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INSTITUTE FOR THE NEW AGE

(Instituto para a Nova Era)

45 East 78th Street, New York, New York 10021 / Fone 737-8808

A CONTRATRANSFERÊNCIA
DO PONTO DE VISTA CARACTERIOLÓGICO

Por Andre Leites, Ph. D

Copyright 1976, A. Leites


PREFÁCIO E ADVERTÊNCIA

Este é um livro técnico, escrito para o terapeuta praticante que queira aprofundar a sua
compreensão de si mesmo, da sua prática e dos seus pacientes. Pode ser usado
simplesmente como um manual de referência, para ser consultado periodicamente, mas
seu objetivo é despertar no terapeuta, o que eu espero que seja uma nova forma de
abordar a contratransferência. Não é uma tentativa de sistematiza aquilo que por
definição desafia a sistematização – uma interação humana. Em vez disso, este livro
espera apenas agir como catalisador, oferecendo uma nova perspectiva, um novo modo
de ver a contratransferência.

O que esperamos é que o terapeuta, depois de ler este livro, comece a pensar dentro das
linhas gerais aqui sugeridas, sem se limitar às interações e aos mecanismos de defesa
aqui descritos. De acordo com a premissa sobre a qual este trabalho é baseado, conhecer
a sua própria estrutura de caráter, sua etiologia e defesas características deve ser útil ao
terapeuta na apreciação da forma pela qual ele afeta o paciente, bem como da forma pela
qual o paciente o afeta. Isto deve ajudá-lo a localizar problemas rapidamente, e talvez
mesmo a prevê-los (algumas vezes).

Tudo isso é baseado, necessariamente, no sistema “modelo”; isto é, são usados


“modelos” que, para começar, são construtos teóricos e, portanto, não reproduzem
exatamente as situações clínicas reais. É uma abstração; mas uma abstração que achei
muito útil conhecer e ter em mente durante a minha prática diária. Ela me manteve fora de
muitos problemas, mas, felizmente, não de TODOS os problemas.

Antes de 1905, Freud postulou a necessidade de um sistema que “caracterizasse” os


pacientes, tornando mais fácil para o terapeuta entender, pelo menos em linhas muito
gerais, os seus pacientes. Muitas tentativas foram feitas desde então, mas eu acredito
que a mais bem sucedida até hoje foi o importante livro de Lowen, O Corpo em Terapia –
A Abordagem Bioenergética. Ele contém a base da teoria bioenergética e descreve em
detalhes cada uma das estruturas de caráter aqui discutidas. Para máxima clareza, eu
sugeriria que o leitor se familiarizasse com este trabalho, antes de ler o livro. Ao longo
deste livro, vamos presumir que o leitor tenha alguma familiaridade com esse modelo
particular, e constante referência será feita a ele.
Para o terapeuta que não tenha um background em terapias orientadas para o corpo, eu
sugeriria a leitura de The Body Reveals, de Ron Kurtz e Hector Prestera, pois é uma
excelente apresentação da teoria subjacente básica que está por trás da hipótese da
identidade psicossomática (mente-corpo) que, por sua vez, é o pilar sobre o qual repousa
o ponto de vista bioenergético. É um trabalho simples, claro, direto – qualidades
realmente raras, num livro que lide com um assunto tão complicado. É uma ponte
excelente.

É claro que para desenvolver um conhecimento profundo da caracterologia em geral, e da


contratransferência caracteriológica, em particular, são necessários muita leitura e muito
trabalho experencial. Entretanto, para o leitor interessado em adquirir uma compreensão
intelectual esquemática e rápida, mas surpreendentemente completa, do modelo
bioenergético da caracteriologia e do seu uso, eu acredito que a leitura cuidadosa dos
seguintes livros, nessa ordem seria muito frutífera:

1. The Body Reveals;


2. Pshysical Dynamics of Character Structure (O Corpo em Terapia);
3. Contrasfrerência Caracteriológica.

Certamente, nada pode substituir o trabalho experimental (mais uma vez, felizmente), em
minha opinião. Ele ainda constitui 80% do aprendizado; mas a maior parte dos outros
20% pode ser alcançada com a leitura desses três livros.

A caracteriologia é um instrumento maravilhoso, quando usado com sabedoria. Ela pode


ser comparada a uma boa serra elétrica; um instrumento excelente e poderoso que,
quando bem usado, economiza muito trabalho, mas quando mal usado pode tornar-se
perigoso. A caracteriologia se torna abusiva e perigosa toda vez que o terapeuta a usa
para “classificar” ou “enquadrar’ seu paciente. Isto é, quando a pessoa se torna um
“esquizóide”, ou um “masoquista”, ou um “histérico”, e o terapeuta começa a presumir,
esperar e até, sem perceber, deduzir determinado comportamento. Isto imediatamente
elimina a singularidade da pessoa que o terapeuta está ajudando, e a terapia – no melhor
sentido da palavra – desaparece, dando lugar a um processo seco, mecânico e
impessoal, que é muito limitado. Porque o coração do trabalho, o coração das duas
pessoas envolvidas – paciente e terapeuta – desapareceu.
Finalmente, eu gostaria de esclarecer a minha posição. Eu não sou um terapeuta
bioenergético, apesar de ser treinado em bioenergética. Eu sou um terapeuta
“core-energético”*. A Core-Energética é uma nova abordagem, desenvolvida no Instituto
para a Nova Era do Homem, sob a liderança do Dr. John Pierrakos. Eu usei a
caracteriologia bioenergética porque é a mais precisa e compreensível que eu conheço,
além de ser aquela na qual fui treinado. Entretanto, como modalidade terapêutica
operacional, eu prefiro a “core-energética”, que é a integração dos 04 aspectos do
homem: o emocional, o intelectual, o físico e o espiritual.

_____________________

* ”core” – coração, alma centro, âmago.


ÍNDICE

Introdução........................................................................................................................ 07

A Estrutura Rígida – Uma Visão Geral............................................................................ 14

Etiologia do Terapeuta Fálico-Narcisista......................................................................... 21

Etiologia da Terapeuta Histérica...................................................................................... 25

Interação entre o Paciente Oral e o Terapeuta Histérico ou Fálico-Narcisista................ 29

Interação entre o Paciente Masoquista e o Terapeuta Histérico


e/ou Fálico-Narcisista...................................................................................................... 32

Interação entre o Paciente Fálico e/ou Histérico


e o Terapeuta Fálico e/ou Histérico.................................................................................. 32

Interação entre a Mulher Agressiva-Masculina


e o Terapeuta Histérico e/ou Fálico-Narcisista................................................................ 39

Interação entre o Paciente Esquizóide e o Terapeuta Histérico


e/ou Fálico-Narcisista....................................................................................................... 41

Interação entre o Paciente Passivo-Feminino e o Terapeuta Histérico


e/ou Fálico-Narcisista....................................................................................................... 45

Interação entre o Paciente Psicopata e o Terapeuta Histérico


e/ou Fálico-Narcisista....................................................................................................... 48

Etiologia do Homem Passivo-Feminino........................................................................... 50

O Terapeuta Passivo-Feminino e o Paciente Esquizóide................................................ 55

Interação com o Paciente Oral......................................................................................... 57

Interação com o Paciente Masoquista............................................................................. 59

Interação com a Mulher Agressiva-Masculina.................................................................. 62

O Homem Fálico-Narcisista.............................................................................................. 65

Interação com a Mulher Histérica..................................................................................... 69

Etiologia da Mulher Agressiva-Masculina......................................................................... 72

A Terapeuta Agressiva-Masculina e a Estrutura Esquizóide........................................... 77

A Mulher Agressiva-Masculina e a Estrutura Oral........................................................... 79

A Terapeuta Agressiva-Masculina e o Paciente Masoquista........................................... 81


Interação entre a Terapeuta Agressiva-Masculina e o Psicopata.................................... 82

Interação entre a Terapeuta Agressiva-Masculina e Outras Estruturas Rígidas............. 84

Esclarecimento Final........................................................................................................ 87

Apêndice I: Exemplos

Exemplo nº 1: Terapeuta Fálico-Narcisista e Paciente Oral............................................ 88

Exemplo nº 2: O Terapeuta Rígido do Sexo Masculino e o

Paciente Passivo-Feminino............................................................................................ 90

Exemplo nº 3: Terapeuta Histérica e Paciente Esquizóide.............................................. 91

Exemplo nº 4: Terapeuta Passivo-Feminino e Paciente Histérica................................... 93

Exemplo nº 5: Um Padrão para uma Terapeuta Oral-Histérica....................................... 94

Exemplo nº 6: Terapeuta Esquizóide e Paciente Oral..................................................... 96

Apêndice II: Características Básicas

Terapeuta Rígido.............................................................................................................. 98

Paciente Rígido................................................................................................................ 99

Terapeuta Oral.....................................................................................................100

Paciente Oral.......................................................................................................101

Terapeuta Esquizóide...........................................................................................102

Paciente Esquizóide........................................................................................................103

Terapeuta Psicopata.......................................................................................................104

Paciente Psicopata..........................................................................................................105

Terapeuta Masoquista.....................................................................................................106

Paciente Masoquista.......................................................................................................107

Apêndice III: O Componente Energético na Contratransferência...................................108


Apêndice IV: A Agressão como Agente Formativo nas

Estruturas de Caráter Rígido.................................................................... 111

Mulheres – A Histérica e a Agressiva-Masculina...................................... 113

Homens – O Fálico-Narcisista e o Passivo-Feminino............................... 115

Etiologia da Agressão Sexual.................................................................... 117

Referências...................................................................................................................... 119
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INTRODUÇÃO

A transferência é definida no glossário psiquiátrico da Associação Americana de


Psiquiatria, Edição 1975, como “o deslocamento inconsciente de sentimentos e atitudes
originalmente associados a figuras importantes (pais, irmãos, etc.) no início da vida de
uma pessoa. O relacionamento de transferência segue o padrão do seu protótipo. Os
psiquiatras usam este fenômeno como uma ferramenta terapêutica para ajudar o paciente
a entender seus problemas emocionais, e suas origens. No relacionamento
pai/paciente/médico, a transferência pode ser negativa/hostil ou positiva/afetiva”.

A transferência é, então, definida pelo mesmo glossário como “a reação emocional,


parcialmente consciente e parcialmente inconsciente, do psiquiatra ao paciente”. Harry
Stack Sullivan, o famoso psiquiatra, usou um termo diferente para definir o mesmo
fenômeno. Ele chamou de “distorção paratáxica”, que foi definida como “certas distorções
no julgamento e na percepção, principalmente em relacionamento interpessoais,
baseadas na necessidade do observador de perceber pessoas e relacionamentos, de
acordo com um padrão estabelecido por experiências anteriores. A distorção paratáxica é
desenvolvida como uma defesa contra a ansiedade”.

Realmente, o Dr. Sullivan definiu o assunto deste livro muito precisamente, porque nós
vamos lidar com a contratransferência da forma como ela acontece, no nível
caracteriológico; sendo hipótese básica que, assim como a estrutura caracteriológica nos
permite predizer com alguma precisão o tipo de respostas que pode ser esperado de
nossos pacientes sob um determinado estímulo, também podemos esperar do terapeuta o
mesmo padrão de ação-reação. Sendo assim, se pudermos criar um modelo para
descrever as interações entre terapeuta e paciente, a nível caracteriológico, nós
poderíamos ajudar o terapeuta a entender, pelos menos intelectualmente, a dinâmica de
uma seqüência contratransferencial específica, na qual ele pode se encontrar envolvido,
dando, assim, um passo muito positivo em direção à clareza. Certamente, deve ficar
entendido que nós estaremos descrevendo apenas um modelo, e um modelo parcial, uma
vez que não é possível predizer todas as interações.
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Entretanto, apesar de termos que fazer uma diferenciação clara entre um modelo e uma
situação real de terapia, onde nos relacionamos com indivíduos, e não com estruturas de
caráter, tais modelos são uteis se forem considerados como uma orientação geral e não
como uma tentativa de substituir a profunda compreensão intuitiva, que é a pedra básica
da boa terapia. Levando em consideração a característica básica de cada estrutura de
caráter, podemos tentar estabelecer o grau de “pureza” com que modelos hipotéticos
reagiriam entre si nesse nível.

Nós definimos defesas caracteriológicas como o mais primitivo mecanismo de defesa


disponível ao ego. A sua desintegração leva à regressão e à psicose: material relativo a
processos primários invadiria o ego que tivesse abandonado completamente suas
defesas caracteriológicas. Portanto, um ataque psicótico pode ser definido como um
estado no qual as defesas de caráter foram destruídas, a ponto de permitir que o material
relativo a processos primários invadisse o ego de forma incontrolável.

O termo “dissolução” ou “resolução” das defesas do caráter deve ser entendido como uma
tentativa parcial de recobrar a flexibilidade do ego comprometida no passado, em troca de
defesas. Porque quanto mais rígida é a defesa, menos flexibilidade é disponível ao ego –
e mais limitada é a escolha de respostas disponível ao indivíduo. Esta é a razão do
tremendo, e totalmente injustificado, medo experenciado por nossos pacientes, toda vez
que chegam perto da possibilidade de uma resolução parcial, de uma defesa
profundamente enraizada na estrutura do caráter: subjetivamente, o ego está
experenciando a dissolução de uma defesa que, no passado, afastou com sucesso uma
ameaça importante; e certamente a maior ameaça de todas é a dissolução da barreira do
ego, que o protege dos processos primários.

Na realidade presente, a resposta caracteriológica é uma resposta automática, que não é


questionada pelo ego, e que, portanto, pode continuar parcialmente ou totalmente
inconsciente. Quando uma resposta caracteriológica do paciente colide diretamente com
a defesa de caráter do terapeuta, uma resposta automática é disparada, e o terapeuta
começa a reagir de forma pessoal; ele está envolvido, está “preso” e responderá de uma
forma que provavelmente tornará a acionar a defesa de caráter do paciente – e assim por
diante, até chegar a um beco sem saída, onde os dois indivíduos, tendo perdido toda a
objetividade, estarão reagindo caracteriologicamente um ao outro.
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Neste ponto, a terapia terminou. Existem basicamente duas formas pelas quais isto se
manifesta: a primeira é quando o terapeuta fica zangado, assume uma posição autoritária
(que pode ser o retraimento) e, de alguma forma – direta ou indiretamente, aberta ou
disfarçadamente – ataca o paciente. A zanga é o ponto básico dessa posição
contratransferencial. O terapeuta perde sua objetividade e sua habilidade de enxergar
através das defesas do paciente; ele personaliza o ataque do paciente e não pode mais
interpretar ou entender. A segunda possibilidade é a de que o terapeuta, num nível
consciente ou inconsciente, se recuse a lidar com o assunto que o paciente está
apresentando, provavelmente porque ele mesmo ainda não resolveu esse assunto. A
recusa é a defesa do terapeuta; isto leva a uma conspiração com o paciente, e elimina a
possibilidade de se trabalhar o problema real. Neste caso, o paciente vai aceitar
alegremente essa conspiração, pois, obviamente, ele não quer encarar aquilo que ele se
recusou a encarar durante toda sua vida. A terapia pode continuar por algum tempo,
lidando com assuntos mais ou menos superficiais e irrelevantes, evitando o problema real,
que continua inexplorado.

É obvio que todos nós, uma vez ou outra, conspiramos com nossos pacientes, e todos
nós, uma vez ou outra, ficamos zangados com nossos pacientes, isto não é novidade.
Este trabalho destina-se a nos ajudar a perceber, um pouco mais claramente, algumas
dessas interações, tipificando algumas das interações caracteriológticas, a fim de que,
quando você estiver em seu consultório e se defrontar com o sentimento desconfortável
de que, ou você quer explorar um assunto, ou fica zangado sem saber por que, você
possa perceber a interação específica que está acontecendo a nível caracteriológico.

Voltando à definição de transferência que usamos previamente, acredito que a


transferência envolva projeção. Isto sempre acontece com defesas de caráter que são
projetadas para fora, num clássico mecanismo paranóide. Em outras palavras, imagens
arcaicas são projetadas sobre o terapeuta que (espera-se) não está envolvido
emocionalmente, e pode apontar a incongruência da projeção, a fim de que o paciente
possa, então, ver mais claramente a situação presente. A contratransferência,
certamente, deve envolver uma projeção similar. E, como vimos na definição de Sulivan,
também envolve uma tentativa de resolução da ansiedade. Ansiedade devida a que?
Muito provavelmente, devida a um conflito não resolvido cuja resolução está impedida por
uma resistência.
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Portanto, parece que estamos realmente lidando aqui com um problema de resistência:
resistência por parte do terapeuta, em resolver seus próprios problemas, seja no contexto
da sessão que está se desenrolando com o paciente, seja no contexto de sua própria
terapia; assim como resistência por parte do paciente que está tentando, algumas vezes
disfarçadamente, trazer um assunto que, devido à resistência, ele não tem podido
resolver em sua vida diária. Portanto, ambos – o paciente que traz o assunto não
resolvido, e o terapeuta que está lidando com uma contratransferência, por também ter
um assunto não resolvido – estão, na realidade, lidando com resistências.

Neste contexto, a contratransferência deve ser vista pelo terapeuta como a expressão da
necessidade de resolver algo dentro de si mesmo, uma fronteira inexplorada. Se esta
atitude for mantida, o trabalho de fazer terapia resultará numa sempre crescente
resolução dos problemas do terapeuta, e numa diminuição da resistência e da
contratransferência. Esta é a diferença entre um trabalho chato e aborrecido e uma visita
profissional excitante, onde as contratransferências são empreendidas como indicação de
páreas que necessitam de exploração e resolução dentro da psique do próprio terapeuta.
A contratransferência, e sua compreensão profunda podem, portanto, ser usadas como
uma ferramenta para a expansão e o crescimento.

Quando colocamos nossos pacientes sob pressão suficiente, eles respondem


caracteriologicamente. Mas cada indivíduo usará primeiramente, e acima de tudo, a
defesa caracteriológica que é típica, bem conhecida e segura. E quando isto ocorre, as
reações são sempre automáticas e fora de controle. Não é difícil, nem pouco comum, que
um paciente, na tentativa de defender-se de confrontos que ocorrem dentro do trabalho
terapêutico, “fareje” a defesa caracteriológica do terapeuta e colida diretamente com ela.

Isto é percebido pelo terapeuta como algo muito ameaçador, como uma exigência para se
deixar completamente aberto e vulnerável aos ataques do paciente. Esta não é uma
percepção falsa. A distorção está em igualar vulnerabilidade com fraqueza, desamparo,
ameaça à vida, ou à própria sanidade. Mas também não é verdade que uma parte
importante do nosso trabalho como terapeutas é, justamente, ensinar aos nossos
pacientes, que na vulnerabilidade repousa a verdadeira força; que o crescimento exige o
abandono da concha protetora, mas opressora de nossas defesas?
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Se o melhor modo de ensinar é dar o exemplo, podemos ver como é necessário que o
terapeuta esteja bem enraizado em sua própria realidade, e confie no seu próprio
processo, para poder receber tal ataque, e ainda assim reagir racionalmente a ela. A
contratransferência ocorre em muitos níveis. Ela pode ter início num nível muito
superficial, facilmente identificável, ou pode permanecer completamente fora do alcance
do consciente do terapeuta. Entretanto, à medida que o relacionamento terapêutico se
desenvolve, qualquer contratransferência aparentemente pequena revelar-se-á
perniciosa, mais cedo ou mais tarde.

A interação a nível caracteriológico só poderá levar, mais cedo ou mais tarde, a uma
paralisação ou, em última instância, à rejeição por uma ou ambas as pessoas. A
paralisação só pode ser interrompida quando um dos participantes estiver disposto a
desistir de sua posição. Este tipo de interação acontece entre terapeuta e paciente,
marido e mulher, pai e filho, professor e aluno – geralmente em qualquer relacionamento
de pares. Alguns pares são, entretanto, mais ameaçadores que outros – por exemplo,
pares terapêuticos e maritais – à medida que cresce a intimidade, cresce a ameaça e, na
mesma medida, cresce a reação caracteriológica.

Alguns pontos precisam ficar esclarecidos. A defesa caracteriologica é apenas uma


defesa. E deve ser encarada como tal. Um paciente é uma pessoa, não uma defesa, num
uma serie de defesas; tampouco uma estrutura de caráter. Estas são apenas uma série
de orientações gerais que a experiência provou serem uteis de se conhecer; mas o
terapeuta que classificar seu paciente como uma estrutura de caráter estará cometendo
um sério erro. Os seres humanos são vastamente complexos, e a maioria das pessoas
apresenta a maioria das defesas de caráter, vez ou outra.

A interação descrita, assim como as histórias de casos, deve, portanto, ser consideradas
como uma das muitas fotografias que constituem um filme. De forma alguma, elas são o
filme, em sua totalidade. Assim como ajuda na compreensão do filme todo, a identificação
de fotos específicas importantes, assim também pode ser muito útil o reconhecimento da
resistência caracteriológica, das defesas, da transferência e da contratransferência. As
interações são modelos, e não devem ser aplicadas indiscriminadamente, mas sim como
exemplos típicos.
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Este trabalho é um esforço inicial e, portanto, parcial, no sentido de descrever a interação


de pares – terapeuta e paciente. Apesar de inicialmente ter planejado descrever a
interação entre as cinco estruturas de caráter dominantes, tornou-se óbvio que isso nos
levaria a sacrificar a profundidade, na tentativa de cobrir maior quantidade de assunto.
Sendo assim, eu decidi limitar este trabalho à interação entre as estruturas rígidas e suas
subdivisões. Esperamos, em trabalhos futuros, ampliar este estudo, a fim de incluir outras
estruturas de caráter.

Enquanto isto, inclui no Apêndice, de forma esquemática, as respostas “Básicas” e


“Secundárias” que podem ser esperadas das cinco estruturas de caráter mais
importantes. Comparando aquelas páginas com as estruturas de caráter específicas
analisadas neste trabalho, e imaginando-as interagindo entre si, o leitor pode ter uma
idéia geral do que pode ser esperado. Obviamente, o modelo a ser usado é desenvolvido
neste trabalho. O leitor pode ser lembrado de que:

A) Eu sou um terapeuta branco, do sexo masculino, basicamente rodeado de


pacientes brancos, na costa oeste dos Estados Unidos, em 1976. As observações
e conclusões relatadas neste trabalho soam necessariamente limitadas por estes
parâmetros, e um trabalho complementar é necessário para determinar a
perspectiva de outros grupos, tais como mulheres e negros. Eu sinto, entretanto,
que os modelos descritos se aplicarão, talvez com algumas modificações, à
maioria dos casos;

B) A terminologia usada é, basicamente, a terminologia padrão da literatura


terapêutica, exceto quando conceitos bioenergéticos são usados.

A idéia deste trabalho surgiu durante um workshop conduzido pelos Drs. Robert Hilton e
Renato Manaco, em 1973. Eles faziam, e pelo que sei continuam fazendo, um trabalho
sobre contratransferência. Eu também quero agradecer ao Dr. Goodwin Watson,
Drª. Barbara Hogan, e Dr. Steve Adler, pelo firme apoio durante a “gestação” deste
trabalho. Um especial “obrigado” ao Dr. Robert Zimmermann, amigo e colega. Mas ao
Dr. John C. Pierrakos, meu amigo, mestre e professor, que tornou possível a realização
deste trabalho, eu não tenho palavras que possam expressar claramente o profundo amor
e gratidão que eu sinto. Foi com o seu amor pela vida, pelos seus pacientes, e pelo seu
trabalho que ele me ensinou. E a mensagem é clara: Quem cura é o amor; não importa
quão impreciso isto possa parecer no contexto do trabalho acadêmico.
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Mais duas pessoas se destacam no grupo de pessoas especiais para mim, e que se
tornaram amigos muito amados. Clare Solomon, que paciente e carinhosamente me
ajudou ao longo do caminho, e que teve que lidar com muitas contratransferências; e Eva
Pierrakos, cuja orientação espiritual, combinada com lógica brilhante, profundo
conhecimento e constante apoio afetivo foram pontos básicos no meu desenvolvimento.
De Eva, John e Clare senti um contínuo e ininterrupto amor – não o amor incondicional,
que leva à simbiose, mas um amor adulto que leva à expansão. Nenhuma técnica pode
substituir isto, assim como nenhuma técnica pode ser efetiva sem esse amor. Talvez uma
melhor compreensão da contratransferência nos ajude a compreender melhor nossos
pacientes, e com isso possamos ultrapassar as defesas e alcançar o ponto profundo onde
repousa a alma do homem, cheia de amor e criatividade, esperando ajuda para liberar-se.
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A ESTRUTURA RÍGIDA – UMA VISÃO GERAL

A classificação geral “rígido” foi usada por diversos autores para incluir várias
sub-classificações que diferem um pouco em seus sistemas defensivos. Entre eles,
podemos considerar: o homem “fálico-narcisista” e a mulher “histérica” de Lowen; o
“crônico-depressivo”, o “maníaco-depressivo” e o “paranóide”, de Baker; o “histérico”, de
F. Lake; o “genital”, o “fálico” e o “histérico” de Reich, etc. Vamos usar aqui somente a
caracteriologia de Lowen, a fim de manter a consistência de nossas descrições.

Todas estas estruturas de caráter são pós-edipianas. A fixação teve lugar durante, ou
depois, do conflito edipiano, e é caracterizada pelo fato de que a libido (energia) fixou-se
na genitália, depois de ter atravessado as fases oral e anal, com algumas exceções, como
discutido no capítulo sobre Agressão como Agente Formativo nas Estruturas Rígidas.
De qualquer forma, entretanto, a sexualidade foi reconhecida e identificada pela criança,
apesar dela não ter diferenciado entre sexualidade e amor.

Esta é, na realidade, a fonte do trauma: o progenitor de sexo oposto, tendo separado


sexualidade de amor, dentro de si mesmo, não pôde tolerar a expressão de um
sentimento integrado, um sentimento que flui suavemente entre amor e sexualidade. O
progenitor se vê reagindo sexualmente (e, portanto, de forma inaceitável) à expressão
(sexual) de amor da criança. Ele culpa a criança por provocar isto, e reprime brutalmente
as manifestações da criança, seja rejeitando-a abertamente, seja de modo dissimulado,
através de uma ameaça de rejeição. Sendo assim, o medo de rejeição se tornará, anos
mais tarde, uma característica predominante do “rígido”.

A princípio, a rejeição foi traduzida pela criança como uma rejeição de todo o seu ser,
mas, posteriormente, ela virá a associar sexualidade e/ou amor à rejeição. A palavra
essencial aqui é: e/ou; simbolizando a divisão entre sexualidade e amor. Antes da
sexualidade, seu amor era totalmente aceito, depois dela, não.
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A sexualidade se torna a culpada, a causa da rejeição. Nessa tenra idade, a criança ainda
é capaz de controlar isto. E apesar do trauma ser profundo e extremamente doloroso, a
criança pode reprimir a expressão sexual do seu amor, deixando-a em estado latente.
Entretanto, o trauma existe e, quando a criança chegar à adolescência e não puder mais
negar sua forte sexualidade; ela se defrontará com uma escolha impossível: expressar
sua irreversível e inegável sexualidade ou permitir que seu amor flua. Seu trauma de
infância lhe ensinou que amor e sexualidade são incompatíveis; que amor expresso
sexualmente significa rejeição imediata.

Uma escolha tem que ser feita, e desde que a sexualidade está emergindo com força
total, a expressão do amor se torna a única solução viável, se o preceito criado pelo
trauma tiver que ser obedecido. Enquanto na sua infância a criança era capaz de suprimir
a sexualidade e continuar expressando amor, na adolescência ela é forçada a reverter o
processo, desta vez permanentemente. Esta escolha, inaceitável, mas inevitável, entre
amor e sexualidade, gera um enorme ódio pela figura que criou esta dicotomia.

O homem fálico-narcisista e a mulher-histérica, durante a adolescência, negam sua


capacidade de amar, e começam a usar, como expressão do seu ódio, o próprio
instrumento que eles lutaram tanto para reprimir na infância. A mulher se torna sedutora e
namoradeira, enquanto o homem se torna um desafiador aberto de seus “oponentes”.
Ambos usam sua sexualidade agressivamente para obter o que quer que desejem do
sexo oposto. Subjacente a este aparente uso da outra pessoa, está também a
necessidade de descarregar – abertamente para o fálico, e de modo encoberto para a
histérica – o tremendo ódio que, por sua vez, é uma defesa contra a expressão do desejo
e, finalmente, do amor. Portanto, a sexualidade é usada sadicamente como vingança; e,
realmente, em terapia, observamos que a “vingança” é uma motivação muito forte neste
tipo de estrutura.

Agora, vamos dar uma olhada na situação edipiana. Como já vimos, o progenitor, do sexo
oposto foi desejado e amado e, entretanto, tornou-se odiado (sendo o ódio uma defesa
contra o desejo, como resultado da rejeição).
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Mas o que aconteceu com o progenitor do mesmo sexo? Se ele/ela é fraco(a) ou


omisso(a) será odiado(a) pela criança por não apoiá-la em sua luta edipiana. Se ele/ela é
forte, será temido(a). Se o progenitor do mesmo sexo é amoroso(a) e protetor(a), a
criança terá permissão para expressar agressão e ódio, e mais tarde será capaz de fazer
isso livremente (homem fálico e mulher agressiva-masculina). Enquanto que se a
agressão não é permitida, ou pior ainda, é reprimida, teremos os subtipos rígidos mais
passivos – o homem passivo-feminino e a mulher histérica. A expressão “mais passivos”
aqui, é usada num sentido relativo – estes subtipos são “mais passivos” do que o fálico e
a agressiva-masculina, mas eles certamente não são pessoas passivas. Nenhum rígido é
passivo, no sentido profundo da palavra.

