Você está na página 1de 53

Julio Almeida

CONTESTAÇÃO
COGNITIVA
Um guia para estudantes de Terapia Cognitiva

2
3
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 5

SEÇÃO I: TERAPIA COGNITIVA 7


1. Teoria do construto pessoal 7
2. Modelo cognitivo 8
3. Crenças disfuncionais 10

SEÇÃO II: CONTESTAÇÕES 20


4. Conceito 20
5. Técnicas 23
6. Exemplos de Contestações 39

SEÇÃO III: RELAÇÃO TERAPÊUTICA 49


7. Recomendações 49
8. Evitações 52
9. Empirismo colaborativo 55
10. Confrontação 59

Considerações finais 64
Referências 66

4
INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta uma pesquisa bibliográfica sobre a prática das contestações na terapia
cognitiva, cuja função é desconstruir as cren​ças disfuncionais manifestas pelo paciente, ajudando-lhe
a alcançar uma ava​liação dos acontecimentos mais adaptada à realidade.
A produção deste livro foi toda embasada no meu Trabalho de Con​​clusão de Curso para
graduação em Psicologia, apresentado à banca em de​zem​bro de 2011. O título original foi Con​tes​ta​-
ção das Crenças Disfun​cio​nais na Terapia Cognitiva. Obviamente, aqui o texto foi adaptado para
um formato mais adequado de livro.
A expressão Contestação Cognitiva me pareceu ser a mais apro​pria​da síntese para designar
com exatidão o conteúdo deste livro, por isso a escolha deste título. Este volume poderia muito bem
ser de​no​mi​nado de A Ciência da Contestação ou ainda Contestação Assertiva.
Até os dias de hoje ainda recebo frequentemente solicitações de co​le​gas profissionais e
estudantes para fornecer uma cópia do TCC por sua utilidade prática, sendo este também um dos
principais motivos que mo​ti​va​ram esta publicação.
O tema deste trabalho foi escolhido devido ao interesse pessoal de obter maior conhecimento
sobre as técnicas de intervenção na terapia cogni​​tiva, especialmente aquelas destinadas a contestar
os pensamentos e crenças disfuncionais expressas pelo paciente.
Pessoalmente, sempre tive o hábito de questionar meus pensa​men​tos e opor mentalmente tudo
aquilo que eu identificasse como sendo irra​cio​nal em minhas interpretações sobre os acontecimentos
da vida e per​ce​bidos no mundo ao meu redor. Mais tarde, soube que ajudar a criar e aper​​feiçoar esta
habilidade psíquica nos pacientes é um dos principais obje​tivos na terapia cognitiva.
Do ponto de vista interpessoal, penso que a capacidade de con​tes​tar assertivamente é uma
habilidade importante não somente dentro da clínica – durante a psicoterapia –, mas exigida a cada
dia mais nas re​la​ções humanas, num mun​do onde as diferenças crescem e as posturas de
inconformidade pre​cisam de pacificação.

Concernente ao aspecto metodológico, o problema de pesquisa foi descrito na seguinte ques​-


tão: Quais as habilidades e conhecimentos ne​ces​sá​rios para o terapeuta con​testar de maneira
assertiva as crenças dis​fun​cio​nais do paciente na te​ra​pia cognitiva? A partir desta questão esta​be​le​-
cemos como objetivo ge​ral exatamente a identificação destas habilidades e conhecimentos fun​da​men​-
tais para a realização das contestações. Deste objetivo geral derivaram os seguintes objetivos
específicos:

• Entender o conceito de contestação e sua função terapêutica na terapia cognitiva;


• Conhecer as principais técnicas de como realizar as con​tes​ta​ções;
• Entender a melhor forma de aplicar as técnicas de contestação, incluindo posturas a serem
evitadas e os momentos mais apropriados para aplicá-las;
• Identificar, na forma de listagem, quais os principais tipos de cren​ças disfuncionais,
exemplos das mesmas e respectivos argumentos pos​​síveis para contestá-las.

5
O trabalho está dividido em três partes que relacionam as con​tes​ta​ções com os principais
aspectos envolvidos em sua prática.
Inicialmente, são abordados os princípios da terapia cognitiva con​ver​gentes com o tema deste
livro, incluindo a teoria do construto pessoal, o modelo cognitivo e as concepções sobre as crenças
disfuncionais.
O segundo capítulo apresenta as implicações terapêuticas da con​testação propriamente dita,
iniciando pelo aprofundamento do con​cei​to, percorrendo as principais técnicas de intervenção e
finalizando com di​fe​rentes exemplos referidos pela bibliografia consultada.
Por fim, o terceiro capítulo versa sobre os elementos necessários para o estabelecimento de
uma relação terapêutica adequada durante a rea​lização das contestações na terapia cognitiva.

6
SEÇÃO I: TERAPIA COGNITIVA

1. TEORIA DO CONSTRUTO PESSOAL

Para entendermos o papel das contestações na terapia cognitiva, precisamos antes recorrer a
alguns princípios teóricos que antecederam e embasaram a formulação da terapia cognitiva,
especialmente a teoria do construto pessoal, de George Kelly.
A teoria do construto pessoal considera cada pessoa um cientista amador de si mesmo ou
teórico da personalidade, condição também denominada pelo autor como o Homem (pessoa)-
Cientista. De maneira análoga a um cientista, desenvolvemos teorias para explicar o mundo,
formando um sistema de construtos usados para compreender e predizer comportamentos pessoais e
alheios. Nesse sentido, as experiências pes​soais servem para validar ou não estas teorias,
reorganizando as próprias versões da realidade (Friedman e Schustack, 2007).

Essa metáfora vê as pessoas agindo como cientistas no sentido de que elas formulam hipóteses sobre o
mundo na forma de construções pessoais e depois põem-se a testar essas ideias de maneira muito
semelhante ao que um cientista faria para obter certeza preditiva e algum controle sobre os eventos.
(Fadiman e Frager, 2004, p. 327)

O aspecto central da teoria de Kelly refere-se à permanente ca​pa​cidade que as pessoas


possuem de modificarem a si mesmas, reinventando-se dentro da realidade flexível e criativa do
mundo em constante mutação. Segundo o autor, “os homens mudam as coisas primeiro mudando a si
mesmos e só atingem seus objetivos se pagarem o preço de mudarem a si mesmos – como
descobriram alguns para sua tristeza e outros para sua salvação” (Kelly apud Fadiman e Frager,
2004, p. 330).
A posição filosófica básica da teoria do construto pessoal de Kelly é conhecida como
alternativismo construtivo, isto é, a ideia de que são possíveis diferentes alternativas de
interpretações para os fatos do mundo real, com os quais cada indivíduo mantém um relacionamento
(através das próprias percepções) dando-lhes significados.

Os fatos que hoje enfrentamos estão sujeitos a uma variedade de construções tão grande quanto nossas
faculdades mentais nos permitem conceber [...] Todas as nossas atuais percepções estão sujeitas a
questionamento e reconsideração e sugere, de modo geral, que mesmo as ocorrências mais óbvias da
vida cotidiana podem parecer totalmente transformadas se formos inventivos o suficiente para
interpretá-las de modo diferente. (Kelly apud Fadiman e Frager, 2004, p. 330)

Segundo Kelly, as pessoas podem reperspectivar o sentido de suas existências a qualquer


momento, inclusive o sentido construído no início da vida, pois sempre podem reinterpretar a
realidade.

7
2. MODELO COGNITIVO

O modelo da terapia cognitiva segue as bases da teoria do construto pessoal, como nos
explica Leahy (2006, p. 24):

O modelo cognitivo de terapia baseia-se no modelo de George Kelly (1955) do “homem (ou mulher)
como cientista” – isto é, que os humanos podem identificar “constructos” ou crenças pessoais e testá-
los. O atual modelo cognitivo, proposto por Beck e colaboradores, enfatiza o aspecto do pensamento
científico que busca a “desconfirmação” ou “falsificação” da crença – isto é, examinar como podemos
provar que a crença é errada ou inadequada.

O modelo cognitivo da terapia desenvolvida por Aaron Beck propõe que o modo disfuncional
de interpretar as situações – por meio dos pensamentos e crenças – determina os sentimentos e
comportamentos das pessoas nos transtornos psicológicos. Judith Beck (1997, p. 17) diz:

O modelo cognitivo propõe que o pensamento distorcido ou disfuncional (que influencia o humor e o
comportamento do paciente) seja comum a todos os distúrbios psicológicos. A ava​liação realista e a
modificação no pensamento produzem uma melhora no humor e no comportamento. A melhora dura​-
doura resulta da modificação das crenças disfuncionais básicas dos pacientes.

Albert Ellis, em seus métodos também fundamentadores da terapia cognitiva, parte do


pensamento de antigos filósofos, a exemplo de Epicteto, para ilustrar esta abordagem psicoterápica:
“Perturbam aos homens não as coisas, senão a opinião que delas tem” (Rangé, 2001, p. 34).
No momento de explicar para o paciente o funcionamento do mo​delo cognitivo, da terapia e
da relação entre pensamentos e emoções, Leahy (2006) sugere que os terapeutas usem linguagem
simples, dizendo, por exemplo:

Antes de você contestar e mudar pensamentos, precisa compre​en​der como os pensamentos afetam os
seus sentimentos […] Quando você se sente triste ou ansioso na sua vida cotidiana, diferentes
pensamentos passam por sua mente. (p. 25)

A fim de distinguir pensamentos, sentimentos e fatos, os tera​peutas podem utilizar a técnica A-B-C, em
que os pacientes têm a oportunidade de reconhecer como o mesmo evento Ativador pode levar a
diferentes crenças (Belifs) (pensamentos) e Consequências (sentimentos e comportamentos). Se eu
acre​ditar que nunca poderei me sair bem no exame (pensa​mento), talvez me sinta desesperançado e me
comporte de acordo com isso – por exemplo, não me dando o trabalho de estudar. Por outro lado, se
acreditar que tenho uma boa chance de me sair bem no exame, talvez me sinta esperançoso e, conse​-
quen​te​mente, estude bastante. (p. 27)

O objetivo da terapia cognitiva, portanto, é ajudar o paciente a des​fazer as interpretações


distorcidas da realidade por meio dos pensa​mentos e crenças, aliviando assim seus sintomas.

Os clientes raramente estão conscientes das premissas de seus pensamentos. Mais frequentemente,
focalizam apenas as con​clusões que, se distorcidas, tentem a gerar problemas emo​cio​nais. O
pensamento racional envolve raciocínio lógico baseado em afirmações empiricamente verificáveis. Se
pensar​mos Ra​cionalmente, é improvável chegarmos a conclusões que levem a sentimentos
extremamente perturbadores. (Rangé, 2001, p. 35)

8
As intervenções na terapia cognitiva podem ser descritas em três etapas gerais (Shinohara,
2003, p. 63), existindo diferentes técnicas para a realização de cada uma:

1. Identificação: “No primeiro momento, o terapeuta ajuda o cliente a identificar os


pensamentos e as crenças que estão relacionados com as emoções e os comportamentos trazidos
como queixas”.
2. Avaliação: “No segundo momento, o cliente é ajudado a ana​lisar os pensamentos para
testar a validade ou utilidade deles, segundo a lógica própria do cliente”.
3. Reestruturação: “No terceiro momento, o terapeuta acompanha o cliente na
identificação e reformulação das crenças consideradas por ele como disfuncionais ou irrealistas”.

A necessidade das contestações pode surgir em qualquer uma destas três etapas. Porém, em
geral, iniciam após a etapa 1 através da conceituação cognitiva, pois é necessário primeiro
identificar o que será contestado. Leahy (2006, p. 53) recomenda a prática das contestações após o
paciente e o terapeuta terem identificado, categorizado e examinado os pensamentos negativos em
relação às perturbações emocionais.

3. CRENÇAS DISFUNCIONAIS

No universo das interpretações da realidade, foram identificados pelo menos três níveis de
pensamento: os pensamentos automáticos, as crenças intermediárias e as crenças centrais.

Os pensamentos automáticos são espontâneos e fluem em nossa mente a partir dos acontecimentos do
dia-a-dia [...] As cren​ças intermediárias correspondem ao segundo nível de pen​samento e não são
diretamente relacionadas às situações, ocor​rendo sob a forma de suposições ou de regras [...] As
crenças centrais constituem o nível mais profundo da estrutura cogni​tiva e são compostas por ideias
absolutistas, rígidas e globais. (Rangé, 2001, p. 50)

Sobre tais convicções rígidas, Kelly (apud Fadiman e Frager, 2004, p. 333) nos diz

Em última instância, o homem define a medida de sua própria liberdade e de sua própria servidão pelo
nível em que opta firmar suas convicções. O homem que organiza sua vida em termos de muitas
convicções especiais e inflexíveis sobre questões temporárias faz de si uma vítima das circunstâncias.

Descoberta Orientada

O terapeuta precisará saber que nem todos os pensamentos mani​festos pelo paciente são
irracionais ou distorcidos, e que por meio da des​co​berta orientada é realizada uma contínua revisão
dos dados obtidos.
A descoberta orientada também tem por objetivo transformar a relação terapêutica numa
experiência humana educativa, por meio do bom humor e de uma diversificação nas estratégias de
comunicação, por exem​plo, variando o modo de apresentar hipóteses e ilustrar pontos impor​tantes.

9
De acordo com Beck, Freeman e Davis (2005, p. 77)

Parte da arte da terapia cognitiva consiste em transmitir um senso de aventura – ao desemaranhar e pôr
às claras as origens das crenças do paciente, ao explorar os significados de eventos traumáticos e ao
aproveitar a riqueza da imaginação. De outra forma, a terapia pode se transformar em um processo
repetitivo que se torna cada vez mais tedioso com o passar do tempo.

As crenças disfuncionais são estudadas a partir de uma variedade de tipos e níveis de


pensamentos errôneos, conforme veremos agora de acordo com os principais autores.

Distorções Cognitivas

Conforme Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 12), as distorções cognitivas são falhas no
processamento de informações, ou seja, erros sistemáticos que mantém a validade de determinada
crença disfuncional, mesmo com evidências contrárias a ela. Geralmente envolvem juízos am​plos
dos acontecimentos de maneira extrema, negativa, categórica, abso​luta e sentenciosa; ao contrário de
um pensamento presumivelmente mais ma​du​ro, com padrões relativos e não absolutos. Neste estudo,
Leahy (2006) lista 17 distorções cognitivas:

1. Leitura mental: achar que sabe o que os outros pensam, sem ter evidências.
2. Previsão do futuro: fazer previsões negativas para o futuro.
3. Catastrofização: acreditar que determinado acontecimento é terrível e insuportável.
4. Rotulação: atribuir traços negativos que englobam a pessoa completamente.
5. Desqualificação dos aspectos positivos: menosprezar aspectos positivos de si ou dos
outros.
6. Filtro negativo: enxergar somente a faceta negativa da pessoa ou situação.
7. Hipergeneralização: padrão global negativo baseado em um único evento.
8. Pensamento dicotômico: avaliar fatos e pessoas em termos de tudo-ou-nada.
9. Afirmações do tipo “Deveria”: enfatizar como as coisas de​ve​riam ser em vez de focar o
que são.
10. Personalização: atribuir somente a si a culpa por fatos nega​tivos.
11. Culpa: focar somente outra pessoa como fonte de seus sen​ti​mentos negativos.
12. Comparações injustas: interpretar os fatos segundo padrões irrealistas, comparando-se a
outros superiores.
13. Tendência à lamentação: enfatizar exageradamente que poderia ter feito melhor ao invés
de focar no que pode fazer agora.
14. “E se?”: fazer mil e uma conjecturas do tipo “e se isso ou aquilo acontecer” e nunca se dá
por satisfeito e seguro.
15. Raciocínio emocional: a pessoa se guia pelas emoções e sen​timentos para interpretar a
realidade.
16. Incapacidade de refutar: negar as evidências e argumentos que contradizem os
pensamentos negativos.
17. Foco no julgamento: ver tudo como avaliações do tipo bom-mau ou superior-inferior,

10
focando em julgamentos.

