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PARECER JURÍDICO

Ituporanga, 4 de maio de 2023

Interessada: XPTO S.AP

Referente à: legalidade ou não da cobrança de IPTU referente aos períodos de 2018 a


2023, acrescido de correção monetária, multa de mora e juros moratórios.

Bianca Emanuela Sens1


Franciane Souza Weber2
Maria Luiza Ventura de Farias³

INTRODUÇÃO

A presente questão permeia a legalidade quanto a cobrança municipal de IPTU


sobre o imóvel direcionado à produção agrícola. Em princípio, esta cobrança está em
desacordo com o estipulado em lei, uma vez que além da bitributação ensejada, já foi
reconhecido pelo texto de lei que a cobrança correta seria o ITR, uma vez que, apesar de o
imóvel estar em um perímetro urbano, ele se destina exclusivamente a produção agrícola.
Desta forma, o nó górdio cinge em qual imposto seria adequado a cobrança, uma
vez que a empresa em questão já realizava de forma regular o pagamento do ITR.
É o relatório necessário, passamos a opinar.

1. FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, a definição de imóvel rural, encontra-se redigido no artigo 93 do


Decreto n° 59.428/1966:

"Imóvel Rural, na forma da lei e de sua regulamentação é o prédio rústico de área


contínua, localizado em perímetro urbano ou rural dos Municípios que se destine à
exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agroindustrial, através de planos
públicos ou particulares de valorização" (grifou-se).

A justiça brasileira, através do Supremo Tribunal de Justiça, atribui legislação


muito mais ampla para a definição do tributo a ser aplicado. O STJ considera a destinação do
imóvel como condição essencial para a incidência de imposto sobre a propriedade. Conforme
o DL 57/1966, em seu artigo 15, não incide IPTU, mas ITR sobre imóveis localizados na área
urbana do município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa,
vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.
Senão vejamos:

“O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o


imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal,
agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sôbre o mesmo, o ITR e
demais tributos com o mesmo cobrados.(Revogação suspensa pela RSF nº 9, de
2005)”

Isso, é claro, independente da área de localização. Portanto, conforme a


determinação do Supremo, a propriedade deve pagar ITR independentemente da localização,
desde que, devidamente comprovado a destinação à exploração agrícola.
Dessa forma, a responsabilidade pelo recolhimento do imposto sobre a
propriedade, aqui em questão, do ITR do imóvel é da União, seguindo o disposto no artigo
153, VI da Constituição Federal.
Sendo assim, as guias de cobrança referente ao IPTU emitidas pela
municipalidade, devem ser canceladas, uma vez que não existe base legal para sua cobrança.
Desta forma, diante da exigência do IPTU pelo Município de São Paulo, a
empresa deve cumprir com suas obrigações tributárias e regularizar ou manter regularizado o
imóvel para uso agrícola e assim, não necessita realizar pagamento dos valores cobrados pela
municipalidade, segundo o período estipulado na notificação. Além disso, é recomendável
que a empresa regularize sua situação tributária e pague os impostos devidos e cumprindo
com suas obrigações fiscais.
Os tribunais superiores já versaram sobre o tema em questão, tanto é que já está
firmado o tema 174 (REsp 1112646/SP):

Questão Submetida a Julgamento:


Questão referente à incidência de IPTU sobre imóvel em que há exploração de
atividade agrícola, à luz do Decreto-Lei 57/1966. Tese Firmada: Não incide IPTU,
mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que
comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou
agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966).

No mesmo sentido, STJ já firmou entendimento:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL.


IPTU. IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA URBANA DESTINADO À
EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE EXTRATIVISTA, AGRÍCOLA, PECUÁRIA OU
AGROINDUSTRIAL. NÃO INCIDÊNCIA DO IPTU. PRECEDENTES DO STJ. I -
Na origem, trata-se de ação anulatória de lançamento fiscal para declarar
inexistente a relação jurídica-tributária de incidência de IPTU sobre o imóvel
descrito na inicial. Na sentença, julgou-se procedente o pedido. No Tribunal, a
sentença foi mantida. II - No tocante à suposta violação do art. 32, § 2º, do CTN,
não assiste razão ao recorrente. O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento
submetido ao rito próprio dos recursos especiais repetitivos (REsp n.
1.112.646/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em
26/8/2009, DJe 28/8/2009), firmou a tese (Tema n. 174/STJ) de acordo com a
qual, sobre imóvel localizado na área urbana do município, comprovadamente
destinado à exploração de atividade extrativista, agrícola, pecuária ou
agroindustrial, nos termos do art. 15 do Decreto-Lei n. 57/1966, não incide
Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), mas sim Imposto Territorial Rural
(ITR). Aceca do assunto, destaco os seguintes precedentes: AgRg no AREsp n.
259.607/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em
11/6/2013, DJe 17/6/2013 e AgInt no AREsp n. 1.197.346/SP, Rel. Ministra Assusete
Magalhães, Segunda Turma, julgado em 8/5/2018, DJe 15/5/2018. III- A partir da
análise do acórdão recorrido, é possível verificar que a decisão impugnada está em
consonância com a tese firmada por esta Corte Superior, no julgamento de recurso
especial repetitivo (REsp n. 1.112.646/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Primeira Seção, julgado em 26/8/2009, DJe 28/8/2009), razão pela qual não
merece reforma. Infere-se o exposto do fragmento do voto condutor transcrito a
seguir: "Para a incidência do IPTU sobre um imóvel, além do critério espacial
previsto no art. 32 do CTN, deve ser aferida a sua destinação, nos termos do art. 15
do DL 57/1966. (...) Isto posto, no caso sub judice, verifica-se que os apelados
comprovaram a exploração de atividade agrícola no imóvel e apresentaram, a fls.
42/66, o pagamento de contribuição sindical rural, a realização de projeto e a
execução de plantio de mudas das espécies guanandi e palmeiras (fls. 261), além
do recolhimento do Imposto Territorial Rural, relativo ao imóvel. (...) Deste modo,
a despeito de se tratar de um imóvel situado em zona de expansão urbana, os
autores comprovaram o desenvolvimento de atividade agrícola, sendo, portanto,
de rigor manter a r. sentença tal como lançada." IV - Agravo interno improvido.
(AgInt no AREsp n. 1.377.458/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda
Turma, julgado em 6/6/2019, DJe de 14/6/2019.) (Grifos nossos)

