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Elfa - Volume I

Autor(es): elfman

Sinopse
Aventuras espadas & calcinhas com um grupo de matadoras de monstros e caçadoras de tesouros que inclui uma
elfa, uma fada, uma coelhinha ninja e uma humana com a bunda gordinha.

Notas da história
* Escrito com o objetivo de sacanear todos os clichês de mangás, animes, rpgs e histórias de fantasia que
existem, nada se salva e todo elemento possível de se imaginar nesse tipo de história acaba aparecendo uma hora.

* A princípio pode não parecer, mas é uma história bastante complexa e com dezenas de personagens e elas
passam por algumas aventuras bastante pornográficas de vez em quando, então leia por sua conta e risco.

* Não leia a sério.

(Cap. 8) VII - Impressões de uma Elfa Aventureira no Mundo


Subterrâneo

Notas do capítulo
Em que a rainha das lâmias conta a história da demônia lady Amora e decide-se o que fazer da jóia e da fadinha.

Parte VII - Impressões de uma Elfa Aventureira no Mundo Subterrâneo

“Em que a rainha das lâmias conta a história da demônia lady Amora e decide-se o que fazer da jóia e da
fadinha.”

Altisidora secou o braço de Pelluria e depois atou o ombro dela com um pedaço de pano.
“Obrigada,” disse a elfa; ainda sentia um pouco de ardência. “Achei que não gostavas de mim.” Estava
sentada numa pedra, um banquinho improvisado que incomodava as coxas.

“Eu não gosto,” respondeu a lâmia. E sorriu com o canto da boca e depois prendeu os cabelos com uma
fita vermelha, fez uma colinha. Balançou a cabeça e foi para longe. Usava uma saia vermelha sobre a cauda
encorpada. Encostou um pedaço de tecido da mesma cor no topo dos seios, era transparente e deixava os mamilos
amarronados à mostra. “Eu fico bem nessa?” disse, voltando-se.

“Hã? Claro, claro,” Pelluria disse sem olhar.

A lâmia aproximou-se e pediu “Fecha para mim” e a elfa amarrou a peça nas costas dela.

“Onde aprendeste a lutar daquele jeito?” Altisidora perguntou, colocando as mãos atrás da cabeça e
aproximando o nariz de uma das próprias axilas para sentir o cheiro dela; uma das vantagens de ser uma lâmia era
suar perfume de flores.

“No exército,” Pelluria disse e levantou.

“Qual? O da Rainha?”

Altisidora quis dizer a rainha do Continente, creio.

“O da Rainha também. Fui mercenária.”

“E por que deixaste o exército?”

“Por quê?” A elfa esperou um pouco. “Não fui feita para mandar e obedecer.”

“Mm. Para que foste feita?”

“Outras coisas,” Pelluria disse após erguer os ombros.

“Sei.”

Altisidora cobriu com um pano grande feito lençol o espelho em que estivera se olhando e que ficava
apoiada numa parede da gruta para refletir-lhe o corpo inteiro. “Vamos indo, estou pronta,” ela disse e então
deixou o local com Pelluria ao seu lado. Entraram num corredor onde estavam outras lâmias. “O que tu mais
desejas?”

“Que tipo de pergunta é essa?” Pelluria forçou o passo para acompanhar o deslizar da outra.

“Uma pergunta simples.”

“O que mais desejo? Acho que... ter uma casa. E ouro. E um marido.”

“E filhos?”

“Ah, por que não? E viver feliz para sempre.”

A lâmia sorriu de novo.

“Que foi?” Pelluria perguntou.

“Nada. Não somos tão diferentes. Queres ouvir uma história sobre lâmias? É muito boba.”

“Claro.”

“Bom... Uma vez um jovem pastor encontrou uma lâmia tomando banho num lago no meio do bosque e
era tão linda que apaixonou-se por ela. A lâmia concordou em casar-se com ele, mas com a condição de que ele
adivinhasse sua idade. Sem saber o que fazer, pois não tinha idéia de quanto tempo vivem as lâmias, ele contou
tudo a uma amiga no vilarejo; ela disse ‘Não te preocupes, eu descubro a idade dela’ e foi até a caverna procurar
pela lâmia. Quando encontrou a criatura escondida ali dentro, voltou as costas para ela, jogou-se para frente e,
apoiando-se no chão, ofereceu-lhe o traseiro enquanto a encarava por entre as próprias pernas abertas. E a lâmia,
exaltada, gritou ‘Nunca em meus cento e cinco anos eu vi uma coisa dessas!’ ”

Pararam diante de uma porta dupla, que foi se abrindo.

*****

Pelluria, tentando imaginar a moral daquela história, se é que tinha uma, sentou-se ao lado de Gustaff
Olafson diante de uma grande mesa retangular; e não em uma cadeira, mas em um tronco suspenso por uns
suportes. Do outro lado, num tronco semelhante onde enrolaram suas caudas, porque este era o modo das lâmias,
sentaram-se a rainha Ellenora e Altisidora.

E havia taças e vinho e muitas bandejas de prata cheias de algo que Pelluria terminou descobrindo serem
ratos cozidos, que Altisidora devorava sem parar. Acabou experimentando um também ela própria, por delicadeza
e esforçando-se muito, e também porque a rainha das lâmias pareceu um pouco ofendida quando notou que ela
lançava um olhar de desgosto para a iguaria que as cobras na cabeça da soberana dividiam. E por mais estranho
que possa parecer, minha tia não achou tão ruim o ratinho. Não recomendo para humanos, contudo.

Comeram todos e vieram outras lâmias trazendo mais e todos ficaram satisfeitos. Menos os cabelos da
rainha, que ela parou de atender, pois não queria que engordassem muito. São insaciáveis, explicou.

A fadinha também estava ali, na cabeceira da mesa, presa pelo pescoço por uma cordinha de barbante
atada a um odre de vinho. Comia cabisbaixa umas pétalas de rosa branca não muito gostosas, pois estavam meio
murchas, e continuava pelada, apenas com as botinas.

As paredes eram cobertas por panos, a iluminação era de candelabros e velas de todos tipos, mas muitas,
tantos que se podia enxergar como se fosse dia e como se não se estivesse embaixo da terra.

As duas cortesãs da rainha ficavam lá no fundo, acomodadas em almofadas, e Altisidora olhava para
Gustaff Olafson e sorria. Ele virou-se para Pelluria uma hora e percebeu que a elfa esforçava-se para não deixar o
vinho escapar de suas bochechas.

“O que é?” ele perguntou.

“Nada” ela disse e riu depois de conseguir engolir. “Só tava me lembrando duma história muito boba sobre
lâmias!” mentiu, porque ria é do que espiava embaixo da mesa: a luta dele para tentar afastar suas pernas da cauda
insistente de Altisidora.

Então Altisidora pediu que Pelluria contasse à rainha sobre como havia urinado na Cerejeira Sagrada
diante de todos os fiéis do vilarejo, e a rainha quis saber mais, disse “Uma elfa que mija na árvore sagrada merece
o meu respeito,” e eles falaram sobre várias coisas, até que Pelluria perguntou sobre aquilo que mais desejava
saber: a jóia e a duquesinha. Afinal, a soberana das lâmias havia chamado a nobre humana de sobrinha.

Neste ponto a rainha pediu que prestassem atenção, pois iria contar a história da província, que também
era a história da jóia, da mãe da duquesa e de muitas outras coisas. E que talvez fosse, além de informativa, bom
entretenimento, se ela soubesse contar direito.

*****

“A história de Lady Amora, a Duquesa de Orqushire”


— Contada pela rainha Ellenora do mundo subterrâneo -

(com algumas inoportunas notas de rodapé

acrescentadas pela elfa Organa Elsewyr)

***

Era uma vez duas irmãs que moravam dentro de uma árvore1 e que eram muito bonitas e diferentes uma
da outra. Tinham um reino inteiro só para elas, mas não era um reino como esses dos homens, com castelos e
casas e pessoas. Havia algumas pessoas, é verdade, e também algumas casas, e até uma vila, mas havia mais
florestas e lagos (se contarmos os lagos subterrâneos) e cavernas e flores do que qualquer dessas coisas. Havia
também algumas poucas e velhas górgonas pelas quais elas eram tratadas como duquesas desde antes das pessoas
lá chegarem.

Uma das irmãs tinha filhas, porque era fácil ter filhas, ela só precisava pôr os ovos e cuidar deles e chocá-
los e brincar com as pequenas quando nasciam, e vê-las crescendo. Ela era tímida, esta irmã, e não tinha pernas. A
outra, a mais velha, tinha pernas, e tinha a bunda pequenina e graciosa2, de nádegas branquinhas e arredondadas
feito luas crescentes esculpidas em mármore, mas macias e quentes, e quando o sol as tocava – o que não era raro,
como veremos em seguida – revelava naquela pele clara uns pelinhos muito curtos que pareciam feitos de ouro e
um sinalzinho negro e redondo perto do centro delas. E ela tinha os lábios muito grandes e vermelhos e úmidos e
curiosos. E os seios fofos e rechonchudos como se estivessem sempre cheios de leite, com bicos que eram duas
frutinhas cor-de-rosa prontas para ser colhidas. Os cabelos eram encaracolados e, também feitos de ouro,
escondiam na testa dois chifres que apontavam duros para o céu. Os olhos eram pequenas pedras pretas como
noite de glfmnorl’t.

E quando Amora – pois esse era o nome da segunda irmã, saboroso como ela toda – quando Amora
aparecia saída do tronco da árvore, os que se atreviam a mirá-la ficavam loucos de desejo por uma daquelas suas
jóias. (Porque era como relíquias que ela tratava os dois brilhantes pretos, as luas de mármore cobertas por veludo,
os fios dourados, as frutinhas rosadas e cada parte dela mesma, à exceção dos pés, que achava feios e escondia
sempre.) Ou ficavam loucos de desejo por todo o tesouro, mas nunca por ela própria, por isso apaixonados não
seria a palavra correta. E não eram bons desejos: eram daqueles que fazem intumescer-se o sexo dos homens
dentro de suas calças e também umedecerem-se os lábios das mulheres sob seus vestidos. E também afastavam-se
as escamas das lâmias no lugar onde suas caudas mesclam-se à pele quando sentiam o perfume de Amora e
ficavam indóceis os animais quando ela se aproximava.

