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Immanuel Kant nasceu em 23 de abril de 1724, em Königsber, Prússia Oriental.

Filho de
um artesão, de religião protestante, iniciou-se na atividade acadêmica como preceptor de famílias
ricas e, em 1770, tornou-se catedrático em Lógica e Matemática na Universidade de Königsberg.
Também estudou Filosofia, Matemática e Física na mesma universidade. Suas principais obras
foram escritas na fase madura de sua vida (após os 60 anos). A mais famosa de suas obras foi
“Crítica da Razão Pura”, publicada em 1781.
Kant não se casou, nem teve filhos. Dedicou quase toda sua vida ao estudo da Filosofia e
a carreira de professor universitário. Levou uma vida simples e metódica na cidade em que
nasceu. Faleceu aos 79 anos de idade, em sua cidade natal, no dia 12 de fevereiro de 1804.
A obra Sobre a Pedagogia foi publicada originalmente em 1803, um ano antes de sua
morte, por isso se encontram especulações de que ele estaria senil durante a escrita desta obra.
Entretanto, apresenta ideias coerentes e organizadas, constituindo um importante referencial
sobre o pensamento social e educacional da época.
Considerando o momento histórico em que viveu, que inclui uma transição do período do
Renascimento para o Iluminismo, Kant é considerado um dos precursores das ideias iluministas,
por criticar o racionalismo e o empirismo e buscar uma “razão pura”, na qual o sujeito fosse capaz
de pensar por si.
Em Sobre a Pedagogia, Kant ressalta que “o ser humano é a única criatura que tem de ser
educada” (Kant, 2021, p. 09). Para o autor, a Educação consiste em CUIDADO e FORMAÇÃO.
O cuidado está relacionado à mantença e o sustento da criança e decorre da preocupação
dos pais para que as crianças não prejudiquem a si mesmas, fazendo uso inadequado de suas
capacidades. O cuidado também se refere ao que o autor chama de educação física, que consiste
na preocupação com aspectos mais práticos da educação, como a alimentação, a saúde física, as
brincadeiras e os costumes em geral. O autor recomenda que a criança tenha certa liberdade para
se desenvolver e desaconselha o uso de muitas ferramentas e instrumentos, como fraldas,
andadores e balanços. Kant considera que alguns aspectos do que ele chama de “cultura da
alma” também podem ser considerados parte da educação física, pois segundo ele, “pode-se
chamar de física tanto a formação da alma quanto a formação do corpo.” (Kant, 2021, p. 48)
Porém o autor enfatiza a distinção entre natureza e liberdade, pois para a natureza humana a
educação deve dar formação, enquanto para a liberdade, deve dar leis. A educação voltada para a
natureza deve ser livre, pautada pela brincadeira, que deve observada e ocupada no lazer, além
de agradável em si e sem propósito. Já a educação voltada para a liberdade, ao contrário, deve se
desenvolver através de tarefas e trabalho, que deve ser coagido, não é agradável e si e deve ser
empreendido com intuito.
A formação consiste em cultivo e instrução. O cultivo corresponde à parte negativa da
educação, enquanto a instrução refere-se à parte positiva. O cultivo está diretamente relacionado
à disciplina que consiste no “amansamento da selvajaria” (Kant, 2021, p. 20). Seu objetivo é
“transformar a animalidade em humanidade” (Kant, 2021, p. 09).
Para Kant, assim como para Comenius, é importante começar cedo a disciplinar as
crianças, pois quanto mais se demorar nessa tarefa, mais difícil será conseguir bons resultados. A
disciplina é importante para submeter o ser humano às leis e, para o autor, tem mais valor do que
a cultura, que pertence à instrução. Esta consiste na condução e no ensino para o
desenvolvimento de habilidades e orientação da prática.
