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Abandono afetivo

O abandono afetivo consiste na prática de negligenciar afetivamente os filhos. Ou seja, um dos


genitores, ou até mesmo os dois, não prestam assistência psíquica, moral e social aos filhos.
Além disso, omitem cuidados referentes a criação e educação deles.

O que é o Abandono Afetivo?

O abandono afetivo é o ato de não cumprir com os deveres parentais para com os filhos. A
estrutura familiar tem como base o amor, o respeito e a dedicação. Estes pilares são
fundamentais para que seus filhos se desenvolvam plenamente. Assim, é através do contato
familiar que eles receberão afeto e proteção.

Desse modo, tais atos são muito importantes para o desenvolvimento da personalidade deles.
Além disso, eles influenciam, até mesmo, na formação, comportamento e vida adulta dos
filhos. Por isso, quando os cuidados afetivos não ocorrem e os genitores agem com descaso
sentimental, entende-se que há o abandono afetivo. Assim, ele acarreta danos morais, uma
vez que representa uma ofensa à dignidade da criança.

Portanto, se a sua esposa trata os filhos de vocês com descaso, o abandono afetivo pode estar
presente em sua família.

Existe uma lei sobre o assunto?

Não existe nenhuma lei que proíba o abandono afetivo. Contudo, a Comissão de Direitos
Humanos do Senado aprovou um Projeto de Lei que modifica o Estatuto da Criança e do
Adolescente.

Dessa forma, os filhos devem receber uma reparação de danos por parte do pai ou mãe que
deixar de prestar assistência afetiva, seja pela convivência ou por visitação periódica.

Assim, apesar da medida não estar valendo ainda, o texto legal poderá mudar. Por isso, alguns
juízes já estão condenando os genitores por abandono afetivo. Portanto, se você sentir que
seus filhos estão passando por alguma situação como esta, pode ser interessante contratar um
advogado de família.

Quais as consequências jurídicas do abandono afetivo?

A princípio, juridicamente falando, o amor é opcional. Contudo, o dever é obrigatório. Por isso,
comprovando-se que houve o abandono afetivo, ocorre a ilicitude civil, sob forma de omissão.
Ou seja, caso você ou sua esposa abandonem os filhos afetivamente, terão que reparar os
danos causados a ele através do pagamento de uma indenização, por exemplo.

Além disso, vale ressaltar que o pagamento de pensão alimentícia não o isenta de seus deveres
enquanto pai. Desse modo, o abandono afetivo pode acontecer mesmo que você nunca atrase
o pagamento da pensão, já que ele diz respeito aos cuidados afetivos com os filhos, não aos
cuidados financeiros.

Portanto, mesmo pagando a pensão, você terá que indenizar seu filho. Além disso, o juiz pode
te condenar a cumprir de 1 a 6 meses de detenção pelo abandono afetivo. Assim, se for
aplicada de forma justa, sem abusos, a responsabilização do pai ou mãe pelo abandono afetivo
dos filhos será de grande significância para concretizar os direitos da criança e do adolescente.
Ademais, servirá para conscientizar a população em relação aos deveres dos pais e como são
importantes para o desenvolvimento psicológico e emocional de crianças e adolescentes.

Abandono afetivo

O artigo 227 da Constituição Federal, bem como o artigo 4º do Estatuto da Criança e do


Adolescente (Lei 8.069/1990), atribui aos pais e responsáveis o dever geral de cuidado, criação
e convivência familiar de seus filhos, bem como de preservá-los de negligencias, discriminação,
violência, entre outros.

Não há como obrigar um pai a amar um filho, mas a legislação lhe assegura um direito de ser
cuidado. Os responsáveis que negligenciam ou são omissos quanto ao dever geral de cuidado
podem responder judicialmente por terem causado danos morais a seus próprios filhos.

Em decisão recente, na qual um pai foi condenado a indenizar filha por abandono afetivo,
desembargador do TJDFT destacou que "Amar é uma possibilidade; cuidar é uma obrigação
civil”. Saiba mais

https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-
semanal/abandono-afetivo

IDBFAM

O abandono afetivo se apresenta como uma questão recorrente entre as demandas judiciais
em Direito das Famílias. Neste mês, o tema ganhou relevo com uma decisão recente do
Superior Tribunal de Justiça – STJ, que estipulou indenização independentemente de
pagamento de pensão alimentícia, e com um projeto de lei, aprovado por Comissão da Câmara
dos Deputados, que estende a abordagem ao abandono de pais idosos.