E ela fazia isso sem esforço, atiçá-los. Fosse um só ou uma multidão inteira, apenas com olhares Amora
dominava os pensamentos de quem ela quisesse. Por isso, para evitar o constrangimento a que ela gostava de
expor os outros, homens e mulheres se curvavam diante das irmãs como se as estivessem adorando cada vez que
as duas saíam da árvore. E a maioria fechava os olhos. Mas algumas vezes um mais curioso, geralmente um dos
mais jovens, a mirava de relance, pensando que não seria percebido. E então Amora o pegava com os olhos e ele
ficava vermelho e suas pernas tremiam, o sexo inchava, ela abria um pouquinho os lábios grossos e, diante de
todos, dentro das calças dele algo explodia e ele se encolhia bufando ofegante e envergonhado. E ela sorria.

Com o passar do tempo as aparições das irmãs se tornaram mesmo adoração, com temor e respeito
religiosos. E os que viviam no ducado passaram a ser chamados de fiéis. E Amora tornou-se a senhora Amora, que
vinha de dentro da Cerejeira Sagrada. Mas não era como deusa que eles a adoravam.

(A primeira irmã eles temiam, pois podia transformá-los em pedra com o olhar, mas esta não é a história
dela.)

Quando chegava a primavera, lady Amora ia até o vilarejo com uma margarida presa atrás da orelha e com
um pote de mel sob um dos braços, andava saltitante entre os homens, visitando as ruas e as feiras como se fosse
uma simples camponesa. Ia sempre sorrindo e lambuzando o dedo com o mel e provando dele de tempos em
tempos. Também experimentava as frutas que os da vila colhiam e ofereciam (e quando não ofereciam, ela
simplesmente pegava), e os doces que as mulheres faziam, às vezes até os elogiando. E de tarde, quando estava
entediada, aproximava-se dos homens e pegava um deles pela mão. (Sempre homens, apesar de ocasionalmente
também se divertir causando nas mulheres constrangimentos semelhantes ao que descrevi há pouco.) Amora
sussurrava algo no ouvido de seu escolhido e o convidava para passear no bosque. E ele a acompanhava, apesar de
saber que nunca ninguém regressava.

Amora o levava até uma clareira perto de um riacho, onde o chão era coberto de flores macias e grama
muito alta. Lá chegando, ela se livrava do vestido negro e depois, com muita naturalidade, do saiote que cobria-
lhe os cabelinhos loiros da pube. Ficava apenas com os longos sapatos de pano indo até os joelhos feito meias.
Depois ela despia o homem, segurava seu falo, que a esta altura já estava o mais ereto que poderia ficar,
descobria-lhe a ponta e o mergulhava no pote de mel para lubrificá-lo3 e principalmente para deixá-lo saboroso. E
com os dedos, untava-o todo e o massageava.

E então, virando-se de costas, ela apoiava-se nos cotovelos e erguia as coxas o mais que podia, deixando
bem exposto o pontinho rosado perdido no meio de toda brancura de seu traseiro. E com o rosto metido entre as
flores, entregava-se ao homem e deixava que a tomasse por trás como se fosse uma cabrita4. E se alguém ouvisse
à distância, na floresta, não poderia distinguir aqueles gemidos dela de balidos. De fato, mesmo que alguém
estivesse ali perto, escondido e espiando de trás duma árvore, teria dificuldade em identificar se era mulher ou
cabra aquilo contra o que investia o homem de forma tão ansiosa, pois do meio daquelas flores e grama tão
cerradas só escapavam as pontas dos chifres e os enovelados cabelos subindo feito lã até o fim das costas.

Logo que ele terminava, o que nunca levava muito tempo para acontecer – e para desgosto dela às vezes
acabava de imediato – Amora sentava-se e o recebia no colo e oferecia-lhe um dos seios carregados, dava-o na
boca dele e deixava que bebesse o seu leite e repousasse em seus braços. E quando ele se revigorava, ela montava
sobre as coxas dele, pegava-lhe o sexo e roçava a ponta ingurgitada por sobre os lábios inferiores e entre eles e ao
redor deles, até que, num único movimento, enfiava-o todo dentro dela própria. E saltava e o cavalgava, metendo-
o cada vez mais fundo em si mesma até estar satisfeita.

E por fim, quando o falo dele não era mais que um animalzinho exausto encolhido na toca, e quando um
pouquinho de suor já escorria pela testa dela mesma, Amora deitava-se e punha o rosto entre as pernas do homem,
e o lambia e beijava e limpava tudo o que havia sobrado do mel e da semente que jorrara para fora dele. E
segurando pela base aquilo que já não podia mais deixar de ser flácido, ela o encostava nos lábios – nos de cima
dessa vez – e o chupava todo para dentro deles. E depois de apreciá-lo bem com a língua, afastando os dentes
pontudos e abrindo com força a boca pequena – porque apesar de ter os lábios muito grandes, tinha a boca
pequena – ela trazia também para o calor do interior das bochechas aquele saquinho com duas saliências
pendurado embaixo do falo. E ficava com a boca bem cheia e as bochechas bem estufadas, e se alguém visse o
rosto dela daquele jeito ou ela deitada ali com tudo aquilo dentro da boca até acharia engraçado.

E então ela o mordia e arrancava5.

Daí sentava em cima do homem e o segurava pelo pescoço para que não fugisse e o fazia ver enquanto
mastigava bem o sexo dele. Comia primeiro o topo, arroxeado e melado, depois o corpo, pedacinho por
pedacinho, e depois, limpando o sangue que escorria dos lábios com o dorso de uma das mãos, devorava uma
daquelas pequenas bolotas de cada vez, arrancando-as de onde vinham guardadas.

Então ela se curvava, aproximava a boca da dele (muitas vezes era preciso quebrar os braços dele neste
ponto) e colocava os lábios dele entre os dentes e puxava. E comia.

Usando os dedos para segurar os dentes dele, abria caminho pelas bochechas até chegar na língua. Era o
mais difícil, a língua, e também o que mais a divertia, ela dava risadinhas como se fosse uma criança enquanto
caçava a língua dele e arrancava dela grandes pedaços. (E às vezes ele se afogava e morria neste ponto.)

E depois ela comia as coxas e as nádegas e metia os dedos no ventre e o abria. (Quando chegava no fígado
ele estava morto, com certeza.) Ela jogava as entranhas fedorentas no mato para os animais e das costelas chupava
a carne. Então comia o coração e quando restava só a cabeça, sentava-se à sombra duma árvore e tirava-lhe os
olhos e eles estalavam entre os dentes. Depois disso Amora roncava alto e quando acordava, quando o sol já tinha
se posto, tirava os sapatos de pano, descobria seus cascos de cabra6 e ia tomar banho no lago.

Eles não a adoravam como deusa, os fiéis. Era mais como demônia.
Foi assim por muito tempo, trinta ou quarenta anos, ou até mais, quando Amora se entediou de viver no
mundo sob a terra com a irmã. Mandou que construissem uma torre donde pudesse ver todos os que chegavam e
saíam da vila que agora é a da Cerejeira Sagrada e quando os bárbaros do clã do Dédalo – aqueles vindos de
Daforos – se aproximavam das fronteiras do ducado, ia ela até eles. Já havia o clã invadido vários territórios nas
proximidades, como a Turísia e até mesmo Blanqueários, e estava sempre investindo contra as mal definidas
fronteiras do ducado das irmãs, às vezes até enviando espiões para dentro dele. Perderam a coragem, porém,
quando Amora encontrou-se com um dos seus mais importantes generais e, quando ele exigiu obediência e
também a posse das terras que pertenciam às lâmias, devorou partes de seu corpo diante de todos seus soldados. E
foi da torre que a duquesa-demônia Amora viu chegar a estranha: vinha do leste, o que era bastante incomum, a pé
e sozinha, carregando nada além de um vestido vermelho que mal ia até as coxas.

As irmãs foram ao encontro dela.

“Não podes entrar assim no nosso ducado,” disse Amora quando viu que a estranha tinha olhos azuis como
pedaços do céu de l’fhnor.

“Preciso atravessar este território das senhoras.”

“Para onde vais?” perguntou Amora, notando a maneira como olhavam para a estranha os homens do
vilarejo.

“Buscar um item feito pelos meus na cidade Relicário.”

“E onde fica a cidade Relicário?” perguntou a irmã de Amora e disse “Nenhuma de nós jamais saiu do
ducado.”

“Fica depois de Blanqueários e de Daforos e do Grande Lago e da Cidade das Montanhas, mas antes de
Cereste e do Vale da Madeira.”

“Terás que pagar um tributo,” exigiu Amora, cruzando os braços e vendo que a pele da estranha era mais
clara e delicada do que a dela. E os cabelos, mais dourados. E os lábios e a parte de trás, mais cheios de carne.

“Que posso vos oferecer, senhoras, se não possuo nada?” disse a estranha, escondendo muitos segredos
dentro do vestido. “Pedi e eu vos darei de bom grado o que tiver.”

“Apressa-te e cruza logo o ducado,” resmungou Amora, “ou terei tempo para pensar em algo que queira
tirar de ti.”

Mas a estranha ficou por muito tempo no vilarejo. E os homens a receberam com alegria e a hospedaram
por vários dias. E ofereceram flores a ela, e frutas e doces. E nem voltavam os olhos para Amora quando ela
passava e ignoravam-lhe o perfume.

Não que Amora se importasse muito, e nem passava mais muito tempo entre eles, pois as diversões da
juventude agora já não a agradavam tanto. E ela passara a olhar de forma diferente para a irmã e para as filhas
desta e era como se ela própria quisesse ter suas filhas.

“Por que não escolhes um dos homens do ducado?” perguntou a irmã de Amora, porque embora a duquesa
agora tivesse várias rugas nos cantos dos olhos e também linhas avermelhadas na barriga, e as luas de mármore
com dobras semelhantes a rachaduras em pedra, ainda tinha o corpo bonito e atraente e, por ser quem era, podia
escolher quem quisesse. E agora a vila já estava maior e nela havia todo tipo de pessoa. “Quem sabe um dos
sacerdotes?”

“Fizeram voto de castidade e eu não pretendo quebrar as regras que eles inventaram para a minha própria
religião7 ou logo estarão se aproximando de onde não devem e os veremos andando por nossos caminhos
secretos.”

“Então o ferreiro,” a irmã sugeriu.

“O ferreiro me teme, porque devorei o pai dele. Não quero nenhum deste bando de simplórios.”
Mas em verdade por mais que os homens a possuíssem antes dela virar o jogo e os devorar, ela nunca
ficava grávida de nenhum deles.

As estações passaram, chegou a primavera e a estranha continuava ali.

“Tu te vestes como uma p******,” Amora disse para ela, certo dia no vilarejo, segurando seu pote de mel
e com a margarida atrás da orelha. “E andas descalça como uma camponesa.”

“Mas eu não sou uma p******, duquesa.” A estranha olhou para os próprios pés descalços e disse “E não
preciso cobrir os pés, pois não tenho cascos para esconder.”

