Usando​ ​Conversas​ ​Numéricas​ ​Para​ ​Desenvolver​ ​o​ ​Raciocínio​ ​Matemático
Utilizamos​ ​o​ ​gênero​ ​feminino​ ​em​ ​todo​ ​o​ ​texto.​ ​Traduzido​ ​de:
HUMPREYS,​ ​Cathy;​ ​PARKER,​ ​Ruth,​ ​2015.​ ​Use​ ​Number​ ​Talks​ ​to​ ​Boost​ ​Math​ ​Reasoning​.​ ​Middleweb.
A maioria das professoras dos anos finais da Educação
Básica se queixam da falta de compreensão matemática
de suas estudantes. Muitas vezes, secretamente - ou
não tão secretamente - se perguntam o que as
estudantes fizeram nas séries anteriores. Por que não
sabem os fatos da multiplicação no quarto, quinto, ou
até no nono ano? Por que algumas estudantes ainda
escondem os dedos embaixo da mesa enquanto
contam?​ ​E​ ​por​ ​que​ ​têm​ ​tantos​ ​problemas​ ​com​ ​frações?
O fato de que isso aconteça em tantas salas de aula em
todo o país nos indica que a falha não está nas
estudantes, tampouco em suas professoras, nas na
forma com que a matemática tem sido ensinada, ano
após​ ​ano,​ ​com​ ​a​ ​melhor​ ​das​ ​intenções.
Compreender quantidades e relações numéricas está
ao alcance de todas as estudantes, mas muita gente
não se dá conta disso. Estudantes vão para a sala de
aula com medo e rejeição da matemática, e, pior,
pensando que não são boas nela. Acreditar que a
matemática consiste majoritariamente no uso correto de
procedimento, elas aprendem a focar em conseguir a
resposta correta, ignorando se o raciocínio utilizado
para​ ​alcançá-la​ ​faz​ ​sentido​ ​ou​ ​não.
Conversas numéricas podem ajudar estudantes a
recuperar a autoridade sobre seu próprio raciocínio
através de uma rotina diária de quinze minutos, na qual
trabalham mentalmente com números. Nosso propósito
é ajudar professoras a aprender a facilitar esta rotina
para que, ao longo do tempo, as estudantes
desenvolvam um forte senso de significado para as
operações, e, em paralelo, ganhem proficiência com as
práticas​ ​matemáticas.
A boa notícia é que as Conversas Numéricas possuem
uma estrutura que te apoia nesta caminhada
gratificante, independentemente da série em que você
ensina. A má notícia é que não há uma série exata de
regras a seguir. Não podemos dizer a você exatamente
o​ ​que​ ​fazer​ ​-​ ​e​ ​não​ ​diríamos,​ ​mesmo​ ​se​ ​pudéssemos!
O processo de engajar estudantes no raciocínio com
números é algo que esperamos que você considere
como uma jornada de resolução de problemas - uma
investigação que vai te ajudar a aprender a ouvir suas
estudantes e a aprender junto com elas enquanto
constrói​ ​aulas​ ​que​ ​levam​ ​em​ ​conta​ ​seus​ ​raciocínios.
Começando​ ​a​ ​Fazer​ ​Sentido
Queremos ser muito claras: professoras não devem
culpar suas alunas pela falta de compreensão mais
profunda sobre números. A maioria de nós só sabe dar
aula como fomos ensinadas. E mesmo quando
tentamos mudar algo em nossa prática, nós
frequentemente nos vemos pressas em um sistema que
joga​ ​contra​ ​as​ ​mudanças​ ​que​ ​queremos​ ​fazer.
Os Padrões de Prática Matemática (CCSS 2010)
oferecem uma nova oportunidade. Com seu foco em
“atentar para o significado das quantidades, não apenas
para a forma de calcular, e conhecer e usar com
flexibilidade diferentes propriedades das operações”
(Padrão 2), estes padrões colocam os holofotes do
ensino​ ​na​ ​matemática​ ​“que​ ​faz​ ​sentido”​ ​.
De fato, muitas estudantes são capazes de fazer contas
com flexibilidade, eficiência e precisão. Mas elas
também precisam explicar seus raciocínios e determinar
se suas ideias e seus resultados fazem sentido. E, de
maneira crucial, como apontado pela Profa. Jo Boaler
(2008), nossas estudantes também precisam passar a
acreditar que essas são coisas que deveriam normais
nas aulas de matemática - porque isso é o que constitui
a​ ​própria​ ​matemática.
Nas Conversas Numéricas, as estudantes fazem contas
que fazem sentido para elas. Por exemplo, aqui estão
algumas formas pelas quais resolveram 63 - 27 e as
formas​ ​com​ ​que​ ​registraram​ ​os​ ​pensamentos:
Eu​ ​tirei​ ​30​ ​de​ ​63​ ​e​ ​fiquei​ ​com Eu​ ​adicionei​ ​3​ ​ao​ ​27​ ​para​ ​dar
33.​ ​Então​ ​eu​ ​adicionei​ ​3​ ​de 30,​ ​e​ ​aí​ ​adicionei​ ​3​ ​ao​ ​63,​ ​que
volta,​ ​porque​ ​eu​ ​tinha​ ​“tirado​ ​a deu​ ​66.
mais”.​ ​E​ ​33​ ​+​ ​3​ ​=​ ​36. E​ ​66​ ​-​ ​30​ ​é​ ​36.
Em contraste aos algoritmos tradicionais (ou “contas
armadas”), nas Conversas Numéricas as contas fazem
sentido para as estudantes. Elas ajudam as estudantes
a se tornarem pensadoras matemáticas com maior
efetividade do que qualquer outra prática que nós já
tenhamos​ ​testado.
Há um número excessivamente grande de estudantes
que pensam que não são boas em matemática porque
não são rápidas para chegar nas respostas. Com as
Conversas Numéricas, as estudantes começam a
acreditar em si mesmas na matemática. Elas passam a
ter maior perseverança na solução de problemas
complexos. Elas se tornam mais confiantes quando
