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30/01/2018 A função pedagógica da retórica: a racionalidade que negocia distâncias

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ARTIGOS

A função pedagógica da retórica:


a racionalidade que negocia distâncias

Rita Pimenta1

Resumo: É usual, quando o que está em questão é o ensino de Filosofia, termos


que enfrentar noções acerca do descrédito de sua utilidade. Neste ensaio, que
tem por objetivo discutir a função pedagógica da retórica, enfrentamos de modo
similar a dúvida a respeito de sua utilidade e, no caso da retórica, sua legitimidade.
Tais dificuldades, infelizmente, justificam-se não porque a dúvida mencionada
tenha qualquer fundamento que a confirme, mas, fundamentalmente, porque
o que se sabe a respeito da retórica e, de modo mais abrangente, a respeito do
movimento sofista, restringe-se àquilo que nos contou Platão. Para atingirmos
aqui nosso objetivo, coube, primeiramente, procurarmos explicar o que foi a
retórica, dirimindo alguns dos principais equívocos que a colocam em uma
condição de menor ou quase nenhum valor formativo. Assim, neste artigo,
apresentamos uma discussão acerca da retórica e sua história, mostrando de que
modo podemos dar mais atenção às estratégias retóricas que, como professores,
recorrermos em nossas aulas, debates, exortações aos nossos alunos e alunas.

Palavras-chave: Argumentação. Filosofia da Educação. Pedagogia. Persuasão.


Retórica.

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1 Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista “ Júlio de Mesquita Filho” (UNESP).
Professora de Filosofia da Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz
de Fora. E-mail: ritapimentar@yahoo.com.br
APRENDER - Cad. de Filosofia e Psic. da Educação Vitória da Conquista Ano IX n. 14 p. 113-129 2015

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The educational function of rhetoric: the rationality dealing distances

Abstract: It is usual, when what is at issue is the teaching of Philosophy, terms


that confront notions about the discrediting of its usefulness. In this essay,
which aims to discuss the pedagogical function of rhetoric, we face a similar way
to doubt as to its usefulness and, in the case of rhetoric, its legitimacy. These
difficulties, unfortunately, are justified not because the mentioned question has
no basis to confirm that, but fundamentally because what is known about the
rhetoric and, more broadly, about the sophistic movement, is limited to what
told us that Plato. To achieve our goal here, fit, first, seek to explain what was
the rhetoric, settling some major mistakes that put them at a lower status or no
educational value. So in this article, we present a discussion of rhetoric and its
history, showing how we can give more attention to the rhetorical strategies that,
as teachers, we turn in our classes, debates, exhortations to our boys and girls

Keywords: Argument. Philosophy of Education. Education. Persuasion.


Rhetoric.

A retórica: arte, discurso e persuasão

A questão que tem conduzidonossos estudos é sabermos de


que modo a função pedagógica da retórica, entendendo-a como uma
racionalidade, pode ser ensinada no âmbito das discussões realizadas na
disciplina de Filosofia da Educação. Defendemos a importância de os
futuros professoresse aproximarem de uma das mais antigas tradições
do mundo ocidental, a retórica, a fim de aprenderem a negociar, com
seus alunos, as distâncias cognitivas e afetivas que ocorrem na relação
ensino-aprendizagem.
Considerando o vínculo essencial que há entre a palavra e o
homem, não podemos descuidar, na apresentação desta história, do
debate que Vernant realiza acerca da constituição da pólis grega. Vernant
(1984) mostrou que a pólis, após a queda do Império Micênico, no
qual o anax centralizava o poder, passou a ter por base o agôn, isto é, a
disputa oratória, o combate de argumentos, cujo teatro é a ágora, a praça
pública, o lugar de reunião. Os que se medem pela palavra, os que opõem
discurso contra discurso, formam, naquela sociedade hierarquizada, um