E ainda, segundo o entendimento do STF, no ARE 1392809 / RJ - RIO DE


JANEIRO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO, cuja decisão foi proferida
pelo Min. LUIZ FUX, com data de julgamento em 01/08/2022, com sua publicação em
02/08/2022, no presente caso, foi negado provimento do recurso, colhe-se trecho da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL. ANULAÇÃO DE LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. IPTU.


IMÓVEL SITUADO EM ZONA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL.
CADASTRO NO INCRA E RECOLHIMENTO DE ITR. RECURSO ESPECIAL
Nº 1.112.646/SP (RECURSO REPETITIVO). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA
DO PEDIDO. MANUTENÇÃO. 1. Controvérsia que se resume à regularidade, ou
não, de incidência de IPTU sobre o imóvel do autor, localizado em zona urbana,
mas alegadamente destinado à atividade agrícola. 2. Código Tributário Nacional
prevendo em seu art. 32, § 1º, que a zona urbana será definida pelo ente municipal
se presentes dois dentre cinco melhoramentos construídos e mantidos pelo Poder
Público, a autorizar a incidência do IPTU. Hipótese em que restou incontroversa a
existência de iluminação pública e escola primária amenos de 3 quilômetros, como
previsto no dispositivo mencionado. 3. Decreto-Lei nº 57/66 que, não obstante,
prevê a necessidade de analisar-se a destinação do imóvel no caso. Diploma
recepcionado como Lei Complementar pela Constituição Federal. Precedente do
Supremo Tribunal Federal. Superior Tribunal de Justiça que, em sede de recurso
repetitivo (REsp nº 1.112.646/SP) confirmou que não basta analisar-se o critério
geográfico para incidência de IPTU ou ITR, conforme art. 15 daquele decreto. 4.
Hipótese em que o autor comprovou que seu imóvel é cadastrado no INCRA como
propriedade rural (minifúndio), utilizado para plantio agrícola, com recolhimento de
ITR. Manutenção da sentença de procedência do pedido. Precedentes desta Corte.
DESPROVIMENTO DO RECURSO. Opostos os embargos de declaração, foram
rejeitados. No recurso extraordinário sustenta-se violação do(s) art.(s) 30, inciso
VIII; 182 a 191 da Constituição Federal. Decido.Analisados os autos, colhe-se do
voto condutor do acórdão atacado a seguinte fundamentação: A controvérsia se
resume à regularidade, ou não, de incidência de IPTU sobre o imóvel do autor,
alegadamente rural. É sabido que para a incidência de IPTU, o Código Tributário
Nacional prevê em seu art. 32, § 1º, que a zona urbana será definida pelo ente
municipal se presentes dois dentre cinco melhoramentos construídos e mantidos
pelo Poder Público.No caso, restou incontroverso que na região em que situado o
imóvel objeto da lide há iluminação pública e escola primária a menos de 3
quilômetros, perfazendo requisitos previstos no dispositivo acima. Não obstante, o
Decreto-Lei nº 57/1966 prevê que não basta, para conceituar o imóvel como urbano
e permitir a cobrança de IPTU, o critério geográfico. É necessário analisar
primordialmente a destinação do bem. Dessa forma, sobre o imóvel utilizado em
exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, incide o ITR, e
não o IPTU. E na hipótese os elementos juntados à inicial demonstram cabalmente
que o imóvel do autor se encontra cadastrado no INCRA como propriedade
agrícola, efetuando o recolhimento do ITR.

Desta forma, resta clarividente que, apesar de parecer confuso qual ente possui o
direito de realizar a cobrança em questão, o tema já passou por diversos debates que
pacificaram o entendimento conforme exposto acima, não restando dúvidas de que o imóvel é
comprovadamente usado apenas para fins rurais, sendo assim, o imposto correto a incidir
sobre ele é o ITR.

2. CONCLUSÃO

Em síntese, a problemática apresentada gira em torno da ausência de legalidade na


cobrança municipal do IPTU sobre imóveis destinados à produção agrícola, uma vez que
contraria a legislação atualmente em vigor.
O Decreto Lei n° 59.428/1966 define imóvel rural como um prédio rústico de área
contínua destinado à exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agroindustrial, independente
da sua localização. A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça reconhece que a
destinação do imóvel é o critério mais importante para a incidência de imposto sobre a
propriedade e, desta forma, a cobrança correta seria o ITR. Diante disso, a empresa em
questão deve permanecer pagando o ITR ao órgão federal competente e não o IPTU exigido
pela municipalidade.
Portanto, a falta de pagamento do IPTU não configura infração sujeita a sanções
previstas na legislação tributária municipal. Recomenda-se que a empresa regularize sua
situação tributária e pague os impostos devidos para cumprir com suas obrigações fiscais. A
jurisprudência já consolidou o entendimento sobre o tema.

É o parecer necessário.

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