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O presente artigo é uma continuação/atualização de uma análise feita em um trabalho

anterior, em 2014, na PNAS (Proceedings of the United States National Academy of Sciences).
Esse trabalho, aparentemente, tem uma carga conceitual muito forte, sobre a primeira e
segunda transições demográficas, evidenciando, também, o marco zero da teoria da segunda
transição demográfica que foi a partir de uma quebra de expectativas do próprio Ron e de seu
parceiro de pesquisa sobre alguns pressupostos (pontos finais assumidos) tais como: a
fecundidade próxima ao nível de reposição, aumento da coabitação.

O trabalho, em si, avalia três perspectivas otimistas relativamente à evolução da


fertilidade, sobretudo na segunda década no novo século: (i) aumentos devidos ao fim do
adiamento, (ii) aumentos relacionados com o avanço do desenvolvimento humano e (iii)
aumentos associados ao avanço da igualdade de género.

Para contextualizar esse assunto, o autor traz à tona, inicialmente, uma discussão sobre
duas caraterísticas da teoria da segunda transição demográfica, aumento da coabitação e
adiamento de fecundidade, em algumas partes do mundo. A grande conclusão do autor nesse
aspecto é que os diferentes contextos históricos e sociais, toda essa heterogeneidade que
acomete as diversas nações, fazem com que o desenvolvimento da teoria se desenrole de
maneiras muito diversas. A gente tem o caso de sociedade patriarcais em alguns países
asiáticos (dominação masculina /posição de subordinação das mulheres) onde a coabitação era
algo impensável, digamos assim, e o nível fecundidade já tinha tendências de queda desde os
anos 70 (ex.: político do filho único). Já América Latina e no Caribe, é o oposto, havia grande
tradição de coabitação sem observação de adiamento de fertilidade. Na Europa havia uma
sincronia entre adiamento da fertilidade e aumento da coabitação.

SEÇÃO 1

Em 1986 a teoria da segunda transição demográfica previu um nível de fecundidade


abaixo do nível de reposição sistêmico (adiamento da fecundidade), devido, sobretudo, a:
aumento da coabitação, avanço dos níveis educacionais feminino, avanço da secularização,
autonomia feminina, além de fatores ideacionais: autorrealização, convicções materialistas.

Acontece que alguns pontos de vista mais otimistas foram apresentados entre 98-2014,
otimistas no sentido de aumento da fecundidade. Primeiro ponto de vista foi resultado de uns
“ajustes de adiamento” técnicos, o segundo ponto foi com base no desenvolvimento humano e
o terceiro devido ao avanço da igualdade de gênero.
Essa primeira questão se refere aos ajustes no efeito tempo trazidos por Bongaarts e Feeney
(1998) e visava ajustar as taxas de fecundidade em determinado período com base nas taxas
médias de adiamento da maternidade observados em períodos anteriores. Uma espécie de
compensação da fecundidade para idades posteriores (ou seja, a pergunta seria: qual a taxa de
fecundidade se nenhum adiamento tivesse o ocorrido?). O ponto é que essa visão, segundo o
autor, requer que sejam negligenciados um possível declínio do efeito quantum (suavização de
distorções na idade média de fecundidade).

Segunda questão o aumento da fecundidade atráves do avanço do desenvolvimento humano,


defendida por Myrskylä, Kohler e Billari (2009). De maneira bem simples eles afirmaram que
melhorias no IDH tendem a elevar o nível de fecundidade aos comumente observados em
sociedades mais desenvolvidas. No entanto, o Ron observou alguns problemas: primeiro, a
conclusão dos autores foi feita com base em dados de corte transversal (dados tabulares
coletados em um único período de tempo), não envolve nenhuma evolução ao longo do
tempo. Outra crítica, foi o que ele chamou de “correlação dividida” que é quando a relação
entre duas variáveis (no caso, idh e fecundidade) parecem existir, quando dados são analisados
em conjunto, mas desaparece quando se separa em subgrupos, o que sugere que outras
variáveis influenciam aquela relação, ou seja, essa correlação existe quando dois grupos
distintos estão presentes. E foi isso que o autor apontou: existe um gráfico de dispersão entre
IDH e fecundidade entre dois grupos : A- Nórdicos, principalmente, e o outro B- países de
língua alemã, sul da europa para três anos , 99, 2005 e 2011. Grupos bem separados no gráfico
e com o passar dos anos, observa-se o grupo B vai avançando no IDH, porém, não chega aos
mesmos patamares do grupo A quando eles tinham tal IDH.