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grupo de iguais. Diferente do Império, as construções urbanas não são


mais edificadas em torno do palácio, a cidade centraliza-se na ágora e essa
centralização dá sentido pleno ao termo pólis.
Vernant afirma ainda que, para a constituição da pólis, três
características foram fundamentais. A primeira, a extraordinária
preeminência da palavra sobre todos os outros instrumentos de poder.
Ela se torna o instrumento político por excelência e a chave de toda a
autoridade no Estado (pólis). A palavra deixa de ser ritual, assume outra
força no debate contraditório, na discussão, na argumentação. Ela supõe
um público ao qual se dirige e este encarna a figura de um juiz que decide
em última instância. Tal decisão, marcadamente humana, mostra a força
de persuasão do discurso vitorioso.
Na pólis, todas as questões de interesse geral são submetidas ao
debate, por isto há uma relação estreita entre a política e o lógos. “A arte
política é essencialmente exercício da linguagem; e o lógos, na origem,
toma consciência de si mesmo, de suas regras, de sua eficácia, através de
sua função política” (VERNANT, 1984, p. 35). Tal prática faz-se perceber
pelo diálogo e só é possível graças ao entendimento da força da palavra.
Entre outros acontecimentos, é pela palavra que se assegura,
naquela Grécia, o advento da Filosofia. É certo que este conhecimento,
ao nascer, exprime-se de forma paradoxal pois, como diz Vernant (1984,
p. 41), “aparentar-se-á ao mesmo tempo às iniciações dos mistérios e às
controvérsias da ágora; flutuará entre o espírito de segredo próprio das
seitas e a publicidade do debate contraditório que marcará a atividade
política”. A Filosofia nasce, então, marcada por esta ambiguidade, da
qual, segundo Vernant, nunca se libertou inteiramente. Isto porque,
o filósofo sempre se move entre duas atitudes: ora afirma-se como
o único qualificado para dirigir o Estado, apresentando-se como Rei-
Divino, que organiza e governa a pólis; ora se recolhe em uma sabedoria
estritamente privada, de renúncia à vida pública, para encontrar a salvação
pelo conhecimento e contemplação. Esta hipótese de Vernant pode ser
contrariada, caso consideremos os sofistas como parte da confraria dos
amantes do saber, o que não era admitido por Platão.

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Os sofistas, partícipes do surgimento da Filosofia, estavam


afastados do paradoxo apontado por Vernant. Isto porque integravam-se
inteiramente na vida pública e utilizavam a palavra – mais especificamente
a arte retórica – como técnica para o exercício do poder na cidade.
A arte (tékhné) retórica, desenvolvida pelos sofistas, anatemizada por
Platão, tem seu tratado escrito por Aristóteles, que, segundo Enrico Berti
(1998), a entende como uma forma de racionalidade que tem por hábito
(disposição ou capacidade) a produção de objetos.
Berti (1998, p. 158) chama nossa atenção para o seguinte trecho
da Ética a Nicômaco, que explicita o que vimos dizendo, “a arte concerne
ao vir a ser e é o inventar (totekhnázein), isto é, o estudar (theoréin) de qual
modo vêm a ser algumas das coisas que podem ser e não ser, mas cujo
princípio está naquele que produz e não no produto (VI 4, 1140 a 10-
14)”. Portanto, Aristóteles entende a retórica como técnica que produz
os elementos para persuasão, como a “arte dos discursos” (Retórica, I,
1, 1354a), isto é, arte de produzir discursos, mais precisamente discursos
persuasivos (pisteis), aquele que se serve da argumentação explícita. Por
isso, segundo Berti (1998, p. 167), “representa uma verdadeira forma
de racionalidade”.
Aristóteles, aos vinte e dois anos já discutia em um diálogo
intitulado Grilo, se a retórica é ou não uma arte (BERTI, 1998). O
interesse de Aristóteles pela retórica inicia-se, provavelmente, no interior
da Academia – escola fundada por Platão em 387 a. C. – num curso no
qual observa um vínculo entre retórica e política. De fato, Aristóteles
determinou um novo sentido para esta técnica entendendo-a como arte
da comunicação. Arte que influenciará, por exemplo, a chamada Filosofia
analítica que se desenvolveu na Grã Bretanha nas primeiras décadas do
século XX.
Em suma, a primeira característica que possibilitou a constituição
da pólis grega foi o predomínio da palavra sobre todos os outros
instrumentos de poder. A segunda, foi a implementação da publicidade
para as manifestações mais importantes da vida social eé por isso que a
discussão, a argumentação e a polêmica tornaram-se as regras do jogo
político e intelectual.

