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VALORIZAÇÃO DAS ARTES E DAS CULTURAS POPULARES NO ENSINO DE ARTE: UMA PROPOSTA
DE EDUCAÇÃO PARA PROMOVER O PERTENCIMENTO.
UNESP‐Univ. Estadual Paulista Campus de Presidente Prudente/FCT. Departamento de Educação, Curso de Pedagogia.
Pesquisa financiada pelo Núcleo de Ensino/ PROGRAD. E‐mail: katiakodama@fct.unesp.br
RESUMO
Este artigo apresenta contribuições para ampliar o referencial teórico das ciências humanas e da
prática do ensino de Arte, expondo teorias que se encontram isoladas e dissociadas como a
Abordagem Triangular proposta por Ana Mae Barbosa, os conceitos de Cultura Hegemônica e
Subalterna Gramsciano, os Estudos da Cultura Visual propostas por Fernando Hernàndez, que
podem se complementar e contribuir para ampliar o conhecimento sobre as manifestações
culturais e as linguagens artísticas, principalmente as oriundas das culturas populares, como
geradoras do pertencimento e da brasilidade como propõe Ariano Suassuna. Demonstrar que é
necessário pensar uma educação que contemple os diferentes costumes, tradições e inovações
que coexistam na “Era das Culturas”. Atrelar os processos de práticas educativas a teorias da
comunicação e desse modo transformar o ensino de Arte em mediador do conhecimento das
múltiplas linguagens das artes populares, constitutivas do patrimônio material e imaterial e da
diversidade cultural do país.
Palavras‐chave: Cultura e arte, Cultura subalternas, Ensino de arte, Mediação cultural,
Pertencimento.
INTRODUÇÃO
Este artigo nasce da necessidade de contribuir para ampliar o referencial teórico das
Ciências Humanas e da Prática do Ensino de Artes inserida em uma realidade concreta. Será
pautado pelo método dialético para atender a finalidade de construir uma análise que promova
reflexões sobre as culturas e artes subalternas, seus produtores e consumidores inseridos em uma
dinâmica de constante evolução e adaptação. Parte do pressuposto que as produções, as trocas, a
circulação dos bens e produtos culturais sustentam as organizações sociais nos diferentes
momentos da história, assim como na atualidade.
As produções culturais desencadeiam a divisão dos homens em camadas ou extratos
sociais, determinando o que e como as sociedades produzem e o modo de modificarem e
intercambiarem essas produções, suas manifestações culturais e seus processos educativos. Esta
dinâmica é vista como um procedimento filosófico na ótica de Ferreira: “O papel da filosofia é
reunir o que está separado, fragmentado, dando um sentido de totalidade e de unidade ao
homem e suas ações.” (FERREIRA, 2006, p.35).
AS ARTES
Ao longo do processo histórico de desenvolvimento do homem e de suas comunidades, as
artes estiveram presentes como forma de marcar momentos iniciáticos da sua formação psíquica
e social. Marcam a relação do homem com o incognoscível e com os ciclos da natureza, do tempo
e das dinâmicas que cooperaram para perpetuar sua subsistência e sobrevivência e seus modos
culturais. Assim, as manifestações artísticas sempre acompanharam a evolução da humanidade,
recriando os marcos, históricos ou não, que compuseram seu desenvolvimento.
No Brasil, as atividades artísticas faziam parte das celebrações dos povos originários como
agentes reguladores da dinâmica social. Com a chegada do Europeu e a transplantação das
culturas da África, diferentes elementos simbólicos foram se agregando, produzindo novas formas
de manifestações culturais e artísticas, preservando concepções e formas ritualísticas dessas
diferentes origens, gerando um país com muitas fases e faces culturais se modificando
O ENSINO DE ARTES.
Desde 1971 que o Ensino de Artes está presente nas escolas como disciplina e ainda é
motivo de questionamentos sobre as diferentes formas de abordá‐lo. Segundo Ana Mae Barbosa,
“Isto não foi uma conquista da Arte educação brasileira, mas uma criação ideológica de
educadores norte americanos que, sob um acordo oficial (Acordo MEC‐USAID), reformulou a
Educação Brasileira” (BARBOSA, 1991). Nesse mesmo ano foi aprovada a Lei Federal nº 5692/71
que instituiu as Diretrizes e Bases da Educação, que vigora com poucas modificações até hoje e
definiu o currículo que está presente nas escolas. Deste modo, o ensino de Artes passou a fazer
parte do currículo das escolas por decreto, sem ser reconhecido como fator importante para o
aprendizado e formação do educando.
Essa dinâmica pode ser confirmada na própria terminologia usada para designar o
profissional da educação responsável pelo ensino de Artes ‐ professor de Educação Artística. Não
se faz curso de Educação Matemática, Educação Científica, Educação Química ou Educação
Geográfica, esses saberes são reconhecidos pela própria natureza das ciências que representam e
são vistos como fatores determinantes na formação de qualquer estudante, mas, a Arte teve que
ser entendida e apresentada como educação para ser introduzida nas escolas.
