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Universidade de São Paulo

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto


Departamento de Química

Áquila Lanza de Paula

Análise da percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a disciplina Química

Ribeirão Preto/SP
2014
Áquila Lanza de Paula

Análise da percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a disciplina Química

Monografia apresentada ao Departamento de


Química da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras de Ribeirão Preto da Universidade
de São Paulo como requisito para conclusão
do curso de Licenciatura em Química.

Orientadora: Carolina Godinho Retondo

Ribeirão Preto/SP
2014
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

De Paula, Áquila Lanza

Análise da percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a disciplina


Química. Monografia. Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto. Universidade de São Paulo/USP. 2014.
72 páginas

Monografia apresentada ao Departamento de Química da Faculdade


de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto/USP. Área de
concentração: Ensino de Química.

Orientador: Retondo, Carolina Godinho.

1. Ensino Médio. 2. Currículo. 3. Motivação.


Áquila Lanza de Paula

Análise da percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a disciplina Química.

O presente exemplar corresponde à redação final da Monografia apresentada por

Áquila Lanza de Paula e aprovada pela comissão julgadora.

Ribeirão Preto, ____ de _______________de _______.

_____________________________________________________________
Educadora Carolina Godinho Retondo
Departamento de Química – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto –
Universidade de São Paulo

______________________________________________________________
Ms. Janaína de Godoy Gonçalves
Departamento de Química – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto –
Universidade de São Paulo

_______________________________________________________________
Ms. Bruno Zoccaratto Favarin
Departamento de Química – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto –
Universidade de São Paulo
Agradecimentos:

Aos meus pais, José Luiz e Maria Elena,


por aceitarem minhas escolhas apesar de nem sempre concordar com elas,

Ao meu irmão,
com quem dividi alegrias, tristezas e os anos de graduação, me mostrando como me portar
com estoicismo diante das agruras da vida,

A minha namorada, Roselaine,


por todos os anos que estamos juntos, me ajudando e apoiando,

A minha orientadora, Carolina,


uma pessoa sensacional, inestimável com sua ajuda e sem a qual certamente este trabalho não
teria sido realizado,

Aos membros da minha banca, Bruno e Janaína


por aceitarem fazer parte deste trabalho,

Aos meus amigos, verdadeiros irmãos


que me colocaram de volta no caminho certo, dizendo o que certamente ninguém mais diria.
“Não viveu em vão aquele que morre no dia em que descobre o Caminho.”

Confúcio
De Paula, A. L. Análise da percepção dos alunos do Ensino Médio sobre a disciplina
Química. Monografia. Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto.
Universidade de São Paulo/USP. 2014.

RESUMO

Neste trabalho foi feita uma pesquisa de campo com os alunos do Ensino Médio de uma
escola pública de Monte Santo de Minas, em relação à disciplina Química. Para tal, foi
elaborado e aplicado um questionário semiaberto bem amplo. Por meio desse instrumento foi
verificado se os estudantes gostam ou não da disciplina, como são as atividades em sala de
aula e fora dela, se percebem sua importância no cotidiano, na indústria, no ambiente e na
sociedade. Além disso, foi verificado se o estudante prosseguiria seu estudo e escolheria a
área de Química. Os resultados mostraram que os recursos audiovisuais, a contextualização, a
interdisciplinaridade e a experimentação não estavam presentes na escola, porém, os
estudantes mostraram-se favoráveis a inserção da experimentação. Além disso, conclui-se que
muitos não possuem interesse pela disciplina, bem como não sabem o papel da Química na
sociedade e nas relações do cotidiano e com outras áreas do conhecimento, por vezes citando
exemplos distantes e estereotipados.

Palavras-chave: Ensino Médio, Currículo, Motivação.


LISTA DE SIGLAS

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação e Cultura

PCNEM Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio de 2000

PCN+ Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais de 2002

PNLD Programa Nacional do Livro Didático


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Sistematização das respostas obtidas para a questão 2 (Sexo).................................47


Figura 2: Sistematização das respostas obtidas para a questão 1 (Idade).................................47
Figura 3: Sistematização das respostas obtidas para a questão 5 (Você trabalha? Qual é o seu
trabalho?)..................................................................................................................................48
Figura 4: Sistematização das respostas obtidas para a questão 32 (O professor faz uso de
experimentos ou leva a turma para o laboratório?).................................................................52
Figura 5: Sistematização das respostas obtidas para a questão 22 (Você acredita que aprender
Química irá ajudá-lo(a) em algo na vida ou seu no dia-a-dia?)..............................................57
Figura 6: Sistematização das respostas obtidas para a questão 20 (Para você, a Química serve
para:)........................................................................................................................................57
Figura 7: Sistematização das respostas obtidas para a questão 19 (Como você se sente nas
aulas de Química?)...................................................................................................................58
Figura 8: Sistematização das respostas obtidas para a questão 11 (Qual a nota de Química que
você tirou no último bimestre?)................................................................................................59
Figura 9: Sistematização das respostas obtidas para a questão 12 (Você vai prestar
vestibular?)...............................................................................................................................62
Figura 10: Sistematização das respostas obtidas para a questão 14 (Se respondeu sim ou
talvez, por que?)........................................................................................................................63
Figura 11: Sistematização das respostas obtidas para a questão 15 (Se respondeu não, por
que?)..........................................................................................................................................63
Figura 12: Sistematização das respostas obtidas para a questão 16 (Prestaria vestibular para
as profissões correlatas como farmácia, engenharia química, engenharia de alimentos,
etc.?).........................................................................................................................................64
Figura 13: Sistematização das respostas obtidas para a questão 17 (Se respondeu sim ou
talvez, por que?)........................................................................................................................64
Figura 14: Sistematização das respostas obtidas para a questão 18 (Se respondeu não, por
que?)..........................................................................................................................................65
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Sistematização das respostas obtidas para a questão 30 (Qual o principal tipo de
material didático utilizado? Cite:)...........................................................................................49
Tabela 2: Sistematização das respostas obtidas para a questão 10 (Se respondeu mais ou
menos, por que?).......................................................................................................................54
Tabela 3: Sistematização das respostas obtidas para a questão 21 (Você sabe onde o químico
trabalha? Cite:)........................................................................................................................54
Tabela 4: Sistematização das respostas obtidas para a questão 24 (O professor explica sobre
as aplicações e utilidades da Química? Cite um aspecto do cotidiano relacionado com
química)....................................................................................................................................55
Tabela 5: Sistematização das respostas obtidas para a questão 29 (O professor relaciona
algum conteúdo de Química com conteúdos de outras disciplinas? Se sim ou às vezes,
cite)...........................................................................................................................................56
Tabela 6: Sistematização das respostas obtidas para a questão 25 (Consegue entender o
conteúdo das aulas de Química?).............................................................................................59
Tabela 7: Sistematização das respostas obtidas para as questões 25 e 26 (Consegue entender o
conteúdo das aulas de Química?/ Você tem dificuldade em entender a explicação do
professor?)...............................................................................................................................59
Tabela 8: Sistematização das respostas obtidas para a questão 24 (Você gosta do professor de
Química)...................................................................................................................................61
Tabela 9: Sistematização das respostas obtidas para a questão 13 (Você vai prestaria
vestibular para Química?)........................................................................................................62
Sumário

APRESENTAÇÃO ....................................................................................................... 11

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 14

1.1 O currículo e o ensino de Ciências/Química no Brasil ............................... 17

2 OBJETIVOS .............................................................................................................. 26

3 METODOLOGIA ...................................................................................................... 27

4 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................... 30

4.1 A organização escolar ................................................................................. 32

4.2 O estudante do Ensino Médio e a motivação para estudar Química........... 35

4.3 As tendências educacionais, os materiais e os recursos didáticos que podem


ser inseridos nos currículos de Química ....................................................................... 38

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................... 46

5.1 Identificação da unidade escolar ................................................................. 46

5.2 Análise da pesquisa realizada na escola...................................................... 46

6 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 68

REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 70
11

APRESENTAÇÃO

Como uma parcela das crianças, comecei a me interessar por ciências ao assistir
programas de televisão como “O mundo de Beakman” que traziam experimentos e
explicações sobre os fenômenos naturais. Nessa época, com aproximadamente 11 ou 12 anos,
eu morava na cidade de Campinas e estudava numa escola particular. Embora tivesse bons
professores de ciências, as aulas ministradas por eles não tinham experimentos, nem
explicações lúdicas como eram fornecidas na televisão, assim, meu maior interesse pelo
universo científico se dava pelo que assistia nos programas.
Pouco tempo depois, mudei para a cidade de Monte Santo de Minas e comecei a
trabalhar (aos 13 anos) como “aprendiz” em uma oficina de manutenção de implementos
agrícolas e usinagem. Mantive-me neste emprego por muitos anos, inclusive durante o Ensino
Médio. Embora, nem sempre tenha sido muito agradável, hoje em dia enxergo essa
experiência como positiva em alguns aspectos.
Ao chegar ao Ensino Médio, que cursei em escola pública, estava empolgado para
aprender formalmente sobre os conteúdos da ciência, que para mim eram fascinantes. Porém,
ao me deparar com um grupo de professores despreparados e um sistema educacional
decadente, em uma época em que eu já dividia o tempo de estudo com o do trabalho, a
decepção foi algo natural. Natural também foi a procura por outras atividades, como as
esportivas, uma vez que meu interesse pela escola foi diminuído.
Ocasionalmente lia um livro ou outro sobre Física, mas me faltava ânimo e um
conhecimento mais aprofundado para entender alguns temas. Vindo de uma cidade pequena,
onde não havia livrarias e a biblioteca da minha escola não funcionava, eu começava a achar
muito difícil estudar. Internet não era uma realidade para mim na época e só veio a ser depois
de um bom tempo.
A falta de preparo específico dos meus professores, a minha situação financeira, não
muito boa na época, a falta de interesse (ou apenas ignorância) da escola em apresentar as
universidades e as profissões são fatores que fizeram eu terminar o terceiro ano do Ensino
Médio sem saber o que era vestibular. Não que eu me importasse muito, tinha outras coisas
com o que me preocupar. Neste ponto – e em parte por pressão dos meus pais em continuar a
estudar alguma coisa – fui buscar um curso Técnico profissionalizante na área em que eu já
trabalhava. Comecei o Técnico em Mecânica, no tradicional Centro Paula Souza na cidade de
Mococa, que ficava a aproximadamente 50 km da cidade onde eu morava.
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Embora o curso tivesse algumas limitações e o foco principal fosse o exercício da


profissão em si, foi neste local que tive um contato mais adequado (ou aprofundado, por
assim dizer) com alguns conteúdos de Física e Matemática. A natureza do meu emprego
requeria um conhecimento mínimo de Matemática, mas com o curso comecei a vislumbrar
algumas possibilidades diferentes. Foi lá também que aprendi um pouco sobre as
universidades e os vestibulares.
Formei-me 18 meses (era esse o tempo mínimo na época) depois e continuei
trabalhando, durante o período integral. Minhas opções haviam diminuído uma vez que meu
dia estava completamente ocupado e, por incentivo de colegas e do meu irmão, que realizou o
curso junto comigo, resolvi fazer o Técnico em Eletrônica, novamente no Centro Paula Souza.
Voltei então a viajar para a cidade vizinha todas as noites. Como eu não tinha condições de
pagar uma faculdade e o curso era gratuito, tomei essa decisão para continuar estudando.
Mantive-me em contato com o ambiente educacional por mais um ano e meio, embora desta
vez a experiência não tenha sido muito boa. Nesse momento da minha vida, o meu acesso aos
livros e aos materiais didáticos já era maior e utilizei razoavelmente bem essa oportunidade.
Porém, devido a uma greve, a minha turma foi severamente prejudicada no curso e, após uma
conversa sobre o tema com os professores, pude ver e sentir em primeira mão o descaso de
alguns profissionais da educação com os estudantes.
Desta vez, cursei os 18 meses, fiz o estágio obrigatório, mas não me formei, devido a
alguns problemas pessoais com um professor. Simplesmente não tive vontade de realizar os
exames que ele aplicava e nem a recuperação. Reprovei. Terminei este curso sem nenhuma
vontade de voltar ao ambiente escolar falido e decadente. Se algum dia voltasse seria pra
tentar um curso superior. Passei os próximos anos trabalhando, até que um dia resolvi tentar
mudar o rumo da minha vida e voltar a estudar. Iniciei, então, um curso preparatório para
vestibular e optei por seguir uma carreira em ciências exatas.
Como sempre me interessei por alguns temas sociais e políticos, licenciatura era uma
boa opção (além, é claro, de ser oferecida à noite). Talvez eu quisesse ser um bom professor
para não repetir o erro dos meus professores. Na escolha do curso o que mais determinou foi a
localidade do campus, pois Ribeirão Preto é a cidade que possui uma faculdade pública de
mais fácil acesso até cidade onde meus pais residem.
Hoje, terminando o curso que escolhi, após muitas vezes ter me perguntado ao longo
do mesmo se era essa profissão que eu queria, tenho um pouco mais de maturidade para
analisar minha passagem pela universidade. Observo que os docentes têm comportamentos
variáveis, por exemplo, existem alguns que usam de sua capacidade de oprimir os estudantes,
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enquanto outros são muito bons. Assim, de certa forma, os problemas que encontrei na
universidade são muito parecidos com os dos cursos que realizei anteriormente, só que em
escala e proporção diferentes.
Agora sob um novo prisma, posso olhar novamente para o Ensino Médio e ver que há
muitos problemas a serem resolvidos – não que eu seja capaz de resolvê-los. Desta nova ótica
é possível analisar como os estudantes se sentem em relação a determinadas disciplinas. No
meu caso, eu não obtive quase nenhum conhecimento de Química e Física nesta etapa do
ensino, havia um total descaso por parte dos docentes. Assim, nunca estive realmente
motivado para estudar tais disciplinas. Porém, é possível que se tenha professores que se
empenhem em ministrar o conteúdo de forma a torná-lo interessante ou até mesmo explícito
para os estudantes.
Assim, juntamente com a minha orientadora, resolvemos procurar perceber como os
estudantes no Ensino Médio entendem a disciplina de Química. Existem vários ângulos para
analisar esta percepção e também a motivação em relação a esta disciplina, como aspectos
curriculares, estrutura do curso, afinidade com os professores, problemas e situações próprios
à juventude (fase da vida em que se encontram), entre outros. A partir desta premissa, este
trabalho foi elaborado objetivando perceber como os estudantes interagem com a disciplina
mediante alguns destes aspectos.
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1 INTRODUÇÃO

O que me ligava à educação era a notícia. Quando eu estava na escola, o que me


ensinavam era tão distante daquele mundo de sensibilidade... Lembro que eu
acompanhava a questão da África do Sul, acompanhava toda a formação do Estado
de Israel, a agitação política no Brasil – isso tudo me fascinava. Mas, na escola, só
me ensinavam, e aqui vou caricaturar, o vovô viu a uva. Eu não era medido pela
sensibilidade que tinha como o conhecimento do mundo, era medido pelo vovô viu a
uva. - Gilberto Dimenstein (2003)

É costumeiro alguém se sentir incomodado ao assistir uma palestra, um filme, um


teatro, um show ou algum outro tipo de apresentação e resolver abandoná-lo. Isso é possível
quando a adesão à atividade é voluntária. Porém, não é possível abandonar uma aula que está
sendo oferecida no ensino formal. Nos atuais moldes em que se encontra a maioria das
instituições de ensino brasileiras, ao estudante não é dada à opção de livre trânsito na sala de
aula e tampouco a escolha dos cursos que ele irá fazer.
Dessa forma, pode-se afirmar que o currículo da maioria das escolas nacionais não é
flexível. Além disso, em muitos casos, o ensino é oferecido de acordo com a concepção
“bancária” de Paulo Freire (1987). Assim, em sala de aula pode ocorrer uma relação em que o
estudante passa a receber passivamente as informações, não decidindo o que quer aprender.
De acordo com o autor:

Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os


educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e
repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem
de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-
los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores das
coisas que arquivam. No fundo, porém, os grandes arquivados são os
homens, nesta (na melhor das hipóteses) equivocada concepção “bancária” da
educação. Arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis, os homens não
podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta
destorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não
há saber. Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta,
impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e
com os outros (p. 33).

É possível identificar pelo conceito de “educação bancária”, descrito por Freire, que o
saber ocorre como uma doação. O autor enfatiza que o saber é entregue aos que julgam nada
saber por aqueles que se julgam sábios, constituindo um instrumento da ideologia da
opressão. Ocorre, então, uma “alienação da ignorância” - onde esta se encontra sempre no
outro. Hypolito (2010) discute que isso pode ser resultado, em alguns casos, da intervenção e
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regulação que o Estado exerce na educação, muitas vezes de caráter neoliberal.