No contexto das situações edipianas clássicas, o medo reforça a repressão inicial da


sexualidade durante a infância. Mas na adolescência, o homem e a mulher reagem de
modo diferente. O homem desenvolve ansiedade de castração, e se a agressão também
for reprimida, ele pode cair na estrutura passivo-feminina. Por outro lado, se uma
quantidade razoável de agressão foi permitida, ele reafirmará sua sexualidade e se
tornará arrogante, desafiador e insolente – o verdadeiro fálico-narcisista. A mulher tenta
negar sua sexualidade, e pode tornar-se frigida – mais ou menos temporariamente, mais
ou menos completamente. Entretanto, a frigidez não é um sintoma específico do caráter,
e não deve ser considerado como tal. A atitude da mãe aqui é importantíssima, e pode
produzir tanto a frigidez quanto a excessiva promiscuidade. A quantidade de agressão
permitida definirá se o adulto se tornará um subtipo agressivo-masculino, ou um subtipo
histérico.

Tipos rígidos são geralmente muito integrados. Seus membros são bem proporcionados.
São frequentemente pessoas atraentes com um grau muito alto de energia, capazes de
funcionar bem na sociedade. São bem sucedidos social e economicamente e,
frequentemente, casados, com relacionamentos aparentemente aceitáveis e significativos.
Entretanto, se olharmos esses relacionamentos mais de perto, descobriremos que eles
são baseados na sexualidade e na conveniência, onde ambos os parceiros estão usando
o outro para satisfazer suas necessidades sociais, econômicas e sexuais.
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Frequentemente há um acordo pelo qual ambos os parceiros toleram desvios temporários


do relacionamento marital (com parceiros externos). É difícil para uma estrutura rígida
admitir a derrota, especialmente no campo dos relacionamentos interpessoais, já que a
derrota está identificada com a rejeição, e a estrutura rígida vai a extremos para se
defender contra essa rejeição, e a estrutura rígida vai a extremos para se defender contra
essa rejeição. Por exemplo, tipicamente eles rejeitam, antes de serem rejeitados; ou eles
“representam” e se tornam tão “perfeitos” que seu parceiro não pode, de forma alguma,
rejeitá-los. Uma fantasia clássica da estrutura rígida é que se ele ganha bastante dinheiro,
ou se ela é bastante bonita, tudo correrá bem. Em outras palavras, o amor perdido pode
ser recuperado através da realização pessoal e do sucesso, em vez de um envolvimento
verdadeiro, que requer a expressão sexual do amor. E isto significa expor-se ao medo
caracteriológico original. Como veremos, esta é uma faceta importantíssima do problema
contratransferencial apresentado por terapeutas rígidos.

Como já foi mencionado, tanto o homem quanto a mulher são atraentes. Seus
movimentos são graciosos, apesar de frequentemente darem a impressão de um corpo
rígido. Subjacente a esta aparente fluidez de movimentos existem, frequentemente,
profundas espasticidades, que Reich identificou como “armaduras moleculares”. Reich
postulou que essa estrutura blindada é, precisamente, a estrutura pós-genital, que é
capaz de distribuir a energia pelo corpo e criar a armadura muscular para proteger-se do
mundo, devido ao fato da libido se ter fixado no nível genital.

Reich descreve dois tipos: a armadura tipo placa, na qual grandes grupos de músculos
funcionam simultaneamente e criam placas de proteção em volta do corpo; e o tipo
“malha” (ou rede), na qual os músculos são aparentemente muito soltos, e operam
suavemente. A armadura tipo malha é muito difícil de ser penetrada e, no nível psíquico,
as defesas do indivíduo são extremamente fluídas e rápidas. Mesmo se a defesa é
momentaneamente penetrada, ela se fecha quase imediatamente depois. O indivíduo é
capaz de desviar os golpes que lhe são desferidos, saltando como um gladiador bem
treinado, que é capaz de pular de lado, desviar, absorver os golpes do oponente. Se a
armadura tipo placa pode ser comparada à armadura de um cavaleiro, a armadura tipo
malha é uma rede de arames de aço envolvendo a pessoa, que se torna quase
impenetrável e extremamente flexível.
19

Estas analogias podem ser banais e superficiais, mas, mesmo assim, eu as acho muito
úteis quando procuro imaginar como as defesas de meus pacientes funcionam durante a
terapia. É claro que existem descrições muito mais profundas e sofisticadas, e o leitor
interessado pode explorar as definições de armaduras nos descritos de Reich, Lowen,
Boadella e Lake.

O homem fálico-narcisista usa sua sexualidade agressivamente contra a mulher. Ele está
tentando recuperar a mãe perdida, retomá-la de seu pai. Ele também está tentando provar
que sexualmente é tão potente quanto o odiado pai, e que agora pode competir e vencer,
num capo onde, na infância, ele era incapaz. Ele também usa sua sexualidade para
expressar diretamente seu ódio pela mulher que, na infância, o rejeitou por causa da sua
sexualidade. Ele não ama a mulher, e a considera um objeto sexual para satisfazer suas
necessidades sexuais e sociais. Uma mulher quebrou seu coração – e ele não está
disposto a tentar outra vez e tornar a experenciar seus sentimentos de dor que, na
infância, pensou fossem esmagá-lo. Ele não percebe que, como adulto, pode suportar a
dor, e que somente essa dor pode ajudá-lo a resolver o conflito e permitir-lhe estabelecer
um contato interpessoal íntimo com uma mulher.

A mulher histérica usa a sexualidade sedutoramente, só para rejeitar friamente qualquer


homem que se aproxime dela. Ela fica indignada com a proposta de um homem para
executar, de fato, aquilo que ela esteve propondo inconscientemente. Ela não percebe
que seus quadris ondulantes, seus olhos brilhantes, seu sorriso fugaz estão
continuamente seduzindo todos os homens à sua volta, e fica furiosa quando um homem
a aborda. Ela, então, sente que os homens a consideram apenas um objeto sexual, que
eles não enxergam o ser humano sob a sexualidade, e que só a desejam para um único
propósito. Ela também não percebe que sua sedução é gerada para atrair os homens,
exatamente para que ela tenha uma justificativa para rejeitá-los e liberar seu ódio
reprimido. Esse ódio não pode ser liberado sem uma provocação, a fim de poder
descarregar seu ódio livremente. Mas ela nunca está consciente disso, nem do fato de
que ela provocou o homem em primeiro lugar.

A mulher agressiva-masculina e o homem passivo-feminino foram descritos em detalhes


nos seus respectivos capítulos. Pedimos ao leitor que se refira a eles.
20

Apesar de estas estruturas serem muito ativas sexualmente (a não ser em casos muito
traumáticos), também é verdade que, normalmente, elas não atingem o verdadeiro
orgasmo, na definição reichiana. Porque se elas o fizessem passariam a ser estruturas de
caráter “genital” - isto é, um modelo idealizado, não-neurótico, concebido por Reich e seus
seguidores e que, aparentemente, existe na realidade como ocorrência rara.

O orgasmo implica numa liberação energética total do organismo, similar para o homem e
para a mulher, sendo a ejaculação uma característica sexual específica do homem. A
liberação total implica numa dissolução momentânea das funções do ego, um verdadeiro
abandono aos processos involuntários - e, portanto, ao parceiro. Neste contexto, o
homem e a mulher rígidos têm grande dificuldade de alcançar o orgasmo, já que eles
raramente são capazes de abandonar verdadeiramente o controle do ego. Isto é ainda
mais significativo se considerarmos o fato de que ambas as estruturas usam sua
sexualidade de forma agressiva, para competir com o sexo oposto e obter vingança pela
dor que lhes foi infligida durante a infância.

Essa estrutura tem uma enorme sexualidade, porque a libido fixou-se fortemente na
genitália. Entretanto, muito frequentemente, a força da energia sexual, confrontada com
as conseqüências de ceder ao parceiro, e a correspondente resolução do conflito edipiano
primário, cria tal tensão nestes indivíduos, que eles preferem reprimir ou negar sua
sexualidade. Uma parte da energia sexual é sublimada e usada na vida social, econômica
ou profissional. Como a energia é muito grande, a repressão tem que ser igualmente
grande, e outros mecanismos de defesa, tais como deslocamento e somatização,
aparecem. No primeiro caso, o indivíduo se torna um pervertido sexual; no segundo caso,
a repressão se torna tão forte que aparecem dificuldades psicossomáticas. Estes foram,
na realidade, os primeiros casos de Freud, quando ele tratou de mulheres histéricas.

Em minha opinião, é significativo o fato de que, apesar do sintoma encontrado por Freud
no fim da era vitoriana ser raramente encontrado em nossa sociedade, as mulheres ainda
tenham alguns dos mesmos problemas, alguns dos mesmos sintomas de insatisfação e
infelicidade, a despeito de serem sexualmente dinâmicas e de estarem funcionando
continuamente. Não é suficiente para o aparato sexual funcionar separadamente da
totalidade do organismo, e estar envolvido num simples ato sexual.
21

É necessário ao indivíduo atingir a realização, integrar o organismo inteiro numa atividade


que culmina no ato sexual, e que fica simbolizada pela sexualidade. Isto significa amor e
doação verdadeiros. Integração de amor e sexualidade é a terminologia geralmente
aceita, para descrever o que estou tentando dizer aqui. Isto ainda é uma impossibilidade
para as estruturas rígidas, a despeito da liberação sexual que ocorreu nos níveis físico e
social. Eu acredito que a verdadeira independência e liberação sexual acontece somente
para aquelas pessoas que são verdadeiramente capazes de confiar totalmente em seus
parceiros durante o coito, que procuram expressar-se totalmente, e por todos os meios ao
seu alcance. Isto significa realmente dar-se - largar o controle do ego, literalmente,
dando-se e confiando completamente. Em uma palavra, amando. As armadilhas básicas,
para as quais o terapeuta deve estar atento, são:

Orgulho e arrogância, que são expressas com desprezo pelo paciente (“ele é um
estúpido”, ou “ele não entende”, ou “eu sei, ele não sabe”). O orgulho é, geralmente
uma defesa contra o medo;

Zanga ou raiva. São geralmente defesas contra o amor;

Desejo de rejeitar, que é uma defesa contra uma possível rejeição;

Necessidade de representar. Esta é uma defesa contra a baixa auto-estima, ou a


fantasia de inadequação, que é subjetivamente percebida como uma possibilidade
de rejeição. A mesma coisa se aplica quando é sentido um desejo de rápida
resolução, ou de sessões brilhantes com grandes descobertas. Isto pode ser
fabricado pelo paciente, para satisfazer o narcisismo do terapeuta, mas terá pouco,
ou nenhum, efeito terapêutico;

Uma necessidade de controle, que é uma defesa contra o sentimento de desamparo,


e que se origina na falta de confiança do terapeuta.

Eu vou descrever, em outros capítulos, as circunstancias específicas que levam ao


desenvolvimento de cada um dos quatro subtipos rígidos principais: o homem fálico
narcisista e o passivo-feminino, a mulher histérica e a agressiva-masculina. Para encerrar,
gostaria de lembrar ao terapeuta rígido que uma de suas grandes fraquezas é o medo de
abrir seu coração – e a boa terapia sempre exige, além de compreensão, um amor
verdadeiro pela essência do paciente. Se este amor está ausente, a terapia se torna um
processo doloroso para o terapeuta, e improdutivo para o paciente, cujas resistências só
serão exacerbadas. O terapeuta que, realmente, não se importa com o paciente, achará
seu trabalho árido e não compensador, não importa o quão claramente ele entenda a
dinâmica envolvida.
22

ETIOLOGIA DO TERAPEUTA FÁLICO-NARCISISTA

Se fosse possível reduzir a etiologia de uma estrutura de caráter a um único trauma


básico, então diríamos que no caso do homem fálico-narcisista esse trauma de originou
na repressão brutal da expressão da sexualidade. Como é o caso de todos os rígidos, o
menino alcançou o estágio edipiano relativamente livre de maiores fixações nos níveis
anteriores. No estágio edipiano, entretanto, ele encontrou repentinamente uma repressão
brutal à sua sexualidade. Até então, o menino vinha expressando seus sentimentos livre e
abertamente, e estes sentimentos eram recebidos com amor por sua mar.

Quando o menino alcançou o estágio edipiano e começou a ter pela mãe desejos sexuais
evidentes, ela não pôde tolerar a situação e se esquivou, ou reprimiu diretamente. O
menino, cuja sexualidade tinha sido experenciada, até então, como uma reação orgânica
total, agradável e difusa por toda a superfície da pele, não pôde entender que a reação da
mãe foi apenas contra as manifestações sexuais, e identificou a rejeição da sua
sexualidade como a rejeição de todo o seu ser. Entretanto, ele tinha alcançado um nível
de desenvolvimento antes de esse trauma acontecer, por isso ele não abandonou
facilmente a luta pelo amor da mãe, e desenvolveu os recursos disponíveis para promover
ativamente a sua luta.

Ele se refez, se tornou competitivo com seu pai, invejou-o e então odiou-o diretamente. As
reações do pai, então, se tornam cruciais para o futuro desenvolvimento da criança,
porque ele tem duas opções – ou tolera a agressão da criança, ou a reprime. Se ele a
reprime demais, a criança pode ficar aterrorizada, a ansiedade de castração pode exceder
os níveis toleráveis, e a criança pode voltar aos estágios anteriores de desenvolvimento
com um componente anal muito alto (o que foi chamado de homem passivo-feminino, e
que será desenvolvido em outro capítulo).

Se a agressão não é excessivamente inibida pelo pai e/ou pela mãe, na vida posterior o
homem será capaz de expressá-la, mesmo se a sua sexualidade for inibida – no
verdadeiro sentido da palavra. (Em outras palavras, mesmo se ele for capaz de uma
ereção, ele pode ser impotente orgasticamente). E esta é a principal característica da
hostilidade do homem fálico, combinada com capacidade de ereção e impotência gástrica.
23

Frequentemente, entretanto, a hostilidade é deslocada para as mulheres, combinada com


a raiva que já existia ali, e o homem fálico conscientemente percebe a si mesmo como
ambivalente em relação às mulheres – ele as deseja e as odeia ao mesmo tempo. Ele
percebe sua necessidade de mulheres como puramente sexual – ele precisa de mulheres
(e não de uma mulher) para descarregar sua sexualidade sobrecarregada, e nunca as vê
como amigas ou companheiras. Ele tenta conter a raiva contra homens e mulheres, e
desenvolve uma musculatura muito rígida, que é destinada a dissipar a energia excessiva,
conter a raiva, e ajudá-lo a conter a violência que ele sente, e da qual tem tanto medo,
num nível mais profundo.

O pai, entretanto, teve suficiente contato com a criança para que a identificação
ocorresse, a despeito do ódio do menino, ódio que se torna muito virulento nesse estágio.
O adulto fálico-narcisista, entretanto, cresceu tendo recebido uma considerável influência
de ambos os pais, tendo sido amado e cuidado, e tendo recebido permissão para
expressar-se e movimentar-se livremente.

Os quatro estágios de desenvolvimento descritos na Psicologia do Ego foram


atravessados com relativo sucesso. É somente quando aparecem a sexualidade e o
Complexo de Édipo que o trauma acontece, e resulta em ódio pela mãe, por ter negado
sua sexualidade, e ódio pelo pai por competir com ele e ser a causa da rejeição da mãe.
Frequentemente, observamos que o fálico, apesar de ter um ódio quase aberto em
relação à mulher, ainda é capaz de ter sentimentos calorosos e de amá-la. Também
observamos que esse ódio pela mulher encobre problemas mais profundos e mais
reprimidos com o pai.

O forte ódio do pai, combinado com um alto nível de energia, mais a grande habilidade
que essas pessoas em geral têm, resultam num caráter muito competitivo; ele acredita
que tem direito de tomar tudo aquilo que deseja; exagerando, poderíamos dizer que o
fálico acredita inconscientemente que ele é o rei, e que o mundo é seu reinado. Os fálicos
são arrogantes, narcisistas, dominantes e muito agressivos. Suas defesas são flexíveis e
poderosas. Eles podem usar quase qualquer defesa durante o curso da terapia, e o fazem
com incrível agilidade, de modo que frequentemente confundem o terapeuta. Eles são
extremamente persistentes e perseguirão seus objetivos sem descanso, uma vez que os
tenham definido. Entretanto, em parte por causa do orgulho narcisista, mais o sucesso,
mais a energia, eles frequentemente sofrem de fortes distorções intelectuais, no nível do
ego, que podem parecer absurdas a outras pessoas.
24

Do ponto de vista físico, a estrutura fálica, como em todos os rígidos, é muito harmoniosa.
O corpo é bem proporcionado, simétrico e sensível. O indivíduo tem um sentido de
relacionamento espacial altamente desenvolvido, e pode geralmente identificar a posição
de qualquer parte de seu corpo, de olhos fechados. Isto é muito útil em termos de
diagnostico, especialmente quando alguém tem problemas para identificar um fálico –
esta pode ser uma das ferramentas. As extremidades – mãos e pés – são geralmente
bem quentes e energizadas. Elas são fortes e sensíveis. Em uma palavra, elas
respondem.

O fálico é geralmente bem sucedido na vida e, de modo narcisista, considera-se atraente


às mulheres – e na realidade ele é atraente. Entretanto, seu sucesso com as mulheres
deve-se, em parte, ao fato dele ser atraente, e em parte porque ele é experenciado pelas
mulheres como um homem “zangado”, que oferece um desafio. Frequentemente,
relacionamentos sado-masoquistas se desenvolvem com mulheres que adotam uma
posição masoquista frente à atitude sádica do fálico, e esta é, muitas vezes, uma das
bases do relacionamento. O fálico sente, no máximo, desprezo pela mulher; o que – é
claro – encobre a dependência e o desejo subjacentes. Pessoalmente, considero que se
um fálico for capaz de reconhecer o seu desejo verdadeiro por uma mulher, dizendo isto
diretamente a ela, terá sido alcançado um considerável progresso terapêutico, e isto pode
ser uma medida da evolução da terapia. Tal resolução do orgulho narcisista seria
realmente um grande passo para este tipo de personalidade.

Na situação contratransferencial, esse homem é particularmente atraente para as


mulheres com conflitos não resolvidos com o pai; e isto inclui realmente muitas pacientes.
É fácil para um homem assim ser apanhado pela lisonja; ou aceitar um desafio a nível
sexual; ou sexualizar seu amor por suas pacientes (transformando assim a única
ferramenta terapêutica útil numa situação muito destrutiva); ou ser tomado pela raiva,
impaciência e desprezo. Este último – o desprezo – é quase uma certeza neste tipo de
estrutura. Humildade e, consequentemente, compaixão são problemas difíceis para o
fálico.
25

O contato a nível profundo é muito difícil para o fálico. A razão é simples: subjetivamente,
ele sente que perdeu a batalha pela mãe (apesar de nunca ter realmente desistido)
porque ele não era bom o suficiente. Seu pai era melhor, simplesmente porque venceu.
Assim, a experiência da infância é de baixa auto-valorização – que é confirmada na vida
de adulto, porque quando ele tem esses sentimentos negativos de ódio, arrogância e
desprezo, ele também sente culpa e dor – a nível inconsciente – por ter esses
sentimentos. Ter contatos íntimos significa arriscar trazer tudo isto para a realidade
consciente. Perceber a baixa auto-valorização, e seus componentes arcaicos irracionais,
leva à resolução da defesa do caráter – e o fálico, como qualquer outra estrutura,
defenderá sua estrutura de caráter por todos os meios disponíveis.

Pelo que foi dito acima, poder-se-ia concluir que o terapeuta fálico é virtualmente um
monstro, um ser negativo que deveria ser evitado. Muito pelo contrario, porque a energia,
o compromisso, a força e a sinceridade, geralmente encontrados nessas pessoas, as
ajudam a resolver em grande parte o seu problema caracteriológico. Se um fálico for
capaz de superar pelo menos uma parte do seu ódio e do seu orgulho narcisista, ele terá
reaberto o seu coração e se tornará caloroso, amoroso, e intensamente comprometido
com o seu trabalho. A contrapartida positiva das características negativas previamente
descritas pode florescer. Sexo e amor se equilibram, ele pode estabelecer um
relacionamento criativo e sólido na sua própria vida, e a partir dessa base sólida pode
compreender profundamente seu pacientes.
26

ETIOLOGIA DA TERAPEUTA HISTÉRICA

Assim como sua contrapartida, o homem fálico-narcisista, o principal trauma da mulher


histérica, aquele em que ela se fixou, foi a rejeição que o pai lhe infligiu durante o estágio
edipiano. Realmente, quando a garotinha tentou subir no colo de seu pai e ficou excitada
sexualmente, quando ela expressou a ele esta excitação, ela percebeu repentinamente
que o seu amado pai a rejeitou, de modo totalmente incompreensível – para ela. Até
então, os sentimentos entre seu pai e ela tinham fluido ininterruptamente. Seu pai a tinha
aceitado incondicionalmente, e o seu amor por ela era grande e profundo. Entretanto,
quando a garotinha chegou ao estágio edipiano, e a sexualidade se tornou um embaraço
para ele, o pai sentiu-se incapaz de tolerar as aproximações sedutoras de sua filha e
repentinamente, abruptamente, rejeitou-a.

A menina não podia entender isto, e repetiu suas tentativas para conseguir as atenções e
o amor do pai, tornando-se ainda mais sedutora - como é a tendência das meninas
pequenas. Isto, por sua vez, aumentou a ansiedade do pai, que reagiu rejeitando-a mais
ainda. Mais tarde, quando ela já tinha sido repentinamente desapontada, a menina
começou a personalizar e internalizar a rejeição, culpando a mãe por ser a competidora
bem sucedida na disputa pelo pai, sentiu-se desvalorizada e identificou sua sexualidade
como a causa da quebra do estado paradisíaco no qual ela se encontrava antes do seu
aparecimento. Finalmente, ela desenvolveu um laço ambivalente de amor e ódio com o
homem que vai dominar sua estrutura de caráter pelo resto da vida.

O problema centraliza-se em torno da crença da criança de que a sexualidade é a causa


da perda paterna. Porque realmente a garota percebe que antes do aparecimento da
sexualidade, o contato com seu pai era contínuo e sem problemas. Existia conflito, mas a
um nível limitado, e com possibilidades de solução. Entretanto, a rejeição definitiva do pai
é associada subjetivamente com o aparecimento da sexualidade. Se na vida real o pai
realmente a rejeitou, ou não, não é importante. O que realmente conta (aqui como em
qualquer outro trauma experenciado subjetivamente) é que a criança acredita que ele a
rejeitou. A rejeição pode ser associada com uma ausência momentânea do pai numa
ocasião crítica; ou a própria criança pode ter se retraído em conseqüência da culpa,
devida ao tabu edipiano (que então envolve a mãe num papel muito importante).
27

Não importa, a perda do pai (objeto amado) é diretamente relacionada com a aparição e
expressão da sexualidade. A solução temporária é reprimir a sexualidade, o que, quando
bem sucedido, leva a garotinha à felicidade da fase de latência, durante a qual ela
restabelece o contato com seu pai.

Durante a adolescência, quando a sexualidade retoma uma importância preponderante, e


desta vez definitiva, ela se confronta com a escolha entre amor e sexualidade. E aqui é
que aparece a maior diferença entre ela e sua contrapartida masculina – o caráter fálico-
narcisista. Porque ele escolhe a sexualidade acima do amor, e ela escolhe o amor acima
da sexualidade. Anos mais tarde, isto se expressará, no caso dele, através da raiva fálica;
e no caso dela, através da sedução histérica e inibição da sexualidade. Isto não quer dizer
que a histérica possa reprimir sua sexualidade com sucesso – ela não pode, porque a sua
energia libidinal está muito fortemente fixada na genitália.

O que ela realmente consegue é odiar suas necessidades sexuais, que são a causa de
seu conflito e dor. Eventualmente, este ódio se transforma em ódio pela sua própria
genitália, que ela considera “suja”, “inferior”, etc. Outra possibilidade na sua escolha entre
sexualidade e amor poderia ser que ela tivesse reprimido ambas as modalidades ativas,
já que a agressão foi severamente inibida, e a sexualidade é uma expressão ativa e
agressiva do self – mas eu não estou certo disso.

A sedução, para a mulher histérica, constitui uma parte integrante do seu comportamento
como mulher adulta; ela está quase sempre inconsciente dessa mensagem, que ela está
constantemente emitindo para os homens à sua volta. Ela fica horrorizada quando um
homem a aborda sexualmente, acreditando – conscientemente - que ela não está
interessada nele “nesse” nível. A sedução é um instrumento usado para encobrir sua
insegurança, seu medo, seu desejo. De uma perspectiva psicodinâmica, o que acontece é
que ela aprendeu que homens (seu pai) eram atraídos (e, portanto, vulneráveis) pelo seu
comportamento sedutor, enquanto que, ao mesmo tempo, teve que reprimir a constatação
consciente de que seus atos levariam diretamente aos tabus da situação edipiana.

As histéricas, no sentido definido por Freud, quase desapareceram, em consequencia da


revolução sexual. No tempo de Freud, as histéricas somatizavam seus sintomas e,
frequentemente, ficavam presas ao leito, ou completamente incapazes de funcionar; hoje,
quando a sexualidade da mulher foi liberada da escravidão do século passado, elas
podem usar mais livremente essa avenida natural de descarga energética.
28

Entretanto, assim como sua contrapartida masculina, a divisão entre seu coração e sua
sexualidade permanece, e apesar de ceder sexualmente ao homem, ela nunca lhe
entregará seu coração. Por outro lado, ela se apaixonará por um homem que seja
sexualmente impotente, ou que não esteja disponível de alguma forma – ou porque é
casado, ou tem outro relacionamento; ou porque, de alguma forma, não está disponível
sexualmente (o “Sonho Impossível”). Qualquer uma dessas escolhas leva à ansiedade.
Uma das características da histérica é a habilidade de sublimar essas ansiedade, e
transformar a energia numa manifestação positiva, tal como sucesso na carreira ou a
nível social.

Como em todas as estruturas pós-genitais, o corpo da histérica é bem integrado,


altamente eficiente, funcional, forte e, geralmente, muito atraente. Realmente,
descobrimos que, surpreendentemente, mulheres pequenas, miúdas, com este caráter,
têm uma força inesperada, incompatível com a sua aparência. A razão dessa força é o
alto nível de integração, que permite a ela usar todo o seu corpo para desempenhar
funções específicas. A integração não está limitada ao corpo físico, mas se estende ao
intelecto, ao funcionamento e intercambio social, e a praticamente todas as atividades de
sua vida. Isto é particularmente evidente durante exercícios agressivos - muita força é
repentinamente mobilizada.

O problema da histérica é unificar seu coração e sua sexualidade, dar-se completamente


a uma pessoa, comprometer-se totalmente com uma única causa, devotar todas as
energias a um único propósito. Como o homem fálico-narcisista, ela tende a cobrir muitas
funções, muitas carreiras, muitos objetivos. E isto pode ser sua ruína, pois enquanto ela
se dispersa mais e mais, ela pode perder o prazer no que está fazendo, e procurar
compensar tentando continuamente fazer mais, fazer melhor, ser perfeita.

A expressão do seu ódio pelo homem é ainda mais inibida pelo seu medo físico do sexo
forte. Porque ela tem horror ao contato físico de qualquer tipo, que está associado – nos
níveis mais profundos do seu inconsciente – ao ato sexual. A imagem que vem à mente é
a da garotinha observando com ódio o seu grande e onipotente pai – fonte de frustração,
desejo e amor; amor frustrado que se transforma em ódio. Ela pode se tornar arrogante,
desdenhosa e dominante.
29

Numa situação terapêutica, a beleza e a sedução da terapeuta histérica podem criar


problemas. Realmente, o homem que ela está tratando pode se sentir extremamente
atraído por ela, e a atitude sedutora, quase inconsciente, da terapeuta pode trabalhar
contra ela. No contexto da terapia bioenergética, onde o paciente pode estar trabalhando
em trajes sumários, enquanto a terapeuta está completamente vestida, isto pode se tornar
um fator significativo.

Se a terapeuta histérica encara, e resolve com sucesso, os seus problemas principais, ela
pode ser excepcionalmente eficiente, compreensiva e profunda, porque ela tem a
integração e a força para entrar em áreas do inconsciente. Ela também representa,
frequentemente, a imagem idealizada que tem sido tão popularizada através da mídia, do
que uma mulher deveria ser: amorosa, compreensiva, bonita, atraente, sedutora e, até
certo ponto, ingênua.

A terapeuta experimentada deve estar consciente, neste caso e em todos os outros, da


imagem que ela projeta, da forma como essa imagem afeta o paciente, e de como ela
corresponde – ou, pelo contrário, conflita – com a idéia do paciente sobre o que uma
mulher deve, ou não, ser. Uma terapeuta tipo histérica bem resolvida conectou, de
alguma forma, o seu coração com a sua sexualidade, sendo, então, capaz de empatizar
profundamente, e de ter o calor e o amor, que são a nossa característica por excelência.
A atitude firme, mas ao mesmo tempo gentil e amorosa, que é possível para este tipo de
mulher, é realmente um importante recurso.
30

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE ORAL


E O TERAPEUTA HISTÉRICO OU FÁLICO-NARCISISTA

Neste caso, o nosso terapeuta histérico/fálico-narcisista defronta-se com um sistema


cujas fronteiras do ego são bem estabelecidas e fixadas na realidade, mas que tem um
nível muito baixo de energia. Então, a necessidade do terapeuta de realizar, de obter
resultados, de se mover com rapidez, pode se tornar contratransferência.