Crenças Irracionais

Ellis (apud Rangé, 2001, p. 39) aponta 11 crenças irracionais que são consideradas aspectos
centrais no desencadeamento das perturbações emocionais e do comportamento humano:

1. Existe uma extrema necessidade de ser amado e aprovado por outra pessoa significativa.
2. Se deva ser inteiramente competente, adequado e realizador em todos os aspectos
possíveis para se ter valor.
3. É catastrófico quando as coisas não são do jeito que gostaríamos.
4. Certas pessoas são más e perversas, e que por isso deveriam ser punidas severamente.
5. A infelicidade é externamente causada.
6. Devemos ficar imensamente preocupados e ruminando as coisas que podem ser perigosas
ou assustadoras.
7. É mais fácil evitar do que enfrentar dificuldades e responsabi​lidades.
8. Precisamos nos apoiar em alguém ou coisa vista como sendo mais forte do que nós.
9. A história/passado de alguém é determinante do seu compor​tamento hoje e sempre.
10. Os problemas e preocupações dos outros devem nos preocupar muito.
11. Há uma solução certa (perfeita) para os problemas e é terrível não encontrá-la.
Crenças Centrais

Judith Beck (1997, p. 177) explica que as crenças centrais são desenvolvidas a partir da
infância, e envolvem ideias sobre si, outras pessoas e o mundo. São “ideias consideradas pela
pessoa como verdades absolutas, exatamente o modo como as coisas ‘são’”. Diz também que as
crenças centrais são “entendimentos que são tão fundamentais e pro​fun​dos que as pessoas
frequentemente não os articulam, sequer para si mesmas.” A autora distingue dois tipos de crenças
centrais disfuncionais e nos apresenta alguns exemplos:

1. Crenças centrais de desamparo: eu sou desamparado; eu sou impotente; eu sou fora de


controle; eu sou fraco; eu sou vulnerável; eu sou carente; eu estou sem saída; eu sou inadequado; eu
sou ineficiente; eu sou incompetente; eu sou um fracasso; eu sou desrespeitado; eu sou defeituoso (ou
seja, eu não chego à altura dos outros); eu não sou bom o suficiente (em termos de conquistas).
2. Crenças centrais de não ser querido (falta de amor): eu não sou capaz de ser amado; eu
não sou capaz de ser querido; eu sou indesejável; eu não sou atraente; ninguém me quer; ninguém liga
para mim; eu sou mau; eu não tenho valor; eu sou diferente; eu sou imperfeito (ou seja, então os
outros não irão me amar); eu não sou bom o suficiente (para ser amado pelos outros); eu estou a
ponto de ser rejeitado; eu estou con​denado a ser abandonado; eu estou a ponto de ficar sozinho.

Crenças Intermediárias

A autora ainda aborda as crenças intermediárias considerando três aspectos: atitude,


suposição e regras. As obras que tratam de terapia cognitiva geralmente abordam diferentes crenças

11
intermediárias. Judith Beck (1997, p. 31) apresenta alguns exemplos:

• Atitude: Por exemplo, “é horrível ser incompetente” ou “é ter​ri​vel ser inadequada”.


• Regras / expectativas: Por exemplo, “eu devo trabalhar o mais arduamente que puder o
tempo todo”, “eu deveria sempre me esforçar ao máximo” ou “eu deveria ser excelente em tudo o que
tento fazer”.
• Suposição: Por exemplo, “se eu trabalhar o mais arduamente que puder, posso ser capaz
de fazer algumas coisas que as outras pessoas fazem facilmente” ou “se eu trabalhar muito duro, eu
posso fazer bem as coisas”.

Leahy (2006, p. 105) propõe um formulário com exemplos de pres​supostos, regras e padrões
típicos, ou seja, crenças intermediárias do tipo “deveria”, “se isso acontecer, então tal coisa é
verdadeira” e impe​rativas. Eis alguns:

• “Devo ser perfeito em tudo que faço.”


• “Se falhar em alguma coisa, então sou um fracasso.”
• “Preciso receber a aprovação de todos para gostar de mim mesmo.”
• “Se alguém pensa mal de mim, então devo também pensar mal de mim.”
• “Temos de impressionar as pessoas com nossa personalidade.”
• “Se eu não for perfeito, as pessoas não gostarão de mim.”
• “Algumas pessoas são melhores do que outras.”
• “Se eu não tiver certeza das coisas, elas provavelmente não darão certo.”
• “É importante ter todas as informações antes de tomar uma decisão.”
• “Eu não deveria ficar deprimido (zangado, ansioso).”
• “Os outros deveriam fazer as coisas à minha maneira.”
• “Se eu cometer um erro, devo criticar a mim mesmo.”
• “Se as pessoas me ofenderem, devo dar o troco.”

Judith Beck (1997, p. 157) lembra que a dificuldade em modificar as crenças dos pacientes
varia para cada indivíduo, e que a modificação das crenças centrais, normalmente mais rígidas,
ocorre em geral após as crenças intermediárias.
Crenças nos Transtornos da Personalidade

Nas pesquisas de Beck, Freeman e Davis (2005, p. 54), os trans​tor​nos de personalidade


apresentam crenças bem específicas:

• Transtorno da Personalidade Esquiva: “é terrível ser rejeitado, desprezado”; “se as


pessoas conhecessem o meu verdadeiro eu, elas me rejeitariam”; “não posso tolerar sentimentos
desagradáveis”.
• Transtorno da Personalidade Dependente: “eu preciso das pessoas para sobreviver, ser
feliz”; “eu preciso ter uma fonte constante de apoio, de encorajamento”.
• Transtorno da Personalidade Passivo-Agressiva: “os outros interferem na minha

12
liberdade de ação”; “ser controlado pelos outros é in​to​lerável”; “eu tenho de fazer as coisas à minha
maneira”.
• Transtorno da Personalidade Obsessivo-Compulsiva: “eu sei o que é melhor”; “os
detalhes são cruciais”; “as pessoas deveriam fazer melhor, se esforçar mais”.
• Transtorno da Personalidade Paranóide: “os motivos dos outros são suspeitos”;
“preciso estar sempre em guarda”; “eu não posso confiar nas pessoas”.
• Transtorno da Personalidade Anti-Social: “eu tenho direito de quebrar regras”; “os
outros são otários, covardes”; “eu sou melhor do que os outros”.
• Transtorno da Personalidade Borderline: “não consigo enfrentar as coisas sozinho”;
“preciso de alguém em quem confiar”; “não tolero sentimentos desagradáveis”; “se confiar em
alguém, serei maltratado, considerado insignificante e me abandonarão”; “a pior coisa possível seria
o abandono”; “é impossível me controlar”; “eu mereço ser punido”.
• Transtorno da Personalidade Narcisista: “já que sou especial, eu mereço regras
especiais”; “eu estou acima das regras”; “eu sou melhor do que os outros”.
• Transtorno da Personalidade Histriônica: “as pessoas estão aqui para me servir ou
admirar”; “as pessoas não tem direito de me negar o que eu mereço.”; “devo seguir meus
sentimentos”.
• Transtorno da Personalidade Esquizóide: “os outros são frus​trantes”; “os
relacionamentos são complicados, indesejáveis”.
• Transtorno da Personalidade Esquizotípica: “se eu tentar ser amigo das pessoas, elas
vão me rejeitar e me magoar”; “é melhor ficar isolado dos outros.”

Falácias Lógicas

Para McMullin (2005, p. 141), as falácias lógicas – premissas irra​cio​nais aparentemente


verdadeiras, são muitas vezes expressas pelo pa​cien​te na tentativa de manipular o exame das
evidências das crenças dis​fun​cionais. Segundo o autor, que faz um levantamento exaustivo dos tipos
de falácias, diz que elas

[...] derivam de distorções na percepção dos pacientes (por exemplo, generalizações), outras vêm de
distorções psicológicas (catastrofização), enquanto outras, ainda, são distorções lógicas (pensamento a
priori). Algumas vezes originam-se da confusão que as pessoas fazem entre correlações e
casualidades.

As falácias lógicas usadas para comprovar pressupostos devem ser identificadas e evitadas
(McMullin, 2005, p. 142):

A melhor maneira de educar nossos pacientes a respeito das falácias lógicas é identificá-las no exato
momento em que são expressas, observando como elas não trazem nenhuma contri​buição para a
avaliação acerca da falsidade ou da veracidade de uma crença. Muito frequentemente, elas são apenas
deri​vações que contribuem para que nossos pacientes evitem de lidar com as percepções distorcidas que
vêm somando ao lon​go da vida.

Segundo McMullin, o terapeuta deve exemplificar as falácias e en​co​rajar o paciente a se opor


(contestação) a elas. Eis, resumidamente, os primeiros 15 tipos de falácias lógicas, dentre 37

13
apontadas pelo autor:

01. Sensacionalismo: Tornar simples emoções em emergências psiquiátricas. Exemplo: “é


muito perigoso ficar ansioso”.
02. Generalização: Escolher características específicas para repre​sentar o todo. Exemplo:
“quem não sabe gramática é burro”.
03. Personalização: Ver eventos casuais como ataques contra si. Exemplo: “Deus me fez
quebrar a perna como castigo por meus pecados”.
04. Antropomorfismo: Atribuir a objetos características humanas. Exemplo: “o carro
recusou-se a funcionar”.
05. Perenizar: Tornar permanente uma condição temporária. Exemplo: “nunca serei feliz”.
06. Culpabilizar: Colocar a culpa em alguém. Exemplo: “todos os criminosos são
produzidos por maus pais”.
07. Patologização: Transformar reações em doenças. Exemplo: “agressividade é uma
doença”.
08. Perfeccionismo: Usar padrões inalcançáveis. Exemplo: “devo ser melhor do que todo o
mundo, em tudo”.
09. Pensamento dicotômico: Tudo ou nada, oito ou oitenta. Exemplo: “neste mundo, ou se é
um vencedor ou se é um perdedor”.
10. Pessimizar: Esperar sempre o pior de tudo. Exemplo: “esta dor na minha perna deve
ser um sinal que estou com câncer”.
11. Obrigatoriedade: Tornar obrigatórios certos desejos. Exemplo: “tenho que conquistá-
la de volta”.
12. Auto-intitulação: Esperar privilégios especiais inexistentes. Exemplo: “é absurdo
mostrar a carteira de identidade para descontar cheque”.
13. Psicologizar: Atribuir sempre causas psicológicas. Exemplo: “esbarrei na mesa porque
estava tentando me punir”.
14. Raciocínio complexo: Explicar complicadamente. Exemplo: “você está transferindo sua
hostilidade infantil reprimida para mim”.
15. Reificação: Pressupor que abstrações sejam entidades reais. Exemplo: “justiça, beleza
e virtude são perfeitas manifestações da realidade”.

Esquemas

Representando um avanço na maneira de compreender as crenças, Young, Klosko e Weishaar


(2008, p. 22), na terapia do esquema – sistema psicoterápico que mescla elementos de diferentes
abordagens para tratar pacientes com transtornos da personalidade e transtornos do Eixo 1, focado
nos esquemas desadaptativos dos pacientes, ou seja, “padrões emocionais e cognitivos
autoderrotistas iniciados em nosso desenvolvimento desde cedo e repetidos ao longo da vida” –
propõem cinco categorias ou domínios para classificar dezoito esquemas desadaptativos. Eis a
listagens dos domínios e esquemas (p. 27-31):

I. Desconexão e Rejeição. Expectativa de que as necessidades de segurança e afeto não

14
serão satisfeitas:

• Abandono/Instabilidade: Percepção que os outros são instáveis, indignos e não


continuarão proporcionando apoio.
• Desconfiança/Abuso: Expectativa de que será machucada de alguma forma pelos outros,
de maneira intencional e injustificada.
• Privação Emocional: Expectativa que não receberá apoio emo​cional adequado e ficará
privada de cuidados, empatia e proteção.
• Defectividade/Vergonha: Sentimento de que é defeituoso, inde​se​jado e não merece amor
das pessoas, ficando sensível a diferentes opo​si​ções do convívio social.
• Isolamento Social/Alienação: Sentimento de isolamento e dife​ren​ças significativas em
relação aos outros indivíduos e grupos.

II. Autonomia e Desempenho Prejudicados. Expectativas sobre si e o meio que afetam a


percepção sobre a capacidade pessoal de ser inde​pendente:

• Dependência/Incompetência: Crença que necessita da ajuda alheia para ser responsável e


competente, apresentando-se como desam​paro.
• Vulnerabilidade a Danos ou Doenças: Medo exagerado de que não terá como impedir uma
catástrofe iminente em termos de saúde, emoções ou acidentes externos.
• Emaranhamento/Self Subdesenvolvido: envolvimento em excesso com uma ou mais
pessoas, afetando a própria individuação e desenvol​vi​mento social.
• Fracasso: Crença no fracasso pessoal permanente e generalizado, sentindo-se menos
exitoso em comparação aos outros.

III. Limites Prejudicados. Deficiência com limites, respeito, coope​ra​ção e responsabilidade:

• Arrogo/Grandiosidade: Crença na superioridade pessoal em relação aos outros,


merecendo direitos e privilégios que o eximem da reciprocidade social normal.
• Autocontrole/Autodisciplina Insuficientes: Dificuldade em lidar com a frustração em
relação aos objetivos pessoais e com os limites de sua expressão.

IV. Direcionamento para o outro. Foco excessivo nos sentimentos e vontades das outras
pessoas em detrimento de si próprio, a fim de ser aprovado e não rejeitado:

• Subjugação: Submissão para evitar raiva, retaliação e abandono, gerando a subjugação


das necessidades e/ou emoções pessoais.
• Auto-sacrifício: Foco excessivo no atendimento aos outros à custa da própria gratificação,
embasado numa sensibilidade intensa aos sentimentos alheios.
• Busca de Aprovação/Busca de Reconhecimento: Ênfase na busca pela aprovação social,
com as reações alheias determinando a própria autoestima.

V. Supervigilância e Inibição. Ênfase excessiva na supressão das próprias manifestações e no

15
comportamento ético à custa da felicidade, saúde e de relacionamentos íntimos:

• Negativismo/Pessimismo: Foco nos aspectos negativos e des​prezo aos aspectos positivos


ou otimistas, esperando sempre o pior.
• Inibição Emocional: Excesso de inibição ao agir para não ser desaprovado, envolvendo
inibição da raiva/agressão, de impulsos positivos e da comunicação livre.
• Padrões Inflexíveis/Postura Crítica Exagerada: Crença de que é necessário muito esforço
para atingir padrões internalizados de desem​pe​nho, gerando sentimentos de pressão e posturas
exageradamente críticas.
• Postura Punitiva: Crença de que as pessoas, quando erram, devem ser punidas, gerando em
si raiva, intolerância e incapacidade de perdoar.

O procedimento de contestar as crenças disfuncionais é passo im​pres​cindível para alcançar-


se a reestruturação cognitiva, pois como ajudar o paciente a incorporar novos pensamentos mais
adaptativos se ele ainda mantiver arraigadas visões distorcidas da realidade? Daí a impor​tância das
contestações, como veremos a seguir.

16
SEÇÃO II: CONTESTAÇÕES

4. CONCEITO

De acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), o termo contestar


apresenta 6 acepções que vem ao encontro a proposta desta pesquisa:

1. Não aceitar como válido; impugnar, refutar. 2. Recusar o reconhecimento de um direito. 3. Pôr em
dúvida a veracidade de ou questionar (algo) a (alguém); negar. 4. Mostrar oposição ou contrariedade;
opor-se, protestar. 5. Dizer como resposta; replicar, responder. 6. Atestar, confirmar.

Outras diferentes palavras mantêm relação direta com o termo contestação, inclusive algumas
sendo usadas como sinônimos e ideias afins. Eis alguns exemplos: antagonismo, argumentação,
conflito, confronto, con​futação, contradição, contraponto, controvérsia, crítica, debate, desacor​do,
desconstrução, discórdia, dissensão, dissonância, dúvida, falseabilidade, impugnação,
incongruência, negação, objeção, oposição, polêmica, refu​ta​ção, réplica.

