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MARCOS SOARES DA SILVA

O SUICÍDIO SEGUNDO DURKHEIM

Trabalho apresentado ao à disciplina de


Aconselhamento Cristão do Curso de Formação
Pastoral da SEAMID.

CASCAVEL
2008
INTRODUÇÃO – UM BREVE HISTÓRICO

Para melhor compreender as afirmações e as conclusões de Durkheim


sobre o suicídio, é preciso ter, pelo menos, uma noção daquilo que o influenciou.
Émile Durkheim, francês, provém de uma família de rabinos e que se interessou pelo
estudo das religiões, teve sobre sua vida a influência, mesmo que indiretamente, de
Auguste Comte, que fundou a religião positivista logo após a morte de sua amada
Clotilde de Vaux, que foi “canonizada” e se constituiu objeto personalizado de culto
desta nova religião. A religião positivista é fundamentalmente uma sociolatria. Seu
Deus, seu objeto de culto último e principal, é a sociedade. Durkheim não chegou a
se envolver com esta religião, nem freqüentou os “templos positivistas” em que se
rendia culto a Clotilde. Seu credo não ia além de uma sociolatria mitigada na teoria,
mas suficiente para gerar um campo de transcendência para sua sociologia, que,
pelo que se vê, uma transcendência fundamentalmente religiosa ou, pelo menos,
fundada numa certa mística do social.
Durkheim é considerado o fundador da Sociologia por ter sido ele quem
efetivamente estendeu o método das ciências positivas ao estudo dos fenômenos
sociais, por ter postulado que o verdadeiro conhecimento sociológico é o
conhecimento daquilo que hoje nomeamos as “correlações funcionais entre diversas
variáveis”. Ele Afirma o caráter sui generis do social na própria aplicação do método
das ciências positivas, que consiste em observar, comparar e explicar uma variável
por outra: Durkheim só admite observar, comparar e explicar um fato social por um
outro fato social. O social só se explica pelo social: proposição teórico-metodológica
que não deixa de reverberar a máxima tautológica do positivismo de que o que dá
estabilidade à ordem social é a própria... ordem social.
Desde o século XVIII o suicídio vinha sendo tratado como um problema de
ordem moral, para mais adiante, no século XIX, ser visto como um crescente
problema social o que exigia uma explicação. Durkheim realiza então, um extenso
trabalho sobre suicídio delimitando e discutindo seu conceito na Obra O Suicídio,
publicado em 1897. Esta obra foi um dos pilares no campo da sociologia e foi ponto
de partida para os estudos sociológicos acerca das relações entre religião e suicídio.
Durkheim trata o suicídio de forma não psicológica, mas de forma social, buscando
padrões empíricos em diversas sociedades e seguindo um método comparativo,
definindo quatro tipos de suicídio do ponto de vista sociológico; egoísta, altruísta,
anômico e fatalista.

OS SUÍCIDIO - DEFINIÇÃO

Durkheim define suicídio como todo o caso de morte que resulte direta ou
indiretamente de um ato positivo ou negativo, praticado pela própria vítima,
sabedora de que devia produzir esse resultado. Esta definição não é suficiente para
que o suicídio seja terma de trabalho sociólogo, pois o ato individual de um suicida é
assunto para a psicologia. Portanto é necessário que se faça uma passagem do fato
singular para o conjunto dos suicídios cometidos numa determinada sociedade. É
desta forma que Durkheim estabelece seu “objeto sui generis”. Em lugar de ver os
suicídios como acontecimentos isolados que deveriam ser analisados
separadamente, ele considera o conjunto destes suicídios, cometidos em uma
determinada sociedade, durante um tempo específico e, a partir disso, passa a
aplicação do método das ciências positivas: em primeiro lugar, observar a
ocorrência, principalmente as variações de ocorrência no tempo e no espaço, da
coisa estudada (no caso, a “taxa de mortalidade-suicídio própria à sociedade
considerada”); em seguida, comparar as ocorrências (as “taxas”) encontradas em
diferentes momentos (anos) da mesma sociedade e em diferentes sociedades; e,
por fim, com base nestas comparações, procurar uma explicação social da coisa (no
caso, explicar as causas sociais do suicídio).

