano pronto, sem possibilidade reais de influenciar o
DO SISTEMA DE processo de tomada de decisões.
PLANEJAMENTO
FEDERAL Outro fator que impossibilitou a institucio­
nalização de um sistema de planejamento foi a
ausência de mecanismos eficientes de acompanha­
A V A L IA Ç Ã O D A EXPERIÊNCIA mento e avaliação dos programas executados,
H IS T Ó R IC A DE P L A N E J A M E N T O impedindo-se a indispensável retroalimentação do
processo de planejamento. Raramente conseguiu-se
N o Brasil, a exemplo do que ocorreu mensurar o desempenho de determinado investimen­
para o conjunto da América Latina, o planejamento to ou aporte financeiro. A alocação de recursos
vivenciou sua fase áurea ao lonso da década de 6 0 públicos a programas e projetos, ao longo dos últi­
e até meados dos anos 70. A crise do planejamen­ mos anos, foi feita de forma errática e pouco criterio­
to, deflagrada a partir do final dos anos 70, coinci­ sa, promovendo distorções que, acumuladas, resulta­
diu com o agravamento das pressões inflacionárias, ram na pulverização dos recursos e na perda da
com a queda do ritmo de crescimento e com a proli­ capacidade de investimento. A continuidade ou não
feração das demandas sociais decorrente do processo de um programa dependia de fatores políticos ou
de democratização. eleitoreiros, não da sua capacidade de gerar resulta­
dos ou modificar uma realidade.
Desde então, o planejamento assumiu
papel secundário no contexto da gestão pública, Incapaz de avaliar resultados e apresentar
deslocando-se o eixo das preocupações do Estado sugestões calcadas em fatos concretos, o Sistema de
para as questões conjunturais ou de curto prazo. Planejamento Federal foi sendo deslocado do
Não há dúvida que muitos planos foram elaborados processo de decisão. Cada vez mais o Sistema de
nesse período da crise do planejamento; entretanto, Orçamento foi assumindo seus espaços e determi­
foram logo suplantados por sucessivos planos de nando que tipos de programas deviam ser mantidos
estabilização. Na verdade, os planos de longo prazo ou cortados. A prática de orçar prim eiro para depois
se transformaram em exercícios desvinculados da planejar foi se institucionalizando. Um exemplo disto
realidade, tendo pouca ou nenhuma influência efetiva é a competência da Secretaria de Orçamentos, e
sobre a orientação da ação estatal. não da Secretaria de Planejamento e Avaliação, em
elaborar a Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Forçoso é reconhecer, por outro lado,
que o esvaziamento das atividades de planejamento
se deu, antes de tudo, por causa de características O P LA N E JA M E N TO A T U A L
intrínsecas do próprio sistema de planejamento
implantado. Aliás, pode-se dizer que o Brasil nunca O Sistema de Planejamento Federal hoje
teve um sistema completo de planejamento. Nunca encontra-se completamente esvaziado. Está-se numa
se institucionalizou um processo permanente e inte­ siuação pior do que na época do planejamento auto­
grado de planejamento, nem a prática de planeja­ ritário e centralizado, onde bem ou mal existia um
mento foi incorporada definitivamente na cultura planejamento normativo. A queda do sistema antigo
gerencial dos órgãos públicos. O que predominou não impulsionou a criação de um modelo alternativo,-
foi um planejamento pro forma, ritualístico, com ênfa­ pelo contrário, o planejamento normativo foi substi­
se no plano-documento e não na atividade de tuído pelo planejamento formalístico, despido de
planejamento. qualquer capacidade de direção da atividade gover­
namental. Os planos são apenas documentos
formais, elaborados para atender a uma exigência
legal qualquer e sacrificados rapidamente por deman­ Não existe também integração com os
das do curtíssimo prazo. As iniciativas de planeja­ órgãos setoriais,- ainda não estão institucionalizados e
mento de longo prazo estão quase totalmente parali­ sedimentados os canais de comunicação da
sadas ou, então, adormecem esquecidas nas SEPLAN, cabeça-de-sistema do Sistema Federal de
prateleiras. Planejamento, e as Coordenações-Gerais de Planeja­
mento Setorial dos ministérios. Estas Coordenações,
A própria Constituição de 1988 contri­ por sua vez, têm estrutura extremamente débil, em
buiu para a debilidade do planejamento. Não há termos materiais e de recursos humanos. Além disso,
referência explícita nem descrição de um Sistema de estão vinculadas às Secretarias de Administração-
Planejamento Federal, mas sim a enumeração Geral dos ministérios, ao invés de estarem ligadas
descoordenada de um grande número de planos e diretamente às Secretarias Executivas ou aos Gabine­
orçamentos, além da prescrição de um complexo tes do Ministros.
processo para sua elaboração. O texto constitucional
também não enfatiza de forma clara a competência Falta, ainda, uma definição e distinção
essencialmente coordenadora e orientadora da clara das atribuições da SPA e dos órgãos vincula­
União, confundindo suas atribuições com as dos dos à SEPLAN, como o IPEA e o IBGE. Estes
estados e municípios e misturando as noções de dois últimos, por sua vez, vivenciam um forte proces­
planos nacionais, planos regionais e planos setoriais. so de esvaziamento institucional e achatamento sala­
Além destes últimos, os instrumentos principais de rial que compromete a sua própria existência como
planejamento criados pela Constituição, não obstante centros de excelência. Percebe-se, também, falta de
constarem da Secão dos Orçamentos, são o Plano entrosamento entre a SEPLAN e outros órgãos
Plurianual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias. O importantes do ponto de vista da atividade de
PPA e suas revisões são, apesar dos esforços dos planejamento, como a SAF (estabelecimento de
setores envolvidos na sua elaboração, sistematica­ carreiras, treinamento, concursos públicos), a SAE
mente ignorados no processo de decisão política. (responsável pelo planejamento estratégico), o
Por outro lado, as LDOs têm sido extremamente Ministério da Integração Regional (reponsável pelo
confusas, estabelecendo prioridades conflitantes planejamento regional), a Secretaria de Política
entre si e exorbitando o domínio da matéria Econômica do Ministério da Fazenda e o Ministério
orçamentária. das Relações Exteriores.

Pode-se perceber facilmente que conti­


nuam os mesmos problemas do passado, como a DESCRIÇÃO S U C IN T A D A
falta de institucionalização de um processo perma­ PROPOSTA
nente e integrado de planejamento e a ausência de
mecanismos de acompanhamento e avaliação. A Segundo a proposta de reestruturação do
SEPLAN mostra-se incapaz de promover a coorde­ Sistema de Planejamento Federal, o novo sistema
nação dos órgãos envolvidos no planejamento federal terá como objetivo coordenar, acompanhar e avaliar
e a integração dos planos regionais e setoriais. Na o processo de planejamento do governo federal,
verdade, as dificuldades da SEPLAN começam mediante ações permanentes, articuladas, participati­
dentro de casa. As próprias Secretarias de Planeja­ vas, integrativas e dinâmicas, que permitam contínua
mento e Avaliação, de Orçamentos e de Assuntos melhoria da eficiência e dos resultados da ação do
Internacionais não trabalham de forma integrada. A setor público, de forma articulada com as demandas
troca de informações é extremamente deficiente,- não da sociedade. A proposta adianta que o novo siste­
é raro a SEAIN se engajar em projetos internacionais ma deverá ser estratégico, mais ágil, flexível, partici­
que não se coadunam com as prioridades da SPA. pativo e eficiente, adequado aos novos tempos,
A SOF trabalha de maneira autônoma, dentre outras sintonizado com a sociedade, capacitado para dar as
coisas, pela própria fragilidade da SPA. O planeja­ referências, diretrizes, objetivos, metas e instrumen­
mento fica è reboque do orçamento e este, por sua tos de ação do setor público e balizar as ações do
vez, permanece à mercê das disposições do Tesouro setor privado.
Nacional, estabelecendo-se o paradoxal planejamen­
to de boca do caixa. Está prevista a reestruturação das
Coordenações-Gerais de Planejamento Setorial,
passando estas a se subordinar ès Secretarias Executi­ consecução dos objetivos nacionais,- uma política, de
vas dos Ministérios e ganhando maior status e poder mediação, buscando a conciliação de demandas e
de atuação. Contempla-se, também, a aquisição de procurando estabelecer um equilíbrio dinâmico entre
equipamentos e sua distribuição, o estabelecimento o Projeto Nacional, a capacidade de governo e os
de um programa de treinamento para capacitação do requisitos de governabilidade. O próprio Osborne
pessoal técnico e administrativo, a criação de uma reconhece que o Estado "em muitas áreas, ainda teria
carreira de planejamento e a abertura de concurso a responsabilidade de prover fundos e determinar
público para preenchimento de vagas. políticas, mesmo sem prestar serviços. Entre elas se
incluem....áreas de planejamento, que vão além da
Componente imprescindível da proprosta competência de estados e municípios, tais como o
é a elaboração, implantação e operacionalização de comércio internacional, as políticas macro-econômicas
um Sistema de Acompanhamento e Avaliação das e grande parte das políticas ambientais"(1 5).
ações do governo, a fim de garantir a retroalimen-
tação do processo de planejamento e permitir ajustes Além disso, a reestruturação do Sistema
e correções de rumo. Este sistema será implantado de Planejamento Federal é compatível com o
em módulos, conferindo-se prioridade às ações que componente preventivo do novo paradigma. Cada
representem aplicação direta de recursos financeiros vez mais é importante não só prevenir problemas,
no cumprimento, pelo setor público, de suas funções como também antecipar o futuro. Como orientador e
alocativa e redistributiva. sinalizador da sociedade, o poder central precisa
mais do que ninguém ser capaz de prever o futuro e,
Os trabalhos para reestruturação do Siste­ mais importante, de tomar no presente decisões
ma de Planejamento serão executados mediante a baseadas na previsão do que vai acontecer, procu­
coordenação e participação de técnicos da rando rapidamente obter consenso sobre as novas
Coordenação-Geral de Planejamento da SPA/ diretrizes traçadas. Somente um Estado que planeja
SEPLAN, com a colaboração do IPEA e do IBGE pode ser um Estado Empreendedor. Somente um
e, numa segunda fase, com a colaboração de técni­ Estado que planeja pode antecipar oportunidades e
cos dos setoriais de planejamento dos ministérios. criar novas formas de aplicação de seus recursos.
Num mundo de rápidas transformações e de segmen­
tação de interesses, por mais paradoxal que possa
A N Á L IS E D A P R O P O S T A À L U Z parecer, somente um Estado Planejador pode ser um
D O N O V O P A R A D IG M A Estado Inovador.