As ciências humanas, especialmente a Filosofia e a Pedagogia, apresentam diferentes teorias


relevantes para o estudo das bases concei​tuais da contestação. O objetivo aqui, no entanto, não é
aprofundar tais conceitos, mas enfatizar a existência de estreitas relações entre os mesmos e o tema
aqui abordado. Eis a definição de quatro destes conceitos, de acordo com Houaiss e Villar (2001):

Dialética
Em sentido bastante genérico, oposição, conflito originado pela contradição entre princípios teóricos ou
fenômenos em​píricos.
1.1 no platonismo, processo de diálogo, debate entre inter​locutores comprometidos profundamente com
a busca da verdade, através do qual a alma se eleva, gradativamente, das aparências sensíveis às
realidades inteligíveis ou ideias.
1.2 no aristotelismo, raciocínio lógico que, embora coerente em seu encadeamento interno, está
fundamentado em ideias apenas prováveis, e por esta razão traz sempre em seu âmago a possibilidade
de sofrer uma refutação.
1.3 no kantismo, raciocínio fundado em uma ilusão natural e inevitável da razão, que por isto permanece
no pensamento, mesmo quando envolvido em contradições ou submetido à refutação.
1.4 no hegelianismo, lei que caracteriza a realidade como um movimento incessante e contraditório,
condensável em três momentos sucessivos (tese, antítese e síntese) que se mani​festam simultaneamente
em todos os pensamentos humanos e em todos os fenômenos do mundo material.

Falseabilidade
[...] possibilidade inerente a qualquer teoria científica de ser submetida a uma refutação parcial,
decorrente de sua inca​pa​cidade constitutiva de refletir integralmente a natureza dos fatos; refutabilidade
[para o filósofo austríaco Karl Popper, característica essencial do método científico, que por este cri​tério
antidogmático se distingue da irrefutabilidade meta​fí​sica ou pseudocientífica].

17
Heurística
1 arte de inventar, de fazer descobertas; ciência que tem por objeto a descoberta dos fatos.
1.1 ramo da História voltado à pesquisa de fontes e documen​tos.
1.2 método de investigação baseado na aproximação progres​siva de um dado problema.
1.3 método educacional que consiste em fazer descobrir pelo aluno o que se lhe quer ensinar.

Maiêutica
[...] 2 método socrático que consiste na multiplicação de per​guntas, induzindo o interlocutor na
descoberta de suas pró​prias verdades e na conceituação geral de um objeto. 3 método heurístico.

O ato de contestar está entranhado nas relações humanas, pois ninguém é igual a ninguém e as
pessoas compartilham de diferentes per​cepções da realidade. As histórias de vida e experiências
pessoais, assim como o modo de pensar, sentir e agir de cada pessoa, se diversificam ao infinito,
tornando inevitáveis as relações humanas divergentes e, conse​quen​temente, opositivas. Observa-se,
portanto, que tal aspecto da subjeti​vidade humana não se exclui nem mesmo dentro da clínica de
Psicologia, neste caso, atribuindo às contestações uma função de ajuda psico​tera​pêutica.
Neste ponto, podemos questionar: existe psicoterapia sem contes​tação? É razoável presumir
que, num momento ou noutro, a contestação se faça presente na relação de ajuda, independente da
abordagem psico​lógica adotada. Entretanto, o objetivo deste trabalho não é analisar as contestações
em outras abordagens que não seja a terapia cognitiva.
O termo contestação ou contestar é largamente empregado pela maioria dos autores em
terapia cognitiva e sua função prática – como importante procedimento psicoterapêutico – fica
evidente em quase todas as obras. No entanto, muito pouco encontramos em termos de definição clara
e específica deste conceito nas obras de referência consultadas. A explicação mais direta foi de
McMullin (apud Abreu e cols., 2003, p. 64):

As técnicas de contestação baseiam-se na lógica de que, quando o cliente discute repetidamente uma
crença, esta se torna progressivamente mais fraca. As raízes dessas técnicas estão na filosofia: disputar,
desafiar e discutir as ideias. As contestações são pensamentos que vão contra, que se opõem a uma
crença irracional: “Isto não é verdade!”, “Ninguém aqui está prestando tanta atenção assim em mim!”.

Com base nas obras consultadas, poderíamos definir a contestação das crenças disfuncionais
na terapia cognitiva como o ato ou efeito de opor-se às interpretações, pensamentos ou pressupostos
desadaptativos aceitos pelo paciente como verdades absolutas, colocando-as em dúvida e
desconstruindo-as de diferentes maneiras, seja questionando, argumen​tando ou testando tais
pensamentos com a realidade.
McMullin (2005, p. 205) diz que “muitas vezes eles estão tão bem-resguardados que a
argumentação racional não funciona. Nossa melhor chance para ajudar os pacientes é prescrever a
eles o tipo de experiência que fará com que descubram a verdade por si mesmos”, ou seja, realizan​-
do a contestação de maneira indireta, por meio da experiência.
A contestação na terapia cognitiva objetiva desconstruir concepções prévias disfuncionais do
paciente por meio da reflexão – cogitando novas hipóteses, sugerindo outras explicações, indicando

18
ângulos de análise ainda não percebidos – e da testagem das mesmas na realidade, visando o aper​-
feiçoamento de determinada compreensão dos acontecimentos, dando lugar para uma visão renovada,
ampla, realista, flexível e funcional capaz de aliviar os sintomas. Judith Beck (1997, p. 30) enfatiza
que “em termos cognitivos, quando pensamentos disfuncionais são sujeitos à reflexão racio​nal,
nossas emoções em geral mudam”.
Nesse sentido, Leahy (2006, p. 17) também comenta:

Os terapeutas cognitivos engendram nos pacientes um pensa​mentos científico e racional ao pedir que
sejam examinados os pressupostos que levam a estados depressivos ou ansiosos [...] Os terapeutas
ajudam os pacientes a examinar a validade de certas afirmações, coletando evidências que as
contradizem.

Importa destacar que as contestações no universo da terapia cogni​tiva podem ser empregadas
em quatro “direções”: do terapeuta para con​sigo mesmo; do terapeuta para com o paciente; do
paciente para consigo mesmo; e do paciente para o terapeuta.
Os focos principais deste trabalho, no entanto, é aprofundar a con​tes​tação realizada do
terapeuta para o paciente e do paciente consigo mesmo.

5. TÉCNICAS

A terapia cognitiva disponibiliza um leque diversificado de técnicas que podem ser utilizadas
para contestar pensamentos e crenças disfun​cionais, como veremos ao longo deste trabalho, segundo
a ótica de vários autores que tratam do tema na prática terapêutica. Segundo Beck, Rush, Shaw e
Emery (1997, p. 5):

As técnicas terapêuticas são projetadas para identificar, testar a realidade e corrigir as conceituações
distorcidas e as crenças disfuncionais (esquemas) por trás destas cognições. Reavalian​do e corrigindo
seu pensamento, o paciente aprende a dominar problemas e situações que ele previamente considerou
insupe​rá​veis. O terapeuta cognitivo ajuda o paciente a pensar e agir de forma mais realística e
adaptativa em relação aos seus pro​ble​mas psicológicos e, deste modo, reduz os sintomas [...] Diver​sas
técnicas verbais são usadas para explorar a lógica subjacente e a base de cognições e pressuposições
específicas [...] As cognições e pressuposições subjacentes são discutidas e exami​na​das em relação à
lógica, validade, adaptatividade e aumento de comportamento positivo versus manutenção da patologia.

Nesse sentido, a terapia cognitiva demonstra e enfatiza o poder dos pensamentos mais
realistas, até onde se consegue conhecer a realidade, oferecendo métodos para “testar os próprios
pensamentos em compa​ração com a realidade”. Ninguém sabe tudo ou possui todas as respostas, nem
o terapeuta nem o paciente, ou seja, não existe um “manual de soluções ou respostas prontas”. Leahy
(2006, p. 17) afirma que a “reali​dade” é um sistema aberto:

[...] o modelo cognitivo é construtivista, na extensão em que o “conhecedor” – aqui, o terapeuta e o


paciente – jamais terá todos os fatos. Não existe nenhum teste completo das infor​mações. Conhecer, no
mundo empírico, é mais uma afirma​ção de probabilidades do que de certezas. As previsões baseiam-se
em informações incompletas – sempre. O reconhecimento de que o pensamento inferencial é sempre
incompleto, indetermi​nado e probabilístico é um componente essencial da pers​pecti​va do terapeuta

19
cognitivo.

Kelly (apud Fadiman e Frager, 2004, p. 349) contribui:

O que achamos que sabemos se ancora somente em nossas suposições, não nos alicerces da verdade
propriamente dita, e o mundo que procuramos compreender permanece sempre nos horizontes de nossos
pensamentos. Entender esse princípio plenamente é aceitar que tudo que acreditamos existir nos parece
como parece em função de nossas presentes cons​truções. Assim, até as coisas mais óbvias deste
mundo estão abertas à reconstrução no futuro.

As técnicas cognitivas se diversificam de acordo com os objetivos específicos de


reestruturação. Neste contexto, Judith Beck (1997) comenta que, após confirmar a crença mais
intensa a ser modificada, o terapeuta “formula em seu próprio raciocínio uma nova crença mais
funcional e menos rígida. Essa nova crença deve ser tematicamente relacionada à crença disfuncional
anterior, e o terapeuta deve acreditar resultar tal substituição em uma maior satisfação para o
paciente” (p. 160).
Na terapia do esquema, segundo Young, Klosko e Weishaar (2008, p. 93), a fase de mudança
envolve estratégias visando modificar esque​mas, ajudando o paciente a contestar os próprios
pensamentos e crenças disfuncionais de maneira mais saudável.

O terapeuta auxilia o paciente a construir uma argumentação lógica e racional contra o esquema. Em
geral, os pacientes não questionaram seus esquemas, e sim os aceitaram com algo dado, como verdades.
Em seus mundos psicológicos internos, os esquemas reinaram incontestes, e não houve modo adulto
saudável para se contrapor aos mesmos. Estratégias cognitivas ajudam os pacientes a distanciar-se do
esquema e a avaliar sua veracidade. Os pacientes percebem que existe uma verdade fora do esquema e
que podem combatê-lo com uma verdade mais objetiva e empiricamente consistente.

O terapeuta terá que identificar os esquemas do paciente e poderá tratá-los com diferentes
técnicas cognitivas e comportamentais. Para Young (2003, p. 51), “todas as vezes que vemos o
esquema surgindo durante a sessão, o apontamos e ajudamos o paciente a contestá-lo”. Mas as
contestações não se restringem somente ao momento da sessão. O autor diz que “sempre que ele
surgir fora da sessão, ensinamos o paciente a escrever o que aconteceu e a dar uma resposta
racional”.

As técnicas cognitivas destinadas a desafiar as crenças disfun​cio​nais do paciente, amplamente


apresentadas na bibliografia especializada sobre terapia cognitiva, buscam demonstrar para o
paciente, por exemplo, os seguintes aspectos listados a seguir, em contraposição às distorções
cognitivas mais comuns:

• As outras pessoas podem estar pensando algo diferente do que se presume.


• O futuro da própria vida ou de uma situação em particular pode não ser tão desfavorável
quanto se presume.
• Um determinado acontecimento potencialmente desconfortável pode ser plenamente
suportável.
• Qualquer pessoa possui diferentes facetas maduras e imaturas coexistindo em sua
personalidade, ou seja, ninguém é perfeito.

20
• Os fatos da vida em geral, mesmo aqueles relativamente aver​sivos, possuem aspectos
positivos a serem levados em consideração.
• Os fenômenos da existência humana, embora possam conter características comuns para
muitas pessoas, possuem elementos especí​fi​cos e únicos a serem levados em consideração.
• A responsabilidade pela maioria dos acontecimentos da vida é dividida entre as pessoas
participantes e não são culpa somente de alguém.
• Cada pessoa possui um histórico de vida particular e aproveita as oportunidades de
maneira diferente, em contextos diferentes, gerando níveis de desempenho diferentes.
• Os acontecimentos do passado tiveram seu contexto próprio e são importantes para
tirarmos lições deles, porém é no presente que agimos.
• A vida e o mundo oferecem imensuráveis possibilidades de interpretação e desfechos para
os acontecimentos.
• Refletir, escolher e agir num dado sentido atribuído para a vida é uma opção de cada um
no presente, inevitavelmente.
• A maneira mais vantajosa de interpretar a realidade é por meio dos atributos da
racionalidade e não das emoções.
• Qualquer conclusão alcançada, por mais convicto que estejamos dela, pode ser livremente
aperfeiçoada.
• A vida é feita de incertezas, sendo impossível controlar tudo e todos.
• Um pensamento negativo não é, necessariamente, verdadeiro.
• Os fatos ruins que ocorrem conosco não refletem, necessaria​mente, o que somos enquanto
pessoa.
• O fracasso num desempenho é humano e inevitável para todos.
• Eventuais emoções desagradáveis possuem um papel impor​tan​te no desenvolvimento
humano.
• Nem tudo tem uma solução imediata e definitiva.

Num outro sentido, McMullin (apud Abreu e cols., 2003, p. 64) chama a atenção para as
contestações construídas a partir da própria visão de mundo do paciente:

O cliente deve encontrar seu repertório específico de contesta​ções já que, sendo argumentos presentes
na sua própria orga​nização cognitiva, certamente elas serão mais efetivas. É pre​ciso que se procure
afirmações alternativas baseadas em evi​dên​cias concretas: “É impossível estar sempre certo”, “Não se
pode ser querido por todos”, etc. Cartões escritos podem fun​cio​nar como lembretes das afirmações a
serem usadas em mo​men​tos de ativação da crença irracional.

Podemos aplicar diferentes técnicas de contestação objetivando desa​fiar o mesmo


pensamento, crença ou distorção cognitiva; assim como a mesma técnica pode ser útil para desafiar
diferentes pensamentos, cren​ças ou distorções cognitivas. Sobre isto, Leahy (2006, p. 20) inclusive
recomenda que o terapeuta diversifique as técnicas utilizadas: “A vanta​gem na utilização de uma
variedade de técnicas para testar ou contestar o mesmo pensamento negativo é que o paciente terá
técnicas alternativas para uso futuro, caso sua contestação inicial não funcione”.
Por outro lado, nem toda técnica com o objetivo de contestar gera o efeito da contestação;
assim como nem todo efeito de contestação é provocado propositalmente por uma técnica. Neste

21
caso, é importante obser​var o perfil do paciente. Sobre este aspecto, Judith Beck (1997, p. 24) faz
suas considerações:

A terapia, no entanto, varia consideravelmente de acordo com o paciente individual, a natureza de suas
dificuldades, suas metas, sua habilidade de formar um vínculo terapêutico forte, sua motivação para
mudar, sua experiência prévia com terapia e suas preferências de tratamento. A ênfase no tratamento
de​pen​de do transtorno(s) particular do paciente.

As contestações também podem ser realizadas através da comuni​cação não-verbal que sugere
ao paciente rever certa interpretação. Dentro da subjetividade da comunicação interpessoal, elas
podem ser mais diretas (objetiva e explicitamente) ou indiretas. Um olhar e até mesmo o silêncio
podem ser contestadores em determinada ocasião. Depende do objetivo da intervenção e seus
efeitos. Por exemplo, uma simples expressão facial do terapeuta pode sinalizar o seguinte
questionamento: “você tem certeza disto que acabou de afirmar?”

Questionamento Socrático

A tarefa de contestar as crenças dependerá fundamentalmente da colaboração do terapeuta que


orientará, principalmente através do ques​tio​na​mento socrático, a análise das ideias do paciente, algo
que ainda não é realizado em nível satisfatório pelo paciente sozinho.

Uma série de perguntas cuidadosamente fraseadas, feitas no momento certo, pode ajudar o paciente a
isolar e considerar cuidadosamente um tópico, decisão ou noção específica. Uma série de questões pode
abrir o pensamento do paciente em torno de um tópico específico e por meio disso permitir-lhe consi​-
derar outras informações e experiências – quer recentes, quer passadas. A curiosidade do paciente pode
ser estimulada por uma série de perguntas. Suas visões rigidamente firmadas tornam-se hipóteses
experimentais. (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997, p. 52)

É importante destacar que o questionamento socrático pode ser utilizado tanto para identificar
pensamentos automáticos e crenças irracio​nais quanto para contestá-los. Beck, Rush, Shaw e Emery
(1997, p. 50) afirmam que “a maior parte das verbalizações do terapeuta estão estru​tu​ra​das na forma
de perguntas”, e que estas são úteis para diferentes fun​ções, sendo consideradas um instrumento
terapêutico fundamental.

A utilização de perguntas serve a uma ampla variedade de funções intrínsecas à terapia cognitiva. De
fato, uma única per​gunta pode simultaneamente tentar atrair a atenção do pacien​te para uma área
particular, avaliar suas respostas a este novo tópico de levantamento, obter informações diretas
referentes a este problema, gerar métodos para resolver problemas que foram considerados como
insolúveis e, por fim, levantar dúvi​das na mente do paciente sobre conclusões previamente distor​cidas.
(Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997, p. 50)

Eis alguns exemplos destes questionamentos (Rangé, 2001, p. 280):

• Quais as evidências que apóiam esta ideia?


