Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Estética Viagens
Estética Viagens
Estética Viagens
ser como aquele viajante que se espanta com o que vê, como se olhasse pela primeira vez, como se
estivesse sempre chegando. Esperar. Aceitar o princípio de não ver imediatamente.
Não se precipitar.
As viagens nas obras de Nazareth e Ana Pi assumem uma centralidade política tanto pela potência dos
encontros com outros sujeitos quanto pela dimensão dos processos históricos acionados na produção
dos territórios. Um redimensionamento dos deslocamentos que abre espaço para vermos como os
traumas do passado seguem habitando nossa contemporaneidade.
A mata que ficava detrás da casa era de um verde intenso, marcado de altura em altura pelas flores do
tajy amarillo, o ipê-amarelo. A estrada por onde parti tinha as marcas de pegadas das onças.
Na terra vermelha dessa estrada, ficaram também as minhas, e meus pés tingiram-se de sua poeira.
Essa estrada ficou em mim.
Miguel Gally
Carla Milani Damião
Priscila Rossinetti Rufinoni
Rita Márcia Magalhães Furtado
Grupo de Pesquisa Interunidades
FAC - UnB / FAU - UnB / CNPq
AMBIENTE 33: Espacialidades, Tiago Quiroga
Comunicação, Estética e Tecnologias
(Organizadores)
PA RT E V
Migrações,
peregrinações
e derivas
ESTÉTICAS DAS V IAGENS
CAROLINA SOUZA
RESUMO
O artigo estuda o papel da mídia na transmissão e na atualização das memórias
coletivas relativas à peregrinação a Santiago de Compostela, na Espanha. A
análise das narrativas revela que: a mídia, por meio da narrativa jornalística,
reforça e também atualiza as memórias da peregrinação, principalmente em
forma de símbolos associados à sua história; a motivação está relacionada
ao apego às tradições, aos valores e aos costumes que mantêm as pessoas
conectadas às memórias e identidades; e a memória é um componente de
inserção identitária e uma ferramenta que gera o sentimento de continuidade e
coerência de um grupo em constante processo de atualização.
INTRODUÇÃO
O
s Caminhos de Santiago estão entre as três principais rotas de
peregrinação cristã desde o século IX – as outras têm como destino
Roma e Jerusalém – e, após um período de declínio de popularidade,
voltaram a adquirir grande número de adeptos nos anos 1980 e 1990. Os
Caminhos de Santiago tornaram-se o Primeiro Itinerário Cultural Europeu em
1987 e Patrimônio da Humanidade, na Espanha, em 1993, e na França, em 1998.
383
PART E V > Migrações, peregrinações e derivas
Para Caballero (2011), a tradição sustenta que Santiago Maior foi à Hispania com
o objetivo de pregar a mensagem de Cristo, mas ao retornar à Palestina foi
morto e se tornou o primeiro apóstolo mártir. Seus restos mortais foram levados
por discípulos de volta ao mundo romano ocidental, chegando até a Gallaecia,
e descobertos após a invasão muçulmana por Teodomiro, bispo de Iria Flavia.
No reinado de Alfonso III, século VII, a crença e o culto à sepultura de Santiago
consolidou-se e legitimou-se na cidade de Compostela, com a obra Breviarum
Apostolorum, que falava sobre a pregação de Santiago na região. O autor
afirma que o Caminho de Santiago teve muita repercussão no mundo medieval
hispânico, pois as autoridades buscaram benefícios políticos e socioeconômicos
que se estenderam em um processo de consolidação e dinamização da
monarquia leonesa, tendo a sede compostelana como um símbolo da elevada
dignidade eclesiástica no contexto das Reformas Gregoriana e Cluníaca.
384
ESTÉTICAS DAS V IAGENS
Torras (2012) explica, por meio da análise das iconografias de São Tiago no
medievo, que a concha ou a vieira constituíram-se como os atributos mais
emblemáticos da imagem do santo e que sua incorporação parece estar
mais ligada à religiosidade popular do que uma construção doutrinária da
alta esfera eclesiástica. Para o autor, a vieira permanece no imaginário da
peregrinação como resultado de uma prática popular como a de levar para
a casa uma recordação de um lugar visitado ou de uma conquista realizada.
Como resultado, a autora notou que ao longo dos séculos, havia um processo
que ela designaria como sinédoque, no qual todos os significados figurativos da
imagem do apóstolo convergem na vieira como atributo. Assim, esse símbolo
trata-se de um protagonista da viagem, não só no espaço, das costas galegas
ao lar do peregrino medieval, mas também ao longo do tempo, desde a Idade
Média até os dias de hoje.
385
PART E V > Migrações, peregrinações e derivas
386
ESTÉTICAS DAS V IAGENS
ANÁLISE E RESULTADOS
387
PART E V > Migrações, peregrinações e derivas
388
ESTÉTICAS DAS V IAGENS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CABALLERO, Guillermo Fernando Arquero. El Liber Peregrinationis como fuente
para la historia del Camino de Santiago y de las sociedades medievales. Ab Initio,
v. 2, n. 4, p. 15-36, 2011.
389
PART E V > Migrações, peregrinações e derivas
DUNN, Maryjane. Historical and Modern Signs of “Real” Pilgrims on the Road to
Santiago de Compostela. In: SÁNCHEZ, Samuel Sánchez y; HESP, Annie (Eds.).
The Camino de Santiago in the 21st Century: Interdisciplinary Perspectives and
Global Views, v. 5. New York: Routledge, 2015.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Trad. Yara
Aun Khoury. Revista do Programa de Estudos Pós-graduados em História e do
Departamento de História da PUC-SP, São Paulo, n.10, p. 7-28, 1993.
PULLAN, Wendy. Tracking the Habitual: Observations on the Pilgrim’s Shell. In:
DAVIES, Paul; HOWARD, Deborah; PULLAN, Wendy. Architecture and Pilgrimage,
1000-500: Southern Europe and Beyond. New York: Routledge, 2017.
RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa (tomo 1). Trad. Constança Marcondes Cesar.
Campinas: Papirus, 1994.
390
ESTÉTICAS DAS V IAGENS
MINIBIOGRAFIA DA AUTORA
Carolina Souza é doutoranda em História Contemporânea pela Universidade
de Coimbra e mestre em Jornalismo e Comunicação pela mesma universidade.
Graduada em História pela Universidade de Brasília e em Jornalismo pelo
Centro Universitário Iesb. Linhas de pesquisa: memória, narrativa, discurso e
identidade.
391