Av-Indiv-gabriela F Lima - Mod I

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas


Departamento de História

Disciplina: História Moderna I

AVALIAÇÃO INDIVIDUAL

Questão 1: “Provavelmente, a Reforma nasceu desta profunda diferença entre a mediocridade


da oferta e a nova veemência da procura”. A frase anterior foi retirada da obra A Civilização
do Renascimento, de Jean Delumeau. Explique, a partir da leitura do texto “O Renascimento
como Reforma da Igreja”, como Jean Delumeau relaciona o desenvolvimento do
“individualismo religioso” com a Reforma Protestante do século XVI.

A vida religiosa na Europa passava por instabilidades, apenas a tradição rígida cristã
desenvolvida na idade média já não servira mais para consolidar as obrigações dos clérigos
perante a sociedade, eles precisavam de mais do que uma figura representativa. Jean
Delumeau descreve um panorama das questões que antecederam, de fato, a reforma
protestante e como o desenvolvimento do individualismo religioso contribuiu nos eventos do
período.
A grande cisma do ocidente (1378) foi um dos eventos decorrentes do processo de
reforma, foi responsável por dividir o papado por 39 anos: sendo Clemente VII (reside em
Avignon) e Urbano VI (reside em Roma). Ainda na mesma querela religiosa, em 1409 houve
o Concílio de Pisa, que visava resolver a questão: papa e antipapa. À época, a polaridade era
representada por Gregório XII (Roma) e Bento XII (França). Apesar de terem concordado em
se encontrar no concílio, não se resolveram e assim, passou a existir três papas: Gregório XII,
Bento XII e Alexandre V. Um ano depois, Alexandre V foi substituído por João XXIII, que
renunciou no concílio de Constança em 1417, dando o título a Martinho V. Ainda no concílio
de Constança, foi decidido que o Papa passa a ser secundário ao concílio e agora, o grupo de
clérigos passa a se reunir regular e automaticamente. O autor descreve essa parte do período
histórico como uma espécie de evidência de que as reformas religiosas iniciaram no seio da
própria Igreja, pelos próprios componentes.
Segundo Delumeau, com as reivindicações populares e agora um sentimento de
culpabilidade pelo o que acontecia de ruim no período, a sociedade passou a ter mais ideia de
autonomia. A crítica era direcionada aos controles da igreja (celibato, jejuns etc), ao clero
pouco erudito, a ausência dos clérigos e as diversas outras formas de descaso dos
representantes da religiosidade da época, já que a vida religiosamente ativa estava atrelada aos
clérigos. Quando o autor relaciona o individualismo religioso à reforma, ele está falando de
uma transição devocional. Como Lutero escreveu, “se pode praticar a religião cristã sem tecer
votos” (DELUMEAU, 1994 apud LUTERO, s.d.) significa que o relacionamento com Deus e
a palavra sagrada podem ser compreendidos pelo próprio homem, sem intermédio dos
clérigos e da Igreja. Lutero e seu sucessor, Calvino, eram veementes contra a manifestação
extrínseca da devoção.
É o desenvolvimento do sacerdócio universal enquanto uma causa e consequência do
processo individualista, que ocorreu da necessidade social de uma doutrina cristã que fosse
além da figura do padre, reformulando as noções da Igreja e permitindo aos leigos uma
compreensão da palavra de Deus e de sua própria capacidade de ser portador convicto da fé
em uma relação exclusiva com Deus, sem precisar de intermediários.

Questão 2: Para Peter Burke, o “movimento de reformas da cultura popular” (1550-1650)


significou modificar ou aperfeiçoar as atitudes e valores das camadas mais baixas da
população. Ainda em sua visão esse movimento não foi monolítico. A partir da visão de Peter
Burke, no texto “O triunfo da Quaresma”, identifique e analise os elementos essenciais desse
movimento de reforma da cultura popular.