Parece evidente que não existe uma A proposta de reestruturação do Sistema


contradição intrínseca entre a proposta de reestrutu­ de Planejamento Federal, quando prevê a organi­
ração do Sistema de Planejamento Federal e o novo zação de um Sistema de Acompanhamento e
paradigma do Estado. Não se trata, necessariamente, Avaliação das Políticas Públicas, é compatível com
de uma medida burocratizante, fortalecedora do os componentes de orientação por objetivos e de
poder central. O componente descentralizador do avaliação de resultados do novo paradigma. A ênfa­
novo paradigma não é absoluto. Há um princípio se aos meios e procedimentos dá lugar à priorização
norteador, qual seja, aquele segundo o qual "a dos objetivos ç da consecução de resultados. Isto
menos que haja uma importante razão obrigando em possibilita a flexibilização de controles, a delegação
sentido contrário, a responsabilidade pela resolução de responsabilidades e a redução do aparato
dos problemas deve cair sobre o mais baixo nível burocrático. Cria-se uma estrutura responsabilizante,
governamental possível"(1 4).
pela qual o agente público é diretamente responsável
por sua perfomance, ao invés de estar protegido
O planejamento federal tem, pelo menos, pela impessoalidade das normas burocráticas.
duas funções imprescindíveis: uma técnico-
operacional, como instrumento de gestão - a de
coordenação do desenvolvimento, estabelecendo
políticas nacionais que contenham uma visão
estratégica orientadora da evolução do país e articu­
lando as ações dos diversos setores com vistas à
4. SUGESTÕES DE principalmente por meio da integração das
ALTERAÇÕES NA Coordenações-Gerais de Planejamento Setorial (dos
PROPOSTA PARA ministérios, autarquias e fundações), restruturadas e
MAIOR dotadas de maior autoridade funcional e política.
CONFORMIDADE
COM O NOVO O planejamento indicativo implica num
PARADIGMA Sistema de Acompanhamento e Avaliação de
Programas completamente descentralizado, sob a
supervisão dos órgãos setoriais e locais, e com meca­
Apesar de não se ter diagnosticado qual­ nismos que levem em consideração a opinião e o
quer incompatibilidade intrínseca entre a proposta de nível de satisfação das populações beneficiárias, tais
reestruturação do Sistema de Planejamento Federal e como pesquisas de opinião e consultas a grupos
o novo paradigma de reforma do Estado, é preciso representativos. Os próprios órgãos setoriais e locais
incluir na mesma algumas garantias contra o viez é que devem delinear as variáveis a ser mensuradas e
centralizador e burocratizante. Em primeiro lugar, há os critérios de avaliação do sistema. Ênfase deve ser
que se permitir a participação dos órgãos setoriais e dada à avaliação qualitativa (capacidade de gerar
seccionais desde a concepção até a implantação do resultados desejados) e não à avaliação quantitativa
Sistema, ao invés de oferecer-lhes um pacote pron­ (capacidade de gerar volume de produção) ou à
to. Pode-se criar um grupo de trabalho integrando avaliação financeira (eficiência do processo de
recursos humanos da SEPLAN, das entidades vincu­ produção).
ladas (IPEA e IBGE) e das Coordenações-Gerais
de Planejamento Setorial. Além disso, a proposta Por outro lado, pode-se delegar a
deve explicitar categoricamente o papel orientador e medição do desempenho dos programas a uma
catalizador do poder central a fim de reduzir os agência local independente, privada ou voluntária, a
riscos da revigoração de um planejamento normativo, fim de permitir maior confiabilidade e controle social
de cima para baixo. no processo de avaliação. O poder central deve
dispor apenas de um pequeno staff que se ocuparia
Na verdade, este é o grande problema da da avaliação de políticas (e não de programas),
proposta: o de não explicitar o perfil de planejamen­ contando com um sistema de informações agregador
to a ser implantado. Há apenas referências genéricas dos dados repassados pelos órgãos setoriais e procu­
ao seu caráter coordenador, participativo, flexível e rando redirecionar recursos para os setores mais
ágil É necessário estabelecer com clareza o tipo de eficazes.
planejamento que se quer. Provavelmente, o melhor
a fazer é traçar as linhas de um planejamento indicati­
vo, tal como existe no Japão. A época do planeja­ 5. ANÁLISE DA
mento onipresente e onipotente já acabou. O plane­ PROPOSTA DE
jamento federal deve cuidar apenas de traçar as dire­ CRIAÇÃO DA
trizes e políticas mais genéricas, deixando para os SECRETARIA
outros níveis de governo e para os outros setores da FEDERAL DE
sociedade a desagregação destas diretrizes e políticas CONTROLE
em instrumentos de intervenção mais diretos. A fim
de garantir o controle popular sobre o estabeleci­
mento de prioridades, pode ser criado um grande DESCRIÇÃO S U C IN T A D A
conselho com representantes de diversos segmentos PROPOSTA
da sociedade, a exemplo do que já ocorre, a níveis
estadual e municipal, no Rio Grande do Sul. Já em novembro de 1 9 9 2 , a Lei n°
8 4 9 0 criava a Secretaria Central de Controle, reti­
O planejamento federal deve cuidar, rando do rol de competências da Secretaria do
também, da coordenação das ações dos órgãos seto­ Tesouro Nacional aquelas pertinentes ao controle
riais e seccionais de governo, compatibilizando os interno. Além de uma resposta à onda de currupção
objetivos da sociedade com as restrições dos recur­ que assolava o país, a medida procurava limitar as
sos públicos. Esta coordenação se deve dar influências políticas sobre as CISETs, uma vez que
estes órgãos seccionais de controle encontravam-se controlar o dinheiro público não poderá comprome­
subordinados aos respectivos ministros. Entretanto, ter a capacidade de administrá-lo bem? Será que a
esta Secretaria Central nunca foi efetivamente criação de uma superagência de controle é a melhor
estruturada. resposta para enfrentar a crise da corrupção e das
irregularidades?
A nova proposta do governo prevê a
transformação da Secretaria Central de Controle em Evidentemente, a adaptação do novo
Secretaria Federal de Controle, que responderá pela paradigma a um país em desenvolvimento como o
auditoria, fiscalização e avaliação de gestão e acom­ Brasil atenua a incompatibilidade da proposta com as
panhamento dos programas de governo. Caberá à novas tendências de reforma do Estado. O processo
Secretaria a coordenação, supervisão técnica e orien­ incipiente de legitimação das instituições pressiona
tação normativa dos órgãos regionais, setoriais e pela maior presença de mecanismos tradicionais de
seccionais do Sistema de Controle Interno. Inte­ controle da ação dos agentes públicos. Além disso,
grarão a Secretaria Federal de Controle as unidades a ausência de uma sociedade civil plenamente organi­
seccionais do controle interno (CISETs) dos órgãos zada dificulta a adoção preferencial de mecanismos
da Presidência da República e dos ministérios civis, de controle social direto sobre as agências estatais.
as unidades regionais do controle interno nos esta­
dos, denominadas Delegacias Regionais de Controle Pode-se acrescentar, ainda, em defesa da
e a Corregedoria-Geral do Controle Interno. Esta compatibilidade da proposta com o novo paradigma,
corregedoria será criada com o objetivo de acompa­ o fato de que a mesma não se preocupa apenas com
nhar as atividades técnicas do sistema e o desempe­ o controle sobre as entradas - normas e recursos, mas
nho funcional dos agentes públicos que o compõem. também com o controle sobre as saídas - resultados
(1 6 ). Não se pensa apenas em averiguar o fiel
A proposta inclui como atribuição da cumprimento de normas e procedimentos administra­
Secretaria Federal de Controle a avaliação das metas tivos. O objetivo do controle supera a mera reali­
previstas no Plano Plurianual, da execução dos zação de auditorias de caráter contábil e financeiro,
programas de governo e dos orçamentos da União, incluindo o acompanhamento dos programas e
além da avaliação dos resultados, quanto à eficiência avaliação da eficiência e eficácia dos gestores públi­
e eficácia, da gestão orçamentária, financeira e patri­ cos. A proposta é compatível, pois, com os compo­
monial dos órgãos da administração federal, bem nentes de orientação por objetivos e de avaliação de
como da aplicação de recursos públicos por entida­ resultados do novo paradigma.
des de direito privado. A proposta contém também
disposição sobre o acompanhamento de programas e Indubitavelmente, existe o risco de que a
o controle preventivo dos gastos públicos, indo proposta de criação da Secretaria Federal de
muito além das noções de auditoria financeira e Controle assuma caráter preponderante de medida
contábil. centralizadora e burocratizante. E preciso prescrever
com clareza a descentralização das ações de auditoria
para as unidades locais, ficando o órgão central
A N Á L IS E D A P R O P O S T A À L U Z responsável apenas pela coordenação dos órgãos
D O N O V O P A R A D IG M A setoriais e seccionais, além da supervisão técnica e
orientação normativa. Neste sentido, deve-se garan­
Uma primeira análise da proposta de tir a delegação de competências aos responsáveis
criação da Secretaria Federal de Controle parece pela ação de controle local, conferindo-lhes poder
indicar que a mesma não é compatível, pelo menos real de decisão e autonomia para ajustar o sistema ás
em parte, com o novo paradigma do Estado. Parece peculiaridades locais.
a reedição de medidas típicas do Estado B urocráti­
co, como a multiplicação e centralização de contro­ Pode-se estimular a participação da socie­
les. Numa época em que se valoriza a capacidade dade civil no processo de controle, estabelecendo-se
de inovar e de aproveitar as oportunidades inespera­ canais diretos de comunicação e parcerias entre os
das, uma proposta como esta pode soar como um órgãos locais de controle e entidades privadas/vo­
soco no estômago dos agentes públicos empreende­ luntárias. A medida que o controle social se organi­
dores. Será que a preocupação demasiada em ze, as estruturas tradicionais de controle devem ser
revistas e até reduzidas. Outro aspecto importante é
criar mecanismos para que os cidadãos sejam perma­ 6- Há no país um forte viez centraliza­
nentemente informados sobre os dados da execução dor e burocratizante, que deve ser
orçamentária, financeira e patrimonial da União. mitigado com a adoção de medidas
que garantam a delegação de
Por outro lado, cabe sugerir que o Siste­ competências e responsabilidades.
ma de Controle Interno se restrinja aos aspectos de
auditoria financeira e contábil, deixando-se o acom­ 7- O planejamento federal cumpre rele­
panhamento e a avaliação de programas para as vante missão de coordenação do
estruturas respectivas do Sistema de Planejamento. É desenvolvimento e de mediação dos
difícil imaginar órgãos típicos de auditoria, como os atores sociais.
do Sistema de Controle Interno, conduzindo a bom
termo uma avaliação qualitativa de programas e 8- Somente um Estado preventivo pode
políticas. O mais provável é que se deixem contami­ ser um Estado inovador, minimizador
nar pelo viez financeiro e escriturário, concentrando de riscos e aproveitador de oportu­
atenções sobre as entradas e não propriamente sobre nidades inesperadas.
as saídas ou resultados alcançados.
9- A proposta de reestruturação do
Sistema de Planejamento Federal é
6. CONCLUSÕES E compatível com o novo paradigma,
RESUMO DAS conquanto que se explicite o caráter
PROPOSTAS apenas coordenador do órgão
central, que se permita a participação
dos órgãos setorias na concepção do
Pode-se, esquematicamente, sistematizar sistema, e que se garanta o controle
as conclusões e propostas do trabalho da seguinte popular sobre a definição de
forma: prioridades.

1- O paradigma do Estado Burocrático, 10- Deve-se partir para a implantação de


Prestador de Serviços, está em crise. um planejamento federal de tipo
indicativo, que trate apenas de traçar
2- Surge um novo paradigma do Estado diretrizes e políticas mais genéricas,
Catalisador, Prom otor e Empreende­ deixando-se a desagregação das
dor. mesmas para outros níveis de gover­
no ou para outros setores da
3- Cada vez mais o Estado se guia pela sociedade.
delimitação de objetivos e pela
consecução de resultados e não pelo 1 1 - 0 planejamento indicativo implica
fiel cumprimento de normas e num Sistema de Acompanhamento e
procedimentos. Avaliação descentralizado, com ênfa­
se sobre a mensuração qualitativa dos
4- Cada vez mais o Estado permite a resultados alcançados e com mecanis­
atuação livre dos agentes públicos, mos que possibilitem auferir constan­
criando em contrapartida, uma estru­ temente o nível de satisfação da
tura responsabilizante, onde cada um população beneficiária.
responde por seu desempenho.
1 2- A proposta de criação da Secretaria
5- N o novo paradigma assume grande Federal de Controle , como qual­
importância o controle das agências quer medida de multiplicação de
estatais pela sociedade civil e as controles, parece contradizer, pelo
parcerias entre o setor público e os menos em parte, o novo paradigma.
setores privado e voluntário. Existe o risco de vir a ser medida
marcadamente centralizadora e (5 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.
burocratizante. Op.cit.

