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Sua figura nos aparece mais claramente na Breve História da Igreja, de August
Franzen: “Inocêncio era um homem profundamente religioso, rico de grande piedade
interior, dedicado a uma severa ascese que, não obstante o seu claro destino de
dominador e de imperador, continuou sempre, sobretudo, um sacerdote e um pastor.
Como vicarius Christi exerce seu ministério agindo com responsabilidade diante de
Deus. A partir dele, o título vicarius Christi foi assumido por todos os Papas para
caracterizar o seu altíssimo ministério. De baixa estatura e um bonito homem, mas de
saúde frágil, Inocêncio soube unir admiravelmente a sua vasta doutrina com os dons
de excepcional força espiritual, perspicácia, prudência e moderação extraordinárias.
Sobretudo, porém, possuía uma concepção altamente espiritual do ministério do
papado universal. Longe de ser um eclesiástico fanático ou um Papa meramente
político, demonstrou grande espírito aberto a todos os problemas de sua época, em
todos os campos: cultural, político, social e religioso”.
O Papa Inocêncio III morreu no dia 16 de julho de 1216. No mesmo dia, ele apareceu
a Santa Lutgarda, no monastério de Aywières, região central da Bélgica. Surpresa
por ver um espectro envolto em chamas, ela perguntou de quem se tratava e o que
queria.
“Mas seria possível que o senhor, nosso pai comum, se encontrasse em um estado
assim?”, ela perguntou.
“Sim, eu de fato me encontro neste lugar”, ele respondeu. “Estou expiando três
faltas que teriam causado minha perdição eterna. Graças à bem-aventurada
Virgem Maria, obtive o perdão delas, mas tenho de fazer reparação. Ai de mim! Aqui
é terrível e isto durará por séculos, se tu não vieres em meu auxílio. Em nome de
Maria, que obteve para mim o favor de recorrer a ti, ajuda-me.”
Devo admitir que a leitura deste incidente me impactou muito e eu com prazer o
deixaria passar em silêncio, pois relutava em pensar que um Papa, e ainda mais
este Papa, tivesse se condenado a um Purgatório tão longo e terrível.
Sabemos que Inocêncio III, que presidiu em 1215 o célebre Concílio de Latrão, foi
um dos maiores Pontífices a se sentar no trono de S. Pedro. Seu zelo e sua
piedade levaram-no a realizar grandes feitos pela Igreja de Deus e pela santa
disciplina. Como admitir, então, que um homem dessa estirpe fosse julgado com
tamanha severidade pelo Tribunal Supremo? Como reconciliar essa revelação de
Santa Lutgarda com a misericórdia divina?
Por conta dessas questões, passei a tratar essa aparição como algo ilusório,
procurando por razões que dessem suporte a essa ideia.
O que descobri, no entanto, ao contrário disso, foi que a veracidade dessa aparição
é admitida pelos mais sérios autores, não sendo rejeitada por nenhum sequer.
Ademais, o biógrafo dessa santa, Tomás de Cantimpré, é muito transparente ao
escrever e, ao mesmo tempo, bastante reservado. “Devo explicar, leitor”, ele escreve
ao fim de sua narrativa, “que foi da própria boca da piedosa Lutgarda que eu ouvi
as faltas reveladas pelo defunto, as quais eu omito aqui por respeito a um tão
grande Pontífice.”
Judicium durissimum his, qui praesunt, fiet: “Será duríssimo o juízo dos que
governam” (Sb 6, 6). É o Espírito Santo quem o declara. Pois bem, Inocêncio III
reinou por dezoito anos e durante tempos muito turbulentos; além disso, acrescentam
os Bolandistas, não está escrito que os julgamentos de Deus são inescrutáveis, e
com frequência muito diferentes dos julgamentos dos homens? Judicia tua
abyssus multa: “Teus juízos são como o grande abismo” (Sl 35, 7).
A realidade dessa aparição não pode, portanto, ser razoavelmente posta em dúvida e
eu não vejo nenhuma razão para omiti-la, dado que Deus não revela mistérios
dessa natureza senão com o fim de que sejam conhecidos para a edificação de
sua Igreja.
Referências