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Para Vernant (1984, p. 36), a palavra era formadora do instrumento


da vida política, sendo que “a escrita que vai fornecer, no plano
propriamente intelectual, o meio de uma cultura comum e permitir
uma completa divulgação de conhecimentos previamente reservados ou
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interditos”. A terceira característica é a ideia de unidade, de semelhança.


Para os gregos, só os semelhantes podem encontrar-se mutuamente
unidos na philia (phíloi, amigos, aliados; aqueles com quem se faz
frente comum). Mesmo havendo oposição na vida social, os cidadãos
constituem-se, no plano político, em unidades permutáveis no interior
de um sistema, cuja lei é o equilíbrio, e a norma, a igualdade. Por este
entendimento, estabelece-se a isonomia, a igual participação de todos os
cidadãos no exercício do poder. A experiência social tornou-se, entre os
gregos, o objeto de uma reflexão positiva, pois se prestava, na cidade, a
um debate público. Assim,

a razão grega se formou tanto no comércio humano com as


coisas, quanto nas relações dos homens entre si. Desenvolveu-se
menos através das técnicas que operam no mundo que por aquelas
que dão meios para domínio de outrem e cujo instrumento
comum é a linguagem: a arte do político, do retor, do professor.
A razão grega é a que, de maneira positiva, refletida, metódica,
permite agir sobre os homens, transformar a natureza. Dentro
de seus limites, como em suas inovações, é filha da cidade
(VERNANT, 1984, p. 95).

Estas características da pólis mostram a possibilidade de o homem


constituir-se em ser político por meio das condições próprias do diálogo, no
debate político, no qual a semelhança dos cidadãos –isonomia – realiza-se
pela palavra e pela publicidade. Aristóteles enfatiza a relação existente
entre política e retórica quando diz: “De sorte que a retórica é como
que um rebento da dialética e daquele saber prático sobre os caracteres
a que é justo chamar política. É por isso também que a retórica se cobre
com a figura da política” (Retórica, Livro I, 2, 1356 a).
Mas, o que é um ser político? É viver numa coletividade (ethos),
condição que adquire significado quando comunga tanto da ética quanto

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da estética e que se concretiza por meio da força da palavra. Dessa


perspectiva, a análise da linguagem não prescinde o homem político,
este ser da pólis, forjado no que lhe é peculiar: a capacidade do discurso,
que o qualifica em qualquer argumentação por sua capacidade de ora ser
orador, ora ser auditório e deliberar.
E o que cabe a cada uma dessas posições? Para ser orador, a
necessidade de conhecer o seu auditório, seus valores, seus costumes, o
que é capaz de proporcionar emoção, o seu pathos, enfim, no que este
auditório está disposto a acreditar, tendo em mente que o auditório
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age como um juiz e não estará passivo às premissas do orador. Para


o auditório, como já adiantamos, cabe julgar os argumentos, analisar
o orador, seu caráter, seu ethos. Certamente, tudo isso se dá a partir de
uma racionalidade que é argumentativa, do ponto de vista ético, estético,
político.
Quanto à retórica, ela é uma técnica, e, portanto, é funcional, por
buscar resultados, e, ao mesmo tempo, uma contrapartida da dialética, ou
seja, é uma forma de argumentação comparável à dialética considerada
no seu sentido primeiro: o do diálogo.
A retórica surgiu na Sicília, no século V a. C., após a queda
de Hiéron e Gélon, tiranos de Siracusa. Estes tiranos proibiram o
debate político, os discursos, como é comum nas tiranias. Uma revolta
democrática derrotou-os, buscando reaver as terras que eles distribuíram
aos seus mercenários. Nesta situação de restauração da vida social
democrática surgiu uma série de litígios para recuperar as terras. Foi
quando os sicilianos Córax e Tísias perceberam a importância da palavra
e escreveram os primeiros manuais de retórica, em 460 a. C., para ensinar
os que necessitavam fazer frente aos litígios. Já se pode notar o caráter
democrático da ação de Córax e Tísias, pois fornecem a todas as pessoas
os instrumentos necessários para conduzirem suas disputas.
O estabelecimento da arte ou técnica retórica, como tal ensinável a
quem se disponha a aprender, busca estabelecer os modos de argumentar
que permitem acordos, a negociação das diferenças entre os litigantes. A
retórica consolidou-se com o advento da pólis grega, mais concretamente