1 3- Deve-se explicitar o caráter apenas (6 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.


coordenador do órgão central de Op.cit.
controle e garantir a autonomia dos
responsáveis pelo controle local.
(7 ) KLIKSBERG, Bernardo. Op.cit.

14- O processo incipiente de legitimação


(8 ) TOFLER, Alvin. A n ticip a to ry Democracy.
das instituições e a ausência de uma
Cit. In: OSBORNE, David & GLAEBER,
sociedade civil plenamente organiza­
Ted. O p.cit., p .2 7 4.
da justificam parcialmente a maior
presença de mecanismos tradicionais
de controle no Brasil. (9 ) TOFLER, Alvin. A n ticip a to ry Democracy.
Cit. In: OSBORNE, David & GLAEBER,
1 5- À medida que aumente o grau de Ted. O p.cit., p .252.
organização da sociedade civil,
devem ser reduzidas as estruturas de (1 0 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.
controle interno e ampliados os Op.cit.
mecanismos de controle social.
(1 1 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.
1 6 - 0 Sistema de Controle Interno deve Op.cit.
se restringir à auditoria financeira e
contábil, deixando-se o acompanha­
(1 2 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.
mento e avaliação de programas para
Op.cit.
as respectivas estruturas do Sistema
de Planejamento.
(1 3 ) KLIKSBERG, Bernardo. Op.cit.

7. REFERÊNCIAS (1 4 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.


BIBLIOGRÁFICAS O p.cit

(1 5 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.


(1 ) KLIKSBERG, Bernardo. Como Transformar o Op.cit.
Estado: para além de m itos e dogmas.
Brasília, ENAP, 1 9 9 2 . 87p. (1 6 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.
Op.cit.
(2 ) D O W BO R, Ladislau. Governabilidade e
Descentralização. Curso de Aperfeiçoam ento
em P olíticas Públicas e Gestão Governamen­
ta l - EN AP, Brasília, 1 99 4 .

(3 ) KLIKSBERG, Bernardo. Op.cit.

(4 ) OSBORNE, David & GLAEBER, Ted.


Reinventando o Governo. Como o E spírito
Emprendedor Está Transformando o S etor
P úblico. Brasília, M H Comunicação, 1994.
4 36 p .
8. BIBLIOGRAFIA

BUARQUE, Cristovam. A Revolução nas Priorida­


des. Curso de Aperfeiçoam ento em Políticas
Públicas e Gestão Governamental- ENAP,
Brasília, 1 99 4 .

DO W BO R, Ladislau. Governabilidade e Descentra­


lização. Curso de Aperfeiçoam ento em P o líti­
cas Públicas e Gestão Governamental- ENAP,
Brasília, 1 99 4 .

H O L A N D A , Nilson. Introdução à Teoria do


Planejamento. Curso de Aperfeiçoam ento em
P olíticas Públicas e Gestão Govemamental-
EN AP, Brasília, 1 99 4 .

KLIKSBERG, Bernardo. Como Transformar o Esta­


d o: para além de m itos e dogmas. Brasília,
E N A P , 1992. 87p.

OSBORNE, David & GLAEBER, Ted. Reinventan­


do o G overno. Como o E spírito Emprendedor
Está Transformando o S etor Público. Brasília,
M H Comunicação, 1 99 4 . 436p.

TAVARES, José Fernando Cosentino. A Matéria


Orçamentária na Revisão Constitucional. Tribu­
tação em Revista, Brasília, 6 :5 -2 3 , Out./Dez.
1993.
A COORDENAÇÃO COMO
INSTRUMENTO DE
MODERNIZAÇÃO E DE
APERFEIÇOAMENTO DO
SERVIÇO PÚBLICO
CIRO GUARANI PENNAFORT
Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e
Gerente de Projetos do Instituto de Pesquisa Econômica A plicada - IP E A

dos órgãos encarregados e com o treinamento de


RESUMO profissionais.

Os enunciados deste trabalho, apesar de


feitos em forma generalizada, não partem de uma
ob jeto deste trabalho foi inspirado na necessida*

O
teorização e muito menos pretendem sê-lo. Cada
de de uma reforma do Estado que o tome apto
aspecto ou consideração levantados a respeito da
a enfrentar os desafios atuais segundo a perspec­
matéria em tratamento são constatações e conclusões
tiva ética e de se desenvolver mecanismos e instrumentos de
produzidas a partir de experiências concretas - suces­
planejamento e gerenciamento do setor público, com o fim
sos e fracassos - e que o autor procurou organizar
de lhe prover eficiência, transparência e capacidade de
numa exposição geral e estruturada. É verdade que
cumprir o papel que « situação presente exige.
esse tipo de enfoque expõe o trabalho ao risco de
estar reinventando a roda, sobretudo por ignorar a
Demonstra, também, a importância de se articular ações no
literatura existente sobre o assunto, mas pode apre­
ím b ito do conjunto de serviços prestados to público,
sentar o mérito de ser calcada sobre problemas verifi­
governamentais ou não, através de profissionais dotados
cados e apontar as vias de solução dentro da realida­
com visão generalisU sobre o universo institudonal e as
de do âmbito de tais problemas, no caso o serviço
questões que o envolvem.
público.

2. A MULTIFORME
1. INTRODUÇÃO AÇÃO DO ESTADO

O presente texto mostra que o Estado, O quadro problemático do Brasil, sendo


conquanto deva ser considerado um ente juridica­ atualmente grave, aponta para uma progressiva dete­
mente uno, freqüentemente aparece como arena rioração, constatação que impõe concluir que sua
contendo entidades alheias ou conflitantes entre si e superação não se produzirá por mecanismos
que, portanto, requerem um mecanismo aglutinador espontâneos ou automáticos a se gerar no meio
para que sua existência e atuação adquiram racionali­ sócio-econômico, ativáveis num contexto de cada um
dade em torno de objetivos comuns. A necessidade p o r si. A construção do país, portanto, exigirá uma
de articulação das diversas áreas leva a se considerar iniciativa que produza ações eficazes, capazes de
a função de coordenação como aspecto a ser desta­ promover as transformações de que a nação carece.
cado nos esforços da reforma administrativa, a ser Por se tratar de ações vastamente abrangentes e, ao
prestigiada notadamente com o apoio consensual das mesmo tempo, que devem ser unificadas, orientadas
forças políticas, com o fortalecimento institucional
por objetivos e metas que importem a todos, e por O tema informação engloba os esforços
transcenderem tais ações ao interesses particulares, a nas áreas de educação e de desenvolvimento científi­
iniciativa e o comando de sua realização caberá ao co e tecnológico, indispensáveis para que o país
Estado. adquira capacidade reativa perante os desafios de
um mundo em constante mudança. A reforma p o líti­
Em decorrência da grande variedade com ca comporta as amplas discussões objetivando aque­
que se apresentam os problemas nacionais, de diver­ las mudanças de que o país necessita para que a
sas naturezas, deverá, igualmente, ser a ação do vontade nacional possa ser fielmente expressa e
Estado, que pode ser enfeixada em cinco grandes adequadamente veiculada e cumprida, bem como as
linhas temáticas: gestões para aprovação e implementação de tais
mudanças. A reforma institucionalvisa dar ao Estado
a) desenvolvimento econômico,- um instrumental eficiente, transparente e ágil, para
que possa desempenhar o papel de manter o
b) resgate social; equilíbrio social, de promover o desenvolvimento do
país e de assistir ao cidadão.
c) domínio do espaço geográfico,-
/

E perceptível que a descrição das linhas


d) informação,- temáticas acima, apesar da forma muito sucinta, deixa
ver que, longe de se excluir ou se contrapor, elas
e) reforma política e institucional. têm implicações entre si e comportam ações que se
completam. Aliás, é tarefa do Estado vincular os
A primeira linha consiste da adoção de diversos setores de atividade às linhas que o direcio-
políticas, de medidas e de regras funcionais que narão, mostrando que a classificação proposta nada
propiciem estabilidade e confiabilidade que, por um mais é do que enfoque orientativo de um mesmo
lado, fundamentem a expansão econômica e, por conjunto de ações, que se articulam em teia matricial
outro, contrabalancem a tendência concentradora de que disponha os setores englobando o que se faz ou
riqueza da economia atual, conciliando o crescimento se fará no país, em cruzamento com os temas que
da produção com sua distribuição geográfica e com a lhes poderão servir de pauta num programa de
participação das diversas camadas da população. governo.

O resgate social atinge o grande e cres­ Fica assim demonstrada a grande varieda­
cente segmento da população que não tem como se de e complexidade que caracterizam as funções e
posicionar num mundo competitivo, uma vez que se papéis do Estado, reclamados tanto pela situação
exclui do mercado e da educação, assim como da atual do país como pelas suas características estrutu­
saúde, da previdência, da assistência e da justiça. A rais. Tal variedade demanda do Estado uma plurali­
ação do Estado nesta linha temática pretende colocar dade de sistemas e de órgãos de atuação específica,
a faixa desprotegida da população em condições de que colimem suas atribuições com os segmentos das
participar do processo de desenvolvimento, dele situações-problemas a que se reportam. A consta­
tornando-se tanto agente como beneficiária e nele tação da diversidade, que tenderia a diluir e disper­
antevendo oportunidades reais de promoção. sar a ação do Estado, destaca a necessidade de se
canalizar as medidas dentro de determinadas políticas
O dom ínio do espaço geográfico visa que lhes dêem consistência e as façam frutificar.
capitalizar para a Nação o formidável ativo de sua
superfície e subsolo, do espaço aéreo e da faixa
oceânica. Para tanto, comporta as medidas que 3. HARMONIZAÇÃO
confiram o exercício efetivo de domínio sobre o ENTRE OS AGENTES
território, em atenção à sua importância como área
de ocupação racional, como reservas de riquezas e
mesmo como suporte de ação geopolítica, incluindo A variedade e complexidade que envol­
políticas de assentamento, de exploração, de preser­ vem a ação do Estado - e, conseqüentemente, sua
vação e de defesa. organização - sujeitam-no á iminência de ocorrer
contradições internas entre as atividades de seus
órgãos (1 ), em razão quer da oposição natural que tais formas serão estabelecidas em consonância com o
caracterizam determinados objetivos, quer das dispu­ programa pactuado. Do consenso resultará a
tas que inevitavelmente surgem entre as unidades, renúncia, por parte do político, de interferir em
especialmente quando não há uma determinação decisões da administração, limitando-se às atribuições
superior clara que as circunscreva em atribuições, normais de apresentar pleitos e, de forma objetiva,
alcances e competências (2 ). As contradições inter­ defender-lhe os méritos. A renúncia à interferência
nas refletem também as oposições partidas de fora, começaria por se respeitar os quadros técnicos dos
da parte de grupos ou personalidades com represen­ órgãos, o que diminuiria o risco de critérios parciais
tação no Congresso e até mesmo na administração preponderarem sobre razões técnicas, definidas em
direta e indireta, que apresentem interesse em que se consonância com orientações adotadas por consenso
produzam ou se evitem determinadas medidas. da maioria das forças políticas, e mesmo sobre razões
legais.
Além das diferenças de natureza contra­
ditória ou conflitante, os órgãos públicos estão, Ainda dentro do aspecto político de
ainda, sujeitos aos riscos do alheamento do resto da busca da unidade no serviço público, deverá ser
administrarão, desconhecendo uma área o que se faz prestigiado o princípio da cooperação interinstitucio-
alhures. E quando acontecem as repetições anti­ nal, mediante a adoção de uma praxe de concertos
econômicas de determinadas atividades, paralelas e entre os órgãos, - quando necessário, sob a arbitra­
desconexas, não raro criando alguma confusão no gem da autoridade - com vistas a se manter um
público destinatário e resultados adversos para os processo de harmonização interna para melhor e mais
próprios órgãos executores. Outro risco do alhea­ eficazmente poderem cumprir seu papel. Requer-se,
mento entre os órgãos é planejar-se e executar-se para tanto, um consenso mínimo entre os diversos
ações ineficazes, perniciosas ou ilegais pelo desco­ segmentos da burocracia no sentido de ser prestigia­
nhecimento, da parte do decisor ou planejador, de do o trabalho conjunto. É claro que as condições
implicações que possam ter em outros campos domi­ acima apontadas estão em estreita dependência da
nados por outros órgãos (3 ). Há, finalmente, os ação da autoridade que, por meio do seu poder de
riscos de se produzir conflitos de natureza temática, liderança política e institucional, vier a imprimir no
de determinada ação contradizer as intenções mani­ serviço público o princípio do mútuo respeito e da
festadas em atividades de outras áreas. cooperação entre as áreas que o compõem.