Na semana passada, a 3ª Turma do STJ deu provimento ao recurso especial ajuizado por uma
filha para condenar o pai ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes do
abandono afetivo sofrido desde a infância. O entendimento da Corte é de que o pagamento de
pensão alimentícia não impede o reconhecimento dos traumas psicológicos causados, inclusive
com consequências físicas, na vida da jovem.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, classificou que o pagamento de pensão não é suficiente
para que os pais se sintam livres de outras obrigações, e a paternidade exercida de forma
“irresponsável, desidiosa e negligente” enseja danos morais. Em voto-vista, o ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva destacou que, apesar de não haver o dever de amar no ordenamento pátrio,
o pedido encontra justificativa nas disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
(Lei 8.069/1990).

Já a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa da Câmara dos Deputados aprovou
proposta que altera o Código Civil e o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003) para prever
legalmente a indenização por dano moral nos casos de abandono afetivo de filhos ou de pais
idosos. O Projeto de Lei 4.294/2008 é do ex-deputado Carlos Bezerra (MT) e segue para
análise, em caráter conclusivo, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

De acordo com a defesa do texto feita pelo parlamentar, o abandono afetivo retira das pessoas
a segurança de que são queridas e de que têm com quem contar. “O vazio afetivo repercute na
vida de quem é abandonado, e pode ser mensurado, para fins de indenização por dano moral”,
sustentou Bezerra.

“Pai e mãe não podem se divorciar de seus filhos”, diz presidente do IBDFAM

“A responsabilidade é um princípio jurídico e deve ser observada e respeitada em todas as


relações jurídicas, especialmente nas relações familiares entre pais e filhos”, frisa o advogado
Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Ele comenta a decisão recente do STJ sobre o tema.

“O princípio jurídico da paternidade responsável não pode se resumir à assistência material.


Nesse ponto, não somente na obrigação alimentar. O cumprimento do dever de assistência
moral é dever jurídico, cujo descumprimento pode ter como consequência a pretensão
indenizatória. Pai e mãe não podem se divorciar de seus filhos.”

Ele lembra que o Enunciado 8 do IBDFAM, aprovado no X Congresso Brasileiro de Direito de


Família e Sucessões, em 2015, sintetiza: “O abandono afetivo pode gerar direito à reparação
pelo dano causado”. O advogado acrescenta: “Os preceitos punitivo e o preventivo, aliados a
uma necessidade pedagógica, da sanção civil, podem significar um freio ao ato danoso”.

“O filho não escolheu nascer, mas os pais, ao contrário, são responsáveis e devem ser
responsabilizados pelo seu nascimento. Poderiam ter evitado, e, se não o fizeram, assumiram
o risco da provável concepção. Uma vez nascido o filho, tenha sido ele planejado ou não,
desejado ou não, os pais devem cumprir a obrigação jurídica de criá-los e educá-los”, destaca
Rodrigo.

Imprescindível intervenção do Estado

Sobre o Projeto de Lei 4.294/2008, que prevê indenização por dano moral nos casos de
abandono afetivo de filhos e também de pais idosos, o presidente do IBDFAM lembra que, por
força de dispositivo constitucional, é dever dos pais criar os filhos e dos filhos assistirem os pais
na velhice, garantindo amparo.

“É imprescindível a intervenção do Estado em situações de abandono afetivo. A punição é a


única forma de conscientizar o pai/mãe do mal que fizeram ao filho e de se tentar evitar que a
omissão parental continue. Além disso, o mesmo vale para filhos que abandonam pais na
velhice.”

Ele cita outra proposição legislativa, o Projeto de Lei do Senado – PLS 700/2007, que prevê
uma mudança no ECA, impondo reparação dos danos ao pai ou à mãe que deixar de prestar
assistência afetiva aos filhos, seja pela convivência, seja por visitação periódica, passando a
caracterizar o abandono moral dos filhos como ilícitos civil e penal.

