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UNIDADE I
A COMPREENSÃO DA EXEGESE E TEOLOGIA BÍBLICA NOS DIAS DE HOJE
1PORTER Stanley E.(Ed.) A Handbook to the Exegesis of the New Testament. Boston/Leiden: Brill, 2002, p. 3-21.
2 Para Henry A. Virkler, hermenêutica é sinônimo de exegese, como o processo que resulta do estudo do cânon-crítica textual-crítica
histórica, e que segue para a teologia bíblica e/ou a sistemática. In: Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1998, p. 11. Para Luís
Mosconi, hermenêutica é a aplicação ou atualização, resultado da eisegese(ir ao texto)-exegese (o texto em si)-hermenêutica (o texto para
nós). Para uma Leitura fiel da Bíblia. São Paulo:Loyola, 2002, p. 111. Para Walter A. Henrichsen, o termo é interpretação, que abrange o
processo gramatical-histórico-teológico/doutrinário. Princípios de Interpretação Bíblica. São Paulo: Mundo Cristão, 1997, p.9.
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passagem da maneira como o escritor original intencionou que ele fosse entendido por
sua audiência. Veja as seguintes definições:
De acordo com W.G. Kümmel: 1) o exegeta deve procurar aprender com o texto
o que ele diz sobre as circunstâncias históricas no tempo de sua composição, seu
autor, os leitores aos quais foi endereçado, o meio intelectual que o originou e a
história externa e interna do Cristianismo primitivo; 2) o exegeta deve procurar
descobrir o significado objetivo do texto, isto é, aprender dele o que ele diz sobre o
assunto que é discutido, e o que quer dizer para o intérprete pessoalmente.
O problema da história
A exegese inclui tanto o que o texto significou no passado quanto o que ele
significa no presente. A distinção na Lingüística contemporânea que coloca isso em
termos de sincronia e diacronia. Quanto à primeira, o objetivo é descrever um texto
com base em sua coerência, estrutura e função na sua forma final. Quanto à segunda,
o objetivo é explicar os eventos e processos históricos que trouxeram o texto à
existência. A exegese que busca responder ao que o texto significa no presente,
normalmente se baseia em uma abordagem sincrônica ao texto: o que ele é. A
exegese que busca se interessa pelo que o texto significou se apoia pesadamente
sobre uma abordagem diacrônica do texto: como ele veio a ser o que é.
Por que é difícil ao exegeta ligar essas duas condições de existência do texto?
Primeiro, porque o Novo Testamento não foi escrito originalmente para nós,
leitores modernos. Mas para audiências antigas. De certo modo, somos observadores
intrusos de uma outra realidade que não vivenciamos.
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Quarto, porque existe também uma distância cultural entre os autores do Novo
Testamento e leitores atuais, principalmente na sociedade ocidental e globalizada.
O problema da Teologia
Auxílio Adicional:
CARSON D.A. Os Perigos da Interpretação Bíblica. São Paulo: Vida Nova, 2002. O
título original é: Falácias Exegéticas e já foi traduzido, em uma edição anterior, por: A
Exegese e suas Falácias. É uma ótima correção à metodologia exegética histórico-
gramatical, e oferece uma visão dos atuais evangelicais norte-americanos acerca das
atuais sugestões acerca da exegese.
MOSCONI Luis. Para uma Leitura fiel da Bíblia. São Paulo: Loyola, 2002. As páginas
103-172 trazem uma metodologia exegética baseada na análise literária e sociológica.
SANTOS Adelindo da Silva. Análise Exegética de João 19:28-30: Elementos literários
e narrativos. Belo Horizonte: FATE-BH, 2007 (monografia de graduação). Um trabalho
exegético experimental na Análise Narrativa.
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o sentido apenas como produto mental, mas como emocional e corporal; valoriza
sobremaneira o caráter social e conflitivo da produção do sentido, bem como o
elemento tensivo e passional na formulação do sentido” (25).