A tendência ao alheamento e a contra­ A o lado das medidas de natureza política,


dições dentro do serviço público são problemas que, a harmonização interna será obtida pela via técnica
para ser atenuados, deverão ser focalizados sob o da implantação e efetivo funcionamento de canais
prisma da legitimação e em perspectiva política e dinâmicos de comunicação e interação entre suas
técnica. Por medidas de legitimação entende-se o áreas, a ser especialmente ativos quando tais áreas
envolvimento da sociedade, via entidades represen­ tratarem de objetivos, destinatários ou campus de
tativas dos segmentos interessados, na discussão das atuação afins ou idênticos. Em outras palavras, as
políticas, na determinação das atribuições e no atividades públicas deverão existir sob coordenação,
controle do funcionamento dos órgãos encarregados confiada a órgãos específicos, institucionalmente
da implementação (4 ). A presença do público estáveis e dotados de determinadas compe­
destinatário, bem como de outras entidades que tências. (5 )
possam coadjuvar o Estado, nos ciclos em que se
desenvolver a ação - discussão, planejamento, Aos órgãos que promovem a coorde­
execução, avaliação - concorrerá para reduzir o nação, portanto, caberá a função de garantir o
bizantinismo das querelas internas, em benefício de processo de racionalização das ações, mediante
maior sensibilidade pelos problemas e maior empe­ aproveitamento otimizado de cada participante, com
nho em sua solução. vistas ao direcionamento pré-estabelecido.

A o lado da interação com a sociedade,


há que se estabelecer um pacto político em torno
não só de um programa de governo como um respei­
to às formas de proceder da administração, já que
4. A COORDENAÇÃO Após o mapeamento dos parceiros, o
coordenador definiria o seu procedimento perante o
grupo, a forma como que conduzirá os trabalhos, o
A coordenação promove a convergência enfoque dos assuntos e sua apresentação aos partici­
de esforços em torno de determinado objeto, sob pantes. Significa dizer que traçará sua estratégia de
orientação de objetivos e metas estabelecidas, visan­ liderança e de diálogo e a metodologia a ser
do obter determinados resultados. Supõe, de um imprimida.
lado, da concorrência de mais de uma entidade
co-agente, dotadas de diferentes naturezas, modos Outro lado da fase elaborativa da coorde­
de operar e finalidades institucionais e, de outro, um nação é preparar o conhecimento, pelos agentes
objeto que lhes seja comum (tema, área geográfica, participantes, da ação proposta a ser empreendida.
público beneficiário etc), pertinente à proposta de Elabora-se, então, a exposição, dentro da estratégia
intervenção (atividade, projeto, programa ou plano). adotada, contendo um desenho prévio do que virá a
ser o detalhamento das operações. Observa-se que,
O problema que se propõe à coorde­ enquanto as primeiras medidas dizem respeito exclu­
nação é dar organicidade às ações dos agentes de sivamente ao coordenador, para subsidiá-lo em sua
forma que se cumpram as metas pretendidas. Trata-se tarefa, o segundo é uma elaboração a ser apresenta­
de ação interativa entre os agentes, dentre os quais da aos coordenadores, geralmente concretizada em
o público interessado. texto-base que se proporá à discussão dos agentes,
do que resultará o produto da colaboração - a defi­
Caberá, portanto, á coordenação o papel nição corresponsável do que fazer.
de estabelecer, de forma dialogada com os demais
participantes, a linha de trabalho comum, definindo- Na fase chamada didática, o coordenador
se as funções, incumbências e responsabilidades, os toma a palavra inicial sobre a atividade a ser desen­
métodos e procedimentos dos trabalhos (4 ). volvida, o que se busca alcançar, o que se espera de
cada participante. Apresenta-se o traçado básico da
Na atividade coordenativa, podem-se ação, fielmente vinculado ao que deve ser empreen­
distinguir quatro fases: a elaborativa, a didática, a dido. Não é demais destacar a importância do expo­
negociai e conclusiva, devendo-se notar que este sitor (coordenador) nessa fase, do que dependerá a
esquema poderá ser adotado tanto como pauta de compreensão, pelos demais, tanto do assunto como
assembléia ou como apenas distinções de um proces­ de seu papel. É bom lembrar que a exposição inicial
so continuamente refeito, retomado e (assim como a elaboração) poderá também ter diver­
retroalimentado. sos autores entre os co-agentes, dependendo da
diversidade de competências que o assunto venha a
A elaboração é um planejamento que o requerer.
coordenador faz da atividade a ser desenvolvida em
conjunto com os demais participantes. Consistiria, A negociação, a terceira fase, são as
inicialmente, de um levantamento das características discussões a partir da exposição inicial pelo coorde­
de cada agente, como o modo de operar, os objeti­ nador, quando se receberão os retornos dos partici­
vos institucionais, os objetivos, metas e resultados pantes - sua própria elaboração, sua expectativa
esperados na atividade, as áreas de conhecimento quanto à atividade proposta, seu entendimento de
que dominam, a doutrina e a linguagem que adotam como devem participar etc. Por se tratar de fase alta­
e outras particularidades que venham a ocorrer. mente interativa, é nesse estágio que a habilidade do
Obter-se-á, com tanto, um traçado do perfil de coordenador será mais intensamente posta à prova,
cada agente, dentro de parâmetros que os tornem pois se lhe requererá a capacidade de inteligir as
comparáveis e em que se identifiquem as interfaces argumentações de cada agente e reproduzí-las em
que possam multiplicar os resultados das ações dos linguagem neutra que facilite a compreensão pelos
componentes (6 ). Seriam especialmente levados em demais, de conduzir os debates em linha que possa
conta os aspectos de oposição potencializada - harmonizar as diferentes posições, de contra-
política ou funcional - de modo a se prevenir contra­ argumentar as posições que se afastem dos propósi­
dições e impasses. tos da atividade e, finalmente, de realizar a síntese
do pensamento dos agentes (vide conclusão, a serem executadas, necessitam da ajuda de outros
seguir). agentes. Estes figurarão como simples coadjuvantes
e, destarte, sua participação seria subordinada à
Dentro do princípio de que tudo é nego­ orientação e coordenação do órgão interessado. O
ciável, o grupo poderá chegar até a contestar o princípio, entretanto, não tem validade absoluta,
próprio esquema de ação proposto, cabendo ao pois a localização do problema de maior magnitude
coordenador, em tal caso, conciliar os diferentes poderá recomendar diferentemente (7 ). As ativida­
posicionamentos para a obtenção de conclusão des chamadas plurissetoriais envolvem agentes em
consensual. Nos casos em que a participação envol­ mesmo nível hierárquico de interesses e, pela
ve profissionais de semelhante nível de formação e abrangência dos seus objetivos e complexidade das
experiência, bem como nos casos de ação continua­ operações e por seguirem um plano de âmbito mais
da e repetida, os trabalhos se podem desenvolver largo que o dominado pelos agentes, são geralmente
sem necessidade de maiores cuidados em planeja­ confiadas a órgãos com atribuição específica para
mento e escolha de estratégias, uma vez que já existe coordená-las (8 ).
um consenso prévio sobre como proceder.
A escolha do coordenador poderá, ainda,
A conclusão dará a versão definitiva das ser condicionada pelas esferas da administração
concordâncias obtidas na fase negociai, quando se envolvidas. O nível federal, por sua abrangência,
terá composto o produto das discussões. Exprimir- preferirá ao estadual, assim como este ao municipal.
se-á em linguagem técnica, mas de intelecção univer­ O princípio, entretanto, assim como os demais, não
salmente acessível e terá três funções básicas: precisará ser necessariamente seguido quando as
características da atividade não recomendarem.
a) definir os entendimentos mediante a
unificação do discurso,-
6. REQUISITOS PARA A
b) estabelecer as ações a ser executadas,- COORDENAÇÃO
c) distribuir incumbências e atribuir
responsabilidades. As unidades de coordenação - as coorde-
nadorias - serão dotadas de competência funcional
Ocorrendo impasses ou pontos de para estabelecer contatos com qualquer outra organi­
discordância, deverão estes ser demonstrados com zação com que venham a apresentar interface ou que
clareza e com propostas de solução para rediscussões desenvolvam ação que interesse à atividade coorde­
em outros níveis ou, se for o caso, para arbitragem nada, para o que precisará contar com facilidades de
das autoridades. informação, de comunicação e de trânsito.

Pela primeira, terá a possibilidade material


5. QUEM DEVE de acesso a dados que a instruam sobre o universo
COORDENAR institucional e as atividades a que se reporte - as
entidades com que poderá operar. Além de se
louvar nas fontes externas disponíveis, a coordenação
De um modo geral, a coordenação deverá irá constituindo, com registro e classificação de
caber ao órgão a quem respeita o componente mais dados provenientes de seu trabalho, uma fonte
importante da atividade a ser desenvolvida. A unida­ autóctone de informes, que em muito auxiliarão no
de coordenadora, entretanto, será definida preferi­ planejamento de futuras atividades e em revisões
velmente por ato da autoridade superior ou por aperfeiçoativas de sua estruturação e modo de
consenso entre os agentes. operar.

