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AULA 03- IMÓVEL RURAL

1- Conceito de Imóvel Rural:

Qualquer estudo adequado sobre Direito Agrário depende de uma


perfeita compreensão do que é imóvel rural, pois nele é que serão
desenvolvidas as atividades agrárias, conforme estudamos inicialmente.
Assim, é necessário distingui-lo de forma precisa do imóvel urbano, uma
vez que somente àquele são aplicados os princípios e normas do Direito
Agrário. Nesse sentido, o imóvel classificado como rural é que deverá
cumprir os requisitos da função social da propriedade rural elencados na
Constituição Federal e no Estatuto da Terra, sob pena de desapropriação
por interesse social para fins de reforma agrária.
O próprio legislador cuidou de nos oferecer um conceito, de certa forma
para facilitar a compreensão inicial do instituto, mas, conforme veremos,
muitos conflitos ainda pairam em torno do tema- art. 4o do Estatuto da
Terra e art. 4o da Lei 8629/93 (Lei de Reforma Agrária).
No mesmo sentido é a Instrução Normativa 11/2003 do INCRA, em seu
artigo 3o.
Observa-se que a mera localização não é critério definidor do imóvel
rural, mas sim a sua destinação econômica. O critério fundamental de
definição do imóvel rural é, portanto, a sua destinação.
Considera-se imóvel rural a área de terra, qualquer que seja a sua
localização, que se destina a atividade agrária. Um imóvel, mesmo que
localizado no perímetro urbano, sendo destinado à alguma atividade
agrária, para os fins de Direito Agrário, será classificado como rural.

2- Questão Tributária:
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Não obstante o disposto no Estatuto da Terra, o Código Tributário


Nacional, adotou, no seu artigo 29, o critério da localização como
fundamento para a incidência do Imposto Territorial Rural (ITR) às
propriedades localizadas fora da zona urbana do município.
Este entendimento foi posteriormente alterado pelo Decreto-Lei no 57/1966,
que trata especificamente sobre o ITR, determinando a incidência desse
imposto à propriedade imóvel que comprovadamente seja utilizada em
exploração vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, mesmo que esteja
localizada no perímetro urbano, seguindo, pois, a conceituação enunciada pelo
Estatuto da Terra.
Subsequente, causando ainda mais confusão, foi publicada a Lei no 9393/96
(art. 1o), específica para questões tributárias, insistindo no critério da
localização para a classificação de imóveis rurais.
Enfim, uma grande confusão legislativa, tanto que alguns doutrinadores
passaram a afirmar que havia dois critérios de classificação dos imóveis rurais:
um específico para fins tributários (critério da localização) e outro para fins de
Direito Agrário (critério da destinação).
MAS, ATENÇÃO!!! Depois de tão grande discussão o Superior Tribunal de
Justiça pacificou o assunto pela aplicação exclusiva do critério da destinação
(tanto para fins agrários quanto tributários).

3- Características do Imóvel Rural:

Ultrapassado os obstáculos relacionados à conceituação do imóvel rural


(localização X destinação), agora passamos à análise das características do
imóvel rural, considerando o texto do art. 4o do ET e do art. 4o da Lei 8629/93
(Lei de Reforma Agrária).
Assim sendo, afirmamos que são características do imóvel rural:
- bem imóvel- art. 79 do CC- solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou
artificialmente.
- prédio rústico- a expressão prédio era utilizada pelo CC de 1916 para
referir-se a terreno não edificado. Assim, por rústico consideramos o imóvel
que tenha prevalência de elementos naturais, como água, vegetais, animais,
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etc., ou seja, imóvel com baixo grau de artificialidade decorrente da atuação


humana.
- área contínua- tal expressão deve ser entendida no sentido de utilidade.
Assim, ainda que o imóvel esteja dividido ao meio por uma estrada ou um rio,
não deixa de ser considerado área contínua. O termo designa, portanto,
continuidade econômica, exploração econômica como um todo único.
- qualquer localização
- destinação voltada para as atividades agrárias.

4- Dimensionamento do Imóvel Rural:

- Qual seria a medida de área de terras ideal para que o agricultor, com sua
família, tenha condições de explorá-la com eficácia e possa garantir o seu
progresso social e econômico?
- Qual a medida ideal de propriedade, visando o desenvolvimento
socioeconômico do país?