• Quais as evidências que vão contra esta ideia?
• Existe uma explicação alternativa?

22
• O que de pior pode acontecer? Você poderia superar isto?
• O que de melhor poderia acontecer?
• Qual o resultado mais realista?

Por meio dos questionamentos, o terapeuta cognitivo precisa ter a habilidade necessária para
ajudar o paciente a identificar os erros de inter​pretação e, mais importante ainda, indicar-lhe quais
pensamentos são mais funcionais.

Por meio do diálogo e do questionamento, o terapeuta auxilia a pessoa a perceber em que ponto seus
pensamentos e crenças estão distorcidos e como isto está relacionado ao mal-estar. O objetivo é ajudar
a descobrir a verdade sobre si mesmo, quem eu sou verdadeiramente, o que está sendo encoberto por
essas crenças irrealistas, injustas e distorcidas. (Rangé, 2001, p. 282)

Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 23) contribuem:

O uso de perguntas é uma parte importante da terapia cogni​tiva. Pode ser fácil para o terapeuta apontar
que o paciente distorceu suas experiências, que há um pensamento interve​niente entre um evento e uma
experiência emocional. Porém pouco progresso pode ocorrer. É importante que o terapeuta faça
perguntas que elucidem a lógica fechada do paciente utili​zando uma abordagem indutiva.

Friedberg e McClure (2004) apontam pelo menos três tipos de ques​tionamentos socráticos: os
lógicos, que desafiam as crenças ilógicas e o raciocínio causal; os empíricos, que pedem dados da
realidade; e os funcionais, que enfatizam custos e benefícios.
É importante evitar questionar o paciente muito frequentemente, pois pode “viciá-lo” em
responder, predispondo a ele perder a naturali​dade ou espontaneidade, bem como a fluência verbal.
Tal procedimento pode também criar um vínculo de dependência, desaconselhável na tera​pia
cognitiva.

[...] o questionamento aberto, às vezes, deixa o paciente na posição defensiva de tentar adivinhar o que
o terapeuta “espera” como resposta. O momento de fazer as perguntas deve ser cuidadosamente
considerado e elas devem ser frasea​das de modo a ajudar o paciente a reconhecer e considerar suas
noções reflexivamente – a pesar seus pensamentos com objetividade. (Beck, Rush, Shaw e Emery,
1997, p. 53)

Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 298) propõem a Lista de Verificação de Competência
para Terapeutas Cognitivos, comonze itens para avaliação específica da prática de questionamentos,
onde o terapeuta analisado deve assinalar “apropriadamente incluído ( √ )”, “inapro​pria​da​men​te
omitido (–)”, “opcionalmente omitido (0)” e “não aplicável (NA)”. Eis os itens:

___ a. Terapeuta habilmente combinou perguntas para extrair da​dos referentes a sintomas,
situação de vida, experiências atuais, pen​as​men​tos, sentimentos e experiências passadas (quando
aplicável).
___ b. Usou perguntas abertas apropriadamente.
___ c. Uso mínimo de perguntas requerendo respostas sim ou não.
___ d. Evitou questionamento “fogo rápido”.
___ e. Intercalou perguntas com afirmações reflexivas, exemplos ilus​trativos ou resumos

23
breves.
___ f. Usou perguntas para mostrar incongruências ou inconsis​tên​cias nas conclusões do
paciente sem rebaixar o paciente.
___ g. Usou perguntas para ajudar o paciente a explorar as diversas facetas do problema.
___ h. Usou perguntas para examinar as conclusões e pressu​posi​ções arbitrárias do
paciente.
___ i. Usou perguntas para eliciar modos alternativos de resolver um problema.
___ j. Usou perguntas para considerar explicações alternativas.
___ k. Usou perguntas para prever consequências positivas e negativas de uma ação
proposta (por exemplo, fazer tarefas de casa, demitir-se de um emprego ou ter um confronto pessoal).

Com o passar das sessões, tal procedimento de contestar será ensi​na​​do/treinado para que o
próprio paciente teste a validade dos seus pensa​men​tos por meio dos questionamentos
(metacognição). Um dos principais obje​tivos na terapia cognitiva é treinar o paciente para que ele
adquira a ca​pacidade de efetuar, por si, as autocontestações. O sexto princípio da te​ra​pia cognitiva
refere-se exatamente ao seu papel educativo ao ensinar o paci​en​te a desempenhar o próprio
terapeuta. Segundo Judith Beck (1997, p. 23):

Um benefício adicional deste procedimento indutivo é que o paciente pode praticar este comportamento
de autoquestiona​men​to posteriormente, quando está sem o terapeuta. Ou seja, ele “ouve” a voz do
terapeuta fazendo perguntas como “Quais as evidências?” “Qual é a coisa mais adaptativa que eu posso
fazer agora?” Além disso, aprendendo a reconhecer e testar suas hipóteses, o paciente desenvolve um
empiricismo sau​dá​vel que serve como uma salvaguarda contra formação de conclu​sões irrealistas.

Para Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 5)

Um dos componentes poderosos do modelo de aprendizagem da psicoterapia é que o paciente começa a


incorporar muitas das técnicas terapêuticas do terapeuta. Por exemplo, os pacien​tes frequentemente
percebem-se, espontaneamente, assumindo o papel do terapeuta, questionando algumas de suas conclu​-
sões ou predições.

Na visão de Leahy (2006, p. 138), quando o paciente evita as situa​ções que ativam crenças
disfuncionais ele perde uma grande oportu​nidade terapêutica consigo mesmo. O autor nos diz que,
por exemplo, “você su​pôs que ninguém gostaria de você, então não interage com as pessoas ou se
afasta delas tão logo se sente pouco à vontade. Como resultado, você teve poucas oportunidades de
contestar os pensamentos negativos”.

Debate

Na TREC – terapia racional-emotivo-comportalmental, proposta por Albert Ellis, o


funcionamento cognitivo está baseado no modelo “A-B-C”, onde “A” é o acontecimento ativador,
“B” a crença pessoal sobre o acontecimento e “C” as consequências emocionais e comportamentais.
Para o autor, a etapa de tentar mudar as crenças irracionais do cliente é o verdadeiro trabalho
terapêutico e ocorre no “D”, de Debater:

24
Debater significa combater, desafiar o sistema de crenças irra​cionais do cliente e portanto, é um
processo lógico-empí​rico no qual o paciente é ajudado a parar e pensar para poder inter​nalizar uma nova
filosofia que envolva uma solução elegante. Isso será feito por questionamentos de natureza cognitiva,
ima​ginária e/ou comportamental. (Rangé, 2001, p. 43)

A TREC consiste num tratamento essencialmente verbal, sendo propostas diferentes


estratégias de debate objetivando desafiar o sistema de crenças irracionais do cliente. Para Campos
(1999), o terapeuta se esforça para que “o cliente avalie de forma crítica e científica suas crenças
racionais e irracionais. É a etapa em que o cliente passa a perceber seu funcionamento cognitivo e
detecta as bases de sua irracionalidade”. Os argumentos são considerados importantes meios de
persuasão, capazes de provocar e manter mudanças cognitivas significativas. As perguntas, espe​cial​-
mente empregando “por ques”, são vistas como os mais úteis instru​men​tos nesse processo, pois
incitam o cliente a procurar explicações ló​gi​cas para justificar suas crenças.

A TREC, por sua vez, apóia-se no método científico e na obser​va​ção empírica. Na prática da TREC,
para cada crença expressa por uma pessoa uma pergunta adequada seria “Quais são as evidências de
que esta crença é verdadeira?”. Tenta-se fazer dos clientes melhores cientistas de modo que eles
possam ad​qui​rir informações corretas, usar as evidências logicamente e cons​truir crenças solidamente
embasadas. (Rangé, 2001, p. 35)

As principais perguntas de combate lógico dividem-se em 3 grupos (Walen, Di Giuseppe e


Dryden apud Rangé, 2001):

1. Racionalidade: Perguntas para testar a racionalidade, por exem​plo: “Isso é uma lógica
correta? Isso é verdade? Por que não? Por que é assim? Por que essa é uma informação não-
verdadeira? Por que tem que ser assim? Por que você deve?” (p. 44)
2. Realidade: Perguntas para testar a realidade, por exemplo: “Qual é a prova? Onde está a
evidência? Que aconteceria se...? Você pode aguentar? Vamos ser cientistas: o que os dados
mostram? Por que ela deve fazer isso? Alguém tem que fazer? Você pode se sentir feliz mesmo se não
conseguir o que quer?” (p. 44)
3. Valores: Perguntas para testar os valores hedônicos, por exem​plo: “Na medida em que
você acredita nisso, como você se sente? ‘Eu devo conseguir o que quer que seja.’ Aonde esse
comando pode levar você? Vale a pena o risco? Como você se sente quando pensa desse jeito? E
aonde isso leva você? Que acontece quando você pensa assim? Por que você mantém uma crença que
lhe causa tanto sofrimento?” (p. 45)

Além dos 3 grupos de questionamentos, a TREC apresenta outras 5 estratégias de debate


cognitivo (Rangé, 2001, p. 45):

• Didática: Uso de miniaulas, analogias e parábolas.


• Humor: Uso de abordagens com efeito humorístico.
• Modelação Vicária: Indicar que muitas pessoas passam pela mesma situação, sem
manifestar reações emocionais exageradas pois não possuem as mesmas crenças irracionais.
• Imagem: Imaginar-se passando pela situação negativa procurando modificar os

25
pensamentos e sentimentos vividos, ou comportando-se de maneira positiva e adequada.
• Comportamental: Exercitar ações, no mundo real, de modo oposto às crenças irracionais.

Técnicas de Oposição

A contestação gera relações de oposição entre a ideia irracional manifesta e o novo modo de
pensar, mais racional e apropriado, para com​preender/lidar com a situação em foco, evidenciando
incompatibilida​des e dissonâncias cognitivas.
Quando colocamos algo em dúvida, pressupomos a possibilidade da existência de um erro,
falta ou insuficiência na constituição deste objeto. Nesse sentido, a contestação assume o caráter
opositivo exatamen​te porque desafia a visão de uma realidade entendida equivocadamente, por parte
do paciente, como indefectível, completa, perfeita ou definitiva.

Na visão de McMullin (2005), a contestação das crenças e pensa​mentos irracionais pode ser
realizada através de diferentes técnicas de oposição realizadas pelo próprio paciente com a ajuda do
terapeuta, que consistem em argumentar persistentemente contra a ideia irracional a fim de
enfraquecê-la. O autor divide as técnicas de oposição em pelo menos três tipos básicas: intensas;
leves; e objetivas.

1. Intensas: Identificar o maior número possível de palavras, frases, sentenças ou


posicionamentos filosóficos fortes que se oponham a cada pensamento irracional. De acordo com o
autor, “a oposição intensa ideal é aquela que traz consigo uma hierarquia de valores, percepções e
experiên​cias, e expulsa o pensamento irracional na direção oposta” (p. 73).
2. Leves: Técnica de relaxamento e tranquilização, em muitos casos mais eficazes no
desafio às crenças distorcidas, reduzindo a exci​ta​ção emocional. “Em estado de relaxamento, a
crença irracional é desa​fiada tanto pelo pensamento quanto pela emoção, provendo assim dois
elementos de tratamento ativo.” (p. 102)
3. Objetivas: Requer a atuação do terapeuta na argumentação que possa persuadir o
paciente a seguir o mesmo estilo. “A oposição objetiva postula que as crenças do paciente podem ser
modificadas se o terapeuta ajudar-lhe a angariar mais evidências contrárias à crença do que aquelas
evidências com as quais o paciente a apóia.” (p. 119)

Ainda segundo o mesmo autor, as técnicas de oposição empre​gadas devem variar e serem
mais ou menos eficazes de acordo com o perfil de cada paciente e as crenças manifestas.

Pacientes deprimidos, particularmente, podem precisar de uma abordagem emocional mais suave para
reforçar seus oposi​to​res, enquanto pacientes com transtorno de pânico frequente​mente beneficiam-se
com a estratégia de ataque da oposição intensa. A análise objetiva das crenças do paciente é uma abor​-
dagem terapêutica cristalina e elegante. Nossa experiência nos mostra, no entanto, que muitos clientes
não valorizam a lógica na mesma medida do terapeuta. Para tais pacientes é neces​sário suplementar ou
substituir a oposição objetiva. (McMullin, 2005, p. 119)

Outras Técnicas

26
Leahy (2006, p. 53) apresenta pelo menos 9 técnicas de avaliação e contestação dos
pensamentos:

1. Definição dos termos: Também chamada de “técnica semân​tica”, é usada para saber o
significado do termo ou conceito da crença (por exemplo, fracasso) na visão do paciente.
2. Análise de custo-benefício: Avaliação das consequências posi​ti​vas e negativas da crença
(custos versus benefícios; vantagens versus des​van​tagens), oferecendo a opção ao paciente de
escolher, posterior​men​te, por mantê-la ou substitui-la.
3. Exame das evidências: Avaliação das evidências contrárias e favoráveis da validade das
crenças negativas, comparando-as e avaliando-as em termos psicológicos, ou seja, o quanto cada
evidência convencem o paciente para um lado ou outro.
4. Exame da qualidade das evidências: Avaliar o quão boa são as evidências para o
paciente, considerando a consistência, validade, lógica e os fatos capazes de comprová-las
efetivamente, como se estivesse diante de um júri.
5. Advogado de defesa: Imaginar-se num julgamento onde os pensamentos automáticos são
representados pela acusação, tendo que o paciente (réu), na posição de advogado de defesa, atacar as
evidências e a lógica dos argumentos do acusador.
6. Dramatização de ambos os lados do pensamento: Paciente e terapeuta alternam-se na
posição racional versus a postura negativa, ten​tan​do convencer-se mutuamente e revezando-se no
apoio a cada papel, com o paciente identificando respostas e contestações mais úteis.
7. Distinção entre comportamentos e pessoas: Distinguir entre o comportamento errado e a
pessoa por inteiro, procurando isolar enganos ou erros e separá-los de um julgamento global de si
mesmo, sem persona​lização e hipergeneralizações.
8. Exame das variações do comportamento em diferentes situações: Focalizar para além
de determinado momento, considerando mais os fa​to​res situacionais que levaram ao comportamento e
compreender seu con​texto sem rotular os indivíduos (pensamento em termos de tudo-ou-nada).
9. Uso do comportamento para resolver o pensamento negativo: Usar a ação para iniciar a
mudança, colocando o foco na solução ou acei​ta​ção do problema, procurando o que pode ser feito
para melhorar habi​li​da​des (sociais, de comunicação, relacionadas ao trabalho), resolver proble​mas
ou mudar a situação.

Dentre as inúmeras técnicas apresentadas por Leahy (2006, p. 179), destacamos outros três
exemplos de como realizar as contestações, neste caso, de pensamentos ilógicos:

1. Exame das contradições internas: O terapeuta questiona o paciente se ele possui dois
pensamentos contraditórios, por exemplo, “Eu deveria ser perfeita, mas não quero me criticar” ou
“Eu gostaria de conhecer tantas pessoas quanto possível, mas nunca quero ser rejeitado”.
2. Redução ad absurdum: Levar a lógica do argumento a um nível absurdo, por exemplo, “Se
estou solteira, então não sou digna de amor”, sendo assim, “Todas as pessoas casadas foram solteiras
outrora; portanto, todas são indignas de amor”.
3. Contestação da autocrítica recursiva: Ajudar o paciente a ver se não está preso num
círculo de ser criticado por ser autocrítico, por exemplo, “Acho que sou um fracasso porque estou

27
deprimido, e estou deprimido porque acho que sou um fracasso”.