A formação também está relacionada à educação prática, da qual fazem parte a
habilidade, a prudência mundana e a moralidade. Sobre a habilidade, Kant enfatiza que deve ter
solidez e profundidade, de modo a ir gradualmente se constituindo em um “costume na maneira
de pensar” (Kant, 2021, p. 70). A prudência mundana corresponde ao bom uso das habilidades,
devendo o aprendiz ser estrênuo, ou seja, esforçado, pertinaz, valente, porém cuidadoso e zeloso.
Enquanto a habilidade pertence ao talento, a prudência mundana pertence ao temperamento.
Há uma grande ênfase à moralidade em Kant. Segundo o autor, esta “diz respeito ao
caráter” (Kant, 2021, p. 71) e consiste na capacidade de eliminar paixões e acostumar-se às
privações. À moralidade pertencem a coragem e a inclinação.
Segundo Kant, a educação pode ainda distinguir-se entre privada, pública ou integral. A
educação privada é aquela que acontece no ambiente doméstico, fortemente relacionada à
educação física e que deve ser desenvolvida pelo preceptor, com total gerência sobre o aprendiz
ou pupilo. Cabe ressaltar a diferença que Kant estabelece entre preceptor e instrutor, sendo que,
para ele, este é um mestre e aquele é um guia, de modo que enquanto o instrutor ensina para a
escola, o preceptor ensina para a vida. (Kant, 2021, p. 24). Porém, para Kant a educação privada
pode não ser tão desejável, pois corre-se o risco de fomentar e reproduzir erros familiares na
criança (Kant, 2021, p. 25). Por isso, para ele a educação pública é mais vantajosa e permite o
desenvolvimento de um “modelo futuro de cidadão” (Kant, 2021, p.27). A educação pública está
ligada à instrução e nela ninguém tem privilégios e pode destacar-se apenas por mérito próprio.
(Kant, 2021, p. 27). Educação pública integral seria a ideal, pois teria como objetivo contemplar a
instrução e a formação moral, buscando o aprimoramento da educação doméstica em um
contexto público. Porém Kant afirma que tais estabelecimentos são caros e elitizados e haveria
poucos deles naquele momento.
Em relação aos propósitos da educação, Kant faz uma distinção entre a cultura geral das
faculdades do ânimo e a cultura particular das faculdades do ânimo. A cultura geral visa o
desenvolvimento de habilidade e aprimoramento, que pode ser física ou moral. A física se baseia
no exercício e na disciplina, deve ser passiva e o aprendiz deve obedecer orientações, sendo que
outros pensam por ele. Já a moral se baseia em máximas e devem ser evitados exemplos,
ameaças ou punições, pois visa desenvolver o valor moral das ações e não pode prescindir de
compreensão. É ativa e o aprendiz deve aprender a fazer o bem porque isso é bom. (Kant, 2021,
p. 55)
A cultura particular das faculdades do ânimo divide-se em faculdades que são
inferiores do entendimento e faculdades que são superiores. As faculdades inferiores são a
cultura da capacidade cognitiva, a dos sentidos, da imaginação, da memória, das forças da
atenção e a da espirituosidade. (Kant, 2021, p. 56). Já as faculdades superiores implicam a
cultura do entendimento, a faculdade do juízo e a cultura da razão. (Kant, 2021, p. 57) Enquanto a
cultura do entendimento, inicialmente pode ocorrer passivamente, através de exemplos, a
faculdade do juízo presume o uso do entendimento. Em relação à cultura da razão, Kant
recomenda uma maneira socrática e enfatiza a necessidade de uma razão guiada e prática, na
qual haja reflexão sobre as causas e efeitos e o conhecimento seja extraído ao invés de
inculcado.
Para Kant, a Educação é uma arte, a propósito, uma das invenções mais difíceis da
humanidade, ao lado da arte do governo. Segundo o autor, tanto as origens quanto os progressos
dessa arte da educação são ou mecânicos ou judiciosos. Quando de origem mecânica, nos casos
em que a educação ocorre por força de circunstâncias que poderiam ser úteis ou prejudiciais à
humanidade, essa educação teria muitos erros e defeitos, pois não haveria um planejamento. Por
essa razão, Kant defende que a educação seja judiciosa, ou seja, sensata, justa, acertada, pois
somente assim poderá desenvolver a natureza humana para alcançar seu destino. (Kant, 2021, p.