A decisão será condicionada pelo tipo de Os cuidados no aspecto comunicativo


ação conjunta a ser encetada. Há atividades que visam manter canais de acesso às outras entidades,
interessam a um só setor e, conseqüentemente, com identificação e classificação dos interlocutores.
cabem ao órgão correspondente, mas que, para Por ser a coordenação uma atividade entre elementos
localizados a distância, a agilidade e a capacidade participantes e nas sínteses e reproduções que fará
do serviço de comunicação constituem requisitos de do que deles receber.
perceptível importância, ao ponto de ser esse aspec­
to geralmente o que sofre hipertrofia em certas áreas A formação multidisciplinar é também
de coordenação, que freqüentemente limitam sua importante porque a coordenação exige um percurso
tarefas a intermediar os co-agentes, veiculando pelas linhas e intersecções da rede temático-setorial
correspondências e retransmitindo informes. Uma proposta no início deste trabalho, ou de outras
questão prática que se pode tornar importante é matrizes dois esquemas que venham a ser elaboradas
conciliar a necessidade da agilização no tráfego de para explicar a complexidade que envolve a apli­
mensagens - o que sugere distribuir o poder de cação de políticas às atividades que se desenrolam
expedir comunicação entre os membros da equipe - no país. Em outras palavras, requer uma aptidão para
com a necessidade de serem tais mensagens revesti­ se familiarizar com diversos ramos da atividade e para
das de formato minimamente homogêneo e de compreender as opções de direcionamento que
conteúdo absolutamente coerente com o restante do poderão sofrer em função das diferentes políticas
discurso da unidade coordenadora, bem como de adotadas.
ser o titular mantido informado do que se faz na
coordenação. De qualquer forma, a escolha entre A o lado do preparo intelectual, serão de
centralizar ou delegar dependerá de cada equipe utilidade (que às vezes se podem tornar decisivas)
coordenadora, do grau de entendimento vigente algumas qualidades pessoais como habilidade na
entre os membros, da sua capacidade de assimilação propositura da questão e na negociação e capacida­
dos princípios e padrões, da natureza do que deve de de gerar ação, uma vez que está sempre presente
ser veiculado, do canal utilizado e do nível a tendência à antítese, quando não à inércia ou
protocolar. mesmo à resistência da parte do co-agente. Como se
trata de trabalho sob forte influência de relações
As facilidades de trânsito prevêem um pessoais, a componente artístico-criativa terá sempre
contato físico do coordenador com as entidades e seu espaço entre as qualidades desejáveis do coor­
com as realizações da atividade coordenada. Como denador, pela qual poder-se-á expressar de maneira
se viu acima, as fases chamadas neste trabalho de motivadora ao apresentar as propostas.
didática, negocia/ e conclusiva, apresar de algumas
vezes poderem ser realizadas a distância, freqüente­ Apesar desta função apresentar traços
mente exigem a presença dos envolvidos em definidos de qualificação, a ponto de justificar a
reuniões. As visitas a realizações in loco são também realização de cursos especializados para treinamento
necessárias para se avaliar o andamento da execução de profissionais, não se justificaria enquadrar seus
de determinada atividade, bem como para se conferir detentores numa categoria a parte, algo como uma
e avaliar relatórios recebidos a respeito. carreira específica. Deveriam os adestrandos em coor­
denação ser escolhidos dentre os membros das
carreiras existentes, notadamente as que requeiram
7. O PROFISSIONAL DE de seus membros treinamento, reciclagem e ativida­
COORDENAÇÃO des nos ramos de conhecimento e habilidades que se
mais aproximem do perfil do coordenador (9 ).

A atividade de coordenação, por revestir-


se de características próprias e definíveis, exige ser 8. AVALIAÇÃO DA
confiada a profissionais do serviço público que apre­ ATIVIDADE
sentem um perfil apropriado ao tipo de problema COORDENADORA
que apresenta. O homem de coordenação deve ser
dotado, basicamente, de preparo multidisciplinar que
Ihè permita inteligir as exposições dos interlocutores Uma coordenação exitosa integra os agen­
dos diversos setores de especialização. Por outro tes e o público interessado num processo de
lado, dotar-se-á também de qualidades didático- discussão-execução com aproveitamento máximo da
comunicativas para se fazer claro nas exposições aos capacidade de cada um, produzindo com eficiência
os resultados esperados. As incumbências da
coordenadoria, entretanto, estendem-se também á atividades que se desenvolvem e das realizações que
autoridade a que está subordinada, mantendo-a cien­ se produzem, provendo dados para cruzamento e
te da importância das questões abordadas pela ação intercâmbio de informações.
conjunta, de modo a mantê-la sensibilizada e a
subsidiá-la na defesa, em foro superior, da manu­ A coordenação compõe um processo ç)e
tenção do seu nível de prioridade. O êxito da ação, co-participação, em que se confere ao serviço públi­
portanto, estará condicionado às variáveis contidas co maiores chances de êxito ou de, pelo menos,
nesses dois flancos - os co-agentes e as autoridades. evitar a incorrência de falhas a que ficam sujeitos os
que se consideram donos da questão. A o participar
Não se pode avaliar a coordenadoria pelo em ação conjunta, cada órgão se expõe à discussão
êxito da ação, pura e simplesmente, uma vez que, do grupo, com o que é instado e motivado a aper­
como se viu, depende de variáveis exógenas. Os feiçoar seu modo operativo, que estará a todo
parâmetros, portanto, para o conferimento de seu instante sendo cobrado e observado.
trabalho estão ligados à sua condução do processo
em confronto com a situação-problema: as propo­ Além do aspecto de facilitar a trans­
sições que apresentou, as argumentações que ofere­ parência dos agentes e do que eles fazem, a coorde­
ceu, os recursos que utilizou. Em suma: se empregou nação pode ainda ser veículo difusor de normas,
adequadamente ou não os meios disponíveis para o princípios, métodos e outras inovações que se
sucesso da ação, se foi ou não capaz de garantir o devam imprimir no serviço público, assim como
processo que propôs ou que endossou (e, portanto, centro de captação das reações que tais novidades
não necessariamente os resultados da ação). Nesse possam suscitar e que instruiriam seu aperfeiçoamento
sentido, pode-se afirmar que, mesmo numa ação ou alterações na forma de propositura. Seria um
fracassada, pode ser identificado um coordenador de intermediário, através da coordenadoria ou de qual­
valor (ainda que sua reputação venha a ficar quer outro agente participante, entre - de um lado -
comprometida). as áreas normativas, controladoras, avaliadoras ou
outras áreas de interesse e - de outro - os demais
A o se avaliar uma ação conjunta, é bom agentes envolvidos nas ações conjuntas.
procedimento iniciar pelo exame da atuação da coor­
denadoria, uma vez que funciona como confluência Pelas facilidades que proporciona, a coor­
do tráfego de decisões, como foro de discussões, denação pode ser, ainda, um instrumento para
de acertos e de distribuição de incumbências. A implantação de políticas modernizadoras no setor
análise da atividade nesse lugar organizacional tem a público, como a chamada gestão pela qualidade
vantagem de prover informação sincrônica do seu to ta l ou qualidade e produtividade, bem como para
andamento, assim como de identificar e localizar manter ou elevar o nível de motivação do servidor,
eventuais deficiências. até mesmo suscitando uma discreta e sadia
competição.

9. IMPORTÂNCIA
ESTRATÉGICA DA 10. CONCLUSÃO
COORDENAÇÃO

A harmonização interna do serviço público


Além da finalidade precípua de congregar e a sua modernização - no sentido de capacitá-lo
eficientemente esforços em vista de objetivos, a ativi­ para suas funções no nível de desempenho que o
dade coordenadora pode ser um instrumento que país passou a mais intensamente requerer - são
oferece outras utilidades como subproduto - poucas condições fundamentais para viabilizar a própria
vezes aproveitadas. Por ser ponto de encontro de existência de fato do Estado que, sem um instrumen­
diversas unidades, a coordenadoria é privilegiada to idôneo, não terá como equilibrar as forças dos
pela oportunidade de poder conhecê-las, acompa­ diversos segmentos da sociedade, fazer vigorar as leis
nhar seu funcionamento e com elas interagir. Torna- e liderar a projeção do país para o futuro. Para
se, destarte, uma atividade que oferece diversos tanto, faz-se necessária uma afirmação consensual de
elementos para avaliação dos outros agentes, das vontade política no sentido de respeitar as
instituições e as normas que forem fixadas para o seu 3 ) Como aconteceu nas implementações
funcionamento. de projetos sociais, de atendimento
ao público, em que se expediam
A o lado do consenso na área política, as documentação à clientela em
atividades deverão ensejar um articulação tanto entre desatenção è lei que trata de registros
os órgãos encarregados de seu planejamento e sua públicos.
execução como dos demais órgãos ou entidades que
tratem de assuntos (temas) que possam condicioná- 4) A constatação de malogrados planos
las. Não deverá haver, portanto, ações isoladas, mas e programas do passado recente, de
um entrelaçamento e mútuo condicionamento delas cujas causas de insucesso destacam-se
que resultem numa racionalidade geral das ações do as políticas equivocadas e a desconti-
Estado. nuidade, reforça o argumento da
urgência na busca da viabilidade e da
Um requisito de especial realce para a continuidade através do envolvimento
harmonização do serviço público é a preparação de do cidadão. Foi a falta de um substra­
profissionais para executá-la, dotados com visão to político-social onde ancorar os
generalista, de domínio do universo institucional e compromissos assumidos pelo Estado
dos temas que expressam as grandes questões da nas décadas passadas que levou, sob
atualidade. as pressões das políticas de ajuste, ao
desmonte das conquistas institucionais
na passagem do regime autoritário
11. NOTAS para o atual.

5) A coordenação confiada a órgãos com


1) Para os fins deste trabalho, usa-se o essa função específica supõe ativida­
termo órgão para designar qualquer des de certo nível de complexidade e
unidade do serviço público com auto­ amplitude. Mesmo, porém que seja
nomia suficiente para decidir sobre sua realizada por unidades ou áreas não
participação em atividade de coope­ especializadas - no caso de serviços
ração com outras de mesmo nível elementares e de âmbito restrito - o
funcional ou institucional. importante é que sejam levadas em
conta as peculiaridades da função
2 ) São clássicos os conflitos como os que coordenativa com respeito à sua natu­
podem ocorrer entre as áreas financei­ reza e seu modo de proceder.
ra e os órgãos gestadores numa orga­
nização, assim como entre áreas que 6 ) É visível a ocorrência de tais pontos
demandam liberdade de ação de um em, por exemplo, um programa de
lado e órgãos de controle do outro. profilaxia, em que são casáveis ativida­
Nas entidades públicas, porém, existe des de saúde, educação, dinâmica
uma gama bem mais variada de razões com unitária (atividades que pretextam
para conflitos entre as posições defen­ trabalhos comuns entre membros de
didas que, além das já mencionadas, uma comunidade) etc.
incluem questões que vão das naturais
- como política salarial versus paga­ 7 ) É o caso de uma campanha de saúde
mentos do setor público, importação que envolva unidades das Forças
versus emprego interno etc - até as Armadas, escolas, prefeituras etc,
disputas pelo orçamento e os conflitos como elementos auxiliares. Se o
criados pela burocracia, como defesa problema mais complexo identificado
corporativista de órgãos ou entidades na atividade for o de deslocamento-
ou disputa por campo de atuação. logística, torna-se forçoso concluir que
sua coordenação caberá à entidade
melhor treinada para tanto, no caso,
as unidades das Forças Armadas.