28
Leahy (2006, p. 280) ainda apresenta um formulário para contes​tação dos esquemas pessoais:

Técnica Resposta
Identifique o esquema pessoal
Defina seu esquema
Grau de crédito no esquema (0 a 100%)
Emoções desencadeadas pelo esquema
Que situações desencadeiam o esquema?
Custo e benefício do esquema Custo
Benefício
Evidências contra e a favor A favor
Contra
Use a técnica do duplo-padrão. Você aplicaria
isso a mais alguém?
Por que este esquema é irreal?
Imagine-se em um continuum – não em termos
de tudo-ou-nada (por exemplo, avalie-se e os
outros em uma escala de 0 a 100%)
Atue contra o esquema (O que você pode fazer
que se opõe a ele?)
Reavalie a crença no esquema

Não-contestação

Na prática das contestações, o objetivo, obviamente, não é opor-se a pensamentos que se


mostrem verdadeiros. Leahy (2006, p. 27) destaca que os pensamentos causadores de perturbações
podem ser verdadeiros, falsos ou ter diferentes níveis de validade.

Só porque acredito que algo seja verdadeiro, isso não significa que seja verdade. Pensamentos são
hipóteses, descrições, pers​pec​tivas e até mesmo adivinhações. Eles podem revelar-se ver​da​deiros ou
falsos. Os pacientes precisam aprender a identi​fi​car seus pensamentos e depois examinar os fatos.

Além disso, Leahy (2006) destaca outras duas condições que não são contestáveis:

1. Pensamentos expressos como fatos: Por não serem testáveis, não são passíveis de
refutação. “Se não existe maneira de refutar uma afir​ma​ção, então ela não tem significado. Eis um
exemplo de afirmação que não é passível de refutação: 'Não importa o que eu faça, não tenho valor'.”
(p. 136). A própria afirmação já descarta todas as evidências contrárias, sendo o mesmo que dizer
“não tenho valor e nada do que você disser vai mudar essa crença”.
2. Sentimentos: Não contestamos sentimentos e sim os pensa​men​tos que originam os
sentimentos.

Não teria sentido dizer a um paciente: “Você, na verdade, não está ansioso”. Isso seria equivalente a
dizer, em essência, que o ferro quente não feriu realmente o paciente quando ele excla​mou Ai!. “Ai!” é
o relato da sensação – exatamente como as palavras “Estou feliz” ou “Estou triste” são relatos de senti​-

29
mentos. (p. 25)

Judith Beck (1997, p. 105) também faz suas considerações quanto às emoções do paciente:
“Embora o terapeuta possa reconhecer a exces​sividade ou inadequação de uma emoção, ele se
abstém de rotulá-la como tal, especialmente no início da terapia”. A autora recomenda, ao contrário,
que o terapeuta reconheça e empatize “com o como o paciente se sente. Ele não desafia ou contesta
as emoções do paciente, mas, antes, focaliza em avaliar os pensamentos e crenças disfuncionais por
trás da sua aflição, a fim de reduzir a disforia”.

Dois autores consideram a função das emoções no momento de analisar as situações


perturbadoras para o paciente:

O terapeuta não analisa todas as situações nas quais o paciente se sente disfórico; a terapia cognitiva
visa reduzir a aflição emocional que está relacionada a interpretações errôneas de uma situação.
Emoções negativas ‘normais’ são tanto uma parte da riqueza da vida quanto emoções positivas e servem
a uma função tão importante quanto a dor física, nos alertando para um problema potencial que pode
precisar ser abordado. (Beck, J.; 1997, p. 105)

Pressão, estresse e sofrimento não são sempre necessariamente ruins. Mostram aos pacientes que há
algo errado, alguma coisa está doendo. É preciso que os pacientes identifiquem de onde vem a dor, para
que possam tratá-la, e não apenas aplacá-la. (McMullin, 2005, p. 82)

Por fim, Judith Beck (1997, p. 156) alerta os terapeutas para não desperdiçarem tempo e
esforço trabalhando sobre crenças tangenciais ou naquelas crenças menos fortalecidas pelo paciente.

Eficácia

Leahy (2006, p. 33) aponta a variação da força da crença como um indicativo de sua possível
modificação e, nesse sentido, também como um instrumento de avaliação sobre o quanto esta crença
já foi superada.

Presumivelmente, o foco e a preocupação do paciente em rela​ção à crença irão variar de acordo com o
momento do dia, os acontecimentos e outros pensamentos. Essa variação reforça ainda mais a ideia de
que uma crença fortemente mantida pode ser modificada. Além disso, esta crença pode variar du​ran​te a
sessão.

A avaliação de eficácia das contestações pode ser realizada por meio da checagem do quanto
o paciente ainda enfatiza determinada crença. Sobre isso, Leahy (2006, p. 33) observa:

Periodicamente, durante a sessão, conforme paciente e tera​peu​ta se dedicam a contestar crenças e a


planejar comporta​men​tos, o terapeuta pode perguntar ao paciente quão forte está a crença naqueles
diferentes momentos. Não é raro o paci​en​te começar a sessão acreditando 90% em uma crença e aca​-
bar a mesma ses​são acreditando 40%.

Judith Beck (1997, p. 122) também indica outros parâmetros, nos dizendo que “Quão intensa a
sua emoção é antes e depois do questiona​men​to socrático, de modo que ele pode avaliar quão bem

30
esta intervenção funcionou”. E complementa:

Usualmente não é possível e nem necessariamente desejável reduzir o grau de uma crença a 0%. Saber
quando parar de trabalhar sobre uma crença é, portanto, uma questão de julga​mento. Em geral, uma
crença foi suficientemente atenuada quando o paciente a endossa de forma inferior a de 30% de quando
ele tende a continuar a modificar seu comportamento disfuncional, apesar de ainda agarrar-se a um
resquício dessa crença. (p. 160)

6. EXEMPLOS DE CONTESTAÇÕES

Muitas manifestações humanas estão sujeitas à contestação como, por exemplo, valores
pessoais, escolhas e até mesmo determinados obje​ti​vos do paciente ao aderir a um tratamento
psicológico. A proposta desta pes​quisa, no entanto, é apresentar as contestações aplicadas às cren​ças
dis​funcionais, também denominadas de errôneas, irracionais ou desa​dap​ta​​tivas, no contexto da
terapia cognitiva.

Aqui reproduzimos as contestações de Ellis (apud Rangé, 2001, p. 40) às três crenças
irracionais consideradas pelo autor como as mais im​por​tantes e comuns:

Crença: Para mim, é absolutamente necessário ser amado e apro​vado pelas pessoas que
me são importantes.

Contestações:
1. É possível que, mesmo que você consiga 100 vezes amor e aprovação em 100 tentativas,
na vez seguinte alguém lhe negue isso?
2. É possível que, mesmo que você tenha obtido amor e apro​vação, isto possa não ser
suficiente, pois acabarão surgindo preocupações sobre o quanto você foi aprovado e amado, se ainda
o consegue e até quando o conseguirá?
3. É possível que, pelos próprios preconceitos ou tendenciosidades do outro, você possa só
receber indiferença ou reprovação, ao invés da​quilo que deseja?
4. É possível que o gasto de energia para tentar agradar todas as pessoas faça com que reste
muito pouca energia para seus outros obje​ti​vos na vida?
5. É possível que sua busca compulsiva de amor e aprovação aca​be gerando um
comportamento inseguro, que conduza mais à perda de apro​vação e respeito do que ao seu ganho?
6. É possível que amar alguém, que é algo prazeroso e absorvente, possa ficar inibido e
impedido de se expandir pela busca incessante de ser amado?
7. Não seria mais racional acreditar que:
• Você deseja amor, e não precisa dele.
• É muito mais prazeroso ser aprovado e amado pelas próprias realizações. Elas é que
sustentam uma forte autoestima: é por nossas con​quis​tas, principalmente as mais difíceis, que
gostamos cada vez mais de nós mesmos. A necessidade (infantil) de ser amado incondicionalmente
sustenta uma falsa e frágil autoestima, pois ela depende sempre de novas provas de amor e

31
aprovação em cada momento. Uma autoestima ver​da​deira e forte deriva de um comprometimento
determinado em seguir os próprios objetivos, não de aprovações alheias.
• É desagradável não receber amor ou aprovação de alguém im​portante, mas isso é
catastrófico?
• Suas ações devem ser guiadas pelos seus desejos, não pelo de​se​jo dos outros. Afinal, de
quem é a sua vida?
• A melhor forma de ganhar amor é dar amor genuinamente.

II. Crença: Para se ter valor, é necessário ser competente e bem-sucedido em todos os
aspectos da vida.

Contestações:
1. É possível ser competente em todos os aspectos da vida?
Tentar ser competente em alguns aspectos pode se saudável e re​com​pensador (prazer,
dinheiro), mas ter a obrigação de ser extremamente competente é um caminho direto ao medo e à
desvalorização, à ansiedade e à depressão.
2. É possível que uma busca desenfreada pelo sucesso ultrapasse os limites do corpo e
provoque doenças psicossomáticas?
3. É possível que, ao fazer comparações dos seus sucessos com os dos outros, você esteja
sendo guiado (a) por padrões externos, e não pelos seus objetivos pessoais?
Se você pensa que tem que ter sucesso marcante, você não estará apenas se desafiando e
testando suas próprias capacidades; está, invaria​velmente, comparando-se com os outros e tentando
superar os melhores. Assim, você passa a ser guiado (a) pelos outros mais do que por si mesmo (a).
Desse modo, sem se dar conta, estabelece metas inalcançáveis, pois, mesmo que você possa ser
extremamente destacado em algo, sempre po​derá aparecer alguém melhor. Não faz sentido comparar-
se aos outros, uma vez que não se pode ter controle sobre o comportamento dos outros, somente
sobre os próprios.
4. É possível que a concentração na crença de ter que ser com​pe​tente desvie você da meta
principal da vida, que é ser feliz?
Você já pensou que esta se alcança (1) experimentando e des​co​brindo quais são seus desejos
mais gratificantes na vida e (2) gastando corajosamente (não importando o que os outros pensem)
uma boa parte do pouco tempo que dura a sua vida perseguindo isso?
5. É possível que uma preocupação excessiva com a competência acabe resultando em muito
medo de correr riscos, de errar, de falhar em certos empreendimentos e que estes próprios medos
sabotem os objetivos que você quer alcançar pelo efeito negativo que produzem no desem​pe​nho?
6. Não seria mais racional acreditar que:
• É melhor tentar fazer mais do que “se matar” para tentar fazer bem, assim como é melhor
focalizar-se no processo mais do que no re​sul​ta​do.
• Ao tentar fazer algo, é melhor fazer pelo prazer de fazer bem-feito mais do que para
agradar alguém.
• Uma coisa é tentar fazer bem alguma coisa pela satisfação que isso dá; outra é tentar fazer
perfeitamente bem. Uma coisa é tentar o seu melhor; outra é tentar ser melhor do que os outros.
• Os esforços valem pela realização em si ou pela realização com a satisfação que ela traz?

32
• Os erros, mais do que algo para se recriminar, são muito vali​osos, pois é por meio deles
que se aprende. Aceite a necessidade de ter que praticar muito se você quiser ter sucesso em alguma
coisa, a neces​sidade de se forçar a fazer as coisas que você tem medo de fazer e o fato de que os
seres humanos são limitados, e você, particularmente, tem suas limitações especificas.

III. Crença: É terrível e catastrófico quando as coisas não acon​tecem do jeito que se quer.

Contestações:
1. Não há motivos para que as coisas devam ser diferentes do que são, não importando o
quanto elas sejam insatisfatórias ou injustas. É satisfatório quando as coisas acontecem do jeito que
desejamos, mas isso não é necessário ou obrigatório. A ideia de um mundo justo é apenas um ideal
social.
2. Sentir-se inconsolável frente a situações adversas não ajuda a transformar as coisas. O
contrário é o mais provável: quanto mais afetada pelas circunstâncias adversas, mais ineficiente
torna-se uma pessoa para tentar reverter as coisas e alcançar o que deseja.
3. Quando as coisas não são da forma que se quer, deve-se fazer o máximo para mudá-las;
porém quando isso é impossível, momenta​nea​mente ou para sempre, a única atitude saudável é
resignar-se.
4. Mesmo havendo uma grande relação entre frustração e raiva, pode-se constatar que são
nossas interpretações dos acontecimentos que geram a raiva. Uma pessoa só se sente necessariamente
infeliz e irada se ela estabelece suas preferências em termos de necessidades.
5. Ao invés de manter-se desnecessariamente exaltado (a) diante de circunstâncias frustrantes
ou de injustiças reais ou imaginárias, você pode tentar adotar as seguintes atitudes:
• Será que estou exagerando a dimensão negativa daquilo que está me acontecendo? Se
houver realmente aspectos negativos e des​pra​zer não será melhor trabalhar racionalmente no sentido
de alterar as cir​cuns​tâncias e, se for impossível, resignar-me, ao invés de ficar irritado ou me
lamentando da sorte ou da minha infelicidade?
• Será que estou vendo como catastrófico, terrível ou fatal algo que é apenas desagradável?
• De que modo posso aprender com essa experiência frustrante, usá-la como um desafio e
integrá-la de modo útil à minha vida? Será que não estou duplicando meu sofrimento ao me irritar
com a própria irrita​ção?

Beck, Rush, Shaw e Emery (1997) nos apresentam três exemplos de contestações por meio da
contra-argumentação:

Exemplo 1 (p. 195):

Paciente: Eu penso que qualquer um que não esteja preocupado com o que os outros pensam
seria socialmente atrasado e estaria funcio​nando em um nível bastante baixo.
Terapeuta: Quem são as duas pessoas que você mais admira?
P: Meu melhor amigo e meu chefe.
T: Estes dois estão superpreocupados com as opiniões dos outros?
P: Não, eu não acho que nenhum deles se preocupe em absoluto com o que os outros pensem.

33
T: Eles são socialmente atrasados e ineficientes?
P: Eu entendo o que você quer dizer. Ambos têm boas habilidades sociais e funcionam em
níveis elevados.

Exemplo 2 (p. 195):

P: O único modo pelo qual eu alguma vez seria feliz é se eu pudesse ser uma grande escritora.
T: Que nível de qualidade literária você teria que atingir?
P: Eu teria que ser tão boa quanto (a paciente citou uma poetiza).
T: Esta poetiza atingiu grande felicidade?
P: Não, eu acho que não. Ela se matou.

Exemplo 3 (p. 197):

T: Quanto dinheiro você precisaria para ser feliz?


P: Eu não sei, mais do que eu tenho agora.
T: Anteriormente na sua vida você pensou que se você tivesse tanto quanto tem agora você
seria feliz?
P: Provavelmente sim.
T: Sucessos, conquistas, dinheiro, tudo isso é aberto. Não é como pintar uma parede ou
construir uma mesa. Não há ponto final.
P: Mas eu acredito que se eu pudesse conseguir a quantia de di​nhei​ro que eu preciso, eu
ficaria contente.
T: Isso é uma necessidade real? Se você acreditasse que precisa de algo que você realmente
não precisa, você jamais seria capaz de conseguir suficiente disso. Você não pode conseguir o
suficiente de algo que você não precisa, mas acredita que precisa.

Reproduzimos aqui alguns exemplos de intervenções úteis, suge​ridas por Leahy (2006, p.
308-321), para contestar as principais distorções cognitivas:

1. Leitura mental:

“Ele acha que sou um perdedor”.

Você acha que a leitura mental lhe proporciona informações valiosas? Como você poderia provar que seu pensamento está
errado? Ele é testável? Se alguém não gostar de você, o que vai acontecer? Que coisas continuarão sendo as mesmas? Não importa o
que você faça, algumas pessoas não vão gostar de você. Atue contra o pensamento fazendo algo positivo em relação à pessoa que você
pensa não gostar de você.

2. Previsão do futuro:

“Não vou conseguir o emprego”.

Você acha que a preocupação o protege e o prepara? Não importa o que você faça, é sempre possível que algo ruim aconteça.

34
Quantas vezes você fez previsões erradas? Qual é o pior, o melhor e o mais provável desfecho? Descreva em detalhes três desfechos
positivos.

3. Catastrofização:

“Seria terrível se eu fracassasse”.

Quantas vezes você fez previsões erradas? O que exatamente tornaria esse acontecimento terrível e assustador? Será que
outras pessoas pensariam que o que está acontecendo ou aconteceu é terrível e assustador? Por que elas veriam isso de forma diferente
da sua? Mesmo que isso acontecesse, algo positivo poderia de​rivar disso? Poderia levá-lo a aprender algo, abrir-se para novas
oportunidades ou motivá-lo a reexaminar seus valores?

4. Rotulação:

“Sou indesejável”.
“Ele [ou ela] não presta”.