Amora mordeu o próprio lábio com os dentes pontudos e olhou para os olhos azuis da estranha, e quando
os homens riram baixinho, decidiu que iria matá-la. Seguiu-a o resto do dia. Sentou-se num canto da taverna e
assistiu enquanto a outra bebia e ria e dançava com os homens, e recusou os convites dos jovens inconseqüentes
que queriam passear com ela no bosque para ser por ela devorados.

De noite Amora viu a estranha entrar sozinha na cabana que os homens haviam construído para ela. E
através dos montes de palha nas paredes, quando estavam todos do vilarejo dormindo, viu a mulher afastar a cama
para um canto e viu-a despir-se e beber todo o vinho de um barril que precisaria dos dois braços para erguer.
Depois viu-a de pé, girando no centro da cabana, percorrendo pequeno trajeto circular sob a luz dumas poucas
velas, e cada vez mais rápido, até ficar tonta e cair. E então ela levantava e continuava, e prosseguiu assim até não
poder mais se erguer.

Amora entrou na cabana e percebeu que no chão onde a outra estava desmaiada havia sido pintado um
círculo e em volta dele estavam marcados números e símbolos. Tudo isto e também velas cercavam a estranha. E
na cama, repousava uma grande folha de couro com um mapa representando o ducado e também as várias outras
terras próximas dele; ali estavam algumas anotações que Amora não pôde compreender e estava tudo coberto por
inscrições e linhas retas que se intersectavam e às vezes formavam figuras. Pelas manchas de tinta e pelas
tonalidades diferentes, algumas delas só podiam ter sido feitas recentemente.

Num dos cantos do pergaminho havia um esboço mal traçado com cópia ampliada de parte do mapa;
continha uma das metades do ducado. Amora viu representações das casas, de sua torre, da grande cerejeira e até
mesmo do lago e do bosque. A estranha parecia tudo conhecer, menos o território subterrâneo. E pequenos
triângulos cobriam tudo, dividindo aquele mapa em áreas e tendo cada um símbolo diferente marcado em seu
interior. Estava tudo riscado, beirando o ilegível, e quando Amora ia deixar a folha, descobriu na outra face dela
mais um desenho. Era a clareira com o lago, em escala onde tudo ficava ainda mais ampliado.

Um grande triângulo envolvia a maior parte da figura e em cada um dos vértices havia daqueles símbolos
que se repetiam nos demais mapas. Quatro outras fileiras de letras similares cercavam o triângulo; da união de
duas paralelas, havia sido traçada linha diagonal.

Amora voltou-se para o círculo no chão e para onde estava deitada e sem sentidos a mulher. Aproximou-se
e com seu pé de cabrita empurrou um pouco o rosto e as duas mãos da outra, que estavam cobrindo um dos
símbolos8. Procurou por ele numa das linhas do mapa e achou-o na horizontal de baixo, pois era a única que não
continha nenhum que estivesse circulado. E ao encontrá-lo, usando apenas sua imaginação, uniu-o ao que estava
marcado na linha de cima. Viu, em sua mente, uma outra reta cruzando a primeira diagonal em um local que no
mapa ficava próximo do centro do lago.

Amora partiu, não sem antes deixar um presente para a estranha e decidiu ir até a clareira; esperou na
margem do lago até amanhecer, porque antes disso quase nada se podia enxergar.

A estranha, ao acordar, o que fez pouco depois do nascer do sol, foi para fora da cabana e vomitou.
Depois, ainda tonta, localizou no mapa o símbolo que já havia memorizado. E então foi se vestir. Neste ponto
sentiu uma dor intensa numa das nádegas, que agravou-se quando ela tocou na própria carne e dobrou o pescoço
para ver o que havia ali. Correu de imediato para a clareira, às vezes mancando um pouco, e quando lá chegou, viu
Amora sair de dentro da água com uma esmeralda presa em seu pescoço por uma fina corrente; acabava de livrar-
se dum pequeno baú cheio de pedras e recoberto por algas que em seguida retornou para o fundo das águas donde
havia sido retirado.
“Lâmia,” a estranha chamou com um pouco de raiva por causa da dor. E por ver em posse de outra algo
que tivera muito trabalho para encontrar. E “lâmia,” que Amora era, soou como uma ofensa.

“Foi por esta jóia que vieste ao meu reino?” riu Amora. “Parece que agora também tens algo a esconder.”

A estranha aproximou-se muito devagar. Numa de suas nádegas – estavam as duas bem descobertas e ela
vestia apenas uma camisa – podia-se ver impresso o casco de uma cabra, como se tivesse sido pisada por uma.

“Estavas tão bêbada que nem reagiste,” disse Amora e foi sentar-se na areia, perto de onde acabava a
grama alta, a água escorrendo de seus cabelos e do vestido.

“Entrega a esmeralda, lâmia," a estranha falou.

“Por quê?”

“Porque não te pertence.”

“Então o que está ela fazendo em meu reino?” Amora perguntou sem olhar para a outra.

“Foi trazida para cá pela tua mãe, a duquesa górgona. Por ela a tua mãe brigou e matou os da própria
família e por causa dela tua mãe veio acabar aqui. Para mortais a jóia só causa pesares.”

“Não sou uma mortal,” disse Amora.

“A devoção dos homens tolos do teu ducado subiu à tua cabeça, lâmia. Viveste por muitos anos e podes
viver por muitos mais, além de que és diferente deles, mas um demônio de verdade tu não és. E tu envelheces,
como provam as tantas rugas ao redor dos teus olhos.”

“Já comi mocinhas mais bonitas por palavras menos atrevidas,” Amora disse e seus lábios se contraíram.

“Se ficares com a jóia, ela vai te fazer brigar com as tuas, e tu e a tua irmã apaixonar-se-ão pelo mesmo
homem e uma vai matar a outra e vai terminar sozinha. E se tiveres filhos, a pedra irá atormentá-los até que não
reste nenhum deles.”

“Ridículo. Tu me ofendes, p******, se pensas que vou acreditar nesse monte de bobagens.”

A estranha veio ainda mais para perto e sentou-se a alguns passos de Amora. Colocou as pernas para
dentro da água e a terra úmida moldou-se ao redor de suas nádegas. O sol brilhava sobre ela e Amora, e não se
podia saber qual tinha o corpo mais branco e qual o tinha mais bonito.

“Tu também me ofendeste, lâmia,” a estranha finalmente disse, “com este ferimento que me fizeste. E não
são mentiras as coisas que conto.”

“Não são?” Amora parou de olhar para a jóia e voltou seu rosto para a mulher. Estava abraçada aos
próprios joelhos. “Tu mentiste desde o início: minha irmã procurou nos mapas dos homens, não existe uma cidade
Relicário.”

“Não mais. Mas não menti. Vim buscar essa jóia, feita na cidade Relicário e criada para ser do meu pai.”

“Como ela veio parar aqui, então? O que é esta jóia?”

A estranha disse que não queria perder tempo explicando algo que uma “lâmia” não compreenderia. Mas
mesmo assim contou sobre como haviam, os da raça dela, procurado por um artefato especial, e sobre como o
haviam derretido na cidade Relicário há vários séculos, e sobre a jóia ter sido feita para receber uma parte da mãe
dela própria. “E então veio a górgona,” ela disse, “e colocou na pedra o que ela não deveria conter. Colocou
também ciúmes, porque a esmeralda era um presente para quem ela queria e não poderia ter. E ela assistiu ao
casamento de meu pai, que era mortal, com minha mãe, que não era. E se meteu entre eles e, numa noite que veio
poucos anos depois, embriagou-o e fez com que traísse a esposa. E em seguida, aquela jóia repleta do ciúmes da
górgona fez com que ele tirasse a própria vida. E a górgona e aqueles que a seguiam foram expulsos, ela
carregando nos braços a filha recém-nascida.”
“Chega,” Amora interrompeu a outra e meteu seus dedos na areia. Sentia-se mais forte e mais bonita do
que nunca desde que pusera a esmeralda em seu pescoço. “Não quero mais ouvir tuas bobagens. Vai embora do
meu ducado.”

“Não queres mais saber a verdade? Não vou dizer aquilo que temes ouvir, não te preocupes, bastarda.”

“Cala a tua boca e vai embora,” Amora disse baixinho.

“Achas que me orgulho por termos o mesmo pai?” a estranha perguntou.

“Se temos o mesmo pai,” Amora disse enquanto amassava um punhado de barro entre as duas mãos,
“então tu também és uma lâmia.”

“Não. Sou muito mais que isso. Ao contrário de ti. És o fruto podre de uma relação incestuosa. Da tua mãe
com o próprio irmão. Irmão este que morreu por causa dela. Já sabes de onde vem a tua maldade, lamiazinha.”

Os ossos dos dedos de Amora estalaram.

“Então,” prosseguiu a estranha, “foi para este fim de mundo que fugiu tua covarde mãe, pequena lâmia. E
foi aqui que ela escondeu a jóia roubada, pela qual eu busco há anos. Era da minha mãe antes de ter sido usurpada
pela tua e ainda há um pouco da minha mãe nela.”

“Vai embora, meretriz, vai agora.” Amora jogou o monte de barro e ele espatifou-se no peito da outra.
“Foge. Ou vou te humilhar como nunca foste humilhada e vou te devorar.”

A estranha levantou e areia endurecida caiu de sua camisa, barro úmido escorreu por suas pernas. Ela disse
“Tu te superestimas, como sempre, lâmia. Entrega a jóia, animalzinho burro. A tua própria mãe escondeu-a para
que ela não pertencesse a ti. Essa gema só vai te fazer mal.”

Amora levantou-se também, seus pés estavam descobertos. Foi para a frente da outra, o mais perto que
pôde, e disse:

“Eu vou te fazer mal.”

E então ela bateu na estranha, enfiou e arrastou suas unhas pela bochecha dela. Ao mesmo tempo a
estranha acertou o rosto de Amora, a boca, e Amora ouviu o som de algo se partindo e caiu sentada no lodo, seu
corpo afundou no meio dele. Passou os dedos pelos lábios. “Minha presa.” E cuspiu longe o dente pontudo. E
também um pouco de sangue.

A estranha jogou-se sobre Amora, seu joelho cravou-se na barriga dela. Pegou-a pelos cabelos e bateu de
novo no rosto. Amora ouviu mais uma vez o som, agora no nariz. E depois em vários outros lugares e cada batida
fazia com que ela deslizasse mais pra trás e com que voassem água e areia para todos lados, até que foi deixada e
caiu de costas. Sentiu frio na nuca e gosto de sangue e teve que escolher entre respirar ou se mover. E os braços
tremeram sem sair do lugar quando ela optou por se mover.