Zabatiero dá algumas razões pelas quais propõe se utilizar das teorias acima
para formular seu método. Dentre elas: 1) a principal tarefa da exegese não é a
compreensão do sentido do texto, mas dos sentidos da ação no texto e a partir do
texto. Desde que a leitura da Bíblia “é tarefa de comunidades cristãs, eclesiais,
missionárias, acadêmicas, familiares...é parte integrante da espiritualidade cristã e da
ação ministerial e missionária. Isto exige uma mudança do centro da tarefa: por isso o
sentido da ação vem ocupar o lugar do sentido do texto enquanto tal.” (22) 2) por isso,
o eixo central da exegese é a obra, o texto enquanto expressão de um conteúdo
simultaneamente pessoal e social; 3) a mudança da intenção do autor para ação no
texto requer a mudança da teoria e do método de interpretação do texto, que priorize a
ação testemunhada no texto; 4) a mudança da tarefa da exegese é feita em função da
mudança dos objetivos da exegese: a resposta do povo de Deus à ação de Deus no
texto bíblico, em termos de: crescimento espiritual, edificação da igreja, realização da
missão, transformação das pessoas, grupos sociais e da sociedade toda.
A partir das teorias escolhidas, Zabatiero formulou seu método “cujo centro é a
compreensão do sentido da ação e que se realiza através de cinco ciclos que giram ao
redor do centro e se complementam mutuamente” (26).
FASE PRELIMINAR
Familiarizar-se com o texto em seu contexto literário
1. ler o texto bíblico até ficar amplamente familiarizado com ele.
2. Anotar suas primeiras impressões e dúvidas sobre o texto (revisá-las a cada
ciclo da leitura)
3. Ler o livro, ou seção do livro, ao qual o texto pertence,notando as principais
interrelações (vocabulário, pessoas, lugares, assuntos).
4. Definir provisoriamente, a época em que o texto foi escrito e conhecer o
máximo que poder sobre ela.
FASE PREPARATÓRIA
Analisar o texto enquanto “plano de expressão”
1. Qual é o texto a ser interpretado (do ponto de vista da crítica textual e
genética)?
2. Como o texto está delimitado, segmentado e estruturado?
3. Que elementos do plano de expressão contribuem mais intensamente para a
produção do sentido?
FASE FINAL
Analisar o texto enquanto „plano de conteúdo”
4 Isto é sugerido pela expressão: “O ponto de partida é a “Fase preliminar”: a familiarização com o texto a ser interpretado” (34). E continua
repetindo as orientações do esquema e dos parágrafos anteriores.
5 Isto fica claro na afirmação: “O trabalho com o texto começa com a análise do plano da expressão” (35).
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que as pessoas realizam em determinado tempo e lugar, não reais, mas significados
no texto.
CONTEXTO
↑
DESTINADOR → MENSAGEM → DESTINATÁRIO
↓
CÓDIGO
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INFORMAÇÃO
↑
AUTOR → Enunciado → OBRA(NARRATIVA) → Apelo →
LEITOR
↑
LINGUAGEM
No esquema acima, o autor transmite ao leitor uma narrativa, a qual, de um
lado, reenvia ao mundo representado (a informação) e, de um outro lado, articula e
coloca em relação os signos verbais (a linguagem).
O Narrador é aquele que conta a história, a VOZ que guia o leitor na narrativa.
Pode estar explicitamente presente (um Eu ou uma personagem principal) ou estar
ausente (por trás da história). Na narrativa bíblica é normal a ausência do narrador que
cede seu lugar às ações de Deus na história.