16) Para que isso seja possível, Kant defende que a Pedagogia se torne um estudo e que seu
mecanismo seja transformado em ciência. Com isso, a educação logrará educar as crianças para
um futuro da estirpe humana melhor. O autor defende uma educação para o bem universal, que
tenha um plano educacional cosmopolita. (Kant, 2021, p. 18)
No que se refere ao pupilo ou aprendiz, Kant afirma que a criança, no que ele chama de
primeira época, deve submissão total e obediência passiva, sofrendo coação mecânica. Já o
jovem pode fazer uso da reflexão e de uma certa liberdade sob leis, de modo que a coação seja
moral. Em relação à submissão, o autor explica que pode ser positiva ou negativa. A primeira
ocorre quando o aprendiz não pode julgar o que faz, por isso necessita punição. Já a segunda
ocorre quando o aprendiz quer impor sua vontade, mas já pode pensar, nesse caso, não é
necessária punição além de não satisfazer a sua vontade. (Kant, 2021, p. 26)
Sobre as punições, Kant destaca seu papel na educação e afirma que nenhuma
desobediência deve ficar impune. Ele divide as punições em físicas e morais, sendo as físicas
consideradas positivas e as morais, negativas. As punições físicas, segundo Kant, devem ser
aplicadas com cautela e consistir apenas em complementos à insuficiência da punição moral.
Devem compensar a falta de reflexão e muitas vezes ocorrem naturalmente devido a uma conduta
inadequada que acarreta consequências ruins. Porém o autor dá grande ênfase às punições
morais, que segundo ele são as melhores. Não se sentir honrado e amado, por exemplo, é uma
punição que Kant considera altamente eficiente, assim com fazer com que o pupilo sinta
vergonha, indiferença, frieza e desprezo. Essas punições devem ser aplicadas nos casos em que
se verifica mândria e imoralidade, como quando há mentira, intransigência e inconciliabilidade por
parte do aprendiz. (Kant, 2021, p. 64)
A referência à disciplina, moralidade e punição são recorrentes na obra estudada e estão
relacionadas à preocupação de Kant com a formação do caráter. Segundo o autor, pertencem ao
caráter a obediência, a veracidade e a sociabilidade. Em relação à obediência, no caso dos
menores deve ser direcionada à vontade absoluta do guia e, sendo assim, deriva de uma coação
absoluta. Já para os jovens, a obediência deriva de uma vontade reconhecida como razoável e
boa e por isso há uma coação voluntária.
Sobre a importância da veracidade, Kant expressa nitidamente o pensamento da época,
que diminui o valor da mulher enquanto educadora e afirma, referindo-se à prevenção da mentira
que “é incumbência do pai atentar para que a criança se desacostume dela; pois geralmente as
mães a consideram coisa insignificante.” (Kant, 2021, p. 67) Segundo Kant, a melhor punição para
a mentira é a perda do respeito.
Em relação à sociabilidade, o autor destaca a importância de permitir que a criança brinque
com certa liberdade, faça amizades e que lhe seja ensinado apenas o que diz respeito a sua
idade, atentando também para a importância dos exemplos positivos.
Para finalizar a obra, Kant fala da fundação do caráter, destacando que este “consiste na
firma resolução de pretender fazer algo, e também na execução efetiva do mesmo” (Kant, 2021, p.
72). Segundo o autor, deve-se fundar o caráter na criança através de exemplos e ordenações,
ensinando-lhes deveres que são ou concernentes a si, quando implicam na dignidade humana ou
concernentes a outrem quando devem resultar em respeito e reverência.