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com a democracia ateniense, na qual falar era essencial para persuadir e


convencer nas assembleias e praças públicas, assim como nos tribunais
e encontros sociais.
Os principais representantes da retórica grega foram os sofistas
– sábios, professores –, que acreditavam que a arte (tékhne) de persuadir
pode ser ensinada, como se dá com qualquer técnica. Mesmo os que
pouco conhecem filosofia sabem que os sofistas são ardilosos, seus
discursos persuasivos nos enganam, logo a sofística deve ser banida.
O que não sabem é que Platão foi o principal construtor dessa
representação dos sofistas, em nome de uma tomada de posição que
separou a retórica da filosofia, esta considerada um conhecimento dos
verdadeiros significados do mundo. Para ele, há dois tipos de retórica:
a dos sofistas, que se dispunham a persuadir qualquer um, e, por isso,
não teriam honestidade intelectual; e, uma outra, interessada na verdade
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e, por isso, se aproximaria da dialética, a qual sempre alcança a verdade.


Esta foi, digamos, uma primeira fase da retórica. A segunda fase
tem início com Aristóteles, que tem o mérito de reorganizar e sistematizar
a retórica como arte que visa descobrir os meios para persuadir um
determinado auditório.
Aristóteles distinguiu duas condições retóricas: uma, a da ciência
demonstrativa, que trata do necessário e evidente, tendo por auditório
o universal; e, uma outra, na qual o discurso persuasivo tem por objeto
o verosímil, ou provável, que procura persuadir um determinado tipo
de auditório, um auditório particular. Aristóteles apoia-se no método
dialético para escrever sua arte retórica (ARISTÓTELES, Tópicos, Livro
I, 1, 100a), ou, como dizem Perelman e Olbrechts-Tyteca (1996, p. 5),
examina as provas dialéticas nos Tópicos e mostra a utilização das mesmas
na Retórica.
Aristóteles entende que o principal na retórica é a arte das provas, ou
seja, a habilidade de discernir, em cada questão, o que é apto a persuadir
o auditório. Neste sentido, a dialética e a retórica são uma contraparte
da outra, pois são faculdades que fornecem argumentos, ou

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A retórica é a outra face da dialética; ambas se ocupam de


questões mais ou menos ligadas ao conhecimento comum e não
correspondem a nenhuma ciência em particular. De fato, todas
as pessoas de alguma maneira participam de uma e de outra,
pois todas elas tentam em certa medida questionar e sustentar
um argumento, defender-se ou acusar (ARISTÓTELES, Retórica,
Livro I, 1, 1354a).

Todas as vezes que acusamos ou defendemos (judiciário),


aconselhamos ou desaconselhamos (deliberativo), censuramos ou
elogiamos (epidítico) estamos fazendo retórica, já que utilizamos gêneros
desta arte. Na situação retórica o orador não se propõe demonstrar, o
que é uma atividade própria da analítica. Por isso, tanto a retórica quanto a
dialética operam por meio de proposições contrárias, buscando estabelecer
os princípios que se julgam adequados a um assunto, tema, objeto, a
partir dos quais constituirão conhecimentos partilhados e considerados
corretos. Estes conhecimentos, depois, devem ser analisados de maneira
a organizá-los a partir de seus axiomas, encadeando-os de tal maneira
que possam ser ensinados, como se faz com a Geometria, por exemplo.
Na situação retórica, a preocupação não está centrada na verdade, pois
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cabe à ciência tal preocupação.