INTEGRAÇÃO SOCIAL – UM FATOR RELEVANTE

Muitos estudos contemporâneos sobre o suicídio focavam em características


individuais. Durkheim estudou as conexões entre os indivíduos e a sociedade. Ele
acreditava que se pudesse demonstrar o quanto um ato individual é o resultado do
meio social que o cerca, teria uma prova da utilidade da sociologia. No trabalho “O
Suicídio” de 1897, Durkheim desenvolveu o conceito de anomia e, de acordo com
ele, os indivíduos têm um certo nível de integração com os seus grupos, o que ele
chama de integração social. Níveis anormalmente baixos ou altos de integração
social poderiam resultar num aumento das taxas de suicídio. Níveis baixos porque
baixa integração social resulta numa sociedade desorganizada, levando os
indivíduos a se voltar para o suicídio como uma última alternativa e níveis altos
porque as pessoas preferem destruir a si próprias do que viver sob grande controle
da sociedade.
Durkheim verificou que o suicídio ocorria menos entre os indivíduos casados
que entre solteiros, situação que, segundo ele, se explicaria através da noção de
integração familiar. Neste trabalho, notou ainda que a taxa de suicídios diminuía em
períodos de grandes acontecimentos políticos, em que aumentava a coesão sócia-
política em torno da idéia de nacionalidade. Fica claro que a taxa de suicídios está
conectada a muitas características de ordem social, solidárias umas às outras, e é
exatamente essa relação o objeto de estudo da sociologia.

SUICÍDIO E RELIGIÃO

O primeiro método desenvolvido para abordar este tema foi a investigação


das relações entre a afiliação a um dado grupo religioso e as taxas de suicídio.
O trabalho clássico de Durkheim (1897) foi o ponto de partida para os
estudos sociológicos acerca das relações entre religião e suicídio. Ele comparou as
taxas de suicídio de diversos países levando-se em conta a religião predominante
em cada um deles. Seus achados basicamente apontaram para uma incidência de
suicídios 50% maior nos países protestantes em relação aos de maioria católica.
Para Durkheim, duas dimensões integradoras da religião são as crenças e
as práticas. Quanto mais numerosas e fortes forem elas, maior será a integração da
pessoa à vida do grupo e menor será a probabilidade de suicídio. A participação do
indivíduo no grupo dá à vida maior sentido, provê significado através da devoção a
outros, fornece uma ideologia, distraindo a pessoa de problemas pessoais que
poderiam, em outras circunstâncias, liberar tendências suicidas.
Durkheim usou a afiliação religiosa como medida, apresentando a idéia que
protestantes teriam menor integração que católicos, pois apresentavam menos
rituais e crenças coletivas. Nos países católicos, a participação religiosa evitaria a
anomia, pela maior possibilidade de integração, pois esta religião requer contatos
mais freqüentes com outros através dos sacramentos, confissão e o ato de ir à
missa, enquanto que a religião protestante, por ser mais individualista, não
requereria tanta interação social, e, assim, não proveria uma maneira de evitar o
suicídio.

A CLASSIFICAÇÃO DE DURKHEIM

No plano teórico, Durkheim propõe a categorização de quatro tipos de


suicídios; egoísta, altruísta, anômico e fatalista, baseando-se no grau de
desequilíbrio de duas forças sociais: integração social e regulação moral.

Suicídio Egoísta
O suicídio varia na razão inversa do grau de integração da sociedade
Baseando-se na afirmação anterior, pode se concluir que a sociedade não
pode se desintegrar sem que na mesma medida o indivíduo seja desengajado da
vida social, tornando seus fins preponderantes sobre os fins comuns. O ego pessoal
se afirma demasiadamente face ao ego social. Podemos dar o nome de suicídio
egoísta ao tipo particular que resulta de uma individualização desmesurada. Esse
tipo de sentimento pode tanto acontecer num indivíduo isolado como em correntes
sociais, que através de humores coletivos conduzem os povos à alegria ou à
tristeza. O estado de doença da sociedade e o enfraquecimento do laço social de
coesão se manifesta no indivíduo.
Este tipo de suicídio seria maior entre homens que mulheres, visto que são
mais dependentes da solidariedade social que as mulheres, mais acostumadas à
solidão (por ficarem mais em casa que os maridos que trabalham na rua). O homem
seria mais impregnado de sociabilidade, sendo um ser social mais complexo,
dependendo sua moral de várias condições e se perturbando com mais facilidade.