O Autor Real é a pessoa (ou grupo) de pessoas que escreve o texto (a obra). O
Leitor Real é o indivíduo ou coletividade à qual ela é inicialmente destinada. Porém, o
Autor e o Leitor Real são personalidades históricas fora da atenção do leitor que abre
o livro. Eles existem fora do texto, independentemente do texto, e não podem ser
reconstruídos a não ser pela via da hipótese histórica com resultados bastante
decepcionantes do ponto de vista da certeza histórica. Isto porque a relação entre o
autor e sua obra é dialética: ele não se dá inteiramente em seu texto. Ele pode se dar
no papel de um narrador que não corresponde exatamente ao que ele pensa. Ele pode
criar um mundo imaginário, no caso da ficção, no qual ele mesmo não habita.
Leitor Implícito
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Todo Narrador, portanto, narra desde um ponto de vista particular. Ele também
pode usar personagens que contam partes da história ou personagens que vivem a
história para oferecer outros pontos de vista. Isso pode ocorrer da seguinte maneira:
Onisciência total: o narrador mostra conhecer tudo sobre o que está contando e
introduz comentários e opiniões visando direcionar o leitor.
Onisciência total neutra: o narrador evita comentários e opiniões, deixando o juízo por
conta do leitor.
“Eu” como testemunha: o narrador faz parte da história e a conta como um
personagem secundário.
“Eu” como protagonista: o narrador faz parte da história e a conta como um
personagem central.
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Que plano é sugerido a partir da seqüência de ações que são realizadas em cada
bloco narrativo?
Além das ações, existem pensamentos, discursos, sentimentos ou percepções
presentes na narrativa? Como esses elementos colaboram com as ações para
formular o plano?
Existem ações fundamentais para a narrativa e ações periféricas? Como essas
ações fundamentais ordenam a lógica do plano?
Há uma lógica temporal e espacial na ordem dos acontecimentos? Como ela
contribui para o plano? Se não existir, como isso afeta a organização do plano?
Há uma relação de causa-efeito entre as ações? Se há, como essa relação organiza
o plano? Se não há, como as ações se sucedem umas às outras?
Por fim, como o plano se organiza em função de uma tensão narrativa na qual um
conflito está em questão? Existem ações, idéias, desejos ou vontades opostas? Há um
início, um desenvolvimento e um clímax ou desfecho da tensão?
2.5 O personagem
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Os personagens são apresentados pelo Narrador. Ele conta algo sobre eles ou
usa outros personagens para fazê-lo. Por vezes, ele oferece uma descrição física,
social, cultural, étnica, familiar, etc. Outras vezes, ele retrata as ações, a linguagem, os
pensamentos e as crenças e valores de cada um.
Cenário espacial
Faremos isso com a ajuda dos seguintes textos: “Rhetorical Criticism”. In:
KENNEDY George A. New Testament Interpretation through Rhetorical Criticism
(North Carolina: NC Press, 1984); AMADOR J.D.H. Rediscovering and Re-
inventig Rhetoric (Scriptura 50 (1994) 1-40).6
6 As obras de: Aristóteles, Arte Retórica, e “Crítica Retórica”. In: CASTELLI Elizabeth A., et. al. (Orgs.) A Bíblia Pós-Moderna: Bíblia e Cultura
Coletiva. (São Paulo, Loyola, 2000, 155-190), também poderão ser consultadas aqui.
7 KENNEDY George A. New Testament Interpretation through Rhetorical Criticism. North Carolina: NC Press, 1984, p. 4.
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8 KENNEDY, Idem, p. 4.