O paciente oral tem carência de atenção e cuidados e irá a qualquer extremo para obter
gratificação, ou pseudo-gratificação, para essas necessidades não satisfeitas. A forma
geralmente usada para isso é uma atitude aparentemente passiva, que, na realidade, é
muito ativa, desde que é destinada a provocar (irritar) o terapeuta. O paciente oral
acredita, de forma distorcida, que a provocação é a única forma de obter atenção e,
eventualmente, amor. Há uma incapacidade para a expressão direta das reais
necessidades à nível de adulto – assim as tentativas de gratificação são sempre indiretas,
passivas e dissimuladas e, portanto, resultam em muito pouca, ou nenhuma, gratificação
real. Na experiência de vida do paciente, isto serviu somente para confirmar a premissa
neurótica de que suas necessidades nunca serão preenchidas. E então, ironicamente,
essa atitude cria condições para aumentar o vazio, que é um traço dominante deste tipo.

E o caso é sempre este – na sua defesa contra a possibilidade de reviver um trauma


inicial, a estrutura de caráter, na realidade, recria precisamente aquilo contra o que está
se defendendo. Neste caso, o perigo contratransferencial, a nível caracteriológico, é que o
terapeuta, com seu sistema de alta energia e exigência de resultados, fique zangado ou
exasperado com a baixa energia, passividade e aparente desinteresse do paciente.

A zanga, exasperação ou impaciência, será percebida pelo paciente que, então, terá a
confirmação de que sua auto-desvalorização e auto-imagem negativa estão objetivamente
corretas. Ele é verdadeiramente uma pessoa sem valor e indigna de amor; não há
esperança, ele não deveria desperdiçar seu tempo e energia – e então ele permite que a
depressão subjacente suba à superfície.
31

Por outro lado, se o terapeuta percebe que está trabalhando com um organismo de
energia muito baixa, que o progresso será lento, e que o principal objetivo da terapia
nesses casos é aumentar a energia disponível ao ego, grandes progressos se tornam
possíveis. O paciente se torna capaz de expressar suas próprias necessidades
diretamente, e toma as atitudes necessárias para satisfazê-las por si mesmo.

Este é o objetivo principal da terapia com esses pacientes – eles geralmente não carecem
de capacidade intelectual, insight, ou habilidade para experenciar sentimentos. A
liberação de energia disponível é de importância fundamental. Isto deveria ser alcançado
simultaneamente, através dos meios usuais, mas também fisicamente pelo aumento da
utilização dos pulmões, através da dissolução dos bloqueios do peito, que são o problema
físico dominante deste tipo.

A interação com este tipo de paciente é particularmente frustrante, pois a constante


expressão indireta de suas necessidades, a sua constante tentativa de estabelecer um
relacionamento dependente e simbiótico, podem se tornar quase intoleráveis para uma
estrutura “rígida”, onde a ansiedade de castração (com o seu medo de intimidade
concomitante) é extremamente poderosa.

Subjetivamente, o terapeuta vai experenciar a sensação de que o paciente está tentando


“sugá-lo”, “sugar sua energia”. O sistema sobrecarregado do terapeuta encontra uma
avenida imediata de liberação nas necessidades do seu paciente, e a ilusão de que pode
realmente satisfazer o paciente pode levar o terapeuta a cair numa armadilha colocada
por seu paciente.

O terapeuta nunca deve esquecer que o paciente oral não tem uma necessidade real de
ser nutrido e alimentado do exterior, porque agora ele é um adulto – o paciente apenas
finge ter essa necessidade. A real necessidade do paciente é neutralizar essa ilusão e sai
para o mundo para satisfazer suas necessidades por si mesmo. Enquanto o paciente oral
continuar na crença de que ele pode conseguir que o pai ausente finalmente lhe dê o
amor e a nutrição que lhe faltaram na infância, ele não sairá de sua posição defensiva, e a
terapia não progredirá. É, portanto, necessário que o terapeuta rígido transmita a idéia de
que é impossível ao paciente obter satisfação do mundo/realidade externos.
32

Só então, o paciente poderá começar a procurar dentro de si mesmo – e com certeza é aí


que a realização verdadeira pode ser encontrada. O terapeuta precisa abandonar todas
as expectativas, desistir da ilusão de que ele pode “curar” seu paciente, porque só então o
paciente poderá – tendo percebido isto – fazer uma tentativa real de se mover em direção
ao terapeuta. A habilidade de se mover em direção ao terapeuta frequentemente
acontecerá paralelamente ao estabelecimento de um novo relacionamento, ou da
consolidação de um relacionamento já existente, assim como de significativas mudanças
físicas – tais como: aumento da respiração, e/ou nível de energia.

Como já foi dito, para a personalidade oral a necessidade de ser “alimentado” do exterior,
é muito grande. Algumas vezes, mulheres orais (especialmente aquelas que são
fisicamente atraentes) tendem a transferir essa necessidade e usar sua sexualidade, a fim
de serem “preenchidas” e, nesse caso, se tornam muito sedutoras. Esta é uma armadilha
para o terapeuta fálico-narcisista que, por seu lado, tem um forte desejo sexual. Será
igualmente perigoso para a terapeuta histérica, porque para ela o apelo será “servir de
mãe”, e isso, é claro, é igualmente verdadeiro para o homem oral.

O homem oral também usa a sexualidade para preencher seu vazio interior. Entretanto,
este não é um problema para os pares que estamos considerando. No caso de
homossexualidade, muitos outros fatores intervêm e, geralmente, sobrepujam este
aspecto (tais como submissão, fantasia de castração, vingança, ódio, etc.).
33

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE MASOQUISTA


E O TERAPEUTA HISTÉRICO E/OU FÁLICO-NARCISISTA

Aqui o terapeuta histérico/fálico-narcisista se defronta com uma estrutura de caráter


altamente energizada. Precisamos fazer uma diferença aqui entre “energia disponível” e
“energia total” do organismo. A primeira é aquela quantidade de energia disponível ao
ego, para ações resultantes de funções volitivas, consciente. Ela não inclui a energia
requerida pelo sistema nervoso autônomo, para sustentar as funções vitais e o equilíbrio
psíquico.

A “energia disponível” é, portanto, a energia disponível para a mobilidade, criatividade e


prazer. A “energia total” é a energia do organismo inteiro, quer ela esteja presa, quer não.
Neste sentido, a estrutura de caráter masoquista tem uma enorme energia total, e pouca
energia disponível – porque ela está toda presa na musculatura maciça, cuja finalidade,
desde a mais tenra infância, é dupla. A musculatura contém a zanga e a raiva da pessoa
(dispersando a enorme energia gerada por estes sentimentos, através de uma
musculatura espástica crônica) e, ao mesmo tempo, se desenvolve uma camada isolante
de carne para protegê-la do exterior.

O masoquista aprendeu a não se expressar, a permanecer passivo, a suportar, a conter


dentro de seu corpo maciço toda a necessidade de protestar, todos os desejos de
independência, toda a capacidade de se colocar de forma agressiva, extrovertida. Se o
terapeuta reproduzir essas necessidades, ele se defrontará imediatamente com a defesa
caracteriológica.

O problema do masoquista é que a liberdade e a permissão para a auto-expressão lhe


foram negadas, e ele conteve dentro de seu corpo o protesto não expresso que essa
recusa provocou. É, portanto, tarefa do terapeuta, ajudar o paciente a sair de sua concha,
liberar a energia contida pela pesada musculatura, ajudá-lo a aprender a se expressar
diretamente, permitir-lhe gritar o protesto e a raiva reprimida que está contida em sua
musculatura. Porque, na infância, essa liberdade de expressão foi sistematicamente
reprimida, seja abertamente ou de forma disfarçada – e o masoquista fica horrorizado
com sua própria necessidade de expansão/expressão.
34

Somente quando ele perceber que é possível expressar sentimentos negativos sem
conseqüências desastrosas, é que ele poderá começar os processos de expansão da
auto-afirmação, que é a chave do processo de des-repressão, para este tipo de caráter.
Entretanto, isto é meio perigoso, porque os meios usados para negar a liberdade e a ação
expressiva foram a super-proteção, a super-preocupação com as necessidades físicas da
criança, em detrimento de sua necessidade emocional de protestar, expressar-se,
arriscar-se e individualizar-se. O terapeuta deve estar atento à reprodução desse
ambiente neurótico, pois (como sempre com os neuróticos) a menor suspeita de que o
trauma básico possa ser reproduzido, aciona as defesas de caráter.

Portanto, o terapeuta deve ter em mente que qualquer choque direto com esse tipo de
personalidade é experenciado pelo paciente como uma reprodução dos métodos
repressivos (e humilhantes) usados na infância. Duas das experiências condicionadoras
mais traumáticas foram: alimentação forçada e aplicação de lavagens; tendo ambos
resultado em fixação no estágio anal. Subjetivamente, isto foi experenciado pelo paciente
como uma violação do seu ser físico e emocional, uma verdadeira invasão de seus limites
e privacidades. Portanto, se o paciente percebe que o terapeuta tem uma necessidade de
forçar assuntos, mesmo que esta necessidade se expresse de forma sutil (por exemplo,
por intervenções excessivas, ou pela expectativa de resultados e progressos), o paciente
interpretará isto como uma reprodução das expectativas dos pais de que ele comesse
bem, defecasse bem e se comportasse bem.

A terapia com o paciente masoquista deve ser orientada, no sentido de ensiná-lo a ter
confiança em que sua necessidade de expressão será bem recebida. Para um terapeuta
rígido, isto significa que ele deve – muito gradual e cuidadosamente – apontar as defesas
de caráter, que são trazidas para a sessão pelo paciente, sem qualquer expectativa de
resultados, ou progressos, ou mudanças rápidas. Métodos analíticos do caráter devem
caminhar paralelamente com o trabalho bioenergético – mas também têm que ter um
aspecto didático. Porque o masoquista precisa ser ensinado que a expressão e a
expansão são aceitáveis – que, na realidade, elas são desejáveis.

A defesa de caráter, como é bem sabido e abundantemente descrito por todos os autores,
desde Freud, é expressa através de uma atitude provocativa e queixosa, destinada a
atrair agressão. O masoquista, disse Freud, tira o prazer da dor. Isto levou Freud ao
postulado do “Princípio da Morte” (Tanatos), em oposição a Eros, a Força da Vida.
35

A existência de Tanatos foi incompatível com as observações e deduções do próprio


Freud, e mais tarde ela a refutou, sem explicar o aparente prazer que alguns pacientes
(masoquistas, com certeza) tiravam da dor. Agora sabemos que a provocação masoquista
destina-se a criar agressão suficiente, a fim de que, por sua vez, ele possa descarregar
sua raiva reprimida – liberando, assim, (mesmo que provisoriamente) a energia
acumulada, que é tão dolorosamente contida pela sua estrutura física. Assim, o problema
contratransferencial pode expressar-se quando o paciente masoquista tenta provoca o
terapeuta rígido a (aparentemente) ajudá-lo. Esta provocação, se for aceita, vai acionar a
defesa caracteriológica, o paciente vai cair em desânimo, e vai culpar o terapeuta por
“atacá-lo”. O masoquista tentará arrastar o terapeuta para o seu “pântano masoquista”,
em vez de usar a ajuda oferecida para sair do pântano.

Os passos serão: 1. Ele provocará o terapeuta a “ajudá-lo” ou “atacá-lo”; 2. Se o terapeuta


aceitar essa provocação, o paciente, então, vai cair em desanimo; 3. Ele vai culpar o
terapeuta, identificando a ajuda oferecida como uma infração à sua independência, o que,
eventualmente, leva a um sentimento de humilhação, associado ao controle das funções
alimentares (criar, nutrir, educar) e de eliminação (liberação de sentimentos negativos).

Neste caso, a terapia pode ser muito ajudada pelas técnicas bioenergéticas, porque a
necessidade de expressar-se e de protestar pode ser particularmente bem canalizada
através da bioenergética. Entretanto, o terapeuta tem que compreender que o paciente
tem que fazer isso por si mesmo. Ele tem que ensinar a técnica ao paciente, e permitir
que ele a realize, sem sugestão ou pressão posterior. Onde o apoio é, frequentemente,
recomendado para outras estruturas de caráter, neste caso o terapeuta deve lembrar-se
constantemente de que nenhum apoio é necessário; nenhuma simpatia é exigida. O
problema do masoquista é romper a cadeia que ele criou com suas formidáveis defesas.
Se o terapeuta puder realmente manter-se afastado, e deixar o masoquista trabalhar por
si mesmo, logo o paciente começará a produzir material que poderá ser analisado da
maneira normal. É muito importante repetir mais uma vez, que esse material tem que ser
produzido pelo paciente, e não oferecido pelo terapeuta; mesmo que o paciente exija,
algumas vezes, que o terapeuta o ajude.
36

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE FÁLICO E/OU HISTÉRICO


E O TERAPEUTA FÁLICO E/OU HISTÉRICO

Os sistemas de energia das duas pessoas envolvidas nessa dupla são similares e,
portanto, isto não é um motivo de consideração. O maior problema repousa no fato de
que os dois têm defesas similares que podem enganchar-se. O paciente pode facilmente
identificar o sistema básico de defesa do terapeuta, e o terapeuta pode (se não for
realmente atento e cuidadoso) interagir com o paciente a nível caracteriológico.

Diversas atitudes caracterizam o sistema de defesa rígida. Uma é a sedução, que, no


melhor dos casos, é parcialmente consciente; outra é a dificuldade de sentir e expressar
amor, ternura, suavidade e vulnerabilidade, que são evitados, mascarando-os com raiva,
ódio, desprezo; outra atitude, ainda, é o orgulho e a arrogância, o penetrante desprezo,
que está virtualmente sempre presente. Há também o retraimento, que dá a impressão de
que o indivíduo está consciente de seus sentimentos, mas se recusa a expressá-los. Isto,
certamente, é um erro e, frequentemente, mascara uma insensibilidade que pareceria
incongruente ao observador não treinado.

O maior problema aqui, eu acredito, acontece quando o paciente e o terapeuta não são
do mesmo sexo, porque precisamos lembrar que a sedução é um sistema básico de
defesa da estrutura rígida. Ela é quase incontrolável, e se expressa em gestos e olhares
quase imperceptíveis; ela permeia o comportamento da personalidade rígida e ocorre
constantemente. Como as duas pessoas utilizam o mesmo mecanismo de defesa, as
duas serão igualmente sensíveis à utilização dessa defesa pelo outro. Portanto, quando o
sexo entra em cena, seja ele homossexual ou heterossexual, uma forte sedução pode
estar ocorrendo a nível inconsciente, ou pré-consciente. Alem disso, as duas pessoas
nesse par têm um medo incomum de rejeição, ambos têm necessidade de representar, e
têm dificuldade de expor seus sentimentos reais, especialmente os de amor e ternura.
Pode realmente parecer simples e tentador para o terapeuta, conspirar e deixar de lado,
pois o paciente pode não colocar os problemas em discussão.
37

Há, pelo menos, dois importantes pontos de orientação para indicar a conspiração: o
primeiro é quando o paciente “se sente bem” durante períodos prolongados, não trazendo
novos problemas, enquanto, ao mesmo tempo, não resolve a transferência, nem tenta
cortar o relacionamento terapêutico; ou, em outras palavras, quando é mantida a ausência
de transferência negativa e/ou expressão de sentimentos negativos, em relação ao
terapeuta, o pai, ou ao companheiro. O segundo é atitude de “bom menino” (ou boa
menina), onde o paciente adota essa posição, e o terapeuta não se confronta com ela,
permitindo que essa situação se mantenha. Este último pode tomar a forma de
promessas, ou sedução sexual.

Apesar disso, eu acredito que a interação do terapeuta e do paciente que têm a mesma
estrutura caracteriológica básica é essencialmente muito positiva, na medida em que o
terapeuta compreende profundamente o problema que o paciente está enfrentando. Eu
não gostaria que o leitor acreditasse que o prognóstico para este tipo de interação é
pobre. Pelo contrário, acontece justamente o oposto, porque se a resistência inicial é
enfrentada e resolvida, as estruturas rígidas podem entrar muito fundo em seus
sentimentos. Crescimento e mudanças realmente acontecem, e o trabalho com este tipo é
muito recompensador para o terapeuta.

A sedução, que está sempre presente no início, precisa ser entendida como uma defesa,
atrás da qual está um garoto (ou garota) assustado, que não tem coragem de colocar sua
necessidade de amor e seu desejo, que foram reprimidos na infância. Se o terapeuta
puder aceitar e expor ao paciente o jogo da sedução, bem como o que está por trás dele,
será capaz de alcançar o coração do paciente, já que (no caso das estruturas rígidas mais
do que em outros tipos) esta é a chave que libera a totalidade da personalidade. As
estruturas rígidas têm essencialmente uma grande quantidade de sentimentos que foram
reprimidos, a nível pré-consciente, e que podem se tornar repentinamente disponíveis, se
as defesas forem expostas e trabalhadas.

A gênese do trauma infantil básico da estrutura rígida foi a rejeição abrupta e repentina
dos avanços sexuais da criança, em relação ao progenitor do sexo oposto. Isto foi
experenciado durante a fase edipiana, e foi tão forte que o adulto irá a extremos
extraordinários para evitar qualquer possibilidade de confronto com uma situação
semelhante. A facilidade de reprimir é justamente a fraqueza e a força do sistema de
defesa da personalidade rígida.
38

Os pacientes rígidos geralmente se adaptam bem à vida, e aceitam um estado de falta de


amor, deslocando seu interesse e energia para a carreira. Se por um lado tive muitas
oportunidades de trabalhar com mulheres (histéricas), tive muito pouca experiência no
trabalho com homens rígidos (estruturas de caráter fálico-narcisista). Portanto, eu não
posso, pelo menos por enquanto, descrever como seria essa interação. Hipoteticamente,
entretanto, parece que a interação entre duas estruturas rígidas do mesmo sexo criaria
grande conflito, já que a competitividade, a zanga e a raiva seriam uma modalidade
dominante de interação. O terapeuta pode facilmente aceitar desafios que são
normalmente usados pelo homem fálico-narcisista. Ele pode, ainda, ser pego pelo
desprezo que está presente quando duas estruturas rígidas do mesmo sexo interagem.
Desprezo, competitividade, medo e hostilidade são modalidades básicas, quando duas
estruturas rígidas do mesmo sexo se encontram. A rejeição mútua é sempre uma ameaça
subjacente em qualquer caso.

Quando a interação é entre estruturas rígidas de sexos opostos, a sedução sexual se


torna um dos temas dominantes. Porque as duas pessoas aprenderam a usar o sexo: ela
é namoradeira, e inconscientemente (ou mesmo conscientemente) sedutora; ele usa o
sexo de forma agressiva; ambos o usam para esconder o verdadeiro desejo, a tristeza e a
vulnerabilidade – sua baixa auto-estima. Porque, por trás da defesa de caráter organizada
e poderosa, está o garotinho, ou a garotinha, triste e solitário(a), que deseja o objeto
edipiano. Então, a contratransferência é perigosamente fácil nesta dupla e, enquanto a
interação aberta de sedução/agressão é fácil de ser detectada, o terapeuta consciente
deve estar alerta para as modalidades mais sutis de sedução/promessa, que podem
acontecer.

O terapeuta do sexo masculino também deve perceber que, para a sua paciente mulher
ele representa uma figura extremamente ameaçadora – o homem poderoso, zangado e,
pelo menos potencialmente, sexualmente disponível. Pode ser muito difícil alcançar a
raiva profundamente reprimida, especialmente porque ela está, provavelmente, misturada
com o desejo. Frequentemente, a raiva do pai foi fortemente reprimida na infância, e se
tornou praticamente inalcançável, já que a sua expressão foi igualada à perda do objeto
do amor. A raiva também foi reprimida pela mãe, apesar de ser mais acessível aqui,
porque a ameaça de perda não era séria.
39

Portanto, para o terapeuta do sexo masculino, pode ser mesmo muito difícil alcançar o
nível indispensável. Algumas vezes, pode ser útil solicitar os serviços de uma colega do
sexo feminino, seja em base temporária para consultas, seja para fazer com que o
paciente trabalhe simultaneamente com as figuras materna e paterna. Isto lhe permitirá
explorar sua raiva num ambiente mais seguro - proporcionado pela terapeuta do sexo
feminino. Para o terapeuta fálico-narcisista, esta co-responsabilidade pode significar abrir
mão de seu orgulho, porque então ele terá que aceitar que ele não é mais o “grande
terapeuta” que vai “salvar” seu paciente, mas que ele precisa da colaboração de uma
mulher – sua colega. No nível profundo, irracional, estas são coisas difíceis de serem
aceitas por um terapeuta fálico-narcisista.

Por outro lado, se a terapia é bem sucedida, então o coração do histérico terá sido
atingido. Será como um maravilhoso fluxo se abrindo, e se dando sem reservas, o tipo de
“dar-se” de que as garotinhas são capazes. Será algo assexual, não-ameaçador, e sem
exigências – tudo aquilo que o terapeuta- fálico-narcisista deseja no fundo de seu
coração. E nesse momento, ele pode começar a resolver a transferência, enviando a
paciente para os braços de outro homem e assim, de certa forma, re-encenar o trauma de
sua própria infância. Trágico? Poético? Talvez, mas uma bonita expressão do amor
verdadeiro e desinteressado, que expandira os horizontes do próprio terapeuta. E este é,
talvez, o motivo pelo qual muitos de nos estão nesta profissão.
40

INTERAÇÃO ENTRE A MULHER AGRESSIVA-MASCULINA


E O TERAPEUTA HISTÉRICO E/OU FÁLICO-NARCISISTA

Aqui, dois pontos importantes desafiam o terapeuta histérico e/ou fálico-narcisista – o


controle e a sedução. Porque estas mulheres são extremamente poderosas,
manipuladoras, intelectualmente brilhantes, frequentemente atraentes e, muitas vezes,
bastante cruéis, uma vez que usarão todos os meio disponíveis para alcançar seus
objetivos. Se elas acreditarem que o terapeuta quer sexo, então é sexo que elas irão
oferecer – em troca de controle absoluto.

A sua estrutura, como descreve o trabalho seminal* de Pierrakos sobre este assunto,
apresenta quadris largos; peitos menores, mas de bonito formato; olhos faiscantes – o
tipo ideal de beleza feminina em nossa cultura. É claro que elas sabem disso, e sabem
como usar isso em seu beneficio. O homem fálico-narcisista, sexualmente potente,
zangado, sedutor e atraente também, é um alvo natural para esta estrutura. Entretanto, o
terapeuta não pode esquecer nunca, que por trás da sedução está a necessidade de
controle, e que a sexualidade é usada para este fim.

A mulher agressiva-masculina é, em geral, intelectualmente agressiva, na mesma medida


em que é passiva sexualmente. Em casos extremos, encontramos mulheres muito
brilhantes e bem sucedidas, que competem e vencem em ambientes predominantemente
masculinos, enquanto permanecem insensíveis sexualmente. Elas não são frígidas – há
uma enorme energia em sua pélvis e órgãos sexuais; é que elas perderam a percepção
clara do estimulo sexual (especialmente vaginal). Na realidade, elas trocaram o prazer
sexual pela carreira, num exemplo quase puro de sublimação.

Uma vez que os jogos de sedução tenham sido expostos, a raiva reprimida contra o
homem (o pai) pode ser trabalhada. Porque essa é uma das chaves para o trabalho bem
sucedido com essa estrutura. E aqui o terapeuta fálico-narcisista pode ser muito eficiente,
representando facilmente a figura do pai, se tiver a habilidade de manter a objetividade.

_____________________
* relativo a sêmen, embrionário.
41

Mas se ele não conseguir manter a objetividade e, ao contrário, personalizar a agressão,


o controle e a sedução de sua paciente, ele irá reagir com raiva – confirmando assim a
crença da paciente de que todos os homens são hostis. Impasses, em geral manifestados
abertamente por discussões sem fim, argumentações intelectuais, discussões acerca de
bobagens, oposição direta (“Eu estou certa, você está errado”), censura (“É você que está
fazendo isso”) – a terapia pode permanecer nesse estágio por períodos prolongados, a
menos que o terapeuta possa vencer seu orgulho, expressar sua inabilidade para quebrar
a resistência da paciente, e expor sua vulnerabilidade – uma tarefa realmente difícil para
um terapeuta fálico-narcisista orgulhoso. Entretanto, esta é a chave para se alcançar o
coração do paciente e, é claro, a chave para o sucesso terapêutico. O perigo de
conspiração com este tipo é limitado; entretanto, um sinal seguro de que a conspiração
está ocorrendo, é a ausência de transferência negativa. Porque a transferência positiva
será abundante - e usada defensivamente.

Com a terapeuta histérica, o problema ainda é o controle – mas a dinâmica do jogo sexual
está ausente. A contratransferência é mais difícil de acontecer e, como já foi dito, é mais
fácil para o paciente alcançar sua agressão reprimida. Entretanto, o nível de agressão,
que é facilmente atingido nessa dupla, é a hostilidade, com relação à mãe – e não o ódio
pelo pai, que é um dos problemas subjacentes básicos para este tipo de paciente.
Portanto, assim como na interação do par anterior, será uma atitude inteligente da
terapeuta do sexo feminino procurar a ajuda de um colega do sexo masculino – e isto, por
si mesmo, ativa as defesas caracteriológicas da histérica, de desprezo e ódio pelo
homem, expressas por uma atitude de auto-suficiência; e também requer a resolução
parcial do orgulho para poder admitir que precisa de ajuda.

A mulher agressiva-masculina tem, frequentemente, componentes psicopatas e


paranóides. É mais fácil para ela confiar numa mulher do que num homem que, afinal de
contas, foi quem a rejeitou, ou abandonou. A resolução deste componente paranóide é
muito importante, apesar de algumas vezes exigir um esforço difícil e prolongado. Alternar
terapeutas do sexo masculino e do sexo feminino é uma ferramenta valiosa. Em última
instância, entretanto, a personalidade realmente muda se o coração for atingido, se a
pessoa se tornar capaz de amar e dar, em vez de odiar e tomar. Nesse caso, se o
terapeuta estiver consciente de que o ódio, a hostilidade, a exigência e a desconfiança
projetados são uma expressão do profundo sofrimento de seu paciente, ele obterá
resultados inestimáveis.
42

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE ESQUIZÓIDE


E O TERAPEUTA HISTÉRICO E/OU FÁLICO-NARCISISTA

Pela descrição precedente, fica obvio que a estrutura histérica/fálico-narcisista representa,


caracteriologicamente, um sistema de ego poderoso e organizado, com uma grande
quantidade de integração e energia. Por outro lado, a estrutura esquizóide sofre de
carência de integração do ego. O ego esquizóide é muito fraco – o ego histérico/fálico-
narcisista é muito forte. Portanto, um dos problemas fundamentais na interação entre
estas duas estruturas é a diferença de níveis de energia.

Onde o terapeuta histérico/fálico-narcisista tem a tendência de se mover rápida e


eficientemente, onde ele precisa resolver, atuar, o esquizóide fica aterrorizado com a
possibilidade de que as fronteiras de seu ego sejam destruídas. Porque seu problema
principal é, precisamente, que as fronteiras de seu ego são permeáveis, frágeis e
instáveis. Ele teme que ocorra uma descompensação maciça, caso as fronteiras do ego
se desfaçam – e este não é um medo irreal.

Como analogia, para descrever essas duas personalidades, poderíamos imaginar uma
ameba com um membrana muito rígida e inflexível, que assegura os limites do organismo,
enquanto, simultaneamente, impede a sua mobilidade – um requisito indispensável para a
extensão de pseudópodes. Supondo que a entrada de alimento fosse, ainda assim,
adequada e constante, o problema dessa ameba seria mover-se e descarregar o excesso
de energia acumulada no protoplasma, pela constante entrada de alimento e oxigênio.

No outro extremo do espectro, uma ameba com uma estrutura de caráter esquizóide teria
uma membrana muito permeável e frágil, talvez até fragmentada. Aí, o perigo para a
ameba seria a perda de protoplasma, através de uma membrana que não consegue
contê-lo devidamente. Sendo assim, quando um paciente esquizóide interage com um
terapeuta histérico/fálico-narcisista, o terapeuta deve sempre ter em mente a fragilidade
de seu paciente. O terapeuta deve lembrar-se que sua necessidade de uma resolução
rápida e eficiente pode desenvolver-se em impaciência, exasperação, e mesmo, raiva,
sentimentos que despertarão o trauma primário do paciente.
43

O terapeuta deve agir frequentemente como conselheiro, consolidando o princípio de


realidade e catexia objetal imperfeita, comuns a estes pacientes. Frequentemente o
paciente esquizóide precisa do exemplo de um alter-ego forte, no qual possa se apoiar
enquanto desenvolve sua própria força e catexia objetal.