8 ) Como planos de desenvolvimento


local ou regional, cuja montagem são
confiadas a órgãos de planejamento
ou de coordenação.
9 ) Tem dado, às vezes, efeitos desastro­
sos a convicção de que o especialista
em determinada área é o melhor coor­
denador em ações conjuntas naquela
área (um médico na área de saúde,
um economista em programas de
desenvolvimento, um sociólogo em
ação social etc.). O coordenador tem
função de natureza metodológica,
formal, negociai, comunicativa, ficando
os aspectos materiais dos assuntos sob
a atribuição dos co-agentes
especialistas.
-

'

.
PLANEJAMENTO
Objetivos, Equívocos, Dimensões

________________JOSÉ RAIMUNDO PEREIRA COMES


Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, e
Coordenador de Modernização do M inistério dos Transportes

Os problemas enfrentados pelas organi­


RESUMO
zações podem ser classificados como sendo de três
naturezas:

partir da idéia de que quatro objetivos devem 1- problemas derivados do ambiente no

A ser, obrigatoriamente, tratados no Sistema de


Planejamento - efetividade, eficácia, eficiência e
humanização -, apresenta os principais equívocos nos quais
tendem a incorrer nos que militam na área.
qual se encontram inseridas, exigindo
das mesmas que cooperem para o
atingimento de seus objetivos,-

2- problemas derivados da necessidade


Insere alguns enfoques pluridimensionais do planejamento de atingir os objetivos para os quais
como forma de fomentar o debate sobre a possibilidade de foram especificamente criadas,-
torná-los instrumentos de governabilidade.
3- problemas derivados da necessidade
de atender os objetivos dos seus
próprios integrantes, em sentido
amplo, englobando proprietários, diri­
1. INTRODUÇÃO gentes, profissionais, técnicos e todos
os demais empregados ou funcio­
nários.
Sem entrar no mérito das diferentes defi­
nições existentes, porém guardando sempre a noção O tratamento de cada problema identifi­
de planejamento como processo e sistema, e vendo- cado assume complexidade maior justamente devido
o como sistema que constitui parte integrante das à inter-relação que possui com os demais, seja de
organizações, existindo para servi-lás, ou seja, para idêntica ou diversa natureza.
auxiliá-las no equacionamento de problemas, na
busca de soluções e na conseqüente implantação de Acontecimentos recentes permitem ilustrar
medidas definidas como necessárias para que alcan­ com um exemplo banal o que foi acima abordado.
cem objetivos traçados de antemão, pretendemos As denúncias sobre manipulação de verbas pela
aqui submeter à consideração dos interessados no Comissão de Orçamento do Congresso Nacional
tema algumas questões que nos parecem relevantes, escandalizaram a sociedade (ambiente), que tem
com o intuito maior de contribuir para o próprio entre seus objetivos a correta aplicação dos recursos
aperfeiçoamento desta relevante atividade arrecadados pelo Governo Federal; a fiscalização e o
administrativa. controle da aplicação dos recursos inclui-se entre as
finalidades para que existe o poder Executivo (a
própria organização), que tenciona criar uma Secreta­ custo possível, não só para a organi­
ria de Controle Federal; tal providência, no entanto, zação como para a própria sociedade
não se concretiza, por envolver objetivos de inte­ (efetividade) e seus integrantes. A o
grantes da máquina pública (integrantes da própria longo do tempo, este se tornou o mais
organização) que lutam por adequada remuneração acentuado viés do planejamento, que
do seu trabalho, o que faz com que o problema se concentrou na busca de alternativas
assuma elevado grau de complexidade, não só por que minimizem os custos dos meios
isso, como porque elevar a remuneração de compo­ utilizados, para tanto se concentrando
nentes da administração pública afeta as finanças na racionalização de processos e na
governamentais, cujo equilíbrio encontra-se igualmen­ eliminação de desperdícios, sejam eles
te entre as finalidades para que existe o poder humanos, físicos, materiais ou
Executivo, e entre as exigências da sociedade que o financeiros.
elegeu.
4- Humanização - entendendo-se por tal
conceito a adequada satisfação dos
2. OBJETIVOS membros da organização. Não se deve
ter em mente exclusivamente incenti­
vos, estímulos e punições que visem
0 contexto exposto obriga a que o siste­ aumentar a produtividade, assegurar a
ma de planejamento das organizações tenha que lidar lealdade ou garantir a permanência dos
simultaneamente com quatro objetivos: integrantes das organizações, mas sim a
compatibilização permanente das aspi­
1 - Efetividade - como tal entendido o rações das partes envolvidas, e não há
reconhecimento, pela sociedade, de caminho a percorrer para tanto que não
que se trata de organização (muitas o do diálogo e da participação, possi­
vezes informal, ou mesmo sem bilitando visualizar claramente o que
existência legal) que atende às aspi­ pode ser alcançado sem colocar em
rações da coletividade como um todo, risco a sobrevivência da organização a
e não apenas de seus proprietários, que se está integrado, por necessidade
dirigentes, empregados, ou de apenas material ou outro tipo qualquer de
alguns segmentos externos. Em outras motivação.
palavras, trata-se de transformar a orga­
nização em instituição. Uma das armas Atender simultaneamente a este elenco de
prediletas, justamente pelo sucesso que objetivos, de maneira equilibrada, exige que se
faz junto à opinião pública, dos pense o planejamento a partir de múltiplas
adversários da estatização, consiste em dimensões, e não apenas do ponto de vista de
mostrar as empresas estatais como enti­ técnicas científicas, ou pseudo-científicas, por mais
dades voltadas para o atendimento, bem elaboradas e atraentes que nos pareçam.
apenas, dos objetivos de seus empre­
gados ou de poucos, porém podero­ Estabelecer como princípio do planeja­
sos, grupos econômicos. mento que ele deve contribuir para que sejam
alcançados os objetivos máximos da empresa, ou que
2- Eficácia - ou seja, capacidade de o planejamento precede as demais funções adm inis­
obtenção de resultados que a organi­ trativas, sem que tais assertivas sejam devidamente
zação se propôs atingir quando de sua esclarecidas, induz a que, de um lado, se esqueça o
criação. A obtenção de resultados não ambiente externo, inclusive o eco-sistema, e, de
pode, obviamente, se dar em detri­ outro, as próprias pessoas que integram a
mento total da efetividade, o que traz organização.
à tona a questão da complexidade.
Vez que o planejamento "não diz respeito
3- Eficiência - que consiste na obtenção a decisões futuras, mas às implicações futuras de
de resultados compatíveis ao menor decisões presentes" (Peter Drucker), tais implicações
devem ser examinadas de forma abrangente e não Embora a presente abordagem tenha
limitadas aos interesses específicos que a realidade pretensões inovadoras, parece-nos justo mencionar o
parece ditar às organizações. esforço de crítica que vem se desenvolvendo há
vários anos, e que permitiu identificar alguns vírus
A idéia de planejamento, desde Fayol, que contaminaram o planejamento, como o reducio>
vem sofrendo sucessivas reformulações, resultado do nismo econômico, o formalismo e a falta de inte­
esforço dos que se dedicam ao assunto, e da consta­ gração sistêmica.
tação de que os resultados alcançados não corres­
pondem à crença depositada nesse instrumental,
visto sempre como poderoso aglutinador de vonta-_ 3. EQUÍVOCOS
des e ferramenta da racionalidade. Em tempo algum
se aceitou admitir que o planejamento deixe de exis­
tir, por ser algo inerente à natureza reflexiva e pros- O primeiro equívoco no qual tendem a
pectiva do ser humano. incorrer os que militam na área de planejamento, ou
dele pretendem se utilizar, consiste em considerá-lo
A visão do futuro tem papel determinante como mero conjunto de técnicas de elaboração de
na vida do homem. O futuro imaginado, bom ou planos, programas e projetos, aos quais o recurso às
ruim, determina as ações que o precedem no tempo, ciências exatas confere aparente rigor científico e
seja para confirmá-lo, seja para modificá-lo. Todavia, elevado grau de certeza quanto aos prognósticos
o vínculo operacional entre planejamento e futuro estabelecidos e correspondentes métodos de contro­
não tem sido pesquisado. le das ações a serem empreendidas.

Ainda que de forma implícita e incons­ Esta visão equivocada, que termina por
ciente, verifica-se que as pessoas tendem a se posi­ reduzir o planejamento a amontoado de planos e
cionar diante do futuro de duas maneiras: primeira, documentos, de conhecimento e interesse restrito
como se o mesmo resultasse do prolongamento no aos que os produziram, está estreitamente vinculada
tempo da situação atual; segunda, assumindo o futu­ à idéia de futuro lógico, já mencionada, a qual faz
ro como uma situação desejada (fantasias à parte), o com que o planejamento assuma vínculo indissolúvel
que implica necessariamente na definição e explici­ com o passado, pela extrapolação de tendências
tação de valores. Sobre esta segunda maneira nos presentes.
estenderemos em outra parte deste trabalho.
i
Na origem de tal postura por parte dos
A linha de pensamento que trabalha com profissionais do planejamento, encontramos o concei­
a idéia de futuro lógico é a predominante entre os to de causa, a qual, por definição, ocorre antes do
que trabalham em planejamento. Nessa linha, predo­ efeito. Os componentes da realidade atual, assim,
mina como critério de avaliação do "êxito" de um seriam causas de um futuro necessário, e a essência
plano não o seu conteúdo decisório, ou mesmo sua do planejamento estaria em aprofundar o conheci­
contribuição aos objetivos, e sim a exatidão das mento desses componentes atuais, de sua natureza e
previsões adotadas. de suas tendências, de preferência mensurando-os.
A isto se acrescenta o fato de que a metodologia
A extrapolação de tendências, como científica rejeita, por princípio, tudo que não seja
elemento indispensável à tomada de decisões que objetivo, e que objetivo, neste caso são os dados
não podem ser adiadas, o inconformismo com a reali­ disponíveis sobre o presente ou o passado, única
dade atuai, a busca de caminhos para a transfor­ coisa possível de ser conhecida cientificamente.
mação dessa realidade, levam, inevitavelmente, a que
se busque a aprimoração do planejamento, o que A visão do planejamento apresentada,
implicará sempre na crítica sistemática do processo. não obstante ter predominado ao longo do tempo,
Através do questionamento dos resultados chega-se resulta negativa e falha, por basear-se na suposição
à identificação de equívocos que, em circunstâncias e de inevitabilidade do encadeamento dos fatos e suas
oportunidades diversas, levaram o planejamento ao conseqüências, e, ainda, por alicerçar-se nas
descrédito, devendo, portanto, serem eliminadas da condições de viabilidade técnica em dado momento.
sua prática.
Um outro equívoco, este predominante na ambiente), eximindo os planejadores de trabalhar
administração pública, consiste em considerá-lo como sobre elementos considerados subjetivos, exime-os
formalidade burocrática, ritual ou liturgia, a ser também da análise dos objetivos (freqüentemente
cumprido periodicamente. Os Planos Nacionais de mal formulados) e distancia os planejadores da
Desenvolvimento, triste lembrança de passado recen­ execução.
te, e os Planos Plurianuais previstos no artigo 165
da Constituição de 1 9 8 8 , são exemplos patentes A isto acrescente-se o sentimento de ser
do que se poderia apelidar visão burocrática do o planejamento especialidade profissional e organiza­
planejamento, se não quisermos, em boa-fé, tachá- cional, domínio exclusivo de profissionais e órgãos
los de mistificação, instrumentos destinados a produ­ especializados e preparados tecnicamente para
zir a ilusão de que se pretende fazer alguma coisa desenvolver tal atividade, como detentores exclusi­
útil, de maneira racional, em benefício da vos das técnicas de diagnóstico, previsão e alocação
coletividade. de recursos.