Além disso, nem mesmo que tivéssemos a ciência mais exata nos
seria fácil persuadir com ela certos auditórios. Pois o discurso
científico é próprio do ensino, e o ensino é aqui impossível, visto
ser necessário que as provas por persuasão e os raciocínios se
formem de argumentos comuns, como já tivemos ocasião de
dizer nos Tópicos a propósito da comunicação com multidões
(ARISTÓTELES, Retórica, Livro I, 1, 1355a).

A argumentação retórica vale-se de silogismos – inferências –


como em qualquer outra situação. Mas, o silogismo da retórica, o entimema,
tem características próprias, uma vez que suas premissas são sempre as
que o auditório considera prováveis, admitindo-as sem contestação. Daí
Aristóteles dizer (Retórica, Livro I, 2, 1357a):

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De sorte que é necessário que o entimema e o exemplo se ocupem


de coisas que podem ser para a maior parte também de outro
modo: o exemplo como indução, e o entimema como silogismo,
formado de poucas premissas e em geral menos do que as do
silogismo primário. Porque se alguma destas premissas for bem
conhecida, nem sequer é necessário enunciá-las, pois o próprio
ouvinte a supre.

Isto porque deliberamos e refletimos sobre as ações, nenhum ato


é produto da necessidade, mas do contingente, assim os meios de prova
destes atos devem partir de proposições do mesmo gênero. Observe-se
que a retórica comporta os processos aptos para manter e suprir, até
certo ponto, a presença de espírito: é o que Aristóteles chama de lugares
(topói) ou linhas de argumentação ou conjunto de significados que uma
determinada comunidade partilha (éndoxa). Nos Tópicos são apresentados
os lugares dos quais são retirados os raciocínios dialéticos. Eis uma
recomendação de Aristóteles sobre tais procedimentos:

Quanto aos problemas mais frequentemente suscitados na


disputa é útil conhecer em profundidade os argumentos a aduzir,
mormente quando estão causa os princípios, pois, ao discuti-los,
os que respondem sofrem, muitas vezes, revés. Por outro lado,
convém dispor de abundância de definições, manejando as mais
prováveis e as que são primeiras, por ser através delas que os
silogismos se constroem. Também importa dispor dos lugares
comuns sob os quais os argumentos a maior parte das vezes se

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encontram, pois,
conhecimento dostalelementos,
como em Geometria é bom ser
e, em Aritmética, versado
saber no
na ponta
do dedo a multiplicação dos dez primeiros números – o que é
muito importante também para o conhecimento dos múltiplos
dos outros números – também nos argumentos é uma grande
vantagem deter os princípios e conhecer as premissas de cor
(ARISTÓTELES, Tópicos, Livro VIII, 14, 163b).

No Livro III dos Tópicos podemos encontrar uma série de lugares


comuns que tratam do mais optativo ou o melhor entre duas ou mais questões.
Segundo Aristóteles, “o mais durável e o mais estável é preferível ao que
for menos. É ainda preferível o que for escolhido pelo homem prudente,