percebem que possuem ideias matemáticas que
merecem ser ouvidas por todos. E quando estudantes
se​ ​sentem​ ​assim,​ ​a​ ​cultura​ ​da​ ​classe​ ​é​ ​transformada.
Como​ ​Começar​ ​com​ ​as​ ​Conversas​ ​Numéricas
A descrição a seguir é próxima a uma receita, como é o
caso também do nosso livro. Cada passo tem uma
lógica (​Nota: a maioria das professoras faz as
conversas numéricas com as estudantes em suas
próprias carteiras, a não ser que a sala seja grande o
suficiente para montar um círculo com as estudantes,
para que possam deixar lápis e papel nas carteiras, e
assim​ ​possam​ ​focar​ ​com​ ​mais​ ​facilidade​).
1. As estudantes afastam seus lápis (pode ser
necessário lembrá-las disso) e colocam os punhos em
frente ao peito para mostrar à professora que estão
prontas. Isso muda a atenção da estudante, do
engajamento com colegas e com a escrita para o
pensamento​ ​individual.
2. A professora escreve o problema na lousa.
Geralmente, nós escrevemos o problema na forma
horizontal, para desencorajar o uso das contas
armadas.
3. A professora fica atenta às alunas, enquanto
resolvem o problema mentalmente e põe o polegar para
cima quando tiveram tempo suficiente para pensar. Dar
às estudantes o tempo que precisarem para pensar é
uma mensagem poderosa sobre a matemática, que
desafia a ideia usual de que ser bom em matemática
significa ser rápida. Ainda, a velocidade com que os
polegares vão sendo levantados - mais rapidamente ou
mais lentamente - consiste em um indicador do grau de
dificuldade do problema. Estudantes que tenham
terminado cedo podem ser encorajadas a resolver
problemas de uma segunda ou até uma terceira
maneira, a podem indicar o número maneiras que
desenvolverem levantando os dedos silenciosamente,
para não interferir no processo de pensamento das
colega.
4. Quando a maioria dos polegares estiver levantada, a
professora pergunta se alguém quer compartilhar a
resposta que obteve. Ela registra apenas a resposta no
quadro, sem comentários e sem se comprometer com a
corretude da resposta, e pergunta se alguém chegou a
outro resultados, continuando a registrar cada nova
resposta na lousa. Pede-se às estudantes que não
revelem sua concordância ou discordância com as
respostas neste momento. Você irá notar que algumas
das Conversas Numéricas mais produtivas acontecem
quando as estudantes sugerem várias respostas
diferentes.
5. Quando não há mais respostas novas, a professora
pergunta se alguém quer explicar como chegou em sua
resposta. Descrever os passos de um procedimento não
é o suficiente - as estudantes precisam explicar por que
seu processo faz sentido. Há diferentes formas de se
fazer esta pergunta (veja abaixo). Não há uma maneira
“certa”, mas temos duas variações que nós mesmas
utilizamos​ ​com​ ​muita​ ​frequência:
● Quem tem uma estratégia que gostaria de
compartilhar?
● Alguém gostaria de nos convencer de que sua
resposta​ ​faz​ ​sentido,​ ​contando​ ​como​ ​fez?
6. Quando as voluntárias começam a compartilhar suas
estratégias, elas primeiro identificam qual resultado vão
justificar (caso haja mais de um resultado na lousa).
Então, enquanto compartilham suas estratégias, a
professora registra o pensamento de cada estudante na
lousa.
● Alguém​ ​tem​ ​alguma​ ​pergunta​ ​para​ ​a​ ​______?
● Você​ ​pode​ ​falar​ ​mais​ ​sobre​ ​______?
● Alguém pode explicar a estratégia da _______
com​ ​suas​ ​próprias​ ​palavras?
● Que conexões vocês notaram entre as
estratégias​ ​que​ ​nós​ ​discutimos?
Como você pode ver, a “rotina” das conversas
numéricas não é, de fato, uma rotina. Para você a
pensar mais sobre como responder aos estudantes
durante discussões em sala de aula, nós
recomendamos particularmente o livro de Elham Kazemi
e Allison Hintz (2014), ​Intentional Talk: How to Structure
and​ ​Lead​ ​Productive​ ​Mathematical​ ​Discussions​.
8. Conversas Numéricas não se encerram naturalmente
após quinze minutos. Com frequência, podem ir muito
mais longe se você quiser - e, às vezes, pode ser que
você tome esta decisão. Em todo caso, é importante
pensar anteriormente sobre o que você irá dizer para
encerrar uma Conversa Numérica se ainda houver
estudantes que queiram compartilhar suas estratégias.
Normalmente, nós reconhecemos para a turma que
sabemos que ainda pode haver estratégias a serem
compartilhadas e expressamos nosso pesar por não
haver mais tempo, que esperamos que as pessoas que
não​ ​puderam​ ​compartilhar​ ​participem​ ​no​ ​dia​ ​seguinte.
Aprendendo​ ​com​ ​uma​ ​Resposta​ ​Errada. erradas são oportunidades, e não agressões à sua
auto-estima. E a resposta, agora, não é a coisa mais
A Profa.Célia colocou o problema 28 x 12. Depois de alguns importante. Isto é uma grande mudança para as
compartilhamentos​ ​de​ ​estratégias,​ ​Elisa​ ​levantou​ ​a​ ​mão: estudantes.