No caso dos Planos Plurianuais, tornou-se Esta visão institucional do planejamento,


instrumento que a cidadania ignora, tamanho o predominante nas organizações, exclui de qualquer
descaso com que é tratado por aqueles mesmos que compromisso os que não estejam nele diretamente
os elaboram, e que os alteram a cada momento, sem envolvidos, e impossibilita recolher informações de
qualquer critério. A afirmação de que tal instrumento natureza ambiental e humana essenciais ao perfeito
não funciona pela pretensão de ser globalista, a conhecimento do real e, por conseguinte, atuar
nosso ver inverte a ordem das coisas, sendo a referi­ sobre o mesmo, de maneira eficaz. N o dizer de
da pretensão ao globalismo resultante da falta de Nilson Holanda: "O planejamento não é uma ativi­
metodologia adequada e seriedade na sua dade dos planejadores...Assim também o planeja­
elaboração. mento é importante demais para constituir tarefa
exclusiva dos planejadores".
Trata-se, neste caso, de uma visão p o lítica
(no mau sentido) do planejamento, visto como Se as deficiências apontadas não chegaram
instrumento de divulgação de ideologias e de mobili­ a destruir a idéia de planejamento, conseguiram redu­
zação da sociedade, cujos efeitos são duvidosos, zir em grande escala a importância conferida ao
quando não contra-producentes. mesmo, bem como a confiança depositada nos seus
instrumentos. Por outro lado, indicam a necessidade
Um terceiro equívoco, predominante nos de aprofundar as críticas e corrigir os desvios, a fim
meios acadêmicos, é a prática do planejamento como de que se possa dispor de meios para atuar sobre o
exercício teórico, constituído essencialmente por real de maneira sistemática, racional e produtiva. Para
pesquisas, estudos e diagnósticos da realidade atual tanto, segue-se tentativa de análise de algumas
e suas tendências. dimensões do planejamento.

Para que se aprofunde o entendimento da


natureza de tais equívocos, convém proceder ao 4. DIMENSÕES
exame da visão corrente da atividade de planejamen­
to no interior das organizações, e suas
conseqüências. Como tentativa de superação dos equívo­
cos mencionados, e, por conseguinte, tentativa de
De início, verifica-se que o mais difundido tornar o planejamento mais efetivo e restabelecer sua
conceito de planejamento, o de que se trata de um respeitabilidade, o que aqui se propõe à conside­
conjunto de técnicas, traz implícita a idéia de que ração dos interessados é a incorporação à atividade
estipular objetivos encontra-se fora do domínio desta de um enfoque pluridimensional, que a torne menos
atividade, cabendo-lhe, tão somente, otimizar a limitada e mais participativa. Para tanto se analisam a
combinação de recursos humanos, materiais, físicos e seguir diversas dimensões do planejamento, cuja inte­
financeiros, com vistas a atingir objetivos traçados, gração parece desejável ao fim que se pretende
com o máximo de eficiência. Além de ignorar aspec­ alcançar.
tos anteriormente mencionados (em particular o
O Planejamento como instrumento de A natureza revolucionária desta proposta
resolução de problemas. choca-se tanto com as habilidades técnicas indivi­
duais como com as condições organizacionais do
Esta primeira dimensão do planejamento sistema clássico de planejamento. N o entanto, a
não suscita reações nem de parte dos especialistas na abertura de espaços para que se trabalhe nesta
matéria, nem de usuários ou interessados no proces­ dimensão é essencial até mesmo para que se evitem
so. A identificação de problemas, o conhecimento súbitas derrocadas, das quais até o mundo político
prévio da realidade a transformar, os objetivos a nos dá exemplos, como o da tomada do poder
serem alcançados, o grau de viabilidade, os meios pelos xiitas no Irã, não prevista por nenhum analista
(capacidade da organização) e condições político, e as derrotas dos exércitos soviético e
(governabilidade; credibilidade, no caso de insti­ francês diante dos alemães, na primeira e segunda
tuições governamentais), tudo isto encontra-se, sem grandes guerras, respectivamente.
questionamentos, no âmbito do planejamento, e as
técnicas pertinentes encontram-se, para tanto, satisfa­
toriamente desenvolvidas. O Planejamento como instrumento da
M oral.
Não havendo como responsabilizar proce­
dimentos lógicos por desvios ou ausência de resulta­ A própria identificação de uma realidade
dos, a crítica feita a esta dimensão do planejamento como problema envolve questões de natureza moral,
se reduz, justamente, ao fato de que tende a limitá- ou poderíamos não considerar como problema o fato
lo aos seus aspectos processuais e tecnológicos, de alguém despender três horas por dia para chegar
excluindo os de natureza política, social e humana. ao trabalho, ou de fazer apenas uma refeição por
dia. Também podemos considerar tais coisas como
problemas, porém vistos de ângulos diferentes.
O Planejamento como instrumento de Poderíamos considerá-las como problemas apenas
inovação. por diminuírem a produtividade da mão-de-obra ou
por entendermos que todo ser humano deve dispor
O sistema de planejamento deve estar de melhores condições de vida. Sem os juízos de
voltado para a criação de novas realidades, e não valor ocultos na definição de objetivos, parcela
apenas para a reprodução futura, ainda que melhora­ substancial do planejamento não teria razão de ser.
da ou ampliada em alguns pontos, da realidade A incorporação da moral ao processo de planeja­
atual, através da extrapolação e controle de mento estende-se, necessariamente, aos meios
tendências. propostos para que os objetivos sejam atingidos, e
tira o sistema da condição de servo de decisões
Nesta dimensão, não se tem em mente autoritárias, tomadas em instâncias superiores, e
utilizar o planejamento apenas para instrumentalizar as amplia seu alcance como instrumento a serviço da
organizações com vistas a que se adaptem mecanica­ humanidade.
mente a ambientes futuros, ou se ajustem com rapi­
dez a ambientes mutáveis e dinâmicos. Procura-se Assim, o planejamento passa a trabalhar
construir realidades hipotéticas desejáveis e buscar os com valores para estabelecer que condições futuras
meios de implementá-las, de modo semelhante ao são presentemente desejadas. "No primeiro instante,
dos que perseguem a construção de uma ideologia, tais condições desejadas são constituídas exclusiva­
até mesmo de uma utopia. mente de valores, não havendo nesse momento nada
de factual que possa relevar a natureza desejada do
Adotada esta posição, o futuro lógico futuro. Todavia, uma vez estabelecido um particular
passa a ter uma função menor no processo de plane­ conjunto de valores concernente às condições futu­
jamento, cuja principal preocupação passa a ser a ras, o conhecimento dos fatos e de suas tendências
criação do futuro (ou de futuros), o futuro deseja­ naturais torna-se indispensável para determinar o
do, decorrente de julgamentos e escolhas, sobretudo peso relativo de cada valor particular previamente
de natureza social. definido, podendo-se, em função disso, proceder a
alguns reajustamentos e alterações... E justamente
nesse sentido de tornar mais realistas as condições
futuras desejadas que o futuro lógico desempenha realidade não devessem ser levadas em conta, ou
sua principal função no processo de planejamento" como se fosse impossível verbalizá-las de forma
(PROCENGE, obra citada, pág. 1 2 9 ), e se toma coerente e aplicar às mesmas tratamento
realmente valioso. técnico-científico.

A necessidade de incorporar essa


dimensão moral está bastante clara no Brasil de hoje, O Planejamento como instrumento de
onde as teorias sobre modernidade conduziram ao intervenção interna corporis.
caos social e ao desmantelamento do Estado. Diga-
se, a bem da verdade, que tal fenômeno foi gestado A dimensão do planejamento como instru­
muito antes, no decorrer do regime militar, quando a mento de intervenção na realidade da própria organi­
opção desenvolvim entista deixou de lado os valores zação pode ser evidenciada por dois aspectos.
éticos, sob o pretexto de que o bolo deveria crescer
antes de ser dividido. Em primeiro lugar, não há como obter
resultados do planejamento sem que a organização
Amplia-se, com grande dificuldade, nos como um todo corresponda às expectativas traçadas.
tempos atuais, o reconhecimento de que prevaleceu Neste sentido, o planejamento torna-se, e deve
no Brasil até recentemente uma modernidade técnica, tornar-se, um verdadeiro indutor de mudanças orga­
cuja hierarquia de propósitos é diametralmente opos­ nizacionais, e não apenas no sentido formal de distri­
ta à do que se poderia denominar modernidade buição de funções, tanto quanto necessário a que a
ética : em primeiro lugar, os valores éticos e os obje­ mesma, vista como um dos meios para que se alcan­
tivos, como a construção da democracia e a abolição cem os objetivos, se adapte ou se aparelhe, não só
do apartheid não oficializado, porém existente e assi­ material e fisicamente, ao que dela se exige
/ ou será
milado por larga parcela da população,- só depois exigido para o atingimento das metas. E comum a
então viriam as opções técnicas e a racionalidade constatação de ter sido a própria estrutura com que
econômica, que, para a m odernidade técnica são os se conta a causa primeira do fracasso de planos
valores supremos. muito bem elaborados, por se ter olvidado ser ela o
principal agente e responsável pela cumprimento do
que havia sido proposto.
O Planejamento como instrumento de
aprendizagem. Em segundo lugar, a execução de planos e
programas elaborados exige permanente orientação e
A dimensão do planejamento como instru­ controle dos efeitos das ações executadas sobre o
mento de aprendizagem situa-se na concepção conjunto da organização e sobre as etapas ainda por
mesma do processo de elaboração dos planos. Tanto executar.
quanto possível, e na maior extensão possível, o
processo de planejamento deve envolver usuários, Em suma, o que se pretende, ao incorpo­
executores, e supostos beneficiários. Envolver, no rar tal dimensão é fazer com que a organização
caso, significando fazê-los participar da identificação examine a si mesma e às ações em curso, de modo
dos problemas, do seu correto enunciado e permanente.
descrição, e da definição das metas a serem alcança­
das e dos recursos a serem alocados para tanto.
5. ESTADO E
Não se pretende, obviamente, que as PLANEJAMENTO
técnicas sejam de domínio de todos os participantes,
nem se trata, por outro lado, de apenas apresentar o
que se está fazendo e onde se pretende chegar, o A esta altura, não há como deixarmos de
que se traduziria em mero trabalho de cooptação ou abrir um capítulo para abordar a crise gerencial do
motivação. Implica, no entanto, em eliminar a discri­ Estado brasileiro.
minação de ordem intelectual que define, a p rio ri, os
não especialistas como incapazes de contribuir com o A reforma do Estado ganhou espaço no
processo, como se suas aspirações e visões da noticiário e passou a integrar a agenda política, sem
que tenham sido tomadas providências para levá-la a se o Estado do controle dos destinos da nacionalida­
cabo de forma coerente e consistente, e sem que se de. É sintomático que, na atualidade, o poder
tenham estabelecidos os seus vínculos com o proces­ Executivo só promova concurso público para fiscais
so de planejamento. do Tesouro e policiais federais.