Esse tipo de discurso e, consequentemente, de modelo de ensino é centrado no
conhecimento absolutizado, sem relação com as formas de pensar. É como se fosse uma
palestra e não uma aula. Michael Young (2007), em seu texto “Para que servem as escolas”,
escreveu: “Para muitos pesquisadores educacionais, uma ênfase no conhecimento mascara o
ponto até o qual os detentores do poder definem o que conta como conhecimento (p. 1289).”
Assim, podemos considerar os fatores que são relacionados diretamente com o modo
como o currículo é determinado e as intenções por detrás da proposição e implementação do
mesmo. Tomaz Tadeu da Silva e Antônio Flávio Moreira (1999), em sua obra “Currículo,
cultura e sociedade”, dizem:

Segundo Kliebard (1974 ) – duas grandes tendências podem ser observadas


nos primeiros estudos e propostas: uma voltada para a elaboração de um
currículo que valorizasse os interesses do aluno e outra que desenvolvesse as
aspectos da personalidade adulta então “desejáveis” (MOREIRA e SILVA,
1999, p.11).

Nesse sentido, pode-se perguntar: O currículo é feito para os alunos ou para formar
cidadãos desejáveis à sociedade e suas necessidades econômicas inseridas na nova ordem
mundial? O que esses cidadãos desejáveis devem saber, de acordo com o que está
estabelecido neste currículo? Quem impõe o currículo nas escolas brasileiras? O Estado? A
direção da escola? Os professores? Os autores dos materiais didáticos adotados? Ou ainda a
combinação de todos esses atores? Como é definido esse currículo que é recebido, muitas
vezes, de forma passiva e obrigatória pelos alunos? Ou seja, quem determina o currículo e
como o mesmo é determinado? Todas essas questões não são fáceis de responder, inclusive,
não há uma resposta definida para elas. Sabe-se que o currículo é resultado de várias
interações e relações que são estabelecidas entre as diferentes classes, mas principalmente é
produto das ideologias dos grupos dominantes. De acordo com Apple (1989), na obra
“Currículo e Poder”:

[…] o currículo não existe como um fato isolado. Ao invés, ele adquire
formas sociais particulares que corporificam certos interesses que são eles
próprios os resultados de lutas contínuas dentro e entre os grupos
dominantes e subordinados. Ele não é resultado de algum processo abstrato,
mas é o resultado dos conflitos, acordos e alianças de movimentos e grupos
sociais determinados (APPLE, 1989, p. 47).

Souza Junior, Santiago e Tavares (2011), no texto “Currículo e saberes escolares:


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ambiguidades, dúvidas e conflitos”, falam sobre a responsabilidade das escolas para contribuir
com a educação:

Na seleção do conhecimento, identificamos diferentes fontes para suas


escolhas, tais como a proposta pedagógica, o livro didático, a formação
continuada as orientações legais, a exemplo dos Parâmetros Curriculares
Nacionais; percebemos também a relevância dessa seleção, ora por
justificativas do uso social dos conteúdos de ensino, ora por preparação para
o vestibular; e ainda pelas compreensões presentes nos elementos da teoria
pedagógica orientadores de teorizações e de diferentes concepções de escola,
disciplina, professor, aluno (SOUZA JUNIOR, SANTIAGO e TAVARES,
2011, p. 187).

Dessa forma, os autores defendem que o currículo nas escolas é influenciado por
vários fatores tanto intrínsecos à instituição, quanto externos a esta. Dessa forma, o educador
sofre a influência da sua própria formação, das concepções de ensino da direção e dos demais
professores, ao mesmo tempo em que têm que seguir documentos legais que representam o
Estado, os materiais didáticos adotados pela escola e tem que pensar em para quê será
utilizado aquele conhecimento (como no caso das escolas que adotam seu ensino visando a
preparação para o vestibular). Os autores ainda refletem que há outras influências no arranjo
dos saberes escolares:

Na organização do conhecimento, observamos que as condições escolares


para a documentação e o acompanhamento do planejamento, o
conhecimento da turma e o uso de recursos e instalações interferem no
arranjo dos saberes. Da mesma forma que a tipologia e a quantidade dos
conteúdos da disciplina, o tempo estrutural para sua organização, seja em
série ou ciclo, condicionam a disposição do conhecimento. Na
sistematização do conhecimento, verificamos que os princípios, os métodos
e os procedimentos dos aspectos metodológicos, assim como os elementos
referentes ao tempo necessário às aprendizagens dos alunos e seus métodos
e procedimentos de avaliação contribuem na constituição dos saberes
escolares (SOUZA JUNIOR, SANTIAGO e TAVARES, 2011 p. 187).

Portanto, é até inocente pensar que somente os conteúdos propriamente relacionados


com as disciplinas em si são levados em consideração na elaboração de uma proposta de
currículo, há também uma parcela de caráter ideológica que está inserida no mesmo, ou seja,
há a tentativa de moldar a personalidade dos estudantes para algo que seja interessante às
classes dominantes ou ao grupo formado pelas classes economicamente dominantes, que
incluem as empresas, as indústrias e o poder público.
Na prática, em uma última instância, quem exerce o currículo efetivamente é o
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professor, no espaço da sala de aula. Neste ambiente, os valores buscados na construção de


aspectos da personalidade e os conteúdos programáticos são de fato ensinados. O professor
pode, então, seguir a cartilha proposta pela escola (ou pelo governo) ou não. Um fato que
chama a atenção é o de que os aspectos ideológicos e políticos são, então, vinculados à prática
pedagógica, quer o professor reconheça e assuma isto ou não.
O currículo - que sofre influências diretas do sistema político, econômico e social, que
é definido pelos documentos do Estado, pelos objetivos da escola, pela direção e que é
aplicado pelos educadores, sendo vivenciado pelos estudantes - determina essa visão
disciplinar. E como é para a área das ciências? E para a disciplina de Química? Na próxima
parte do texto, a partir de um histórico, pode-se entender como o currículo desta disciplina foi
mudando.

1.1 O currículo e o ensino de Ciências/Química no Brasil

A educação no Brasil, no período da Primeira República (período que vai de 1889 até
1930), começava seus primeiros passos no sentido de estabelecer um ensino formal e gratuito
que atingisse uma maior fatia do contingente populacional. Boa parte da população era
analfabeta e o acesso às escolas era praticamente restrito às classes dominantes. Assim, neste
período, primeiras mudanças começaram a ocorrer e de acordo com Rossi et al. (2009):

A Primeira República é assinalada, também, pela propagação do pensamento


renovador da educação. Desde a segunda metade do século XIX, mais
especificamente 1870, as finalidades educativas do ensino primário foram
renovadas e se revelavam por meio de diferentes correntes pedagógicas. Os
novos propósitos traçados para a (e pela) escola primária alteravam
significativamente sua função. Transformando-se a escola do instruir em
escola do educar, repensava-se com profundidade a formação dada ao aluno
(ROSSI, RODRIGUES e NEVES, 2009, p. 97).

Neste período a importância do ensino das Ciências Naturais começou a fazer parte da
pauta dos educadores e este processo pode ser mais bem compreendido levando em
consideração vários aspectos, inclusive os políticos-educacionais. Do ponto de vista histórico,
pode-se identificar uma preocupação dos educadores com a situação da educação em geral,
inclusive essa necessidade de mudança foi expressa com a publicação do Manifesto da
Educação Nova (1932). Sobre o Manifesto, Machado (2009) reflete que:

Vinte e seis educadores assinaram o Manifesto, sendo que muitos deles se


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tornaram importantes na história da educação brasileira, como Fernando de


Azevedo, Lourenço Filho, Paschoal Lemme, Cecília Meireles, Afrânio
Peixoto, Sampaio Dória, Nóbrega da Cunha, Anísio Teixeira. Este último,
que divulgou amplamente o ideário escolanovista, tinha como pressuposto
que a educação era a base de qualquer sociedade civilizada. Em sua visão, a
sociedade estava se transformando devido ao desenvolvimento da ciência, e
consequentemente isto desencadearia mudanças na escola, onde as ciências
tornar-se-iam conteúdos fundamentais. Ele criticava a escola tradicional, que
devido ao seu caráter autoritário, não preparava o homem para as mudanças:
era preciso prepará-lo para refletir sobre seus problemas e encontrar soluções
(p. 108-109).

Aqui se nota um movimento para o desenvolvimento e estudo da ciência nas


instituições escolares, já que esta contribuía para as mudanças sociais, assim havia a
preocupação de um grupo de educadores influentes da época em inserir formalmente o ensino
de Ciências nas salas de aula. Porém, alguns anos ainda se passariam até que as proposições
deste movimento se realizassem de fato, pois a escolas demoraram a mudar.
Vale recordar que o momento histórico era conturbado, pois esse documento foi
lançado após a Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918) e a Revolução Russa (1917). Na
década de 1930 também se iniciou a era Vargas, com movimentos como a Revolução de 30, a
implantação do Estado Novo (1937-1945) - e o aparecimento do fenômeno do populismo.
Neste período ocorreu a reforma Francisco Campos que, entre outras mudanças, estabeleceu
que o ensino secundário passasse a “ter dois ciclos: um fundamental, de cinco anos, e outro
complementar, de dois anos, este último visando a preparação para o curso superior”
(ARANHA, p. 201). Sobre o Ensino de Química, esta reforma dizia que:

O Ensino de Química, para satisfazer à finalidade indicada, não se deve


limitar à simples exposição de conhecimentos já adquiridos, numerosos e
variados, mas restritos a casos particulares, senão visar à sua solicitação
constante dos alunos para os processos de investigação e da utilização de tais
conhecimentos.

Ainda na vigência do Estado Novo ocorreu também a Reforma Capanema (1942) com
uma nova reestruturação do curso secundário “passando a ser constituído do ginásio de quatro
anos e colegial de três anos, este dividido em curso clássico (com predominância de
humanidades) e científico” (ARANHA, 1996, p. 202). A Reforma Capanema buscava
promover o espírito científico de uma maneira que este se tornasse ativo (SICCA, 1990).
No período da Segunda Guerra Mundial, houve um grande desenvolvimento nas
ciências. Com o Projeto Manhattan e o produto gerado por ele e também com as
comunicações, o advento do radar e dos computadores. Assim, a guerra influenciou no
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desenvolvimento científico mundial, quase sempre com consequências desastrosas, como foi
o caso das bombas atômicas, embora esse desenvolvimento seja possível em tempos de paz.
No Brasil, com o fim do Estado Novo teve-se, então, no período entre 1945 e 1964 um
retorno ao estado de direito, com esperanças de uma aceleração no progresso (ARANHA,
1996). No governo de Juscelino Kubitscheck (1956 a 1961), foi implementada uma proposta
de grande desenvolvimento (pelo seu lema 50 anos em 5), e ocorreu “na Educação, um debate
nunca visto tem como pano de fundo o anteprojeto das Leis de Diretrizes e Bases (LDB), que
leva 13 anos para entrar em vigor” (ARANHA, 1996, p. 204).
Desta maneira, o período iniciado na década de 1950 até os dias atuais, ficou marcado
pela crescente preocupação e mobilização de educadores no Brasil pela inserção de um ensino
de Ciências de qualidade nas escolas primárias e secundárias, que atendesse as necessidades
vigentes, como a profissionalização, a prática social e tendência de uma maior participação
das ciências no currículo.
Este período coincidiu também com o pós-guerra (II Guerra Mundial) e a influência
que as grandes potências passaram a exercer mediante o novo imperialismo. Merece destaque,
em especial, o que se refere aos investimentos feitos pelos Estados Unidos na década de 1960
para melhorias no campo do Ensino de Ciências em suas escolas, durante a Guerra Fria (1947
a 1953), decorrente do final da Segunda Guerra Mundial e do surgimento da dicotomia
capitalismo-socialismo. Esse movimento, que se iniciou no final da década de 1950, teve
grande influência no Brasil:

Esse período marcante e crucial na história do ensino de Ciências, que


influi até hoje nas tendências curriculares das várias disciplinas tanto no
ensino médio como no fundamental, foi dando lugar, ao longo dessas
últimas décadas, a outras modificações em função de fatores políticos,
econômicos e sociais que resultaram, por sua vez, em transformações das
políticas educacionais, cumulativas em função das quais ocorreram
mudanças no ensino de Ciências (KRASILCHIK, 2000, p. 85-86).

Inclusive, na década de 1950 foi lançado um segundo Manifesto dos educadores, já


que o primeiro não obteve um resultado satisfatório em suas ações planejadas juntamente ao
Governo. De acordo com Machado (2009):

Embora o Manifesto tenha causado grande impacto no período em foi


escrito, não gerou ações concretas; seus princípios pedagógicos não foram
absorvidos na organização da escola, nitidamente tradicionalista. Isto
favoreceu que os signatários desse documento, juntando-se a outros,
redigissem um segundo manifesto, menos conhecido, mas não menos
20

importante: o "Manifesto dos educadores democratas em defesa do ensino


público (1959) – Mais uma vez convocados – Manifesto ao Povo e ao
Governo[...]" (p. 112).

Porém, na década de 1960 realmente ocorreram mudanças no cenário educacional


brasileiro, principalmente, devido à implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(LDB-1961). De acordo com KRASILCHIK (2000), com a Lei 4.024 – Diretrizes e Bases da
Educação, de 21 de dezembro de 1961, houve uma ampliação das ciências no currículo
escolar. A partir desse momento, elas começaram a ser ensinadas desde o 1º ano do curso
ginasial e na etapa do colegial, houve também grande aumento da carga horária de disciplinas
como Física, Química e Biologia. Logo no primeiro artigo dessa lei, fala-se da importância da
ciência:

Art. 1º A educação nacional, inspirada nos princípios de liberdade e nos


ideais de solidariedade humana, tem por fim: [...]
e) o preparo do indivíduo e da sociedade para o domínio dos recursos
científicos e tecnológicos que lhes permitam utilizar as possibilidades e
vencer as dificuldades do meio; (BRASIL, 1961, p. 1).

Porém, na década de 1960, iniciou-se no Brasil o período militar que foi de 1964 até
1985. Durante a ditadura ocorreram outras mudanças no ensino, inclusive foi promulgada
outra LDB (Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971), que desta vez, fixou alguns parâmetros
para o ensino profissionalizante. Novamente o currículo de ciências foi afetado, desta vez,
entretanto, houve regulamentações em relação às modalidades de ensino oferecidas. Assim:
“Mais uma vez as disciplinas científicas foram afetadas, agora de forma adversa, pois
passaram a ter caráter profissionalizante, descaracterizando sua função no currículo”
(KRASILCHIK, 2000, p. 87). Desta forma, a lei, no seu artigo 5, parágrafo 2º, diz que:

§ 2º A parte de formação especial de currículo:


a) terá o objetivo de sondagem de aptidões e iniciarão para o trabalho, no
ensino de 1o grau e de habilitação profissional, no ensino de 2º grau;
b) será fixada, quando se destine a iniciação e habilitação profissional, em
consonância com as necessidades do mercado de trabalho local ou regional,
à vista de levantamentos periodicamente renovados (BRASIL, 1971, p. 2 ).

Essa legislação ficou em vigor por mais de vinte anos, pois somente em 1996 é que foi
feita outra LDB. Desta vez, em seu 2º parágrafo do artigo 1º, enfatiza-se que a prática social e
também o trabalho deveriam estar atrelados à educação escolar e, em seu artigo 26º fala-se
que os ensinos fundamental e médio deveriam ter uma base nacional comum, como pode ser
visto na própria lei:
21

Art. 1o. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na


vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino
e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais.
§ 1o. Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve,
predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.
§ 2o. A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social (p. 1). [...]
Art. 26o. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base
nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e
estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas
características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da
clientela (BRASIL, 1996, p. 11).

Percebe-se, a partir deste breve resumo, no qual foram abordados apenas alguns
tópicos, que muitas mudanças ocorreram no cenário educacional brasileiro e que o Ensino de
Ciências se modificou ao longo dos anos, buscando sempre atender certos requisitos que eram
determinados em grande parte pelo Poder Público. Muitas dessas mudanças foram propostas a
partir das LDB‟s. Em relação ao Ensino Médio, além da LDB, a partir da década 1990 foram
promulgados documentos orientadores como o PCN, PCN+ e as Orientações Curriculares
para o Ensino Médio, que afetaram todas as disciplinas, inclusive a Química.
Mas, mesmo com as várias mudanças propostas nas últimas décadas para a Química,
ainda se observa em muitas escolas que os conteúdos são apresentados de maneira hermética,
o que contribui negativamente para o processo de aprendizagem. Essa maneira de transmitir
conceitos, sem discussões e sem apresentar situações problemas, faz com que o conhecimento
científico se torne difícil de ser entendido e estudado e isso não produz resultados satisfatórios
na educação. Inclusive nos Parâmetros Curriculares Nacionais (2000) há um trecho que diz:

Na escola, de modo geral, o indivíduo interage com um conhecimento


essencialmente acadêmico, principalmente através da transmissão de
informações, supondo que o estudante, memorizando-as passivamente,
adquira o “conhecimento acumulado”. A promoção do conhecimento
químico em escala mundial, nestes últimos quarenta anos, incorporou novas
abordagens, objetivando a formação de futuros cientistas, de cidadãos
mais conscientes e também o desenvolvimento de conhecimentos aplicáveis
ao sistema produtivo, industrial e agrícola. Apesar disso, no Brasil, a
abordagem da Química escolar continua praticamente a mesma. Embora às
vezes “maquiada” com uma aparência de modernidade, a essência
permanece a mesma, priorizando-se as informações desligadas da realidade
vivida pelos alunos e pelos professores (BRASIL, 2000, p. 30).