O autor destaca a importância de atentar para os apetites, vícios e virtudes do ser
humano. Os apetites podem ser formais, materiais ou incluir ambos como elementos da
felicidade. Os apetites formais estão relacionados à liberdade e capacidades e incluem ambição
desmedida, sede de poder e ganância. Os apetites materiais se relacionam aos objetos e incluem
fruição sexual, fruição material e fruição em companhia. Já quando são elementos da felicidade,
os apetites incluem amor ao viver, amor à saúde e amor à comodidade. (Kant, 2021, p. 78)
Os vícios são da ordem da maldade, da estreiteza ou da baixeza. Os da ordem da
maldade são: inveja, ingratidão, alegria com o mal alheio. Os vícios da ordem da estreiteza são:
insensibilidade, avareza e letargia. Já os vícios da ordem da baixeza são: injustiça, deslealdade,
indolência.
As virtudes são ou do mérito, ou da obrigação ou da inocência, sendo as do mérito a
generosidade, a caridade e o domínio de si. As virtudes da obrigação são retidão, decência e
pacificidade, enquanto as virtudes da inocência são a honestidade, a compostura e a frugalidade.
Apesar de apresentar algumas críticas à educação da época, Kant apresenta nesta obra
algumas sugestões e indicações do que poderia ser feito a fim de obter uma boa educação.
Destaca-se a preocupação do autor com uma educação que assegure a evolução da “estirpe
humana” e que seja pensada com propósitos universais.
Destaques e sugestões do autor
1. “As crianças são mandadas à escola não já com o intuito de que aprendam coisas ali, mas a
princípio para que possam se acostumar a se quietar e a observar pontualmente aquilo que lhes
seja prescrito, para que no futuro, também, não venham realmente a pôr já em prática qualquer
ideia que lhes ocorra.” (p. 10)
2. “O ser humano só logra se tornar humano mediante educação”. (p. 12)
3. “Há vários germes na humanidade, e então cabe a nós desenvolver as disposições naturais
proporcionalmente e desenvolver a humanidade a partir dos seus germes, e fazer com que o ser
humano alcance seu destino.” (p.14)
4. “A educação é uma arte cuja prática tem de ser aprimorada por várias gerações.” (p. 15)
5. “Um dos maiores problemas da educação diz respeito à possibilidade de conciliar a subjugação
à coação das leis com a capacidade de se servir da sua liberdade. Pois a coação é necessária!”
(p. 26)
6. “Distrações não devem ser toleradas, nunca, muito menos na escola[...] Em uma criança
entregue à distração, são arruinados mesmo os mais belos talentos.” (p.53)
7. “E, não obstante, nota-se que as crianças, principalmente os filhos, a amam mais os pais do
que as mães.” (p. 59)
8. “Falta às nossas escolas, quase por completo, algo que promoveria e muito a formação das
crianças em relação à integridade, a saber: um catecismo do direito.” (p. 75)
9. “Mas será que o ser humano, moralmente, é bom ou mal por natureza? Nenhum dos dois, pois,
por natureza, ele não chega a ser um ser moral; isso ele se torna apenas quando sua razão se
eleva até alcançar os conceitos do dever e da lei. Entretanto, pode-se dizer que ele tem em si,
originalmente, impulsos a todos os vícios, pois tem inclinações e instintos que o incitam, ainda
que a razão o conduza ao oposto.” (p. 78-79)
10. Deve-se indicar ao jovem a importância:
 da alegria e do bom humor;
 da estabilidade do temperamento;
 de considerar várias coisas como dever, sempre;
 do altruísmo;
 dos sentimentos cosmopolitas;
 de se alegrar com o bem universal;
 de dar pouco valor à fruição dos prazeres da vida;
 da necessidade do acerto diário de contas consigo mesmo.

Referências Bibliográficas

KANT, Immanuel. Sobre a Pedagogia. Petrópolis: Vozes, 2021.

RAMOS, Jefferson Evandro Machado. Immanuel Kant. Sua Pesquisa.com, 2021. Disponível em:
<https://www.suapesquisa.com/filosofia/immanuel_kant.htm>. Acesso em 21 de mai. de 2023.

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