Em vez de focar a pessoa inteira com um rótulo, pense sobre alguns comportamentos diferentes – positivos, negativos e neutros
– que você vê nessa pessoa. De que maneira essa pessoa estava vendo a situação? Ela tinha diferentes pontos de vista, necessidades e
informações? Será que todos iriam rotular essa pessoa de forma tão negativa? Por que não?

5. Desqualificação dos aspectos positivos:

“Essas conquistas foram fáceis, então elas não têm importância”.

Você está usando todas as informações disponíveis ou limitando sua busca a informações que sustentam essa crença? Qual é a
consequência de pensar dessa maneira? E se fizéssemos com que você percebesse que essas coisas não são universais? Qual seria a
consequência? O elogio vai contribuir para o aumento ou diminuição do comportamento positivo?

6. Filtro negativo:

“Veja todas as pessoas que não gostam de mim”.

Você está vendo todas as informações? Há alguma informação que você esteja ignorando? Por quê? Será que todos entendem
as coisas tão negativamente? Por que não? Se você realmente amasse alguém, você levaria em conta seus pontos positivos? Por quê?
Qual a razão para não considerá-los?

7. Hipergeneralização:

“Isto sempre acontece comigo. Parece que fracasso em tudo”.

Você acha que hipergeneralizar é ser realista? Existem situações nas quais o [comportamento, desfecho, emoção, etc.] não
acontece? Experimente ter a men​te alerta em vez de fazer julgamentos. Evite usar palavras tais como sempre e nunca – por exemplo:
“Ele é sempre assim” ou “Nunca irei conseguir”. Foque apenas comportamentos que você possa observar (por exemplo: “Ele estava
diri​gin​do rápido”) e como se sentiu (“Fiquei nervosa”). Mantenha-se no presente. Como se sente?

8. Pensamento dicotômico:

35
“Sou rejeitado por todos”.
“Foi uma total perda de tempo”.

Como seus pensamentos, comportamentos e sentimentos se modificariam se você fosse menos dicotômico no modo de pensar?
Como poderia provar que seu pensamento está errado? Ele é testável? Que comportamentos são piores, me​lhores ou iguais a este?

9. Afirmações do tipo “Deveria”:

“Eu deveria fazer tudo direito. Caso contrário, sou um fracasso”.

Você acha que está defendendo princípios “morais” ou “lutando pelo que é certo”? Examine as evidências a favor de contra a
regra do tipo “deveria”. Existem pessoas que não tem essa regra? O que você pensa dessas pessoas? E se a ideia de todos seguirem as
regras do tipo “deveria” fosse transformada em princí​pio universal, quais seriam as consequências? A moral deve melhorar a dignidade
humana. Suas regras do tipo “deveria” tratam as pessoas de maneira humana e digna? Ou elas objetivam condenar e criticar as
pessoas? Especifique onde exa​ta​mente você aprendeu essa regra. Será que a versão atual é uma per​cepção errônea do que foi
originalmente ensinado ou escrito? Se você real​mente amasse alguém ou se importasse com ele ou ela, você aplicaria essa regra do tipo
“deveria” a essa pessoa? Por quê? Existe alguma razão pela qual você usaria essa regra com algumas pessoas mas não com outras? E
se você fosse menos extremo em sua afir​mação? Por exemplo, em vez de dizer “Eu deveria ser perfeito”, você diria “Eu pre​feria me
sair bem”?

10. Personalização:

“O casamento acabou porque eu fracassei”.

Você acha que levar isso para o lado pessoal o motiva a se esforçar mais ou o protege de alguma maneira? Quais eram as suas
intenções? As intenções da outra pessoa? Você tem certeza de que sua crença sobre as intenções da outra pessoa está correta? Como
poderia saber? Estabeleça a diferença entre autocrítica e autocorreção. Que comportamento você poderia melhorar? O que poderia
apren​der? O que poderia fazer de modo diferente no futuro? E se você perguntasse que problemas precisam ser resolvidos em vez de
personalizar e se culpar? Por exem​plo, se você está passando pelo rompimento de uma relação, em vez de se culpar ou culpar outra
pessoa, por que não pergunta a si mesmo que problemas práticos você precisa equacionar neste exato momento? Quais seriam as
consequências desse novo modo de pensar?

11. Culpa:

“Ela é totalmente culpada pelo modo como me sinto agora”.


“Meus pais causaram todos os meus problemas”.

Culpar os outros o protege de alguma maneira? Examine as evidências a favor e contra a sua afirmação de culpa. Será que
todos veriam isso dessa manei​ra? Por que não? E se fizéssemos da sua crença uma regra universal: ou seja, todos deveriam ser
severamente culpados por esse comportamento. Qual seria a conse​quência?

12. Comparações injustas:

“Ela é mais bem-sucedida do que eu”.


“Sou um fracasso total porque outros se saíram melhor do que”.

36
Examine as evidências a favor e contra seu uso de padrões extremos. Esses padrões realmente o motivam? Você evita certas
coisas em função desses padrões? Eles são realmente realistas? Especificamente, o que significa alguém não “estar à altura do padrão”?
O que exatamente acontecerá? Há pessoas que às vezes não tenham vivido de acordo com o padrão? O que exatamente aconteceu com
elas?

13. Tendência à lamentação:

“Eu não deveria ter dito aquilo”.


“Eu deveria saber que [ele ou ela] não era de confiança”.

Você acha que lamentar o passado o motiva a ser mais cuidadoso no futuro? Por que você deveria saber antes que [X]
aconteceu? Você deveria saber tudo? Você deveria ser capaz de ler a mente das pessoas? Prever o futuro? Nunca cometer erros? Qual
é a consequência dessa maneira de pensar? De quais evidên​cias você dispunha? Qual parecia ser a coisa mais importante naquele
momento? É possível que você tenha tomado uma boa decisão em vista das informações disponíveis no momento? Você tomou outras
decisões corretas? O que você con​cluiu a partir dos sucessos na tomada de decisões? Embora a decisão não tenha funcionado, quais os
aspectos positivos que derivaram dela? Quais são as coisas positivas que você poderia fazer agora ou no futuro?

14. “E se?”:

“Mas se eu ficar ansioso? E se eu não conseguir?”

Você acha que a preocupação o protege e o prepara? Você acha que precisa de uma solução para cada problema possível?
Você está tentando tornar as coisas absolutamente certas? É possível ter certeza em um mundo incerto? Você acha que as coisas são
perigosas a menos que possa ter certeza de que elas sejam completamente seguras? Você acha que aparecer com ideias baseadas em
“e se algo der errado” o ajuda a resolver os problemas que precisam ser resolvidos? Quantas vezes você fez previsões negativas
incorretas? Descreva em detalhes três desfechos positivos. Você tem medo de fazer previsões positivas? Você tem a su​pers​tição de que
jamais deveria “testar o destino” ao fazer previsões positivas?

15. Raciocínio emocional:

“Sinto-me deprimido, então meu casamento não está indo bem”.

Estabeleça a distinção entre emoção e fato. Descreva os fatos – coisas que você pode ver ou ouvir – em vez da sua resposta
emocional a eles. Depender de suas emoções o faz sentir como se estivesse em uma montanha-russa? Examine as evidências a favor e
contra o uso do raciocínio emocional. As evidências funda​mentam a ideia de que suas emoções tem geralmente sido boas ou más guias
para a realidade?

16. Incapacidade de refutar:

“Não sou digno de amor”.

Examine as evidências a favor e contra sua posição. É possível obter evi​dên​cias que contrariem seu pensamento? Como você
poderia provar que seu pensamento está errado? Ele é testável? Se seu pensamento não pode ser testado – se não existe nenhuma
maneira possível de provar que está errado, então ele não seria realmente “sem sentido”? Se outra pessoa pensasse dessa maneira, que
con​selho você lhe daria? Imagine-se tendo de criar um experimento para testar o pen​sa​mento. Como faria para coletar informações?
Como descreveria o experimento para um estranho?

17. Foco no julgamento:

37
“Se for jogar tênis, não vou me sair bem”.
“Veja como ela é bem-sucedida. Eu não sou”.

Identifique a natureza exata de seu julgamento – por exemplo: “Eu deveria ser perfeito” ou “Eu deveria ter a aprovação de
todos” ou “Eles deveriam fazer o que eu quero que façam”. Examine as evidências a favor e contra os julgamentos. Outras pessoas
fazem esses julgamentos de modo tão severo e tão frequentemente quanto você? Você se rotula e aos outros em termos de tudo-ou-nada
quando você ou eles não se comportam conforme regras severas? Todos veriam isso desta maneira? Por que não? E se
transformássemos o padrão (bom-mau) em uma regra universal, válida para todos? A moral deve melhorar a dignidade humana. Seus
julga​mentos tratam as pessoas de maneira humana e digna? Ou tem o propósito de condenar as pessoas? Se você realmente amasse
alguém ou se importasse com ele ou ela, você o/a julgaria dessa maneira? Por quê? E se você dissesse: “Eu preferiria fazer bem feito”
em vez de “eu deveria ser perfeito”?

38
SEÇÃO III: RELAÇÃO TERAPÊUTICA

7. RECOMENDAÇÕES

O terapeuta que se propõe a empregar as técnicas cognitivas terá que conduzir com
habilidade o processo de contestação dos pensamentos e crenças irracionais do cliente a fim de obter
os resultados esperados. Judith Beck (1997, p. 33) nos diz:

É importante para o terapeuta colocar-se no lugar do paciente para desenvolver empatia pelo que o
paciente está passando, entender como ele está sentindo-se e perceber o mundo atra​vés dos seus olhos.
De acordo com a sua história e conjunto de crenças, suas percepções, pensamentos, emoções e
compor​ta​mento deveriam fazer sentido.

A autora (1997, p. 26) recomenda que o próprio terapeuta exercite as técnicas cognitivas em
si: “Ensinar a si mesmo as habilidades básicas da terapia cognitiva usando você mesmo como sujeito
aumentará a sua habilidade de ensinar essas mesmas habilidades aos seus pacientes”.
Embora invariavelmente existam pessoas por trás das ideias defen​dendo-as, a contestação
envolve oposição de ideias e não de pessoas. A fim de não comprometer a fluência da aliança
terapêu​tica, a prática das contestações na terapia cognitiva não deve se converter em conflito entre
terapeuta e paciente. Sobre isto, Dattilio, Freeman e cols. (2004, p. 57) comentam:

Apesar de não estarmos defendendo que se discuta com o pa​ciente, há momentos em que o
questionamento direto é neces​sário. Um critério importante de necessidade é a iminência de uma
tentativa de suicídio. O terapeuta precisa abordar, direta e rapidamente, a desesperança. O
questionamento pode parecer a técnica terapêutica de escolha, mas há o risco de o terapeuta se
envolver em uma luta de poder ou discussão com o pacien​te. O confronto externo pode, na verdade,
gerar resistência pas​siva e uma resposta passivo-agressiva, que poderia incluir o sui​cídio. Confronto,
discussão ou debate são instrumentos po​ten​​cialmente perigosos. Eles devem ser empregados cuida​do​as​-
mente, judiciosamente e com habilidade. Se o terapeuta se tornar mais uma pessoa insistente, o paciente
pode “desligá-lo” completamente.

É de suma importância ao terapeuta cognitivo ser competente (ha​bi​lidade social) no trabalho


de contestação a fim de não comprometer o tratamento e prejudicar a relação terapeuta-cliente
(aliança terapêutica). O paciente já traz uma problemática a ser solucionada, não queremos que as
contestações malsucedidas ampliem desnecessariamente os problemas.
Questionar a validade das ideias, falas ou comportamentos do ou​tro, por si só, é uma
intervenção complexa, pois, em geral, as pessoas não gostam de ser contestadas, mesmo quando
equivocadas de maneira evi​dente. Quanto a isso, Kelly (apud Fadiman e Frager, 2004, p. 349) afirma

O que tendemos a fazer é aceitar construtos familiares como observações totalmente objetivas do que
realmente está ali, e ver com grande suspeita qualquer coisa cuja origem subjetiva é suficientemente
recente para reconhecer [...] Pode inicialmente parecer perturbador nos imaginarmos tentando fazer
progresso em um mundo onde não existem pontos de partida seguros ime​diatamente a nosso alcance,

39
nada ‘dado’, nada do qual pu​dés​semos partir dizendo que sabemos com certeza.

Nesse sentido, o terapeuta precisa estar atento às implicações emo​cionais decorrentes da


contestação e não focalizar somente no choque de ideias. Quanto mais profunda seja a ruptura com
determinada maneira de pensar do paciente, com a qual ele se sinta seguro, esteja mais identi​fi​ca​do e
acostumado, maiores tendem a ser as repercussões (dissonância cogni​tiva) desencadeadas pelas
emoções associadas ao pensamento ou cren​ça em questão. De acordo com Beck, Freeman e Davis
(2005, p. 22):

Uma das considerações mais relevantes no trabalho com pa​ci​en​tes que apresentam transtornos da
personalidade é ante​cipar a ansiedade que será provocada por um processo terapêutico que vai desafiar
a sua identidade e o seu senso de self [...] A mudança significa entrar em um novo território, onde o
terreno é desconhecido. Eles estão sendo solicitados [...] a desistir de quem eles são e de como se
definiram por muitos anos e em muitos contextos diferentes. É crucial reconhecer que isso pro​va​​-
velmente provocará ansiedade – e tanto o paciente como o terapeuta precisam ser informados desse
potencial.

Além disso, não raramente, receber uma contestação traz consigo uma série de impressões
subjetivas, por exemplo, ligadas à rejeição, in​com​petência ou desafeto, por mais lógicos e
construtivos que sejam os ar​gu​mentos contrários. Neste sentido, Leahy (2006, p. 53) faz uma obser​-
va​ção relevante quanto ao uso das contestações:

O terapeuta pode pedir ao paciente que adote uma postura contestadora mais vigorosa, esperando assim
ativar uma inter​pre​tação nova e mais adaptada por meio de um questio​na​men​to ativo. Em certo sentido,
tal contestação ou questionamento é uma maneira de testar a validade do pensamento negativo. Se este
for válido, o paciente será capaz de suportar uma vigorosa contestação. Entretanto, o terapeuta deve
reconhecer que debates e questionamentos excessivos com o paciente podem fazer com que ele sinta
desvalorizado, dominado, hu​mi​lhado ou mal-entendido.

Geralmente as pessoas associam comportamento e valor pessoal, ou seja, se uma ideia ou


comportamento é contestado, isso pode ter o mesmo significado de um ataque ou ofensa pessoal para
o paciente, am​pliando suas resistências e mecanismos de defesa. Segundo Leahy (2006), “um dos
erros comuns de pensamento é igualar determinado com​por​ta​mento à pessoa por inteiro. Assim, se eu
fracasso em um com​por​tamento, então sou um fracasso completo”.
McMullin (2005, p. 260) destaca a importância do foco na terapia cognitiva, considerando-a
uma técnica fundamental, principalmente para os mais iniciantes, que consiste na habilidade do
terapeuta em colocar-se em contato com as experiências do paciente durante a consulta, condição
capaz de influir significativamente no sucesso do atendimento.

O processo englobaria os sentimentos, pensamentos automá​ti​cos, imagens, emoções, atitudes e valores,


sensações físicas ou qualquer outro elemento experienciado durante a consulta. Se o terapeuta estiver
permanentemente em contato com as ex​pe​riên​cias contínuas do paciente, as técnicas cognitivas serão
ade​qua​das e o tratamento será eficiente. Do contrário, as técnicas não terão sentido real para o paciente
e as consultas correm o risco de se transformarem em exercícios puramente intelectuais.

McMullin também chama a atenção para a dificuldade em se de​sen​volver esta habilidade de


manter o foco, a qual exige um nível elevado de atenção a sutilezas que, para o autor, é alcançado

40
principalmente com anos de prática.
Dentre as orientações para a manutenção do foco cognitivo, des​ta​camos: enfocar como se
manifesta o paciente e não somente o que ele diz; atentar-se para a comunicação verbal e não-verbal;
trabalhar obje​ti​vando compreender o que as cognições estão revelando; seguir mais as reações do
paciente do que a programação do atendimento. Sobre este último item, McMullin (2005, p. 260) nos
diz: “A diferença entre um te​ra​peuta cognitivo experiente e um iniciante é que o primeiro usa as
reações do paciente, em vez do programa agendado, como material de sessão”.
Baseando-se em suas observações e análises de atendimentos de terapeutas mais experientes,
McMullin (2005, p. 261) cita como exemplo as posturas de Albert Ellis. Eis aqui três delas:

• É um terapeuta diretivo, que ensina, guia e instrui seu pa​ciente, mas interrompe seus comentários
imediatamente, sem​pre que o paciente faz menção de falar algo.
• Embora possa atacar uma crença fortemente e com se​gu​ran​ça, nunca ataca o paciente. Mostra um
respeito completo e total pela pessoa.
• Deixa que os pacientes decidam quão profundamente querem ir durante a sessão, sem pressioná-los
até o objetivo estabelecido, se não estiverem prontos para isso.