9 AMADOR J.D.H. “Rediscovering and Re-inventing Rhetoric”. In: Scriptura 50 (1994) 1.
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pessoal com eles – Gal. 1:1), pathos (trata dos recursos que o orador utiliza para
demonstrar suas emoções ou mover as emoções dos ouvintes – 1 Tes. 2:13-16) e
logos (trata de como o assunto é de tal modo racionalmente demonstrado de modo a
convencer os ouvintes da sua veracidade). Eles podem ser de duas formas: indutivos
e dedutivos. Os indutivos usam uma série de exemplos para chegar a uma conclusão
final. Os dedutivos são silogismos cuja uma das partes é oferecida e da qual se
conduz o ouvinte a um raciocínio conclusivo. Eles podem ser: da premissa para a
conclusão, normalmente a transição sendo feita por um “portanto” ou “pois”; da
conclusão para a premissa, normalmente a transição sendo feita por um “porque” (Gal
3:6,7). Também, existem três tipos ou gêneros de discurso retórico: judicial (o orador
busca que a audiência tome alguma decisão acerca de algum evento ocorrido no
passado. O método é o do ataque e defesa 10); deliberativa (o orador busca que a
audiência tome alguma decisão acerca de alguma ação futura. O método é o da
persuasão e dissuasão); epideítico (o orador busca que a audiência reforce alguma
decisão que sustenta sua existência no presente. O método é o do louvor e acusação).
10 As referências ao método, nos três gêneros, são retiradas de: SOLCHZ Vilson. Princípios de Interpretação Bíblica. Canoas: ULBRA, 2006,
p. 204.
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Preliminares:
Unidade retórica: que corresponde à perícope na crítica da forma, com começo, meio
e fim.
Situação retórica: que corresponde ao sitz in leben da crítica da forma, que refere a
alguma condição específica histórica que controla a resposta retórica.
Problema retórico: o tema específico da situação retórica ao qual o orador se dedicará
em seu discurso.
Stasis
Definição do gênero
Estudo do Arranjo: a fase própria da Análise Retórica.
Revisão final: o discurso satisfez as exigências retóricas preliminares, quais as suas
implicações para orador e audiência.
Segundo J.D.H. Amador, o modelo de Kennedy acabou por manter a Análise
Retórica sob o historicismo da crítica das formas. Aqueles que o seguiram, de uma
forma ou de outra, acabaram por fazer da busca pela Situação Retórica um
mecanismo de fazer determinar historicamente a compreensão do texto. Ao contrário,
11 A divisão na estrutura final entre “apelo” e “conclusão” é de Vilson Scholz (206), não de George Kennedy (24). Conforme este, as duas
divisões são perfeitamente unidas na conclusão.
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Unidade retórica: esta pode ser uma unidade literária, mas deve ser argumentativa,
deve ser um esforço para persuadir ou convencer a audiência, para mudá-la de algum
modo. Pode ser pequena (máxima, parábola, metáfora, etc), mas devem ser
combinadas com unidades argumentativas maiores (sermão da montanha), e depois,
com um texto completo (Mateus), este texto dentro do cânon (NT) e este dentro da
cultura literária maior (Antigo Testamento e outras obras contemporâneas).
Postura relacional da unidade retórica: deve-se buscar como o orador procura
expressar seu ponto de vista para a audiência, o que significa discutir como a intenção
do autor e do leitor é colocada dentro do contexto histórico, mas também literário.
Método da argumentação: trata-se de descobrir os caminhos que modelam a
argumentação da unidade retórica, qual a sua estratégia argumentativa.
Mudanças na situação argumentativa: procura-se perceber se a continuidade do
discurso em uma unidade retórica maior favorece e conduz mudanças na situação
argumentativa, indicando novos estágios ou novas trajetórias.
Classificação do argumento: Stasis e situação retórica: somente após o estudo
realizado acima, pode-se determinar qual é a questão básica que está em discussão e
identificar o gênero retórico.
Significado contextual: reconstrução histórica: a reconstrução histórica indica as
muitas possíveis situações contextuais nas quais o texto pode ser lido e analisado.
Aqui, contexto ainda pode ser determinado pelo meio utilizado: escrito, falado,
cantado, dançado, dramatizado.
De todo modo, as preocupações com os usos da Análise Retórica não se
esgotam aqui. Há nítida preocupação contemporânea com o lugar do leitor/ouvinte,
12 AMADOR, Idem, p. 5.
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13 Uma obra que trata extensivamente desta questão, desde o método histórico-gramatical é: FEE Gordon, STUART Douglas. Entendes o
que Lês? São Paulo: Vida Nova, 1997.