Em outras palavras, a personalidade esquizóide precisa de um ego forte, mas gentil,


compreensivo e tolerante, pelo qual possa modelar-se. Ela precisa constantemente ser
confrontada com a realidade, todos os tipos de realidade, mas de uma forma que não seja
ameaçadora. A repressão foi deficiente – a regressão é uma ameaça constante. O
terapeuta histérico/fálico-narcisista precisa estar sempre consciente disto, já que é bem
possível que um dos “testes” que o paciente esquizóide fará com o terapeuta será o da
paciência. O paciente esquizóide vai se retrair, recusar-se a produzir material novo, e
permanecer num platô estável durante longos períodos, exigindo que o terapeuta rígido
seja paciente, e capaz de tolerar a necessidade do esquizóide, de ter uma terapia lenta,
progressiva e orientada para a realidade.

O terapeuta precisa perceber que os esquizóides são, geralmente, pacientes para a vida
toda. O problema do esquizóide é sua falta de habilidade para manter contato com a
realidade exterior. O contato com o terapeuta, e com a realidade é, talvez, o único ponto
importante para essas estruturas. O terapeuta precisa, frequentemente, agir como uma
ponte, como um guia, para ajudar seu paciente. Nenhuma resolução rápida é possível,
nenhum grande progresso vai acontecer por longos períodos de tempo. O terapeuta
precisa realmente “ensinar”, às vezes a níveis quase elementares.

O homem fálico-narcisista usa a raiva e a agressão como defesa básica contra sua
própria vulnerabilidade. Mas não o esquizóide, que usa o retraimento. Isto é exatamente o
que acontece quando o terapeuta fálico-narcisista pressiona um avanço, fica zangado ou
impaciente, ou faz qualquer outra coisa que agrida o paciente. O paciente se retrai, senão
fisicamente, pelo menos emocionalmente, ad infinitum, exasperando, ainda mais, o
terapeuta. Eventualmente, o retraimento se transforma em descompensação, e a
regressão pode acontecer, levando – em casos extremos – a incidentes psicóticos. Este
não é um problema serio para a mulher histérica, cuja linha básica de defesa é a sedução,
em vez da raiva.
44

A bio-energética é especialmente útil numa situação contratransferencial deste tipo,


porque usando técnicas físicas, o terapeuta pode ajudar o paciente a restabelecer – ou
manter – o contato básico de realidade, que é a percepção do corpo.

Simultaneamente, a possibilidade de um trabalho físico, ativo, criativo e inovador, ajudará


o terapeuta a satisfazer sua própria necessidade de resultados, porque, geralmente, o
paciente esquizóide pode trabalhar muito fisicamente. Eles adoram a sensação de
estarem vivos, que esse trabalho proporciona a eles. A percepção do corpo é um passo
fundamental no restabelecimento da catexia objetal, e do contato com a realidade. Para o
esquizóide, os exercícios físicos pesados são geralmente bem vindos.

Eles são capazes de manter muitos dos exercícios bioenergéticos mais ativos, por muito
mais tempo do que outras estruturas de caráter, e se beneficiarão enormemente por
atingirem os limites físicos de tolerância; porque é nestes limites que eles perceberão
mais claramente a realidade do seu corpo. É fato sabido, por exemplo, que muitos dos
maiores dançarinos têm fortes componentes esquizóides, porque isto lhes permite levar
seu corpo muito além dos limites de tolerância de outras estruturas.

É claro que é indispensável fazer trabalho analítico continuamente também. Porém, mais
uma vez, a análise deve ser orientada para a consolidação dos limites do ego, em vez da
descoberta de material arcaico. Este material é, precisamente, o que está constantemente
em maior contato com o paciente, e ele tem medo disto, porque não tem certeza se isto
pode ser suficientemente reprimido, para manter o equilíbrio.

Todos os autores concordam que um passo importante é a expressão de transferência


negativa, e aqui novamente a bioenergética é utilíssima, já que permite ab-reação
progressiva e controlada. Mas o terapeuta habilidoso precisa tomar cuidado para não
forçar demais seu paciente – porque a estrutura esquizóide teme, num nível muito
primitivo, seus próprios impulsos agressivos, que são, subjetivamente, experenciados
como material destrutivo e incontrolável do id invadindo o ego enfraquecido. Aqui
repousam os maiores perigos contratransferenciais.
45

A sexualidade não deve ser um problema nesta dupla, em particular, apesar de que, em
geral, sexualidade/sedução seja um perigo contratransferencial básico para o terapeuta
histérico/fálico-narcisista. A razão disto é que a sexualidade, geralmente, não é um
problema para a personalidade esquizóide – ou ela é muito reprimida, e o paciente tem
um interesse limitado por sexo; ou é abertamente usada, de um modo tão obvio e rude,
que é fácil de reconhecer e trabalhar com ela.

Entretanto, o contato pode se tornar um problema contratransferencial. Porque o


esquizóide precisa explorar muito vagarosamente, fazer contato e interrompê-lo
frequentemente; o terapeuta rígido precisa mover-se, realizar, e pode temer o contato
profundo, de alma para alma, que o esquizóide exige. Defensivamente, o terapeuta pode
de alguma forma, tornar-se irreal – e isto é a pior coisa que se pode fazer com esses
pacientes. Porque eles percebem a dinâmica dos outros, a um nível incrivelmente
profundo, e os outros sempre lhe mentiram na infância. As coisas mais importantes que o
terapeuta deve lembrar são:

1. Ele precisa, acima de tudo, ser real e perceber que o seu paciente pode quase “ler
seus pensamentos”. É inútil mentir;

2. Ele pode ensinar ao paciente, fragmentos da realidade que outros adultos


presumem estar integrados;

3. Ele tem que entender a raiva, como uma expressão de dor e frustração, por ser
incapaz de manter contato com a realidade. Contato é o ponto principal.
O terapeuta é a ponte para a realidade.
46

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE PASSIVO-FEMININO


E O TERAPEUTA HISTÉRICO E/OU FÁLICO-NARCISISTA

Como foi apropriadamente descrito no capítulo sobre o terapeuta passivo-feminino, o seu


padrão básico de comportamento é a submissão. A estrutura de caráter passiva-feminina
tende a aplicar, submeter, racionalizar, todos os sentimentos que possam, de alguma
forma, levar à confrontação direta. O terapeuta rígido, que tende a ser muito mais direto,
que pode ter algum desprezo não resolvido, se torna impaciente e, finalmente, zangado. E
então o paciente passivo-feminino tentará agradar o terapeuta. Ele também vai se retrair,
se fechar em seu ressentimento ardente, e vai concluir que estava certo desde o início
(sua dedução caracteriológica) de que sentimentos negativos, rebelião e auto-afirmação,
são tabus. Mas, de qualquer forma, ele continuará tentando agradar por algum tempo.

Portanto, o terapeuta deve ser muito cuidadoso com os “presentes” que o paciente vai,
quase continuamente, produzir. Estes “presentes” podem tomar qualquer forma, incluindo
produção de sonhos e material de inconsciente profundo, que o paciente acredita (em
nível mais profundo) que o terapeuta espera. O paciente está sempre antecipando as
expectativas do terapeuta, e irá a extremos absolutos para satisfazer essas expectativas,
frequentemente fantasiadas. Por outro lado, este tipo de paciente precisa que o terapeuta
lhe dê apoio, e lhe assegure que ele é aceito e amado. Para o homem fálico-narcisista,
isto é mais uma vez um desafio, já que uma de suas dificuldades básicas é amar de forma
genuína, sem manipular. Como o paciente passivo-feminino é, essencialmente, um
manipulador que exige e requer amor e apoio, a tendência do terapeuta, de conter seu
amor (experenciada como “uma exigência desnecessária do paciente”) será exacerbada.

Este não é um grande problema para a terapeuta histérica. Primeiro, porque é muito mais
fácil para ela amar a figura do “menino desamparado” que o seu paciente apresenta.
Depois, porque ela é uma mulher, e o paciente fica mais confortável com mulheres
(contanto que elas permaneçam assexuadas), do que com homens, que são mais
ameaçadores. Não esqueçamos que a principal área problemática do passivo-feminino é
com o homem – e não com a mulher. Os problemas com mulher/mãe afloram, às vezes
violentamente, quando a sexualidade aparece – mas para que isso aconteça, é preciso
que uma confiança considerável se desenvolva, e um bom relacionamento terapêutico é
indispensável – e nesse ponto, muitas situações contratransferenciais já terão sido
trabalhadas.
47

Há uma forte tentação para o terapeuta de conspirar com seu paciente, e de aceitar os
“presentes”, que são apenas uma sedução por parte do paciente. Entretanto, se o
terapeuta aceitar esses presentes sem analisar seu verdadeiro propósito e significado, e
sem desmascarar a resistência de forma analítica, ele estará fazendo o jogo de defesa
caracteriológica do seu paciente. Por outro lado, se ele confrontar o paciente de forma
muito rude, apontando a verdadeira irrelevância desse material, frequentemente inútil, e a
forma como é usado como defesa contra o progresso, o paciente passivo-feminino
perceberá isto como uma reprodução do seu trauma infantil original, e se retrairá ainda
mais para a sua passividade, ressentimento e medo.

Para este tipo de paciente, é necessário desenvolver confiança suficiente, a fim de


tornar-se auto-afirmativo, poder mover-se e expressar seus verdadeiros sentimentos,
ansiedades e ódios, sem medo de represálias por parte do temido progenitor – o
terapeuta. Mais uma vez, o terapeuta rígido precisa perceber que este tipo de paciente vai
necessitar de uma terapia prolongada e, apesar de acontecerem avanços e momentos
decisivos, o progresso é lento.

A raiva inconsciente do terapeuta fálico-narcisista será interpretada, se percebida pelo


paciente, como uma raiva dirigida diretamente contra ele, e mais uma vez reproduzirá o
trauma da infância. O mesmo se aplica ao desprezo inconsciente. Para a terapeuta
histérica, além da raiva e do desprezo, o problema da sexualidade e da imagem da mãe
pode se tornar sério. Porque, se nos referirmos à etiologia da estrutura de caráter
passivo-feminino, veremos que a identificação masculina do paciente não está segura.

O paciente aprendeu a sobrevier, manipulando os instintos protetores de sua mãe. Ele


usou a sedução, o desamparo e, em última análise, a promessa de um relacionamento
assexuado com ela – e ele não se esqueceu disso. É claro que todas as histéricas têm
um desejo secreto pelo “príncipe encantado” – o jovem perfeito, que elas podem amar
sem correr o risco de que ele se torne um “homem de verdade”.

E esta é exatamente a transformação que é necessária para o paciente passivo-feminino


– ele precisa se tornar auto-afirmativo e sexual – ele precisa possuir inteiramente sua
própria raiva. Estes sentimentos são defesas que o terapeuta rígido desenvolveu em lugar
da expressão de seu amor e interesse.
48

Certamente é aqui que está a solução. Porque o terapeuta rígido deve realmente ter calor
e bons sentimentos pelo paciente passivo-feminino, antes de concordar em trabalhar com
ele. De outra forma, a terapia será extremamente difícil, e os prognósticos duvidosos.

Se, no início da terapia, o terapeuta rígido perceber em si mesmo, raiva ou desprezo pelo
paciente, ele deve considerar – depois de trabalhar estes sentimentos dentro de seu
próprio trabalho – a possibilidade de enviar o paciente para outro terapeuta. Por outro
lado, se os sentimentos positivos e calorosos realmente existirem, então o relacionamento
entre estas duas estruturas pode levar a uma experiência frutífera, produtiva e gratificante
para as duas pessoas envolvidas.
49

INTERAÇÃO ENTRE O PACIENTE PSICOPATA


E O TERAPEUTA HISTÉRICO E/OU FÁLICO-NARCISISTA

Aqui, o terapeuta rígido vai encontrar um desafio real. No caso do paciente psicopata, ele
está encontrando um paciente cujo sistema energético é similar ao seu próprio, no que se
refere à grande quantidade de energia disponível. Entretanto, o psicopata deslocou sua
energia para a parte superior do seu corpo, e sobrecarregou a sua mente. As funções do
ego são extremamente ativas, talvez até super ativas.

Os psicopatas precisam estar certos sempre. Sua receptividade está diminuída, sua auto-
afirmação não deixa lugar para dúvidas ou desafios. Entretanto, eles têm grande
dificuldade em aceitar qualquer sugestão do terapeuta. Eles também resistirão fortemente
a muitas das técnicas físicas disponíveis em bioenergética, realizando-as mecanicamente,
e dissociando-se de qualquer percepção de sentimentos novos e, portanto,
desconhecidos. Devemos lembrar que a defesa do psicopata se originou pelo excesso de
manipulação da mãe sedutora, o que, através da negação, resultou numa ênfase
excessiva do ego, em detrimento de todas as outras percepções. O problema
fundamental é que eles nem mesmo tentam desafiar a sua própria interpretação da
realidade, que foi frequentemente ajustável e funcional em sua vida exterior (com exceção
de seus relacionamentos interpessoais).

Por outro lado, o terapeuta histérico ou fálico-narcisista tem uma enorme dificuldade em
expressar amor diretamente. Ele teme a rejeição que, na infância, criou sua própria
estrutura de caráter. Daí resulta uma retenção de amor, ou uma forma indireta de
expressá-lo, que pode parecer ao paciente psicopata a manipulação, as mensagens
duplas, a trapaça, a falta de segurança, às quais ele este sujeito. Além disso, o psicopata
tem um comportamento de rejeição, constantemente expresso em todos os níveis, o que
ativa o medo básico de rejeição do terapeuta rígido – isto é subjetivamente e
conscientemente percebido como frustração extrema, que pode levar à raiva defensiva.
Além do mais, o psicopata provavelmente rejeitará qualquer tentativa do terapeuta de
atingi-lo diretamente. Tudo isto inevitavelmente ativa as defesas caracteriológicas do
terapeuta rígido. Para evitar a rejeição, o terapeuta terá a tendência de se retrair, ficar
passivo, deixar o paciente tomar o controle que ele deseja, e talvez não vá nem mesmo
confrontar o paciente, quando isto for necessário.
50

O terapeuta sentirá que o paciente psicopata não quer realmente mudar, que a motivação
é muito limitada, e poderá cair na armadilha de acreditar que seu paciente não está
realmente decidido a mudar. Pode haver alguma verdade nisso; o psicopata acredita,
basicamente, que ele está certo e a sociedade está errada, que as regras impostas a ele
do exterior são o produto de uma mãe irracional.

Desse modo, terapeuta e paciente conspiram e deixam de lado o principal problema do


psicopata, que é a necessidade de controle. Deixando o paciente tomar o controle da
terapia, nenhuma confrontação (com as conseqüentes dores e riscos) é necessária. O
paciente se sentirá muito confortável se apenas um pouco de aceitação ou apoio for
oferecido, e pode até não querer partir. Mas isto não é terapia. Se, neste contexto, o
terapeuta começar a oferecer intervenções didáticas ou analíticas do caráter que possam
alterar o equilíbrio confortável, numa tentativa de reativar a terapia, o paciente vai,
provavelmente, rejeitá-las. Isto certamente ativará a raiva e o desprezo, que são tão
facilmente usados como defesa pelas estruturas rígidas, em vez de sentir e expressar a
dor pela rejeição (que é o melhor modo de realmente atingir o paciente). Se o terapeuta
ficar zangado, estará reproduzindo o trauma básico infantil do psicopata, onde pais
amorosos repentinamente se tornam irracionais e traem a confiança incondicional da
criança. As coisas pioram se o terapeuta tenta reprimir os sentimentos – o que ele quase
invariavelmente tenderá a fazer, já que essas duas modalidades são parte das defesas do
caráter rígido, e, portanto, quase inconscientes e, frequentemente, automáticas.

Resumindo, vemos que a estrutura rígida precisa atuar e obter resultados; a estrutura
psicopata pondera; a estrutura rígida se enraivece ou se torna sedutora, e confirma a
crença do psicopata de que o mundo é louco e ele é são. Esta é uma das dinâmicas
típicas que podem ocorrer entre o terapeuta rígido e o paciente psicopata. A solução é o
terapeuta experenciar totalmente, e expressar o seu desamparo, mostrando ao paciente a
dor infligida. Somente então o terapeuta poderá alcançar o coração do paciente, que é a
chave para a resolução do conflito. O terapeuta precisa ter sempre em mente que a
rejeição é uma modalidade operacional normal do psicopata, que o desprezo se
manifestará a toda hora durante a terapia, que o psicopata realmente acredita que ele
está certo e os outros estão errados. Talvez, então, o terapeuta possa entender e aceitar
a rejeição, a dúvida e o desprezo, o que é tão difícil para a estrutura rígida, onde o
orgulho é um dos traços dominantes.
51

ETIOLOGIA DO HOMEM PASSIVO-FEMININO

Esta estrutura de caráter foi amplamente descrita por Reich, em seu livro Análise do
Caráter, onde ele discute a historia de um caso bem sucedido, usando precisamente o
seguinte ponto de vista:

Fisicamente, o homem passivo-feminino tem um corpo pesado, masoquista, da cintura


para baixo; e oral da cintura para cima, apresentando um contraste chocante entre as
duas partes, com um poderoso bloco diafragmático. Esta estrutura física corresponde
exatamente ao desenvolvimento psicodinâmico do paciente que se identifica
predominantemente com sua mãe fria, sedutora, poderosa e (aparentemente) bem
sucedida. A regra, geralmente válida, que diz que a identificação acontece com o
progenitor mais ameaçador, também aqui se mostra verdadeira; a mãe é experenciada
como sendo completamente dominadora e como tal, certamente mais ameaçadora do que
o pai.

O mecanismo é, geralmente, um mecanismo de adaptação, e este caso é reforçado pelo


fato de que a mãe é também o progenitor do sexo oposto no conflito edipiano,
tornando-se, portanto, não apenas o objeto do amor, mas também o modelo que a criança
introjeta, e com o qual mais tarde se identifica. Isto conflita diretamente com o seu
desenvolvimento psicodinâmico normal. O pai estava ausente – física ou emocionalmente
- ou então foi experenciado como muito fraco e incapaz de contrariar a forte mãe. O pai
também foi sentido como dissimuladamente ameaçador, uma derivação da culpa
edipiana, acentuada por uma ansiedade de castração poderosa, apesar de fortemente
reprimida. O resultado é, geralmente, uma estrutura de caráter inibida, embora genital,
que tem medo do homem, e é dependente da mulher.
52

O medo do pai, a ansiedade de castração, a culpa e a identificação imprópria do ego


resultam em:

1. Ódio pela mulher, que é forte, bem evidente e, algumas vezes, violento;

2. Aparente submissão ao homem – numa atitude de “bom menino” – que encobre


um ódio profundo e brutal pelo homem, que foi reprimido e deslocado para a
mulher.

A mulher, claramente perigosa, era na realidade menos ameaçadora do que o pai


dissimulado, obscuro, fraco e desconhecido, que se ocultava no segundo plano. A história
do desenvolvimento é, particularmente, importante para entender pessoas com esta
estrutura. Um cenário típico deve ser mais ou menos assim:

A criança provavelmente se desenvolveu dentro de um esquema seguro, apesar de


repressor e sufocante, e teve relativamente pouca fixação nos primeiros estágios, exceto
pelo período bem inicial da fase oral, durante a qual a mãe tirânica, sedutora, mas fria,
não foi experenciada como amorosa e nutridora. Esta é a causa subjacente do
componente oral que, apesar de muito forte, não é dominante. A criança não se fixou
definitivamente neste nível, e continuou seu desenvolvimento mais ou menos
normalmente. Ela alcançou a fase edipiana, e nesse ponto sexualizou seus sentimentos
em relação à mãe e expressou-os como tal.

A mãe abertamente rejeitou os avanços da criança, enquanto, dissimuladamente, era


sedutora e provocante. A criança primeiramente ficou confusa com essa mensagem
dupla, e depois ficou com medo. Porque em segundo plano se ocultava uma figura
desconhecida – o pai. Foi para seu pai, que ela se voltou em busca de apoio e identidade,
somente para perceber (subjetivamente) um homem fraco. A atitude expressa do pai, com
relação à sua mulher foi, provavelmente, conciliatória, ou excessivamente submissa;
portanto, o pai não pôde ser usado pela criança como modelo de identidade.
53

O problema é manifestado mais tarde, como uma identificação indiferenciada, confusa, e,


algumas vezes, completamente invertida. A mulher foi experenciada como sendo forte,
afirmativa, desembaraçada e dominante. O homem foi experenciado como sendo fraco,
submisso, medroso. Os valores normalmente masculinos de afirmação, força e ordem,
foram atribuídos à mulher; e os valores normalmente femininos de suavidade,
receptividade e calor foram relacionados ao homem. Frequentemente, o pai foi também a
figura amorosa e nutridora – o que mais tarde veio complicar o problema de identidade da
fase edipiana da criança. Resumindo, a mãe fria e sedutora e o pai inseguro se
combinaram para gerar, por um lado, um conflito edipiano muito forte, e não resolvido; e
por outro lado, um ódio contra o pai, que falhou em proteger a criança de seus próprios
desejos instintivos, porque foi incapaz de fornecer um ego-ideal adequado.

As expressões desse ódio foram toleradas até certo ponto, mas a criança percebeu a dor
que ela estava infligindo. Seguiu-se a culpa. Eventualmente, a agressão aberta contra o
pai foi reprimida, e mais tarde deslocada para a mulher por que – como entidade
conhecida – ela se tornou menos ameaçadora do que o pai desconhecido e irreal.

Assim, além da forte culpa edipiana, descobrimos culpa associada ao amor recebido do
pai (e, portanto, associada também ao amor pelo pai). Também encontramos culpa ligada
à expressão do princípio agressivo, já que essa mesma agressão – recebida como
tolerância, paciência, e até amor – foi reprimida tanto pela criança, porque era percebida
(mais uma vez subjetivamente e, portanto, não necessariamente de forma precisa) como
a causa do sofrimento do pai.

Aqui precisamos compreender que a afirmação saudável foi exagerada até chegar ao
ódio e, em última instância, a impulsos assassinos, já que o pai, afinal, forneceu a
ameaça edipiana. A afirmação se confundiu com agressão – e ambas foram reprimidas. A
modalidade de comportamento resultante é a aparente submissão ao homem. Isto serve a
um duplo propósito – elimina o risco de confronto (com a ameaça de liberação de
impulsos assassinos) e é usado como expiação pela culpa, que é um componente tão
importante desta estrutura de caráter. Na realidade atual, o ódio reprimido, exacerbado
pela contínua submissão ao homem, é deslocado para a mulher, onde se torna
controlável. Mas o processo de relacionamento do casal sofre severamente, e esta é
frequentemente uma das queixas presentes.
54

Muitas vezes, o indivíduo lembra seu papel de infância como “o verdadeiro homem da
família” – e isto, até certo ponto, pode ter sido verdade. Seu pai fraco, retraindo-se diante
da mãe afirmativa, pode ter usado a criança como pára-choque. Por seu lado, a mãe
insatisfeita pode ter colocado sua sexualidade para a criança inofensiva. Qualquer uma –
ou ambas – as manobras, resultaram no fato da criança se sentir obrigada a “lutar a
batalha do pai”, ou se sentir “o homem da família”, etc.

A criança se defendeu contra isso de varias formas: primeiro, tentou repetidamente


conquistar o amor da mãe, ao qual tinha livre acesso antes do desenvolvimento de sua
sexualidade. Como a rejeição continuou, ele identificou a mudança na atitude de sua mãe
com a sua própria sexualidade, e tentou reprimi-la. A criança usava a negação como
mecanismo básico de defesa. Mais tarde em sua vida, isto será manifestado
psicologicamente por uma camada de gordura e/ou musculatura espástica, que rodeia
(como que para isolar) a pélvis, onde a sexualidade se originou; isto interrompe
eficientemente o fluxo de energia através da parte inferior do corpo, resultando numa
configuração masoquista nessa parte.

A criança também tentou (e foi parcialmente bem sucedida) identificar-se com a mãe. É
ela que a criança deseja, e com ela teve um relacionamento muito íntimo e, às vezes,
simbiótico, antes da manifestação de sua sexualidade. Portanto, a identificação com, e a
introjeção da figura feminina é, parcialmente, uma adaptação, especialmente por que não
há figura masculina para compensar. Estas duas manobras servem para manter a
esperança de que um dia a criança vá recobrar a intimidade como a mãe, enquanto –
mais uma vez – aplaca a ameaça real, o pai, castrando-se simbolicamente. O resultado
geral é a submissão, que é interpretada pela família como uma atitude de “bom menino”,
e é bem-vinda quando o indivíduo é uma criança. Mais tarde, na vida, esta atitude se
torna, talvez, a mais chocante manifestação desta estrutura de caráter. Descobrimos que
o homem passivo-feminino carece de espontaneidade e objetividade, e tem uma forte
inibição da capacidade de expressar necessidades e desejos. O nível energético não é
tão alto como se poderia esperar de uma estrutura de caráter pós-genital, como
mencionado anteriormente, este tipo tem a parte inferior do corpo pesada e masoquista, e
um grau considerável de oralidade na parte superior.
55

Exteriormente, o adulto é gentil, compreensivo, submisso e passivo, mas interiormente ele


está cheio de ódio, ressentimento e raiva contra o homem e a mulher, o que é geralmente
expresso pela constante manipulação. Ele é geralmente bem sucedido em sua carreira, já
que as características de manipulação, submissão e dissimulação, são valorizadas em
nossa sociedade. Por outro lado, sua vida pessoal é, geralmente, dominada pela mulher,
pois a mesma submissão que é valorizada no mundo dos negócios é causa de desprezo
dentro da estrutura familiar. Ele está geralmente sujeito a problemas sexuais. Ele pode ter
ataques de impotência eretiva, e é sempre orgasticamente impotente (no sentido
reichiano da palavra). Já que ele está sempre tentando agradar a mulher, ele encontrará
um modo de satisfazer sua parceira, seja diretamente, através da relação sexual, seja
através de alternativas, tais como sucessos financeiros, sociais, políticos ou similares.

Esse desejo de agradar a mulher se origina, é claro, da sua necessidade de agradar sua
mãe, para obter seu amor. O desejo e a ambição, que essas pessoas em geral, têm,
resultam da tentativa da criança de competir com seu pai, a fim de conseguir o amor
prometido, mas sempre inalcançável. A criança compreende que o pai é o provedor e
protetor da casa. A criança iguala sucesso social e poder material, com fraqueza
emocional, timidez e submissão à mulher. Já que o pai tem poder financeiro bem como o
amor da mãe, obviamente o caminho para conquistar a mãe é obter o sucesso financeiro.
Entretanto, a criança pensa que ela tem que ter mais poder financeiro do que seu pai,
para que a escolha se torne obvia para a mulher. Esta distorção, carregada para a vida
adulta, persiste como um desejo inconsciente de obter cada vez mais bens, na esperança
de que, eventualmente, uma quantidade suficiente seja obtida, e a mãe, perdida há tanto
tempo, seja finalmente reconquistada.

Podemos agora entender porque o medo básico do homem passivo-feminino é expressar


diretamente seus sentimentos afirmativos, tanto com relação ao homem, quanto à mulher.
A contínua necessidade de representar e desviar qualquer confrontação possível, assim
como a tendência a manipular, são realmente os problemas básicos, dos quais deve estar
consciente um terapeuta com uma estrutura de caráter passivo-feminina dominante.

Na sequência, tentarei descrever algumas interações típicas entre o terapeuta passivo-


feminino, e outras estruturas de caráter. Eu terei que ser sucinto e parcial, já que um ser
humano é, primeiramente, uma pessoa individual, como já foi dito aqui em diversas
ocasiões, e, portanto, não pode jamais ser completamente descrito por qualquer sistema
caracteriológico, que deve ser usado apenas como um guia.
56

O TERAPEUTA PASSIVO-FEMININO E O PACIENTE ESQUIZÓIDE

Para o paciente esquizóide, cujas necessidades básicas são: reintegrar sua percepção do
mundo externo, e consolidar suas defesas do ego, o terapeuta passivo-feminino pode ser
muito adequado. Porque a ansiedade de castração (medo de destruição) do próprio
terapeuta, encontra um paralelo, pelo menos parcialmente, no medo de aniquilação total
do esquizóide – ambos sendo experenciados como ameaça física à existência. O medo
do terapeuta, em reconhecer sua raiva e seu ódio, também encontra um paralelo no medo
da própria raiva que o paciente esquizóide tem – o que, algumas vezes, é quando muito
pré-consciente.

O terapeuta compreenderá a necessidade do paciente de nutrição, apoio e teste da


realidade. Seu ego é suficientemente integrado, para servir como modelo para o ego
deficiente do esquizóide. Os perigos repousam na necessidade do terapeuta de
manipular, agradar e escapar da confrontação. O paciente esquizóide, percebendo isto,
pode tentar provocar a confrontação – que provavelmente provocará uma reação
exagerada do terapeuta, cuja tendência é passar da não-confrontação, à agressão
exagerada. Se isto acontecer, será experenciado pelo paciente, como um ataque que
reproduz seu próprio trauma infantil básico.