O ensino de Artes presente como componente curricular há 40 anos nas escolas do país
tem gerado muitos questionamentos, principalmente quanto aos conteúdos que devem ser
abordados. Em 1997 o Ministério da Educação/MEC elabora os Parâmetros Curriculares
Nacionais/PCNs, entre eles o PCN/Arte e aponta as linguagens das Artes Visuais, da Dança, da
Música e do Teatro como conteúdos necessários.
Nesse processo histórico do Ensino de Artes, foi Ana Mae Barbosa quem estabeleceu
reflexões significativas e contribuições incisivas quando propôs que o conhecimento em arte deve
abordar: a história da arte, a leitura da obra de Arte e o fazer artístico. Essa triangularidade foi
denominada por Barbosa de “Metodologia Triangular” em seu livro ‐ A imagem no Ensino da Arte
– publicado em 199.Em 1998 foi revisada pela autora no livro ‐Tópicos utópicos ‐ que passou a
denominar esse tripé de “Abordagem Triangular” e na sétima edição de ‐ A imagem no ensino da
Arte (2009) atualiza sua proposta inicial consolidando‐a. (BARBOSA; CUNHA, 2010, p. 77).
Hoje, este texto aponta para a necessidade de fundamentar uma adequação ao Ensino de
Artes e criar uma educação libertadora, transformadora, para promover valores éticos, estéticos e
culturais; valorar o trabalho em equipe numa postura inter e transdisciplinar, visando à
manutenção das culturas regionais, os saberes locais, a vida no planeta preservada pelas tradições
e melhor qualidade de vida para todos. Pretende ainda, promover aprendizagens que
desenvolvam o potencial criativo e expressão estética de todos os envolvidos, possibilitando que
sejam coletiva e qualitativamente melhores em sociedade, mais críticos e construtivos.
Nesta ótica, emerge outra necessidade: propor atividades educativas marcadamente
atreladas ou portadoras de significados do seu tempo, da história e do social e usar os domínios da
razão, da vontade e do sentido, para ampliar o desenvolvimento do aluno, ajudando‐o a ser ele
mesmo, logo, é imprescindível entender o referencial cultural dos alunos antes de elaborar uma
práxis do ensino de Arte. Citando Boff (1997, p.5), “Para entender como alguém lê, e necessário
saber como são seus olhos e qual é sua visão de mundo [...] A cabeça pensa a partir de onde os
pés pisam”.
Será necessário conhecer nas comunidades suas principais manifestações culturais:
festivais, festas, apresentações de teatro, música, dança e exposições de artes visuais, conhecer os
artistas que nela residem e as manifestações culturais promovidas pelas instituições públicas
presentes nessas comunidades. São essas manifestações que dão sustentação à identidade
cultural encontrada nas escolas. Esse processo é também um processo de circularidade de bens
culturais e, não raro, manifestações das culturas hegemônicas penetram as culturas subalternas,
assim como o inverso também acontece, desencadeando um processo de caráter comunicacional
único.
Não é finalidade primeira deste texto elaborar uma proposta de Ensino de Artes. As que
estão circulando nos materiais didáticos produzidos pelos diferentes sistemas já são suficientes. O
que se almeja é organizar formas de conhecimento que se complementam e que juntas possam
auxiliar os docentes a promover uma educação de pertencimento, provocar novas formas de ver o
cotidiano e nele as manifestações das diferentes linguagens de Arte.
A Arte sempre é provocativa e indagadora, não produz respostas, ela lança perguntas e faz
emergir pensamentos. O pensar possibilita compreender e quando se trilha o processo da
compreensão aumenta no individuo ‐ educando/educadores ‐ a percepção do eu, do outro, do
nosso, da vida e do mundo que nos rodeia e movimenta a roda do desenvolvimento científico,
artístico e cultural. “a educação ou a ação cultural para a libertação, em lugar de ser aquela
alienante transferência de conhecimento, é o autêntico ato de conhecer, [...] o conhecimento
existente” (FREIRE, 1984, p. 99).
Vive‐se o momento dialético do fim de um século que não permitirá ao homem ser como
antes, mas sim, construir um “humanismo novo” para o milênio em curso, numa urgência até
então desconhecida pela história, Freire aponta para o imbricamento entre tempo e cultura/arte:
“Herdamos a experiência adquirida, criando e recriando, integrando‐se às condições de seu
contexto, respondendo a seus desafios, objetivando‐se a si próprio, discernindo, transcendendo,
lança‐se o homem num domínio que lhe é exclusivo – o da História e o da Cultura.” (FREIRE, 1983,
p 41).
O foco da educação na atualidade não é de pertencimento e de qualidade, mas sim o de
quantificar e padronizar saberes, o que gerou a inoperância do ensino em todas as esferas, pública
e privada. Não se padroniza os saberes de um país continental e com peculiaridades culturais tão
distintas e ricas como o Brasil. Para quantificar os saberes foi necessário sucumbir com as práticas
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