4.1. Módulo Rural:


Foram questionamentos como esses que levaram o legislador a criar
unidades de medida específicas para os imóveis rurais, dentre as quais a
primeira foi o denominado “módulo rural”.
A definição de módulo rural é encontrada no art. 4o do Estatuto da
Terra, no inciso II, estabelecendo como a medida de área fixada como
propriedade familiar, de tamanho mínimo suficiente para o
desenvolvimento de atividade agrária.
À primeira vista, pode parecer um conceito muito abstrato, mas a
intenção do legislador foi exatamente essa, tendo em vista que a dimensão da
propriedade familiar varia de uma região para outra (e de imóvel para imóvel),
considerando a qualidade da terra, localização geográfica, condições de
aproveitamento etc.
Com a criação de outras unidades de medida (principalmente o “módulo
fiscal”), o módulo rural perdeu muito do seu valor, por exemplo na definição de
espécies de imóvel rural.
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A fixação dessa área é feita por órgão (em verdade autarquia)


competente do Governo Federal (atualmente o INCRA), para cada imóvel, com
base nas informações descritas no Certificado de Cadastro do Imóvel Rural,
variando de 2 (dois) a 120 (cento e vinte) hectares.
Por meio da Instrução Especial no 50/1997, O INCRA fez publicar as
dimensões dos módulos rurais por tipo de exploração, conforme “Zona Típica
de Módulo”, de maneira que existem várias categorias de módulos rurais a
saber, ex: módulo de exploração hortigranjeira, módulo para a exploração
pecuária.
Essas zonas características encontram fundamento no art. 5o do Estatuto
da Terra e nos artigos 11 a 14 do Decreto 55.891/65.
Em síntese: instituto que define a fração mínima de parcelamento do
imóvel rural, visando evitar a proliferação de áreas tidas como antieconômicas
para efeito de exploração agropecuária, bem como para se propiciar a
realização do princípio da função social da propriedade.

4.2 Módulo de exploração indefinida (MEI):


É uma unidade de medida, expressa em hectares, a partir do conceito
de módulo rural, com dimensão que varia entre 5 e 100 hectares, de acordo
com a Zona Típica de Módulo (ZTM) do município. As informações sobre as
dimensões do MEI para cada município estão disponíveis no sítio eletrônico do
INCRA.
Finalidade: determinar os limites da aquisição de imóveis rurais por
pessoas (naturais ou jurídicas) estrangeiras, segundo regulamenta a Lei no
5709/1971.

4.3 Fração mínima de parcelamento:


Foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei no 5868/72
(art. 8o ), que dispõe sobre o Sistema Nacional de Cadastro Rural.
Ato contínuo, o art. 39 do Decreto 72106/73 estabeleceu que nenhum
imóvel rural poderá ser desmembrado ou dividido e área de tamanho inferior
àquele previsto no art. 8o da Lei 5868/72.
Em razão de tais dispositivos, para muitos o instituto da Fração Mínima
de Parcelamento acabou superando a utilização de módulo rural.
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São considerados nulos e de nenhum efeito quaisquer atos que infrinjam


o disposto no art. 8o da Lei no 5868/72, não podendo os serviços notariais lavrar
escrituras dessas áreas, nem ser tais atos registrados nos Registros de
Imóveis sob pena de responsabilidade civil, administrativa e criminal de seus
titulares ou prepostos.
Excepcionalmente, será possível o desmembramento do imóvel em
dimensões inferiores à do FMP- art. 8o, parágrafo 4o da Lei no 5868/72; art. 65
do Estatuto da Terra (Lei 4504/64) e art. 2o do Decreto no 65504/1968.
Sintetizando: é a menor área que um imóvel rural, num dado município,
pode ser desmembrado. Ao ser parcelado, o imóvel rural, para fins de
transmissão a qualquer título, a área remanescente não poderá ser inferior à
fração mínima de parcelamento.

4.4 Módulo fiscal:


A Lei no 6746/79 introduziu mais uma figura jurídica usada como unidade
de medida para imóveis rurais, trata-se do denominado “módulo fiscal”. É muito
comum no cotidiano agrário, as pessoas confundirem o Módulo Fiscal com o
Módulo Rural, o que não pode acontecer.
Originalmente, como o próprio nome sugere, o Módulo Fiscal servia
como critério para fixação do Imposto Territorial Rural (ITR).
Ocorre que, tal unidade de medida tem sido usada inclusive para a
classificação dos imóveis, minando ainda mais a relevância original do módulo
rural.
O módulo fiscal é fixado para cada município, estabelecendo uma área
mediana dos Módulos Rurais dos imóveis rurais do município. De acordo com o
parágrafo 2o do art. 50 do ET, o módulo fiscal de cada município, expresso em
hectares, será determinado (pelo INCRA) levando-se em conta determinados
fatores.

5- Classificação do Imóvel Rural:

5.1 Pequena, média e grande propriedade rural:


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A Lei no 8629/93, com o objetivo de regular os dispositivos previstos na


Constituição Federal referentes à reforma Agrária, prevê em seu art. 4o as
definições:
Pequena propriedade: área compreendida até 4 módulos fiscais,
respeitada a fração mínima de parcelamento.
Média propriedade: área superior a 4 e até 15 módulos fiscais.
Grande propriedade: imóvel que atinja mais de 15 módulos fiscais.
Uma questão bastante polêmica acerca desta classificação é o critério
de medição, basicamente se o cálculo deve ser com base na “área
aproveitável” ou “área total do imóvel”. O STJ, segundo orientação do Estatuto
da Terra já decidiu no sentido de que a classificação do imóvel como pequena,
média ou grande propriedade rural, deve ser obtida dividindo-se a “área
aproveitável” do imóvel pelo módulo fiscal do Município.