Dessa forma, vários fatores podem contribuir, em determinado grau, para uma
predileção por parte do estudante para as disciplinas que mais lhe aprazem e um afastamento
22

das que sente mais dificuldade. Desta maneira, algumas disciplinas chegam a gerar um
repúdio quando não é possível compreender e obter o rendimento necessário, ainda mais se
houver um histórico de reprovação. Devido a essa situação, na disciplina de Química, as
aplicações e a compreensão dos fenômenos e transformações que ocorrem em processos
naturais e industriais não são desenvolvidas adequadamente por uma parcela dos estudantes.
Como agravante, na área das ciências da natureza há uma dificuldade com relação ao
entendimento por parte de alguns membros da comunidade discente, devida à abstração
cobrada e não trabalhada adequadamente por alguns profissionais, muitas vezes, não
construída em diálogos e discussões no ambiente da sala de aula. Sabe-se ainda que há uma
carência de aulas de reforço nas instituições públicas para as disciplinas em geral, o que com
o passar dos semestres gera uma defasagem no processo de aprendizagem com relação à
determinados conteúdos. Com isso o estudante não entende determinado conteúdo e suas
aplicações, enquanto novos conteúdos são aplicados. Isto gera um desânimo e um desconforto
durante as aulas de Química, pois cada vez fica mais difícil entender o conteúdo ministrado.
Esses e outros fatores contribuíram para que fossem propostas várias mudanças tanto nos
conteúdos curriculares, quanto na forma de se ensinar a disciplina. Essas modificações foram
propostas por professores, pesquisadores da universidade e também por membros do Poder
Público.
Neste contexto, foi inserido nos PCN‟s (2000) ideias desses diversos atores e com isso
passou-se a valorizar mais a disciplina de Química como uma ciência que possui implicações
sociais, ambientais, políticas e econômicas, que tem caráter interdisciplinar e que pode ser
explicada de maneira contextualizada. No próprio documento é destacado que “A Química
participa do desenvolvimento científico-tecnológico com importantes contribuições
específicas, cujas decorrências têm alcance econômico, social e político” (BRASIL, 2000,
30). Em 2002, os Parâmetros Curriculares Nacionais - Orientações Educacionais
Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+) foram publicados para
complementar o que já estava vigente nos PCN‟s, dessa forma, a intenção não era de uma
mudança radical:

Sem pretensão normativa, e de forma complementar aos Parâmetros


Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), as orientações
educacionais aqui apresentadas têm em vista a escola em sua totalidade,
ainda que este volume se concentre nas disciplinas da área de Ciências da
Natureza, Matemática e suas Tecnologias (BRASIL, 2002, p. 7).

De acordo com a maneira como a abordagem deve ser realizada em sala de aula é dito
23

nos PCN+ (2002) que: “A proposta apresentada para o ensino de Química nos PCNEM se
contrapõe à velha ênfase na memorização de informações, nomes, fórmulas e conhecimentos
como fragmentos desligados da realidade dos alunos” (BRASIL, 2002, p. 87).
Vale ressaltar que esses documentos são orientadores e não ditadores do ensino. No
entanto, muitas das modificações que eles propõem acabam sendo incorporados nos
documentos escolares e materiais didáticos. Porém, em certos casos, não chegam até a sala de
aula e o ensino oferecido continua sendo descontextualizado, com ênfase em fórmulas,
esquemas e informações que não fazem parte do cotidiano dos alunos. Além disso, em muitas
escolas, os docentes ainda continuam aderindo a “educação bancária”.
Dada a importância do conhecimento químico para a formação de diversos
profissionais e também para a formação do indivíduo como cidadão consciente, a abordagem
no ensino de Química não pode representar algo que afugente os estudantes das aulas.
Assim, a partir de um enfoque que busque trabalhar os conceitos de uma maneira
abrangente, o ensino de Química pode se tornar mais interessante se a escola e o professor se
aproximarem do universo do aluno e de sua realidade. Os PCNEM e PCN+ fornecem uma
referência para um trabalho que inclua o estudante de uma maneira mais envolvente com as
disciplinas ministradas, sempre em busca de aproximar conteúdos com o cotidiano e
contextualizá-los abordando temas tecnológicos, sociais e ambientais. Com o uso dos PCN's
para orientar o trabalho nas escolas, pretende-se que a abordagem bancária deixe de ser
utilizada e assim:

O aprendizado de Química pelos alunos de Ensino Médio implica que eles


compreendam as transformações químicas que ocorrem no mundo físico de
forma abrangente e integrada e assim possam julgar com fundamentos as
informações advindas da tradição cultural, da mídia e da própria escola e
tomar decisões autonomamente, enquanto indivíduos e cidadãos. Esse
aprendizado deve possibilitar ao aluno a compreensão tanto dos processos
químicos em si quanto da construção de um conhecimento científico em
estreita relação com as aplicações tecnológicas e suas implicações
ambientais, sociais, políticas e econômicas. Tal a importância da presença da
Química em um Ensino Médio compreendido na perspectiva de uma
Educação Básica (BRASIL, 2000, p. 31).

A disciplina de Química é ministrada nos três anos do Ensino Médio, se esta disciplina
não possuir uma boa receptividade por parte dos estudantes, assim como um bom
entendimento ao longo desse ciclo, os alunos não irão se concentrar, se esforçar e tampouco
entender e acompanhar o andamento das aulas. A importância da disciplina para o
desenvolvimento cognitivo, para um domínio das relações com o ambiente e para uma
24

desmistificação de determinadas informações veiculadas erroneamente por alguns meios de


comunicação é visível. Tem-se ainda o caráter norteador que tal disciplina pode exercer na
escolha de uma futura profissão. A Química contribui para a formação do indivíduo como
cidadão, como sujeito pensante e capaz de compreender as interações políticas e sociais
advindas de problemas e problematizações que surgem durante o processo de aprendizagem.
Isto fica evidente num exemplo de abordagem de um conteúdo de Termoquímica exposto no
PCN+:

A aprendizagem de química, nessa perspectiva, facilita o desenvolvimento


de competências e habilidades e enfatiza situações problemáticas reais de
forma crítica, permitindo ao aluno desenvolver capacidades como interpretar
e analisar dados, argumentar, tirar conclusões, avaliar e tomar decisões. Por
exemplo, uma discussão sobre combustíveis em sala de aula pode envolver
cálculos termoquímicos que permitem obter e comparar a energia fornecida
na queima de uma dada quantidade de combustível. Entretanto, é possível e
recomendável que se dê uma abordagem mais abrangente a essa questão,
discutindo-se aspectos como a origem e o meio de obtenção dos
combustíveis, sua disponibilidade na natureza, o custo da energia gerada, a
quantidade de poluentes atmosféricos produzidos na queima de cada um
deles, os efeitos desses poluentes sobre o ambiente e a saúde humana, os
meios eficazes para minimizá-los ou evitá-los, a responsabilidade individual
e social envolvida em decisões dessa natureza e a viabilidade de outras
fontes de energia menos poluentes (BRASIL, 2002, p. 88).

Dada a importância da Química e dos processos químicos envolvidos no nosso


cotidiano, é preciso que a disciplina, assim como o próprio currículo, seja trabalhada
adequadamente junto aos estudantes. Caso contrário não é possível que a Química auxilie o
aluno a exercer o seu papel de sujeito ativo socialmente e a entender os fenômenos e
correlações que lhe são características.
Historicamente, a partir da promulgação de documentos como os PCN‟s e o PCN+, a
discussão sobre o currículo escolar, incluindo o que deve ser ensinado em cada disciplina
continuaram em vários âmbitos da sociedade. Com isso, na década de 2000 foi lançado um
terceiro documento orientador: as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006). Esse
documento também enfatiza a necessidade do aluno do Ensino Médio ter uma formação
humanística, tal como foi sendo discutido desde a década anterior:

Os atuais marcos legais para oferta do ensino médio, consubstanciados na


Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (no. 9394/96), representam
um divisor na construção da identidade da terceira etapa da educação básica
brasileira. Dois aspectos merecem destaque. O primeiro diz respeito às
25

finalidades atribuídas ao ensino médio: o aprimoramento do educando como


ser humano, sua formação ética, desenvolvimento de sua autonomia
intelectual e de seu pensamento crítico, sua preparação para o mundo do
trabalho e o desenvolvimento de competências para continuar seu
aprendizado. (Art. 35) (BRASIL, 2006, p. 7).

As Orientações Curriculares vieram para que se oferecesse aos docentes um material


que auxiliasse o trabalho juntamente aos PCN e PCN+. Mesmo com a publicação do PCN e
PCN+, ainda apareciam algumas dificuldades a serem superadas. Sobre isso, aparece nas
Orientações que:

No entanto, a prática curricular corrente, apesar de já passados sete anos


desde a divulgação dos PCNEM, continua sendo predominantemente
disciplinar, com visão linear e fragmentada dos conhecimentos na estrutura
das próprias disciplinas, a despeito de inúmeras experiências levadas a cabo
no âmbito de projetos pedagógicos influenciados pelos Parâmetros (p. 101).
O que se precisa é instituírem os necessários espaços interativos de
planejamento e acompanhamento coletivo da ação pedagógica, de acordo
com um ensino com característica contextual e interdisciplinar, ou seja,
instituírem os coletivos organizados, como foi proposto nos PCNEM e
PCN+ (p. 105).

No entanto, todas essas mudanças que ocorreram no Ensino de Ciências estiveram


relacionadas com necessidades sociais, especialmente, econômicas. Além disso, tiveram
também implicações relacionadas com a estrutura política e de poder na sociedade. O
currículo, desta forma, é um terreno que terá uma influência direta das ideologias das classes
dominantes e também das lutas sociais.
Não obstante, desde a década de 1990, foi proposto que se mudasse o ensino de
Química e das outras disciplinas no Brasil. Mas, será que esse mudou? Os estudantes
percebem essa mudança? Os estudantes gostam de Química? Percebem que os conteúdos
dessa disciplina têm implicações sociais, econômicas e ambientais? Essas e outras questões
fazem parte do problema dessa pesquisa.
26

2 OBJETIVOS

Analisar a percepção em relação aos aspectos curriculares da disciplina Química dos


alunos de uma escola do Ensino Médio. Pretende-se verificar se os estudantes percebem a
importância da Química no cotidiano, na indústria, no ambiente e na sociedade de uma
maneira geral, assim como se se sentem motivados para o estudo desta disciplina.
27

3 METODOLOGIA

A presente pesquisa refere-se à receptividade e percepção dos alunos de Ensino Médio


em relação à disciplina de Química. Para realizá-la, primeiramente foi realizada uma pesquisa
bibliográfica e documental. Tal pesquisa foi muito importante no sentido de fornecer os
subsídios teóricos necessários às (inter)relações para ulterior análise. Nesta pesquisa estão
incluídas obras acerca de estudos sobre o ensino e também uma série de documentos e leis
sobre este tema.
Depois foi realizada uma pesquisa de campo. O campo escolhido foi o ambiente
escolar. Assim se buscou compreender o fato social do objeto da pesquisa. Para isso contou-se
com o auxílio do questionário estruturado. O questionário utilizado possui 36 questões de
múltipla escolha. Esse instrumento foi elaborado pelos autores da pesquisa. Foram criadas três
categorias, visando facilitar a compreensão dos resultados obtidos e, consequentemente, a
posterior análise aos quais os dados foram submetidos. A seguir apresentamos o modelo do
questionário aplicado.

Prezado(a) aluno(a),
O questionário abaixo é parte de um instrumento de pesquisa, que visa analisar a receptividade de
estudantes do Ensino Médio em relação à disciplina de Química. Essa pesquisa está sendo realizada no âmbito
da disciplina de Monografia oferecida pelo DQ-FFCLRP-USP e será importante para a conclusão do meu curso
de Licenciatura em Química. VOCÊ NÃO SERÁ IDENTIFICADO(A). Agradecemos sua valiosa colaboração.
Graduando do Curso de Licenciatura em Química: Áquila Lanza de Paula.
Orientadora: Educadora Carolina Godinho Retondo.

1.Idade:
( ) 14 anos ( )15 anos ( )16 anos ( ) 17 anos ( ) 18 anos ( )19 anos ( ) 20 anos ( ) 21 ou mais anos
2. Sexo:
( ) Masculino ( ) Feminino
3. Ano:
( ) Primeiro ( ) Segundo ( ) Terceiro
4. Período:
( ) Manhã ( ) Tarde ( ) Noite
5. Você trabalha?
( ) não ( ) sim, em período integral ( ) sim, em meio período
Qual é o seu trabalho? ________________________________
6.Você utiliza os conceitos de Química no seu trabalho?
( ) não ( ) sim
Caso tenha respondido sim, quais? _________________________________________
7.Você gosta de Química?
( ) sim ( ) não ( ) mais ou menos
8. Se respondeu sim, por que?
( ) é fácil ( ) possui afinidade com exatas ( ) gosta das aulas de laboratório (caso haja aulas no laboratório) ( )
gosta das fórmulas e de estudar as substâncias ( ) a química está relacionada com o seu cotidiano
9. Se respondeu não, por que?
( ) é difícil ( ) é abstrato demais ( ) não possui afinidade com exatas ( ) não gosta das aulas de laboratório ( ) não
entende
28

10. Se respondeu mais ou menos, por que? _____________________________________


11. Qual a nota de Química que você tirou no último bimestre?
( )entre 0 e 2 ( )entre 2,1 e 4 ( )entre 4,1 e 6 ( )entre 6,1 e 8 ( )entre 8,1 e 10
12. Você vai prestar vestibular?
( ) sim ( ) não ( ) não sabe
13. Você prestaria vestibular para Química?
( ) não ( ) talvez ( ) sim, para Bacharelado ( ) sim, para Licenciatura ( ) sim, mas não sabe para que modalidade
14.Se respondeu sim ou talvez, por que?
( ) possui interesse em trabalhar na área ( ) quer ser professor de Química ( ) quer trabalhar em laboratório
( ) quer fazer pesquisas na área de química ( ) quer trabalhar nas indústrias químicas ( ) é rentável ( ) tem muito
emprego nessa área ( ) gosta de Química
15.Se respondeu não, por que?
( ) não gosta de Química ou não tem interesse nenhum pela área ( ) não quer ser professor de Química ( ) nunca
pensou nessa profissão ( ) não é rentável ( ) nessa área, não há oportunidades de emprego ( ) não quer trabalhar
na indústria ( ) não quer fazer pesquisas em Química
16.Prestaria vestibular para as profissões correlatas (como farmácia, engenharia química, engenharia de
alimentos, etc.)?
( ) não ( ) talvez ( ) sim
17.Se respondeu sim ou talvez, por que?
( ) gosta de somente algumas áreas da Química que serão abordadas nestas profissões ( ) são profissões mais
rentáveis ( ) possui interesse nestas profissões específicas
18.Se respondeu não, por que?
( ) não tem interesse nestas áreas ( ) não gosta de Química ( ) vai prestar vestibular para as áreas de humanas ( )
vai prestar vestibular para as áreas biológicas ou de saúde
19.Como você se sente nas aulas de Química?
( ) Descontraído(a) ( )Interessado(a) ( ) Chateado(a) ( )Irritado(a) ( ) Cansado(a) ( ) Contente
20.Para você, a Química serve para:
( ) poluir o ambiente ( ) melhorar a poluição ambiental ( ) fabricar bombas ( ) fabricar compostos em remédios,
cosméticos, plásticos ( ) fabricar compostos que estão presentes no cotidiano ( ) fazer pesquisas sobre saúde ( )
não serve para nada
21.Você sabe onde o químico trabalha?
( )sim ( ) não
Cite:__________________________
22.Você acredita que aprender Química irá ajudá-lo(a) em algo na vida ou seu no dia-a-dia?
( ) sim ( ) não ( ) talvez
23.O professor de Química explica aspectos do cotidiano?
( ) sim, sempre ( ) sim, às vezes ( ) não
24.O professor explica sobre as aplicações e utilidades da Química?
( ) sim ( ) não
Cite um aspecto do cotidiano relacionado com química: __________________________
25.Consegue entender o conteúdo das aulas de Química?
( )sim ( ) não ( ) às vezes
26.Você tem dificuldade em entender a explicação do professor?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes
27.Se respondeu sim ou às vezes, por que?
( ) é difícil acompanhar o raciocínio ( ) não presta atenção ( ) não entende o que o professor quer dizer ( ) não
gosta de Química ( ) não gosta de exatas ( ) não gosta de nenhuma disciplina
28.Você gosta do professor de Química?
( ) sim ( ) não ( ) mais ou menos
29.O professor relaciona algum conteúdo de Química com conteúdos de outras disciplinas?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes.
Se sim ou às vezes, cite:______________________
30.Qual o principal material didático utilizado?
( ) livro ( ) apostila ( ) outros.
Cite: ______________________
31.Existe laboratório na escola?
( ) sim ( ) não
29

32.O professor faz uso de experimentos ou leva a turma para o laboratório?