O PLS 700/2007 propõe a prevenção e solução de casos “intoleráveis” de negligência dos pais
para com os filhos. Estabelece que o artigo 3º do ECA passe a vigorar acrescido de pena de
detenção de um a seis meses para “quem deixar, sem justa causa, de prestar assistência moral
ao filho menor de 18 anos, prejudicando-lhe o desenvolvimento psicológico e social”. O texto
foi remetido à Câmara dos Deputados em outubro de 2015.

Crise da paternidade
Nas palavras de Rodrigo da Cunha Pereira, o Direito brasileiro já deveria ter entendido que,
por mais que se queira atribuir uma paternidade pela via do laço biológico, jamais conseguirá
impor que o genitor se torne pai. “O alcance dessa investigação limita-se, como já estabeleceu
a lei francesa, para os fins de subsídios.”

“Com isto, podemos entender que a Constituição brasileira de 1988, ao interferir no sistema
de filiação, está a um passo do entendimento da paternidade em seu sentido mais profundo e
real. Ela está acima dos laços sanguíneos. Um pai, mesmo biológico, se não adotar seu filho,
jamais será o pai. Por isto, podemos dizer que a verdadeira paternidade é adotiva e está ligada
à função, escolha, enfim, ao desejo.”

Segundo o especialista, podemos falar hoje de uma “crise da paternidade” diante das novas
representações sociais da família, frente ao rompimento dos modelos e padrões tradicionais.
“Sua função básica, estruturadora e estruturante do filho como sujeito, está passando por um
momento histórico de transição de difícil compreensão em que os varões não assumem ou
reconhecem para si o direito/dever de participar da formação, convivência afetiva e
desenvolvimento de seus filhos.”

Como exemplos, ele cita: o pai solteiro, ou separado, que só é pai em fins de semana, ou nem
isso; o pai, mesmo casado, que não tem tempo para seus filhos; o pai que não paga ou boicota
pensão alimentícia e nem se preocupa ou deseja ocupar-se com isto; o pai que não reconhece
seu filho e não lhe dá o seu sobrenome na certidão de nascimento.

“A ausência do pai, e dessa imagem paterna, em decorrência de um abandono material e/ou


psíquico, tem gerado graves consequências na estruturação psíquica dos filhos e que
repercute, obviamente, nas relações sociais. A ausência das funções paternas já se apresenta
hoje, inclusive, como um fenômeno social alarmante, e provavelmente é o que tem gerado as
péssimas consequências conhecidas por todos nós, como o aumento da delinquência juvenil e
menores vivendo nas ruas”, acredita.

Abandono independe de classe social

O fenômeno não está restrito a uma determinada classe social, diz o advogado. “Certamente,
nas classes menos favorecidas economicamente, o abandono material é maior, pois se mistura
também com a questão política de abandono do Estado, que também exerce, em muitos
casos, uma função paterna e de ‘o Grande Outro’”.

“Essa ausência paterna e o declínio do pater-viril está acima da questão da estratificação


social. É um fenômeno e consequência das transformações sociais iniciadas com a revolução
feminista, a partir da redivisão sexual do trabalho e a consequente queda do patriarcalismo.”

O advogado conclui: “O desafio do terceiro milênio será a aprendizagem da organização da


polis, considerando que não é possível pensar o Estado sem seu núcleo básico: a família. Não é
possível este núcleo básico sem o lugar estruturante do pai. Teremos que reaprender, então,
diante das novas formas de família, e nesse novo contexto social, o que é um pai, pois já
sabemos que a ausência dele pode ser desestruturante para o sujeito”.

https://ibdfam.org.br/noticias/8967
Abandono Material

O ordenamento jurídico-constitucional pátrio confere especial proteção à família, que


considera a base da sociedade (CF artigo 226) e estabelece que os pais têm o dever de assistir,
criar e educar os filhos menores, ao passo em que os filhos maiores têm o dever de ajudar e
amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade (CF, artigo 229). O Código Penal prevê,
nessa linha de ideias, crimes contra a assistência familiar, entre os quais se insere o crime de
abandono material.

Previsto no artigo 244 do Código Penal, o crime de abandono material pode se configurar
mediante duas condutas. A primeira delas é a recusa voluntária e injustificada em prover a
subsistência de cônjuge, filho menor de 18 anos/inapto para o trabalho, ou ascendente
inválido/maior de 60 anos, quer lhes privando dos recursos necessários ao seu sustento ou
faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.
Também é possível cometer abandono material deixando-se, sem justa causa, de socorrer
ascendente ou descendente gravemente enfermo.