O paciente se tornará muito defensivo, possivelmente até regressivo a estágios bem


primitivos. Há o perigo de que a regressão inicie a descompensação. De qualquer forma,
o paciente resistirá a todas as tentativas de interpretação e, em geral, bloqueará todos os
esforços que o terapeuta possa fazer. Isto de torna muito frustrante para o terapeuta, que
sente que não está agradando ao paciente, experencia seu próprio medo, e reage
exageradamente, aumentando seus esforços para ajudar o paciente. Isto, por sua vez, vai
exacerbar no paciente a situação previamente mencionada, e ele então vai se tornar cada
vez mais defensivo. Se este processo continuar livremente, o paciente provavelmente
deixará a terapia mais cedo, ou mais tarde. Se, por outro lado, o terapeuta se
conscientizar de que está tentando agradar o paciente, que não está expressando seus
próprios sentimentos, que está sendo “irreal”, enquanto o que o paciente precisa é de
paciência, apoio, compreensão e, acima de tudo, contato com um alter-ego “real”.
57

Se ele compreender que pode ajudar o paciente a restabelecer gradualmente o contato


com a realidade, então o terapeuta será capaz de abandonar sua contratransferência,
compreendendo que a aparente rejeição do paciente é uma mera manobra defensiva, que
não é necessário apaziguar ou submeter-se, que o que é exigido dele é que expresse
seus verdadeiros sentimentos.

Esta compreensão fará com que a terapia, necessariamente longa com este tipo de
paciente, seja muito fácil para o terapeuta, já que ele será capaz de avaliar as
necessidades do paciente, de uma perspectiva diferente. Naturalmente, o paciente
também se beneficiará.
58

INTERAÇÃO COM O PACIENTE ORAL

Neste caso, o terapeuta passivo-feminino se defronta com um paciente que se fixou na


fase oral, isto significa que o desenvolvimento psicodinâmico, embora possa ter
continuado além da fase oral, só o fez com relativamente pouco sucesso. O corpo do
paciente não pode suportar muita energia, e como resultado ele não tem muita energia. A
libido permaneceu principalmente no nível oral; a sexualidade é geralmente usada para
obter proximidade, intimidade, e para assegurar que está presente o relacionamento de
dependência que esta estrutura requer; existe uma dificuldade em experenciar qualquer
tipo de gratificação real diretamente do ato sexual. Frequentemente acontece que o
paciente oral seja bastante promiscuo; isto, entretanto, não provém diretamente do desejo
sexual, mas antes da necessidade de estar nos braços de alguém, de estar próximo,
quente e protegido.

O paciente oral é raramente capaz de expressar suas necessidades diretamente. Na


realidade, ele se defende contra suas necessidades, expressando o oposto – uma
aparente independência, que é experenciada na terapia como uma atitude de “eu não
preciso de você”. É claro que por baixo disto, a atitude de rejeição provém da
necessidade oral, que será reprimida até que o paciente experimente a raiva causada
pela frustração da necessidade original. A repressão dessa raiva envolve a repressão das
próprias necessidades; daí a posição adotada pelo paciente, anteriormente descrita.

Além disso, como esses pacientes têm geralmente pouca energia, o “eu não preciso de
você” pode mudar muito rapidamente para uma atitude passiva, que na realidade
transforma essa afirmação em “você faz isso por mim”. O terapeuta tem que estar de
sobreaviso para esta manobra, já que esses pacientes são extremamente propensos a
criar este tipo de dependência.

O terapeuta passivo-feminino experencia esses pacientes, como buracos sem fundo que
nunca podem ser satisfeitos. Pode haver alguma verdade nisso, já que a necessidade oral
é realmente inextinguível; mas na contratransferência, o terapeuta experencia a si mesmo
como sempre tentando agradar seu paciente, e nunca conseguindo isso completamente.
Isto desencadeia a raiva.
59

E esta situação vai se conectar diretamente com a constituição neurótica, no nível


caracteriológico, já que o terapeuta experencia seu paciente como tentando depender
excessivamente de sua energia/sentimentos/recursos. O terapeuta se ressente
profundamente dessa dependência, já que seu próprio componente oral privou-o
exatamente daquilo que o paciente está agora exigindo dele.

O terapeuta, inconscientemente, pode acreditar que só tem uma quantidade limitada


“daquilo” (amor/energia/calor/sentimentos) que o paciente exige contínua e
inexoravelmente. O terapeuta pode experenciar o paciente como “sugando” (esta é uma
palavra simbólica, mas muito descritiva neste caso em particular) sua força, e ele pode
estar certo. Entretanto, a privação oral do próprio terapeuta, que está sendo ativada, e
sua própria necessidade oral, que o paciente não está gratificando, é que estão criando a
contratransferência. Se esses sentimentos, geralmente inconscientes, não são resolvidos,
serão demonstrados ao paciente como agressão irracional, ou retraimento frio, que irão
reforçar a crença essencial do paciente de que mais cedo ou mais tarde ele será privado
do objeto de seu amor.

No decurso da terapia é importantíssimo que essa contratransferência negativa seja


continuamente trabalhada, mesmo que isso signifique expor (depois de cuidadoso
auto-exame) esses sentimentos irracionais diretamente ao paciente. Se esta revelação for
feita de forma apropriada, eventualmente levará o paciente a desenvolver suficiente
confiança no terapeuta, para expressar diretamente seus próprios sentimentos
transferenciais negativos – e isto marcará o início de uma aliança terapêutica bem
sucedida.

O terapeuta também precisa ser capaz de, gentilmente, frustrar as exigências de amor
maternal e de apoio que o paciente tem, enquanto aceita seu ódio e rejeição defensivos.
O ódio e a rejeição aparecerão quer o terapeuta aceite, ou não, “servir de mãe” ao
paciente, já que neste caso estamos lidando com a expressão de um ódio não
diferenciado, que é conseqüência das necessidades orais/infantis frustradas. Estes
sentimentos negativos são aqueles que mais requerem expressão e, eventualmente,
diferenciação. Portanto, o terapeuta passivo-feminino deve aprender a tolerar e aceitar
totalmente a raiva, o ódio, e a rejeição do paciente.
60

INTERAÇÃO COM O PACIENTE MASOQUISTA

Aqui, o terapeuta passivo-feminino se confronta com um problema totalmente diferente. A


estrutura masoquista é, em geral, altamente energizada, apesar de essa energia ter
implodido.

Lowen descreve o masoquista, como o resultado de um ambiente sufocante, onde todas


as necessidades materiais da criança são excessivamente supridas, e suas necessidades
emocionais são completamente negligenciadas. Como sabemos, a estrutura do corpo
físico é caracterizada por excesso de peso, espasticidade crônica na maioria dos grandes
músculos, diminuição do pescoço, e extrema contração dos glúteos. O famoso “pântano
masoquista” é experenciado pelo paciente como um sentimento desesperado de
incapacidade de mover-se em direção ao mundo, e afirmar suas necessidades. Muito
frequentemente, percebemos que os pacientes masoquistas, quando conseguem chegar
perto de se tornar afirmativos, e de expressar seus impulsos agressivos, despencam
nesse “pântano”, do qual não conseguem sair.

Os lamentos e reclamações do masoquista, que são quase sempre evidentes no tom de


sua voz, servem para esconder um desesperado grito de socorro. O masoquista quer que
alguém venha e o ajude, que o tire do pântano no qual ele se debate. Em outras palavras,
o masoquista está pedindo ao terapeuta que alivie a dor na qual ele vive, ajudando-o a
descarregar o excesso de energia, que é a causa da ansiedade.

Nós não devemos subestimar a dor do paciente – ela está lá, e é resultado de uma
espaticidade quase crônica e permanente, em todo o sistema muscular voluntário,
incluindo, frequentemente, uma parte da musculatura involuntária (veja o trabalho seminal
de Gerda Boyesen sobre psicoperistalse). Essa espasticidade é a expressão física da
defesa que o paciente construiu em torno de si mesmo quando criança, e que serviu a
diversas funções importantes: 1. Conteve e dissipou, até certo ponto, a sobrecarga
energética resultante de alimentação excessiva e contato emocional deficiente;
2. Mais tarde, durante a fase edipiana, serviu para proteger seus genitais de uma possível
castração que ele fantasiava.
61

A explicação completa dessa dinâmica pode ser encontrada no capítulo sobre o terapeuta
masoquista; para entender o relacionamento desse par, basta dizer que o masoquista se
encontra aprisionado dentro de sua musculatura, que ele agora quer abandonar para
poder participar dos prazeres da vida, que ele vê em torno de si. O masoquista ainda se
apega ao princípio do prazer, mas não pode tolerar o crescimento energético até o ponto
da descarga do prazer. Portanto, ele nunca experencia realmente uma genuína descarga,
e vai sempre parar antes de atingir um clímax. Isto é particularmente verdadeiro em
relação à sua sexualidade – ele é raramente capaz de liberar a tensão através de uma
descarga sexual, apesar de ter uma excelente potencia eretiva, e, respectivamente,
lubrificadora. O homem pode ter problemas para ejacular, e a mulher, para atingir o
orgasmo. Algumas vezes, a ejaculação masculina não é acompanhada de contrações
pulsantes; em vez disso, é um fluxo contínuo de sêmen, muito semelhante ao ato de
urinar. Isto resulta numa falta de gratificação sexual que não é realmente percebida como
tal. Por isso, as reclamações que ele apresenta raramente incluem expressões de
distúrbios sexuais. Entretanto, trabalhar os problemas sexuais frequentemente se torna
uma das chaves do processo terapêutico.

Voltando à interação com o nosso terapeuta passivo-feminino, é muito difícil resistir à


exigência do masoquista de ser ajudado, já que a estrutura de caráter do nosso terapeuta
exige que ele “ajude” e “nutra”. Entretanto, se o terapeuta fizer isso, o paciente cairá em
seu pântano, provando, assim, que o terapeuta estava errado. Porque o que o paciente
realmente precisa é fazer as coisas por si mesmo, dar aquele passo em direção ao
mundo que lhe proibiram quando criança – sentir-se livre da mãe super-preocupada que o
“sufocou”. O terapeuta precisa fornecer as ferramentas, mas o paciente precisa usá-las
por si mesmo.

Precisamos lembrar agora, que as duas fraquezas básicas do terapeuta são a submissão
e a passividade, que se originaram do medo da figura masculina; ambas resultam em
extrema dificuldade de confrontação direta. Neste caso, nosso paciente continuamente
(embora de forma dissimulada) ameaça partir, rejeitando assim, o terapeuta, caso ele não
corresponda. Às vezes, ele também é agressivo, e o terapeuta pode sentir-se na
presença de um organismo que tem mais poder do que ele próprio.
62

Além disso, se o terapeuta realmente tentar ajudar o paciente, como vimos acima, isto
será subjetivamente percebido pelo paciente, como uma repetição do relacionamento
sufocante que ele tinha com sua mãe. É, portanto, necessário que o terapeuta mantenha
estritamente o princípio da realidade, permanecendo objetivo e real, e não aceitando os
desafios, ameaças ou comportamento sedutor do paciente, enquanto o confronta
continuamente e utiliza técnicas analíticas do caráter (Reich).

O terapeuta precisa estar consciente de que ele não pode, de modo algum, resolver o
conflito do paciente; isto depende inteiramente do paciente, e é ele quem tem que
resolver fazê-lo – se, e quando quiser. O terapeuta precisa, também, encarar seu próprio
medo do objeto primário, que é defendido pela raiva – e deve estar atento para não atacar
o seu paciente defensivamente (e em contratransferência). O papel do terapeuta, neste
caso, é simplesmente o de reforçar constantemente o princípio de realidade, apontando
as defesas de caráter do paciente, enquanto se mantém a uma distância suficiente (para
que o paciente possa se mover em direção a ele), sem perder o contato.

A bioenergética é uma ferramenta especialmente útil no trabalho com estes pacientes,


para os quais a frustração da expressão física de sentimentos negativos foi justamente o
que os inibiu tanto. Quando esta expressão é permitida dentro do contexto da terapia, o
paciente realmente diminui sua tensão interna usando métodos físicos, e percebe
simultaneamente, que é ele quem está fazendo tudo, que ele não será punido, e que sua
negatividade não é realmente destrutiva (e, portanto, ameaçadora) como ele imaginava.

É importante que o terapeuta permita que aconteça livremente essa percepção da


auto-responsabilidade sobre a ação – de outro modo, o paciente retornará para sua antiga
fantasia, isto é, a fantasia de que ele não pode fazer as coisas por si mesmo. Isto é
realmente difícil para o terapeuta passivo-feminino, que precisa de aprovação, e que não
poderá – mesmo quando bem sucedido – reivindicar os frutos do seu trabalho. O orgulho
é especialmente perigoso aqui, e a sua manifestação mais insignificante anulará o efeito
terapêutico obtido.
63

INTERAÇÃO COM A MULHER AGRESSIVA-MASCULINA

A mulher agressiva-masculina foi descrita recentemente pelo Dr. John Pierrakos, de forma
bastante extensiva, assim, limitarei minha descrição a um breve sumário. Eu sugiro ao
leitor que queira desenvolver melhor seu conceito sobre esta importante estrutura de
caráter, que se reporte à literatura apropriada.

A mulher agressiva-masculina tem uma aparência física bem específica. Seus quadris e a
metade inferior do seu corpo, inclusive as pernas, são pesados, de compleição
masoquista, e apresentam profunda espasticidade, coberta por camadas de gordura.
Essa parte do corpo é pesada, carece de mobilidade, e frequentemente de sensibilidade e
percepção. Esse peso se manifesta na dificuldade em pular, correr, ou em qualquer outra
forma de deixar o chão. A mobilidade física da pessoa fica prejudicada – mas a
mobilidade emocional, nem tanto. A metade superior é fraca no peito, e pode ser muito
delicada e bonita quando comparada à metade inferior. A discrepância entre a fragilidade
da metade superior e a grande força da metade inferior é extremamente chocante para o
observador treinado. A cabeça é, muito frequentemente, bonita e energizada. Os olhos
são brilhantes, a pessoa é inteligente, sutil, perspicaz, e muito capaz no plano intelectual.

Estas mulheres são muito, frequentemente, bem sucedidas em suas carreiras. Como elas
têm uma enorme energia que não foi capaz de encontrar a descarga normal através do
canal sexual, essa energia é sublimada e utilizada para competir no mundo dos homens.
Com relação ao seu desenvolvimento, a mulher com esta estrutura de caráter geralmente
teve um ótimo relacionamento com seu pai, até que o conflito edipiano aparecesse, ou às
vezes, até um pouco depois. De qualquer forma, a nutrição foi fornecida por um pai
amoroso e terno que, de repente, por alguma razão, desapareceu. Algumas vezes, esse
desaparecimento pode ter sido uma ausência física, tal como divórcio ou morte, outras
vezes, pode ser simplesmente um retraimento emocional. A mãe, muito provavelmente,
dominava o pai fraco, e foi experenciada pela criança como uma pessoa fria, forte, e que
a rejeitava frequentemente. Essa experiência subjetiva pode ser o resultado de uma falta
de contato emocional entre a mãe e a criança (daí a oralidade). O pai era a figura que
nutria, e não a mãe.
64

A espasticidade da pélvis e das pernas, mais a camada de gordura, foram utilizadas como
defesa pela garotinha, que desenvolveu sentimentos muito intensos pelo seu pai, que
foram interrompidos como conseqüência de seu repentino retraimento ou abandono.
Deixada com esses sentimentos, ela tentou resolvê-los diminuindo, tanto quanto possível,
a consciência de sua genitalidade. A estrutura espástica e a gordura serviram para tornar
tão difícil quanto possível a percepção de sua área pélvica. Este é o propósito do peso e
da tensão.

Na vida adulta, estas mulheres muito frequentemente se submetem passivamente à


sexualidade masculina, sem ter muito sentimento. Elas podem ser ótimas parceiras
sexuais, pois a resposta física ao homem pode ser muito intensa, apesar de essa
resposta ser, frequentemente, bloqueada do consciente. Ela pode ter uma lubrificação
intensa, sem estar sentindo muita coisa. Quando seus desejos sexuais não encontram a
descarga apropriada via orgasmo, ela sublima e utiliza a energia para competir no mundo
exterior. Isto ela faz com sucesso; ela é muito frequentemente uma mulher que se
destaca em sua profissão.

Como o leitor talvez já tenha imaginado, o terapeuta passivo-feminino se confronta aqui


com sua contrapartida exata. Uma constelação familiar semelhante o fez passivo,
enquanto eretivamente potente; e a fez agressiva, enquanto sexualmente inibida. É,
portanto, uma situação difícil para o nosso terapeuta. A contratransferência aparece
facilmente em qualquer estrutura que confronte sua contrapartida. A mulher sabe como
provocá-lo, e instintivamente sabe como vingar-se; ambos interagem num nível muito
básico, subliminar, este poderia ser o par típico na guerra dos sexos; a mulher ataca e
domina o homem intelectualmente; enquanto o homem usa e humilha sexualmente a
mulher. De qualquer forma, a transferência e a contratransferência podem ser muito
fortes; e traços sadomasoquistas e de sedução podem muito bem aparecer no
relacionamento terapêutico. A realidade pode se tornar difícil de perceber, já que a
distorção mútua, contida em ambas as estruturas, geralmente inclui um forte componente
psicopático.

Nessa situação, o terapeuta deve estar atento para qualquer provocação, seja ela sexual,
intelectual, emocional, ou uma combinação das três. O que pode parecer, a princípio, um
simples desafio intelectual, pode resultar num impasse competitivo. A mulher nessa
situação irá a extremos incríveis para sobrepujar sua contrapartida masculina, já que esse
é seu padrão básico de relacionamento.
65

Se o terapeuta cair em sua natural passividade, fortes desejos contratransferenciais de


vingança irão aparecer. Por isso, o terapeuta precisa manter a objetividade e a distância,
tanto quanto possível, enfocando a transferência negativa do paciente diretamente na
situação parental que a originou. O problema aqui não é estabelecer contato (que se fará
facilmente demais), mas sim manter objetividade suficiente. O terapeuta precisa ficar
atento a todos os desafios; ele precisa colocá-los no contexto da realidade. É importante
para ele, lembrar que a paciente precisa expressar um comportamento provocador e
desafiador, se quiser realmente alcançar qualquer material transferencial. Para que a
terapia progrida, é essencial que seja permitido à mulher desafiar o terapeuta e perceber
que a sua provocação não leva a qualquer tipo de relacionamento.

Isto pressupõe que o terapeuta possa permanecer objetivo e imune à provocação,


enquanto mantém contato com a paciente. O terapeuta deve estar muito consciente de
seus próprios desejos contratransferenciais (que podem se tornar sexualizados) de
vingança contra a mulher provocativa. Ele precisa se conscientizar dos tons sádicos de
seus desejos. E precisa estar atento a qualquer tentativa de apaziguar sua paciente, pois
este é um sinal seguro de contratransferência.
66

O HOMEM FÁLICO-NARCISISTA

Esta estrutura de caráter pós-genital aparece como defesa contra a dor da rejeição da
mãe, quando a criança manifestou sexualidade durante a fase edipiana. Mais uma vez, a
criança tinha um relacionamento satisfatório com ambos os pais, de modo que a fixação
dominante não ocorreu no nível pré-genital. Entretanto, quando a criança tentou
manifestar seu amor através de sua recém-descoberta sexualidade; em outras palavras,
quando o menino tentou expressar-se com a totalidade do seu ser, que inclui se corpo
e/ou sua latente virilidade, a mãe, com medo, o rejeitou. Essa rejeição, não
compreendida, foi experenciada como totalmente devastadora.

Mais tarde, na terapia, um dos gritos profundos que o homem fálico-narcisista emite é:
“Por quê?” Esta repentina rejeição induz à dissociação entre a sexualidade e os
sentimentos suaves de amor que a criança experimentava anteriormente; a sexualidade,
que até então não tinha aparecido, se torna a causa da rejeição da mãe. O menino vai,
portanto, tentar reprimir sua sexualidade, e muito provavelmente vai ser bem sucedido
durante os estágios infantis de desenvolvimento.

Entretanto, durante a adolescência, como a energia libidinal ficou bem fixada nos genitais,
a sexualidade se afirma fortemente. Essa sexualidade frequentemente pode ser
experenciada como indesejada, apesar de irrevogável. E assim, por causa da dissociação
entre amor e sexualidade, o indivíduo é forçado a reprimir sua capacidade de amar, em
vez de sua inevitável sexualidade. Por isso, é característico de toda estrutura de caráter
genital ter dificuldade em amar.

Particularmente, no caso do homem fálico-narcisista, a sexualidade é usada como uma


arma de vingança contra o objeto primário do amor, que inexplicavelmente o rejeitou. Ele
também usa sua sexualidade para competir com o pai, que possui o objeto do amor
perdido – a mãe – porque tem um pênis poderoso. Subjetivamente, o pai é
frequentemente experenciado como frio, poderoso e extremamente ameaçador e,
portanto, é usado como modelo de identificação.
67

Esta identificação promove maior dissociação do princípio feminino, que é percebido


como duro, dominante, conquistador, sem sentimentos, mas poderoso. Como um possível
derivativo neurótico, o fálico-narcisista pode estar frequentemente se defendendo contra a
homossexualidade latente, através de uma expressão exagerada de seu poder genital.

Fisicamente, o homem fálico-narcisista é muito bem integrado. Ele funciona suavemente;


é bem coordenado e bem proporcionado; é bem sucedido nos esportes e em quase todas
as atividades de que participa; geralmente é muito atraente. Ele coloca um desafio para a
mulher, pois expõe e exibe sua masculinidade. Ele é geralmente inteligente, perspicaz,
eficiente e bem sucedido social e financeiramente. Ele não tem problemas em encontrar
pessoas dispostas a receber a descarga de seu violento ódio pelas mulheres. Ele usa seu
pênis de forma sádica para, simbolicamente, perfurar a mulher e gratificar seu desejo de
vingança.

Entretanto, como as mulheres o assediam, ele também as experencia como agressivas e,


eventualmente, ameaçadoras. Ele então se retrai para o seu narcisismo, enquanto
continua a servi-las sexualmente, aumentando simultaneamente seu ódio por elas.
Porque este é o outro lado da agressão e da sexualidade exageradas que o homem
narcisista exibe. Vamos lembrar que sua tentativa de reconquistar o amor materno
perdido consistiu em desenvolver sua sexualidade, a ponto de poder competir com a
conquista bem sucedida de seu pai.

Em outras palavras, ele experenciou a sexualidade de seu pai como aceitável para a mãe,
enquanto a sua foi rejeitada. É claro que a única diferença era uma questão de potência;
portanto, o homem fálico-narcisista desenvolve um alto nível de potência para compensar
sua fantasiada deficiência da infância. Frequentemente, esses homens têm percepções
distorcidas quanto à adequação de sua genitália, apesar de serem eretivamente muito
potentes; eles frequentemente têm dúvidas quanto à sua habilidade de, realmente,
funcionar sexualmente. Ejaculação precoce ou incapacidade de ejacular são muito
comuns. Tudo isto pode estar escondendo profundas tendências homossexuais que, em
geral, são reprimidas com tanto sucesso que o paciente não manifesta nem mesmo um
nível normal de material homossexual inconsciente.
68

Nosso terapeuta passivo-feminino defronta-se, neste caso, com uma estrutura de caráter
que é mais altamente energizada do que a sua. Ele também se defronta com um homem
que aceitou uma posição agressiva no mundo, e que tem força, onde o terapeuta tem
fraqueza. A passividade e a identificação feminina do terapeuta não podem competir com
o homem viril e forte que ele está enfrentando. Isto pode acionar um medo profundo,
ligado às associações parentais não resolvidas do terapeuta, e pode bloquear a
expressão da transferência negativa do paciente, já que o terapeuta irá conspirar com o
paciente para evitar essa confrontação indispensável.

Em última instância, a disposição do paciente para representar, sua habilidade em fazer


isso, e seu desejo de agradar o terapeuta e ser bem sucedido na terapia, podem também
ser usados para conspirar, assim como para mascarar problemas mais profundos, que
são o conflito edipiano e a ansiedade de castração. Esses problemas coincidem com os
problemas do terapeuta, e é possível que terapeuta e paciente tenham a tendência de
evitar expor essas camadas ameaçadoras.

A manifestação dessa conspiração será simplesmente uma produção constante de


material aparentemente significativo, por parte do paciente; e por parte do terapeuta, a
interpretação e o trabalho sobre esse material, no nível apresentado pelo paciente. Como
já foi dito, paciente e terapeuta irão a extremos para evitar a ansiedade de castração, o
ódio pela mulher e o conflito edipiano não resolvido, que são problemas que eles
– caracteriologicamente – têm em comum. É importante, portanto, que o terapeuta fique
atento e consciente de que o paciente pode produzir todos os tipos de pistas falsas, com
o propósito de esconder seus verdadeiros conflitos.

A descarga de ódio pela mulher é uma das chaves para a terapia bem sucedida com essa
estrutura de caráter. Inicialmente, o ódio será, provavelmente, experenciado como
ego-sintônico, e muito terá que ser feito pelo paciente para desenterrá-lo; toda a sua vida
manifesta uma contínua troca (sexual e de outros tipos) com as mulheres. Por isso, a
reclamação apresentada raramente incluirá uma expressão desse ódio e, em vez disso,
apresentará relacionamentos superficialmente bons, que podem ser até um casamento
bem sucedido que dura há muitos anos.
69

A impressão do paciente de que ele estabeleceu um relacionamento bem sucedido com


uma mulher, pode ser reforçada pela contínua potência eretiva; e será somente através
da expressão do seu ódio e da conscientização, de que isto foi um “padrão” em sua vida,
que o paciente começará a enxergar a verdadeira perspectiva de seu relacionamento com
o sexo oposto. Para o terapeuta passivo-feminino, a expressão desse ódio pelas
mulheres está mais uma vez tocando em seus próprios problemas primários; e, sendo
assim, este pode ser mais um problema de contratransferência.

O paciente pode parecer muito desdenhoso, e com tendência a fazer julgamentos. Isto
irá, ao mesmo tempo, provocar e ameaçar o terapeuta passivo-feminino, levando-o ao
retraimento e à passividade. Nessa situação, ele vai deixar de confrontar, ou irá fazê-lo
apenas parcialmente, ambiguamente, hesitantemente – o que, se for percebido pelo
paciente, só irá aumentar seu desdém. Eventualmente, o paciente se sentirá superior ao
terapeuta, e obviamente partirá.

Assim, o terapeuta não pode hesitar – neste caso mais do que em qualquer outro – em
confrontar diretamente o paciente. Ele não pode ter medo – seu paciente é tão poderoso
que, sob condições apropriadas, pode suportar praticamente qualquer coisa. A dificuldade
é alcançar o paciente – porque uma grande parte da energia do paciente é usada para
manter as pessoas à distância.
70

INTERAÇÃO COM A MULHER HISTÉRICA

Mulheres histéricas foram as primeiras pacientes tratadas por Freud, e existe muita
literatura com descrições sobre elas. Entretanto, como este trabalho é apresentado de um
ponto de vista bioenergético, eu acho que é pertinente descrever muito rapidamente
alguns traços marcantes dessa personalidade.

A mulher histérica é fisicamente muito atraente, bonita e sedutora. Seus movimentos são
fluíidos e geralmente muito harmoniosos; o corpo é bem proporcionado e permanece
relativamente em boa forma, mesmo após a gravidez, ou com o passar dos anos. O corpo
é harmonioso e existe uma qualidade sedutora e sexualmente atraente nessa mulher. Ela
é bonita, e manterá sua beleza mesmo em idade avançada.

Mais uma vez, como em estruturas de caráter anteriores, a frustração só veio depois que
ela começou a expressar sua sexualidade, desta vez com relação ao pai. Anteriormente,
o desenvolvimento psicossexual foi tal, que encontrou muito pouco conflito com o exterior,
e assim foi harmonioso. Apesar de que algumas fixações possam ter ocorrido em estágios
anteriores, foi somente quando a criança tentou expressar-se com a totalidade do seu ser
– incluindo, obviamente, a sexualidade - que ela foi rejeitada.

Possivelmente, essa rejeição jamais foi entendida e, de qualquer forma, nunca foi aceita
pela paciente. Permitiram-lhe expressar sua rebelião livremente, mas ela ficou frustrada
quando percebeu que não era compreendida. Sua defesa contra a rejeição do pai foi
desenvolver ainda mais a sua sexualidade; ela viu a figura bem sucedida da mãe obtendo
o amor do pai, e identificou a diferença básica entre ela e mãe como uma diferença
sexual.

Depois da fase edipiana, todo componente sedutor desta estrutura de caráter se tornou
inconsciente, e assim a mulher histérica, apesar de ser permanentemente sedutora,
nunca está consciente do que está fazendo. Portanto, quando os homens respondem à
sua sexualidade, ela os rejeita imediatamente – não entendendo porque foi abordada – e
censura os homens por seus desejos sexuais exagerados.
71

Todo este mecanismo serve para protegê-la de seus próprios sentimentos sexuais
incestuosos por seu pai, que ela nunca reconheceu, e que constituem a base de seu
problema. Como no caso do homem fálico-narcisista, que é sua contrapartida masculina,
ela será inteligente, bem sucedida, bonita, e não hesitará em manipular quem quer que
seja, ou o que quer que seja necessário para alcançar seus objetivos.

Ela vai continuamente conter seus sentimentos, sem expressá-los, e vai usar a
sexualidade e outros instrumentos para alcançar seus objetivos. Entretanto, onde o
homem fálico-narcisista – quando confrontado com a escolha entre amor e sexualidade –
escolheu a segunda, a mulher histérica escolhe o primeiro. Então ela acredita que ama
todo mundo, homens e mulheres, da mesma forma – e fica surpresa quando os homens
respondem à sua sexualidade e as mulheres a repudiam como “namoradeira”, “vaquinha”
ou “prostituta”. Sua guerra contra as mulheres foi aceita há muito tempo – e
eficientemente resolvida. É a resposta sexual do homem à sua sedução inconsciente que
ela não aceita, porque ela sente que apenas os “ama” de uma forma “bonita”, sem
sexualidade. Ela se torna a “bela adormecida” esperando eternamente pelo “príncipe
encantado” – o seu paizinho, é claro.

