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Crítica: Autor James Carroll faz uma


interpretação notável sobre Jerusalém
JOÃO PEREIRA COUTINHO
ESPECIAL PARA A FOLHA

23/03/2013 03h44

Sempre que alguém fala no conflito israelense-palestino, Jerusalém é um tema


fundamental. Razão evidente: a cidade é reclamada por judeus e árabes como capital
dos respectivos Estados.

Na história do conflito, já houve propostas para todos os gostos: transformar Jerusalém


em "cidade franca", sob supervisão internacional; dividir a cidade irmãmente entre
ambos os povos; ou, como agora acontece, manter a cidade sob administração de um
deles (os israelenses, depois da ocupação da zona oriental na Guerra dos Seis Dias de
1967).

Mas não é possível entender o mais intratável conflito do nosso tempo sem regressar
sempre a Jerusalém.

Patricia Pingree/Bloomberg

O escritor James Carroll

James Carroll, autor de "Jerusalém, Jerusalém", concorda. Mas Carroll vai ainda mais
longe: não é apenas o conflito israelense-palestino que nos obriga a regressar a
Jerusalém. A história da civilização começa (e, para muitos, acaba) na cidade assim
chamada.

DESEJO MIMÉTICO

Como explicar a centralidade de um lugar que, por experiência pessoal, se apresenta


aos olhos do turista como razoavelmente anódino e inóspito?

Carroll, antigo sacerdote cristão com sentido crítico apuradíssimo, socorre-se do grande
pensador René Girard para apresentar a "febre de Jerusalém" à luz do "desejo
mimético": sucessivas culturas foram atraídas por Jerusalém porque as culturas

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anteriores já haviam eleito o lugar como pedra fundacional (e sacrificial) dos seus
respectivos povos.

E os seres humanos, afirma Carroll seguindo Girard, não desejam necessariamente


aquilo de que precisam. Eles desejam aquilo que os outros desejam.

Assim foi com os originais israelitas do tempo de David, que fizeram de Jerusalém o
centro físico e espiritual da sua ligação a um único Deus.

E assim foi com todos os povos que vieram a seguir: dos romanos aos muçulmanos;
dos muçulmanos aos cruzados; dos cruzados aos turcos otomanos; dos otomanos às
potências
ocidentais que saíram vitoriosas da Primeira Guerra Mundial (1914- 1918).

Sem esquecer, obviamente, as sucessivas vagas de imigração judaica (e sionista) que,


em finais do século 19 e procurando escapar aos pogroms da Europa oriental,
regressaram a
Jerusalém depois de uma diáspora milenar.

E quando Jerusalém estava demasiado longe para quem decidia rumar em sentido
inverso, a cidade era (re)criada como uma "Nova Jerusalém": a "cidade no topo do
monte" que recebeu os imigrantes do Velho Mundo quando eles chegaram ao Novo
Continente.

PROPOSTA INCLUSIVA

O livro de James Carroll é uma interpretação notável sobre a história de Jerusalém: não
apenas a Jerusalém "real", mas também a Jerusalém imaginada, sublimada --e
desejada.

Mas é mais que isso: tratando-se de um antigo sacerdote, Carroll procura mostrar como
a "febre de Jerusalém", a disputa constante por um território onde sucessivas
civilizações projetaram as suas fantasias milenaristas, só pode ser temperada por uma
compreensão mais "ecumênica" do verdadeiro espírito religioso.

A unicidade de Deus, sistematizada pelo povo hebraico nos anos do exílio babilônico e
mimetizada pelas religiões abrâmicas posteriores, não é uma proposta que exclui (e
demoniza) o Outro.

Pelo contrário: deve ser uma proposta inclusiva, onde todas as criaturas são convidadas
para sentar à mesma mesa.

E "convidadas" é o termo: a religião deve apresentar-se como um convite, não como a


expressão coerciva de quem pretende subjugar terceiros à sua Verdade revelada.

Eis um livro que merece leitura atenta: não apenas pelos fanáticos religiosos. Mas
também pelos fanáticos seculares que mimetizam os fanáticos religiosos.

JERUSALÉM, JERUSALÉM
AUTOR James Carroll
EDITORA Cultrix
TRADUÇÃO Euclides Luiz Calloni e Cleusa Margô Wosgrau
QUANTO R$ 52,20 (464 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo

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Endereço da página:

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2013/03/1250987-critica-autor-james-carroll-faz-uma-interpretacao-
notavel-sobre-jerusalem.shtml

Links no texto:

"Jerusalém, Jerusalém"
http://livraria.folha.com.br/catalogo/1201772/jerusalem-jerusalem

JERUSALÉM, JERUSALÉM
http://livraria.folha.com.br/catalogo/1201772/jerusalem-jerusalem

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