Nesse sentido, durante a aplicação das técnicas de contestação, é re​comendável ao terapeuta


não perder de vista as reações do paciente, bem como não distrair-se da sua própria intenção de
ajudar, mantendo assim um firme foco terapêutico.

8. EVITAÇÕES

Para Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 53), as “perguntas cons​tituem uma importante e
poderosa ferramenta para identificar, considerar e corrigir cognições e crenças”. No entanto, os
autores advertem que:

Conforme ocorre com outras ferramentas poderosas elas po​dem ser erroneamente utilizadas ou
ingenuamente aplicadas. O paciente pode sentir que está sob um interrogatório ou que está sendo
atacado se as perguntas são usadas para “arma​di​lhá-lo” em contradizer-se.

Tomando como referência as pesquisas de Friedberg e McClure (2004) na terapia cognitiva


com crianças e adolescentes, quando o ques​tio​namento socrático é adotado com o objetivo de
contestar as crenças disfuncionais do paciente, o terapeuta deve evitar pelo menos três pos​tu​ras
capazes de prejudicar a aliança terapêutica e, em consequência, os re​sul​tados do tratamento:

1. O terapeuta precisa ter cuidado de avaliar o nível de sensi​bi​li​da​de do paciente a


questionamentos diretos, o que torna necessário diver​si​fi​car o diálogo a partir das respostas
recebidas. O objetivo é evitar que o pa​ciente se sinta numa inquisição, sendo bombardeado de
perguntas uma atrás da outra.

Por exemplo, suas respostas podem estar baseadas em seu nível de sofrimento, de tolerância de
ambiguidade/frustração, de formação cultural, de maturidade psicológica ou de reação ao processo de
questionamento. (p. 87)

41
2. Ao contestar o cliente usando o questionamento socrático, o terapeuta não deve ter como
objetivo direcionar o paciente a uma con​clusão que o terapeuta já definiu, previamente, como correta
e mais fun​cional sob a própria ótica, ou que já se tenha certeza da resposta que o paciente fornecerá.
É mais importante levantar dúvidas do que tentar fazer o paciente pensar igual ao terapeuta.

Ao desenvolver um diálogo socrático, evite perguntas cujas res​postas você tem certeza de que sabe. O
questionamento so​crático não é apenas uma oportunidade para orientar o cliente, mas também uma
chance de demonstrar sua curio​si​dade. Per​guntas maliciosas para as quais você sabe a resposta não es​-
ti​mulam uma descoberta orientada genuína. (p. 91)

3. Agir com arrogância, como se fosse o detentor de todos os as​be​res, como se tivesse todas
as soluções para os problemas do paciente. Ao contestar o paciente, evitar o uso de questionamentos
com a intenção de se exibir intelectualmente, ou como instrumento de poder para sub​jugar o paciente,
mostrando-lhe quem é “superior” ou “mais inteligente”.

Às vezes, infelizmente, nós, terapeutas, agimos como verda​dei​ros “sabe-tudo” e usamos processos
socráticos para nos exi​bir​mos (‘Eu posso usar minhas perguntas para mostrar como você está errado’).
O momento terapêutico é prejudicado quando agimos com arrogância, portanto, encorajamos você a
usar o processo de questionamentos socrático para genuinamente pro​mover maior entendimento das
origens das crenças do cliente. (p. 91)

O terapeuta deve evitar manter uma relação de dominação onde procura desfazer crenças
irracionais impondo outras. Judith Beck (1997, p. 160) diz:

O profissional não impõe essa crença sobre o paciente, mas, antes, orienta-o de uma forma colaborativa,
utilizando um ques​​tionamento socrático para construir uma crença alter​na​tiva. Ele pode, além disso,
educar o paciente sobre a natureza das crenças (por exemplo, que elas não são ideias neces​sa​ria​men​te
verdadeiras e sim que foram aprendidas, podendo, então, ser desaprendidas; que elas podem ser
avaliadas e mo​di​fi​cadas) e ajudar o paciente, dessa forma, a avaliar as van​ta​gens e desvantagens de
continuar a manter tais crenças.

Sobre isso, Abreu e cols. (2003) contribuem:

Ao trabalhar com as crenças centrais, a participação do tera​peu​ta é muito mais persuasiva, dado que
estas são mais rígi​das, supergeneralizadoras e absolutistas. No entanto, as infe​rên​cias do terapeuta
devem ser consideradas como opiniões, e não como fatos [...] A sugestão de um trabalho conjunto de
revisão das crenças mobiliza o terapeuta e o cliente em uma busca de crenças mais funcionais e menos
rígidas.

Muitas vezes faz parte da natureza humana aderir ao caminho mais curto, que exige menos
esforço, agindo automaticamente e simplificando a intervenção de maneira impulsiva mediante uma
discordância. Por isso pode torna-se tentador questionar outra pessoa de maneira ofensiva, ainda
mais a partir da posição de terapeuta. No entanto, o empirismo colabo​ra​tivo é a base da relação
terapêutica e precisa ser construído solidamente para que as contestações sejam realizadas de
maneiras assertiva.
Judith Beck (1997, p. 79) destaca que, quando está aborrecido, o paciente possui alta

42
probabilidade de interpretar questionamentos de ma​neira negativa, devendo o terapeuta evitar neste
momento uma avaliação di​reta quanto à precisão das ideias do paciente. Por outro lado, a autora
obser​va que alguns pensamentos negativos podem atrapalhar o terapeuta, como por exemplo: “Se eu
interromper o paciente, ele pensará que eu o estou controlando” ou ainda “Se o meu paciente ficar
aborrecido comigo, ele abandonará a terapia” (p. 316). Estes pensamentos podem ser preju​di​ciais à
terapia, por isso é recomendável ao terapeuta monitorá-los e remediá-los.

9. EMPIRISMO COLABORATIVO

A contestação na terapia cognitiva é embasada no empirismo co​laborativo, tornando-a um


trabalho conjunto do terapeuta e do paciente contra as crenças disfuncionais.
Para Judith Beck (1997), o empirismo colaborativo consiste em aju​dar o paciente a
“determinar a precisão e a utilidade de suas ideias através de uma revisão de dados cuidadosa (em
vez de desafiá-la ou persuadi-la a adotar seu ponto de vista).” Em outras palavras, terapeuta e
paciente trabalham juntos, decidindo coisas, o que trabalhar em cada ses​são, a fre​quência dos
encontros, as tarefas de casa, entre outros. Para Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 7):

[...] o terapeuta que está aplicando terapia cognitiva mantém-se continuamente ativo, interagindo
deliberadamente com o paciente. O terapeuta estrutura a terapia de acordo com um padrão específico
que engaja a participação e colaboração do paciente [...] Embora a colaboração do paciente em
formular o plano de tratamento possa ser seriamente prejudicada por seus sintomas neste estágio, o
terapeuta precisa usar sua enge​nho​si​dade e recursos para estimular o paciente a tornar-se ativa​men​te
engajado nas diversas operações terapêuticas.

O trabalho do terapeuta é mais ativo no direcionamento das ses​sões e na realização de


resumos sobre o que foi discutido no atendi​mento, mas, por outro lado, o paciente é permanentemente
encorajado a tornar-se também ativo na sessão, por exemplo, participando das decisões sobre o que
falar, identificando distorções do pensamento e projetando as tarefas.
Para Beck, Freeman e Davis (2005, p. 135), a partir da lista de pro​ble​mas e objetivos
estabelecida para o tratamento, poderão surgir im​por​tantes crenças a serem contestadas ou não, pois
“o que pode parecer um objetivo adequado para o terapeuta, pode não parecer adequado para o
cliente”. Os objetivos devem ser construídos de maneira colaborativa. É preciso ouvir e tomar como
referência as demandas trazidas sob a ótica do paciente, o que pode ser diferente da percepção do
terapeuta.
Segundo estes autores, “se o terapeuta começar a especular sobre os objetivos apropriados,
ele corre o risco de errar completamente o alvo”. Agindo desta forma, “cliente e terapeuta podem se
envolver em uma dinâ​mica com diferentes metas e, portanto, com diferentes rotas e processos”. Por
este motivo, às vezes pode ser difícil aceitar objetivos que a princípio não permitirão abordar
crenças centrais da problemática principal. Neste caso, é fundamental ao terapeuta atentar-se para
suas próprias crenças e trabalhá-las.
Além de construir um empirismo colaborativo, a não-colaboração, ou não-adesão, é fator
importante na relação terapêutica, que pode influir de maneira negativa o momento e os resultados
das contestações, dimi​nu​indo a eficácia das mesmas. De acordo com Beck, Freeman e Davis (2005,

43
p. 92)

Os esquemas relativos à mudança, visão de si mesmo e dos outros podem ser extremos e
superexagerados. Essa visão exagerada pode se expressar de várias maneiras. A não-colabo​ração
pode-se manifestar diretamente em comportamentos que não estão de acordo com os planos
combinados (por exemplo: atrasar-se ou perder sessões) ou, mais sutilmente, em omissões no material
relatado nas sessões [...] A força relativa de qual​quer ação de não-adesão pode mudar com as circuns​-
tân​cias de vida do paciente, com o progresso da terapia, com a habilidade do terapeuta ao tratar crenças
que interferem na colaboração, e assim por diante.

Os autores apresentam pelo menos 22 condições que podem pro​vo​car ou manter a não-
colaboração principalmente em pacientes com trans​​tornos de Eixo II:

1. O paciente pode não possuir desenvolvida habilidades mais complexas de colaborar, por
exemplo, em termos sociais.
2. O terapeuta pode não possuir a habilidade de desenvolver co​laboração, devido, por
exemplo, à inexperiência com determinados pro​blemas.
3. O terapeuta subestima a ação de algum viés etnocêntrico ou o papel da cultura do
paciente, podendo levar a um sentimento de incom​preensão no terapeuta.
4. Crenças de outras pessoas significativas na vida do paciente podem dificultar a mudança
ou reforçar seu comportamento disfuncional.
5. As ideias autodepreciativas do paciente e focando muito em um possível fracasso na
terapia podem contribuir para a não-colaboração.
6. Os pacientes resistem à colaboração por possuírem crenças de que sua mudança
acarretará consequências prejudiciais ao bem-estar de outras pessoas significativas.
7. O paciente acredita que a colaboração na terapia destruirá sua personalidade, vendo sua
mudança de ideias como ameaça à sua iden​ti​da​de ou senso de si mesmo.
8. As crenças disfuncionais do paciente e do terapeuta podem estar harmoniosamente
mescladas, por exemplo, a desesperança quanto à melhoria.
9. Não compreender aspectos básicos do modelo da terapia cogni​​tiva pode ser um fator na
não-adesão, principalmente se a capa​ci​dade de compreensão do paciente estiver afetada, por
exemplo, por deses​pe​rança ou frustrações.
10. O paciente pode ter um benefício ou ganho secundário signi​ficativo, por exemplo, dentro
de sua família, que o leva a manter um pa​drão disfuncional.
11. O timing inadequado das intervenções, quando apressadas e inoportunas ou parecendo
sem a anuência do paciente, pode ser um fator na não-adesão.
12. Os limites de tempo do cuidado gerenciado, por exemplo, através de restrições ao
número de sessões permitidas pelo plano de saú​de, podem provocar reação e alterar a colaboração.
13. Os objetivos da terapia podem não estar claros completa​men​te, contendo alguns
importantes elementos muito implícitos.
14. Os objetivos da terapia podem ser vagos e indefinidos, ou seja, não descritos de maneira
trabalhável e observável.
15. Os objetivos da terapia, sejam vindos do paciente ou do tera​peuta, talvez sejam
irrealistas, muito humildes ou demasiadamente ambi​ciosos.
16. Talvez não haja concordância entre terapeuta e paciente em relação aos objetivos de

44
tratamento.
17. O paciente sente-se obrigado ao tratamento, enviados contra a própria vontade por
pressão externa, e não tem motivação.
18. O paciente acredita que a terapia é um processo passivo ou mágico, esperando por um
efeito curativo apenas por estarem diante de um terapeuta.
19. A rigidez do paciente pode impedir a adesão, tornando-o obs​ti​nado em suas posições e
imune a receber qualquer influência do terapeuta.
20. O paciente pode ter controle insuficiente dos impulsos, po​den​do despertar ansiedade e
raiva devido às regras (estrutura e horá​rios) da terapia.
21. O paciente ou o terapeuta podem ficar frustrados pela falta de progresso na terapia, com
base no eventual longo período de tratamento necessário.
22. Questões envolvendo a percepção que o status de “paciente” e sua autoestima
diminuíram impedem a adesão, sentindo-se inferiores ou com a imagem de “loucas”.

Na relação terapêutica adequada para a prática das contestações, importa também considerar
o estado e o perfil do paciente que podem gerar a postura de não-colaboração. Dattilio, Freeman e
cols. (2004) apre​sentam uma lista de importantes fatores de vulnerabilidade – “circuns​tân​cias,
situações ou déficits que tem o efeito de diminuir a capacidade do paciente de enfrentar eficazmente
os estressores de vida ou perceber as opções disponíveis” – que, estando estes fatores presentes no
momento do atendimento clínico, podem acentuar a sensibilidade do paciente para receber
contestações. É fundamental para o terapeuta estar atento se o pa​ciente apresentar algum dos
seguintes fatores:

• Doença aguda: por exemplo, dor de cabeça, infecções virais e outros.


• Doença crônica: gerando, por exemplo, pensamento suicida.
• Deterioração da saúde: perda de atividade (envelhecimento).
• Fome: durante privação alimentar, podendo estar associado à depressão e transtornos
alimentares.
• Raiva: nesta condição, a pessoa pode responder exage​ra​damen​te a estímulos.
• Fadiga: incapacitando a resolução de problemas e o controle de impulsos.
• Solidão: predispondo pensamentos suicidas.
• Perdas importantes de vida: ocasionando falta de opções e interesse.
• Reduzida capacidade de resolução de problemas: incapacidade de lidar com situações
de crise e grande estresse.
• Abuso de drogas: julgamento comprometido, aumentando ris​cos de suicídio.
• Dor crônica: podendo levar a pessoa a ver o suicídio como solução.
• Reduzido controle dos impulsos: principalmente em pacientes com doença bipolar,
transtorno de personalidade borderline, anti-social ou histriônico.
• Novas circunstâncias de vida: durante fases de transição que envolva estressores como,
por exemplo, a mudança de emprego.

No contexto das rupturas de aliança terapêutica, Safran (2003) chama a atenção para dois

45
subtipos:

1. Ruptura de Afastamento: Envolve o descomprometimento do paciente em relação ao


terapeuta, suas emoções ou à terapia. Por exem​plo, “o paciente nega um estado de sentimento como
raiva que estava mani​fes​ta​mente evidente”, “o paciente responde com repostas curtas para dar fim às
questões exploratórias do terapeuta” ou “o paciente discute uma expe​riên​cia dolorosa de uma
maneira intelectualizada ou despren​dida”.
2. Ruptura de Confronto: Envolve expressões de ira, ressentimento ou insatisfação do
paciente em relação ao terapeuta ou outro aspecto. Por exemplo, “o paciente considera os
comentários do terapeuta inúteis e questiona sua capacidade”, “o paciente fica irritado com as
questões do terapeuta relativas aos estados de sentimento internos e admira-se em voz alta sobre sua
relevância” ou “o paciente confronta o terapeuta com dúvi​das sobre continuar a terapia.”