Negando sua sedução, ela percebe os homens como sexualmente exigentes,


acusando-os de fazer com ela exatamente o que ela faz com eles – isto é, usá-los.
Ironicamente, ela se torna uma pessoa sem coração – pois comprometeu seu coração
com a imagem irreal do pai. A sua reação aos contínuos avanços dos homens é tornar-se
sexualmente fria, paralisada, insensível. E isto significa bloquear a sexualidade – o
veículo normal de descarga energética. Como conseqüência, apesar do corpo ser bem
integrado e bastante flexível, ela somatiza com sucesso o seu conflito – daí as
observações de Freud, e a dificuldade do tratamento. Isto é somente a expressão do seu
trauma emocional. A garota teria gostado de reprimir totalmente a sexualidade, que foi
experenciada como o fator que interferiu entre ela e seu amado pai.

Do nosso ponto de vista, ela apresenta um grande desafio ao terapeuta passivo-feminino,


já que usará sua sexualidade para tentar seduzi-lo e evitar que ele toque nos problemas
cruciais. Quando confrontada com essas manobras, ela aceita o fato e, provavelmente,
tenta outra vez; eventualmente, ela produzirá quantidades ilimitadas de tentativas
inconscientes de desviar do assunto, a fim de encobrir a ansiedade edipiana essencial.
72

Ela também expressará desprezo pelo terapeuta que – se for capaz de tolerar isto sem
rejeitá-la, se confrontará, então, com o ódio real da paciente pelos homens e,
eventualmente, com o seu desejo inconsciente de castrá-los. Esse ódio pelos homens é a
chave para o problema da paciente. E já que esta é também a chave para o problema do
terapeuta, uma conspiração pode muito bem acontecer.

Se isto ocorrer, a transferência negativa nunca será expressa, e a paciente permanecerá


no nível da sedução, produzindo continuamente material para análise. Isto pode incluir
sonhos, problemas da vida diária, etc., mas o propósito de grande parte desse material
será manter a terapia longe dos problemas reais da neurose.

Entretanto, o ódio / raiva da mulher contra o homem pode também ameaçar o terapeuta.
Não vamos esquecer que sua própria mãe foi subjetivamente percebida como fria,
distante, e, ainda, dominadora, sedutora e bem sucedida no controle de seu pai. O
terapeuta passivo-feminino levou sua infância lutando contra a mulher agressiva – e
perdeu. Assim, a agressão da histérica pode assustá-lo; e a sua reação poderá ser não
confrontar a paciente. A conspiração é realmente o maior problema que o terapeuta
enfrenta, porque sua paciente histérica ficará muito feliz, como dissemos anteriormente,
em apresentar material ilimitado, cujo objetivo é, simplesmente, fugir do problema central.

Estranhamente, os histéricos usam a negação e a projeção continuamente. Aqui, o


problema contratransferencial essencial para o terapeuta é a sedução contínua e
incansável da paciente, que pode persistir até mesmo depois que ela tenha sido
diretamente confrontada – porque o componente sedutor é inconsciente.
73

ETIOLOGIA DA MULHER AGRESSIVA-MASCULINA

Como em todas as estruturas rígidas, o trauma básico da mulher agressiva-masculina foi


o retraimento abrupto, ou a rejeição, ou o abandono pelo sexo oposto; neste caso, o pai.
A garotinha trocou muitos sentimentos com seu pai, sexualizou alguns deles, e foi
repentinamente rejeitada. Até este ponto, o seu background é o mesmo da mulher
histérica, anteriormente descrita. Entretanto, no caso da mulher histérica, a agressão e o
ódio resultantes foram reprimidos por uma mãe disciplinadora, e pelo ambiente social;
enquanto que, no caso da mulher agressiva-masculina, a mãe era fraca, de modo que a
repressão da hostilidade (agressão, ódio, raiva, zanga) foi muito menor, e uma expressão
direta muito maior foi permitida.

A sexualidade foi reprimida, mas a agressão foi permitida, até certo ponto. A repressão
total dos sentimentos foi menor para a mulher agressiva-masculina, do que para a
histérica. A criança pode até ter pensado que realizou a fantasia edipiana – de qualquer
modo, ela realmente se tornou “a mulherzinha da casa”. Ela era mais forte do que sua
mãe, mais agressiva, mais poderosa e (como provavelmente a fraqueza da mãe resultou
num relacionamento deficiente com seu homem) tornou-se a “favorita”. Eventualmente, é
claro, a repressão da agressão realmente aconteceu, mas, enquanto isso, a sexualidade
já tinha se fixado muito fortemente no corpo, através de quadris pesados, apresentando
uma aparência quase “masoquista”.

Esta conformação masoquista é uma tentativa do organismo de diminuir os impulsos e


sentimentos sexuais originados da vagina sobrecarregada, isolando a área
“sobrecarregada” com camadas de gordura; outro meio, igualmente efetivo, usado pelo
corpo, é criar espasmos musculares graves em torno dessa área, prendendo a energia
excessiva ao músculo permanentemente espástico – isto leva a uma sensibilidade e
percepção decrescentes, evitando que a consciência tenha que lidar com impulsos não
desejados. O excessivo desenvolvimento pélvico da mulher agressiva-masculina é um
típico exemplo desse fenômeno. Espasmos musculares profundos são típicos da pélvis e
da área glútea da mulher agressiva-masculina.
74

O espasmo é encoberto por uma camada de gordura e de músculo flácido, dando a


impressão visual de maciez – que na realidade encobre uma dureza profundamente
escondida. E isto tem uma expressão direta no comportamento do indivíduo – a mulher
agressiva-masculina é suave, sedutora e promissora na superfície; mas dura, competitiva,
exigente e poderosa no nível mais profundo. Como já foi dito, o peso em volta da pélvis é
uma defesa contra sentimentos sexuais, desenvolvida durante sua interação com seu pai.
A mãe é manifestada no peito e/ou nas pernas da paciente, onde certo grau de oralidade
está sempre presente. A mãe foi percebida pela criança como ineficaz, fraca, talvez
ausente. E aqui devemos lembrar que é pouco importante se isto foi verdade ou não – foi
verdade para a paciente na sua percepção subjetiva da realidade, durante os seus
estágios de desenvolvimento e, portanto, é verdade para o indivíduo que está em
tratamento conosco.

A estrutura é, portanto, dividida – uma pélvis masoquista e/ou um peito oral. As pernas
serão masoquistas (pesadas) ou orais (muito finas), dependendo do grau de dominância
de cada um dos pais. Quanto maior o componente oral, maior será o grau de psicopatia
que está sempre presente neste tipo. Mais tarde, a retenção da pélvis se manifestará pela
incapacidade de liberação orgástica: ao mesmo tempo, a carga de energia na vagina será
tão excessiva que frequentemente agirá no pênis do homem, levando à ejaculação
prematura e/ou perda de ereção. Isto não quer dizer os “problemas” da mulher sejam
responsáveis pelos do homem – mas sim que a energia excessiva da mulher pode
assustar um homem que já seja inseguro de sua própria sexualidade. Um homem forte,
bem definido, seguro de sua sexualidade, não teria esse problema; porque é verdade,
acredito eu, que cada indivíduo é totalmente responsável por sua própria sexualidade.

A cabeça da mulher agressiva-masculina é sempre altamente carregada; elas são


mulheres intelectualmente ativas e criativas. Elas têm, algumas vezes, consideráveis
distorções, percepções falsas baseadas no trauma arcaico, e generalizações (tais como:
“o meu pai me rejeitou, portanto, todos os homens sempre me rejeitarão”), que
frequentemente levam a atitudes paranóides. Elas são chamadas de “cabeçudas”, e com
razão. Elas são obstinadas (o que está certamente, ligado ao seu componente psicopata)
e muito bem sucedidas; elas sabem competir no mundo masculino, têm um rosto bonito e
forte, olhos brilhantes e feições bem proporcionadas e atraentes. Há certo brilho em torno
delas. Elas têm uma beleza “masculina”. Elas sublimaram uma parte da sua energia
sexual, e a usaram para realizações sociais.
75

Num relacionamento sexual, a psicopatia dessas mulheres fica exacerbada – ela se


considera vítima de seu parceiro, enquanto, na realidade, ele é vítima dela. Ela se vê
como sendo “compelida” pelo homem, e o culpa pelos seus problemas. “Ele” não é
sexualmente adequado, “ele” não tem consideração, amor, carinho, etc. Para a mulher
agressiva-masculina, é muito difícil reconhecer o princípio da auto-responsabilidade.
Porque isto significaria, num nível mais profundo, a plena aceitação de seus desejos
sexuais, com relação ao seu pai, e do ódio dirigido à sua mãe. Estes dois sentimentos
estão profundamente reprimidos no nível emocional, e contidos na estrutura física
anteriormente descrita.

O trabalho físico com a mulher agressiva-masculina é recompensador, pois com a sua


alta energia, elas podem alcançar sentimentos profundos muito rapidamente. Muitos
sentimentos estão profundamente trancados nos sistemas de retenção em torno da
pélvis, na rigidez do peito e nas áreas de retenção voluntária, na parte detrás do pescoço
(esterno cleidomastóide e occipício – todo o “segmento ocular”, como definido por Reich).

Realmente, muito trabalho físico tem que ser feito; a função de “base”, como descrita por
Lowen, é geralmente uma área problemática. O bloco pélvico maciço, e as conseqüentes
deficiências nas pernas (seja fraqueza oral, ou retenção masoquista) são os agentes
causais disso, tornando difícil para essas mulheres perceber o chão sob seus pés.

A teoria bioenergética clássica declara que quando a pessoa não tem “base” há uma
dificuldade concomitante em testar a realidade. A mulher agressiva-masculina tenta
compensar essa deficiência com uma atitude agressiva, em relação ao mundo, que é
expressa diretamente através de seu ego. Ela reforça seu ego, a ponto de torná-lo sua
principal ferramenta no contato com a realidade, de modo que, quando esse contato é
ameaçado, toda a estrutura defensiva entra em funcionamento. Daí o desenvolvimento de
tendências paranóides, as atitudes extremamente voluntariosas, a necessidade de criar
sua própria realidade, a grande dificuldade em ser receptiva e em desenvolver um
princípio de receptividade, enquanto o princípio de agressividade é super desenvolvido. A
necessidade de impor sua vontade, a receptividade deficiente, a necessidade de
resultados (que é comum a todas as estruturas rígidas) e as fortes tendências paranóides
são alguns dos problemas contratransferenciais que uma terapeuta com este tipo de
estrutura vai encontrar.
76

Como veremos nas interações, estes temas aparecem repetidamente. Existe, além disso,
outro tipo de problema contratransferencial que merece atenção especial, e cuja origem é
o componente oral. A nossa terapeuta precisa ser “alimentada”, “nutrida”. Essa oralidade
é expressa fisicamente no peito, e psicologicamente pela necessidade de gratificação
narcisista do ego – a necessidade de ser “nutrida”.

A combinação da necessidade narcisista com um ego forte, extrovertido, voluntarioso,


torna-se perigosa quando uma terapeuta com esta estrutura defronta-se com um paciente
que reforce a terapeuta, dando-lhe autoridade, iniciando uma relação de transferência, e,
portanto, enfraquecendo-se a si mesmo. Porque a terapeuta tenderá a fazer com que o
paciente a nutra, seja através de sedução, seja através de manipulação.

A mulher agressiva-masculina é particularmente adepta da manipulação verbal


(sofismas). Porque a combinação de sua psicopatia, mais a atitude agressiva e
extrovertida, mais a necessidade de estar certa e de “representar”, juntamente com sua
necessidade de “nutrição” (através da satisfação do ego), fazem com que suas
necessidades sejam muito importantes, e fazem com que os esforços para satisfazer
essas necessidades sejam tremendos.

Ela é inteligente, brilhante, agressiva, saliente. Sua receptividade pode ser deficiente, e
ela pode ter dificuldade em perceber claramente a realidade da outra pessoa, devido ao
seu princípio de receptividade deficiente. Na tentativa de conseguir clareza, ela pode
distorcer as informações de seus pacientes, sem estar consciente disso. Sua atitude
vigorosa pode, algumas vezes, levar o paciente a aceitar sua autoridade, apesar de não
acreditar realmente no que ela diz, pois é mais fácil aceitar, do que confrontar essa figura
autoritária tão forte.

A mulher agressiva-masculina precisa controlar, e se ela sente que seu paciente, de


alguma forma, desafia essa necessidade, ela usará os recursos disponíveis para
neutralizá-lo e retomar o controle, que ela acredita ser indispensável. Ela pode tender,
especialmente, a transformar uma tática terapêutica diretiva saudável, em controle
absoluto, que pode levar à submissão.
77

O leitor pode inferir, pelo que foi dito acima, que a mulher agressiva-masculina é uma
criatura monstruosa que deveria ser evitada a todo custo. A realidade é exatamente o
oposto. Porque quando a mulher agressiva-masculina resolve, através de sua própria
terapia, alguns dos problemas que são típicos da sua estrutura, ela pode ser brilhante,
energética, clara e amorosa. Ela tem sentimentos e energia em abundancia; tem um
coração caloroso, profunda compreensão, coragem e facilidade de expressão.

A correção de suas distorções e concepções falsas iniciais leva à clareza e à acuidade


perceptiva. O equilíbrio de seus princípios ativos e receptivos leva à honestidade,
solicitude e confiabilidade. A liberação de sua sexualidade bloqueada leva à real
apreciação da importância do prazer, e dos meios de alcançá-lo. O relaxamento da
necessidade de controle e da paranóia, levam a uma profunda confiança no processo de
seu paciente. Como sempre, a resolução da estrutura e das defesas de caráter leva ao
florescimento do coração e da mente.

Lembramos ao leitor, que a ênfase deste trabalho é a descrição das defesas expressas
caracteriologicamente – não é uma descrição do ser maravilhoso que reside dentro
dessas defesas, no coração do homem (ou da mulher), no âmago da humanidade.
78

A TERAPEUTA AGRESSIVA-MASCULINA E A ESTRUTURA ESQUIZÓIDE

Neste caso, a tremenda diferença de níveis energéticos deve ser analisada


cuidadosamente pela terapeuta, seja ao fazer qualquer avaliação, seja durante qualquer
tipo de auto-exame. Porque, ao mesmo tempo em que sua energia é essencialmente
extrovertida, assertiva e tende a colidir diretamente com o paciente, a energia do
esquizóide é contraída, contida no centro, e congelada.

Nós sabemos que a defesa do esquizóide é apresentar uma máscara, que mesmo
podendo ser frágil e rígida, dura e inflexível, é usada contra a hostilidade e o medo. A
terapeuta agressiva-masculina sensível será capaz de ver através da máscara e de
alcançar a agressão que está sob as defesas. Ela deve ser cuidadosa, para não colidir
com essas defesas muito violentamente. Ela precisa entender que o esquizóide tem
necessidade de um alter-ego pelo qual modelar-se, e que esse alter-ego precisa manter
uma distância respeitosa e não ser muito exigente, não ter expectativas elevadas, nem
esperar que o paciente abandone suas defesas rapidamente.

A terapeuta precisa se dar conta de que suas necessidades orais narcisistas não serão
preenchidas pelo seu paciente, que o paciente precisa aprender sobre forças de contato
primitivas, onde não existe gratificação do ego; que ela precisa permitir que o paciente
faça contato da forma que preferir; e que, apesar de ser um símbolo sólido e concreto da
realidade, ela precisa abdicar de uma grande parte do controle.

Ela precisa perceber que o esquizóide tem uma profunda compreensão dos assuntos
essenciais, e que essa compreensão é, geralmente, mais clara do que a sua. Precisa
aceitar – e certamente esclarecer – a percepção frequentemente real, mas
grosseiramente distorcida, do esquizóide; e desafiar suas próprias idéias sob a luz das
informações recebidas de seu paciente. O esquizóide precisa de um terapeuta muito
receptivo que possa decodificar a realidade distorcida que é, surpreendentemente, muito
acurada e, ao mesmo tempo, muito distorcida.
79

A terapeuta precisa lembrar que o esquizóide tem uma percepção profunda dos
verdadeiros assuntos em jogo, mas não consegue organizá-los ou apresentá-los de forma
organizada, uma vez que a expressão da percepção se torna distorcida, ao passar
através do ego defeituoso. Cabe à terapeuta esclarecer essas distorções, ser receptiva à
informação fornecida pelo paciente esquizóide, e ser capaz de interpretar de forma lógica,
realista e ordenada, a mensagem que está recebendo do esquizóide.

Essencialmente, ela deve ser real no nível mais profundo da forma mais profunda. Aqui, o
seu brilho intelectual é muito útil, mas ela deve ser cuidadosa para não obstruir o seu
princípio receptivo e se impor, porque o esquizóide geralmente vai preferir aceitar, a
desafiar a autoridade poderosa que está enfrentando. Isto o levaria a reprimir ainda mais
a sua raiva e sentimentos negativos e, mais tarde, a se retrair ainda mais em suas
defesas, ou mecanismos de proteção. As tendências paranóides frequentemente
encontradas na estrutura esquizóide podem também coincidir com as tendências do
terapeuta. E isto pode levar à conspiração.

Talvez as coisas mais importantes que a mulher agressiva-masculina deva ter em mente
sejam: que o processo do esquizóide é lento e gradual; que ele interpreta a confrontação
excessiva como uma violação, e se defende dela com o retraimento; e que o ponto crucial
é sempre o contato, tanto interpessoal quanto o que chamaremos de intrapessoal, contato
com o self, com seus sentimentos, com seu corpo e, portanto, com a realidade.
80

A MULHER AGRESSIVA-MASCULINA E A ESTRUTURA ORAL

Novamente neste caso o nível energético da terapeuta é considerável superior ao de seu


paciente. Entretanto, ela não deve se preocupar com um ego defeituoso, ou com uma
barreira de ego defeituoso que pode ser derrubada, como no caso do esquizóide. O
problema básico aqui é a terapeuta agressiva-masculina conseguir reter sua energia,
contê-la e, de forma prudente, permitir que o paciente oral saia de dentro de si, expresse
sua agressão e suas necessidades, e aprenda a expressar seus sentimentos; e este é o
problema básico da oralidade – a inabilidade de sair de dentro de si e expressar
diretamente os sentimentos que estão contidos ali.

Essa retenção de sentimentos leva à raiva, que então aciona as defesas da mulher
agressiva-masculina em dois níveis: o componente paranóide será ativado pela raiva; e a
sua energia extrovertida, agressiva, será ativada pela retenção. Se a mulher agressiva-
masculina aceitar esses dois desafios, o paciente estará com o controle total da terapia, e
a contratransferência pode ser tão forte que a terapeuta pode se surpreender
sistematicamente zangada com seu paciente.

A princípio, essa zanga pode ser difusa, injustificada, obscura – mas em breve a mulher
masculina-agressiva, usando suas habilidades intelectuais, será capaz de encontrar um
bom motivo para justificar sua raiva e frustração. Certamente, esta é uma grande
armadilha, pois esse motivo geralmente não corresponde ao problema real, que é
simples: ela está muito zangada com a retenção do paciente, com as exigências
continuamente não expressas, com a passividade e a falta de resposta que a terapeuta
percebe como “não dar”, enquanto ela está “dando tudo”. Isto, é claro, faz reviver o
trauma oral da terapeuta, e lhe dá um motivo perfeito para culpar o paciente e não
assumir nenhuma responsabilidade pela interação da culpa.

Se, além disso, o paciente é do sexo masculino, a dinâmica básica da terapeuta


agressiva-masculina é estimulada em quase todos os níveis, porque enquanto ela pode
ser agressiva impunemente no nível do ego, ela espera – inconscientemente, é claro –
que o homem se vingue no nível sexual.
81

Mais uma vez, no contexto terapêutico, o acting-out da sexualidade é geralmente evitado,


ela está numa situação onipotente, na qual não tem que temer nenhuma exigência sexual
real de seus pacientes passivos. Ela pode ser sedutora, sem ter que pagar o devido preço
– e isto pode convir perfeitamente à constituição psicológica de seus pacientes, pois a
pessoa oral tende a usar a sexualidade como um meio de obter proximidade. A
conspiração é ideal.

Do ponto de vista do paciente, a habilidade de manipular, o desprezo, a dureza e a


agressão da terapeuta – através dos quais o paciente pode geralmente enxergar – irão
ativar as defesas do paciente, que são baseadas na crença de que, se ele se adiantar, se
expuser, se fizer vulnerável, ele será ferido (ou porque não haverá ninguém lá, ou porque
a qualidade do contato será insatisfatória).

Devemos lembrar que a oralidade é gerada quando o bebê não consegue um contato
satisfatório com sua mãe, pois, apesar de estar sempre procurando, ele não a encontra.
Mais tarde, isto é expresso como uma descrença na possibilidade de procurar satisfação
e obtê-la, pois a total frustração que a criança sentiu quando procurou sua mãe e não a
encontrou está gravada, e aciona reações automáticas.

No caso da terapeuta agressiva-masculina, o paciente oral se confronta com uma pessoa


que está continuamente ansiosa para “fazer as coisas por ele”. Se este for o caso, as
defesas neuróticas do paciente tornam-se adaptativas, já que ele está sendo nutrido do
exterior, que é exatamente o que ele quer obter com suas defesas. É claro que nenhuma
resolução de defesas será conseguida nesse contexto; pelo contrário, elas serão
exacerbadas.

Do ponto de vista da terapeuta, é muito difícil inverter completamente sua posição


normalmente agressiva e tornar-se paciente, receptiva, aberta, de modo que, quando quer
que o paciente se adiante um pouquinho, ele não encontre expectativas, exigências e
poder, mas amor e calor – e isto, apesar de quase contínua raiva, retenção e passividade
do paciente.
82

A TERAPEUTA AGRESSIVA-MASCULINA E O PACIENTE MASOQUISTA

Aqui, a terapeuta precisa ter em mente que a aproximação terapêutica básica com o
masoquista é fazê-lo entender qual é o seu problema, qual é sua possível resolução, e
então permanecer afastada e deixar o masoquista agir. Porque, no caso de uma estrutura
masoquista, qualquer tentativa da terapeuta de se intrometer e “fazer” ativará
imediatamente a barreira defensiva que, na realidade, diz: “Eu posso agüentar, eu não
tenho que me render, eu posso encarar qualquer coisa que você me apresente”.

Se o paciente perceber a terapeuta como dogmática, diretiva, dizendo-lhe o que deve


fazer, e assim por diante, ele se retirará para sua concha masoquista, onde fica
praticamente inexpugnável. A terapeuta deve lembrar que ela tem que ser paciente,
conter seu desejo de resultados imediatos; acima de tudo, ela deve ser direta e real com o
paciente, e renunciar o controle. Ela também deve lembrar que toda vez que o paciente
masoquista se abrir, surgirão quantidades enormes de sentimentos, que exigirão toda a
habilidade da terapeuta para se tornarem organizados e integrados.

O desprezo da terapeuta pode se tornar um motivo contratransferencial, porque se ajusta


exatamente à necessidade masoquista de ser provocado, a fim de poder descarregar
energia. O desprezo é uma defesa contra as necessidades não-expressas do próprio
terapeuta, e é percebido pelo paciente como uma leve provocação, que é, provavelmente,
suficiente para fazê-lo retrair-se em suas defesas, mas que não é forte o suficiente para
fazê-lo sair e descarregar sua negatividade. O resultado desse desprezo pode ser a
desfusão da habilidade do paciente de expressar transferência negativa, revivendo,
assim, o trauma da infância. Devemos lembrar que a etiologia do masoquista se origina
essencialmente quando uma mãe super preocupada cuida fisicamente de sua criança,
mas não presta a menor atenção às necessidades emocionais e espirituais da criança.
Uma mulher super preocupada, dominadora, e que não é receptiva, seria a réplica quase
perfeita da mãe do paciente. Outra armadilha nesta dupla, é a necessidade de controle da
terapeuta, o que mais uma vez leva diretamente ao problema original do paciente, já que
ele foi totalmente controlado através de um excessivo treinamento das funções de
excreção, ao qual mais tarde vieram se juntar outras imposições similares do mundo
exterior. Isto o levou a ter medo e desconfiança da liberdade, e a uma inabilidade de
expressar muitos sentimentos fortes e variados, que estão contidos, inexoravelmente, em
sua estrutura maciça.
83

INTERAÇÃO ENTRE A TERAPEUTA AGRESSIVA-MASCULINA E O PSICOPATA

Neste caso, a psicopatia de ambos – paciente e terapeuta – interage e pode ser


considerada como o maior problema contratransferencial. O controle será um assunto
importante, e já que os dois são iguais, cada um tentará sobrepujar a manipulação do
outro. Será, provavelmente, muito difícil para a terapeuta manter a objetividade neste
caso, pois a habilidade do paciente de perceber suas fraquezas e suas defesas
caracteriologicas é muito grande, e a primeira tentativa do psicopata em se defender
colidirá diretamente com as defesas caracteriológicas de sua terapeuta.

O paciente também é brilhante intelectualmente, tem suas próprias necessidades orais, é


igualmente voluntarioso e capaz de manipulação e tem horror de perder o controle, que
se iguala ao da terapeuta. Pacientes psicopatas são notoriamente deficientes em
receptividade; são difíceis de ser atingidos, porque nunca ouvem. Se isto combinar com a
carência da terapeuta, teremos realmente uma conversa de surdos, cada um ouvindo a si
mesmo, e nenhum dos dois sendo receptivo ao outro.

A constante rejeição e manipulação do paciente psicopata acionará as defesas da


terapeuta de tal forma, que (devo dizer francamente) duvido que uma terapia bem
sucedida possa ocorrer, a menos que a terapeuta tenha resolvido a maior parte de seus
próprios problemas. Porque o psicopata necessita fundamentalmente de uma atitude
paciente, mas insistente, através da qual o paciente seja continuamente desafiado pelo
lado negativo; quer dizer, seu racional, suas percepções, suas idéias, devem ser
constantemente desafiadas e colocadas em dúvida; o paciente deve ser constantemente
colocado em defesa pela terapeuta. Este é o processo terapêutico normal com os
pacientes psicopatas, e deve ser mantido, pois de outro modo, o paciente não será
atingido.

Uma possível resolução para este problema é que a terapeuta evite tanto quanto possível,
qualquer tipo de interação verbal, e trabalhe fisicamente com seu paciente, porque esta é
a área onde o maior conhecimento da terapeuta irá ajudá-la incomensuravelmente. Os
psicopatas precisam ser fixados na realidade, eles precisam ter seu senso de realidade
reforçado.
84

O seu deficiente princípio de realidade (que é certamente um produto de seu superego


deficiente e de sua carência de receptividade) precisa ser testado repetidamente. O
campo físico é onde as defesas do psicopata são menos eficientes; assim, se a terapeuta
puder introduzir trabalho físico sistematicamente, ela terá uma chance maior de conseguir
atingir o paciente. A terapeuta deve lembrar que o paciente não pode ser convencido de
nada. Ele precisa experenciar uma coisa repetidamente, até que a experiência se fixe.

A princípio, a habilidade de absorver, de ser receptivo é tão bloqueada que os pacientes


psicopatas podem levar muito tempo até desenvolver qualquer tipo de transferência.
Somente através do constante desenvolvimento da confiança, é que o psicopata poderá,
gradualmente, começar a se abrir e se entregar ao seu terapeuta. E já que neste caso a
terapeuta tem a sua própria desconfiança e paranóia, ela nunca deve esquecer que
estabelecer confiança é um passo muito difícil para seu paciente. O trabalho físico deve
se concentrar essencialmente nas funções de “base”, o que significa trabalhar com as
pernas, com o bloco pélvico ou com o diafragma, ou mesmo com os três juntos,
dependendo de cada caso individual.

Se o terapeuta resolveu, pelo menos parcialmente, sua própria psicopatia, o paciente


psicopata pode ser um desafio muito grande e estimulante, que se transformará, para a
terapeuta, numa grande oportunidade de aprender. Porque o paciente a desafiará a cada
passo, e ele deve reagir desafiando-o também, mas sem atacá-lo.
85

INTERAÇÃO ENTRE A TERAPEUTA AGRESSIVA-MASCULINA


E OUTRAS ESTRUTURAS RÍGIDAS

A terapeuta agressiva-masculina precisa lembrar que a agressão foi severamente inibida


nas estruturas rígidas; ela também não deve esquecer nunca que a sedução é um
mecanismo de defesa inerente das estruturas rígidas, assim como para ela mesma; por
isso, especialmente quando estiver lidando com pacientes do sexo oposto, a sedução
será o maior problema.

Se a necessidade da terapeuta controlar não for constantemente vigiada, o resultado


principal será a inibição da necessidade do rígido de expressar a agressividade e o ódio
reprimidos. A etiologia do rígido envolve dois traumas básicos: 1. Inibição da sexualidade;
e 2. Bloqueio da zanga que nasceu da inibição sexual.

A personalidade rígida é essencialmente um “bom menino” ou uma “boa menina” – a


mulher agressiva-masculina, vigorosa, extrovertida, afirmativa, dominadora, pode ser
muito assustadora para o paciente, no início. Ela precisa estar muito consciente destas
características, percebidas como perigosas pela personalidade cuja agressividade está
muito inibida.

