Você está na página 1de 6

DESIGUALDADE RACIAL E EDUCAÇÃO NO BRASIL

Priscila Sena Rocha


Mestranda em Direito Político e Econômico
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Resumo

O presente artigo aborda o tema Desigualdade Racial e Educação no Brasil com o objetivo
precípuo de evidenciar a desigualdade sustentada por uma origem histórica escravocrata e
opressora. A educação é utilizada como instrumento de poder e status social, demarcando as
bases de uma sociedade tradicionalmente excludente. A desigualdade racial na educação é
matéria que transcorre pelo racismo, pela manutenção do imaginário social que reproduz
estereótipos racistas de inferioridade da população negra. Além disso, o racismo estrutural é
ferramenta utilizada para inviabilizar o acesso igualitário à educação. A análise do poder e das
relações de poder que mantêm as estruturas sociais intactas e que se dedica a preservar os
privilégios da população branca, é fundamental para compreender as circunstâncias que
envolvem a temática.

Palavras-chave: Educação - Desigualdade – Racismo

Introdução

A desigualdade racial no Brasil tem como principal fundamentação histórica a escravidão,


estruturada no país por quase quatro séculos, esse instituto constituiu-se como base
econômicapolítica da sociedade brasileira.
Diante da mudança de paradigma no mundo, com o advento das ideias iluministas, capitalistas e
da globalização, a manutenção do sistema escravocrata tornou-se paradoxal, uma vez que os
ideias de liberdade e fraternidade amplamente difundidas, confrontavam com a exploração de
mão de obra escrava, com a negação da cidadania.
Com a abolição da escravidão em 1888, não houve por parte do estado brasileiro nenhum
programa capaz de materializar a liberdade concedida pela Lei Áurea. Dessa forma, falar em
acesso à educação, quando os negros libertos buscavam meios de sobrevivência, é no mínimo
constrangedor.
Pretende-se, então, demonstrar que a Desigualdade racial na educação brasileira é reflexo de um
passado que insiste em manter as estruturas sociais intactas, que se recusa a oportunizar a
ascensão intelectual de pessoas negras, que resiste em reconhecer tais desigualdades e que
sustenta essa desigualdade racial baseada em estereótipos racistas e no discurso da Meritocracia.
Para isso, será realizada uma breve análise das situações históricas que permeiam as
desigualdades raciais e sua relação com a educação.
Serão evidenciadas algumas mudanças favoráveis aos negros, a partir da instituição de políticas
de ação afirmativa. Por outro lado, tais medidas não resultaram na solução da questão
desigualdade racial na educação, isso porque são necessários, para isso, mudanças estruturais e
sistêmicas. A ideia de relação de poder trazida por Michel Foucault é relacionada às ideologias
de racismo e dominação, na medida em que o racismo estrutural é fator de manutenção das
relações de poder e que os negros se mantêm em situação de sujeição em relação aos brancos.
Potencializando, com isso, a relação de dominação, negros diante da situação de desigualdade,
permanecem sem ascensão por meio de barreiras estruturais impostas, determinando a condição
de superioridade daqueles que detém o acesso pleno à educação, a população branca.

Métodos

Foi adotado o método hipotético-dedutivo, pois a pesquisa buscou compreender o caráter


subjetivo da questão, explorando a situações pretéritas, presentes e apontando um panorama para
o futuro. O método hipotético é demonstrado quando o pesquisador elege o conjunto de
proposições hipotéticas que acredita serem viáveis como estratégia de abordagem para se
aproximar do seu objeto (MEZZAROBA, 2019).
Foi realizada uma pesquisa qualitativa, porém utilizando-se, muitas vezes, de dados
estatísticos para corroborar com as reflexões e conclusões sobre o tema.