Provavelmente, diferentes pacientes apresentam uma predomi​nância de um tipo de ruptura sobre outra;
essa predominância reflete diferentes características dos estilos de enfrentamento ou adaptação.
Entretanto, durante o tratamento, ambos os tipos de rupturas podem emergir com um paciente, ou ambas
as características de afastamento e confronto podem contribuir para um impasse específico. (p. 252)

10. CONFRONTAÇÃO

O momento de contestação pode gerar um confronto entre tera​peuta e paciente no decorrer do


atendimento psicoterápico. A FAP (psicoterapia funcional-analítica) traz contribuições importantes
para o es​tu​do das contestações, onde a estratégia de o terapeuta mostrar ao cliente o comportamento-
problema em evidência na sessão é chamada de con​fron​tação. Segundo Egan (apud Rangé, 2001, p.
21) “essa palavra inspira medo em muitas pessoas (terapeutas), pois há relatos de experiências
malsucedidas com tal procedimento.”

O uso da confrontação pode ser avaliado positiva ou negativa​mente a partir da reação da pessoa
confrontada. Muitas vezes, determinadas ações podem ter efeitos confrontativos ruins, em​bora a
intenção da pessoa que confronte seja apenas estabelecer empatia ou mostrar compreensão. Os efeitos
da con​frontação dependem, na psicoterapia, das características com​portamentais do terapeuta (tom de
voz, palavras esco​lhi​das, etc.), do comportamento do cliente (como ele interpreta a confrontação) e,
principalmente, de ela ser geralmente utiliza​da para feedbacks negativos. (Rangé, 2001, p. 21)

Rangé (2001) sugere alguns questionamentos para o terapeuta fazer a si mesmo fim de avaliar
a qualidade das confrontações realizadas. Por exemplo, em termos de momento, “Quanto tempo você,
terapeuta, demora para mostrar ao cliente qual o seu comportamento-problema?”. Ou ainda, do ponto
de vista da técnica, “Esse ato de apontar para o pro​ble​ma é feito de forma direta ou indireta?”.
Na TREC de Albert Ellis, a confrontação é um aspecto importante na prática terapêutica,
usada para indicar discrepâncias entre o dito agora e anteriormente pelo paciente, a comunicação
verbal e não-verbal, o modo de ver os problemas por parte do paciente e do terapeuta (Rangé, 2001).

Dentro da terapia do esquema, Young, Klosko e Weishaar (2008, p. 316) ainda destacam a

46
importância de o terapeuta não temer a con​fron​tação com o paciente:

Os terapeutas que tem esquemas de subjugação e que usam esquemas de enfrentamento de resignação
ou de evitação en​fren​tam o risco de se tornarem muito passivos com os pa​cientes. Talvez evitem o
confronto e deixem de estabelecer limites adequados. As consequências podem ser negativas para
terapeuta e paciente: ele se torna cada vez mais irritado com o passar do tempo, e o paciente se sente
mais e mais ansioso em relação à falta de limites, com possibilidade de desenvolver comportamento
impulsivo ou autodestrutivo. Os terapeutas que tem esquemas de subjugação precisam realizar esforços
cons​cientes e determinados para confrontar as pacientes sem​pre que indicado – por meio do confronto
empático – e esta​be​lecer e aplicar os limites adequados.

Na terapia do esquema, Young, Klosko e Weishaar (2008) enfati​zam que durante o processo
do tratamento, a primeira postura a ser assu​mi​da pelo terapeuta é chamada de confrontação empática,
também deno​mi​nada de testagem empática da realidade. Segundo os autores (2008, p. 177)

O confronto empático é a postura terapêutica na terapia do es​que​ma. O terapeuta assume essa postura
durante a fase de mu​dança a fim de promover o crescimento psicológico do pa​cien​te. Entretanto, o
confronto empático não é uma técnica, e sim uma abordagem em relação ao paciente, que envolve um
vín​cu​lo emocional verdadeiro. O terapeuta deve se preocupar ge​nuinamente com o paciente para que a
abordagem funcione.

Young, Klosko e Weishaar (2008, p. 177) enfatizam que a confron​tação empática é importante
quando os esquemas surgem em relação ao terapeuta, devendo-se mostrar ao paciente que suas
reações ao terapeuta muitas vezes são distorcidas ou disfuncionais, refletindo seus esquemas e
estilos de enfrentamento.

O terapeuta usa o confronto empático sempre que são ativados os esquemas do paciente no contexto da
relação terapêutica. O ativador de um esquema torna-se visível nas reações exa​ge​radas do paciente, em
suas interpretações equivocadas e em seus comportamentos não-verbais.

No confronto empático, o terapeuta contesta os pensamentos e crenças irracionais do paciente


de maneira empática, aliando a compre​ensão sobre as razões da existência do esquema (experiências
do paciente no início da infância), e o quanto é difícil mudá-lo, com a con​frontação dessas crenças
causadoras atualmente de padrões doentios.
O terapeuta explica ao paciente que os esquemas que ele possui parecem corretos ou fazem
sentido devido ao histórico particular de sua vida, durante a qual provavelmente passou por
situações que pareceram confirmar tais esquemas e que possibilitaram lidar com circunstâncias
adversas na infância. Por outro lado, o terapeuta enfatiza para o paciente as consequências negativas
desses esquemas desadaptativos no presente: “eram adaptativos no início da infância, mas agora são
desadaptativos.” A partir daí o terapeuta estimula o paciente a responder de maneira saudável os
gatilhos ativadores de esquemas já identificados.
O processo de confrontação empática parte da postura de o te​ra​peuta estimular a livre
expressão do paciente, permitindo-lhe manifes​tar os próprios pontos de vista, compartilhando
pensamentos e senti​mentos.

Para ajudar o paciente, o terapeuta faz perguntas: o que o paciente pensa e sente? O que ele deseja
fazer? Quais ações por parte do terapeuta ativam o esquema? Qual é o esquema? Quem mais faz com

47
que o paciente se sinta assim? Quem, no passado do paciente, fez com que ele se sentisse assim? O que
aconteceu? Com quem o paciente se sentiu assim na infância? O terapeuta pode usar imagens mentais a
fim de ajudar o pa​cien​te a conectar o incidente a ventos passados. (Young, Klosko e Weishaar, 2008, p.
177)

O terapeuta mantém a empatia em relação aos pensamentos e sen​ti​mentos do paciente em vista


da situação, reconhecendo os pontos realistas.

Uma vez que o paciente se sinta entendido e validado, o tera​peuta avança para o teste de realidade,
confrontando falhas no ponto de vista do paciente, usando a lógica e as evidências em​pí​ricas. O
terapeuta apresenta uma interpretação alternativa, inúmeras vezes abrindo seus próprios sentimentos
sobre a interação. Terapeuta e paciente avaliam as reações deste à si​tua​ção terapêutica. (Young, Klosko
e Weishaar, 2008, p. 177)

Eis quatro exemplos apresentados por Young, Klosko e Weishaar (2008), ilustrando o
processo da confrontação empática:

Maria, sei que lhe parece natural tentar fazer com que James fique irritado a fim de chamar a atenção
dele, mas, mesmo que você ache que seja a única maneira de ele lhe dar algum ca​rinho, você tem de
abordá-lo de uma forma mais vulnerável. Diga-lhe por que você precisa de seu amor e veja se ele res​-
ponde, antes de avançar tão rapidamente a esse outro estilo que usa para irritá-lo. Entendo que fosse a
única forma de você obter atenção de seu pai, mas pode não ser a única maneira a funcionar com
James. (p. 95)

Concordo que você não desenvolveu relacionamentos basea​dos em amor em sua vida, mas isso
aconteceu por uma boa razão. É por causa do que lhe aconteceu na infância, que foi muito difícil para
você. Como você aprendeu muito cedo a esperar crítica e rejeição, você parou de procurar outras pes​-
soas. Mas esse padrão pode ser alterado. Podemos trabalhar juntos para ajudá-lo a escolher pessoas
que sejam carinhosas e receptivas e permitir que elas se tornem parte de sua vida. Você pode trabalhar
para se aproximar aos poucos dessas pes​soas e deixar que elas se aproximem gradualmente de você.
Você pode começar parando de denegrir a si e aos outros. Se der esses passos, as coisas podem ser
diferentes para você. É nisso que trabalharemos na terapia. (p. 97)

[...] uma jovem com esquema de abandono procura tratamen​to e pergunta ao trapeuta: “Eu sou carente
demais pra você? Você vai parar de me atender porque eu sou carente demais?”. O terapeuta responde
diretamente: “Não, você não é carente demais para mim. Não sinto assim”. O terapeuta usa a relação
terapêutica para contrapor-se ao esquema. (É claro, o terapeuta só dirá isso se for verdade) Dessa
forma, o terapeuta assegura ao paciente que as expressões normais de necessidade não con​figuram um
problema. (p. 178)

[...] um jovem com esquema de defectividade diz ao terapeuta: “As pessoas da minha família dizem que
sou egoísta. Você me considera egoísta?”. O terapeuta responde, sinceramente: “Não, não lhe considero
egoísta. Considero você solidário e ge​ne​roso.” Assim, a sinceridade do terapeuta oferece um antídoto
parcial aos esquemas do paciente. (p. 178)

De modo fundamental, na confrontação empática cabe ao tera​peu​ta esforçar-se para alcançar


um equilíbrio ou alternância constante entre a empatia e o confronto capazes de ajudar na mudança do
paciente, evitan​do exagerar numa ou outra situação, ou seja, ser muito empático a ponto de não
estimular os enfrentamentos da realidade; ou ser muito confron​tador ampliando as defesas do
paciente. O êxito no processo de aliar empatia e confrontação gera nos pacientes sentimentos de
compreensão e segurança, predispondo-se assim a mudar e a admitir novas perspectivas contra o

48
esquema que passa a ser visto não como parte fundamental do que são, mas sim como algo estranho.

49
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como podemos concluir desta pesquisa, as contestações podem ser realizadas por meio de
questionamentos e argumentações que, inseridos nas diferentes técnicas de terapia cognitiva e
embasados numa aliança te​ra​pêutica empática, solidamente construída, buscam ampliar a coerência
entre os pensamentos do paciente e a realidade.
A contestação das crenças disfuncionais na terapia cognitiva é um tema amplo e complexo,
embora, para muitos, pareça simples e bem co​nhe​cido. No presente trabalho fizemos um recorte dos
principais as​pectos que, na ótica deste autor, mais interessariam a um estudante de Psi​co​lo​gia. No
entanto, este assunto permite ainda muitas pesquisas adi​cio​nais e vale à pena ser continuada e
aprofundada.
Só para citar alguns exemplos, seria de grande valia considerar uma análise mais acurada dos
elementos da lógica, argumentação e persuasão, além das implicações da inevitável subjetividade de
cada terapeuta na prá​tica das contestações.
Dentre todas as etapas da terapia cognitiva, a tarefa de contestar as crenças disfuncionais do
paciente talvez seja a mais sujeita ou dependente da subjetividade do terapeuta, exigindo inúmeras
habilidades complexas, dentre as quais a empatia, logicidade, experiência, compreensão, calma e
conhe​ci​mento.
Independente das possibilidades de continuidade da pesquisa, é gra​tificante constatar que os
objetivos propostos foram plenamente sa​tis​feitos. Pessoalmente, espero que o resultado final deste
trabalho seja útil, por tempo indeterminado, não só para o exercício pessoal da profissão de
psicólogo, mas também aos demais colegas, estudantes interessados em conhecer mais sobre a
terapia cognitiva, notadamente para os quais foi dedicada este livro.
Nesse sentido, deixamos aqui a sugestão de leitura dos livros espe​cia​lizados em técnicas de
intervenção em terapia cognitiva, os quais geral​mente apresentam uma gama diversificada de
procedimentos e diálogos ricos em contestações.
Além disso, é importante deixar registrado aqui o fato de que, não raramente, comprometemos
laços importantes e criamos desavenças des​ne​cessárias pelo simples fato de não sabermos realizar
contestações empá​ticas, colaborativas ou assertivas. Geralmente as pessoas entram em con​flito pela
dificuldade em expressar discordâncias de maneira pacífica. Há uma grande dificuldade de compre​-
ender que a realidade e os acon​te​ci​men​tos da existência humana são am​bí​guos e relativos, sujeitos a
pontos de vista nem sempre errados, mas muitas vezes diferentes.
O estudo das contestações contribui para a formação de cidadãos com a mente mais aberta,
com menos convicções arraigadas e com ha​bi​li​da​des sociais mais eficazes. Cada pessoa é diferente
da outra e a cons​tru​ção da realidade se dá, em grande parte, exatamente por esta mis​ci​ge​na​ção de
maneiras distintas de pensar, sentir e agir – numa espécie de dia​lé​ti​ca entre os opostos –, fazendo
emergir, o tempo todo, di​ver​gên​cias de opi​niões ou visões dos fatos. Em razão disso, o estudo das
con​tes​ta​ções no universo clínico e terapêutico pode também apresentar de​ri​va​ções úteis e ser apro​-
vei​tado no âmbito social das relações humanas.
Por fim, podemos concluir que a prática das contestações será uma constante na vida dos indi​-

50
ví​duos e, neste caso, no universo dos aten​di​men​tos em terapia cogni​tiva, indicando assim sua
relevância. É recomendável ao terapeuta lembrar sempre que, na prática das contestações, a lógica e
a cientificidade nor​tea​doras das ava​lia​ções cognitivas são tão importantes quan​to à ética do terapeuta
em pre​ser​var o pensamento crítico e a auto​no​mia decisória do paciente.

51
REFERÊNCIAS

Andrade, M. M. Introdução à metodologia do trabalho científico. 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.
Bastos, R. L. Ciências humanas e complexidades: Projetos, métodos e técnicas de pesquisa. Juiz de
Fora, MG: UFJF, 1999.
Beck, A. T.; Freeman, A.; Davis, D. D. Terapia cognitiva dos transtornos da personalidade. 2 ed.
Porto Alegre: Artmed, 2005.
Beck, A. T.; Rush, A. J.; Shaw, B. F.; Emery, G. Terapia cognitiva da depressão. Porto Alegre:
Artmed, 1997.
Beck, J. S. Terapia cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
Campos, L. F. L. (1999). Terapia Racional-Emotiva Comportamental. Em R. A. Banaco (Org.), Sobre
comportamento e cognição – aspectos teóricos, metodológicos e de formação em análise do
comportamento e terapia cognitivista, vol. 1, cap. 3 (pp.15-20). Santo André: ESETec editores
associados.
Dattilio, F. M.; Freeman, A.; e Cols. Estratégias cognitivo-comportamentais de intervenção em
situações de crise. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
Fadiman, J.; Frager, R. Personalidade e crescimento pessoal. 5ª edição. Porto Alegre: Artmed, 2004.
Friedberg, R. D.; Mcclure, J. M. A prática clínica de terapia cognitiva com crianças e adolescentes.
Porto Alegre: Artmed, 2004.
Friedman, H. S.; Schustack, M. W. Teorias da personalidade: da teoria clássica à pesquisa moderna.
2ª ed. São Paulo: Pearson, 2007.
Houaiss, A.; Villar, M. S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
Lakatos, E. Maria; Marconi, M. A. Fundamentos da metodologia científica. 4ª ed. São Paulo: Atlas,
2001.
Leahy, R. L. Como lidar com as preocupações: sete passos para impedir que elas paralisem você.
Porto Alegre: Artmed, 2007.
Leahy, R. L. Técnicas de terapia cognitiva: manual do terapeuta. Porto Alegre: Artmed, 2006.
McMullin, R. E. Manual de técnicas em terapia cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2005.
Rangé, B. (Org.); Psicoterapias cognitivo-com​por​ta​men​tais: Um Diálogo com a Psiquiatria. Porto
Alegre: Artmed, 2001.
Richardson, R. J. et al. Pesquisa social: métodos e técnicas. 3ª. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
Safran, J.; Muran, C. (2003). Modelos de estágios do processo de resolução da ruptura da aliança.
Em C. N. Abreu, M. Roso e colaboradores. Psicoterapias cognitiva e construtivista. Porto Alegre:
Artmed, 2003.
Shinohara, H. (2003). Técnicas selecionadas da prática da terapia cognitiva. Em C. N. Abreu, M.
Roso e colaboradores. Psicoterapias cognitiva e construtivista. Porto Alegre: Artmed, 2003.

52
Young, J. E. Terapia cognitiva para transtornos da personalidade: uma abordagem focada em
esquemas. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2003.
Young, J. E.; Klosko, J. S.; Weishaar, M. E. Terapia do esquema: Guia de técnicas cognitivo-
comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed, 2008.

53

Você também pode gostar