Neste artigo, vamos nos limitar a discutir a configuração do tipo penal pelo não pagamento de
pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada a filho menor de 18 anos ou
inapto para o trabalho. Quando o não pagamento de pensão alimentícia pode configurar o
crime de abandono material?

Inicialmente, vale observar que o crime do artigo 244 é omissivo próprio e veicula em si um
elemento normativo, isto é, se houver alguma justificativa válida para a falta de assistência
material, não se há de cogitar da configuração típica. Do mesmo modo que o ordenamento
processual civil admite a possibilidade de apresentação de justificativa para o inadimplemento
na execução de alimentos ou no cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de
prestar alimentos (CPC artigos 911 e 528), também o sistema de persecução penal pode
reconhecer que a ausência de pagamento de pensão alimentícia encontra fundamento em
circunstâncias fáticas que a justifiquem, afastando a existência de crime.

Além disso, é importante salientar que, quando o Código Civil pensa em alimentos, está
falando mais do que de mera subsistência. Os alimentos têm como finalidade suprir as
necessidades do alimentando, sem que isso signifique seu enriquecimento ou
empobrecimento do devedor. Abrangem não apenas a alimentação (como o nome pode levar
a crer), mas também vestuário, habitação, assistência médica, educação e instrução, ou seja,
todo o necessário à manutenção da subsistência. Apenas excepcionalmente os alimentos vão
se prestar a garantir apenas a subsistência (quando a necessidade resultar de culpa de quem
pleitear os alimentos, conforme o §2º do artigo 1.694 do Código Civil).

Assim, o simples inadimplemento de pensão alimentícia não tem o condão de configurar o


crime do artigo 244 do Código Penal. É preciso mais: a) que o inadimplemento seja
injustificado [1]; e b) que prive o beneficiário do necessário à sua subsistência [2].
Mostra-se inquietante, entretanto, a conformação da previsão em estudo quando se leva em
conta que o Direito Penal deve ser entendido como a ultima ratio do sistema jurídico. Ora, se o
inadimplemento do mais, que são os alimentos, já é apto a ensejar a prisão civil do devedor
(conforme a autorização constitucional e o artigo 528, §3º do CPC), há razoabilidade em ainda
se prever o crime de abandono material?

Nos parece que não.

O débito alimentar recente pode ser cobrado judicialmente, até mesmo mediante a constrição
da liberdade do devedor. O inadimplemento da obrigação alimentar pode ensejar a prisão civil
do devedor, prisão a ser cumprida em regime fechado por até três meses. O devedor dos
alimentos se vê, assim, coagido ao cumprimento da obrigação.

Seria o Direito Penal necessário e eficaz para garantir a paternidade responsável? Devendo o
Direito Penal ser encarado como ultima ratio, não estaria essa responsabilização criminal
contrariando o princípio da intervenção mínima?

O Direito Penal somente pode atuar quando os demais ramos do Direito não o fizerem de
forma adequada, quando não foram capazes de tutelar de maneira devida os bens jurídicos
protegidos. Ao se analisar a tutela civil dada ao devedor dos alimentos, pode-se notar que este
o faz de maneira suficiente. Isso porque, sendo permitida a imediata prisão do alimentante
inadimplente, ela se mostra mais eficaz do que a via penal. Na esfera criminal, há necessidade
de ação penal e o crime é cumprido em regime semiaberto ou aberto, uma vez que o delito é
punido com detenção.

Ora, se o intuito maior da prisão do devedor seria compeli-lo ao seu pagamento, evidente que
a esfera civil se mostra mais eficiente, pois a prisão pode ser decretada de imediato,
independentemente de processo-crime e mais, com prisão a ser cumprida em regime fechado.

Dessa forma, tem-se que o Direito Penal não seria o meio adequado à tutela da paternidade
responsável e dos direitos do alimentando, eis que o Direito Civil se mostra suficiente à sua
proteção.

Não significa que estamos incentivando ou fechando os olhos para o abandono familiar,
apenas temos que não seria o Direito Penal o meio necessário e adequado à sua tutela.
Até porque, a partir do momento em que se utiliza da esfera penal, pode-se acabar por
contribuir com a maior violação da já fragilizada relação entre alimentante e alimentado.