Resultados e Discussão

O presente artigo apresenta como discussão primordial a ideia de que o racismo e a


desigualdade racial são componentes de uma relação de poder instituída entre pessoas brancas e
negras. A ideia de superioridade das pessoas brancas, eternizadas no imaginário social, é
condição de manutenção dos privilégios e é manifestada através de uma estrutura que impede o
acesso igualitário à educação e a mobilidade social da população negra. Um ciclo de
desigualdade que é coordenado a partir da reprodução de estereótipos racistas e do favorecimento
de um grupo em detrimento do outro.
Assim, dispõe como resultado que:

a) A desigualdade racial na educação tem sua base lastreada na herança escravocrata, que
estabeleceu critérios de superioridade e inferioridade, utilizando-se de conceitos como a
meritocracia;
b) Que a falta de condições mínimas de subsistências no pós-abolição teve importante
influência nas condições de desigualdade vivenciada pela população negra;
c) Que não é possível falar de desigualdade racial, sem discutir o racismo, especialmente, na
educação;
d) Que o racismo e a desigualdade racial são componentes de uma relação de poder
instituída entre pessoas brancas e negras, que é sistêmico e estrutural; e
e) Que apesar dos avanços alcançados, principalmente, por meios das políticas afirmativas,
ainda há muito a fazer para que a população negra alcance igualdade de acesso à
Educação.

Conclusões

O presente artigo buscou estabelecer as bases estruturais da desigualdade racial na educação