Suicídio Altruísta
Existe também um tipo de suicídio que difere do anterior por características
marcantes. Enquanto o anterior se devia ao intenso individualismo, estado onde o
ego escapa do conjunto e não obedece senão a ele próprio, e outro que decorre do
fato do indivíduo estar estreitamente sob a obediência do coletivo, onde o ego não
se pertence, se confundido a outra coisa que não ele próprio, estando sua conduta
fora de si mesmo no grupo ao qual pertence. A esse tipo de suicídio chamaremos de
altruísta.
Nesses casos o homem não se mata por se arrogar no direito de, mas
porque se sente na obrigação de fazê-lo. Renuncia-se da própria vida porque existe
algo maior que eles amam mais que a si mesmo.
Podemos dividir essa categoria em três variedades: suicídio altruísta
obrigatório (pressão do coletivo), suicídio altruísta facultativo e suicídio altruísta
agudo (suicídio místico de mártires, por exemplo, que quando não se matam se
entregam voluntariamente para serem mortos).
Esse tipo de suicídio pode ocorre tanto em sociedades contemporâneas
("desenvolvidas"), quanto nas sociedades primitivas

Suicídio Anômico
Os suicídios anômicos nada mais são que ascensões bruscas da curva de
suicídios, em períodos em que a sociedade se vê perturbada, seja por crises
dolorosas ou por transformações súbitas, mesmo que favoráveis.
No caso das crises econômicas, faz-se necessário que se diminua o padrão
de vida, ajustando- se a condição atual. No caso dos ricos, isso se torna muito difícil,
pois acostumados ao ímpeto de querer sempre mais, seguindo às suas paixões e
desejos, é difícil frear esse movimento. Já nos países pobres, a pobreza protege
contra o suicídio, porque é ela mesma um freio. Há maior conformação com o que
se pode ter, agindo com moderação e tendo maior consciência dos seus limites,
nada lhes excitando a inveja.
É essa incessante busca por mais e mais, que já se tornou marca de
distinção moral baseada na doutrina do progresso que leva a essa falta de controle e
limites, estando desregrada a atividade dos homens que nos momentos de crise
levam a esse terceiro tipo de suicídio. Falta ao homem a marca do coletivo em suas
paixões individuais, deixando-as assim sem freio para as regular. (Podemos então
fazer um paralelo entre o suicídio egoísta e o anômico, visto que em ambos há
ausência de afirmação do coletivo).
Esse tipo de suicídio está presente nas principalmente nas sociedades de
atividades econômicas desenvolvidas, como comércio e indústria.

Suicídio Fatalista
O fatalismo é o estado oposto à anomia, onde a regulação social é
completamente instilada no indivíduo; não há esperança de mudança contra a
disciplina opressiva da sociedade. A única forma do indivíduo ficar livre de tal estado
é cometer suicídio. Durkheim viu esta razão nos escravos que cometeram suicídio
na antigüidade, mas viu uma relevância mínima na sociedade moderna.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta obra, Durkheim dedica toda a primeira parte a fatores extra-sociais