( ) sim ( ) não ( ) às vezes
Cite um exemplo de experimento:___________________________________
33.Você gostaria de ter mais aulas de laboratório ou com demonstração de experimentos?
( ) sim ( ) não
34.São ministradas aulas com recursos audiovisuais?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes
35.São assistidos filmes sobre as temáticas químicas?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes ( ) não, mas o professor indica.
Cite um filme assistido: _______________________
36.É feito uso de animações/simulações de computador para demonstração de conceitos?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes ( ) não, mas o professor indica.
Cite uma animação/simulação que você teve contato: _______________________

Os questionários foram aplicados a 84 alunos do Ensino Médio da Escola Estadual


Américo de Paiva da cidade de Monte Santo de Minas, Minas Gerais, em três salas do período
vespertino, uma de primeiro, uma de segundo e uma de terceiro ano.
Após a aplicação utilizou-se as abordagens quantitativa e qualitativa para interpretar
os dados. Na abordagem quantitativa os dados foram tratados de forma matemática, com o
uso de ferramentas estatísticas, inclusive, foram construídos gráficos e tabelas para a
organização dos resultados. A partir da análise dos resultados obtidos, utilizou-se a
abordagem qualitativa. De acordo com Marques (2006), essa vem do campo da educação e
das ciências sociais e visa apreender as percepções na subjetividade dos indivíduos
envolvidos na pesquisa.
30

4 REFERENCIAL TEÓRICO

Para a maioria das escolas de ensino regular é possível afirmar que o público do
Ensino Médio se encontra na adolescência, que é uma fase na qual as mudanças acontecem
rapidamente e vão além das que ocorrem no organismo, pois envolvem outros componentes
desse ser, tal como afirma os autores a seguir:

A adolescência, sob a perspectiva de Zekcer (1985), é um momento de


grandes modificações físicas e necessariamente de uma maior maturidade
emocional. Os valores éticos, morais, sociais e religiosos são contestados,
repensados e passados por um crivo bastante crítico (BITTENCURT e
KOGUT, ano, p. 2836).

Esse adolescente que está passando por tantas mudanças, ainda se vê obrigado a
pensar sobre seu futuro profissional, tendo que decidir se irá continuar seus estudos e, se
escolher dar prosseguimento, tem que pensar em uma área a ser seguida. Tanto para os
adolescentes, quanto para a sociedade de uma maneira geral, a educação é vista como um
modo do sujeito conseguir uma ascensão ou uma projeção social, que pode estar associada a
uma maior acumulação de renda e consequentemente a aquisição dos bens de consumo
disponíveis, independência financeira, etc. O Ensino Médio e o Superior apresentam
possibilidades que, quando exploradas, podem levar a uma participação social mais ativa, não
somente do ponto de vista econômico. É difícil definir sucesso na sociedade atual, porém a
educação é tida como fator preponderante que facilita a via para este entre os estudantes, pois:

Entre os fatores considerados mais importantes para se ter sucesso na


sociedade, a escolaridade ocupa o primeiro lugar, com 49% das respostas,
seguida pela oportunidade de emprego (47%) e pela capacidade ou esforço
individual (47%). Esse é apenas um dos aspectos da pesquisa Adolescentes e
Jovens do Brasil que evidenciam o quanto os jovens adolescentes valorizam
a educação, principalmente os que tiveram oportunidade de avançar nos
estudos (UNICEF; AYRTONSENNA; ITAÚSOCIAL, 2007, p. 35).

No entanto, em algumas localidades do Brasil, há um desemprego endêmico que é


percebido pelos jovens. Com relação a isso, pode ocorrer dos estudantes não perceberem ou
mesmo não reconhecerem a importância da instituição escolar e da etapa do Ensino Médio,
neste processo de prosseguimento dos estudos e também de formação social. Somando-se a
isso, estes jovens percebem que não será fácil obter uma autonomia, uma independência
31

financeira que será importante para a constituição de uma família. Sobre isso, Marilia Pontes
Sposito (2005) diz que:

Em tese, porque tendo em vista a crise da sociedade assalariada e as


transformações do mundo do trabalho, tornando o desemprego uma categoria
de natureza estrutural e permanente para grandes contingentes populacionais,
a autonomia do adulto via independência financeira pode não ser realizar.
Assim, estaríamos diante da necessidade de buscarmos, também, outros
elementos definidores da condição adulta na sociedade, para além da
independência financeira sob pena de negar a condição de autonomia para
enormes segmentos excluídos da possibilidade de trabalho (p. 204).

Os jovens que possuem um emprego e consequentemente não fazem parte da


população que está desempregada, muitas vezes se dedicam primeiramente ao emprego, sendo
a escola uma ocupação menor. Em alguns casos este emprego pode ser a porta de entrada para
um ingresso em uma faculdade, mas o contrário também pode ocorrer. Alguns jovens podem
não prosseguir nos estudos após a conclusão do Ensino Médio, por não possuírem condições
financeiras, mesmo que tenham um emprego. Sposito (2005) ainda diz que:

Assim, o modo como os jovens vivem essa etapa de vida também se altera,
uma vez que a escolaridade já não se afigura mais como elemento garantidor
da entrada no mundo do trabalho, especialmente se considerarmos o ingresso
no mercado formal de ocupações e as posições dos extratos menos
privilegiados da sociedade, exatamente aqueles que têm acesso tardiamente
aos degraus mais elevados do sistema de ensino ( p. 205).

No decorrer desse processo, pode ocorrer de alguns destes jovens estudantes perderem
um pouco (ou toda) a confiança na instituição escolar que os prepara para o ambiente de
trabalho ou que contribui para que eles consigam um emprego. Este processo, então, é de
acordo com Abad (2003):

uma crise das instituições “tradicionalmente consagradas à transmissão de


uma cultura adulta hegemônica, cujo prestígio tem se debilitado pelo não
cumprimento de suas promessas e pela perda de sua eficácia simbólica como
ordenadoras da sociedade” (ABAD, 2003, apud SPOSITO, 2005, p. 205).

A cultura escolar recebe forte influência da organização curricular determinada pelas


políticas, presente nos livros didáticos e na seleção dos saberes. Por isso, em seguida, iremos
analisar estes aspectos que influenciam a escola.
32

4.1 A organização escolar

Toda escola tem uma organização curricular. Essa é proposta pelos diferentes
membros do corpo docente, que trabalham junto com a coordenação/direção em consonância
com o que é proposto pelas ações governamentais. Existe, então, um currículo que é proposto
e que está materializado nos documentos escolares. No entanto, nada garante que esse
currículo é de fato desenvolvido. Souza Junior & Santiago & Tavares (2011), no texto
“Currículo e saberes escolares: ambiguidades, dúvidas e conflitos”, dizem, sobre a
responsabilidade das escolas para contribuir com a educação:

Diferentes elementos pedagógicos vão procurar materializar essa


responsabilidade, sendo o currículo um deles. Este, mantendo interseção com
os demais elementos, constitui os saberes escolares, fazendo uma seleção
cultural e configurando-os como uma cultura escolar, devido às suas
características peculiares. Essa configuração, ao longo do tempo, passou a ter
uma força tão grande, principalmente em tempos modernos, que, além de
selecionar elementos da cultura, passou a colaborar com a elaboração desta
(SOUZA JUNIOR, SANTIAGO e TAVARES, 2011, p. 184).

O professor é, de fato, o profissional que desenvolve o currículo na sala de aula. E a


maneira como ele desenvolve sua aula interfere na motivação, no interesse e,
consequentemente, no aprendizado dos estudantes. Os autores ainda analisam quais são os
elementos do currículo que interferem no aprendizado dos alunos:

Na sistematização do conhecimento, verificamos que os princípios, os


métodos e os procedimentos dos aspectos metodológicos, assim como os
elementos referentes ao tempo necessário às aprendizagens dos alunos e seus
métodos e procedimentos de avaliação contribuem na constituição dos
saberes escolares (SOUZA JUNIOR, SANTIAGO e TAVARES, 2011, p.
187).

O currículo escolar não é só a organização dos conhecimentos, mas esta relacionado


com muitos outros fatores, tanto os intrínsecos da escola, quanto os sociais, como destacam
Silva e Moreira (1999) em sua obra “Currículo, cultura e sociedade”:

Não é mais possível alegar qualquer inocência a respeito do papel


constitutivo do conhecimento organizado em forma curricular e transmitido
nas instituições educacionais. A Teoria Curricular não pode mais, depois
disso, se preocupar apenas com a organização do conhecimento escolar, nem
encarar de modo ingênuo e não-problemático o conhecimento recebido. O
currículo existente, isto é, o conhecimento organizado para ser transmitido
nas instituições educacionais, passa a ser visto não apenas como implicado
33

na produção de relações assimétricas de poder no interior da escola e da


sociedade, mas também como histórica e socialmente contingente
(MOREIRA e SILVA, 1999, p. 20-21).

Um dos fatores que interfere na organização curricular, estando diretamente


relacionado com esta é a questão política. Os documentos e leis propostas pelo Estado acabam
tendo que ser acatados pela escola, mesmo quando são somente orientadores. Além disso, é
importante considerar a questão econômica, como diz Tomaz Tadeu Silva, no texto “O
Currículo como fetiche”:

O projeto hegemônico, neste momento, é um projeto social centrado na


primazia do mercado, nos valores puramente econômicos, nos interesses dos
grandes grupos industriais e financeiros. Os significados privilegiados deste
discurso são: competitividade, flexibilização, ajuste, globalização,
privatização, desregulamentação, consumidor, mercado. Neste projeto, a
educação é vista como simplesmente instrumental à obtenção de metas
econômicas que sejam compatíveis com esses interesses (SILVA, 2006, p.
28).

Apple (1989), em sua obra “Currículo e Poder”, pondera sobre essa questão: “Neste
ponto devemos ser bastante cautelosos. Facilmente podemos fazer parecer que tudo que é
relativo à educação pode ser reduzido às necessidades da divisão do trabalho ou das forças
econômicas fora da escola” (APPLE, 1989, p. 48). Assim, é preciso ter cuidado com uma
simplificação do quadro total, pois o currículo e suas implicações são muito mais complexos
do que isto. Embora haja uma tendência considerável do currículo e das políticas curriculares
de estabelecer uma diferenciação e favorecer determinadas fatias da população, há muitas
outras variáveis a considerar.
Para os estudantes, de qualquer forma, a organização curricular chega pronta, nas
disciplinas ministradas em sala de aula. Embora eles, e muitos professores também, não
percebam, essa organização também é influenciada por estas características de cunho político,
ideológico e por razões de caráter econômico, ditadas em parte pelo mercado de trabalho e
suas necessidades.
Logo, não se pode olhar para o currículo como um meio imparcial de transmissão de
conhecimentos aos estudantes, conhecimentos estes que deveriam ser devidamente
selecionados por sua importância no contexto da sociedade atual. Há também no currículo, e
em grande parte do que rege sua confecção, os fatores mencionados por Silva (2006), que não
só favorecem, mas também constroem nos alunos tais valores. Ou seja, os valores afetivos não
são trabalhados juntamente aos estudantes e na maioria das vezes não são considerados para a
34

promoção dos mesmos. Ainda, os valores procurados são aqueles que se ajustam a uma
competitividade predatória, de obtenção de valores puramente econômicos, como a favorecida
pela enorme globalização vigente na nova ordem mundial. Há um pouco de neoliberalismo
incrustado no modelo de ensino, aparentemente meritocrático e livre.
Se por um lado as medidas governamentais teoricamente podem oferecer uma maior
autonomia para o professor, por outro também podem desamparar o mesmo e o sistema
educacional. Além disso, tem-se ainda a agregação de alguns valores que são ensinados
implicitamente pelo chamado currículo oculto:

O currículo oculto constitui-se daqueles aspectos do ambiente escolar que,


sem fazer parte do currículo oficial explícito, contribui de forma implícita
para aprendizagens sociais relevantes. [...]
Para a perspectiva crítica, o que se aprende no currículo oculto são
fundamentalmente atitudes, comportamentos, valores e orientações que
permitem que crianças e jovens se ajustem da forma mais conveniente às
estruturas e às pautas de funcionamento, consideradas injustas e
antidemocráticas e, portanto, indesejáveis, da sociedade capitalista. Entre
outras coisas, o currículo oculto, ensina, em geral, o conformismo, a
obediência, o individualismo. Em particular, as crianças das classes operárias
aprendem as atitudes próprias a seu papel de subordinação, enquanto as
crianças das classes proprietárias aprendem os traços sociais apropriados ao
seu papel de dominação […]
Mais recentemente, nas análises que consideram também as dimensões do
gênero, da sexualidade ou da raça, aprende-se, no currículo oculto, como ser
heterossexual ou homossexual, bem como a identificação com uma
determinada raça ou etnia (SILVA, 1999, p. 78-79).

A partir dessa análise de Silva (1999), pode-se identificar que certos valores buscados,
como o conformismo e o individualismo, além da aceitação das estruturas injustas que o
capitalismo provoca; são trabalhados pelo currículo oculto, assim como a maneira como o
indivíduo deve se portar de acordo com a orientação sexual, raça ou etnia. Entretanto, tão
importante quanto o currículo oculto é o currículo que é expresso pelas disciplinas e pelo
conteúdo que se pretende trabalhar, que é mais explícito.
No desenrolar das atividades curriculares explícitas, espera-se que o aluno obtenha o
rendimento mínimo necessário, em relação às notas estabelecidas como médias suficientes
para ser promovido à próxima série do nível de ensino. Obtendo-se tal rendimento, não
importa o que o aluno pensa, seus interesses, se possui bom comportamento e relacionamento
com professores e outros alunos. Porém, o que, muitas vezes, se observa é que certos jovens,
mesmo que reconheçam que a educação é importante para uma projeção social, não estão
interessados em aprender, nem mesmo a tirar boas notas. Alguns não se interessam por uma
35

determinada área, outros possuem um desinteresse geral. Dessa forma, na próxima parte do
texto trataremos da motivação para os estudos de uma maneira geral e da motivação para os
estudos relacionados com a Química, que embora seja importantíssima para a sociedade, é
uma ciência de difícil compreensão, porque envolve muita abstração.

4.2 O estudante do Ensino Médio e a motivação para estudar Química

A motivação pode ser interpretada de várias maneiras e ainda ter diversas definições,
de acordo com o ponto de vista dos diferentes autores. Todorov e Moreira (2005), no texto “O
Conceito de Motivação na Psicologia”, dizem que:

Motivação , assim como aprendizagem, é um termo largamente usado em


compêndios de psicologia e, como aprendizagem, é usado em diferentes
contextos com diferentes significados. O mesmo autor pode empregar o
termo de maneira diversa num mesmo parágrafo. Vernon (1973) faz isso logo
na primeira página do primeiro capítulo de seu livro “Motivação Humana”:
“A motivação é encarada como uma espécie de força interna que emerge,
regula e sustenta todas as nossas ações mais importantes. Contudo, é evidente
que motivação é uma experiência interna que não pode ser estudada
diretamente” (TODOROV e MOREIRA, 2005, p. 120).

Dessa forma, a motivação pode ser interpretada como uma força interna, ou seja, algo
que faz parte do sujeito. Porém, a motivação também pode estar relacionada com outros
aspectos da vivência desse ser, assim, seria influenciada por fatores externos. Todorov e
Moreira citam ainda mais exemplos sobre como a motivação pode ser definida, mediante
diferentes significados atribuídos por outros autores, explicando que:

Um outro exemplo interessante de como o termo motivação pode assumir


diferentes significados em um mesmo texto está em Bergamini (1997): “Se,
no início do século, o desafio era descobrir aquilo que se deveria fazer para
motivar as pessoas, mais recentemente tal preocupação muda de sentido.
Passa-se a perceber que cada um já traz, de alguma forma, dentro de si, suas
próprias motivações. Aquilo que mais interessa, então, é encontrar e adotar
recursos organizacionais capazes de não sufocar as forças motivacionais
inerentes às próprias pessoas. [...] não existe o pequeno gênio da motivação
que transforma cada um de nós em trabalhador zeloso ou nos condena a ser o
pior dos preguiçosos. Em realidade, a desmotivação não é nenhum defeito de
uma geração, nem uma qualidade pessoal, pois ela está ligada a situações
específicas” (BERGAMINI, 1997 apud TODOROV, MOREIRA, 2005, p.
120).
36

Embora, ambos autores expressem que a motivação está relacionada com uma força
interna, sendo intrínseca do sujeito, diversos fatores externos podem também alterar a
motivação, fazendo que a pessoa queira algo ou queira fazer algo, ou dirigindo determinadas
ações nos estudantes. Com isso, a motivação, esta força que guia os indivíduos a realizar
determinadas ações, no entanto, pode ser trabalhada externamente ao ser. Assim, no espaço da
sala de aula, o professor é um dos elementos fundamentais para executar o processo de
motivar os estudantes, objetivando a construção de uma aprendizagem significativa no
contexto da disciplina ministrada. Sobre esta situação, tem-se que:

A motivação extrínseca tem sido definida como a motivação para trabalhar


em resposta a algo externo à tarefa ou atividade, como para a obtenção de
recompensas materiais ou sociais, de reconhecimento, objetivando atender
aos comandos ou pressões de outras pessoas ou para demonstrar
competências ou habilidades [...] diversos autores consideram as
experiências de aprendizagem propiciadas pela escola como sendo
extrinsecamente motivadas, levando alguns alunos que evadem ou concluem
seus cursos a se sentirem aliviados por estarem livres da manipulação dos
professores e livros (MORAES e VARELA, 2007, p. 8).