No fim a estranha estava montada nela, os joelhos enfiados fundo na lama, o barro cobrindo os corpos de
ambas como se fosse roupa.

“Teus ossos vão descansar no fundo do lago junto com os dos que mataste neste lugar, lâmia,” disse a
estranha. Estava livre de qualquer arranhão, mesmo no rosto, por onde as unhas de Amora haviam passado, e tinha
a respiração inalterada. “Agora…”

Foi aproximando os dedos da gema esparramada sobre o peito de Amora.

Quando segurou-a, porém, foi como se lhe tivessem acertado o rosto com um pedaço de tábua; uma força
invisível jogou-a longe.

Amora abriu os olhos e respirou fundo, engoliu sangue e areia e, apoiando-se nos cotovelos, após
cambalear um pouco, conseguiu se erguer. Não entendia o que havia acontecido. Sentiu que sua força voltava, a
dor diminuiu.
No chão a outra tremia como se sentisse os golpes que ela própria havia dado em Amora; o rosto da
estranha estava cheio de sangue. Amora ajoelhou-se ao lado dela e pegou-a pelo pescoço.

“Ela te quer,” a estranha balbuciou. “Ela te experimentou e vai beber de ti até o fim.” Amora ergueu um
pouco a cabeça da estranha e esta falou ainda “Vai fazer contigo o que fez com a tua mãe. Quer o sangue dela que
corre no teu corpo.”

“Quieta,” Amora disse e acariciou as bochechas feridas da mulher. “É o teu fim, p******.”

“Sim... mas há outros como... serei encontrada... vingada... tu vais pagar por... não tens idéia... do que
fizeste...”

E então Amora torceu. E ouviu de novo o som de madeira se partindo.

Depois tirou o vestido rasgado e entrou no lago. A dor voltou a ser intensa, e ela lavou a areia e o sangue
presos em sua pele e nos pêlos das patas. E quando virou para trás, sentiu como se a água se tivesse convertido em
gelo ao redor de seu corpo.

Ocupando muito espaço sobre todo o campo, estava agora o cadáver dum grande dragão de escamas
vermelhas.

Amora correu para baixo da terra por uma das passagens secundárias e contou tudo à irmã. “Há outros
deles e vão vir atrás de mim,” ela chorou no colo da irmã menor. E a menor tratou os ferimentos de Amora,
costurou o arranhão no queixo dela e cobriu o nariz, e colocou ervas no lugar onde havia a presa que fora
arrancada e também sob os olhos para que não inchassem. Envolveu-a num cobertor, porque sua pele estava fria
como peixe, e mandou que a velha naga guardiã cuidasse dela, e também que suas filhas cortassem o corpo do
dragão e o comessem ou dessem para os animais, e escondessem no lago o que restasse de seus ossos e escamas e
chifres.

“Está tudo bem, tu vais ficar escondida aqui, debaixo da terra, e eles nunca vão te encontrar.”

Alguns meses depois vieram três homens. E perguntaram sobre as irmãs.

Elas não apareciam mais há muito tempo, as pessoas do vilarejo disseram. Mas os estranhos ficaram
esperando ali no vilarejo, até que a irmã de Amora os encontrou. Eles tinham o mesmo olhar da estranha, aquele
que esconde natureza terrível sob face inocente, e perguntaram pela mulher que tinha vindo antes deles, dando a
descrição dela. A irmã de Amora mentiu que nunca a tinha visto, disse “Nunca esteve aqui” e eles ainda ficaram lá
por alguns dias, até que foram embora.

Amora não veio mais à superfície. A Cerejeira Sagrada passou a ser protegida e cortavam a cabeça de
quem se aproximava dela, e com o tempo, passou-se a acreditar que ira divina cairia sobre o vilarejo se um leigo
nela tocasse e todos se esqueceram de que ela conduz ao centro do Reino Subterrâneo.

E ninguém mais viu Amora e não se ouviu mais falar dela.

Passou-se mais outra geração de homens e Amora, que já havia sido quase deusa e quase demônio, tornou-
se quase lenda. Os homens ainda temiam as lâmias, que de vez em quando apareciam na floresta.

Nesse tempo os bárbaros do clã do Dédalo foram expulsos da Turísia pelo rei Dortocolmos, que conseguiu
libertar pelo menos a metade oriental da província. Então o clã veio para o sudeste e aproveitando-se da ausência
de Amora, estabeleceu o Forte de Pernície, tendo o mesmo tal nome em homenagem ao general que a duquesa-
demônio havia mutilado e que assim se chamava. Ainda hoje existem as ruínas da fortificação, espalhadas pelas
bordas dos territórios da Cashimiria, Blanqueários e Orqushire onde as três se aproximam.

Os bárbaros montaram vários acampamentos ligando Daforos e o forte para impedir a passagem dos
soldados da Rainha da Cidade dos Espelhos, isolando a Turísia e Blanquearios e a floresta das lâmias do restante
do continente. Os exércitos da Rainha partiam de Arai, precisavam marchar através da longa zona das florestas,
dos perigos da província das Terras Rochosas e das armadilhas montadas pelos inimigos em Agropólos para,
muitos meses depois, atingirem finalmente a linha de Pernície, como ficou conhecida aquela intransponível
barreira de Daforos ao forte, a qual isolava tudo o que é hoje o nordeste do Continente.
A Cidade das Montanhas não tinha interesse no conflito e a Cashimiria, além de pouco habitada, já
enfrentava seus próprios combates no leste, em Trimaris, então não havia donde vir reforços.

Não muito tempo passou até o clã do Dédalo, vendo que não se importavam mais as irmãs com sua
presença na fronteira, invadir o restante do ducado. “Não vou sair do Reino Subterrâneo,” foi o que Amora disse
ao tomar conhecimento disso; tinha medo de que os dragões estivessem escondidos entre os invasores.

As lâmias lutaram sem ela, e a irmã menor, usando em volta do pescoço aquela jóia verde – pois Amora
disse que aumentar-lhe-ia a força, como aumentava a dela própria quando a usava – transformou muitos dos
inimigos em pedra. Mas não pôde agüentar assistir enquanto matavam suas filhas e terminou também escondida
com elas nos túneis. Todo o ducado – ou pelo menos a superfície dele – foi dominado. Uns poucos homens
fugiram da escravidão: refugiaram-se no norte, fora do reino das irmãs e nas proximidades do mar.

Uns destes vieram certo dia para as cavernas, em busca das lâmias. Contaram às irmãs da chegada de um
navio com estrangeiros que queriam encontrar a governante do ducado para aliarem-se a ela. Amora continuava
assustada, por isso decidiu que sua irmã veria o líder dos recém chegados.

Foi a irmã de Amora pelos túneis secretos até o norte, onde encontrou-se com o comandante deles, e
Amora observou de longe a tudo isso. E tudo se passou às escondidas para que os do Dédalo de nada
suspeitassem, muito embora raramente viessem para o norte, pois julgavam não terem o que temer do lado onde
havia só o mar; os bárbaros concentravam suas forças no sul e na linha de Pernície.

Os estrangeiros que a irmã de Amora encontrou eram comandados pelo jovem barão de Loirs, vindo de
Arai para pôr em prática um plano concebido pelos de sua família e aprovado pela Rainha. Havia reunido um
grande exército e conduzido o mesmo até Cereste, donde partiram diversas embarcações para o norte, para
contornar as bordas de Daforos e do Continente e chegar nesta ilha recém descoberta pelo rei da Turísia, a atual
Guarnição de Dortocolmos, localizada a meio caminho entre a ilha de Tchuma-Enthofa e o nosso continente.
Daquela viagem longa e perigosa, iniciada há quase um ano, haviam restado cinco navios, os quais aguardavam
em alto mar para se aproximaram e iniciarem seu ataque aos invasores. Também estavam com eles outros dois
navios com alguns soldados cedidos pelo rei Dortocolmos da Turísia.

Todas estas forças quase igualavam-se às dos bárbaros e vinha o Barão à fronteira do ducado para
constatar em que situação encontrava-se o mesmo e para propor uma aliança com as lâmias e suas duas
governantes.

Em poucos dias homens e lâmias atacaram o clã do Dédalo e destruíram o forte de Pernície. Os soldados
da Rainha de Arai, vindos do outro lado, logo quebraram a linha de Pernície e a guerra foi levada ao território de
Daforos.

Isso foi há aproximadamente trinta anos, quando Amora concordou com a anexação do ducado ao Império
e assim tornou-se a grão-duquesa da província de Orqushire. Foi restaurado o vilarejo e, tendo passado tanto
tempo, Amora terminou por recuperar a coragem, voltando a andar por entre os homens, porém agora de forma
mais cuidadosa e com menos apetite por jovens humanos. E em menos de cinco anos foi terminada a construção
do castelo de Loirs, onde foram morar as duas irmãs, e vieram mais homens para construir uma cidadela em volta
dele. Pouco a pouco ocuparam os lugares que eram só das lâmias, retornando a maioria delas para o Reino
Subterrâneo, pelo qual tinham preferência.

E a irmã de Amora, desde o início, apaixonara-se pelo barão de Loirs, agora o representante do Império
naquela nova província. Ia casar-se com ele no final daquele que era o quinto ano de Orqushire. Mas poucos
meses antes, Amora veio falar com ela. “Eu o quero para mim,” foi o que disse. E depois disse ainda “Por favor,
foge, vai embora do castelo. Deixa-o.”

“Mas nós vamos nos casar,” a irmã de Amora disse por fim, quando recuperou-se da surpresa.

“E que bem fará o teu casamento com ele? Tu nem mesmo tens pernas,” Amora gritou. “Não conseguirás
agradá-lo por muito tempo.”

“Ele gosta de mim,” a irmã dela disse e Amora, que espiava com ciúmes sempre que os dois se
encontravam, sabia bem que suas próprias palavras não eram verdadeiras.
“Tu já tens muitas filhas,” Amora disse então e sentou-se na cama da irmã, cabisbaixa e com os braços
cruzados. “Eu sou sozinha.”

“Tu és linda,” a irmã dela disse virando-se para onde ela estava. Veio rastejando para perto e amontoou a
cauda sobre a cama. As cobras que eram seus cabelos estavam todas deitadas como se dormissem e algumas delas
repousavam por sobre seus ombros. Ela disse “Tu podes ter qualquer outro.”