A relação de Deus com seu povo deveria ser adquirida (segundo o dogma cristão
católico) através do intermédio dos padres, que deveriam representar ao povo, o elo entre o
céu e a terra. Na Europa dos 1500, deu-se início ao que Peter Burke chama de Reforma da
Cultura Popular (ocasionada pelas reformas: protestante e católica). Essa reforma perpassa
nas iniciativas do pequeno clero culto de intervenção na cultura popular. Para explicar o
processo histórico, Burke delimita as periodizações e os agentes históricos do movimento.
Segundo o autor, a cultura popular da Europa do século XVI seguia duas tradições. A
grande tradição, de acordo com Delumeau, era clássica. Transmitida no ambiente acadêmico,
que utiliza das epistemes elaboradas em grandes correntes teóricas, como a Renascença,
Iluminismo etc. Já a pequena tradição, fazia parte do coletivo popular, geralmente de fácil
compreensão como: canções, folhetos, festividades, homenagens aos santos da Igreja
Católica, carnaval, etc. Para Burke, só se pode compreender a reforma quando se entende a
polaridade do momento das tradições.
Além da tradição, outros elementos essenciais que Burke utiliza para descrever a
reforma são as objeções, teológica e moral. Ele divide o processo em duas fases: a primeira
(que ele datou de 1500 a 1650) foi uma reforma teológica, os reformadores criticavam a falta
de decência e ordem do clero. Era a necessidade de separação entre o “sagrado e o profano”
pois, para os reformadores, a ambientação dos clérigos em locais de festas, teatros, tavernas, a
laicização do espaço da igreja etc, causavam a sensação popular de vinculação familiar ao
sagrado e isso deveria se romper, pois e houvesse um vínculo, haveria também atrevimento e
petulância.
A segunda fase da reforma, é de objeção moral. As acusações de magia e feitiçaria
diabólica já não estão tão presentes. A crítica passa a ser direcionada às recreações populares.
Para os reformadores, as danças folclóricas, jogos de cartas, procissões etc, eram tradições
pagãs, não faziam parte do dogma cristão. A crítica ferrenha era sobre o carnaval, que
segundo os reformadores, deixava as pessoas libidinosas, inclinadas ao pecado da carne, à
fornicação provocada pelo toque impuro e até o uso de máscaras, os reformadores não
queriam criar uma cultura própria, eles queriam alcançar o povo. As recreações populares
deveriam acabar pois era “desperdício de tempo e dinheiro”. Neste segundo momento, os
leigos tiveram um papel mais ativo na reforma, a Companhia do Sagrado Sacramento, por
exemplo, era composta por padres e leigos. A reforma da cultura popular ia além da devoção,
era também uma mudança de perspectiva religiosa.
Segundo Burke, houve “reforma dentro da reforma”. Os reformadores sabiam que eles
não poderiam simplesmente se desfazer da cultura popular, então passaram a substituí-la. Os
católicos não proíbem as festas, eles tomam medidas para purificá-la; eles não acabam com as
imagens, eles as reformulam e criticam a superstição (superstição enquanto um medo
irracional, credo em práticas sem efeitos) ainda, os reformadores colocaram as imagens e
gravuras no catecismo, para melhor compreensão. Os reformadores protestantes publicaram a
Bíblia para diversos idiomas, medida que contribuiu para o desenvolvimento da linguagem e
da literatura da época. Nem todos tinham acesso à Bíblia, seja pelo preço ou pela falta de
alfabetização, muitos artesãos e camponeses, provavelmente só conheceram a bíblia de
maneira oral ou de segunda mão.
Segundo Burke, a reforma teve dois lados: o positivo e o negativo. O lado positivo foi a
democratização da reforma, que chegou ao campo e aos leigos, trabalhadores bem populares.
E o negativo, foi o apagamento de itens da cultura popular pela preocupação com a
purificação. A reforma da cultura popular, ocasionada pelas reformas católicas e protestantes,
foi mais acrescentada do que suprimida. Porém, a cultura popular deixou de ser algo comum a
todos e no fim do século XVIII, a sua reforma passou a ser evidência da separação entre povo
e a elite intelectual.
Referências:
BURKE, Peter. “A vitória da Quaresma”. In: Cultura popular na Idade Moderna. São Paulo,
Companhia das Letras, 1989, p. 231-257.
DELUMEAU, Jean. “O Renascimento como Reforma da Igreja”. In: A civilização do
Renascimento. Lisboa, Estampa,1985, p. 121-147.

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