Desta maneira, os estudantes podem ser motivados intrínseca e/ou extrinsecamente


durante o processo de aprendizagem e ainda de uma maneira positiva ou negativa. O ambiente
da sala de aula possui uma característica diferente no sentido de que nem sempre os
estudantes se sentem a vontade e, em alguns casos, não querem estar ali. Desta forma:

Quando se considera o contexto específico de sala de aula, as atividades do


aluno, para cuja execução e persistência deve estar motivado, têm
características peculiares que as diferenciam de outras atividades humanas
igualmente dependentes de motivação, como esporte, lazer, brinquedo, ou
trabalho profissional (MORAES e VARELA, 2000, p. 10).

É possível perceber que há várias interpretações sobre o significado da motivação,


cada qual com suas peculiaridades em consonância com o que explicam os respectivos autores
responsáveis por tais definições.
Embora o currículo de ciências tenha passado por várias mudanças ao longo dos
últimos 60 anos, a relação entre o professor e o estudante continua sendo importante para o
desenvolvimento da motivação, como apresentado no trabalho “A Qualidade da Motivação
em Estudantes do Ensino Fundamental”, de Rufini, Bzuneck e Oliveira (2012):
37

A motivação para o aprendizado, no contexto escolar, é um assunto que


permite a discussão não somente do ponto de vista dos alunos, mas também
da perspectiva do professor. Ambos, quando motivados, empenham-se mais
na realização das atividades acadêmicas (Bzuneck, 2005). As investigações
de Accorsi, Bzuneck e Guimarães (2007), Boruchovitch e Bzuneck (2004) e
Goya, Bzuneck e Guimarães (2008) apontam que, no caso do aluno, a falta
de motivação para aprender pode se reverter em um baixo desempenho
escolar, tendo em vista o pouco investimento no próprio aprendizado
(RUFINI, BZUNECK e OLIVEIRA, 2012, p. 53).

Aliás, no ensino, de uma maneira geral, boa parte dessa carga de responsabilidade
concernente à motivação, fica sobre o professor, que precisa estar preparado para lidar com
diversas situações na sala de aula, que incluem a indisciplina, o desinteresse e até mesmo a
violência. Além disso, as jornadas de trabalho longas, normalmente em mais de uma escola,
os baixos salários (ainda mais quando comparados às outras profissões, cujos profissionais se
preparam tanto quanto um licenciado), a descrença na profissão e também o pouco caso dos
governantes perante esta situação, faz com que o professor sinta-se, muitas vezes,
desmotivado em vários aspectos.
Se o estudante não se sente a vontade na presença do professor, por qualquer que seja
a razão - desinteresse do professor, apatia, animosidade - isso provavelmente irá afetar a
qualidade do aprendizado. Com isso, o estudante pode não conseguir manter-se atento durante
a aula, não realizar as atividades propostas, não perguntar quando houver dúvida ou até
mesmo uma curiosidade relacionada com a disciplina. Esta relação professor-aluno é descrita
em um estudo realizado sobre a motivação dos estudantes frente a disciplina de Matemática
realizado por Porto (2005):

Depois de quase 25 anos de carreira profissional na Educação Matemática, o


autor diz ter tido um primeiro raio de luz visto em relação a esta questão
quando viu um estudo de Hoyles, pesquisadora do Instituto de Educação da
Universidade de Londres, realizado em meados dos anos 1980. Neste estudo
ela investigava entre os alunos de uma escola, a correlação entre gostar ou
não gostar de cada "matéria"e gostar ou não do professor ou professora.[...]
A partir destes resultados, Lins (2004), apresentou a seguinte formulação:
"talvez a Matemática que tínhamos na escola só existisse dentro da escola e,
como consequência, todo o contato que tínhamos com ela era através
daquele professor ou professora, fazendo acentuar marcadamente o efeito de
aceitação ou rejeição da matéria associado a gostar ou não do professor"
(PORTO, 2005, p. 3).

Em relação à disciplina de Química, observa-se que, muitas vezes, para o estudante,


seus conceitos só existem no âmbito escolar. Assim, eles não percebem como todas as
fórmulas, nomes, reações e experimentos estão associados com seus cotidianos. Em certas
38

localidades, o estudante ainda só tem acesso a essa Química pelo professor, portanto, nesses
casos, um bom relacionamento dentro e fora da sala de aula é imprescindível. A motivação
aqui é diretamente ligada ao professor, a quanta influência este exerce e se esta é positiva ou
negativa. Um professor motivado e com bom relacionamento com a sua sala de aula e seu
ambiente de trabalho terá resultados melhores no desempenho e qualidade de aprendizado de
seus alunos.
Há muitas tendências educacionais e recursos que podem ser inseridos na organização
curricular da Química escolar. Muitas delas podem, inclusive, motivar os estudantes. Na
próxima parte do texto discutiremos algumas dessas propostas para a suposta melhoria do
ensino de Química da atualidade.

4.3 As tendências educacionais, os materiais e os recursos didáticos que podem ser


inseridos nos currículos de Química

É possível que todo o processo de construção de currículo e também da identidade que


o currículo busca formar, tenha uma maior fundamentação e um alcance se levar em
consideração outras variáveis, que estão relacionadas com as tendências educacionais
propostas por autores de diversas partes do mundo. Muitas vezes, uma determinada tendência
educacional entra na moda e acaba sendo incorporada pela organização política, tal como
afirma Silva (2006):

As políticas curriculares têm também outros efeitos. Elas autorizam certos


grupos de especialistas ao mesmo tempo que desautorizam outros. Elas
fabricam os objetos “epistemológicos' de que falam, por meio de um léxico
próprio, de um jargão, que não deve ser visto apenas como uma moda, mas
como um mecanismo altamente eficiente de instituição e constituição do
“real” que supostamente lhe serve de referente. As políticas curriculares
interpelam indivíduos de diferentes níveis institucionais aos quais se
dirigem, atribuindo-lhes funções e papéis específicos: burocratas, delegados,
supervisores, diretores e professores. Eles geram uma série de outros
variados textos: diretrizes, guias curriculares, normas, grades, livros
didáticos, produzindo efeitos que amplificam os dos textos-mestres. As
políticas curriculares movimentam, enfim, toda uma indústria cultura
montada em torno da escola e da educação: livros didáticos, material
paradidático, material audiovisual (agora chamado de multimídia) (SILVA,
2006, p. 11).

Levando isso conta, vê-se a abrangência que a política curricular exerce, assim como o
alcance de sua influência, que pode ser notada em maior ou menor escala na implementação
39

do currículo no cotidiano das instituições escolares. A carga horária das disciplinas, os


materiais e recursos didáticos utilizados têm muita importância no contexto da construção do
processo de ensino-aprendizagem e são diretamente influenciadas pelas diretrizes propostas
pela política curricular, que acabam tendo que ser seguidas pelas escolas.
Uma tendência curricular que foi proposta nas políticas públicas no âmbito da
disciplina de Química - mas não somente desta disciplina, pois envolve outras mais – é a
interdisciplinaridade. Principalmente no ensino de Ciências, não é simples delimitar as
fronteiras de disciplinas isoladas, ou seja, saber onde acaba um campo de conhecimento e
começa outro. Estas fronteiras não são bem definidas, o que cria a necessidade de
estudar os fenômenos naturais de acordo com vários pontos de vista, usando diversos
enfoques para as disciplinas envolvidas. Por isto, este conceito de interdisciplinaridade se faz
necessário, pois a partir deste trabalho é possível articular os conteúdos entre várias
disciplinas e saberes. De acordo com Ferreira (2012):

A interdisciplinaridade no campo das ciências é um conceito amplo e


complexo de construção do conhecimento, que deve ultrapassar a disciplina
isolada. Essa concepção deve partir de um modelo de ensino que privilegie e
articule as ciências Matemática, Biologia, Química, Física, História etc, em
um ambiente amplo em que os fenômenos dos em que se possam dar aulas
experimentais planejadas em que os fenômenos sejam observados,
analisados e entendidos como fatos conectados. [...]
Os fenômenos científicos são, por natureza, complexos e sem recortes
definidos sendo, portanto, importante que sejam estudados de forma
conjunta. Para se encarar esse desafio os temas podem ser tratados por
diferentes disciplinas, mas com um olhar multidisciplinar. Nesse modelo não
ocorrem quebras entre as disciplinas e se formam os eixos integradores de
ensino (FERREIRA, 2012, p.1).

Desta maneira, de acordo com Ferreira (2012), trabalhar a interdisciplinaridade


contribui para a formação de eixos integradores de ensino, que irão auxiliar o processo de
construção de um conhecimento em ciências que envolva as disciplinas sem delimitá-las e
restringi-las. Porém, a definição de interdisciplinaridade não está fechada, existem várias
outras interpretações e isso dificulta ainda mais a construção curricular na escola, pois pode
haver divergências conceituais no próprio corpo docente.
Tão importante e difícil de ser definida quanto à interdisciplinaridade é a
contextualização dos conceitos apresentados e construídos na apresentação da disciplina de
Química. Sobre esta contextualização nesta disciplina, de acordo com Wartha, Silva e
Bejarano (2010):
40

No caso da química, temos três estudos que se complementam na tentativa


de identificar como o termo contextualização foi apropriado pelos
professores de química (Santos e Mortimer, 1999), pelos autores de livros
didáticos (Warthae Alário, 2005) e na construção de unidades didáticas na
perspectiva CTS (Silva e Marcondes, 2010). [...]
Os autores [Santos e Mortimer, 1999] apontaram que grande parte dos
professores pesquisados entende a contextualização como uma descrição
científica de fatos e processos do cotidiano do aluno. [...]
Os autores [Wartha e Alário, 2005] identificaram que, nos livros, a ideia de
contextualização se restringe à exemplificação de fatos do dia a dia e à
descrição científica de fatos e processos do cotidiano do aluno, ou seja,
muito similar às concepções dos professores estudados por Santos e
Mortimer (1999). [...]
Silva e Marcondes (2010) investigaram os entendimentos dos professores
sobre as ideias de contextualização antes, durante e após discussões e
reflexões de outros enfoques do termo contextualização durante um curso de
formação continuada para professores de química na Secretaria de Educação
do Estado de São Paulo. [...] Concluem que a maioria entende a
contextualização como uma estratégia capaz de permitir a descrição
científica de fatos e processos. Outros demonstraram ideias de
contextualização relacionadas a aplicações do conhecimento químico, ou
seja, apresentam concepções sobre contextualização como exemplificação e
ilustrações de contextos para ensinar o conteúdo de química e que poucos
professores apresentaram entendimento da contextualização na perspectiva
da compreensão da realidade social. A concepção de contextualização para
transformação social não fez parte do discurso de nenhum dos professores
cursistas (WARTHA, SILVA e BEJARANO, 2010, p. 87-88).

O tema contextualização, dessa forma, não é um conceito que tenha um significado


único na comunidade docente de Química e, além disso, os professores não se apropriam de
um mesmo significado, havendo algumas divergências quanto ao que é contextualização.
Assim, o significado de contextualização não está bem delimitado entre os professores de
Química. A construção de um conhecimento que faça uso de contextualizações é mediada
pelos professores, porém, a diversidade de ideias sobre o tema poderá gerar conflitos no
âmbito escolar e nas decisões curriculares. Wartha, Silva e Bejarano (2010) dizem sobre isso
que:

Entendemos que a diversidade de concepções de contextualização do ensino,


identificada nesses artigos, pode dificultar ou, por outro lado, apresentar
inúmeras possibilidades de mediações didáticas que o professor poderá
encontrar a partir das diferentes concepções decontextualização que podem
ser muitas, sendo estas apenas algumas delas. O importante é o professor
estar atento a elas, para que ele possa assumir, de fato, o seu papel de
mediador dos processos de ensino e aprendizagem (p. 88).

A contextualização pode facilitar o entendimento das disciplinas, incluindo a de


Química, pela aproximação deste conhecimento com os aspectos mais cotidianos, que são
41

vivenciados pelos estudantes. Mas, para isso é necessário que o professor se mantenha atento
a este tema, utilizando este conceito em sua totalidade, ou pelo menos não excluindo outros
tipos de contextualização que podem ser utilizados. Desse modo, Wartha, Silva e Bejarano
(2010) concluem que:

Do ponto de vista das pesquisas que se utilizam dessas perspectivas de


cotidiano e contextualização, precisa-se avançar a um patamar em que a
comunidade tenha um entendimento mais homogêneo e uma formulação
mais elaborada do que é ensino de química fundamentado no cotidiano e
ensino de química contextualizado (p. 90).

A contextualização está presente no atual currículo de Química no Brasil, que é


influenciado pela legislação e a documentação que o regimenta. Tais documentos foram
elaborados por diversos autores, dentre eles educadores políticos, pesquisadores universitários
e professores. Não necessariamente os autores que propõem as políticas trabalham
diretamente com os alunos do Ensino Médio, por isso, em certos momentos tais documentos
trazem propostas difíceis de serem concretizadas. Neste contexto, Lopes (2005) diz que:

No processo de elaboração dos PCNEM, os princípios curriculares como


interdisciplinaridade, contextualização e currículo por competências, que
integram seu discurso regulativo, já estavam definidos antes mesmo de o
trabalho das equipes disciplinares se desenvolver, e foi com base neles que o
documento foi produzido. […]
Na busca de sua legitimidade em diferentes contextos sociais, os documentos
tornam-se uma bricolagem de tendências curriculares ambivalentes: um
híbrido de concepções as mais diversas. Mesmo porque, os consultores dos
grupos disciplinares participantes do processo também têm a expectativa de
legitimar suas concepções em uma esfera com poder diferenciado sobre a
prática nas escolas (LOPES, 2005, p. 268).

É possível perceber que princípios como interdisciplinaridade e contextualização, são


tendências curriculares que foram legitimadas e materializadas nos PCNEM. Embora tal
documento tenha sido publicado como uma orientação, ele acaba moldando o currículo
escolar de Química, que consequentemente se desenvolve a partir destas premissas, pois neste
foram inseridos tais discursos curriculares. Lopes (2005) caracteriza isto como um hibridismo
que está presente no currículo da disciplina de Química:

É possível identificar esse hibridismo no texto da disciplina Química dos


PCNEM pela preocupação dos autores em estar relacionando as habilidades
e competências aos conteúdos de química. [...]
Na organização curricular por competências, os conteúdos não são o eixo
42

organizador, pois devem ser traduzidos em habilidades a serem expressas em


um saber-fazer. [...]
A associação com o discurso cognitivista, que valoriza determinados
conhecimentos como fundamentais no processo formativo, acarreta a
produção desse discurso híbrido que visa formar competências estreitamente
relacionadas aos conteúdos disciplinares. Mais facilmente esse hibridismo se
desenvolve, em virtude do grupo de ensino de Química ter um histórico de
crítica aos currículos excessivamente conteudistas. Ou seja, o currículo por
competências no ensino de Química passa a ser encarado mais como uma
forma de se contrapor ao currículo enciclopédico do que como uma forma de
organização curricular (LOPES, 2005, p. 268-269).

As aulas de Química têm o potencial de aproximar o estudante (com o auxílio do


hibridismo citado por Lopes) aos conteúdos, que são atualmente organizados por
competências. Porém, a autora ainda diz que esse currículo híbrido pode ser apenas uma
contraposição ao currículo enciclopédico que era o trabalhado anteriormente. Não obstante,
ainda sobre o currículo de Química, Lopes diz que há mais aspectos inseridos, que necessitam
de contextualização para serem melhores compreendidos:

No caso do documento disciplinar de Química, é proposta a relação da


Química com aspectos tecnológicos, sociais, políticos, econômicos e
ambientais, salientando a necessidade de contextualização. Mas é sob o foco
disciplinar da Química que essa relação é construída, sendo os temas de
ensino propostos analisados pelo ponto de vista dessa disciplina (LOPES,
2005, p. 273).

Desta forma, tem-se uma disciplina que apresenta uma orientação curricular híbrida,
com algumas dificuldades a se superar para efetivamente concretizar o que é proposto nos
documentos orientadores.
Com relação aos temas expostos (interdisciplinaridade e contextualização), é razoável
esperar que estes sejam abordados de uma maneira abrangente e coerente - conforme retratado
pelos autores citados anteriormente - nos materiais e recursos didáticos utilizados pelos
estudantes e professores.
Os materiais mais utilizados em sala de aula são os livros didáticos e as apostilas.
Esses exibem e refletem em seu conteúdo as competências que a política curricular determina
e orienta. A partir disso, e levando em consideração a discussão sobre o currículo abordada
anteriormente neste texto, tem-se que estes materiais não são apenas uma simples catalogação
dos conhecimentos necessários ao cumprimento das orientações curriculares e outros
documentos, mas também são detentores de conflitos que se dão nestes campos, entre
educadores e pesquisadores da área de educação e ensino. Abreu, Gomes e Lopes (2005),
sobre os livros didáticos de Química, dizem que:
43

Os livros didáticos são resultados de disputas relacionadas às decisões e


ações curriculares, um currículo escrito que nos proporciona um testemunho,
uma fonte documental, um mapa do terreno sujeito a modificações; constitui
também um dos melhores roteiros oficiais para a estrutura institucionalizada
da escolarização. São também documentos monumentalizados em que
podem ser identificadas tendências dominantes, muitas vezes em conflito
entre si, que participaram de sua elaboração. Como monumentos são
produzidos socialmente e são o resultado de relações de poder (p. 2).