Outra "vantagem" do Direito Civil em relação ao Direito Penal é a possibilidade da perda do


poder familiar por decisão judicial, o que não pode ocorrer na área criminal, vez que o crime
do artigo 244 é punido com detenção e somente se admite a perda do poder familiar a crime
punido com reclusão.

Assim, o inadimplemento da pensão alimentícia, por mais abjeto que possa se demonstrar,
tem melhor solução em âmbito do Direito de Família, não cabendo ao Direito Penal, que deve
ser utilizado quando os demais ramos do Direito falharem, ser utilizado como forma de impelir
o devedor a cumprir com sua obrigação.

Saliente-se que não se está afastando a fundamental importância da família (entendida como
bem jurídico penalmente tutelado). No entanto, a tutela desse valioso bem jurídico deve ser
feita com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Tem-se, portanto, que a criminalização da conduta de não pagamento da pensão alimentícia,


antes de compelir o devedor a adimplir com sua obrigação, acaba por contribuir para maior
segregação familiar.

Nesse contexto, conclui-se que a tipificação penal do abandono material, em caminho oposto
de salvaguardar a família, acaba por lesioná-la. E ademais, o Direito de Família é certamente
mais eficaz para tutelar tais questões, não se podendo utilizar o Direito Penal quando outros
ramos do Direito se demonstrarem suficientes.

https://www.conjur.com.br/2021-ago-26/moretzsohn-burin-pensao-alimenticia-crime-
abandono-material

Abandono material, intelectual, afetivo: uma análise sob os aspectos cível, penal e suas
sequelas em breves considerações

Autor: Kelly Moura Oliveira Lisita | Data de publicação: 05/10/2020

Abandono material, intelectual, afetivo: uma análise sob os aspectos cível, penal e suas
sequelas em breves considerações.

Resumo

O presente artigo tem por escopo discorrer sobre o abandono material, afetivo e intelectual,
abordando os aspectos cíveis, penais e as consequências para as crianças e os
adolescentes.Esse tema tão cotidiano é responsável por inúmeros conflitos vivenciados por
muitas famílias brasileiras.Infelizmente é notório o referido abandono em desfavor de crianças
e adolescentes e tal fato ocasiona prejuízos não só de ordem moral, mas principalmente
emocional.É cada vez maior o número de jovens que desenvolvem sentimentos de rejeição e
baixo-estima em decorrência da ausência daquele (a) pessoa que deveria dar-lhe amor e
atenção.Pais e mães tem dever legal e moral no trato para com seus filhos,tem
responsabilidades conjuntas para toda uma vida.
Palavras-chaves: Abandono, afeto, sentimento, família, rejeição.

1-Introdução

O presente tema aborda aspectos não apenas jurídicos como também de natureza emocional.

Toda e qualquer forma de abandono é indubitavelmente dolorida e inquestionavelmente


marcante para quem figura no polo passivo de uma relação por vezes carente de atenção e
cuidados. As consequências são mais consideráveis porque envolvem crianças e adolescentes.

O abandono afetivo, material e o intelectual são assuntos sérios e merecedores de muita


atenção e análise minuciosa por que geram sequelas de natureza física e psicológica para
muitas pessoas e envolvem não somente a questão financeira como também a emocional.

É cada vez mais presente o número de jovens acometidos por sequelas psíquico-emocionais
decorrentes das espécies dos referidos abandonos acima citados.

Inegavelmente é assunto de suma importância porque fere direitos, ”atropela” sentimentos e


gera danos ás vezes irreversíveis por parte das vítimas, haja vista cada pessoa ser única e
absorver de formas diferenciadas o que lhes acontece.

Filhos são para a vida toda, a responsabilidade de ser pai e mãe tem início já com a gestação.

2-Abandono intelectual e abandono material

O denominado abandono intelectual é um crime tipificado no artigo 246 do Código Penal e


ocorre quando o pai, mãe ou responsável legal deixa, sem justa causa, de garantir a educação
primária de seu filho.A objetividade jurídica recai sobre o direito dos filhos menores de terem
acesso à informação,ao aprendizado,à cultura.Válido destacar a expressão “justa causa”como
elemento normativo do tipo penal,para a caracterização do delito e aplicabilidade da pena.A
tentativa ou conatus não é admissível para esse crime.