14 ZABATIERO Júlio Paulo T. Idem, p. 146.
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Assim, um texto pode fazer várias coisas com a linguagem, como: representar
uma situação ou descrever as coisas; exprimir uma atitude mental ou emocional;
avaliar e emitir juízos sobre algo; dirigir a conduta de pessoas; comprometer as
pessoas; declarar algo sobre as pessoas. Para cada uma dessas ações existe uma
forma lingüística correspondente. Se a exegese consegue perceber isso no texto
interpretado, ela consegue responder à dimensão missional do texto que pede
Zabatiero.
também está orientada para a prática, pois se entende que o autor organizou o texto
de tal modo a induzir o leitor à ação, porisso se estuda o texto em busca da trama que
suscita a ação do leitor. Assim
detectar o “Modelo de Ação” de um texto é, pois o grande objetivo da
Pragmática Lingüística. O texto, na sua globalidade, é tomado como
uma sequência de motivos e indicações destinadas a provocar e
impulsionar o destinatário par a ação. O conjunto desta sequência de
indicações e motivos para a ação é o Modelo de Ação.23
Mas, ela também pode ser encontrada em metodologias como:
Agora, cabe responder, nos termos da Teologia, acerca das configurações para
a elaboração de uma teologia bíblica.
De novo, vamos contar com a ajuda de Júlio Zabatiero. Em seu método sêmio-
discursivo, o Ciclo 2 trata da Dimensão Teológica da Ação. Ele entende que a
dimensão teológica do texto está contida no discurso ou mensagem presente no texto.
Em sua mensagem reside a intencionalidade teológica do autor. E esta pode ser
percebida nos sentidos do texto. Estes são organizados através de:24
Você pode ver um bom exemplo do que Zabatiero está dizendo quando ele fala
da Teologia do texto presente em Marcos 1:9-11.25
27 Ibidem, p. 149.
28 DUNN James D.G. A Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo: Paulus, 2003, p. 30-46.
29 DUNN, Idem, p. 31.
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trata de saber quem ele foi de fato, no contexto do Novo Testamento. Ele foi
missionário, apóstolo, pastor, plantador de igrejas, mestre, também teólogo. Por que
focar apenas a sua teologia? Dunn oferece as seguintes respostas acerca do que seja
uma teologia de Paulo:
...o teste de uma boa teologia de Paulo será o grau em que permite ao
leitor e à Igreja, não só penetrar no mundo do pensamento de Paulo,
mas também entrar teologicamente em diálogo com as exigências que
faz e as questões de que trata, voltando sempre de novo ao próprio
texto...30
30 Ibidem, p. 33.
37
31 Ibidem, p. 38.
32 Ibidem, p. 40.
38
Por fim, Dunn assume que o caráter teológico multifacetado presente nas cartas
de Paulo possui uma questão mais básica: o caráter ou estrutura narrativa que subjaz
à sua teologia. Esta espécie de infra-estrutura consta de quatro níveis:
UNIDADE II
EXEGESE E TEOLOGIA DAS CARTAS PAULINAS
Unidade retórica: esta pode ser uma unidade literária, mas deve ser argumentativa,
deve ser um esforço para persuadir ou convencer a audiência, para mudá-la de algum
modo. Pode ser pequena (máxima, parábola, metáfora, etc), mas devem ser
combinadas com unidades argumentativas maiores (sermão da montanha), e depois,
33 Ibidem, p. 45,46.
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com um texto completo (Mateus), este texto dentro do cânon (NT) e este dentro da
cultura literária maior (Antigo Testamento e outras obras contemporâneas).
Postura relacional da unidade retórica: deve-se buscar como o orador procura
expressar seu ponto de vista para a audiência, o que significa discutir como a intenção
do autor e do leitor é colocada dentro do contexto histórico, mas também literário.
Método da argumentação: trata-se de descobrir os caminhos que modelam a
argumentação da unidade retórica, qual a sua estratégia argumentativa.