“Eu estou apaixonada,” Amora disse. E depois apertou os próprios dedos contra o rosto. “Desde a primeira
vez que vi os olhos verdes dele, quando veio falar contigo na floresta. Eu nunca me senti assim. Esperei minha
vida toda e nunca senti o mesmo por nenhum outro, é a primeira vez que sou mulher, e não demônio.” E então ela
voltou os olhos enrugados para a irmã e eles estavam úmidos e as bochechas estavam vermelhas. “Eu o quero
tanto que dói-me o peito e me falta o ar cada vez que ele olha para ti. Eu estou apaixonada.”

“Eu também,” a irmã dela disse e passou o dedo pelo queixo de Amora, onde ainda havia a cicatriz
deixada pelo dragão disfarçado de mulher. E depois limpou as lágrimas do rosto de Amora.

Mas Amora se afastou com velocidade e cobriu bem a face. “Eu estou grávida,” gemeu.

E a irmã dela mordeu com força o lábio, até sentir gosto de sangue. As serpentes se contorceram em sua
cabeça, umas apertando as outras em silêncio.

E então a irmã de Amora encostou-se na parede e a cauda dobrou-se toda sem se importar em amassar ou
rasgar o vestido luxuoso que ela jamais havia tido igual e ela empurrou as duas mãos fechadas contra o colchão, as
unhas pontudas enfiadas na pele das próprias palmas.

“Eu também,” a irmã de Amora disse. “Eu também estou grávida.” E depois falou “Ele dizia que eu era a
única,” e sua voz foi se perdendo.

Amora deitou no colo da irmã, encostou o rosto nas escamas com perfume de flores dela e abraçou-lhe a
cintura. “Mas agora estamos as duas grávidas,” disse.

A irmã de Amora tocou-a no pescoço e tirou a jóia verde de dentro do vestido dela. “É como a estranha
disse,” falou chorando muito. “Estamos apaixonadas pelo mesmo homem.”

“E uma de nós vai matar a outra?”

Então a irmã de Amora soltou a jóia verde. “Não,” ela disse, “eu vou embora. Direi que estou grávida de
uma serpente.” E Amora percebeu a raiva que sua irmã sentia. “Ou de outro homem, se o filho que espero tiver
pernas.”

No dia seguinte havia móveis destruídos por todo castelo e homens mortos e também um arranhão feito
por garras de lâmia nas costas da irmã do Barão de Loirs. E a irmã de Amora havia sumido. “Ela ficou louca,”
Amora disse. E os homens expulsaram as lâmias do castelo, foram todas para o mundo subterrâneo. E o barão
acabou apaixonando-se por Amora quando ela deu-lhe uma filha linda que tinha os mesmos olhos verdes dele e os
mesmos lábios grossos de Amora, e também os cabelos dourados dela9. E para alegria de Amora, tinha os pés
delicados de uma mulher comum, a menina, e não os de uma lâmia.

Casaram-se o barão e Amora e ele tornou-se o grão-duque de Orqushire e Loirs. E se alguma vez em sua
vida Amora foi capaz de amar alguém, ela amou a criança, na qual puseram o mesmo nome da tia. E não da lâmia,
mas da tia humana, que era a sexta Mychelle Alanturia de Loirs. Amora deu para a menina a esmeralda e tudo o
que ela podia querer.

Quando a pequena duquesa fez oito anos, Amora morreu.

Passeava pelo bosque perto do lago, com uma margarida presa atrás da orelha e segurando a mão da filha,
quando surgiram três homens. Traziam com eles velhos ossos e chifres de dragão cobertos pelas algas do fundo do
lago. Amora sabia quem eram. Mandou que sua filha corresse e a menina fugiu para o Reino Subterrâneo.

Pouco depois a irmã de Amora chegou na clareira e encontrou-a no chão, com suas roupas rasgadas, as
pernas de cabra descobertas, e dois ossos longos e pontudos de dragão metidos no peito, perfurando suas costelas,
e um atravessando o ventre e também o solo sob o corpo dela. Estava morrendo.

A irmã de Amora abaixou-se perto dela e tirou-lhe o cabelo da frente dos olhos, acariciou-lhe o rosto,
acomodou-a no colo. Pegou a mão dela.

“Tu disseste onde eu estava,” Amora falou e uma bolota grande de sangue preto caiu de seus lábios. “Tu
me entregaste pra eles, não foi?” E os olhos da irmã dela se encheram de lágrimas. “Sempre fui uma p***. Não te
culpo por isso. Nós duas sabemos a verdade, mas não os homens.”

“Quieta,” a irmã dela falou e lembrou do que Amora lhe havia dito quando tinham se encontrado pela
ultima vez, há pouco mais de três anos, naquela mesma clareira: no escuro, Amora havia disfarçado as pernas e
tinha assumido a forma e a idêntidade da irmã para engravidar do Grão-Duque; e a própria Amora tinha matado os
homens do castelo para culpar as lâmias e sua irmã depois dela ter fugido de lá.

“A minha filha,” Amora chamou e sentiu-se aliviada quando viu a menina escondida atrás da irmã. “Não
deixa que eles… Eu fiz o possível para… proteger...”

“Tudo bem,” ela ouviu. “Não te preocupes.”

Amora tentou falar mais, mas já não podia fazer isso. Ergueu um braço e apontou para a menina.

“Calma, está tudo bem,” a irmã dela repetiu e acariciou-lhe a testa, por entre os chifres. “Descansa agora.”

E Amora fechou os olhos e depois parou de tentar respirar.

Então vieram os soldados e encontraram a lâmia ali, com a duquesa morta em seus braços. Se não
estivesse abraçada a ela a duquesinha, teriam-na matado. Bem, não teriam conseguido, de qualquer forma, pois
antes seriam transformados em pedra, mas deixaram que fugisse sem tentar segurá-la.

E então ela foi embora. E vieram as guerras com o Reino Subterrâneo e os tratados e tudo o que todos
desta província conhecem, embora nem todos saibam o verdadeiro motivo.

É isso.

*****

“Tu trouxeste mesmo os dragões?” Pelluria perguntou um pouco depois da rainha Ellenora terminar a
história. “Tu entregaste a tua irmã para eles?”

“O que tu achas?” foi a resposta dela.

Ninguém disse nada. A rainha soltou a jóia em cima da mesa e voltaram-se para a esmeralda as atenções
de Gustaff Olafson e da fada. E então a soberana do Reino Subterrâneo falou:

“Não. Eu não poderia. Ela era minha irmã e eu a amava.”

“Aquele homem que nos acompanhava,” perguntou Gustaff Olafson, “acreditas que seja um dragão?”

“Sim; ele e o dragão vermelho que minha irmã matou são a mesma coisa.”

“E o que estava fazendo aqui? Teria vindo pela jóia?” Pelluria perguntou.

“Quem sabe o que querem os dragões? Podiam já ter tirado a esmeralda de minha irmã naquela ocasião,
bem como podiam tê-la roubado de Mychelle Alanturia depois disso, mas nunca o fizeram durante todos estes
anos. Sempre acreditei que pelo fato de ser a jóia inútil.” Depois que disse isso a rainha, interessaram-se ainda
mais Gustaff Olafson e a fada; e a soberana prosseguiu: “Ela aumenta a força, mas só dos que tem sangue de
demônio, que é como os simples chamam o sangue de górgonas. Apesar disso, a jóia cobra um preço, e traz
sofrimento. E os que não tem o sangue só podem obter da pedra este ultimo.”

“É verdade,” concordou Pelluria. “Essa jóia dá mesmo azar, basta ver tudo que me aconteceu desde que
deparei-me com ela!”

“Tentei avisar minha prima uma vez,” Altisidora disse e, com uma mão nas costas, esticou o pano que
cobria seu peito. “Mas não quis ouvir e me chamou de invejosa. Usa a esmeralda desde pequena, mas sempre
pareceu imune aos seus efeitos malignos. Talvez agora sua sorte tenha mudado.”

“Bobagem, suas burras!” a fadinha gritou do outro canto, de braços cruzados. “Pode estar amaldiçoada a
esmeralda, mas sempre há maneiras de reverter uma maldição. E essa história, além de conter passagens
hediondas e obscenas, está muito mal contada: por exemplo, por que a tal mãe da duquesinha transava com tudo
que era homem e nunca ficava grávida, e aí, duma hora pra outra, ela aparece grávida do grão-duque? Não é por
demais conveniente?”

“Porque ela tomava chá de quitoco, ora,” Pelluria disse e puxou para perto de si o odre em que estava
atada a pequena. “E o que tu sabes sobre a jóia, seu monstrinho? Não disseste que a tua chefe te mandou até aqui
para roubar a esmeralda?”

“Sim.” A fadinha, percebendo que não podia voar para longe, escondeu-se atrás do odre para ficar fora do
alcance de minha tia. “Os elfos sombrios do clã dos dragonetes capturaram a filha de minha formosa senhora
Régala e exigem a jóia da duquesinha para devolvê-la com vida!”

“Elfos do clã dos montadores de dragonetes?” perguntou a rainha Ellenora e suas serpentes começaram a
sibilar. “Há poucos meses encontramos alguns espiões deles na província, uns até mesmo atreveram-se a invadir o
Reino Subterrâneo. Transformei os ossos deles em pedra e deixei-os espalhados pelas galerias para servirem de
aviso.”

Isso explicava o esqueleto de pedra encontrado pela minha tia e pela mulher-coelho no nosso capítulo
anterior e Pelluria deu-se conta de que ‘clã dos montadores de dragonetes’ era o que deviam significar as runas
marcadas no cinturão que ela passara tanto trabalho para decifrar.

“Têm fama de saqueadores, os montadores de dragonetes, mas não imaginávamos que a jóia fosse o
objetivo deles,” continuou a rainha. “De repente, então, estão interessados tantos grupos nesta jóia que foi de
minha sobrinha por tantos anos?”

“Podem tê-la descoberto há pouco,” Pelluria falou. “O estranho disse que os de Dravísios vêm de fora do
continente. Quem pode saber de que distância e de que tipo de terra?”

“E de que outro lugar vieram os dragões que mataram minha irmã?” disse a rainha. “O dragão vermelho
disfarçado de mulher veio do leste, donde só há o mar.”

“Não podemos nos esquecer de que existem outras jóias,” lembrou Gustaff Olafson, “como a de Xexeres e
a da Rainha Tchuma-Enthofa. Não terão todas origem semelhante?”

“A de minha sobrinha foi feita pelos dragões, pelo que disse a estranha à minha irmã,” explicou a rainha.
“Mas minha mãe roubou a esmeralda e, de alguma forma, alterou sua estrutura para que apenas ela pudesse usar.
Fazendo isto, terminou por amaldiçoar a pedra. Na verdade pouco me importa quem vai ficar com esta esmeralda.
Se quiserdes, vos entrego a jóia, desde que leveis ela para longe daqui. Só não quero que minhas filhas ou minha
sobrinha e o grão-duque terminem como a minha irmã.”