Elisa: Ah, eu fiz algo diferente, mas eu cheguei na Mas pode ser uma mudança ainda maior para nós,
resposta​ ​errada,​ ​e​ ​eu​ ​não​ ​sei​ ​onde​ ​eu​ ​errei. como professoras. Ajudar as estudantes a desenvolver
Profa.Célia: Legal! Então, em que resultado você chegou, essas disposições significa que nosso papel também
da​ ​primeira​ ​vez? vira de ponta-cabeça. Para aquelas de nós - a maioria -
Elisa: Ah, 132. Mas eu já sabia que estava errado
que foram ensinadas que nosso trabalho é explicar
porque olhando pros números, não pode ser ideias com clareza, as Conversas Numéricas podem ser
132. um desconforto, especialmente no início. Elas também
Profa.Célia: Por​ ​que​ ​não​ ​pode​ ​ser​ ​132? gerar um desconforto por confrontar nossa própria
crença​ ​sobre​ ​o​ ​que​ ​significa​ ​ensinar.
Elisa: Porque 12 vezes 12 é 144, e 12 vezes 28
tem​ ​que​ ​ser​ ​maior.
Ensinar explicando é parte no nosso DNA cultural, então
Profa.Célia: Então, você pode contar para nós como você é natural nos questionarmos sobre como as estudantes
fez?
vão adotar novas estratégias se não as mostrarmos
Elisa: Eu sabia que 7 vezes 4 é 28, então eu fiz 7 x primeiro, para depois pedir que as estudantes
12 e então 4 x 12. E aí eu adicionei os dois e compartilhem seus trabalhos. Acreditar que as
deu​ ​132.
estudantes podem - por si próprias - criar formas
Aqui está a forma como a Profa. Célia registrou a estratégia matemáticas válidas para resolver problemas pode ser,
de​ ​Elisa.​ ​Você​ ​consegue​ ​descobrir​ ​o​ ​erro​ ​da​ ​Elisa?
ao mesmo tempo, algo libertador e transformador para
nosso​ ​ensino.

Profa.Célia: Elisa usou esta ótimo raciocínio para ver que

a resposta dela estava errada. Alguém
entender o que a Elisa fez e onde as coisas
podem ter dado errado? Converse com a
pessoa ao seu lado sobre o que pode ter
acontecido

Antes​ ​de​ ​Começar,​ ​Leia​ ​Isso.

Conversas Numéricas viram de cabeça para baixo o

papel das estudantes na sala de aula. Agora, elas são
responsáveis por descobrir algo, em lugar de seguir
uma sequência de passos pré-definidos. Agora se
espera que elas expliquem o que pensam, em lugar de
esperar por nossa explicação. Também se espera que
elas expliquem “por que”, enquanto no passado saber
explicar​ ​“como”​ ​era​ ​o​ ​suficiente.

Agora se espera que sejam testadas novas ideias, com

erros sendo apenas uma parte natural do processo.
Agora, elas precisam acreditar que suas respostas