Neste campo de contestações presente no livro didático aparecem ainda os temas e as


concepções que são recomendadas pelas Orientações Curriculares. Estas são apresentadas nos
livros didáticos de diferentes formas pelos autores, muitas vezes reconstruídas de diversas
maneiras no desenvolvimento das temáticas e dos conceitos propostos. Abreu, Gomes e
Lopes (2005) se referem a uma recontextualização das orientações, como segue abaixo:

As orientações oficiais estão sendo recontextualizadas pelos livros didáticos,


na medida em que são colocadas em outros contextos, relacionadas com
outros interesses e integradas a outras orientações. Nessa recontextualização,
há ressignificação dos conceitos dos contextos de produção, das propostas
oficiais (PCNEM) e das propostas dos grupos de pesquisa em ensino, bem
como a ressignificação dos discursos sociais que valorizam cada vez mais o
conhecimento científico-tecnológico submetido à lógica do trabalho e do
mercado, associados aos interesses editoriais e às visões dos próprios
autores. Dessa maneira, os livros didáticos expressam concepções de grupos
específicos em um novo contexto de produção de discursos híbridos, os
quais estabelecem novas relações entre os mais diversos grupos,
educacionais ou não (p. 9).

Os livros didáticos de Química no Brasil apresentaram diversas modificações desde


sua implantação, sempre buscando uma melhoria deste material. Mortimer (1988) na década
de 1980 já afirmava que há alguns conceitos que são abordados com muita simplificação. Isso
pode resultar em uma dificuldade para construir estes conceitos, pois alguns são modelos mais
elaborados que não são facilmente entendidos se ocorrer muitas simplificações. Mortimer diz
que:

Em resumo, pode-se afirmar que os autores de livros didáticos, ao longo da


história, sempre tiveram dificuldade em romper com certas tradições. As
únicas rupturas que se consegue detectar são as relacionadas à apresentação
dos livros didáticos e à posição dos temas que se está discutindo no
programa de 2.° grau. Terá sido para melhor essa mudança? Por outro lado,
os livros quase sempre estiveram desatualizados em relação ao estado da arte
do conhecimento químico. Os livros atuais, apesar de aparentemente
atualizados, apresentam certos assuntos - como estrutura atômica e ligação
química - com tantas simplificações que os descaracterizam (p. 39).
44

Além dos materiais didáticos mais tradicionais, como os livros e as apostilas, cada vez
mais, especialmente em escolas mais abastadas, tem sido incorporados os recursos
tecnológicos, disponíveis ou não na internet, como sites com simulações, animações e vídeos.
Assim, para auxiliar o trabalho dos professores há novas tecnologias que podem ser
empregadas para auxiliar na apresentação de conteúdos e explicações. Estes novos recursos
tecnológicos, em geral, aparecem hoje na sociedade como formas de facilitar o cotidiano e na
escola para facilitar o ensino. É uma realidade que está presente e não pode ser negligenciada
no que se refere ao seu uso em sala de aula. De acordo com Lima e Moita:

As novas tecnologias fornecem instrumentos imprescindíveis para essa


empreitada, pois os recursos que elas disponibilizam são capazes de facilitar
e agilizar a vida da sociedade contemporânea e de fornecer formação
educacional, no campo da química, permitindo, assim, a atualização de
conhecimentos, a socialização de experiências e a aprendizagem através dos
recursos tecnológicos. 'As novas tecnologias de informação e comunicação,
caracterizadas como midiáticas, são, portanto, mais do que simples suportes.
Elas interferem em nosso modo de pensar, sentir, agir, de nos relacionarmos
socialmente e adquirirmos conhecimentos. Criam uma nova cultura e um
novo modelo de sociedade' (KENSKI, 2004, p. 23 Apud Lima e Moita,
2011, p. 133).

As tecnologias disponíveis, então, podem auxiliar muito as formas de ensino-


aprendizagem, se presentes e bem exploradas na escola pelos professores e alunos. Além
disso, o uso de tecnologias permite a apresentação de aparelhos e técnicas que não estão ao
alcance do aluno e isso amplia os recursos e, consequentemente, o acesso ao conhecimento.
Desta maneira, pode-se conseguir uma melhora na construção do conteúdo Químico, pois os
alunos acabam se familiarizando e utilizando novos métodos. Lima e Moita (2011) dizem
ainda que:

Portanto, uma das formas de se promover um ensino de qualidade é através


do emprego de tecnologias que se apresentem como uma ferramenta
pedagógica que propicie a integração do aluno no mundo digital, através da
otimização dos recursos disponíveis, possibilitando uma multiplicidade de
formas de acesso ao conhecimento, de forma dinâmica, autônoma, prazerosa
e atual (p. 134).

A tecnologia, desta maneira, pode propiciar uma forma de alavancar o processo de


ensino-aprendizagem, porém sempre tendo o professor como mediador. O professor em
conjunto com a direção da escola e todo o corpo docente, neste caso, deve estabelecer a
tecnologia que será utilizada e como se dará este processo. Sabe-se dos transtornos que o
aparelho de celular e congêneres podem trazer ao desenvolvimento de uma aula. Porém, a
45

utilização de visualizadores de moléculas tridimensionais, simuladores de experimentos,


laboratórios virtuais, só para citar alguns usos que a tecnologia pode ter no ensino de
Química, acaba trazendo uma nova dinâmica à aula, além de auxiliar na visualização de
processos e modelos em diferentes níveis (macroscópicos e atômico-moleculares), que
requerem abstração por parte dos estudantes.
Atuando conjuntamente com esses recursos didáticos e tecnológicos há a
experimentação, que pode ser trabalhada em laboratório ou na própria sala de aula, quando se
tratar de práticas mais simples. Com relação à experimentação, Marcelo Giordano (1999) diz
que “é de conhecimento dos professores de ciências o fato de a experimentação despertar um
forte interesse entre alunos de diversos níveis de escolarização (p. 43)”.
A partir disso, a experimentação pode e é muitas vezes utilizada como um recurso para
alterar a dinâmica da aula, prendendo a atenção e atraindo o interesse dos estudantes. Isto
ocorre devido a novidade que o laboratório representa e à possibilidade de manejar
instrumentos. Porém, é preciso ter cuidado para que as práticas experimentais não se tornem
apenas isso: uma forma de atrair a atenção dos estudantes. Alguns requisitos precisam ser
atendidos para o bom aproveitamento e para evitar os possíveis erros decorrentes de
excessivas simplificações de conceitos e da banalização dos experimentos. Utilizar a
experimentação somente com o intuito de prender a atenção dos alunos não contribui para o
processo de aprendizagem. De acordo com Sicca (1996):

O prioritário nas aulas práticas não é a manipulação de materiais específicos,


a aquisição de técnicas de laboratório, embora consideremos isso importante.
Nosso olhar deve estar voltado desde a cena anterior à ida ao laboratório,
quando desenvolvemos os fundamentos teóricos da referida prática até a cena
seguinte à realização do experimento, que é de fundamental importância.
Nesta, se dá a interpretação dos fenômenos pelos alunos, a expressão de seus
modelos explicativos, a intervenção do professor no estabelecimento da
possível mudança conceitual, a interação aluno-aluno (p. 126).

Em alguns casos como, por exemplo, nas escolas que não possuem laboratórios ou
locais apropriados para a realização de práticas experimentais, pode ser realizada então
experimentação por simulação, ou seja, por um recurso tecnológico se mostra como é feito
um determinado experimento.
Desta maneira, há diferentes maneiras de explorar os conceitos e fenômenos químicos
que não somente apenas das costumeiras aulas, utilizando os diversos recursos didáticos que
estão disponíveis ao professor. Com isso, além de facilitar a visualização de conceitos que de
outro modo seriam muito abstratos, pode-se ainda tornar a aula mais agradável aos alunos.
46

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 Identificação da unidade escolar

A escola onde foi aplicado o questionário fica no município de Monte Santo de Minas,
Minas Gerais, que faz parte do circuito das montanhas cafeeiras do sul de Minas. A cidade
fica localizada próxima a fronteira com o estado de São Paulo, a aproximadamente 140 km de
Ribeirão Preto, 50 km de Mococa e 330 km da capital.
O colégio funciona nos três períodos e possui cerca de mil alunos matriculados,
estando localizado em um bairro predominantemente residencial, cercado por várias
moradias. À sua frente encontra-se um Seminário Religioso Camiliano (prédio atualmente de
posse da Igreja, mas que não funciona como escola para futuros párocos) e uma pequena
praça. Existem também no entorno alguns estabelecimentos comerciais: lanchonetes, uma loja
material de construção, um posto de gasolina, uma oficina automotiva e uma academia de
ginástica e musculação. A escola atinge praticamente toda a população jovem da cidade, uma
vez que é a única instituição pública de Ensino Médio existente no município. Os alunos que
não querem estudar ali ou vão para uma escola particular fixada no município (também uma
escola apenas) ou se deslocam para os municípios vizinhos.
De acordo com os dados obtidos através da secretaria da escola, a mesma é composta
de 13 salas de aula bem arejadas, com espaço físico adequado, portas e janelas de madeira
maciça, com piso de granito. Na instituição há um laboratório de ciências (que está
desativado), uma biblioteca, um laboratório de informática (sala multimídia) e um salão nobre
para realização de atividades culturais, exibição de filmes e reuniões. Também há televisores
e computadores para uso dos discentes, um pequeno pátio, uma quadra esportiva coberta e
outra sem cobertura. A cozinha é grande e atende as necessidades da vigilância sanitária e há
um refeitório com mesas e cadeiras.

5.2 Análise da pesquisa realizada na escola

Após a escolha da escola-campo, foram feitos contatos iniciais para verificar a


disponibilidade para a realização da pesquisa. Nesses contatos, foi conversado com a direção,
coordenação e com a professora de Química. Assim, foram esclarecidos os objetivos da
pesquisa, bem como foi mostrado o questionário que seria aplicado aos alunos.
Depois os contatos iniciais, marcou-se uma data para a aplicação dos questionários.
47

No total 84 alunos que cursam o Ensino Médio no período vespertino participaram da


pesquisa. Deste total, 44,05% cursam o primeiro ano, 34,5% o segundo e 21,4% o terceiro
ano. Ainda, do total de alunos: 33,3% são do sexo masculino e 65,5% do sexo feminino. Um
estudante não respondeu a esta questão (correspondendo a 1,2%). A distribuição do sexo por
série na figura 1.

Figura 1: Sistematização das respostas obtidas para a questão 2 (Sexo).

A distribuição das idades dos estudantes é: 14 anos - 6%; 15 anos - 31%; 16 anos -
31%; 17 anos - 25%; 18 anos - 3,6%; 19 anos - 1,2%; 20 anos - 1,2% e 21 anos ou mais -
1,2%. Pode-se observar que a maioria está na idade considerada como ideal para o que se
refere à idade de escolarização. A distribuição de idades por série é apresentada na figura 2.
48

Figura 2: Sistematização das respostas obtidas para a questão 1 (Idade).

Dos estudantes entrevistados, 76,19% disseram não trabalhar, enquanto 5,7% disseram
trabalhar em período integral, 11,9% em meio período e 9,52% não responderam. Dos alunos
que trabalham: 7,14% são do primeiro ano, 5,95% são do segundo ano e 4,76% são do
terceiro ano. Verifica-se que o trabalho na zona rural totaliza 30,77% da atividade dos
entrevistados. A figura 3 apresenta os empregos dos estudantes distribuídos por série.

Figura 3: Sistematização das respostas obtidas para a questão 5 (Você trabalha? Qual é o seu trabalho?).

Dos estudantes que trabalham, dois alunos (23,08%) disseram usar conceitos de
Química em seus empregos. As respostas obtidas para o uso dos conceitos foram: “utiliza em
basicamente tudo, pois a química é algo que usamos e nem percebemos” (aluno 1) e
“formulação NPK para adubos” (aluno 2), sendo que o primeiro era do terceiro ano e o
segundo do primeiro ano.
A resposta do aluno 1 contém uma contextualização mais genérica, enquanto a do
aluno 2 apresenta um aspecto mais específico da utilização da Química. Entretanto, pela
resposta do aluno 1 percebe-se que este consegue ao menos entender o alcance desta ciência,
embora sem muitos detalhes. Com relação ao aluno 2, de acordo com Santos e Mortimer
(1999) e Wartha e Alário (2005), pode-se perceber que, a partir da contextualização, ele tenta
aproximar a descrição científica com os fatos e processos do cotidiano. O aluno 2 apresenta
uma contextualização relacionada com uma aplicação do conhecimento químico (Wartha,
Silva e Bejerano, 2010), mostrando que o conhecimento Químico é aplicado na lavoura pelo
uso dos adubos.
49

Com relação ao material didático utilizado em sala, 73,81% disseram que o livro era o
principal material utilizado, 2,38% disseram apostila, 21,43% disseram que outros materiais
eram utilizados e 2,38% dos estudantes não responderam esta questão. As respostas dos
outros tipos de materiais didáticos usados foram:

Respostas do outro tipo de material didático


utilizado em sala de aula
livro 1,19%
química 1,19%
caderno 3,57%
a lousa 1,19%
tabelas 2,38%
explicação oral 1,19%
exercícios 1,19%

Tabela 1: Sistematização das respostas obtidas para a questão 30 (Qual o principal tipo de material didático
utilizado? Cite:).

Desta forma, percebe-se que o livro didático é o material de apoio mais utilizado em
sala de aula, seguido do uso concomitante, porém, eventual, de apostilas. Os livros didáticos
adotados são aqueles que foram aprovados no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).
Tais livros sofreram algumas mudanças nos últimos anos, em geral, para se adequar aos
PCN's. Porém, de acordo com Abreu, Gomes e Lopes (2005), a maioria dos livros didáticos
ainda aborda as disciplinas de maneira fragmentada, o que dificulta o seu entendimento. E
ainda, um aspecto que desperta atenção nos livros didáticos é a importância dada aos exames
nacionais. Com isso, pode-se entender que, em alguns casos, o livro didático mantém este
aspecto disciplinar e também tem como uma de suas finalidades preparar os estudantes para a
execução de um exame.
O livro didático, deste modo, ajuda a consolidar também o currículo disciplinar, uma
vez que mantém o seu conteúdo restrito ao universo da Química. Isso se deve, de acordo com
Lopes (2005), a facilidade oferecida pelo currículo disciplinar:

O foco nas disciplinas escolares justifica-se pelo fato de o currículo


disciplinar, a despeito de todas as críticas a ele desenvolvidas ao longo dessa
história, ser considerado a idéia pedagógica mais bem-sucedida da história
do currículo (p. 266).

Com isso, é possível montar os conteúdos a serem estudados separando-os, mantendo


horários específicos para cada disciplina, organizando assim a rotina escolar. No entanto, no
caso da disciplina de Química - e das ciências naturais - este aspecto disciplinar dificulta um
50

pouco o processo de aprendizagem, devido à redundância de conteúdos vistos em diferentes


disciplinas sobre diferentes ângulos, sem a interdisciplinaridade e também por alguns
conteúdos não despertarem atenção nos estudantes, por não haver assunto correlato aos seus
conhecimentos.
Ainda de acordo com Lopes (2005), “parece ser desconsiderada a trajetória histórica
do conceito, marcada por abordagens instrumentais, sendo suposto que, se elas constam dos
parâmetros, nada mais natural do que incorporá-las (p. 270)”. Com isto, os livros didáticos
passam a conter uma série de conceitos que muitas vezes não são contextualizados e
interligados as outras áreas do conhecimento.
De fato, ao se analisar as questões do questionário - no que se refere a
contextualização e, principalmente, a interdisciplinaridade - foi possível constatar que os
estudantes percebem a disciplina de Química como algo separado das outras disciplinas,
talvez em parte devido à abordagem dos livros didáticos.
Essa Química isolada não atrai os estudantes, pois, de acordo com Porto (2005), em
seu estudo sobre a disciplina de Matemática, o “problema não é apenas que a academia ignore
ou desautorize a Matemática da rua, mas também que a rua ignore e desautorize a Matemática
da academia (p.3)”. Também com a Química isto acaba por se tornar verdade, pois muitas
vezes o estudante não consegue entender como os conceitos dessa ciência se inserem em seu
cotidiano. Como exemplo, nenhum estudante fez relação de processos que ocorrem em suas
casas, como a combustão na cozinha, a lavagem de roupas com branqueador óptico, entre
outros inúmeros, quando questionados sobre algum aspecto do cotidiano relacionado com a
Química. Na maioria dos casos, imaginaram uma Química distante, no laboratório ou em
indústrias, conforme respostas citadas adiante.
Isto, de certa forma, influencia na motivação dos estudantes sobre a aprendizagem de
Química, pois, este pode não encontrar motivos para estudar essa Química que não possui
relação com seu mundo. Desta forma, se inicialmente não sente afinidade pela disciplina, os
fatores externos a ele, que poderiam despertar sua atenção – motivação extrínseca – quando
não são explorados em sua totalidade, fazem com que eles continuem não se identificando ou
não percebendo a Química de outra maneira, assim, acaba se tornando somente mais uma
disciplina a ser aprendida para a preparação para um exame.
Ainda com relação aos exames, os estudantes também percebem que algumas vezes há
por parte do corpo docente uma predileção pelos alunos de melhor desempenho acadêmico,
sendo implicitamente - e às vezes explicitamente também - reservado a estes um melhor
tratamento e também melhores projeções com relação aos seus futuros. Lopes (2005) diz que:
51

A manutenção das disciplinas escolares relaciona-se assim com o


atendimento às finalidades sociais da escolarização: os processos de seleção
de alunos, a produção de diplomas para o sistema produtivo e a produção de
padrões e tipificações sociais estáveis e legitimadas, capazes de serem
trocados no mercado de identidade social (p. 266).