A rainha Ellenora contou então que havia enviado uma mensageira para alertar o grão-duque dos
acontecimentos e disse que suas vigias haviam encontrado na floresta um grupamento de homens em armaduras
similares àquele que tinham enfrentado há pouco tempo. Havia talvez cinquenta deles e podia ser sua intenção a
de atacar o vilarejo ou o Reino Subterrâneo, ou até o castelo de Loirs, em busca da jóia. Cinquenta daquelas coisas
de armadura poderiam fazer enorme estrago, mesmo que o exército de lâmias ou o exército do grão-duque os
pudessem deter. As entradas para o Mundo Subterrâneo estavam seladas e as lâmias haviam todas se refugiado
dentro dos túneis, estando prontas para defender seu lar.
Por fim a rainha jogou a jóia nas mãos de Pelluria e disse:

“Se fores embora com ela, os homens de armadura irão atrás de ti. E também os elfos sombrios de que fala
a fada e, quem sabe, os dragões e até mesmo a minha sobrinha, que parece ter grande apego pela esmeralda. E,
não vou mentir, ela certamente não te fará bem algum. Não vamos esconder de ninguém que está contigo.”

“Dá a jóia para mim, elfa, e eu a levarei até a rainha Tchuma-Enthofa,” pediu Gustaff Olafson.

“Não!” a fadinha gritou. “Me dá a esmeralda e eu levo ela até minha senhora!”

Pelluria cobriu o corpo da fada com a taça em que estivera bebendo para que a pequena se calasse, e após
pensar um pouco, disse:

“Nada disso. Precisamos voltar ao vilarejo.”

“O quê? Mas o vilarejo pode ser atacado a qualquer momento,” Gustaff Olafson falou, estranhando aquele
desejo da elfa. “E tu mesma não disseste quase ter sido executada pelo povo daquele lugar? Vamos embora da
província! Não era o que querias fazer? A jóia tem grande valor, Tchuma-Enthofa pode te pagar bom dinheiro por
ela.”

Pelluria levantou-se e disse aos outros, enquanto puxava Gustaff Olafson pelo ombro:

“Só um minutinho que eu preciso falar uma coisa com ele em particular!”

“Esquece a elfa,” a lâmia Altisidora falou para Gustaff Olafson. Pelluria viu a enorme cauda dela vindo
por baixo da mesa. “Fica aqui e casa comigo!”

Neste momento a rainha levantou-se e mandou que levassem Pelluria e o homem para onde pudessem
falar e decidir o que fazer, e disse que mais tarde Altisidora mostraria a Gustaff Olafson todas as riquezas das
lâmias e tudo que poderia ser dele se se casasse e fosse viver com ela (pois parece que a rainha aprovava a
vontade de sua filha).

“Dize que vais pensar,” Pelluria falou e bateu nele com o cotovelo. “Essas lâmias malucas são capazes de
fazer alguma sacanagem se ficarem irritadas.”

Então aproximou-se uma das cortesãs e pediu que eles a acompanhassem. Pelluria logo foi atrás dela, mas
Gustaff Olafson viu a fadinha batendo uma das mãos contra as paredes da taça e apontando com a outra para as
próprias bochechas arroxeadas pela falta de ar e tirou-a dali; arrebentou a cordinha e levou-a consigo.

*****

Foram para uma pequena sala iluminada por archotes onde havia um amontoado de palha num canto e
também alguns caixotes vazios que serviam de mesa. Fecharam, sem chavear, uma porta de ferro com uma
janelinha e deixaram sozinhos minha tia, o humano e a fada. Gustaff Olafson perguntou por qual motivo pretendia
Pelluria voltar ao vilarejo, onde certamente não seria bem recebida e perderia a jóia que poderia render-lhe
dinheiro.

“Preciso buscar a Lucille,” ela disse. E em seguida explicou-lhe, quando ele perguntou, de quem se
tratava.

“Arriscarás tudo por uma espada?” intrigou-se Gustaff Olafson.

“Não é uma espada comum, é a espada da minha família! Ela é muito importante!”

“Dá a jóia pra gente, elfa,” sugeriu a fada. “Daí nós a levamos embora e tu podes ir para onde quiseres.”
“Vou para o vilarejo e tu ou a Meloine vão vir comigo, vão me ajudar a recuperar a Lucille!” Pelluria disse
para Gustaff Olafson e ignorou a outra. “E é bom decidir logo, antes que nossa amiga lâmia descubra que quer se
casar com uma saborosa coelhinha de Xexeres!”

Mas Gustaff Olafson, lembrando-se do guerreiro de armadura na floresta, respondeu:

“Não há nada que possa me fazer querer voltar ao vilarejo em momento tão perigoso.”

“Bom, talvez eu possa te dar um bom motivo,” Pelluria disse e apoiou suas costas na parede rochosa.
Contou sobre a jóia de Xexeres e sobre como ficara com ela a capitã Artemísia do vilarejo; claro que não disse que
bem poderia estar morta a capitã, e a jóia, em poder dos de Dravísios. “Sem ela, a rainha Tchuma-Enthofa não
poderá desfazer a maldição!”

“O que? Não é possível!” disse Gustaff Olafson. “Como foi aquela coelha burra capaz de perdê-la?”

“Ora, ela é meio descuidada. Vamos, agora vem comigo e poderemos recuperar tua jóia e a minha Lucille,
e já aproveitamos para saquear algumas moedas daquela duquesinha da bunda gorda. Depois eu vendo esta
esmeralda para a rainha Tchuma-Enthofa e, finalmente, lucro um pouco com esta história toda.”

“Por favor, levai-me junto!” pediu a fadinha.

“Tu vais é voltar para as lâmias!” Pelluria disse. “Nem devias estar aqui!”

“Por favor, dona elfa Pelluria, me resgata! Pede para a rainha-lâmia me soltar! Eu te concedo três desejos
em troca da minha liberdade!”

“Pensas que vou cair de novo nesse truque?” minha tia perguntou.

“Eu posso cantar pra ti! Sou uma fada cantora, posso cantar todas as músicas que existem em qualquer
idioma e as que não existem e também as que forem existir e as que já não existem mais por terem sido
esquecidas, olha: ¯Tell you what it's all about: It is without-a-doubt swing in the latest style! ¯Service with a
smile! If you want to swing and shout, get your heels and get about, ¯I'm an errand fairy-girl for rhythm! Send
me! Just get hip and follow through, ¯I'll deliver straight to you! I'm an errand fairy-girl for rhythm, send me!”

“E pra que vou querer uma música que eu não entendo, sua gralha?” Pelluria perguntou e levantou a
fadinha, aproximando-a do rosto.

“Eu também sou uma fada lutadora e posso entrar em buracos pequeninhos e posso carregar o dobro do
meu peso! Por favor, te dou três pedidos!”

“Qual o teu nome, fada?”

“Alanis,” a fadinha zumbiu.

A elfa mostrou para ela a esmeralda, cuja correntinha prateada tinha enrolada nos dedos da outra mão, e
disse:

“Talvez tu sejas útil no vilarejo. E sei que não fugirás para muito longe, pois estás de olho nesta jóia, não é
verdade?”

“Gulp! Sim, senhora! Quer que eu cante de novo, senhora?”

“Não percamos tempo,” Gustaff Olafson disse neste ponto. “Devemos anunciar nossa decisão, vamos até a
rainha das lâmias.”

“Então virás comigo?”

“Que escolha tenho? A jóia de Xexeres é a única coisa que pode acabar com minha maldição.”

“Tudo bem.” Pelluria jogou a fada nas mãos dele, onde a pequena encolheu-se assustada. “Vão indo na
frente que eu tenho que fazer uma coisa antes.”
Gustaff Olafson, com a fada, deixou a sala e, alguns minutos depois, Pelluria foi atrás deles. Encontraram
a rainha Ellenora sobre aquele monte de almofadas em que estava quando haviam conversado com ela no capítulo
anterior, e ela disse que poderia conduzi-los através de túneis secretos até a saída há muito tempo sem uso que
abria-se no interior da Cerejeira Sagrada, por onde entrariam no vilarejo sem que ninguém os percebesse. Era a
mesma passagem mencionada na história de lady Amora, a rainha explicou quando surpreenderam-se sobre o fato
de terem as lâmias uma entrada para o vilarejo dos humanos sem que estes sequer suspeitassem.

Altisidora quis ir junto, mas sua mãe permitiu apenas que acompanhasse os outros até o fim da passagem,
pois não queria que corresse perigo.

A rainha ainda mandou que entregassem à elfa cimitarras e outros itens que pudessem ser úteis. Pelluria
perguntou então se poderia ficar com a fadinha, e a rainha acabou concordando, desde que a pequena entregasse
para ela um pouco de seu suco.

“Tu vais me dar o teu suco na quantidade que eu exigir?” perguntou a rainha à fada.

“Ai, eu vou tentar. Mas pra isso preciso de uma Marcgravia polyantha roxa com fruto.”

“Minhas filhas trarão a flor para ti. E só partirás se puderes produzir o suficiente.”

“Como se tira suco de fada?” quis saber Pelluria.

“Como eu não sei, mas o suco de fada tem poderes hipnóticos,” disse Gustaff Olafson.

Ficou decidido que só partiriam no fim do dia (pois lá na superfície já havia amanhecido há horas), para
que pudessem entrar no vilarejo depois de posto o sol, quando seria mais fácil passarem despercebidos. E também
porque assim poderiam mudar de plano caso fosse o vilarejo atacado durante o dia pelos de armaduras, e poderia
minha tia descansar um pouco, pois mal parava de pé.

Retornaram àquela outra sala e Pelluria sentou-se sobre a palha esparramada no chão. Devolveram à fada
as suas roupas, de modo que, aliviada, pôde finalmente cobrir seu corpo com algo além das mãos, e deram para
minha tia o restante dos itens que haviam tirado da pequena: uma varinha e outros artefatos acomodados em
minúscula sacola que a elfa guardou com seus pertences.

“Por favor, dona Pelluria,” chamou abatida a fadinha, em quem puseram uma pedra pequena acorrentada a
um dos pés para que não pudesse sair voando. “A senhora pode vender a esmeralda para minha senhora Régala ao
invés de vendê-la para Tchuma-Enthofa?”

“É cedo demais para isso. Só depois que tiver a Lucille de volta decidirei o que fazer da jóia.”

*****

Porque estava mesmo muito cansada, minha tia dormiu logo em seguida. A fadinha, entediada, passou
bom tempo andando e arrastando sua pedra dum lado para o outro em cima do caixote onde fora deixada, até que
chamou Gustaff Olafson, ele também quase dormindo, apoiado num outro canto.

