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OS EXCLUÍDOS DO INTERIOR (CAP.

IX)
Bourdieu

Em os excluídos do interior, Bourdieu (1999) inicia sua fala estabelecendo sobre as crises
ocorridas nos anos de 1986 e 1990 comumente conhecidas pelo nome de “mal-estar nos
liceus”, o termo liceu vem do grego e em uma tradução livre refere-se aos ginásios
localizados fora de Atenas, ou seja, hoje o termo liceu pode ser associado às escolas e/ou
instituições de ensino. O texto instaura sobre as transformações socioestruturais ocorridas
nos últimos anos nas escolas-instituições oriundas da estabilização do modelo neoliberal
que sucedeu os anos 1950. Assim, o texto traz um recorte temporal sobre a classe elitista
de alunos, hierarquizando o corpo discente e os separando em dois grandes grupos: o
primeiro intitulado de alunos “de boas famílias” que vinham de uma trajetória tradicional
familiar seguida comumente por seus “pais ou avós”; o segundo grupo é composto por
alunos periféricos, como mostra Bourdieu.

“por um lado, os estabelecimentos improvisados, cuja multiplicação


fez-se, de maneira precipitada, nas periferias desafortunadas para
acolher populações de alunos cada vez mais numerosos e mais
desprovidos do vista cultural” (Bourdieu,1999, p.219)

Deste modo, Bourdieu relaciona as disparidades sociais ao contexto educacional, provando


que os estudantes de famílias burguesas possuíam (e ainda possuem) uma educação de
qualidade enquanto os periféricos recebem aquilo que sua posição social se aplica. Com a
abertura da obrigatoriedade de educação para todos, as escolas/instituições até o final dos
anos 1950 impuseram uma eliminação tanto brutal como precoce de alunos pertencentes às
classes desfavorecidas. O que acarreta na criação do ensino técnico para os filhos da
classe trabalhadora evitando o contato dessas classes sociais em um mesmo ambiente.

Bourdieu (1999, p.219) explica que as escolas primárias e secundárias “estabelecia uma
relação estrita de homologia com a hierarquia social; e isso contribuía muito para persuadir
aqueles que não se sentiam feitos para a Escola”. Reforçando a divisão social baseada no
poder aquisitivo das famílias como corrobora Bourdieu (1999) na seguinte parte:

Entre as transformações que afetaram o sistema de ensino a partir


dos anos 50, umas das que tiveram maiores conseqüências foi, sem
nenhuma dúvida, a entrada no jogo escolar de categorias sociais.
(Bourdieu,1999, p.220)

Todas essas transformações são oriundas do modelo de privação ao estudos que as


classes menos favorecidas sofrem, apesar de hoje encontrarmos menos essas questões,
há ainda um discurso dominante nas escolas a respeito dessas divisão e/ou vagas
específicas para os alunos que se encontram na periferia da sociedade, reforçando mais
uma vez a nítida separação contínua não só de alunos mas de uma parcela da sociedade.

Com o perpassar dos anos, a reformulação institucional tomou mais força e hoje, o corpo
docente e principalmente a ala progressista luta contra o novo ensino médio que se
demonstra mais uma vez como modelo de separação entre o alunado e sua condição
social, acarretando com que muitos não consigam ter estabilidade para continuar sua
educação, causando uma saída maciça do alunado que se encontra cada vez mais
desmotivado e decepcionado com sua situação. Esse pensamento pode ser constatado na
passagem que Bourdieu (1999, p. 221) destaca. “[...] a instituição escolar tende a ser
considerada cada vez mais, tanto pelas famílias quanto pelos próprios alunos, como um
engodo, fonte de uma imensa decepção coletiva”. Anteriormente vista como transformadora
de vidas, a escola como entidade com os anos foi sendo sucateada em nome de grandes
empresas, fazendo com que ocorra esse êxodo escolar, concretizando uma nova crise
crônica na educação.

Com o sucateamento cada vez mais forte, o ensino público vem se estruturando apenas
como um estabelecimento tecnicista enquanto a criação de um novo espaço “limpo” de
periféricos se estabelece e monta uma forte estrutura educacional, essas instituições, como
conhecemos se intitulam como “escolas privadas” formadores de doutores mantém uma
capacidade de melhoramento e ensino qualificado atrai as famílias que não estavam “à
vontade” com a homogeneização de classes e status, como podemos ver a seguir.

“Eis aí um dos mecanismos que, acrescentando-se à lógica da


transmissão do capital cultural, fazem com que as mais altas
instituições escolares e, em particular, aquelas que conduzem às
posições de poder econômico e político, continuem sendo exclusivas
como foram no passado” (Bourdieu, 1999, p. 223)

Há inúmeras formas de segregação social, as mais veladas, podem exigir uma


padronização de vestimentas e/ou equipamentos muito das vezes impossíveis para os
desfavorecidos que ingressaram em alguma instituição, outras excluem sem se importar,
uma coisa é certa para Bourdieu (1999, p. 224) “como sempre, a Escola exclui, mas a partir
de agora, exclui de maneira contínua, em todos os níveis do cursus.

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