Terceiro ponto é equidade de gênero. Os estudiosos que veem essa correlação positiva,
entendem que há de duas fases da revolução de gênero em que a primeira seria o aumento da
força de trabalho feminina e a segunda fase seria a entrada dos homens no ambiente que até
então era feminino (ou seja, o lar) para ajudar nas atividades domésticas. Essa segunda fase
seria, de fato, a grande revolução que, por conseguinte, acarretaria no aumento da
fecundidade de maneira concomitante ao avanço da equidade de gênero. E boa parte dessa
conclusão se deu ao analisar, novamente, dois grupos duais em que o primeiro seria
representado, sobretudo, pelos países escandinavos, que foram aqueles que, por ter um maior
número de mulheres no mercado de trabalho no século passado, iniciaram precocemente o
adiamento da maternidade e, teoricamente, no novo século, teriam recuperado a fecundidade
e o outro por países de língua alemã, comunistas, que ainda estariam nesse processo de
revolução de gênero. Mas, segundo o Ron Lesthague, não há essa correlação tão forte. Ele traz
alguns dados como por exemplo, a tímida evolução da taxa de fecundidade entre 00 e 09
desses países já avançados quanto à questão de gênero, e menciona que esse aumento se
reflete em vários países, não somente naqueles já avançados, mas também naqueles em que a
partilha do trabalho doméstica ainda estava em estágio embrionário. Ou seja, em conclusão,
em que pese a teoria da revolução de gênero ser um fator importante, o Ron entende que não
é único, ou seja, não é uma abordagem suficiente, é necessário uma multiplicidade de fatores
adicionais para explicar esse fenômeno.

Assim, a previsão original do SDT de 1986 de fecundidade sustentada de sub-reposição ainda


se mantém após 35 anos.

SEÇÃO 2

A segunda seção do artigo se refere ao tema coabitação. E, dentro desse tema, o autor procura
ao longo do texto discutir os argumentos sobre a coabitação tanto no âmbito da teoria da
segunda transição demográfica, que postulava tal comportamento em virtude de uma questão
mais revolucionária e atrelada ao nível educacional, enquanto uma outra camarada desse
estudo dá como causa ao aumento da coabitação o agravamento das condições de vida mais
pobre (padrão de desvantagem) que por sua vez é comumente tratada em conjunto com
questões etno-históricas.

A discussão sobre a coabitação nesse texto ela é eminentemente empírica. De plano, foram
trazidas à baila as realidades europeias. Os dados apresentados até mostram um indicador
(proporção de coabitação entre todas as uniões de mulheres entre 25-29 anos para várias
coortes) e por meio deles percebe-se que, para países da europa ocidental, aquelas mais
instruídas tinham maior coabitação. Noruega e reino unido tinham a curva mais plana. E países
comunistas (Bulgária,russia) o padrão era em forma de ‘V’ ( ou seja, caia à ao sair de educação
low para médium , e depois aumentava). Então, em suma, percebeu-se que o gradiente
educacional era baixo. As mudanças de coorte eram mais representativas para o aumento da
coabitação.

Nos EUA e Canada a conclusão é semelhante.

No Japão também percebeu-se um aumento da coabitação nos últimos anos, seguindo a ideia
do padrão de desvantagem (que contraria a relação positiva entre educação e aumento da
coabitação).

Na América Latina tem uma pequena diferença. Lá, já se observava há muito tempo propoções
significativas de coabitação bem antes do boom da Europa e América do Norte e essas
propoções se concentravam nas camadas mais pobres dos países, populações indígenas,
enquanto as populações brancas dessas nações, que tinha maior escolaridade, fortaleceram
muito a instituição casamento, ou seja, seja pobre seja rico a coabitação não tinha relação com
o nível educacional. Ou seja, havia uma clara predominância do padrão de desvantagem (POD)
nessas regiões. E isso foi observado sobretudo a partir dos anos 70, mas aí, a dúvida do autor
foi, como estaria 40 anos depois? E o resultado foi, segundo o autor, muito claro: houve
aumento da coabitação nos níveis educacional tanto daqueles com ensio médio quanto
daqueles universitários. Isso levou a seguinte conclusão: não acabou a ideia de POD, mas sim
foi acrescentado outro componente (que foi o previsto na teoria da segunda transição – nível
educacional). Isso está afim à previsão da STD : maior liberalismo social, desestigmatização do
divórcio, enfim, aspectos totalmente ideacionais.
Esses últimos pontos, por sinal, fazem parte do que o autor chamou de ‘Revolução da ética’. Ou
seja, descreve uma mudança abrangente nos valores sociais e morais, caracterizada por uma
maior tolerância e aceitação de comportamentos anteriormente estigmatizados em várias
sociedades ao redor do mundo. E isso, é fator preponderante ,para o aumento da coabitação
mundial

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