“Ei, tu confias nesta elfa?” perguntou ela em voz baixa. “Acho que vai sumir com a esmeralda assim que
recuperarmos sua espada.”

“É verdade, nada garante que não fugirá. Afinal, não passa duma ladra que aplicava golpes simplórios em
viajantes.”

“Vamos aproveitar que dorme e vamos tirar-lhe a jóia!” sugeriu a fadinha, pois imaginava que seria mais
fácil roubar a esmeralda de Gustaff Olafson do que de Pelluria, por já estar a elfa bastante prevenida a respeito
dela.
Gustaff Olafson, que também preferia estar ele mesmo com a jóia, aproximou-se de Pelluria e percebeu
não estar a esmeralda no pescoço dela e nem nas mãos ou em qualquer outro lugar dos que ficavam à vista.

“Tira-me daqui que eu ajudo a procurar,” a fada ofereceu e ele colocou-a no chão. Esforçando-se um
pouco, ela escalou as pernas de Pelluria, que roncava e dormia um sono pesado, e Gustaff Olafson terminou de
procurar no interior dos sacos de pano que continham os diários da elfa.

“Onde ela escondeu?” ele perguntou sem saber onde mais poderia ter sido posta a jóia.

“Já sei!” a fada falou bem baixinho, apontando para a saia de Pelluria. “Na ultima vez que nos
encontramos, ela tinha colocado a esmeralda dentro da saia. Deve ter feito o mesmo naquele momento em que
ficou sozinha!”

“Quer dizer...”

“Vamos, levanta a saia dela!” a fada pediu, segurando com as duas mãos a pedra a que estava acorrentada
e batendo as asas para equilibrar-se sobre uma das coxas de minha tia. “Levanta logo antes que ela acorde! Com
cuidado, vamos, a elfa não vai nem perceber!”

Com certa relutancia, Gustaff Olafson pegou a beira da saia de Pelluria com as pontas dos dedos e,
observando a elfa para ver se não despertava, foi erguendo-a vagarosamente.

“Rápido, levanta tudo! Não tá dando pra ver nada!” sussurrou a fadinha, abaixando a cabeça para espiar
por sob os panos.

Ele jogou a frente da saia para cima, em direção ao ventre da minha tia, e ficou então descoberta toda a
pube pelada dela.

“Ih, ela não usa calcinha! E não tem nada aqui!”

“Nem pêlos!” concordou a fadinha. E em seguida bateu com o bico da botina na... bem, na intimidade da
minha tia. “Ei, olha ali! Tem uma argolinha prateada escondida aqui embaixo! Abre as pernas dela, deve ser a
corrente em que estava presa a jóia!”

A fada soltou a pedra que carregava, abaixou-se ali entre as coxas da minha tia e meteu com força um de
seus braços finos entre as virilhas dela, trazendo para cima uma argolinha de metal que, ao modo de um brinco,
estava presa num daqueles lábios mais grossos que todas as elfas, e também as mulheres que não são elfas, têm
nessa parte do corpo (estava no lábio esquerdo, se quiserdes informações mais precisas). E fez isto muito rápido,
de maneira que já tinha o brinco ou argola em suas mãos quando Gustaff Olafson pegou-a para tirá-la dali. Puxou-
a e ela puxou o brinco, e como este estava preso da maneira como foi dito no corpo de Pelluria, esticaram junto
aquele lábio dela. E se já dói o suficiente um puxão desses em um brinco na orelha, imaginai em um lugar desses.

Na mesma hora Pelluria sentou-se berrando e viu Gustaff Olafson ajoelhado ao seu lado; em seguida sua
mão estava acertando o rosto dele com toda força que tinha.

“Tarado! Pervertido!” gritou a elfa, cobrindo a pube e, debaixo da saia, apertando a mão contra aquele
lugar tão dolorido. “Onde já se viu?! Não posso nem dormir em paz!?”

“Foi a fadinha! Ela queria roubar a jóia!” ele disse, tentando se proteger dos chutes de Pelluria, que não
paravam de vir.

“O quê!? E desde quando a minha b***** é porta-jóias?” Pelluria levantou empurrando Gustaff Olafson e
fazendo com que caísse para trás. “Dize-me! A minha b***** parece porta-jóias pra ti, tarado?” gritava ela e
tentava pisar em cima dele de tudo que era jeito enquanto corria para longe a fadinha. “Não, não precisas
responder! Agora porque tenho um brinco na b*****, então também devo ter jóias e barras de ouro e, por que
não?, diamantes dentro dela!”

“Socorro! A fadinha disse que estava sob a tua saia! Foi idéia dela!”
Pelluria pegou a cimitarra que repousava de encontro à parede, aquela que a rainha das lâmias lhe havia
dado, e ergueu-a acima dos ombros pronta para descê-la na cabeça dele.

“É uma mina de pedras preciosas, a minha b*****!” ela gritou e percebeu então que haviam aberto a porta
da sala e já estavam lá dentro Altisidora e outras duas lâmias, todas estranhando muito aquilo tudo.

“O que está acontecendo aqui?” Altisidora perguntou com as mãos na cintura.

Pelluria virou o rosto vermelho para ela e pensou um pouco. Depois sorriu e depois abaixou a cimitarra
devagar, dizendo “A gente tava só treinando!” enquanto Gustaff Olafson arrastava-se para longe de seus pés.

Uma das outras lâmias recolheu a fadinha, que era o que tinha vindo fazer, e saiu da sala com ela. Pelluria
aproximou-se de Altisidora e, no corredor, disse-lhe:

“Acho que o meu amigo gosta mesmo de ti.”

“O que?”

“Não parava de falar em ti e em como te acha bonita,” mentiu Pelluria. “Talvez esteja apaixonado.”

“Verdade?” Altisidora sorriu.

“Sim, nunca ouvi elogiarem tanto uma cauda de lâmia!”

Altisidora abaixou o rosto um pouco envergonhada e a ponta de sua cauda, que costumava ficar erguida,
deitou-se no chão. Ela falou:

“Eu ia mostrar a ele o Reino Subterrâneo e os meus aposentos.”

“Por que tu não levas ele para lá, então? Com certeza vai deixá-lo muito feliz. Mas cuidado, temo que
possa ter a intenção de aproveitar-se de ti se ficares sozinha com ele!”

“Oh, é mesmo?” A lâmia pôs as mãos nas costas e deslizou até a entrada da sala. “Eu vou ser cuidadosa,
então.”

Assim, Altisidora levou Gustaff Olafson dali e minha tia, vendo-se sozinha, fechou a porta atravessando
na maçaneta a cimitarra e colocando na frente dela os caixotes para que não pudesse ser aberta sem causar muito
barulho. Tirou sua capa, deitou e cobriu-se com ela. Em seguida dormiu de novo e descansou por muitas horas.

*****

Altisidora vestia agora apenas o pano avermelhado sobre o peito e as vários argolas de ferro ao redor dos
braços, algumas delas moldadas no formato de pequenas serpentes. Estava com os cabelos presos, faziam uma
cola muito escura e comprida indo até abaixo de sua cintura, de aparência pesada.

Estava sentada ao lado de Gustaff Olafson sobre umas rochas arredondadas, à beira duma piscina ou lago
raso e de águas límpidas que ficava num dos extremos de uma enorme gruta. Havia panos cor-de-rosa em algumas
paredes, e em outras, nas descobertas, algumas tochas. Mais panos cobriam algumas mesas, e também, mas só de
forma parcial, um grande espelho ao lado de um armário que não estaria deslocado num quarto de castelo nobre e
rico e que não sei de que maneira não estava arruinado pela umidade. Para trás havia um amontoado de almofadas
volumosas muito similar àquele da sala da rainha, mas cercado por dois postes ou pilares de madeira que
seguravam cortina de seda; era provavelmente a cama da dona daquele lugar.

Era tão grande a caverna que as tochas, e também as velas em candelabros nas mesas, não conseguiam
iluminar tudo. O ar era frio, mas bastante agradável para uma lâmia, e tinha o perfume suave delas acompanhado
de um toque de musgo.
Parte da cauda de Altisidora estava mergulhada na água e deslizava vagarosamente de um lado para o
outro, suas escamas brilhando muito; era tão comprida que às vezes sua ponta erguia-se lá longe e dela escorriam
pingos claros.

Altisidora havia mostrado um pouco do tesouro das lâmias para o humano: alguns baús de ouro e jóias e
alguns quadros e livros e diversos artefatos e móveis construídos por elas ou roubados de homens ou de viajantes
de outras raças. Havia muito mais, ela disse. Mostrara também várias partes do Reino Subterrâneo, salas onde
dormiam dezenas de lâmias, galerias com armas e decorações variadas, precipícios e pontes similares àquele que
ele havia percorrido para chegar até a sala da naga, e vários túneis e caminhos que formavam apenas o centro de
todo aquele labirinto, e que estavam dentro daquela espécie de torre de rocha lisa que ele havia avistado da ponte,
da qual até mesmo estradas partiam.

“Se te casares comigo, tudo isto será teu também,” ela disse jogada para trás, apoiada em seus braços
musculosos e ao mesmo tempo delicados.

“Mas como é possível que se case um homem com uma lâmia?”

“Ora, isso é muito normal, muitas lâmias casam com humanos,” Altisidora respondeu e soltou os cabelos,
jogou-os todos para trás dos ombros. “Não prestaste atenção na história da mãe da duquesinha? Ela era uma lâmia.
É muito normal e comum, eu digo!”

“Mas ela tinha...” e Gustaff Olafson olhou para a água, em direção à cauda de Altisidora. “Hã, pernas,
apesar dos pés de cabra.”

Altisidora voltou-se para a própria cintura e depois pôs as mãos sobre o lugar onde uma mulher normal
teria as coxas.

“Ah, isto?” ela perguntou e um dente pontudo apareceu no canto de sua boca. “Qual o problema com a
minha cauda?”

“Bem... tu disseste que querias ter filhos.”

“Ah, tu não entendes muito de lâmias, não é mesmo?”

Altisidora contou que as lâmias como ela, e também como a rainha Ellenora, que eram as lâmias nobres
(coisa que a mãe da duquesinha, lady Amora, não era) colocavam muitos ovos uma vez por ano, e ela sempre o
fazia na primavera, no nlla’lt. Para isto ela não precisava casar, mas desta forma suas filhas nasceriam lâmias
comuns, destas meio mulheres e meio cobras que eram a maioria das que viviam no Reino Subterrâneo e que eram
conhecidas como guerreiras. E filhas assim ela já tinha muitas.