A paranóia da mulher agressiva-masculina pode também aparecer como fator, e ela pode
querer inibir a expressão de agressão a fim de proteger-se. A combinação de sua
necessidade de controle, com sua atitude extrovertida e tendências paranóides, pode
resultar, como especificado anteriormente, numa forte inibição da transferência negativa,
que certamente é um requisito básico na terapia das estruturas rígidas.

Entretanto, a combinação é muito boa. Terapeuta e paciente são iguais energeticamente;


têm as mesmas distorções intelectuais, advindas frequentemente do conflito edipiano – e
isto pode levar à conspiração em assuntos específicos. Eles são confrades – e, portanto,
podem compreender profundamente um ao outro. A mulher agressiva-masculina tem a
vantagem de seu conhecimento e treinamento; e conseguindo evitar os erros grosseiros
será capaz de fazer um excelente trabalho.
86

A coisa mais importante a ser lembrada pela mulher agressiva-masculina talvez seja que
ela deve manter um grande espaço físico entre ela e seu paciente. Porque todas as
estruturas rígidas têm uma dificuldade considerável com relação ao contato – de um
modo peculiar, eles se parecem com as estruturas esquizóides. Lake chamou-os de
“iguais e opostos” – o esquizóide respondeu ao trauma infantil com uma contração em
direção ao centro, e um congelamento da periferia; o rígido respondeu ao trauma infantil
com uma expansão aos limites mais extremos de suas fronteiras (que são altamente
energizadas e quentes), e um congelamento de seu âmago – seu coração. A terapia para
todas as estruturas rígidas consiste sempre em abrir o coração, liberar a capacidade de
amar e de dar verdadeiramente.

É quase certo que ocorrerá a sedução entre a mulher agressiva-masculina e os homens


rígidos. É muito importante desencobrir e resolver este assunto tão cedo quanto possível.
Porque o homem rígido está acostumado a seduzir como meio de alcançar um objetivo, e
se a transferência estiver ocorrendo, ele certamente ficará aterrorizado com a
possibilidade de ser bem sucedido e conseguir seduzir a imagem de sua mãe.

A terapeuta deve lembrar que, se a teoria de Reich sobre A Praga Emocional estiver
certa, ela pode muito bem parecer-se realmente, pelo menos em atitudes, com a
verdadeira mãe do paciente. Ela tem que ser capaz de enfrentar a expressão aberta da
sexualidade/sedução de seu paciente sem reagir, nem positiva, nem negativamente – ela
precisa ser capaz de entender que esses jogos são na realidade testes, e que seu
paciente a está testando para ver se ela o ama por sua sexualidade (pois para ele as
mulheres geralmente o fazem) ou por ele mesmo.

O paciente faz a diferença entre “ele mesmo” – que geralmente quer dizer seu “ser”
elementar – e o adulto realizado, o adulto bem sucedido, o adulto sexual que tem direito
ao “amor da mãezinha, porque ele conquistou”. A mulher agressiva-masculina precisa ter
em mente que o coração fechado do homem rígido é, em parte devido à baixa
auto-valorização – um mecanismo de auto-desvalorização originado da divisão entre
coração e sexualidade; a culpa edipiana entra aqui como um grande reforço.
87

Com a mulher rígida, o problema contratransferencial centraliza-se mais em torno da


repressão da agressão pela mãe. Aqui, a personalidade autoritária da mulher agressiva-
masculina, sua agressividade excessiva, e seu próprio desprezo pelas mulheres, podem
tornar a terapia muito difícil. Porque a paciente rígida precisa de uma mulher que lhe dê
apoio – o oposto de sua mãe. E ela precisa de permissão para liberar sua transferência
negativa sem ser ameaçada – seja dissimuladamente, seja abertamente.

Uma indicação de que a transferência negativa está bloqueada é quando a paciente


assume uma atitude aparentemente cooperativa por longos períodos, durante os quais as
coisas parecem ir muito bem – e na realidade quase nada está acontecendo. Outra
indicação é a ausência de choro por períodos prolongados – por que a mulher rígida tem,
geralmente, muitos sentimentos que não são muito difíceis de alcançar, se ela não for
apanhada por um “desafio”. Mas se ela estiver provocadora e desafiadora, será muito
difícil atingi-la. Suas defesas são geralmente poderosas, eficientes e bem organizadas. A
provocação é, na realidade, uma competição das vontades.

O orgulho é um fator importante em todas as estruturas rígidas; a sua resolução é um


passo importante e inevitável para o sucesso da terapia. Aqui, tanto a paciente como a
terapeuta devem abdicar de seu orgulho – e esta pode realmente ser uma grande barreira
contratransferencial para a mulher agressiva-masculina.
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ESCLARECIMENTO FINAL

Como acertado na apresentação deste trabalho, o PDE é na realidade parte de um livro


muito maior, que cobrirá as cinco estruturas básicas do caráter, descritas no livro de
Alexandre Lowen, O Corpo em Terapia.

Assim, em minha mente, o trabalho não está completo, e eu não inclui o costumeiro
resumo que, em geral, conclui um livro deste tipo. De fato, eu ainda não posso escrevê-lo,
pois ainda não terminei o livro.

A quantidade de trabalho necessária para descrever a integração das cinco estruturas


básicas do caráter é muito grande, e tomará algum tempo. Também é possível que eu
considere necessário criar subdivisões, assim como aconteceu com as estruturas rígidas.
O comitê previu isto durante a apresentação, e então sugeriu que eu deixasse de lado
meu perfeccionismo (uma defesa básica da estrutura rígida), e apresentasse esta
quantidade parcial, mas substancial, de trabalho como PDE.

De qualquer forma, estão incluídas no Apêndice as características primárias das cinco


estruturas. Se você realmente começou a pensar dentro da linha da caracteriologia, como
eu esperava, seria excitante e recompensador fazer suas próprias extrapolações, usando
as características primárias. Você vai precisar saber, contudo, qual é a sua estrutura de
caráter dominante, que defesas você usa mais, e onde você ainda está parcialmente
não-resolvido. Se este trabalho tiver servido pelo menos para ajudar você a descobrir uma
parte desse material, terei atingido meu objetivo.
89

APÊNDICE I

EXEMPLOS

Os seguintes “exemplos” substituem as “Histórias de Casos” que normalmente fariam


parte desta apresentação. Eu fiz esta substituição porque, em minha opinião, é mais útil e
apropriado mostrar exemplos de interação caracteriológica de pares que se apliquem à
premissa básica deste trabalho, do que histórias de casos generalizados, onde o ponto da
contratransferência pode ficar perdido.

Estou especialmente interessado no exemplo de “Judy”, onde um caso-problema


específico levou à descoberta de um problema caracteriológico geral, que estava
obviamente afetando toda a prática de Judy. Creio que esse tipo de descoberta é o
melhor tipo de supervisão.

EXEMPLO Nº 1

TERAPEUTA FÁLICO-NARCISISTA E PACIENTE ORAL

Ron é um terapeuta fálico-narcisista, e Paul é um oral, membro de um grupo de Ron. Paul


é homossexual, jovem, atraente. O grupo, em geral, ia bem, mas Ron se sentia irritado,
insatisfeito, e culpava especificamente Paul, por manter uma atitude passiva, não-
cooperativa. Ron sentia que Paul não estava motivado a ficar no grupo, não contribuía,
não era apreciado pela maior parte dos membros do grupo e, portanto, devia sair. O rosto
de Ron mostrava sua zanga quando ele falava de Paul – mesmo assim, quando
questionado, ele negava estar se sentindo zangado – isso era obviamente inconsciente.

Felizmente, o grupo tinha acesso à esposa de Ron, através de um de seus membros. E o


feedback que ela tinha era bem diferente da versão de Ron. Ela tinha ouvido dizer que o
grupo gostava de Paul, e apesar de ser verdade que ele não dava muita coisa, o grupo
achava que ele fazia o que podia, que ele se beneficiava estando no grupo, e queriam
que ele ficasse. Ron foi confrontado no Grupo de Supervisão.
O resultado de seu trabalho, em resumo, parece ter sido o seguinte:
90

1. Ron se ressentia profundamente da passividade de Paul, que ele personalizava até


certo ponto. Ele reprimia e negava sua zanga, e a racionalizava. Ele projetava
sobre Paul o seu desejo de livrar-se de Paul; ele censurava Paul, concentrando-se
nas defesas dele (em vez de ver a pessoa que havia sob elas), e usando seus
conhecimentos contra Paul. A combinação da projeção, da negação e da censura
criou a culpa, o que enraiveceu Ron ainda mais;

2. Depois de perceber essa dinâmica, ele também foi capaz de ver que, muito
provavelmente, Paul estava se nutrindo da raiva encoberta de Ron, o que lhe dava
uma sensação de poder sobre Ron (a imagem do pai), satisfazia sua necessidade
de atenção / energia (ele de fato recebia mais atenção do que outros membros do
grupo), e gratificava sua retenção rancorosa. Paul havia identificado a necessidade
de performance do rígido, e havia percebido que se ele não a satisfizesse, Ron ia
continuar “tentando” para sempre.

3. Não confrontando Ron, Paul não dava oportunidade ou justificativa para que Ron
descarregasse sua raiva reprimida. Na realidade, Ron tinha se tornado a fonte de
energia para o oral Paul.

Apesar do Grupo de Supervisão ter parado neste ponto, eu gostaria de formular hipóteses
adicionais, que poderiam ser verificadas mais tarde.

É obvio que a raiva de Ron é uma defesa caracteriológica, ligada à falta de “atuação” de
Paul – que Ron interpretou como uma deficiência sua (de Ron). E isto acionou a auto-
desconfiança profundamente reprimida, enraizada na baixa auto-estima do fálico, que
atinge sua sexualidade, sua virilidade, sua potência.

Há mais um fator aqui. A oralidade de Paul (fonte de sua passividade) deve ter se
expressado como necessidade. Isto, combinado com a franca homossexualidade, deve
ter ameaçado Ron, que deve ter confundido amor com sexualidade (uma reação típica do
rígido). A real necessidade de amor e atenção por parte de Paul, pode ter sido
interpretada por Ron como uma sedução, confrontando-o com seu próprio componente
homossexual. A soma destes fatores tornou-se muito ameaçadora e frustrante para a
paciência limitada do rígido, e ele reagiu caracteriologicamente – rejeitando antes de ser
rejeitado.
91

Tanto as defesas de Paul, como as de Ron devem ser entendidas aqui como um disfarce
de seus sentimentos reais um pelo outro, que eram, da parte de Ron, simplesmente
interesse e consideração, e da parte de Paul, necessidade de proximidade. Ambos
estavam se defendendo caracteriologicamente – Paul com uma retenção rancorosa, e
Ron com rejeição.

EXEMPLO Nº 2

O TERAPEUTA RÍGIDO DO SEXO MASCULINO E O PACIENTE PASSIVO-FEMININO

Don é um terapeuta rígido, e Bill, seu paciente, é descrito como essencialmente


passivo-feminino. Don confessou que queria livrar-se de Bill. A terapia não estava
progredindo. Depois de muitos meses, Don acreditava que a contínua necessidade de
agradar de Bill mascarava seu ódio escondido pelo homem/terapeuta/pai – mas ainda
assim Don queria interromper a terapia.

Na que seria a última sessão, segundo pensava Don, ele provocou uma briga simulada
com seu paciente, e muita agressão foi expressa por ambas as partes.
Surpreendentemente (para Don), Bill quis continuar a terapia depois de ocorrida a
descarga catártica. Mas Don ainda não acreditava nas evidentes expressões de amor de
seu paciente, achado que eram um truque de sedução, um disfarce.

Num Grupo de Supervisão, Don percebeu que essa descrença no amor de outra pessoa
por ele permeava toda a sua vida. Algumas vezes, ele tinha tido a mesma reação às
aproximações ternas de sua esposa e, quando criança, tinha tido a mesma reação com
seus pais. Esta descrença estava enraizada em sua própria falta de amor por si mesmo,
sua baixa auto-estima, sua apreciação não realista de seu verdadeiro valor. Então, a
afirmação inconsciente era: “Como posso acreditar que alguém me ama, se eu não me
sinto digno de ser amado”. Daí a descrença e a desconfiança em qualquer expressão de
amor.
92

É claro que as pessoas interpretavam isso como rejeição e, por seu lado, reagiam
rejeitando-o também, reafirmando, assim, a premissa original – que ele não tem valor.

Temos aqui outra explicação para o medo caracteriológico de rejeição da estrutura rígida.
Isto também explica a necessidade de perfeição, realização e atuação – porque a
admiração obtida, além de preencher as necessidades narcisistas, alivia sua baixa
auto-estima.

EXEMPLO Nº 3

TERAPEUTA HISTÉRICA E PACIENTE ESQUIZÓIDE

Mary é uma histérica típica, estrutura rígida do tipo intelectual. Peter, seu paciente, tem
uma personalidade essencialmente esquizóide, e desenvolveu um corpo maciço, de
aparência masoquista, como defesa contra o profundo problema esquizóide. Peter foi
hospitalizado duas vezes num pavilhão psiquiátrico, uma das vezes por mais de um ano.
No Grupo de Supervisão, Mary expressou sua insatisfação com a terapia, e o grupo
decidiu arranjar uma confrontação entre paciente e terapeuta (o que só é feito em casos
muito excepcionais).

O problema, segundo Mary, era que sessão após sessão, Peter permanecia passivo,
imóvel, numa atitude que ela interpretava como passivamente desafiadora. Nenhum
esforço da parte dela parecia obter qualquer resposta emocional de Peter – suas
respostas eram precisas e não-emocionais. Ele não trazia material novo, nem começava
nada. Mary estava disposta a abandonar a terapia, e enviá-lo a outro lugar.

Entretanto, quando ela expressou isso diretamente, tornando-se, na realidade, muito


vulnerável, Peter repentinamente começou a gritar (com raiva) que ela não sabia o que
andava acontecendo dentre dele todo esse tempo; o quanto ela o tinha realmente
ajudado. O quanto seu processo tinha continuado intra-psiquicamente. Ele se sentia
ultrajado com a falta de confiança da terapeuta em seu processo interior, que ele não
tinha externalizado.
93

Mary ficou atônita, e depois zangada (porque ele não tinha expressado nada). O grupo
encorajou sua raiva que, repentinamente, se transformou em medo do maciço poder físico
de seu paciente, e da ameaça encoberta na raiva feroz de Peter que, aparentemente, era
subjacente à sua passividade. Essa passividade era, certamente, um mecanismo que
Peter havia desenvolvido durante sua hospitalização (onde, como ele diz: “Eu aprendi a
juntar os meus pedaços”) como defesa contra a raiva esquizóide que ele mesmo temia.

Com o encorajamento do grupo, Peter expressou uma parte dessa raiva. Que
imediatamente se misturou com um pedido de aceitação e “compreensão sem feedback”
(que eu interpreto como a necessidade de validação da existência, que o esquizóide não
teve na infância). Este é um problema clássico de contato para o esquizóide: a
necessidade de contato, através de raiva, aceitação, amor – mas contato!

O problema contratransferencial se tornou claro. Contato – nos níveis necessitados pela


estrutura esquizóide – é uma experiência desconhecida para a estrutura rígida. Mary
carecia de compreensão do problema, e caiu em sua própria estrutura experencial. Uma
terapeuta histérica encontra-se desprovida de feedback positivo – uma situação típica e
quase intolerável, que atinge sua estrutura de caráter em muitos níveis.

A terapeuta não viu nenhum “resultado” e, portanto, não sabia se ela estava “atuando”.
Por isso, ela começou a sentir sua própria baixa auto-estima, que não podia ser
conscientemente admitida, e imediatamente acionou a defesa de caráter que foi primeiro
a zanga, e depois a raiva. A raiva foi, provavelmente, pré-consciente, e foi reprimida como
inaceitável (em vista de seu papel de terapeuta?). Mas essa raiva tinha que encontrar
uma saída; então a terapeuta começou a culpar, tornando o paciente responsável pelo
que era – em última análise – sua própria baixa auto-estima.

A necessidade da estrutura rígida de validação externa é muito grande. Eu suspeito, e isto


ainda é hipotético, que essa necessidade é precisamente a fonte da dependência, tanto
das figuras parentais arcaicas e fantasiadas, quanto dos objetos de amor do tempo
presente. A baixa auto-estima levada a extremos leva ao desprezo e ódio de si mesmo. A
validação externa se torna uma solução temporária, embora realmente insatisfatória. O
histérico flerta, seduz, se torna bem sucedido, poderoso, forte – tudo por causa do
feedback externo positivo, que é, na realidade, considerado como validação da existência.
Que drama! Um drama encenado para ocultar uma injustificada baixa auto-estima.
94

EXEMPLO Nº 4

TERAPEUTA PASSIVO-FEMININO E PACIENTE HISTÉRICA

A paciente em questão era uma mulher de 25 anos, particularmente bonita, recentemente


divorciada, com uma vida sexual variada e abundante, e dois filhos de seu casamento.
Além de ser predominantemente histérica, havia um componente esquizóide, de modo
que, entre as duas estruturas, ela era realmente inconsciente de sua atitude
extremamente sedutora. Ela tinha conseguido ser bem sucedida na vida, sendo
abertamente sedutora com os homens, e usando sua sexualidade para obter deles tudo
que queria. Este foi realmente o padrão que ela exibiu no início da terapia, usando
roupas, e tendo atitudes extremamente provocantes.

O terapeuta, um psiquiatra muito bem sucedido, de aproximadamente 60 anos, ficou


sexualmente excitado com as provocações da paciente, e imediatamente colocou esse
fato. A resposta dela foi ficar zangada e fria. Neste ponto, poder-se-ia pensar que a
paciente iria tentar outra tática; mas infelizmente ela não o fez, variando entre o orgulho
frio e a atitude sedutora que ela havia trazido no início da terapia.

O terapeuta, inevitavelmente, ficava excitado diante da sexualidade dela, apesar de tê-la


confrontado com sua sedução várias vezes. No fim da sexta sessão, ele lhe disse que ela
tinha que vir propriamente vestida e que daquele momento em diante eles não ficariam
mais face a face, não estabelecendo, assim, contato visual. Nesse momento, ela ficou
muito zangada, e lhe disse que ele não podia determinar o modo dela vestir-se e
comportar-se. O terapeuta tentou trabalhar essa zanga, mas só encontrou, por parte da
paciente, uma atitude “compreensiva” e fria. Durante as sessões seguintes, a paciente
continuou a mudar da mulher fria, racional, que compreende seu problema, para a
garotinha que estava tentando seduzir o seu pai. Parecia não haver saída para esse
impasse, e como o terapeuta era continuamente estimulado sexualmente, resolveu
recomendá-la a outro terapeuta.

Neste caso, infelizmente, foi impossível resolver o problema contratransferencial, que foi
seriamente agravado pela insatisfação sexual que o terapeuta estava experenciando em
sua vida privada nesse período. A sua decisão de suspender a terapia foi a única solução
honesta nessas circunstâncias. O que a jovem mulher precisava era, talvez, de uma
terapeuta do sexo feminino que fosse imune à sua manipulação sexual.
95

EXEMPLO Nº 5

UM PADRÃO PARA UMA TERAPEUTA ORAL HISTÉRICA

Judy e Bert são co-terapeutas e estão trabalhando juntos há algum tempo. São ambos
muito experientes e têm muito background. Entretanto, ultimamente Bert tem percebido
que Judy está tendo dificuldades com alguns de seus pacientes comuns. Num Grupo de
Treinamento, onde terapeutas se confrontam entre si, com seus problemas, Judy tentou
colocar o que vem acontecendo.

Apesar de a discussão ter principiado com um caso específico, logo ficou claro que
diversos pacientes de Judy estavam na mesma situação. Muitos, ou todos esses
pacientes, são basicamente orais, e Judy os experencia como “drenando sua energia”, a
tal ponto que ela tem que se tornar defensiva. Durante o trabalho, ficou claro que ela
estava bem consciente de que os pacientes a estavam “drenando”, e tentou reprimir isso,
sem sucesso, é claro. A própria Judy tem certa oralidade, com uma configuração rígida
histérica dominante.

A configuração oral-histérica é confirmada tanto em sua atitude no grupo, quanto em sua


vida externa. Por exemplo, apesar de amar seu marido e de ter um bom casamento de 25
anos, o sexo sempre foi um problema, e continua sendo. Judy parece muito dependente
de seu marido, e como isso combina a necessidade dele de mútua interdependência, a
sua associação é muito satisfatória. Eu dei esse background para documentar minha
análise caracteriológica.

Voltando ao nosso assunto, Judy conscientizou-se de que reagiu aos seus pacientes orais
com sua própria oralidade, e também com seu componente histérico; sua oralidade
sintonizou-se com a oralidade dos pacientes, quando ela sentiu que estava sendo
“sugada”, e investindo muita energia. Ela esperava que os pacientes a alimentassem e
nutrissem, assim como ela os alimentou e nutriu inicialmente.

Essa criação de um relacionamento dependente é realmente uma expressão do


componente histérico, que é fundamentalmente o medo de ser rejeitada, e também da
oralidade, que precisa de gratificação narcisista.
96

Portanto, para garantir que o paciente não venha a rejeitá-la, Judy começa a prometer
amor, afeição, apoio, etc., que o paciente oral, é claro, aceita. Mas o paciente oral não
retribui nada, e fica exigindo mais, ao mesmo tempo em que se torna zangado (raiva oral).
Judy continua “representando” para que seu paciente não a abandone.

Como o paciente continua fazendo exigências sem expressar gratidão, Judy sente, de
repente, que já deu o suficiente. Sua própria oralidade vem à tona, e exige a retribuição
de seus “presentes”; e quando nada é oferecido e o paciente continua exigindo mais e
mais, Judy sente raiva e ódio, justificando, assim, perfeitamente, a sua rejeição.

A raiva e o ódio são reprimidos, não suprimidos, de modo que Judy percebe que ela tem
que negar um forte sentimento nela, que ela atribui à culpa. Essa culpa é real – é o
produto de seu ódio oral irracional, e de seu desejo histérico de rejeitar que, por sua vez,
se originou da necessidade de representar, e de não ser rejeitada. Praticamente, tudo isto
foi confirmado por Judy durante o grupo, quando ela respondeu a perguntas como: “O que
você faria se um paciente a rejeitasse?” A resposta foi: “Eu me sentiria muito, muito, mal e
faria qualquer coisa para eliminar isso.”

Ela também reconheceu sua necessidade oral de ser alimentada pelo paciente, e o fato
de que ela sentiu muito claramente que estava reprimindo sentimentos, que não eram
identificáveis antes do trabalho no grupo. A resolução veio quando Judy se conscientizou
de todos esses componentes, e aceitou o fato de que, na realidade, ela não tinha que
nutrir os pacientes, e que os pacientes podiam ficar com ela, ou partir, de acordo com
seus próprios problemas e necessidades. Em outras palavras, Judy conscientizou-se de
que era mais importante permitir que os pacientes se desenvolvessem (sejam quais forem
as conseqüências desse desenvolvimento) do que manipulá-los para continuarem a
terapia, e gratificarem as suas necessidades neuróticas. O passo seguinte, seria
reconhecer que sua própria auto-valorização não dependia de manter, ou perder, um
paciente – mas ela não chegou a alcançar esse ponto.

Não há dúvidas de que esses insights podem não ser permanentes. Esperar isso seria
indevidamente otimista, já que implicaria em resolução total, ou parcial, de sua estrutura
de caráter. Entretanto, ela se conscientizou, pelo menos, de um aspecto muito destrutivo
da contratransferência.
97

EXEMPLO Nº 6

TERAPEUTA ESQUIZÓIDE E PACIENTE ORAL

Eric é um tipo esquizóide quase puro, com mais de dois metros de altura, que resolveu
muitos de seus problemas, a ponto de ter se tornado um terapeuta qualificado. Ele
pertence ao tipo esquizóide rígido; em outras palavras, seu corpo é duro, rígido e
ameaçador; a defesa é contra o terror. Robert é seu paciente, pequeno e
predominantemente oral.

Numa confrontação dentro de um Grupo de Treinamento, Robert expressou muita raiva e


hostilidade com relação a Eric. A princípio, Eric ouviu, depois começou a rejeitar
defensivamente, e logo em seguida houve a explosão de sua própria raiva. Eric disse que
Robert estava projetando, sem levar em consideração a realidade da terapia. O
comportamento de Eric foi agressivo, mas ainda assim, Robert conseguiu manter sua
base. Robert continuou atacando, e Eric ficou realmente muito, muito zangado. O grupo
interveio, tentando fazer Eric compreender que ele tinha que lidar com a transferência de
imagens, e com as exigências orais infantis de Robert; e que, na realidade, a zanga de
Robert não era dirigida a Eric, o terapeuta, mas sim à imagem do pai – por quem Robert
tinha um enorme ressentimento acumulado.

O grupo também mostrou que era responsabilidade de Eric facilitar a transferência, e não
se opor a ela. Eric foi capaz de aceitar isso; ele se acalmou e deixou que Robert
continuasse com sua raiva. Entretanto, Eric não ficou passivo; antes de continuar, ele
expressou – verbalmente, como que para se reafirmar – aquilo que o grupo tinha
colocado. Ele estava, na realidade, examinando a sua reação – vendo quão irracional ele
era, e quanto estava afetando negativamente o relacionamento terapêutico. Quando ele
entendeu, tornou-se ativamente compreensivo, permitindo que Robert expressasse o que
mais tarde se tornou raiva violenta; depois do que Robert sucumbiu, e expressou sua
verdadeira necessidade de amor. Robert chorava muito, enquanto tentava alcançar Eric; e
Eric estava pronto para segurá-lo (o que, para uma personalidade esquizóide, é muito
difícil), ele expressou seu desejo de ajudar Robert, e seus sentimentos bons e calorosos
se voltaram para Robert. Esta foi uma resolução excepcionalmente bonita, de uma
contratransferência do terapeuta, que felizmente foi capaz de ver que seu comportamento
correspondia às suas próprias defesas de caráter, de modo que a resolução pôde
acontecer.
98

APÊNDICE II

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Como mencionado na Introdução, o que se segue é uma versão abreviada das


“características básicas” que podem ser geralmente esperadas das diferentes estruturas
de caráter. Espero que o leitor use essas informações como material de referência,
sempre que se encontrar perplexo diante de sua prática. Porque neste trabalho tentei
cobrir apenas algumas das interações possíveis – mas de modo algum todas elas. Além
disso, esta primeira parte do trabalho refere-se somente aos quatro subtipos rígidos – e o
leitor pode desejar saber sobre as outras estruturas básicas de caráter, que esperamos
cobrir em trabalhos futuros.
TERAPEUTA RÍGIDO

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS

Trauma Básico: A rejeição da sexualidade infantil Precisa “atuar” – A freqüência e intensidade das
resultou no adulto, numa divisão coração / sexualidade; intervenções pode ser excessiva;

Impaciente;
Problema Básico: Expressar amor, integrar a divisão
coração / genitais. Sexualidade negada pela histérica, e
usada agressivamente pelo fálico; Muito energético;

Medo Básico: De ser rejeitado, magoado; de se sentir Sexualmente reprimido;


sem valor;

Sedutora (histérica)
Defesas Básicas: Diversas. A sedução é uma delas. A
raiva é outra. A retenção é outra. Defesas altamente
organizadas, frequentemente muito flexíveis (armadura Agressivo (fálico)
tipo rede);
Fica zangado defensivamente;
Negatividade Subjacente: Raiva, desprezo, arrogância
(orgulho); Desdenhoso. Arrogante. Pode ter carência de compaixão
(especialmente o fálico);

Problema Encoberto: Sentimento de inutilidade, que


resulta em dependência da validação dos outros. Precisa “obter resultados” de/para o paciente, para
Perfeccionismo excessivo, usado como mecanismo de compensar sua baixa auto-estima;
compensação.
Dificuldade com a real expressão de
99

amor/desejo/necessidade, mesmo quando isso é


apropriado;
PACIENTE RÍGIDO

CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Retém; Trauma Básico: A rejeição da sexualidade infantil


resultou, no adulto, numa divisão coração/sexualidade;
Altamente energizado;
Problema Básico: Expressar amor, integrar a divisão
coração / genitais. Sexualmente negada pela histérica, e
“Atua” – Um paciente muito recompensador; usada agressivamente pelo fálico;

Arrogante ou desdenhoso; Medo Básico: De ser rejeitado, magoado; de se sentir


sem valor;

Usa abundantemente as justificações;


Defesas Básicas: Diversas. A sedução é uma delas. A
raiva é outra. A retenção é outra. Defesas altamente
Muito vulnerável à rejeição, ao desapontamento; organizadas, frequentemente muito flexíveis (armadura
tipo rede);

Agressivo (fálico) ou sedutora (histérica);


Negatividade Subjacente: Raiva, desprezo, arrogância
(orgulho);
Tem bloqueio afetivo;
Problema Encoberto: Sentimento de inutilidade, que
resulta em dependência da validação dos outros.
A raiva, usada como defesa pode encobrir a mágoa, o Perfeccionismo excessivo, usado como mecanismo de
desejo, o amor, a necessidade, os sentimentos suaves; compensação.
100

O lucro básico do ato sexual é a descarga genital. Como


a vulnerabilidade raramente é exposta, contato/amor
são apenas interesses secundários. Assim, a
TERAPEUTA ORAL

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS

Trauma Básico: Abandono ou falta de alimento Passivo;


emocional (físico) durante a fase oral;
Dissimuladamente rancoroso, ressentido;
Problema Básico: Incapacidade de alcançar (atingir).
Porque a função de alcançar as coisas foi frustrada pela
ausência do progenitor; “Suga” energia – Não dá energia durante a terapia;