Mudanças na situação argumentativa: procura-se perceber se a continuidade do
discurso em uma unidade retórica maior favorece e conduz mudanças na situação
argumentativa, indicando novos estágios ou novas trajetórias.
Classificação do argumento: Stasis e situação retórica: somente após o estudo
realizado acima, pode-se determinar a situação retórica, e, a partir dela, qual é a
questão básica que está em discussão e identificar o gênero retórico.
Significado contextual: a reconstrução histórica indica as muitas possíveis situações
contextuais nas quais o texto pode ser lido e analisado. Aqui, contexto ainda pode ser
determinado pelo meio utilizado: escrito, falado, cantado, dançado, dramatizado.
Significado teológico: a dimensão missional (Zabatiero) e a pragmática (Sholz) se dará
como discussão propriamente teológica da Unidade Retórica.
Veremos, dessa maneira, como acontece nossa compreensão do texto da
Primeira Carta aos Tessalonicenses.
Estrutura Retórica:
Introdução (1:1-10): à maneira de uma narrativa (narratio), Paulo oferece breve relato
autoavaliativo da recepção do Evangelho (de Paulo, 5; a palavra, 6; a mensagem do
Senhor, 8) pela igreja e estabelece sua tese (propositio) a ser desenvolvida: fé, amor e
esperança são as marcas da igreja (3:3) que servem como modelo para todas as
demais da Acaia e da Macedônia (3:7). Estas marcas são associadas a três
qualificativos operantes: a fé opera o trabalho; o amor opera a motivação; a esperança
opera a perseverança. Estas marcas são desenvolvidas no relato como: a fé em Deus
(8), o amor pelo apóstolo (9) e a espera pelo Filho de Deus, Jesus (10). Uma marca
escatológica ressoa no final: o livramento da ira futura (10).
Primeira Unidade Retórica: a fé (2:1-3:13), demarcada por “irmãos...”
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Método da argumentação:
A estratégia argumentativa do Orador é uma mescla de:
Ethos: É contínua a reminiscência da estadia de Paulo entre os tessalonicenses
(2:1,2) desde como ele compartilhou da própria situação dos mesmos (2:7-13), e das
igrejas da Judéia (2:14). Esta visa fortalecer a participação na mesma situação como
condição para que o Orador seja ouvido a partir dos laços profundos que se
estabeleceram entre eles, Paulo, Silvano e Timóteo e os primeiros cristãos judeus na
Judéia.
Pathos. As reminiscências estão encharcadas de sentimentos que as envolvem, e se
tornam muito mais agudas à distância, geográfica e temporal. Os maus tratos e
insultos em Filipos e a “muita luta” (2:2); sentimentos de cuidados maternais, como:
bondade, afeição, doação, amor (2:7), e paternais, como a símile do “pai que trata os
filhos, exortando, consolando e dando testemunho para que vivam uma vida digna”
(2:11); o anseio por rever os tessalonicenses, no presente, com referências ao
coração e à saudade (2:17) e ao interesse pessoal (2:18) e à recompensa do trabalho
feito (2:19,20); a referência ao interesse também dos tessalonicenses (2:6); a oração
como expressão mais profunda do desejo de revê-los (3:11).
Logos. Abundam as provas lógicas do Orador em favor da sua integridade e
operosidade, a partir das reminiscências. Ele inverte a desonra em honra, ao
transformar a rejeição em Filipos e em Tessalônica, pelos judeus, como prova de quer
agradar a Deus e não aos homens = “aprovados por Deus” (2:4) e “Deus é
testemunha” (2:3-6); a conduta entre os tessalonicenses de: santidade, justiça e
irrepreensibilidade (2:10), de não ser um peso e o trabalho extenuante (2:7,9); o
comportamento atribuído a uma mãe e a um pai (2:7,11); as perseguições que os
tessalonicenses sofreram e sofriam são o bom resultado da recepção da palavra de
Deus, comprovado pela mesmas perseguições que as igrejas na Judéia sofreram dos
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judeus (2:14); o envio de Timóteo e a alegria por seu retorno a Paulo como prova do
seu interesse pessoal (3:1-1,2,5,6); a referência ao interesse pessoal dos
tessalonicenses como prova da correção do interesse de Paulo (3:7-10); a oração
como prova do inequívoco interesse no bem-estar dos tessalonicenses (3:12-13).