Porém, se casasse com um homem (não precisando ser ele necessariamente humano), suas filhas poderiam
ser dos mais variados tipos de lâmia, e, com sorte, nasceria até mesmo uma lâmia nobre. Com muita sorte, claro,
mas podia acontecer, afinal ela mesma era a filha duma serpente gigante (porque era possível para lâmias terem
filhos com bodes, serpentes, leões e diversos outros animais, dependendo, é lógico, do tipo de lâmia que fossem,
pois existiam inúmeras espécies delas).

Gustaff Olafson disse a Altisidora que tinha imaginado ser o grão-duque o pai dela, já que na história de
lady Amora havia a rainha Ellenora ficado grávida do nobre. Mas a filha dele chamava-se Laetitia, Altisidora
explicou, e tinha pernas, sendo bem mais humana do que lâmia.

“Olha, eu posso ter pernas também!” Altisidora disse em seguida e levantou-se, sua cauda jogando água
para todos lados. Ela deslizou até o armário e tirou de dentro dele um pano, que enrolou na cintura e transformou
em saia longa; ia a saia dali de onde se prendia quase até o chão.

Quando Gustaff Olafson percebeu, estava vendo uma mulher comum. A gigantesca cauda de Altisidora
havia sumido e no fim da saia revelavam-se pés humanos. E sob os panos claros, podia-se ver pernas e as formas
de duas coxas grossas como as da duquesinha.

“Tu podes te transformar numa mulher humana!”


“Bom, não é de verdade,” ela disse apoiada no armário. “É só uma ilusão, se alguém toca, elas
desaparecem. E eu nunca treinei muito, não consigo andar direito com essas coisas!”

Altisidora veio aproximando-se lentamente e com os braços abertos para se equilibrar, mas quando chegou
na frente dele, tropeçou e, se Gustaff Olafson não a tivesse segurado, teria caído no chão. Sua cauda voltou a
tomar o lugar das pernas, duma hora para outra preencheu a saia e saiu por baixo dela.

“Viste? Prefiro meu rabo. É mais fácil de caminhar!” Ela riu segurando-se nos braços dele enquanto
levantava. A pele dela era úmida. “Não gostas do meu perfume?”

“Ah, claro, claro.” Ele se afastou. “É comum então que as lâmias daqui se casem com humanos do
vilarejo?”

“Oh, não.” Altisidora pôs as mãos na cintura. “Os homens de Orqushire não gostam muito das lâmias, tu
sabes, por essa história toda com lady Amora – digo, o que ela fez anos atrás no castelo – e muitas das lâmias
também não gostam deles. Mas acontece, às vezes, e minha mãe não se oporia se eu quisesse me casar com
alguém do vilarejo. Tenho irmãs que se casaram com homens de Orqushire e algumas vivem em casas acima da
terra.”

“E isso tu nunca quiseste?”

Ficaram vermelhas as bochechas da lâmia; tinha o rosto magro e o nariz reto e fino.

“Bem, não exatamente,” ela respondeu.

(Interrompemos a história para um flashback com a lâmia Altisidora)

Altisidora [acariciando um homem amordaçado e amarrado numa cadeira]: Vamos, vamos, não fiques
com medo, não vou tirar nada de ti! Bom, nada muito importante, pelo menos.

Rainha Ellenora [abaixando as calças dele]: Apenas dá-nos um pouco da tua semente e te libertaremos
sem causar-te mal algum.

Altisidora [acariciando de maneira intensa o homem]: Relaxa, não vai doer nada. Não estás gostando?

Rainha Ellenora [segurando apertado o que pertencia ao homem]: Ele parece já estar pronto. Não vamos
desperdiçá-lo!

Altisidora [virando-se e sentando-se com cuidado sobre ele, e enrolando muitas vezes sua cauda ao redor
dele]: Aah, viu? É muito mais gostosa que as das humanas, não é?

Rainha Ellenora: Devagar, não o apertes tanto!

Altisidora [subindo e descendo]: Preciso me segurar nele pra não cair! Vamos, só mais um pouco, estás
sentindo ele bater no fundinho? Está todo dentro! Por que não te mexes também? Oh! Ele não está se mexendo!

Rainha Ellenora: Oh, não. Já é o terceiro esta semana! Precisas controlar a força da tua cauda,
Altisidora! É por essas coisas que acabamos todas com a fama de devoradoras de homens!

Altisidora [chorando]: Eu fiz de novo! Eu fiz de novo! Aaah, eu esmaguei outro!

Rainha Ellenora [consolando Altisidora]: Calma, nós pegamos mais um e tentamos de novo. Da próxima
vez tu consegues.

(fim do flashback)
“Hã, quer dizer, não, eles não me agradam, nunca quis me casar com nenhum!” Altisidora abaixou o rosto.
“Bem, o que é que tens com aquela elfa da madeira, afinal?” perguntou.

“Nada, eu mal a conheço.”

“Sério? De verdade?” a lâmia ergueu uma das sobrancelhas.

“Claro, eu nem confio nela. Nos encontramos há dois dias no vilarejo. E acho que ela não gosta muito de
mim.” Gustaff Olafson acrescentou esta ultima parte ao lembrar-se dos acontecimentos mais recentes.

“Mm. Vem comigo.”

Altisidora levou-o para perto das almofadas e sentaram-se ali. Ela pegou uma cesta cheia de nozes abertas
e comeram algumas delas.

“Tu achas ela bonita?” perguntou um pouco depois.

“A elfa?” disse Gustaff Olafson. “Não tinha pensado nisso. Mas ela é muito magra.”

“É, e tem as bochechas cheias de efélides!” Altisidora riu, e ele também apesar de não saber o que
significava ‘efélides’. Então, uma hora, ela deitou o rosto no colo dele. Parecia uma mulher comum, se não se
olhasse abaixo da cintura. E se não estivessem os dois cercados por uma cauda gigante de serpente. E até que era
bonita. Ou isto ou ele já estava se acostumando. “Podes me dar um beijo, se quiseres. Não precisas ter medo, eu
sou uma constritora, não sou venenosa!”

*****

Mais para o final da tarde, acordaram Pelluria com batidas na porta da sala. A rainha disse a ela que uma
tempestade se aproximava e que os guerreiros de armadura haviam desaparecido por completo da floresta; não se
sabia para onde tinham ido, mas também não havia sinal deles ou de luta no Vilarejo da Cerejeira Sagrada. Algo ia
acontecer e não podia ser algo bom.

Minha tia tinha posto de novo sua camisa, que tinha sido lavada e secada e agora tinha uma costura no
ombro. A elfa e Gustaff Olafson recolheram as cimitarras e os equipamentos cedidos pelas lâmias, e também foi
entregue à minha tia a fadinha, já vestida e aparentando estar bastante cansada, como se tivesse tido que fazer
grande esforço para dar à rainha aquilo que ela tinha exigido. A pequena, dizendo-se abatida demais para voar,
entrou num dos bolsos de Pelluria e lá ficou. E Pelluria amarrou-a ali com um pedaço de lã.

Altisidora conduziu os três por túneis iluminados e por rampas e passagens onde teve que acionar
alavancas para afastar grades e outras portas. Carregando tochas, chegaram num corredor mais estreito e sem
iluminação onde ela usou uma chave enorme para abrir uma porta de ferro que tinha dez fechaduras.

Mais tarde ainda, pouco depois do anoitecer, chegaram onde havia uma escada de metal reta que subia por
passagem muito apertada e que à minha tia lembrava uma chaminé; terminava no topo da Cerejeira Sagrada,
Altisidora disse, mas de jeito nenhum minha tia podia enxergar, donde estava, o topo da subida.

Foi ali que Gustaff Olafson voltou a transformar-se na coelha Meloine, o que, é claro, foi uma das coisas
mais estranhas que Altisidora e a fadinha já tinham visto. E Meloine também ficou muito assustada quando viu a
lâmia, logo tirou sua espada da bainha para defender-se dela, pois reaparecera com todas suas roupas e armas e
equipamentos ninja. Mas Pelluria explicou-lhe tudo e em seguida a coelha já estava verificando seus itens, pronta
para retornar ao vilarejo em busca de sua jóia.

“Vão agora, eu vou estar por perto,” Altisidora disse, retirando de seu braço uma daquelas pulseiras de
ferro. Deu-a para Pelluria. “Entrega para ele, dize que se a perder ou se não voltar para mim, ele já sabe o que
faço.”

“Só não vai fazer enquanto eu estiver presa a ele!” Meloine falou e subiu pela escada.

Altisidora disse para Pelluria que Gustaff Olafson havia prometido voltar para casar-se com ela quando se
livrasse da maldição.

“Hm, vós sois noivos, então?”

“Sim. Por favor, dize para ele que se eu não receber nenhuma mensagem, vou ir atrás dele e, se tiver se
engraçado com outra mulher, irei fatiá-lo com minha cimitarra.”

Pelluria entregou a tocha para a lâmia e começou a subir a escada. Mas Altisidora chamou-a de volta e
perguntou-lhe:

“O que tu quiseste dizer antes com... hã... ‘A minha b***** é uma mina de pedras preciosas’?”

...

Na seqüência desta narrativa descobriremos o que aconteceu com a capitã Artemísia enquanto minha tia
estava no mundo subterrâneo e saberemos qual era o item que deveria ela receber do enviado de Dravísios! E
também a felina da Turísia tentará recuperar sua pérola e a herborista revelará seu verdadeiro propósito, tudo
assuntos de grande interesse para quem quiser saber como continua a aventura!

Notas finais do capítulo


1 Não que alguém possa viver numa árvore, mas o tronco daquela tinha abertura levando para a rede de túneis e
cavernas que era na verdade o lar das duas. 2 Ih, não começou bem esta história! 3 Ui! Que tarada essa rainha das
lâmias está me saindo. 4 Eu até poderia comentar, mas acho que vou parar com essas notas; me chamem quando
acabar. 5 Por Sene, a mulher é doente! 6 E eu que sempre achei que cabras comiam capim e não pessoas. Vai ver
as lâmias-cabra são diferentes. 7 Entre correr o risco de ser devorado por uma lâmia ou manter a castidade, creio
que qualquer sacerdote preferiria a segunda opção, motivo pelo qual devem ter criado esta regra, imagino. 8
Acho que é giromancia. Uma amiga minha fazia isso. Bom, não era tão amiga assim, na verdade. 9 Mas nada de
pequenas luas de mármore pra gorducha, pois quando cresceu, a coitada ganhou uma bunda do tamanho do
Continente, como deixou minha escrupulosa tia anotado neste relato de suas aventuras.

Todas as histórias são de responsabilidade de seus respectivos autores. Não nos responsabilizamos pelo
material postado.
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