Esta relação entre o livro didático e a disciplina, em um sistema curricular que mantém
uma estratificação, uma classificação dos estudantes de acordo com seus desempenhos em
avaliações (muitas vezes na forma de exames pontuais escritos), não favorece o
desenvolvimento de uma motivação nos alunos. É claro que há outros fatores envolvidos e
não é possível apontar isto como fator exclusivo para a falta de motivação, mas é evidente que
este é um ponto que poderia ser trabalhado e melhorado. Moraes e Varela (2007), explicam
que:

A educação necessita de uma nova forma de abordagem para eliminar o


problema do fracasso escolar, ser planejada e desenvolvida para atender às
necessidades formativas dos alunos com o objetivo de torná-los capazes e
preparados para enfrentar as mudanças e desafios que o progresso e a
evolução social naturalmente irão trazer (p. 12).

Adiante será discutida a influência das notas na motivação dos estudantes. Com
relação a esta nova abordagem citada por Moraes e Varela, a experimentação pode servir
como uma ferramenta para atrair a atenção dos estudantes, desde que usada corretamente e
atendidos os requisitos para o estudo da Química.
Com relação ao laboratório, 85,71% disseram existir laboratório na escola, 9,52%
disseram não existir e 4,76% não responderam. Sobre o uso de experimentos 3,57% disseram
que o professor utiliza esse recurso, 92,86% disseram que não, 1,19% responderam às vezes e
2,38% não responderam. Dos que responderam sim, algumas respostas sobre os experimentos
realizados foram: o filtro de separação (2,38%) e como separar água do óleo (1,19%). Um
estudante (1,19%) respondeu que “falta de aparelhos” era o motivo de não haver
experimentos. Quando questionados se gostariam de ter mais aulas com experimentos ou no
laboratório, 83,33% responderam que sim, 15,48% responderam não e 1,19% não
responderam. A distribuição das respostas por ano está na figura seguinte.
52

Figura 4: Sistematização das respostas obtidas para a questão 32 (O professor faz uso de experimentos ou leva a
turma para o laboratório?).

Giordano (1999) diz que os professores sabem que a experimentação provoca forte
interesse nos estudantes. Isso vai ao encontro do que foi obtido nos resultados, pois a grande
maioria dos estudantes respondeu que gostaria de ter mais aulas de laboratório. Porém, o
laboratório da escola está atualmente desativado, devido à falta de vidrarias e reagentes, de
acordo com o professor da disciplina.
Conforme as respostas dadas pelos alunos, o professor utiliza pouco ou não utiliza o
recurso do uso dos experimentos. Sicca (1996) diz que o prioritário não é a manipulação dos
materiais em si, mas o desenvolvimento dos aspectos teóricos, antes da utilização deste
recurso, ou seja, a construção de conceitos prévios à experimentação. No entanto, como não
houve nenhuma atividade prática, esses conceitos e o trabalho que seria desenvolvido
anteriormente à ida ao laboratório não foram construídos junto aos estudantes.
Apesar disso, mesmo com o laboratório estando atualmente desativado e levando em
consideração que talvez possa haver algumas dificuldades na realização de experimentos em
sala de aula, os mesmos poderiam ser apresentados por recursos audiovisuais.
Sobre utilização de recursos audiovisuais nas aulas de Química: 2,38% disseram que
são ministradas aulas com o uso de tais recursos, 86,90% disseram que não, 9,52%
responderam às vezes e 1,19% não respondeu. Nenhum exemplo de recurso audiovisual foi
citado pelos estudantes. Sobre a questão de serem assistidos filmes sobre as temáticas
químicas: 1,19% responderam que sim, 89,29% que não, 8,33% responderam que não, mas o
professor indica e 1,19% não responderam. Nenhum exemplo de filme foi citado pelos alunos.
53

Sobre o uso de animações/simulações de computador para demonstração de conceitos


1,19% responderam que sim, 94,05% responderam que não, 1,19% responderam às vezes,
2,38% responderam que não, mas que o professor indica e 1,19% não responderam essa
questão. Não houve nenhum exemplo de animação citado pelos alunos.
Percebe-se de acordo com as respostas que os recursos multimídias não são muito
explorados. As novas tecnologias são capazes de fornecer um auxílio na formação
educacional e, além disso, a utilização de recursos audiovisuais, simulações e filmes podem
ser utilizados para aumentar a dinamicidade da aula e otimizar os recursos disponíveis ao
professor (Lima e Moita, 2011). Com o uso destes recursos poderiam ser simulados
experimentos virtuais e alterar a dinâmica “giz e lousa” para uma aula que poderia mudar o
ambiente costumeiro em que os alunos se sentem um pouco entediados.
Quanto a gostarem da disciplina de Química: 21,43% responderam que gostam,
23,81% disseram não gostar e 54,76% responderam que mais ou menos. Dos alunos que
disseram gostar de Química, as respostas, ao serem questionados sobre o porquê, foram:
11,11% é fácil; 16,67% gosta das aulas de laboratório (caso haja aulas no laboratório);
50,00% gosta das fórmulas e de estudar as substâncias; 16,67% a química está relacionada
com o seu cotidiano e 5,56% não responderam. Alguns estudantes que responderam mais ou
menos a essa questão também marcaram algumas opções com relação ao motivo de gostarem:
4,35% é fácil; 2,17% gosta das aulas de laboratório (caso haja aulas no laboratório); 6,52%
gosta das fórmulas e de estudar as substâncias; 2,17% a química está relacionada com o seu
cotidiano e 2,17% não responderam.
Dos estudantes que responderam gostar de química, nota-se que a maioria disse gostar
das fórmulas e do estudo das substâncias. As razões que alguns estudantes deram para o
motivo de gostar mais ou menos de química estão apresentadas na tabela 2.
54

MOTIVOS
“não gosta das aulas de teoria” 1,19%
“não gosto muito” 2,38%
“porque não é uma matéria que eu gosto muito” 2,38%
“porque a matéria é complicada, porque as vezes é complicado de fazer a fórmulas” 1,19%
“porque eu só tiro nota baixa, não vejo interesse em tudo” 1,19%
“não me chama a atenção” 1,19%
“não consegue entender completamente; tem um pouco de fórmulas” 1,19%
“por ter muitas fórmulas” 1,19%
“não entendo” 1,19%
“porque é uma matéria interessante” 1,19%
“gosta de algumas matérias” 1,19%
“gosto apenas de algumas partes” 1,19%
“quando se entende é legal, mas as vezes tenho dificuldade para aprender” 1,19%
“algumas matérias são interessantes” 1,19%
Tabela 2: Sistematização das respostas obtidas para a questão 10 (Se respondeu mais ou menos, por que?).

Com relação aos estudantes que responderam “mais ou menos”, pode-se perceber que
a maioria não gosta da disciplina e, ainda, apresenta alguma dificuldade no entendimento. Dos
que responderam não gostar, os motivos foram: 1) porque acham a disciplina difícil (35%); 2)
não entende (25%); 3) é abstrato demais (15%); 4) não possui afinidade com exatas (10%); 5)
não gosta das aulas de laboratório (5%) e 5% não responderam a questão. Novamente, achar a
disciplina difícil e não entendê-la teve a maior parte das respostas dadas pelos estudantes.
Quando questionados se sabiam onde o químico atuava no mercado de trabalho,
32,14% disseram saber, 65,48% não saber e 2,38% não responderam. Complementando essa
questão, foi pedido aos estudantes que citassem os locais onde o químico trabalha. As
respostas obtidas estão apresentadas na tabela 3, em relação aos estudantes que responderam
sim na questão anterior:

Locais onde o Químico trabalha


laboratório 25,00%
escola 2,38%
indústria 3,57%
farmácia 2,38%
professor de química (realiza pesquisas) 1,19%
indústrias diversas 1,19%
laboratório de manipulação 1,19%

Tabela 3: Sistematização das respostas obtidas para a questão 21 (Você sabe onde o químico trabalha? Cite:).

Pelas respostas do questionário, percebe-se que muitos estudantes não sabem onde o
químico exerce sua função no mercado de trabalho. Os que disseram saber citaram o
55

laboratório como local da principal atividade. O químico possui atribuições que o permitem
trabalhar em diversas áreas e, no entanto, os estudantes responderam majoritariamente que
este exerce sua função no laboratório, o que representa uma resposta genérica. Desta forma,
nota-se que os estudantes não conhecem bem o que um químico pode fazer como profissional.
Isso pode explicar porque alguns não possuem muito interesse e não gostam da disciplina.
Aqui, pode-se perceber outra característica do currículo. Com a falta de atividades
extracurriculares que ampliam a visão dos estudantes sobre esta profissão, os mesmos
acabam por acreditar que a Química é uma ciência distante e puramente disciplinar e que
enfatiza fórmulas. Ainda, pode-se observar que os valores transmitidos para os estudantes
sobre a profissão, nem sempre são suficientes, uma vez que os alunos não deram muitos
exemplos sobre o mercado de atuação do químico.
Ao serem questionados se o professor explicava as aplicações da química 64,29%
responderam sim, 27,38% não e 8,33% não responderam. Sobre o caso de o professor
explicar aspectos do cotidiano relacionados com a Química 34,52% disseram que sim,
sempre, 57,14% sim, às vezes, 7,14% responderam não e 1,19% não responderam. Na tabela
4 estão os exemplos citados sobre o que alguns estudantes escreveram como os aspectos da
Química presentes no cotidiano.

Aspectos do cotidiano relacionados com Química


misturas como sal, água, óleo 1,19%
ação de filtrar o café (princípio de separação de misturas) 1,19%
na fabricação de alguns produtos como a gasolina 1,19%
composição química 1,19%
gasolina 1,19%
acetona 1,19%
composições químicas 1,19%
filtração e separação 1,19%
experiências 1,19%
fabricação de remédios 9,52%
nenhum 1,19%
serve para experiências 1,19%

Tabela 4: Sistematização das respostas obtidas para a questão 24 (O professor explica sobre as aplicações e
utilidades da Química? Cite um aspecto do cotidiano relacionado com química).

Embora a maior parte tenha respondido que o professor explica e relaciona aspectos
do cotidiano relacionados com a Química, poucos responderam esta questão. No entanto, o
item “fabricação de remédios” apareceu com maior frequência, o que reforça a resposta
anterior que muitos estudantes disseram que o laboratório era o local de trabalho do Químico.
Nota-se que as respostas dadas pelos estudantes são muito genéricas e que não foi citado um
56

exemplo mais específico da relação da Química com o cotidiano.


Perguntados se o professor relaciona conteúdos com outras disciplinas, 27,38%
responderam sim, 51,19% não, 11,9 % às vezes e 9,52% não responderam. Na tabela 5 estão
as respostas dadas pelos estudantes com relação aos conteúdos de Química que são
relacionados com outras disciplinas.

Conteúdos de Química relacionados com outras disciplinas


comportamento 1,19%
matemática 5,95%
física 8,33%
conversa com os alunos 3,57%
sei lá 1,19%

Tabela 5: Sistematização das respostas obtidas para a questão 29 (O professor relaciona algum conteúdo
de Química com conteúdos de outras disciplinas? Se sim ou às vezes, cite).

No caso da interdisciplinaridade, os estudantes citaram outras disciplinas, mas não


descreveram os conteúdos relacionados que estas continham. Inclusive, quando foi aplicado
os questionários, os estudantes perguntaram sobre essa questão e ela foi esclarecida. Mas,
mesmo assim, as respostas obtidas mostraram que a interdisciplinaridade não ocorre de fato
na disciplina. De acordo com Ferreira (2012), a interdisciplinaridade é um conceito amplo,
que visa articular as ciências entre si, pois os fenômenos científicos são complexos. Desta
forma, simplesmente citar outra disciplina não indica que aconteça a interdisciplinaridade,
pois não foram correlacionados aspectos entre as diferentes ciências que permitam um melhor
entendimento dos fenômenos naturais.
Quanto a acreditarem que a Química serviria para algo nas suas vidas, mais de 50 %
dos alunos disse que sim, 13,1 % disse que não e 30,95% responderam que talvez ajude. Estes
dados são mostrados na figura 5.
57

Figura 5: Sistematização das respostas obtidas para a questão 22 (Você acredita que aprender Química irá
ajudá-lo(a) em algo na vida ou seu no dia-a-dia?).

Percebe-se, de acordo com este gráfico, que os alunos de primeiro ano possuem uma
visão mais otimista em relação à utilidade da Química, enquanto que os alunos de segundo e
terceiro ano estão quase que uniformemente distribuídos entre as três outras respostas, embora
a maioria acredite nessa utilidade. Também foi perguntado aos estudantes sobre para que
serve a Química. A figura 6 mostra o gráfico com a distribuição das respostas para essa
questão, de acordo com a série.

Figura 6: Sistematização das respostas obtidas para a questão 20 (Para você, a Química serve para:).
58

A maior parte das respostas foi a fabricação de compostos em remédios e compostos


do cotidiano. Respostas como fabricar bombas, poluir o ambiente e não serve pra nada
também foram dadas, embora em pequena quantidade. Isso mostra que embora a maioria dos
estudantes tenha noção de algumas utilidades da Química na sociedade, ainda há alguns que
não compreendem bem tais relações, tendo ainda uma visão estereotipada. A resposta
“fabricação de remédios” foi mencionada em mais de uma questão, assim, acreditamos que
provavelmente o professor tenha ministrado aulas sobre esse tema.
Com relação a como os estudantes se sentem durante a aula de Química (questão 19),
os resultados estão apresentados na figura 7.

Figura 7: Sistematização das respostas obtidas para a questão 19 (Como você se sente nas aulas de Química?).

Observa-se que a maior parte dos estudantes se sente interessada, seguido por
descontraída e cansada. Uma pequena parte se sente contente, chateada e irritada. Também
houve estudantes que responderam “contente”. O fato de alguns estudantes se sentirem
cansados pode estar relacionado com várias razões: 1) ao deslocamento que precisam fazer da
zona rural até a escola, por estradas de terra; 2) pelo fato de trabalharem meio período; 3) por
não gostarem da disciplina e 4) por não entenderem o conteúdo e as explicações dadas pelo
professor. Assim, pode-se perceber que a motivação, de uma maneira geral, depende de várias
situações específicas. Observando os resultados, tem-se que, apesar da grande maioria dos
estudantes não possuir sentimentos negativos durante a aula de Química, outros fatores (que
serão vistos adiante) como nota, compreensão mais profunda da disciplina, extrapolação do
59

conteúdo para o cotidiano e diversas situações, dinâmica da aula monótona, irão contribuir
para um decréscimo na motivação dos estudantes.
Os estudantes também foram questionados se entendem o conteúdo das aulas de
Químicas. As respostas para essa questão estão sistematizadas na tabela seguinte.

Consegue entender o conteúdo das aulas de Química?


sim 21,4%
não 16,7%
às vezes 58,3%
não respondeu 3,6%

Tabela 6: Sistematização das respostas obtidas para a questão 25 (Consegue entender o conteúdo das aulas de
Química?).

Em relação a explicação do professor, boa parte disse que tem dificuldade para
entender, mas a maioria disse que tem dificuldade somente “às vezes”. Sobre os motivos desta
dificuldade, mais da metade dos estudantes respondeu que a maior dificuldade é acompanhar
o raciocínio exposto. Os resultados de ambas as questões estão apresentados na tabela 7.
Você tem dificuldade em entender a explicação do professor?
sim 25,0%
não 13,1%
às vezes 58,3%
não respondeu 3,6%
Se respondeu sim ou às vezes, por que?
é difícil acompanhar o raciocínio 52,4%
não presta atenção 10,7%
não entende o que o professor quer dizer 14,3%
não gosta de Química 8,3%
não gosta de exatas 1,2%
não gosta de nenhuma disciplina 1,2%
não respondeu 6,0%

Tabela 7: Sistematização das respostas obtidas para as questões 25 e 26 (Consegue entender o conteúdo das
aulas de Química?/ Você tem dificuldade em entender a explicação do professor?).