Já por educação primária acredita-se que a idade escolar é compreendida dos 04 até 18 anos
incompletos.

Já à luz do artigo 1.634 do Código Civil compete aos pais em relação aos filhos menores,
dirigir-lhes a criação e a educação,exercendo por sua vez o poder familiar cumprindo com seus
deveres e direitos no que pertine aos filhos menores ou maiores incapazes.Seja na guarda
unilateral como na guarda compartilhada ambos genitores devem zelar pelos filhos e ser
garantes dos mesmos em todos os sentidos:de proteção e responsabilidade.Poder familiar é
expressão atualmente utilizada para denominar o conjunto de deveres e direitos dos pais na
criação de seus filhos.

Antigamente era usada a expressão “pátrio poder” ao invés de poder familiar.Quando a


responsabilidade recai sobre algum parente dizemos haver a “Autoridade Parental”. Outras
pessoas ao exercerem a tutela ou curatela detém a chamada responsabilidade legal,
independentemente se são parentes ou não.

A tutela e a curatela são denominadas de múnus público e decorrem do princípio da


Solidariedade para o Direito de Família, enquanto a primeira protege o menor cujos pais foram
destituídos do poder familiar, foram declarados ausentes ou ainda vieram a óbito, a segunda
protege o maior incapaz de forma transitória ou não.Ambos institutos são deferidos em ações
judiciais próprias.

É importante mencionar que é constitucional o direito de todos à educação dentre outros. Pais
e mães tem a obrigação no âmbito moral e legal de matricularem seus filhos em idade escolar,
de acompanharem-nos em tarefas e reuniões escolares, o artigo 227 da Constituição Federal
explicita de forma clara o dever da família, do Estado e da sociedade.

O artigo 244 do Código Penal descreve o abandono material que consiste na recusa de forma
injustificada daquele que deve pagar,ou seja, de prover materialmente com o necessário para
a subsistência da vítima,como deixar de pagar pensão alimentícia judicialmente acordada ou
fixada, ou deixar de socorrer ascendente(Pais) ou descendente(Filho) sem justa causa,sendo
que a vítima pode ser cônjuge,convivente, ascendente portador de necessidade especial ou
maior de sessenta anos,sem excetuarmos o filho menor de dezoito anos ou inapto para o
trabalho.A conduta do autor deve ser reiterada e a observação recai no elemento
normativo”sem justa causa”.Não se poderia incriminar um filho maior e capaz que é presente
na vida dos pais mas não possui muitos recursos financeiros capazes de ajudar-lhes.

Já a pensão alimentícia compreende a alimentação, vestuário, lazer, remédios, materiais


escolares e deve ser estipulada analisando o chamado binômio: necessidade de quem a
pleiteia e possibilidade de quem vai pagá-la.É, porém, importante mencionar que quando
judicialmente acordada, deve ser paga para que não haja a tipificação no 244 do Código Penal,
quando de forma injustificada e reiterada o devedor não a cumpre.

Existem três ações ou verbos nucleares que são: frustrar o pagamento da pensão alimentícia,
não socorrer ascendente ou descendente gravemente enfermo ou ainda injustificadamente
deixar de prover a subsistência da vítima.Trata-se de crime omissivo próprio e que não admite
tentativa.

Outra forma de abandono intelectual por partes dos pais ocorre quando os mesmos permitem
que o menor frequente casas de jogo ou conviva com pessoa viciosa ou de má-vida, que
frequente espetáculo capaz de pervertê-lo, que resida ou trabalhe em ambientes impróprios,
que mendigue ou sirva de mendigo para excitar a comiseração pública.Enfim, há várias
possibilidades de praticar o delito em questão e não poderíamos deixar de citar que a evasão
escolar também é uma das consequências desse delito.

O dolo é o elemento subjetivo, significa que a pessoa autora age de forma intencional, que há
o conhecimento da conduta e do resultado, que é lesivo e ainda assim o agente opta pela
prática do fato. A questão ainda é mais séria porque envolve sentimentos da vítima e os
efeitos acabam por refletir na estima, saúde física e mental da mesma, sem excetuarmos o
quão horrendo é o fato em sí.Imaginemos um filho maior e capaz e tendo condições
financeiras, não acudir o pai idoso e portador de doença degenerativa como o Alzheimer, não
o levr ao médico, não comprar remédio!