Medo Básico: De ser abandonado; Baixa energia;

Defesa Básica: Passividade, pseudo-tristeza; Teme “atingir” (alcançar);

Negatividade Subjacente: Rancor, voracidade, Tem dificuldade em sustentar a exigência de apoio por
necessidades não preenchíveis; parte dos pacientes;

Declaração Básicas: “Você faz isso por mim”, “Eu estou Teme o abandono. Trauma infantil básico. Terapeuta
impotente”, “Eu não consigo fazer isso”. extremamente vulnerável neste ponto;

Pode facilmente tornar-se dependente do paciente;


conspira para obter “sustento”
energético/emocional/financeiro;
101

Muito racional, lógico. Tem uma excepcional clareza


intelectual, e capacidade verbal muito grande (que
PACIENTE ORAL

CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Rancoroso; Trauma Básico: Abandono ou falta de alimento


emocional (físico) durante a fase oral;
Baixa energia;
Problema Básico: Incapacidade de alcançar (atingir).
Passivo; Porque a função de alcançar as coisas foi frustrada pela
ausência do progenitor;

Segura (não solta realmente);


Medo Básico: De ser abandonado;

Sente-se prejudicado;
Negatividade Subjacente: Rancor, voracidade,
necessidades não preenchíveis;
Cheio de necessidade;

Declarações Básicas: “Você faz isso por mim”, “Eu estou


Indiretamente, através da passividade, declara: “Você impotente”, “Eu não consigo fazer isso”.
faz isso por mim?”, “Você não pode fazer isso por mim”;

Extremamente verbal. Tende a bloquear o trabalho


físico.
102
TERAPEUTA ESQUIZÓIDE

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS

Trauma Básico: Hostilidade ativa por parte dos pais; Muito racional, capta o problema de modo muito claro,
compreensível e intelectual; entretanto, pode ter uma
Problema Básico: Ego defeituoso; área totalmente distorcida, “cega”, devido ao bloqueio do
afeto;

Medo Básico: Invasão de material de processos Tem frequentemente, um terror não resolvido (do seu
primários, que é igual a loucura/morte, leva ao medo de próprio ego instável, e de suas conseqüências);
ser morto, aniquilado, destruído;
Sistema de baixa energia. Pode ter medo de sistemas de
alta energia;
Defesa Básica: Congelar e manter-se inteiro, manter os
limites do ego, e assim conter a violenta negatividade
Pouca tolerância à frustração;
subjacente;
Tem medo da raiva expressa diretamente (tem medo de
Negatividade Subjacente: Intenção homicida – desejo de sua própria raiva violenta);
matar, destruir, aniquilar;
Pode super enfatizar a compreensão intelectual do
problema do paciente, bloqueando a liberação de afeto;
Declaração Básica: ““Eu estou aterrorizado”.
Dissimuladamente hostil. Provavelmente se sente
culpado por isso;

Relativamente frio;
103

Tem dificuldade com o contato, com o compromisso


direto;
PACIENTE ESQUIZÓIDE

CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Muito racional, capta o problema de modo muito claro, Trauma Básico: Hostilidade ativa por parte dos pais;
compreensível e intelectual; entretanto, pode ter uma
área totalmente distorcida, “cega”, devido ao bloqueio do
Problema Básico: Ego defeituoso;
afeto;
Tem frequentemente, um terror não resolvido (do seu Medo Básico: Invasão de material; de processos
próprio ego instável, e de suas conseqüências); primários, que é igual a loucura/morte, leva ao medo de
ser morto, aniquilado, destruído;
Sistema de baixa energia. Pode ter medo de sistemas
de alta energia;
Defesa Básica: Congelar e manter-se inteiro, manter os
Pouca tolerância à frustração; limites do ego, e assim conter a violenta negatividade
subjacente;
Tem medo da raiva expressa diretamente (tem medo de
sua própria raiva violenta);
Negatividade Subjacente: Intenção homicida – desejo de
Pode super enfatizar a compreensão intelectual do matar, destruir, aniquilar;
problema do paciente, bloqueando a liberação de afeto;
Declaração Básica: ““Eu estou aterrorizado”.
Dissimuladamente hostil. Provavelmente se sente
culpado por isso;

Relativamente frio;

Tem dificuldade com o contato, com o compromisso


direto;
Pode ter dificuldade no trabalho com o corpo (devido à
falta de contato com o próprio corpo);
104

Forte em imaginação, fantasia, sonho;


Muito espiritual – precisa “encarnar, entrar no corpo”.
TERAPEUTA PSICOPATA

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS

Trauma Básico: Traição; mensagens duplas; ligações Controle é o ponto principal;


duplas, que resultam em superego defeituoso, sobre o
qual toda a confiança está baseada. Desconfia de todo o É muito desconfiado, receoso. Só aceita sua própria
resto, e de todas as pessoas; realidade;

Problema Básico: Confiar (em si mesmo, nos outros, na


Sob pressão irá manipular;
realidade, na sua “base”);

Não tem “base”;


Medo Básico: Ser traído/controlado outra vez;

Pode não estar consciente da mudança de níveis – que


Defesa Básica: Controlar tudo. A manipulação é na realidade é uma masturbação mental;
constante, inclusive a manipulação do self. Obstinação;
Pode ser presa do sofisma;

Negatividade Subjacente: Desconfiança, até mesmo de


seu próprio processo. Medo de cair no desamparo Não tolera a manipulação sedutora;
infantil – ou mesmo na irrealidade esquizóide;
Precisa sempre ganhar, quando desafiado – muita
dificuldade em ceder. Enquanto super enfatiza sua auto-
Declarações Básicas: ““Eu vou controlar tudo” ,“Eu faço
segurança, pode enfraquecer o paciente;
do meu jeito”, “Eu estou certo, você está errado”.

Oferecerá apoio (que ele não tem), em troca de


submissão;
105

É vulnerável e cria situações de ligações duplas;


PACIENTE PSICOPATA

CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Extremamente manipulador; Trauma Básico: Traição; mensagens duplas; ligações


duplas, que resultam em superego defeituoso, sobre o
Tentará confundir, para tomar o controle; qual toda a confiança está baseada. Desconfia de todo o
resto, e de todas as pessoas;
Atitude desafiadora (diferente do masoquista);
Problema Básico: Confiar (em si mesmo, nos outros, na
Irreal;
realidade, na sua “base”);

Muda constantemente de nível (masturbação mental).


Medo Básico: Ser traído/controlado outra vez;
Não segue uma sequência lógica de raciocínio;
Defesa Básica: Controlar tudo. A manipulação é
O controle é uma necessidade primária. Pode ser
constante, inclusive a manipulação do self. Obstinação;
aberto, ou dissimulado (“alimenta” o terapeuta, adota
uma atitude sedutora/passiva – mas extremamente
Negatividade Subjacente: Desconfiança, até mesmo de
controladora);
seu próprio processo. Medo de cair no desamparo infantil
– ou mesmo na irrealidade esquizóide;
Homossexualidade – expressa ou subjacente –
freqüentemente presente; pode causar problemas não
Declarações Básicas: ““Eu vou controlar tudo” ,“Eu faço
expressos, e problema contratransferencial encoberto.
do meu jeito”, “Eu estou certo, você está errado”.
106
TERAPEUTA MASOQUISTA

CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS
CARACTERÍSTICAS BÁSICAS

Medo de proximidade. Identifica a proximidade como “ser


Trauma Básico: A liberdade de expressão e/ou ação foi
sufocado”. Entretanto, se este problema é resolvido,
negada. O processo de separação/individualização foi
pode manter um ótimo contato com o paciente;
severamente impedido. Super preocupação com o bem-
estar físico, em detrimento do contato emocional. Sofreu
violação e humilhação. “Foi sufocado, em vez de criado”; Resistência excepcional. Precisa “suportar”. Gosta do
stress;
Problema Básico: Liberar e expressar-se; expandir-se;
ter esperança e fé. Intimidade e liberdade antitéticas;
Pode se tornar provocativo para atrair agressão sádica
Medo Básico: Ter negada a possibilidade de expressar- (gosta dos ataques dos pacientes);
se; ser constrangido, possuído;
Pode dar muito apoio, amor e força;
Defesa Básica: Suportar tudo, até que sentimentos
reprimidos se tornem intoleráveis. Então começa uma
provocação que – se bem sucedida – justificará a Muito intuitivo, muito sensível. Pode ter “lampejos
liberação explosiva. Entretanto, segue-se a culpa que intuitivos”, que podem, ou não, ser censurados pela
impede expressão posterior, resultando num “colapso razão;
masoquista” – e o círculo vicioso recomeça;

Tem remanescentes sádicos;


Negatividade Subjacente: Ódio, e um ressentimento que
queima por dentro;
Dificuldade em lidar com a humilhação, especialmente
anal. Isto pode tomar a forma de intolerância à crítica;
Declarações Básicas: ““Eu suportarei isto” ,“Se você me
ajudar (como estou lhe pedindo) você estará, na
realidade, inibindo minha liberdade. Mas se você não me Perigo de comunicar seu próprio desamparo.
107

ajudar, quer dizer que você não se importa”, “Estou


preso, não existe saída; é inútil”.
PACIENTE MASOQUISTA

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS
CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS

Trauma Básico: A liberdade de expressão e/ou ação foi


Precisa “suportar”; negada. O processo de separação/individualização foi
severamente impedido. Super preocupação com o bem-
estar físico, em detrimento do contato emocional. Sofreu
Teme – e necessita – a liberdade de expressão;
violação e humilhação. “Foi sufocado, em vez de
criado”;
Entra em colapso facilmente;
Problema Básico: Liberar e expressar-se; expandir-se;
ter esperança e fé. Intimidade e liberdade antitéticas;
Dificuldade com a agressividade;
Medo Básico: Ter negada a possibilidade de expressar-
se; ser constrangido, possuído;
Humilhação anal e retenção;
Defesa Básica: Suportar tudo, até que sentimentos
reprimidos se tornem intoleráveis. Então começa uma
Atitude provocativa; provocação que – se bem sucedida – justificará a
liberação explosiva. Entretanto, segue-se a culpa que
impede expressão posterior, resultando num “colapso
Rebelião dissimulada – nunca aberta; masoquista” – e o círculo vicioso recomeça;

Negatividade Subjacente: Ódio, e um ressentimento que


Ressentimento sufocante; queima por dentro;

Declarações Básicas: ““Eu suportarei isto” ,“Se você me


ajudar (como estou lhe pedindo) você estará, na
Concorda, mas não dá;
realidade, inibindo minha liberdade. Mas se você não
me ajudar, quer dizer que você não se importa”, “Estou
Culpa os outros. Raramente aceita responsabilidade preso, não existe saída; é inútil”.
108

pessoal (“foi obrigado a”);


109

APÊNDICE III

O COMPONENTE ENERGÉTICO NA CONTRATRANSFERÊNCIA

Um fator essencial que todo terapeuta deve considerar, quando está entrevistando um
possível cliente, é a energia liberada pela estrutura de caráter do paciente, comparada
com a sua própria. Em outras palavras, quais são os níveis relativos entre paciente e
terapeuta? E como a interação deles afeta a transação terapêutica?

Por exemplo, um terapeuta esquizóide que não tenha trabalhado o seu terror básico, terá
dificuldades óbvias ao lidar com um paciente fálico-narcisista, cuja defesa básica é
assustar seu oponente. O fálico-narcisista, tendo uma estrutura altamente carregada, com
uma enorme quantidade de energia, provavelmente sobrepujará o nível de energia do
terapeuta esquizóide que, por definição, tem um baixo nível de energia. O mesmo se
aplicaria a um terapeuta oral, quando confrontado com um paciente psicopata, que
precisa absolutamente controlar, e que usará tudo a seu alcance, inclusive a força, para
controlar a sessão. Eu não quero dizer força física, mas sim psíquica, emocional e
intelectual.

Por outro lado, o terapeuta com muita energia em sua estrutura de caráter precisa
entender que, quando está lidando com um paciente esquizóide, ele está se defrontando
com uma estrutura que é muito mais fraca do que a sua. Portanto, se o terapeuta
confrontar o paciente diretamente, nessas condições, ele vai simplesmente apavorar o
paciente, e este, ou irá embora, ou sofrerá uma crise psicótica.

Nós nos encontramos diante do problema da pura força psíquica de um lado, e da


fraqueza e medo do outro lado. Classicamente, o terapeuta deve abster-se de intervir
durante a terapia, mas como a maioria das escolas terapêuticas hoje em dia abandonou a
prática da abstenção, em maior ou menor grau, o terapeuta deve estar consciente não só
da qualidade de suas intervenções, mas também da intensidade, e de como a estrutura
do paciente será capaz de lidar com essa intensidade.
110

Essa avaliação é particularmente valiosa durante a primeira entrevista. Se o terapeuta


puder diagnosticar precisamente a estrutura de caráter de seu paciente, e se ele conhecer
a dinâmica de sua própria estrutura, poderá imediatamente entender o relacionamento
energético que se estabelecerá, e assim tentar neutralizá-lo, se achar que é necessário.
Ele também poderá entender que será imediatamente lançado para suas próprias defesas
de caráter, se ele se defrontar com uma estrutura, cujo nível de energia seja
consideravelmente maior do que o seu.

Devemos enfatizar aqui, que o terapeuta deve ter se conscientizado (ou pelo menos
deveria) de suas defesas caracteriológicas, no decurso de sua própria análise, e deve ter
resolvido muitos dos traumas básicos que criaram essas defesas. É claro que nessas
circunstâncias, qualquer terapeuta pode tratar de qualquer paciente. Percebemos aqui, a
recorrência do conceito de que o terapeuta só pode ajudar um paciente, quando ele
mesmo já trabalhou seus problemas. Entretanto, especialmente para o terapeuta iniciante,
o conceito dos sistemas relativos de energia pode ser uma ferramenta muito útil para
fazer seus diagnósticos.

Os níveis de energia de cada estrutura de caráter são descritos na “etiologia” – a


descrição inicial, que antecede a descrição da interação da dupla, em cada estrutura de
caráter. Entretanto, para o leitor interessado, que deseja se aprofundar neste assunto, eu
sugiro o livro clássico de Lowen, O Corpo em Terapia.

Talvez eu possa ajudar o leitor em suas dúvidas, se tentar fazer uma simples descrição
do que eu quero dizer com níveis relativos de energia. Imagine que uma terapeuta frágil
seja confrontada por um homem grande, agressivo e fálico, cujo maior problema é conter
sua raiva. Ele despreza as mulheres em geral, e a mulher fraca em particular. A terapeuta
frágil é um alvo fácil, e mesmo que seu treinamento tenha sido extenso, um medo
primitivo, pequeno, mas profundo, ocultar-se-á em seu inconsciente. Ela pode tentar
racionalizar esse sentimento, pode tentar entendê-lo e assimilá-lo, pode tentar integrá-lo.
Mesmo assim, o medo persiste quando ela é confrontada pelo homem enorme, agressivo,
meio animal.
111

Há uma realidade física para esse medo, e ela esta reagindo a esse nível. Em algum
lugar de seu inconsciente profundo, existe o terror primitivo de ser fisicamente atacada e
destruída. Isto vai interferir continuamente na terapia, e eu duvido seriamente de que ela
seja realmente capaz de ajudar seu paciente, a menos que adote o modelo original de
total não participação e abstenção.

Esse modelo só é válido dentro do esquema da psicanálise clássica, cujos resultados se


tornaram questionáveis nos tempos atuais. Mesmo que ela usasse o sofá e a regra de
abstenção como um escudo contra seu próprio medo, é certo que o paciente perceberia
isso, e não aceitaria a condição de não confrontação. Por outro lado, se ela enfrentasse
diretamente a raiva, ele teria uma vantagem real, óbvia, que poderia assustá-la, e com
razão.

É claro que esse tipo de diferença dramática de nível energético entre duas estruturas
não é muito freqüente, mas no nível sutil, esse intercâmbio e essa interação realmente
acontecem. Avaliações da realidade presente são feitas, embora sutilmente, tanto pelo
terapeuta, quanto pelo paciente; e ambos sabem que terão que lidar com a negatividade
do outro, mais cedo ou mais tarde. O terapeuta deve estar consciente disso, como um
elemento no diagnóstico, e para uso terapêutico futuro.
112

APÊNDICE IV

A AGRESSÃO COMO AGENTE FORMATIVO


NAS ESTRUTURAS DE CARÁTER RÍGIDAS

Enquanto o conflito edipiano é o fato determinante na etiologia da estrutura rígida,


acredito que a agressão – seu grau de expressão, ou inibição – seja um fator importante
na determinação da estrutura de caráter. A agressão deveria ser diferenciada da
afirmação – expressão normal e saudável das necessidades. A agressão geralmente
resulta da frustração da necessidade (expressa afirmativamente, diretamente), ou do
amor (expresso através do desejo, ou da sexualidade).

Enquanto o grau de expressão (ou inibição) da agressão é um fator determinante em


todas as estruturas de caráter, no caso específico da estrutura rígida ele tem uma
importância adicional, na medida em que é o fator que determina, em última instância,
qual dos quatro subtipos conhecidos será adotado pela criança. Porque, sob o título de
“Estruturas Rígidas”, existem agora, pelo menos, quatro subtipos: o homem fálico-
narcisista, a mulher histérica, o homem passivo-feminino e a mulher agressiva-masculina.

Cada um desses quatro subtipos apresenta quadros clínicos diferentes, e ainda assim são
todos classificados como rígidos. A razão é que todos eles são resultado do trauma
desenvolvido durante o estágio edipiano, enquanto que as estruturas pré-edipianas não o
são. Durante o estágio edipiano, o trauma básico é infligido pelo progenitor do sexo
oposto que, repentinamente, rejeita a sexualidade aberta da criança – que a criança
experencia apenas como uma nova expressão de amor.

Portanto, a criança, a princípio, não pode entender, mas mais tarde ela liga o
desenvolvimento da sexualidade com a rejeição inesperada – e frequentemente brutal –
por parte do progenitor do sexo oposto. Essa rejeição significa uma ameaça de perda do
amor; e a conformidade com as exigências do progenitor é uma expectativa do progenitor
que não é desafiada (embora seja geralmente inconsciente).
113

Isto exige da criança uma adaptação muito dolorosa, difícil, e às vezes, prolongada. A
perda do amor é uma experiência muito, muito dolorosa, quando ameaçada por um dos
progenitores – o progenitor edipiano; mas quando ameaçada pelos dois progenitores, é
igual à morte – porque a criança acredita que essa ameaça é sinônimo de abandono
físico.

No modelo edipiano clássico, a criança deseja o progenitor do sexo oposto, e é rejeitada


por ele. Então, ela passa a odiar esse progenitor por causa da rejeição, passa a competir
com o progenitor do mesmo sexo pelo objeto do amor e, portanto, odeia também esse
progenitor, por causa da competição, desenvolvendo culpa resultante da intenção
escondida de “roubar” o progenitor do sexo oposto, e de matar o progenitor do mesmo
sexo. O resultado é que a criança odeia os dois progenitores – e isto é confirmado
universalmente pela observação direta.

Como a criança expressa esse ódio? Tornando-se agressiva, hostil, exigente. Essas
descargas desagradáveis são reprimidas pelo progenitor em graus variáveis. E o grau de
repressão determinará o desenvolvimento caracteriológico final da criança. Pelo menos,
esta é a hipótese básica subjacente a este trabalho. Vamos examinar os backgrounds de
desenvolvimento individual, que levam aos diferentes subtipos reunidos sob o título geral
de “Estruturas Rígidas” – de acordo com o modelo bioenergético descrito no livro de
Lowen, O Corpo em Terapia.
114

MULHERES: A HISTÉRICA E A AGRESSIVA-MASCULINA

Na realidade presente, ambas têm um desejo secreto por seus “queridos paizinhos”;
ambas são competitivas com as outras mulheres, e as odeiam; ambas são atraentes,
altamente organizadas, inteligentes, ou mesmo brilhantes. Ambas são geralmente “bem
sucedidas”, “realizadas”, etc. Ambas têm como background em comum, o conflito
edipiano não resolvido – entretanto elas têm corpo e atitudes muito diferentes.

A histérica tem um corpo muito harmonioso; não há grandes incongruências. Enquanto


que a agressiva-masculina tem um tórax fraco e rígido, reminiscente da oralidade; e uma
pélvis muito grande, frequentemente maciça, reminiscente do masoquismo. Existem
“estruturas divididas”, como diz J. Pierrakos, que as define brilhantemente em seu
trabalho A Condição da Mulher Moderna (The Plight of the Moder Woman). A histérica é
reservada, às vezes, até um pouco tímida, raras vezes é abertamente agressiva – na
realidade, ela dá a impressão de uma perfeita princesa real, algumas vezes orgulhosa,
geralmente arrogante, aristocrática, sempre muito sedutora. A agressiva-masculina
também pode ser uma princesa – mas ela é agressiva de modo muito mais aberto. As
diferenças de comportamento são os diferentes níveis de agressão expressa – a histérica
é muito mais inibida que a agressiva-masculina.

Eu acredito que a razão disto é que a agressividade da histérica foi seriamente inibida,
certamente pela mãe, provavelmente também pelo pai. Mas, mesmo que somente a mãe
(progenitora do mesmo sexo) tenha reprimido sua agressividade, ela se defrontou com a
rejeição dos dois progenitores – o seu pai a rejeitou por causa de sua sexualidade, a sua
mãe por causa da sua agressividade. Mãe e pai estavam intimamente ligados, formando
uma frente unificada. A ameaça de perda de amor/abandono veio dos dois progenitores –
e ela foi forçada a reprimir tanto a sexualidade, como a agressividade. Isto deixa pouco
espaço para a auto-expressão – daí as atitudes manipuladoras, sedutoras, reservadas e
contidas. Com sua irmã, a agressiva-masculina, foi o contrário. Sua mãe permitiu um grau
muito maior de agressividade. Talvez porque ela fosse fraca, ou ausente (fisicamente,
emocionalmente, ou ambos), o que fica expresso no peito oral. Ou então, apenas porque
ela usasse a criança contra seu marido. De qualquer forma, a agressão da garotinha foi
aceita a um nível muito maior.
115

Assim, na vida adulta, ela será uma pessoa que vai a busca do que quer – agressiva,
direta, arrebatada. Ela será muito competitiva – sua mãe permitiu, e até encorajou esse
traço. Ela terá desprezo por outras mulheres, e possivelmente por sua própria
feminilidade e/ou sexualidade. Porque sua sexualidade foi reprimida, e isto é visto
fisicamente, na pélvis maciça, e na ausência de orgasmo.

A agressividade livre, combinada com a sexualidade reprimida, que é a via normal de


liberação de energia excessiva, resulta numa tremenda quantidade de energia disponível,
que ela frequentemente tenta segurar, porque tem medo de soltá-la. Mas a energia e sua
expressão agressiva são, quando muito, suprimidas – em contraste com a histérica, cuja
agressão é muito mais inibida, talvez até completamente reprimida.

Quando a mãe permitiu a agressão, ela também se aliou à filha, proporcionando um


ambiente seguro. A criança não estava mais ameaçada pelos dois progenitores, já que a
mãe estava do seu lado. Ela pode ter continuado competitiva, rancorosa, e com ódio de
sua mãe – mas subjacente a tudo isto, estava a forte e segura aliança, uma certeza de
que a mãe não a abandonaria completamente, não importando o que acontecesse.

A identificação com a figura feminina foi possível, mesmo através da culpa da situação
edipiana. Como já foi dito, havia frequentemente uma aliança entre mãe e filha, contra o
pai. Ao contrário da histérica, que se defrontou com uma “frente unificada” – a mãe e o pai
estavam juntos, e foram igualmente repressores. Ela teve que reprimir tanto a
sexualidade, quanto a agressividade.
116

HOMENS – O FÁLICO-NARCISISTA E O PASSIVO-FEMININO

O pai do homem fálico-narcisista permitiu, e talvez tenha ate apoiado, a agressividade de


seu filho. Apesar de a criança ter sofrido com a culpa, por odiar seu pai (o conflito
edipiano clássico), ela o atacou, na tentativa de conquistar a mãe. O pai, mesmo sem
compreender a dinâmica, tolerou, e até apoiou seu filho, proporcionando a segurança
necessária para o completo desenvolvimento do princípio agressivo na criança.

Mais tarde, o homem fálico-narcisista não terá problemas em expressar sua agressividade
– sua dificuldade será sexual. Apesar de eretivamente potente, o homem fálico-narcisista
é, em geral, orgasticamente impotente. Ele pode ter ereções e ejacular, mas ele odeia a
mulher, tem medo do poder destrutivo que (em sua imaginação) ele próprio possui, e mal
consegue suprimir seu ódio, suprimindo, assim, seu amor e, em última análise, a
verdadeira descarga orgástica total, que implica em abandono involuntário do controle do
ego.

O pai do fálico era geralmente gentil com seu filho – e descobrimos clinicamente que o
fálico adulto odeia abertamente os homens, e é muito agressivo com as mulheres (sendo
que essas atitudes são usadas para encobrir seu desejo, suas necessidades, sua
capacidade de dar, amar, e ser alegre).

Em contraste, o pai do passivo-feminino aliou-se à sua mãe – por hostilidade, fraqueza,


medo, ou outra razão, isto não tem importância. O importante é que o pai reprimiu a
agressividade, e algumas vezes foi muito brutal neste ponto. Com a sexualidade inibida
pela mãe, e a agressividade pelo pai, cria-se a necessidade de muito maior repressão, do
que no caso do fálico, e, frequentemente, a criança tenta regredir a um estágio de
desenvolvimento anterior, e mais seguro.

Isto explica o forte componente anal compulsivo destes homens que, na realidade,
abandonaram parcial, ou totalmente, a posição sexualmente agressiva do fálico; e é
também a causa das tendências masoquistas (em oposição ao sadismo do fálico) e da
configuração do corpo. A passividade e homossexualidade latente dos homens
passivos-femininos são vistas como uma tentativa de aplacar o homem/pai, e
assegurar-lhe que eles não são perigosos – sexual ou agressivamente.
117

É claro que, a um nível mais profundo, eles odeiam verdadeiramente o homem – muito
mais intensamente que o fálico, cuja agressividade é aberta, e encobre um desejo mais
profundo.

Resumindo: a agressão é, então, a variável determinante na postura caracteriológica final


do rígido. Se ela é permitida, ou apoiada, pelo progenitor do mesmo sexo, ela pode ser
expressa, o processo de identificação pode continuar, e o resultado é o homem fálico, ou
a mulher agressiva-masculina. Se ela é seriamente inibida, um nível muito maior de
repressão é exigido, e uma personalidade mais inibida resulta daí. Este é o caso da
histérica, e do homem passivo-feminino.
118

ETIOLOGIA DA AGRESSÃO SEXUAL

I. HOMEM

a. A mãe sedutora conspirou com o garotinho, deu-lhe apoio contra o pai, fez dele
“seu homenzinho”, transferiu sua sexualidade frustrada para ele – levando ao
fálico-narcisista. O pai é disciplinador, duro, mas amoroso. O pai inibe a agressão,
a mãe a redireciona contra o pai, e conspira com a criança.

b. A mãe sedutora tem medo do pai; a princípio é sedutora, depois fica assustada. Ela
trai o garotinho com o pai, alia-se ao pai contra a criança – levando ao passivo-
feminino. Ambos reprimem a agressão.

II. MULHER

a. O pai sedutor conspirou com a filha contra a mãe. Deu-lhe apoio contra a mãe –
levando à agressiva-masculina; um dos pais inibiu a agressão, o outro é
fraco/ausente. O pai redireciona a agressão contra a mãe, conspira com a criança.

b. O pai, sedutor a princípio, promete, depois trai a filha, aliando-se à mãe. Ambos
reprimem a agressão – levando à histérica.

As estruturas edipianas diferem das pré-edipianas, na medida em que o pai é tão


importante quanto a mãe, na criação de defesas caracteriológicas. Antes do conflito
edipiano, a mãe predomina claramente, mas depois dele, pai e mãe chocam-se
igualmente com a criança.
119

SEXUALIDADE AGRESSIVIDADE

1. O pai seduz a criança, e depois “corta”. a. Pai e mãe usam a criança um contra o
MULHER. outro. O pai conspira com a zanga da
criança, redirecionando-a contra a mãe –
mulher agressiva-masculina: desprezo
pelas mulheres, dependência edipiana do
homem (não resolvida).

b. Pai e mãe juntos contra a criança. Ambos


reprimem a hostilidade da criança –
mulher histérica: sexo e agressão
reprimidos.

2. A mãe seduz a criança e depois “corta”.


HOMEM c. Mãe e pai usam a criança um contra o
outro. A mãe redireciona a zanga da
criança para o pai. A mãe conspira com a
criança contra o pai, prometendo
(dissimuladamente) o amor edipiano.
Torna a resolução edipiana impossível,
pois a promessa é constantemente
adiada – homem fálico-narcisista:
somente a sexualidade é reprimida, a
agressão, não; essa agressão é quase
aberta com relação às mulheres, e mal
suprimida (expressa com desprezo) com
relação aos homens.

d. Mãe e pai repressivos. Não permitem


emoções negativas. A criança se sente
traída pela mãe, odeia o pai. Precisa
reprimir tanto a sexualidade, quanto a
agressividade – homem passivo-feminino.
120

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