brasileira através de uma breve análise história e da evidenciação dos fundamentos estabelecidos
pelo sistema escravocrata vigente no Brasil até 1888 e no período-pós abolicionista.
A desigualdade racial no Brasil não é tema que se possa tratar sem passar pelo racismo. Assim,
verificou-se que a desigualdade racial atua sobre várias vertentes como saúde, moradia e justiça
social. Ademais, o acesso à educação dos negros brasileiros, caracterizado pela discrepante
desigualdade foi abordado sob o ponto de vista histórico e na atualidade.
Ficou demonstrado que o racismo reproduzido no imaginário social da população branca está
refletido na manutenção dessa desigualdade que se perpetua ao longo dos anos. A ideia da
incapacidade intelectual do negro, estabelecida por meio do racismo, é instrumento de
manutenção das estruturas sociais, de desenvolvimento de um abismo social que separa brancos
de negros. É ainda reforçado pelo discurso da Meritocracia que atribui a responsabilidade pela
situação de desigualdade ao próprio negro. Com isso, o estado e grande parte da sociedade
brasileira, naturalizou a ausência da população negra no ambiente acadêmico e nas camadas
sociais mais baixas.
A ideia de Michel Foucault sobre poder, visto como uma relação de poder, é utilizada para
demonstrar a situação de dominação relacionada as desigualdades raciais, pois a sujeição do povo
negro esteve sempre relacionada a decisões políticas e econômicas.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen, 2019.
BALIBAR, Étienne; WALLERSTEIN, Immanuel. Raça, nação, classe: As identidades
ambíguas. São Paulo: Boitempo, 2021.
BASTOS, Maria Helena Camara. A Educação dos Escravos e libertos no Brasil: Vestígios
Esparsos do Domínio do ler, escrever e contar (Séculos XVI A XIX) - 2016. Disponível em:
http://www.seer.ufu.br/index.php/che/article/view/35556/18747. Acesso em 05jun.2021.
BOBBIO, Norberto. Dicionário de política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998.
BORGES, Juliana. Encarceramento em massa. São Paulo: Editora Jandaíra, 2020.
BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil. (1824). Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm . Acesso em: 29 mai.2021.
BRASIL. Lei de 15 de outubro de 1827. Disponível em:
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-38398-15-outubro-1827-
566692publicacaooriginal-90222-pl.html Acesso em 05jun.2021.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro:
Civilização brasileira, 2020.
FERNANDES, Florestan. O negro no mundo dos brancos. São Paulo: Global, 2007.
FOUCAULT, Michel. A ética do cuidado de si como prática da liberdade. Rio de Janeiro:
Forense, 2006.
FERNANDES, Florestan. Em defesa da Sociedade: Curso no Collège de France (1975-1976).
São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
GOULD, Stephen Jay. A falsa medida do homem. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014.
GUIMARÃES, Antonio Sérgio Alfredo. Classes, Raças e Democracia. São Paulo: Editora 34,
2012.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Desigualdade Sociais por raça ou cor.
Rio de Janeiro: IBGE, 2018. Disponível em:
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/25844-desigualdades-sociais-por-cor-
ouraca.html?=&t=resultados Acesso em: 21 mai.2021.
MENEZES, Jaci Maria Ferraz de. AS DUAS PEDAGOGIAS: Formas de educação dos escravos;
mecanismos de formação de hegemonia e contra- hegemonia: Revista HISTEDBR On-line.
Disponível em: https://www.fe.unicamp.br/pf-fe/publicacao/5029/art10_28.pdf.Acesso em
08jun.2021.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra : uma
política para o SUS. Brasília, 2017. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_negra_3d.pdf.
Acesso em: 03jun.2021.
MBEMBE, Achille. Necropolítica. Biopoder, soberania, estado de exceção, política de morte.
São Paulo. Editora n-1, 2018.
NASCIMENTO, Abdias do. O genocídio do negro Brasileiro: processo de um racismo
mascarado. São Paulo: Perspectivas, 2016.
NUNES, Ranchimit Batista. Encontro de pesquisa educacional do Norte e Nordeste (2014).
História da Educação história da educação brasileira: o negro no processo de constituição
e expansão escolar. Disponível em:
https://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:qgxd0c8GK4YJ:https://www.fe.ufg.br/
nedesc/cmv/controle/DocumentoControle.php%3Foper%3Ddownload%26cod%3D1001+&cd=1
&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso em 29jun.2021.
PALMA, João Cardoso. FILHO. A Educação Brasileira no Período de 1930 a 1960: a Era
Vargas.2005, Disponível em: https://www.justica.gov.br/news/conheca-melhor-o-trabalho-
daseppir.Acesso em 07jun.2021.
Revista Latino-Americana de História. HENN, Leonardo Guedes; NUNES, Pâmela Pozzer
Centeno. A educação escolar durante o período do Estado Novo. Vol. 2, nº. 6 – Edição Especial,
2013.
RIBEIRO, Anna Lyvia Roberto Custódio. Racismo estrutural e aquisição da propriedade:
Ilustração na cidade de São Paulo. São Paulo: editora contracorrente, 2020.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. - 3ª ed.- São Paulo:
Global, 2015.
SANDEL, Michael. A tirania do mérito: O que aconteceu com o bem comum? Rio de Janeiro
Civilização brasileira, 2021.
SANTOS, Luiz Carlos. Luiz Gama. Retratos do Brasil Negro. São Paulo: Selo Negro, 2010.
SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. A prisão dos ébrios, capoeiras e vagabundos no início da
Era Republicana. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/topoi/a/DPRr6kxK4gx8k56fN9tvGKc/?lang=pt .Acesso em: 04jun.2021.
UFMG. Universidade Federal de Minas Gerais. História das ações afirmativas. Disponível em:
https://www.ufmg.br/prae/acoes-afirmativas/historia-das-acoes-afirmativas/ . Acesso em 24
mai.2021.
UNFPA. Fundo de População das Nações Unidas. Conferência Mundial contra o Racismo,
Discriminação, Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas. Disponível em:
http://www.unfpa.org.br/Arquivos/declaracao_durban.pdf. Acesso em: 25mai.2021.
VALEIRÃO, Kelin; OLIVEIRA, Avelino da Rosa. A escola enquanto instituição disciplinar.
Revista Educação Pública: Rio de Janeiro, 2009. Disponível em:
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/9/32/a-escola-enquanto-instituiccedilatildeo-
disciplinar#:~:text=A%20escola%2C%20grande%20m%C3%A1quina%20de,seu%20estado%20
de%20%E2%80%9Cselvageria%E2%80%9D .Acesso em 01jun.2021.

Você também pode gostar