E quanta falta de consideração quando o devedor de pensão frustra propositadamente a


mesma no que pertine ao filho menor! Alguns devedores largam o emprego só para não a
pagar.São demandas envolvendo pessoas que desaparecem para não pagar a pensão ou então
mentem em relação a salário, gastos para pedir minoração ou exoneração da pensão.

O assunto pensão alimentícia na maioria das vezes envolve lide entre as partes e infelizmente
o devedor de pensão de filho menor esquece que a pensão é direito e não favor e que ainda
que o outro genitor tenha boas condições financeiras, sobrevive e com muita força o dever de
cada genitor contribuir na criação do filho.Nem a multiparentalidade exclui essa
responsabilidade dos genitores consanguíneos.

É de suma importância esclarecer que pagar pensão não é ser pai ou mãe, para criar a prole
faz-se necessário a presença, a preocupação e o interesse na vida dos filhos, em seu dia a dia,
em seus problemas, conquistas e vitórias.

Existem muitas diferenças entre ser genitor e ser pai ou mãe.Divórcio dissolve a sociedade
conjugal e não a que sempre existirá sempre entre pais e filhos e que colocar filhos no mundo
e não criar consiste apenas no fato de ser genitor ou ser genitora.Carinho e amor são vividos,
são construídos ao longo do tempo, a cada dia, nas conversas, nas trocas de olhares, sorrisos,
conselhos e até na “chamada de atenção”entre pais e filhos.

Os relacionamentos maternais e o paternal são formados pela convivência e o apoio, o


sustento emocional acima de qualquer coisa.O abandono tem punibilidade e efeitos.

Indubitavelmente todos esses fatos abalam a estima e declaram a olhos vistos que o respeito,
o carinho, a gratidão por vezes não tem muito espaço na vida do autor do fato delituoso em
questão.

A pena para o abandono material é de um a quatro anos e multa de uma a dez vezes o maior
salário mínimo vigente no país, não se tratando, pois, de crime de menor potencial
ofensivo.Informalmente espera-se a cobrança por parte da consciência do sujeito ativo do
delito em questão.

No que concerne ao Direito Civil, não pagar a pensão alimentícia judicialmente acordada ou
fixada enseja prisão por até 90 dias do devedor inadimplente, negativação do nome e bloqueio
em conta através de ordem judicial.Trata-se de não cumprimento de obrigação de dar, que é
civilista e também configura descumprimento a ordem judicial.

No contexto do não pagamento da pensão alimentícia, ressalte-se ainda os chamados


alimentos gravídicos ou gestacionais.

Pois bem, a lei 11.804/2008 trata dos alimentos gravídicos, que são solicitados no período da
gestação e após o parto são convertidos em pensão alimentícia.Durante a gestação já há a
responsabilidade e compartilhamento do poder familiar, medicamentos, exames, consultas
devem ser divididos e vivenciados pelos genitores do nascituro, mas sempre importante
destacar que a proporcionalidade financeira é inerente a ambos os genitores.

3-Abandono afetivo

O abandono afetivo difere do material e do intelectual, mas aproxima-se muito do mesmo


quando por exemplo um dos genitores paga a pensão e não tem o mínimo de carinho pelos
filhos, não a procura ou se faz presente na vida dos mesmos.É comum e triste
simultaneamente o fato de alguns genitores não pagarem a pensão e consequentemente não
serem presentes.

Não existe ainda tipificação para o abandono afetivo. Para algumas pessoas é a forma mais
grave de abandono, pois lesiona o estado emocional do jovem.A ausência por exemplo da
figura paterna propicia o aumento de casos vinculados à socioafetividade.
A legislação civilista inclusive faz uma observação importante no que concerne a chamada
verdade real e verdade biológica.Explicando podemos dizer que a primeira recai sobre a
filiação multiparental e a segunda sobre a filiação consanguínea.Lamentavelmente muitas
pessoas não conheceram seu genitor ou genitora ,no entanto tiveram a esposa do pai que
figurou como mãe ou o esposo da mãe que figurou como o pai e então é mais justo e
compreensível que essas pessoas busquem o reconhecimento da multiparentalidade a busca
da verdade biológica.Óbvio que existem pessoas que ainda buscam a verdade consanguínea e
isso é um direito que lhes confere.