Analisando estas respostas, percebe-se que 21,4% e 25% dos estudantes responderam
que entendem realmente o conteúdo e as explicações do professor, respectivamente. A razão
dada pela maioria foi a dificuldade de acompanhar o raciocínio, enquanto que apenas 8,3%
disseram que o motivo é não gostar de Química. Desta maneira, acredita-se que a forma como
os estudantes percebem a disciplina de Química pode alterar a maneira como estes irão se
motivar e estudar.
Foi levantada a distribuição das notas dos estudantes e correlacionadas com a
afinidade que tinham pela disciplina e também com o ano cursado. A distribuição está
apresentada na figura 8.
60

Figura 8: Sistematização das respostas obtidas para a questão 11 (Qual a nota de Química que você tirou no
último bimestre?).

Como pode ser observado na figura 8, os estudantes que disseram gostar mais ou
menos de Química têm suas notas mais distribuídas no intervalo de 6,1 a 8,0, assim como os
que disseram não gostar. Os estudantes que disseram gostar de Química têm suas notas mais
distribuídas no intervalo de 8,1 a 10,0.
Analisando a distribuição de notas de acordo com a afinidade com a disciplina, pode-
se afirmar que os estudantes que gostam da disciplina possuem um melhor desempenho nas
avaliações, enquanto poucos que não gostam possuem notas maiores que 8,1. Os estudantes
que disseram gostar mais ou menos, em sua maioria, ficam com a média das avaliações entre
4,0 e 8,0.
Dessa forma pode-se analisar o sucesso e fracasso com relação às notas na disciplina
de Química. De acordo com Moraes e Varela (2007, p. 3) “a motivação pode ser entendida
como um processo e, como tal, é aquilo que suscita ou incita uma conduta”, dessa foram, os
estudantes que ficam com médias baixas, passam a se sentir desmotivados, pois uma vez que
não conseguem a média, também não se esforçam no processo de aprendizagem.
Neste contexto, de acordo com as respostas, as notas baixas e mais a dificuldade de
entender o conteúdo e as explicações do professor, o cansaço durante a aula e o fato de não
conseguirem acompanhar o raciocínio, podem trazer prejuízos educacionais e motivacionais
aos estudantes.
61

Moraes e Varela dizem que “é preciso considerar que o conhecimento é uma


construção individual e coletiva, e à escola cabe o papel de fornecer condições adequadas a
essa construção”. Desta forma, diminuir distância entre a Química escolar e a do cotidiano,
atentar para o desempenho e o papel das notas no currículo, mostrar aos estudantes a extensão
da atuação do químico são tópicos que auxiliam na construção deste conhecimento como algo
em constante mudança e não algo pronto, acabado.
A relação dos estudantes com o docente também precisa ser levada em consideração,
de acordo com o que diz Porto (2005). Por isso, foi feita uma questão que aborda se os
estudantes gostam do professor de Química (questão 28), os resultados obtidos foram
sistematizados na tabela 8.

Você gosta do professor de Química?


sim 79,8%
não 2,4%
mais ou menos 13,1%
não respondeu 4,8%

Tabela 8: Sistematização das respostas obtidas para a questão 24 (Você gosta do professor de Química).

De acordo com os dados da tabela acima, a grande maioria dos estudantes gosta do
professor da disciplina. Uma vez que 23,8% dos estudantes disseram não gostar da disciplina
e apenas 2,4% disseram não gostar do professor, percebe-se que os estudantes que não gostam
da disciplina, em sua maioria, podem não ter a relação com o professor como motivo para
isso. No caso da maioria dos estudantes que respondeu o questionário, o relacionamento
professor-aluno é bom, o que então leva a crer que o problema da motivação nesta disciplina
não tenha tanta influência negativa por parte da relação com o docente. No entanto, para esses
2,4%, um dos motivos para não gostar de Química pode ser o fato de não gostarem do docente
responsável pela disciplina. De acordo com Moraes e Varela, “O tema motivação ligado à
aprendizagem está sempre em evidência nos ambientes escolares, impelindo professores a se
superar ou fazendo-os recuar[...]”. Assim, mesmo com pouca rejeição dos estudantes com a
figura do professor, este precisa sempre levar em consideração que não deve despertar apatia
em seus alunos.
Sobre o ingresso em uma faculdade, a maioria dos estudantes disse que irá prestar
vestibular (53,57%); 9,52% disseram que não vão; 35,71% disseram não saber e 1,19% não
responderam a essa questão. Isso reforça que os estudantes reconhecem a importância da
continuidade dos estudos para a obtenção do sucesso em suas vidas, como mostrado
anteriormente (UNICEF, AYRTONSENNA e ITAUSOCIAL, 2007, p.35). Embora mais da
62

metade dos estudantes dissesse que prestará vestibular, há ainda um grupo considerável que
não sabe se continuará os estudos. A figura 9 apresenta o gráfico com as respostas dessa
questão correlacionadas com o ano. O fato destes estudantes não saberem se vão ou não
prestar vestibular pode ser influenciado pela faixa etária dos mesmos. De acordo com Zecker
(1985), a adolescência é um momento que requer mais maturidade emocional, o que é
necessário para escolher uma carreira, por exemplo.

Figura 9: Sistematização das respostas obtidas para a questão 12 (Você vai prestar vestibular?).

A questão seguinte do questionário abordava se os alunos prestariam ou não vestibular


para a carreira de Química (tabela 9). Apenas 4,8% do total de estudantes que respondeu o
questionário disse que prestaria vestibular para o curso de Química, o que mostra grande
rejeição por esta carreira ou pela disciplina.

Você prestaria vestibular para Química?


não 65,5%
talvez 29,8%
sim, para Bacharelado -
sim, para Licenciatura 2,4%
sim, mas não sabe para que modalidade 2,4%
não respondeu -

Tabela 9: Sistematização das respostas obtidas para a questão 13 (Você vai prestaria vestibular para Química?).

As justificativas pelo interesse em prestar vestibular para Química estão no gráfico da


figura 10.
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Figura 10: Sistematização das respostas obtidas para a questão 14 (Se respondeu sim ou talvez, por que?)

Gostar de Química, trabalhar em laboratório e o fato de haver emprego na área foram


os principais fatores que levariam os estudantes a prestar vestibular para esta carreira. Porém,
percebe-se que os estudantes não possuem muito interesse em seguir esta profissão e os que
ao menos consideraram esta possibilidade têm opiniões diversas, embora gostar da disciplina
e a abundância de emprego tenham sido marcadas como as principais razões. Chama atenção
o fato de nenhum estudante ter marcado a opção de seguir “carreira como professor desta
disciplina”, o que mostra que esta profissão é desvalorizada pelos estudantes. Sobre a
alternativa de não seguir esta carreira, não gostar da disciplina e nunca ter pensado na
profissão foram as principais escolhas, como se pode verificar na figura 11.

Figura 11: Sistematização das respostas obtidas para a questão 15 (Se respondeu não, por que?).
64

A rejeição pela disciplina e o fato de nunca ter considerado a profissão foram as


principais razões dos estudantes para não prestar vestibular para esta carreira, seguido de não
ter intenção de ser professor de Química, o que mostra que estes estudantes não gostam
realmente desta profissão (professor). Sobre a questão se os estudantes prestariam vestibular
para profissões correlatas, as respostas encontram-se na figura 12.

Figura 12: Sistematização das respostas obtidas para a questão 16 (Prestaria vestibular para as profissões
correlatas como farmácia, engenharia química, engenharia de alimentos, etc.?).

No caso de prestar para profissões correlatas à Química, as respostas foram mais


positivas que com relação à questão anterior, embora a maioria dos estudantes tenha
respondido não e talvez para essa questão. Sobre os motivos de prestar vestibular para
profissões correlatas, os dados estão na figura 13.

Figura 13: Sistematização das respostas obtidas para a questão 17 (Se respondeu sim ou talvez, por que?).
65

De acordo com os dados da figura acima - semelhante às questões anteriores sobre


prestar ou não vestibular para Química – a escolha ou não por estas profissões correlatas tem
relação, principalmente, com a afinidade ou rejeição pela disciplina ou, no caso dos que
disseram que prestariam para profissões correlatas, afinidade por determinadas áreas e
conteúdos desta disciplina. Isto pode ser verificado também na figura 14, que mostra as razões
dadas pelos estudantes para não prestar tais carreiras.

Figura 14: Sistematização das respostas obtidas para a questão 18 (Se respondeu não, por que?).

Com isso, ao analisar como os estudantes percebem esta disciplina e suas aplicações,
no que se refere também na escolha de uma carreira que tenha relação com o estudo dessa
disciplina, mesmo que apenas em parte, pode-se afirmar que a maioria dos estudantes não se
sente à vontade para prosseguir os estudos em cursos que possuam relação com Química.
A partir da perspectiva da motivação intrínseca e seu efeito sobre o indivíduo, Moraes
e Varela dizem que:

A motivação intrínseca é compreendida como sendo uma propensão inata e


natural dos seres humanos para envolver o interesse individual e exercitar
suas capacidades, buscando e alcançando desafios ótimos (MORAES e
VARELA, p. 10)

De acordo com a definição de motivação intrínseca, por mais difícil que esta disciplina
seja ou possa vir a ser, levando em consideração essa propensão inata do ser humano para
exercitar sua capacidade, deveria haver menos rejeição por esta área do conhecimento. Ao
66

analisar os dados, percebe-se que as respostas dos estudantes muitas vezes caminham mais
para a rejeição da disciplina do que por afinidade por outras disciplinas, o que pode ser
observado na tabela 13 ao comparar as respostas sobre prestar para outras áreas e não prestar
para áreas correlatas á Química.
Supõe-se assim, que algo acontece durante o estudo desta disciplina que passa a
desmotivar os estudantes sobre a possibilidade de se dedicar e prosseguir os estudos nessa
área. Ao considerar também como o currículo pode exercer um papel na relação desta
disciplina e subsequente motivação dos estudantes, pode-se dizer que “as visões tradicionais
sobre as relações entre currículo e cultura estão assentadas numa concepção estática e
essencializada de cultura”, de acordo com Silva (2006, p.14).
Isto quer dizer que, somando-se ao discutido anteriormente sobre o currículo
disciplinar, livro didático disciplinar e também no ensino fragmentado da disciplina, tem-se
em algumas instituições, na prática, apesar de esforços e de todo os documentos orientadores
publicados, o conhecimento como algo estático. Desta forma, a Química chega aos estudantes
como um conhecimento absoluto, e estes não serão capazes de se apropriar do mesmo.
Esta cultura que é “concebida como um produto acabado” que “não é feita, não se
transforma”, de acordo com Silva (2006, p. 14), parece não exercer atração sobre os
estudantes e pior ainda a maneira como essa disciplina é ensinada parece causar repulsa na
maioria deles, mesmo naqueles que inicialmente se mostraram propensos a estudá-la.
Extrapolando o assunto, ainda de acordo com Silva (2006, p. 22) “O currículo visto
como produto acabado, concluído, não pode deixar de revelar as marcas das relações sociais
de sua produção”. Com isso, é preciso levar em consideração a maneira como o currículo é
apresentado, apesar de diversas mudanças que ocorreram no sentido de melhorar não só este
isoladamente, mas também as relações interdisciplinares ministradas dentro do mesmo. Deste
modo, este ainda guarda as relações de classe em que foi criado, mantendo uma estrutura
classificatória e excludente, no que diz respeito ao sistema de classificação por provas
pontuais (geralmente, mas nem sempre) que classificam o estudante implicitamente em
melhor ou pior de acordo com suas notas.
A nota final no boletim, para muito destes estudantes, não significa muito, ainda mais
por saberem da progressão continuada, e tampouco o aprendizado da disciplina em si, já que
não conseguem visualizar como poderão utilizá-la no cotidiano. Ainda, de acordo com os
dados obtidos, quase metade dos estudantes disse que não sabe ou não irá prosseguir os
estudos. Nessa realidade, o sistema curricular, como dito anteriormente, com objetivo de
classificar os estudantes para o temido mercado de trabalho e ingresso em faculdades, não
67

exerce influência significativa.


Por fim, “somos obrigados a rejeitar a visão convencional do currículo como uma
„coisa‟, como um conjunto de informações e matérias inertes” (MOREIRA e SILVA1999,
p.28). O currículo, mesmo que os docentes e a instituição de ensino não percebam, possui
marcas de relações sociais. Deste modo, é preciso ter cuidado para não propagar estas
relações no meio escolar, para que isso não desmotive ainda mais os alunos.
68

6 CONCLUSÃO

Ao realizar a pesquisa no que se referem à motivação, tendências educacionais,


materiais e recursos didáticos utilizados no estudo, foi possível observar, mesmo que em
pequena escala, a influência que estes tópicos têm na maneira como os estudantes percebem
tal disciplina.
A motivação depende de vários fatores que podem ser internos ou externos ao
estudante, porém, de acordo com as respostas obtidas neste questionário, acredita-se que o
conjunto de fatores externos, que irão formar as mais variadas situações para estímulo da
motivação extrínseca, tenha mais influência que a motivação intrínseca. Isso se deve ao fato
da maioria dos estudantes apresentar alto índice de rejeição pela disciplina ao invés de
predileção por outras. O fato de gostar de outras disciplinas e conteúdos deveria pesar mais na
escolha dos estudantes, sobre a dedicação ao estudo e prosseguimento em carreiras de
Química ou profissões correlatas, do que o fato de não gostar desta.
A partir disso, acredita-se que a motivação extrínseca tenha um papel importante no
estudo desta disciplina e de seus conteúdos, pois o sentimento negativo com relação a esta
disciplina transpareceu na análise do questionário.
Sobre a Química escolar e suas relações com a percepção e motivação dos estudantes
no que tange a disciplina, foram procuradas ligações sobre pontos referentes à propagação de
um currículo disciplinar e suas relações com desempenho acadêmico, manutenção e
influência das relações sociais - mesmo que implícitas - por este currículo e como este sistema
curricular, que carrega alguns traços destas relações de poder, poderiam afetar a percepção
dos alunos e consequente motivação para estudo da disciplina.
O currículo como algo estático, que entrega uma cultura pronta, uma disciplina
fragmentada, servindo aos propósitos de preparação para exames e um sistema de nota que
classifique os indivíduos, pautado em discurso que privilegie a competitividade, consumo e
mercado, entre outros, não atrai a atenção dos alunos, ainda mais de alunos que não têm ainda
formada projeções sobre seus futuros. Embora os estudantes saibam que é necessário
continuar seus estudos, nesta pesquisa ficou evidente que boa parte não sabe se continuarão a
estudar após o término do Ensino Médio.
Deste modo, o discurso quase que hegemônico de estudar para passar no vestibular, ter
um bom emprego e melhorar de vida, quando a projeção futura não é ainda bem delineada,
parece não exercer influência positiva na motivação dos estudantes.
69

Finalmente, também foi analisado como as tendências educacionais poderiam ter


efeito nestas relações. Nesta pesquisa em questão, foi investigado se os recursos audiovisuais,
contextualização, interdisciplinaridade e experimentação exerceriam efeito positivo na
percepção e motivação dos estudantes. No entanto, ao analisar as respostas do questionário,
foi possível constatar que os recursos audiovisuais não foram utilizados. Do mesmo modo,
apesar dos estudantes responderem que havia contextualização e interdisciplinaridade, ao ser
pedido que citassem tais exemplos, não foram capazes de fornecer exemplos consistentes.
Sobre a experimentação foi quase unânime que a desejam, embora também não seja utilizada.
Levando em consideração estes fatores, mesmo não sendo possível estabelecer uma
conexão direta entre a ausência destes e sua influência na motivação e percepção, acredita-se
que se estas tendências educacionais fossem utilizadas adequadamente, os estudantes teriam
mais interesse pela disciplina. Pois, muitos dos exemplos citados sobre as relações da
Química com trabalho, interdisciplinaridade e contextualização deixaram transparecer que os
alunos não possuem muita noção do papel da Química na sociedade e nas relações do
cotidiano e com outras áreas do conhecimento, por vezes citando exemplos distantes e
estereotipados de tais relações.
Assim, acredita-se que vários estudantes possuem uma percepção incompleta e
preconceituosa da disciplina, além de não possuírem motivação suficiente e não se sentirem
motivados extrinsecamente para o estudo da Química. Isto poderia talvez ser mitigado pelo
uso eficiente e adequado das tendências educacionais supracitadas. No entanto, é preciso ser
cauteloso com as relações sociais que estão vinculadas, mesmo que implicitamente e sem nos
darmos conta, no currículo. Os estudantes não se sentem motivados a atingir os objetivos que
tal currículo define, ainda mais quando não possuem bom desempenho nesse sistema.
É claro que é muito difícil, se possível, separar estes fatores e estudá-los, pois todos
interagem entre si e com mais outros, em maior ou menor grau, dependendo da situação.
Entretanto, de acordo com o proposto neste estudo, o que se pôde observar foi que, por mais
que ainda haja muito a ser melhorado na prática educacional, não é possível toda a
responsabilidade ficar a cargo do poder público. O professor e a escola juntos devem, antes de
tudo, se esforçar para que o processo de ensino-aprendizagem e construção do conhecimento
tenham uma influência maior nos estudantes, utilizando-se de vários recursos. Ainda, as
avaliações não devem ser um fim, mas um meio para corrigir e melhorar tais processos no
decorrer do estudo da disciplina de Química, assim como as relações que existem no currículo
devem ser colocadas sempre em pauta para verificar se atende as necessidades da comunidade
específica em que a escola está inserida.
70

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