Significado contextual:
Atos 16 é a base para a reconstrução histórica desta Unidade Retórica. Está
claro o conflito entre a pregação do Evangelho por Paulo na região da Macedônia e os
judeus que vivem na região. Estes não permitem que Paulo anuncie a Jesus, o Cristo
e o perseguem de cidade em cidade. Já, no caso da igreja em Tessalônica, não fica
claro se o conflito é entre ela e os judeus da cidade, visto que não parece existir
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sinagoga ali, ou com os seus próprios concidadãos, visto a mudança de conduta que a
recepção do Evangelho operou entre os participantes da igreja (
Significado teológico:
A riqueza de lembranças das ações dos apóstolos e da igreja ao longo da
Unidade Retórica aponta para uma caracterização da missão realizada em um
ambiente adverso e conflituoso, o que pede uma fé que seja capaz de não apenas
sobreviver perante ele, mas também realizar obras ou operar uma vivência conforme a
recepção do Evangelho. As abundantes palavras-ação que seguem as reminiscências
têm em vista operar o agir da fé. Fica evidente que o Evangelho se trata de uma
mudança radical no estilo de vida daqueles que, crendo nele, o recebem, e que requer
uma atitude ou operosidade igualmente radical desta fé. Esta se dá no meio no qual se
vive, sendo uma fé para o cotidiano. Esta fé assim demonstrada agrada a Deus, ainda
que desagrade àqueles que estão ao redor, o que aumenta a maior honra daquele que
crê. A unidade da igreja é afirmada em termos da relação entre ela e os apóstolos em
meio à participação nos mesmos sofrimentos e operosidade da fé.
II – Exegese e Teologia da segunda carta aos Tessalonicenses
Estrutura Retórica:
Introdução (1:3-12): Há uma recuperação das marcas da fé, amor e esperança
presentes na Primeira carta (3-5). A esperança, à semelhança da Primeira carta, é
acentuada e radicalizada em termos da vinda do Senhor Jesus, que trará alívio para a
igreja e juízo sobre os seus perseguidores (6-10), concluída pela oração de petição
(11,12). É possível dizer, à luz deste horizonte, que esta é a tese (propositio) acerca
da qual o discurso será desenvolvido daí em diante.
Primeira Unidade Retórica: “a vinda do Senhor” (2:1-17), demarcada por “Irmãos”.
Segunda Unidade Retórica: a vida atual de Paulo, Silvano e Timóteo e da igreja dos
tessalonicenses perante a espera da vinda do Senhor (3:1-16), demarcada por
“Finalmente, irmãos...” e concluída pela bênção (16).
Conclusão (3:17,18): com despedida e bênção final.
Unidade retórica:
Analisaremos a Primeira Unidade Retórica que trata da vinda do Senhor (2:1-
17). Trata-se de um discurso sobre o dia da vinda do Senhor, estreitamente vinculado
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Significado contextual:
Uma carta ou comunicação de Paulo que chegou à igreja dos tessalonicenses
gerou inquietação e alarme acerca da definição do dia da vinda do Senhor. O falso
discurso será combatido por Paulo por meio do seu discurso verdadeiro.