Afetivamente o abandono gera no campo jurídico ação indenizatória conforme o artigo 186 do
Código Civil e que é rodeada por questionamentos que envolvem o fato de que ninguém é
obrigado ou obrigada a gostar de quem quer que seja, mas há o interesse e o emocional de
uma pessoa, seja criança ou adolescente que nada tem a ver com problemas entre seus
genitores ou da imaturidade de um deles. O abandono afetivo constitui descumprimento do
dever legal de cuidado, criação, educação e companhia presente, previstos implicitamente na
Constituição Federal, que é a nossa Carta Magna.

São tantas mudanças na forma de vida e na construção das famílias que o Direito precisava
acompanhar tanta evolução e ampliar seus conceitos, suas idéias, como ocorreu com o justo
reconhecimento da multiparentalidade, dos filhos adotivos e sua igualdade com os biológicos,
dos conviventes na união estável, dentre outros, uns mais recentes e outros anteriores.

Seja qual for a espécie de abandono, é importante esclarecer que valores morais estão muito
além dos financeiros, que ajudam a sobreviver, óbvio, mas não se sobrepõem aos primeiros
por não proporcionarem às pessoas nobres sentimentos tais quais: amor, companheirismo e
gratidão!

4-Sequelas do abandono e suas vítimas

Ansiedade, o complexo de rejeição, a baixo-estima, agressividade, pesadelos, irritabilidade,


isolamento, depressão e até suicídio, sem excluirmos as doenças psicossomáticas como
gastrite de origem nervosa, problemas na pele, insônia dentre outras, são consequências
geradas pelo abandono.

A depressão é caracterizada como doença, tendo fatores endógenos ou exógenos como seus
aliados e não como uma fase em que alguém está deprimido, mas sim depressivo.Estar
deprimido pode consistir em estar triste, mas é algo passageiro o motivo dessa tristeza, já
estar depressivo é sofrer com a depressão, fase prolongada por sentimentos de tristeza
contínua, frustração, ausência de ânimo, de cuidados próprios e requer auxílio urgente do
médico psiquiatra.

É importante destacar que a depressão também acomete jovens e não é fase passageira como
já dito em linhas anteriores, ou algo desmerecedor de atenção.

Na vida escolar pode ainda ocorrer dificuldade de aprendizagem, desatenção ás aulas, notas
baixas e também no processo de socialização com os colegas.

O tratamento então consistirá em sessões de terapia e em casos mais graves a prescrição de


medicamentos pelo médico.
Quando for notada qualquer alteração no comportamento do menor, devem os pais buscar
auxílio.

5-Considerações finais

O referido artigo buscou de forma singela tratar do abandono material, intelectual e afetivo,
embasando-se nas tipificações, nos conceitos de cada espécie de abandono e as
consequências geradas pela ausência da pessoa que deveria cuidar e não abandonar.

Acredita-se não haver uma forma de abandono mais grave que a outra, haja vista todas
culminarem em desprezo para com pessoas que tem não somente seus direitos assegurados
por lei, como também seus sentimentos que são massacrados pela falta de atenção que lhe é
ministrada.

A dor na alma não tem cura, não pode ser cicatrizada com remédio, com ataduras e gessos. O
estado emocional tem o condão de inclusive alterar o sistema nervoso e imunológico.

Tratamento psicológico e psiquiátrico devem ser buscados e com urgência nessas situações,
pois crianças e adolescentes estão em processo de formação e tendem a absorver conflitos.

A consciência de ser pai e mãe e suas responsabilidades deveria prevalecer em uma sociedade
composta por muitos jovens que infelizmente são denominados “órfãos de pais vivos”.

Muitos genitores já foram responsabilizados penalmente por matarem suas namoradas


gestantes porque matavam para não ter que pagar alimentos gravídicos e posteriormente
pensão alimentícia; outros por sua vez até pagam a pensão, mas não tem contato com sua
prole e um número cada vez mais considerável além de não pagar a pensão, pratica abandono
afetivo e intelectual.

https://ibdfam.org.br/index.php/artigos/1572/Abandono+material,+intelectual,+afetivo:
+uma+an%C3%A1lise+sob+os+aspectos+c%C3%ADvel,
+penal+e+suas+sequelas+em+breves+considera%C3%A7%C3%B5es

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