Verdadeiramente, não há como se voltar a Sem que se restabeleça a competência


pensar em planejamento no Brasil, a nível governa­ gerencial da administração pública, não haverá plane­
mental, enquanto não se dotar a administração públi­ jamento governamental atuante e eficaz. Por outro
ca de competência gerencial para formular diretrizes e lado, não há por que restabelecer essa competência
estratégias, e, a partir daí, elaborar planos e projetos gerencial sem que chegue a bom termo a redefinição
(além de implementá-los). das funções do Estado brasileiro, e este é o cerne da
questão.
A questão da reforma do Estado se resu­
miu nos últimos anos a privatizações e à busca de A partir dos anos 3 0, o Estado brasileiro
enxugamento da máquina pública, através de assumiu o papel de indutor do desenvolvimento,
demissões de empregados de estatais, e fusão ou como tal entendida a industrialização do país. Prote­
extinção de órgãos, além de tentativas infrutíferas de cionismo econômico e intervenção do Estado na
transferir para estados e municípios atividades que a economia, não só como fiscalizador e facilitador, mas
União não tem condições de manter, face à crise também como financiador (BNDES, BNB,
financeira que atravessa. Aos estados e municípios, SUDENE) e como agente produtor, sobretudo na
por sua vez, faltam também recursos financeiros, área de infra-estrutura (energia, transportes, comuni­
pessoal qualificado e experiência no trato de diver­ cações, siderurgia), através de autarquias e empresas
sos encargos que teriam que assumir. estatais, foram a marca do período que estende
desde a criação da usina de Volta Redonda até o
Na administração pública direta, face à fim do ciclo militar, quando se inicia a luta contra a
impossibilidade de se demitir, optou-se por reduzir hegemonia econômica do Estado.
os gastos com pessoal, promovendo achatamento
salarial jamais visto na história da República, Tanto os setores progressistas da socieda­
estratégia complementada com a transformação em de como os setores mais conservadores, clamam hoje
funcionários públicos de empregados de instituições por mudanças no Estado brasileiro, o que leva à
que se constituíam em ilhas de excelência (IPEA, conclusão de que o mesmo não consegue mais aten­
IBGE). der nem a gregos nem a troianos.

Curiosamente, os dados disponíveis não Os conservadores apontam o Estado, em


demonstram o propalado inchaço da máquina públi­ última análise, como empecilho ao desenvolvimento
ca, seja do ponto de vista do número de servidores do país, por impedir a livre atuação dos agentes
por 1 .0 0 0 habitantes (3 7 ,8 no Brasil contra 6 5 ,0 econômicos que, a seu ver, livres do intervencionis­
na Itália e 5 3 ,4 na Espanha), seja do ponto de vista mo estatal, poderiam investir, gerar empregos e
do número de servidores em relação à população aumentar a produção a custos muito menores. Alme­
economicamente ativa (8 ,7 % no Brasil, contra jam não só a desregulamentação econômica, com o
1 6 ,1 % na Itália e 1 4 ,5 % na Espanha), seja de fim de inúmeros cartórios, como privatizar ou extin-
qualquer outro ponto de vista utilizado para examinar guir estatais e monopólios, abrir mercados à livre
a questão. concorrência, e transferir à iniciativa privada serviços
que consideram como não pertinentes aos objetivos
Verifica-se, assim, que a causa da inefi­ da administração pública.
ciência do setor público dever ser procurada em
outros fatores, e que a política de enxugamento O reconhecimento da validade das críticas
èonsiste, na realidade, em política de desmantela­ apresentadas pelos setores conservadores deve ser
mento do Estado, o qual, impossibilitado de operar, acompanhado de análise crítica, assinalando-se com
será com mais facilidade afastado do caminho de clareza alguns de seus objetivos não explicitados, os
poderosos e escusos interesses. Primeiro, avilta-se,- a argumentos utilizados, os métodos propostos para
seguir, tacha-se de incompetente; finalmente, afasta-
alcançá-los e as conseqüências do que propõem para que às suas posições de acoplam interesses meramen­
a sociedade como um todo. te corporativistas de uma parcela privilegiada dos
trabalhadores brasileiros, e de empresários cuja
Dois pontos, em particular, devem de sobrevivência se deve exclusivamente a seus vínculos
início serem assinalados. com o aparelho estatal.

Em primeiro lugar, o grau de estatização Este o pano de fundo sobre o qual vem
da economia no Brasil, em confronto com o de se desdobrando o processo de revisão das funções
outros países, está longe do propalado absurdo que de Estado no Brasil, sem diretrizes claras, sem plane­
se alega. Segundo o Anuário da Organização das jamento e sem transparência, através da privatização
Nações Unidas, referente ao ano de 1 99 1 , o e extinção de estatais, da desregulamentação ou
percentual de participação do Estado brasileiro no desburocratização e da terceirização de serviços.
Produto Interno Bruto é de 2 1 ,4 4 % , contra
2 8 ,1 4 % na Alemanha, 4 2 ,1 0 % na França, e O processo de privatização vem sendo
4 9 ,7 8 % na Suécia, para citar apenas alguns exem­ objeto de denúncias de irregularidades, que incluem
plos. Seria antes um problema de qualidade e não o favorecimento a grupos privados através de sub-
de quantidade, ou a questão estaria relacionada com avaliações, fraudes nas licitações, dispêndios superio­
os setores em que o Estado atua preferencialmente res aos recursos auferidos (financiamentos e aportes
em cada país,- de qualquer forma, o argumento de recursos, a título de saneamento).
necessita de clarificação.
A extinção de empresas estatais não se
Em segundo lugar, se o Estado brasileiro fundamenta em qualquer critério definido e conheci­
se constitui realmente, nos nossos dias, em entrave do. Empresas extintas continuam até hoje em funcio­
ao desenvolvimento, tanto pela excessiva regulamen­ namento, outras foram liquidadas às pressas, deixan­
tação da economia (reserva de mercados, subsídios) do lacunas institucionais ainda não preenchidas, e,
como pela ineficiência de sua máquina e, mais ainda, ainda, empresas cuja extinção foi considerada indis­
pela sua incapacidade de atender a demandas sociais pensável, são hoje consideradas de grande
inerentes a suas funções (previdência, saúde, importância para o país.
educação, segurança, e outras muitas), não se pode
perder de vista que este Estado foi gerado exata­ A desregulamentação tropeça na ausência
mente para propiciar o surgimento de grandes grupos de cidadania, na impossibilidade de desregulamentar,
econômicos nacionais, que sem ele hoje não existi­ que implica em descentralizar, sem instrumentos de
riam, e que dele se apoderaram com a finalidade de fiscalização de serviços voltados para o público, ou
colocá-lo a serviço de seus próprios interesses. importantes para o desenvolvimento econômico, dos
quais se exige qualidade superior.
O esgotamento do modelo acima referido
se constata pela luta que travam internamente os A terceirização, que consistiria em repas­
próprios setores conservadores, dos quais parcela sar a terceiros atividades-meio, tem se orientado no
substancial entende que suas ligações com o Estado sentido não de reduzir custos ou aumentar a
se tornaram grilhões, e outra parcela o julga ainda eficiência, mas de se livrar de ônus administrativos de
necessário para resguardar seus interesses. Deixare­ natureza trabalhista
mos de abordar aqui o componente externo, que
influi de maneira determinante nas questões acima O equacionamento das questões apresen­
colocadas. tadas, vale dizer, a redefinição das funções do Esta­
do brasileiro e dos instrumentos a serem por ele utili­
Quanto ao setor progressista, que vê no zados para cumprir suas finalidades é, sem dúvida,
fortalecimento do Estado (por fortalecimento enten­ pré-requisito a que se restabeleça o planejamento
dido não só a manutenção do seu papel na econo­ governamental no país. Por outro lado, o próprio
mia como também sua modernização) elemento indis­ processo de transformação do Estado requer que se
pensável a que o mesmo possa atuar de maneira utilize o instrumental do planejamento, não sendo
decisiva na correção de mazelas e desníveis estrutu­ compreensível o desmantelamento e a redução a
rais, não se pode deixar de identificar, igualmente,
proporções mínimas das instituições que funcionam Acreditamos que essa mudança cultural
como matrizes dessa atividade primordial. contribuiria, logo de início, para que a lei do Plano
Plurianual passasse a ser encarada com seriedade,
criando-se, como já sugerido, exigências rituais e de
6. CONCLUSÕES quorum mínimo que dificultassem alterações na
mesma. Isto propiciaria, como conseqüência, que a
leis de Diretrizes Orçamentárias, decorrentes do
A história do planejamento no Brasil Plano Plurianual, e sobretudo o Orçamento da
mostra que a preocupação com este importante União, se transformassem em verdadeiros instrumen­
instrumento de governo e de administração somente tos de Governo e de governabilidade, e se consti­
se consolidou na década de 70, quando, após tuíssem em bússola para os diversos setores cujas
ensaios emergenciais de curto prazo (Governos atividades se pautam pelas ações governamentais, ou
Dutra - Plano SALTE, Juscelino - Plano de Metas, delas dependem.
João Goulart - Plano Trienal, Castelo Branco -
Plano de Ação Econômica do Governo e Costa e
Silva - Programa Estratégico de Desenvolvimento),
se elaboraram os I e II Planos Nacionais de Desen­
volvimento, e foi colocado è disposição do Estado
formidável elenco de instrumentos de planejamento,
com o fortalecimento de diversos órgãos ligados à
atividade, complementado pela criação de importan­
te base burocrática.

Na década de 80, conforme já menciona­


do, ocorreu o esvaziamento do processo de planeja­
mento, passando os planos de longo prazo a se
constituir exercícios acadêmicos puramente formais.

No Governo Collor, a m odernidade liqui­


dou com o que restava do sistema de planejamento,
incorporando a Secretaria de Planejamento ao
Ministério da Economia, então criado.

Não obstante o reconhecimento de que


fatores conjunturais contribuíram para este esvazia­
mento, entendemos que tal fato se deveu também, e
em grande parte, a se terem ignorado várias
dimensões do planejamento, que se tornou excessi­
vamente econômico e tecnicista, razão de o sucesso
de alguns planos, quando ocorrido, ter sido apenas
parcial e restrito a alguns setores.

Desta maneira, e visto nos encontramos às


vésperas de novo Governo, ocasião propícia á
elaboração de plataformas, planos, programas e
projetos, nos sentimos estimulados a provocar o
debate sobre a possibilidade de que sejam incorpo­
radas ao processo de planejamento, estatal ou priva­
do, as dimensões mencionadas nos capítulos
anteriores.
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SIG, QUADRA 6, LOTE 800,
70604-900, BRASÍLIA, DF,
EM 1994, COM UMA TIRAGEM
DE 1.000 EXEMPLARES
_
Publicações ■ Revista do Serviço P úblico
ENAP V o l. 11 8 , no. 1 : G overnabilidade

em 1994
■ C ó d ig o de Ética Profissional d o S ervidor P úblico C iv il d o Poder
Executivo

■ Estrutura e O rganização d o Poder Executivo ( 2 volum es)

■ Revista d o Serviço P úblico


V o l. 1 1 8 , no. 2 : Profissionalização

■ H istória A dm inistrativa d o Brasil - V o l. 3 7


O rganização e A dm inistração d o M in isté rio d o Exército
Francisco Pondé

■ Pobreza: uma questão inadiável


Bernardo Klilcsberg (organizador)

■ Cadernos E N A P
V o l. 2 , no. 1 : A Q uestão Social no Brasil

■ Cadernos E N A P
V o l. 2 , no. 2 : Recursos Hum anos no S etor P úblico

Próximos O N o v o C o ntrole de G estão


lançamentos H e n ri Savall e V éro niq ue Z arde t

Revista d o Serviço P úblico


V o l. 1 1 8 , no. 3 : N ovas Tendências Institucionais

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V o l. 2 , no. 4 : Reforma d o Estado

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