Significado teológico:
São enormes a repercussão do discurso desta Unidade Retórica para a reflexão
teológica acerca da expectativa escatológica de Paulo e que ele transmitia às suas
igrejas. Assuntos como: a iminência do dia da vinda do Senhor; dos sinais que a
precedem; dos personagens que confrontam a vinda do Senhor – Satanás e o
Perverso; personagem que são incógnitas – o que detém o Perverso; Tudo indica que
esta teologia depende daquela inicialmente desenvolvida na Primeira epístola (4:13-
5:11), mas que segue em descontinuidade com ela. Também é clara uma teologia
incipiente da igreja à luz dessas condições escatológicas, pois ela é separada dos
demais pela vontade de Deus e será salva da ira que Deus derramará sobre as
impiedades dos que não creram no Evangelho. A análise do ambiente que cerca o
apóstolo e a igreja também é tipicamente descrito em termos da degradação do
pecado gerado pelo engano atribuído ao Perverso, mas, ao final, de origem absoluta
em Satanás, o grande adversário da vinda do Senhor. O agir, neste ambiente, se trata
de não se deixar enganar ou seduzir e se apegar firme às orientações do apóstolo,
além de ter firme esperança no livramento que Deus trará naquele dia.
Estrutura Retórica:
Introdução (1:1-10): Há breve defesa do seu apostolado por Paulo (1) e do evangelho
que ele anunciou às igrejas da Galácia (2). Segue um relato (narratio) (6-9) das
circunstâncias polêmicas que movem Paulo a elaborar seu discurso, dentro do qual se
encontra a sua tese (propositio): somente o Evangelho de Cristo anunciado por Paulo
aos gálatas é o evangelho verdadeiro. Conclui com uma nova defesa do seu
apostolado que combina bem com o v. 1. O que segue é uma sequência
argumentativa acumulativa, na qual diversas unidades retóricas são sobrepostas à
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medida que o discurso avança, no intuito de oferecer uma única prova conclusiva aos
gálatas de que o seu (de Paulo) Evangelho é verdadeiro: a recepção da promessa do
Espírito só é possível pelo Evangelho de Cristo.
Primeira Unidade Retórica (1:11-2:21): Delimitado, de início, pelo termo característico
“Irmãos” (1:11), Paulo reconstrói as origens do Evangelho de Cristo por ele anunciado,
a partir de uma sucessão de narrativas visando oferecer uma base histórica para o
julgamento das igrejas da Galácia (1:13-2:14). Este argumento é encerrado com uma
reflexão teológica conclusiva a partir da base histórica do encontro com Pedro (2:15-
21).
Segunda Unidade Retórica (3:1-6:10): Delimitado, de início, por “ó gálatas
insensatos!”, que afirma a presença de um ensino ao qual se opor: “quem os
enfeitiçou?”, por meio de uma sequência de argumentos que se sobrepõe
acumulativamente, que visam re-apresentar o Evangelho de Cristo pregado por Paulo
anteriormente: “Não foi diante dos seus olhos que Jesus Cristo foi exposto como
crucificado?” (1). Esta é uma reminiscência da afirmação da apresentação inicial da
carta (1:4, “Jesus Cristo, que se entregou por nossos pecados”). A conclusão deles é
que a promessa do Espírito está baseada no Evangelho. Esses argumentos podem
ser relacionados como seguem:
Primeira Subunidade Retórica (3:1-5): argumentação quanto ao passado: a promessa
de Deus de dar o Espírito é recebida pelo Evangelho de Cristo (3:5).
Segunda Subunidade Retórica (3:6-14): argumentação quanto ao passado: a
promessa foi dada gratuitamente a Abraão (6:14).
Terceira Subunidade Retórica (3:15-4:7): argumentação quanto ao passado: a
promessa dada a Abraão é recebida por todos por meio da fé no Evangelho de Cristo
e torna a todos filhos de Deus (3:26-29;4:6).
Quarta Subunidade Retórica (4:8-20): argumentação quanto ao presente: referência
ao encontro pessoal passado com os gálatas visa reorientar a experiência atual dos
gálatas (4:19).
Quinta Subunidade Retórica (4:21-31): reafirmação da argumentação quanto ao
presente: apelo à exegese bíblica (4:31).
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