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“Senhor Diretor,
"Obrigado, obrigado por sua defesa da verdade católica, obrigado por seus artigos
documentados e precisos. Mas, se posso me permitir uma sugestão, porque não lança um olhar
mais atento às numerosas publicações "religiosas" que, atrás do biombo do decreto da
Congregação pela Doutrina da Fé, confirmado pelo Papa Paulo VI, não são mais submissas
ao imprimatur e publicam o que querem? 1 Por exemplo, o que se deve pensar de certas
publicações das Edizioni Dehoniane de Roma, que publicam livros como La vrai vie de Dieu de
Vassula Ryden, páginas pretensamente escritas "sob o ditado de Jesus"? Ela é comparada a
Santa Francisca Romana; "ela comunga tanto entre os católicos como entre os ortodoxos ou
anglicanos" (segundo René Laurentin). Que podemos pensar das numerosas "mensagens" de
Jesus, de Nossa Senhora, etc...? das profecias sobre o próximo fim do mundo (é assim que se
explica o terceiro segredo de Fátima)? E o senhor conhece L´avenir avant l´an 2000 de Jean
Stiegler (Edizioni Segno)? Aí encontramos Medjugorje, dom Gobbi e outros "místicos". O que
devemos pensar? Como devemos acolher tais publicações, que alguns fiéis submetem a nosso
julgamento..."
Carta assinada.
Caro amigo,
Em tempos normais nossa resposta teria sido breve e concisa: os filhos da igreja devem seguir o
exemplo de sua santa Madre Igreja, que não exclui as pretensas revelações privadas, mas pede
garantias para estar certa de que não se trata de ilusões privadas ou, ainda pior, de imposturas
humanas ou de enganações diabólicas. A primeira garantia é que estas "revelações" estejam em
harmonia com a Revelação de que a Igreja é depositária há dois mil anos.
São João da Cruz escreve: "Tão grande é a importância de nos servirmos da razão e doutrina
evangélica que, mesmo no caso de recebermos algo por via sobrenatural — queiramos ou
não — só devemos admiti-lo quando é conforme à razão e aos ensinamentos do Evangelhos" (A
Subida do monte Carmelo, 1.2 c. 21 n. 4; ver também em Si Si No No, ed. francesa, de agosto de
1990: Brouillards du révélationnisme et lumière de la foi, pelo padre Calmel O.P.).
E, com esta regra fundamental, se faria justiça à imensa maioria das "revelações" atuais. Mas o
atual pululamento de fenômenos pseudo-místicos é tão estreitamente ligado à crise neo-
modernista que atormenta a Igreja, que se torne necessária uma explanação muito mais vasta.
Raízes protestantes
O protestantismo, ao contrário, realizou uma verdadeira revolução coperniana: o ato de fé, para
Lutero, não é um ato de conhecimento ou intelectual (a razão seria, em matéria de religião,
inteiramente cega e a Igreja católica teria errado em lhe dar confiança demais), mas um simples
ato efetivo ou emocional; não mais a adesão a todas as verdades reveladas (fé dogmática), mas
simples sentimento de bem estar espiritual, confiança de ser perdoado e salvo. A
revolução coperniana de Lutero achou sua sistematização filosófica no kantismo, que
desvaloriza a razão (agnosticismo) e recorre à vontade ou "razão prática" para dar um
fundamento à religião.
A revolução modernista
Desordem doutrinal
Antes de falar nisso é necessário lançar um olhar na desordem doutrinal radical, que no
modernismo nasce da exaltação da "experiência religiosa"; desordem que não poupa nenhuma
das verdades católicas fundamentais. O pseudo-misticismo, de fato, é somente a ponta de um
iceberg diabólico no caminho da Igreja católica.
A apostasia
Pelo caminho da "experiência religiosa" o modernismo chega também a uma "nova religião",
que não é mais a religião fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo. É uma verdadeira apostasia
vestida de razões mais ou menos especiosas, particularmente de uma falsa "caridade", porque é
privada de seu fundamento que é a fé: a caridade "ecumênica".
O repúdio a uma verdade objetiva e imutável (que por si permite julgar pretensas "revelações")
associada à procura de "experiências religiosas" mesmo extraordinárias (coisa que é
severamente proibida pela verdadeira mística), faz do modernismo, como já fez do
protestantismo, o terreno de cultura mais propício para ilusões místicas, fruto da fantasia e do
sentimento, por imposturas humanas e mesmo por enganações diabólicas. São João da Cruz
escreve: "O demônio se alegra muito quando uma alma facilmente admite revelações, e quando
ele a vê inclinada a isto, porque então ele tem numerosas ocasiões e modos de insinuar erros e
de derrogar a fé no que lhe é possível" (Subida do Monte Carmelo I, II c. X n. 10).