5.2 Munifúndio, latifúndio e propriedade familiar:


O Estatuto da Terra (Lei no 4504/1964), em seu art. 4o , logo após definir
imóvel rural, apresenta uma classificação que o diferencia em:
- propriedade familiar (inciso II)- é o imóvel rural que, direta e
pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força
de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico,
com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, eventualmente
trabalhado com a ajuda de terceiros.
- minifúndio (inciso IV)- imóvel rural que tem área e possibilidades
inferiores às da propriedade familiar. Vale lembrar que o conceito de
propriedade familiar é utilizado para a determinação do módulo rural, de modo
que podemos afirmar, que o minifúndio é o imóvel que tem área inferior ao
módulo rural.
- latifúndio (inciso V) – pode ser classificado considerando dois
diferentes critérios: extensão e exploração.
Latifúndio por extensão: é o imóvel rural que exceda a seiscentas vezes
o módulo fiscal.
Latifúndio por exploração: é o imóvel rural que, não excedendo o limite
referido anterior e tendo dimensão igual ou superior a um módulo fiscal, seja
mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais
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do meio, com fins especulativos, ou seja, deficiente ou inadequadamente


explorado, de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural.

6- Propriedade Produtiva:

É a pequena, a média e a grande propriedade que atingem os níveis de


utilização da terra e de eficiência na exploração exigidos em lei.
O grau de utilização da terra (GUT) deverá ser igual ou superior a 80%,
calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área
aproveitável total do imóvel. Por sua vez, o grau de eficiência na exploração da
terra (GEE) deverá ser igual ou superior a 100%.

7- Cadastro do Imóvel Rural:

Com o advento do Estatuto da Terra (1964) foi implementada uma nova


forma de cadastramento rural. Regulamentado pelo Decreto no 55891/1965, o
cadastramento rural está incluído dentre as atribuições do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Quanto ao conteúdo do cadastro, o Estatuto da Terra o especifica em seu
art. 46, separando-o em três grupos.
O cadastro rural é importante por possibilitar que o governo conheça a
realidade agrária do Brasil, identificando os problemas com mais precisão, o
que contribui para o desenvolvimento de uma política agrária mais efetiva, bem
como para a assertividade das ações de reforma agrária.
Certificado de Cadastro de Imóvel Rural: é o documento que comprova a
regularidade do imóvel rural, apresentando informações sobre seu titular, valor,
localização, possuidor, formas de utilização, área (em hectares), módulo rural,
módulo fiscal, fração mínima de parcelamento, dentre outras informações.
Para a emissão desse documento, é necessário que o imóvel esteja
devidamente cadastrado no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR).
O SNCR, criado pela Lei 5868/1972, é um sistema utilizado pelo INCRA
para conhecer a estrutura fundiária e a ocupação do meio rural brasileiro a fim
de assegurar o planejamento de políticas públicas. É com base nesse banco de
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dados, conforme as declarações de proprietários ou possuidores (posseiros) de


imóveis rurais, que o INCRA emite CCIR.
O CCIR é importantíssimo para o rurícola, pois a prática de diversos atos
jurídicos dependerá da apresentação de tal documento. Ex: somente com o
CCIR atualizado é possível realizar em cartório a transferência,
desemembramento, partilha, ou constituir hipoteca sobre o imóvel rural.
IMPORTANTE!!! Não confundir o CCIR com o Registro Imobiliário.
Muito embora o CCIR seja indispensável para a prática dos mais variados atos
jurídicos envolvendo o imóvel rural, ele não faz prova de propriedade. Somente
o Registro Imobiliário
Outro banco de dados muito importante para o Direito Agrário é o CAFIR.
Trata-se de um cadastro de imóveis rurais, administrado pela Receita Federal,
com informações referentes aos imóveis rurais de todo o país, utilizadas para
fins do ITR (imposto sobre propriedade territorial rural). TODOS os imóveis
rurais, mesmo aqueles que gozam de alguma imunidade ou isenção tributária,
devem ser cadastrados no CAFIR, onde serão identificados por um número
chamado NIRF (Número do Imóvel na Receita Federal).
Caminhando para o final, não poderíamos deixar de falar sobre CNIR
(Cadastro Nacional de Imóveis Rurais) criado pela Lei 10267/2001. O CNIR
é uma base de dados gerenciada conjuntamente pelo INCRA e pela Secretaria
da Receita Federal, produzida e compartilhada pelas diversas instituições
públicas federais e estaduais produtoras e usuárias de informações sobre o
meio rural brasileiro.
Ressalta-se que o titular de imóvel rural que não realizar a vinculação do
CNIR ficará sujeito a não emissão do CCIR, o que poderá causar diversos
transtornos.

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