como loucura, raça, hereditariedade, clima temperatura, sazonalidade e a imitação.
O filósofo refere tipos de suicídio, tais como suicídio maníaco, melancólico,
obsessivo, impulsivo e automático e a sua conclusão é que não existe nenhum
estado psicopático que mantenha com o suicídio uma relação regular e
incontestável. Da mesma maneira, não encontra relação com os estados
psicológicos normais, raça e hereditariedade, nem com fatores cósmicos e imitação.
Durkheim segue seu estudo sobre as causas sociais e tipos sociais, dividindo o tema
em partes: método para determinar as causas e os tipos sociais; os diversos tipos de
suicídio.
Ao analisar os três principais tipos de suicídio, que é o ponto central de sua
pesquisa, Durkheim na primeira parte, analisa e denomina de suicídio egoísta,
estabelecendo três pressupostos: O suicídio varia na razão inversa do grau de
integração da sociedade religiosa. O suicídio varia na razão inversa do grau de
integração da sociedade política. Estuda então, as informações referentes ao
número de suicídio entre os estados protestantes, mistos (católicos e protestantes),
católicos, católicos gregos, concluindo que em toda parte, sem exceção, há mais
suicídios entre os protestantes do que entre os adeptos dos demais credos e que o
maior número de suicídios no protestantismo decorre do fato de que esta religião
menos fortemente integrada do que católica.
Durkheim também trata dos aspectos relacionados à vida da família e a
sociedade política, estudando casos históricos, observa que o suicídio surge quando
a velha organização da comunidade é abalada. Declara que quanto mais se
enfraquece os grupos sociais a que ele (indivíduo) pertence, menos ele dependerá
deles, e cada vez mais, por conseguinte dependerá apenas de si mesmo para
reconhecer como regras de conduta tão somente as que calquem nos seus
interesses particulares. Se, pois, concordarmos em chamar de egoísmo essa
situação em que o eu individual se afirma com excesso diante do eu social em
detrimento deste último, podemos designar de egoísta o tipo particular de suicídio
que resulta de uma individuação descomedida. Quando trata do suicídio altruísta,
Durkheim afirma que, se uma individuação excessiva leva o suicídio, a individuação
insuficiente produz os mesmos efeitos. Quando desligado da sociedade, o homem
se mata facilmente, e se mata também quando está por demais integrado nela. Este
tipo de suicídio para o autor é endêmico em sociedades inferiores, e em seguida
depois de exemplificar com casos históricos, classifica-os em três categorias: 1)
suicídios de pessoas que chegaram ao limiar da velhice ou adoeceram; 2) suicídios
de mulheres por ocasião da morte do marido; 3) suicídios de clientes ou servidores
ao ensejo da morte de seus chefes.
Conclui o autor que crises industriais como financeiras, como as da
prosperidade, têm o mesmo resultado: aumentam os suicídios porque são crises, ou
seja perturbações de ordem coletiva. Por ser um processo imediato, leva os
indivíduos não se ajustarem às novas condições. Para Durkheim, atividades
industriais e comerciais são as que registram mais suicídios, estando quase no
mesmo nível que as carreiras liberais, ao passo que os índices são mais baixos na
agricultura. Comparando patrões e empregados, afirma serem os primeiros mais
atingidos que estes últimos.
Durkheim coloca em evidência os tipos sociais que propõe corresponder
aproximadamente a tipos psicológicos. Desta maneira o suicídio egoísta
corresponde apatia e secundariamente melancolia; ao altruísta, energia passional ou
voluntária e sentimento do dever; ao anômico, corresponde irritação, desgosto e
como variedade secundária, queixas contra a vida. Afirma que o suicido só poderá
ser explicado sociologicamente, pois é a constituição moral da sociedade que
determina a cada instante o contingente de mortes voluntárias. Existe, pois, para
cada povo, uma força coletiva, de determinada energia, que impele os homens a se
matarem.

REFERÊNCIAS

DURKHEIM, E. Suicídio: definição do problema, Suicídio Altruísta, Suicídio


Egoísta, Suicídio Anômico. In: Coleção Grandes Cientistas Sociais, pp. 103 a
122, 7ª Edição, 1995, Ed. Ática.

TEIXEIRA, R. R. Três fórmulas para compreender “O suicídio” de Durkheim. In:


Interface - Comunic, Saúde, Educ, v6, n11, p.143-52, ago 2002

ALMEIDA, A. M; LOTUFO NETO, F. Religião e Comportamento Suicida. In:


Meleiro, A. M. A. S.; Teng, C. T.; Wang, Y. P. (Eds.) Suicídio: Estudos
Fundamentais. São Paulo, Segmento Farma, 2004. pp.: 53-60.

Sites consultados - Acesso em: 04 nov. 2008.

http://pt.wikipedia.org

http://pt.shvoong.com

http://www.webartigos.com>

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