É um fato (explique quem puder...) que quase todos os "místicos" e os "carismáticos" atuais, sob
o véu do convite à oração, ao jejum, etc, etc. (o demônio, como se sabe, está disposto a "perder
um pouco para ganhar muito") difundem os dois erros mais perniciosos do modernismo: o
indiferentismo religioso e o ecumenismo.
Tomemos o exemplo de Vassula Ryden, a quem nosso amigo leitor fez alusão. Tiramos nossas
informações de Medjugorge - espírito e verdade, março de 1992 (pode-se notar que Vassula
Ryden e Medjugorje se fazem publicidade recíproca).
Vassula, a "santa Francisca Romana de nosso tempo" (somente porque ela tem marido e filhos),
não é nem mesmo católica, mas ortodoxa, e dá a volta ao mundo para pregar aos católicos, em
nome do católico "Sagrado Coração" a... "caridade sem fé" dos modernistas (São Pio X). "A
chave da unidade — diz ela — é o amor e a humildade [...] Muitos padres ortodoxos gregos
pensam que a unidade virá quando os católicos se converterem para se tornarem ortodoxos
gregos e muitos católicos pensam o inverso. Bem, as duas partes estão erradas" (pág. 82).
"Então, tudo estará no nível do coração?" pergunta o jornalista. Resposta: "exatamente" (pág.
83). E então, afirma Vassula, não há "nenhuma razão para me fazer católica" (pág. 83), o que
Jesus quer é "a unidade por meio do coração. A nova (sic!) Igreja que Ele quer unir é unida no
coração" (ibid).
Evidentemente, o "Jesus" de Vassula pensa muito diferente do Jesus do Evangelho, que não
quer unir nenhuma "nova Igreja", porque sua Igreja Ele já uniu, e não somente "no coração",
mas na realidade, e isso há dois mil anos. Depois disso Ele a manteve unida até hoje, não
obstante as defecções de numerosos batizados durante os séculos.
"Você nunca se perguntou — sugere a "mística" Vassula à seu entrevistador — por que Jesus
não escolheu um católico para transmitir esta mensagem, apesar de se apresentar como o
Sagrado Coração? Ele quis tomar uma ortodoxa que não conhece nada. Ele a forma como quer
em termos católicos, precisamente para mostrar que Ele não faz diferença. Sim, a unidade se
fará no coração. A virgem disse isso também em Medjugorje" (ibid). Então "no domingo vou à
Igreja ortodoxa... nos outros dias vou à católica. Não faço diferença... Jesus me guia e nunca
fez objeções a este meu modo de agir." E assim, em nome de Jesus "místico", a "vidente"
pretende fechar a boca daqueles que teriam ainda objeções a fazer em nome de Jesus do
Evangelho. Não! Jesus — o verdadeiro — não se contradiz. Não contradiz tampouco o que a
sua Igreja ensina infalivelmente há dois mil anos. Na realidade, este "Jesus" de Vassula, sob
alguns "termos católicos", leva a crer em uma doutrina não católica: a heresia do modernismo,
que considera que todas as religiões são boas; faz que seja "deglutido" o indiferentismo
religioso, a "unidade na diversidade" do protestante Cullmann e do cardeal Ratzinger (ver Sim
Sim Não Não, julho de 1994, "Ratzinger, Prefeito ecumênico... pela "abolição" do papado...!?").
Esta "unidade no coração", sem unidade de fé, já foi condenada por Pio XI em Mortalium
Animos e com palavras que podem parecer ter sido escritas para Vassula Ryden: "Estes "pan-
cristãos", que procuram federar as Igrejas, parecem perseguir o nobilíssimo desejo de
desenvolver a caridade entre todos os cristãos: mas como imaginar que este crescimento de
caridade se faça em detrimento da fé? Ninguém ignora que o próprio São João, o Apóstolo da
caridade, aquele que no seu Evangelho transmite de algum modo os segredos do Sagrado
Coração de Jesus, aquele que não cessava de lembrar a seus fiéis o novo preceito: "Amai-vos
uns aos outros" (1 Jo 4, 7-11), proibia de modo absoluto toda relação com aqueles que não
professassem a doutrina de Cristo inteira e pura: "Se alguém vem a vós e não traz esta
doutrina, não o receba em sua casa e nem mesmo o cumprimente" (2 Jo 10). (O Ecumenismo.
Publicações Courrier de Rome, pág. 137).
Mas eis em nossos dias uma nova "apóstala da caridade", escolhida por Jesus entre os ortodoxos
"precisamente para mostrar que Ele não faz diferença", que vem mostrar aos católicos que o
Sagrado Coração de Jesus hoje... mudou de opinião e que pensa exatamente o contrário!
Que católico pode levar a sério tais "revelações"? As regras católicas para discernir se as
pretensas "revelações" vêm de Deus ou de outras fontes (ilusão ou impostura do demônio) são
claras: "Devemos considerar como falsa toda revelação privada oposta a uma verdade de fé"
(A. Tanquerrey - Précis de théologie ascétique et mystique no. 1501 a). "Então, se [...] nos for
revelada alguma coisa nova e diferente no domínio da fé, não devemos aceitar de modo
nenhum, mesmo se estivermos certos que aquele que nos manifesta é um anjo do Céu. Assim
afirma São Paulo... (Gl 1, 8)" (São João da Cruz - Subida do Monte Carmelo, livro 2, capítulo
27 número 3).
O que dizer então, se não se trata de um anjo que se afirma mensageiro do Céu, mas de uma
ortodoxa que, não obstante seus contatos "místicos" com o "Sagrado Coração", proclama que
quer ficar no cisma e na heresia.
Há, entretanto, outro motivo que pode explicar o favor mais ou menos tácito dado pelos
membros modernistas da hierarquia ao "pseudo-misticismo". Quando o velho modernismo
parecia morto, A. Loisy deu assim a razão: "Com menos razão e mais entusiasmo religioso, ele
foi mais forte" (Choses passées, pág. 355). Na realidade, os modernistas, conquanto inimigos da
razão, são intelectuais e seus sofismas e sua linguagem, se podem fascinar algumas "elites",
mostram-se frios e incompreensíveis para a massa (o cardeal Ratzinger, em 30 dias, exprimiu há
algum tempo um lamento substancialmente idêntico a respeito dos "novos" teólogos). Logo, não
há nada mais adaptado do que os "místicos" ou os movimentos "carismáticos" para suscitar nos
simples fiéis este "entusiasmo religioso" que o neomodernismo precisa para não ser, ele
também, um "estado maior sem tropa" (J. Rivière) destinado, mais uma vez, à derrota. Mesmo
Teilhard de Chardin, S. J., um dos "santos padres" do neomodernismo, queria que a "nova Fé
para a Terra" se desenvolvesse no seio do velho cristianismo, "partindo da maravilhosa
realidade de seu "Cristo Ressuscitado", não como uma entidade abstrata, mas como objeto de
uma larga corrente mística extraordinariamente adaptável e vivaz" (carta a um dominicano
apóstata que o convidava a sair oficialmente da Igreja - ver Courrier de Rome, junho de 1994,
pág. 5).
Não é temerário supor que os atuais membros modernistas da hierarquia vejam nos movimentos
"carismáticos" de toda sorte e em diversas "místicas" ecumênicas, o instrumento mais eficaz
para difundir o modernismo no nível da massa, assim como para justificar pelo "Céu" o novo
curso eclesiástico. E o povo cristão, duplamente enganado, nem mesmo imagina que é levado
para a apostasia através das nuvens "místicas" e "carismáticas" do convite à caridade, à oração e
à penitência (jejum inclusive). Tanto é verdade que o demônio "sabe que é preciso perder um
pouco para ganhar muito" (bem-aventurada Acarie, fundadora do carmelo na França). E no
caso presente, o lance no jogo é enorme e decisivo. Os Papas nos advertiram muitas vezes: "o
fundamento sobre o qual [o movimento para promover a união entre os cristãos] se apóia, é de
natureza a desorganizar totalmente a constituição divina da Igreja", escrevia Pio IX ao
episcopado inglês em 16 de setembro de 1884; e Pio XI advertiu aos católicos, que aderindo ao
movimento ecumênico ou o ajudando, eles "estariam atribuindo autoridade a uma religião
falsa, inteiramente estranha à única Igreja de Cristo" (Mortalium animos). Não nos deveríamos
espantar que Satanás, para sustentar o ecumenismo atual, gaste todas as suas baterias.
Como se salvar
Como se vê, caro amigo, a impostura dos "místicos" e dos "carismáticos" atuais de todo gênero
(colocamos também nesta categoria aqueles chamados "movimentos eclesiásticos", todos mais
ou menos "poluídos" de pietismo), é um fenômeno muito mais grave do que o dos falsos
místicos contra os quais, periodicamente, a Igreja teve que defender-se.
Você compreende agora, também, porque nós combatemos de preferência no campo doutrinal;
lutando contra os erros doutrinais do neo-modernismo, vamos também à raiz do pseudo-
misticismo atual. Seja sobre o plano doutrinal, seja em face às pretensas "revelações", a atitude
de um filho da Igreja é substancialmente idêntica: permanecer solidamente no que a Igreja
ensina desde dois mil anos e que, no que concerne aos fenômenos místicos, é assim resumido
por Tanquerrey:
"toda revelação contrária à fé ou aos bons costumes deve ser inexoravelmente rejeitada, como
ensinam unanimemente os doutores apoiados sobre as palavras de São Paulo: "Quando nós
mesmos ou um anjo vindo do Céu vos anunciar um evangelho contrário ao que vos
anunciamos, que seja anátema". A. Tanquerrey, Précis de Théologie Ascétique et Mystique, no.
1501).
Isidorus
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Fonte:
– https://permanencia.org.br/drupal/node/5313