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pelo homem bondoso, ou pela lei justa, ou por gente estudiosa enquanto
escolhe nessa qualidade” (Tópicos, Livro III, 1, 116a). Outro lugar comum
de argumentação diz que “o que tem categoria de essência é preferível
ao que não se acha neste gênero, a justiça, por exemplo, ao homem justo
porque uma é absolutamente o bem, enquanto o outro não é” (Tópicos,
Livro III, 1, 116a). Outro lugar comum: “o que mais se aproxima do bem
é melhor e preferível, isto é, o que se mostra mais semelhante ao bem, por
exemplo, a justiça, é melhor do que o homem justo” (Livro III, 2, 117b).
Encontramos nos Tópicosuma lista de lugares úteis no momento da
argumentação, mas não é só lá que Aristóteles indica esses topói, também
na Retórica os encontramos. Ao tratar do objetivo da deliberação sobre o
bom e o conveniente, diz: “Também é bom o que a maioria deseja e o que
parece digno de ser disputado; pois o que todos desejam é sem dúvida
bom, e ‘a maioria’ representa aqui ‘todos’. É também bom o que é objeto
de elogio, visto que ninguém louva o que não é bom” (Retórica, Livro I,
6, 1363a). Ainda na Retórica lemos: “Em geral: o difícil é melhor do que
o fácil, porque é raro; e, ao contrário, o fácil é melhor do que o difícil,
por ser o que desejamos” (Livro I, 7, 1364a). Eis porque Perelman e
Olbrechts-Tyteca (1996, p. 94) ficam autorizados a dizerem que os lugares
podem servir para fundamentar valores ou hierarquias, ou reforçar a
intensidade da adesão que eles suscitam.
Assim, a “retórica não encontrará teoricamente o provável para
cada indivíduo, mas sim o provável para os homens desta ou daquela
condição, e nisso se assemelha à dialética”, e que esta arte “estriba em
fatos que já estamos habituados a pôr em deliberação” (Retórica, Livro
I, 2, 1357a) porque, do contrário, as coisas serão admitidas pura e
simplesmente.

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A retórica no século XX: a potencialidade de uma racionalidade


argumentativa

A retomada contemporânea da retórica, agora na forma de uma


teoria da argumentação, tem seu marco com a publicação, em 1958,
do Tratado da Argumentação: a nova retórica de Chaïm Perelman e Lucie

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Olbrechts-Tyteca. Nela, os autores vinculam a retórica e a dialética


gregas para constituírem uma teoria da argumentação. Nas palavras dos
autores, esta teoria é “uma ruptura com uma concepção da razão e do
raciocínio, oriunda de Descartes, que marcou com seu cunho a Filosofia
ocidental dos três últimos séculos” (PERELMAN; OLBRECHTS-
TYTECA, 1996, p. 1). Para Descartes, a evidência é a marca da razão,
considerando racionais somente as demonstrações. Perelman e Olbrechts-
Tyteca propõem uma concepção alargada de razão, uma racionalidade
argumentativa, que privilegia as características de um raciocínio prático
e mostra a aptidão da razão para lidar com valores, para organizar as
nossas preferências.
Mas o que levou Perelman a resgatar a retórica aristotélica? Em
1945, em sua obra Da justiça, Perelman estava inclinado a pensar que
nos julgamentos realizados pelo juiz existia uma lógica dos julgamentos
de valor. Ou seja, que o raciocínio jurídico era uma operação dedutiva a
partir de normas positivas expressas por meio de premissas necessárias.
Isto porque, segundo Perelman (1993, p. 14), para os positivistas, “os
juízos de valor não tinham qualquer valor cognitivo, qualquer valor
verificável”. Naquela obra, Perelman fundamenta uma noção de justiça
formal de inspiração logicista, regida pela regra de justiça, segundo a qual
os seres de uma mesma categoria essencial devem ser tratados da mesma
maneira. É a fase em que, para Perelman, os julgamentos de valor
apresentam-se como sendo arbitrários e insuscetíveis de tratamento
racional. Contudo, ao longo de suas pesquisas, Perelman (1993, p. 13-
14) começa a questionar-se: “como distinguir o que é essencial do que
o não é?”. Percebe que esta distinção não podia ser feita sem recorrer
a juízos de valor. E continua:

Seriam os juízos de valor primitivos, os princípios da moral e


de toda a conduta, puramente irracionais, expressão das nossas
tradições, dos nossos preconceitos e das nossas paixões? Em
caso de desacordo, apenas a violência seria capaz de resolver os
conflitos, e seria a razão do mais forte a melhor? Ou existe uma
lógica dos juízos de valor e, nesta hipótese, como constitui-la?
(PERELMAN, 1993, p. 13-14).
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A partir disso, o jurista e lógico polonês, naturalizado belga, dedica-


se à busca de “Como se pode raciocinar sobre valores?” (PERELMAN,
1993, p. 14), empreendendo a tarefa de achar uma lógica dos juízos
de valor. Ao final, Perelman e Olbrechts-Tyteca concluem não existir
“uma lógica específica dos juízos de valor” (p. 15) e, mais ainda, que o
que procuravam já fora desenvolvido “numa disciplina muito antiga e
atualmente esquecida e menosprezada, a saber, a retórica, a antiga arte
de persuadir e de convencer” (p. 15).
Os autores verificaram que ao se tratar do preferível, aceitável e
razoável “os raciocínios não são nem deduções formalmente corretas
nem induções do particular para o geral, mas argumentações de toda a
espécie, visando ganhar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam
ao seu assentimento” (PERELMAN, 1993, p. 15). Resgatando a retórica
aristoteliciana, Perelman e Olbrechts-Tyteca (1996) desenvolveram – no
Tratado da argumentação: a nova retórica – a ideia de que a lógica, caracterizada
pela demonstração, é mais uma forma de raciocínio, porém existe outra,
que, ao invés de demonstrar, utiliza-se da argumentação, sendo que esta faz
uso de uma série de recursos que procuram persuadir um determinado
auditório, o que é próprio da retórica.
A Teoria da Argumentação é, então, “o estudo das técnicas
discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesão dos espíritos
às teses que se lhes apresentam ao assentimento” (PERELMAN;
OLBRECHTS-TYTECA, 1996, p. 4). A preocupação de Perelman e
Olbrechts-Tyteca com os textos escolhidos como exemplos de suas
análises é a de apresentá-los das mais variadas formas, sem se deterem
nos discursos como unidades de uma estrutura e de tamanho mais ou
menos convencionalmente aceitos. Segundo eles,

todo discurso se dirige a um auditório, sendo muito frequente


esquecer que se dá o mesmo com todo escrito. Enquanto o
discurso é concebido em função direta do auditório, a ausência
material de leitores pode levar o escritor a crer que está sozinho
no mundo, conquanto, na verdade, seu texto seja sempre
condicionado, consciente ou inconscientemente, por aqueles
a quem pretende dirigir-se (PERELMAN; OLBRECHTS-
TYTECA, 1996, p. 7).

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A função pedagógica da retórica: a racionalidade que negocia distâncias 125

Na relação retórica encontram-se o orador (ethos) e o auditório


(pathos). Ethos e pathos, os quais se referem respectivamente às posições
do orador e do auditório frente ao discurso, a palavra (lógos), que os põem
na comunicação. Cada um destes elementos da relação só se revela em
sua totalidade, nenhuma parte pode ser superestimada, ainda que em
Perelman e Obrechts-Tyteca ocorra o predomínio do lógos, daí ser uma
teoria da argumentação, como mostrou Meyer (1994).
Argumenta-se para um auditório universal, um ideal regulatório,
ao qual os oradores se valem para atingir o maior número possível de
auditores ou leitores. Assim como o auditório universal é um ideal, o
mesmo se dá para o orador. No entanto, na prática, há diversidade de
auditórios e oradores, os quais buscam adaptar-se aos auditórios sempre
particulares e nunca passivos. O ideal regulatório, ou auditório universal,
expõe as características formais da argumentação, como é o caso dos
topói2 que independem dos auditórios e oradores.
Os koinóitopói, os “lugares comuns” usados tanto na argumentação
científica quanto na cotidiana – daí terem sido denominados “comuns” –
são linhas ou esquemas de argumentação, como anotamos anteriormente.
Argumenta-se a partir de um ponto de vista, de um lugar, como os da
quantidade e da qualidade. Os da quantidade afirmam que uma coisa vale
mais que outra por razões quantitativas, expressam ideia de estabilidade,
universalidade, objetividade e utilidade. Já os lugares da qualidade
enfatizam o singular, o único. Ambos os lugares tanto podem sustentar
posições dogmáticas quanto posições não dogmáticas. Perelman diz que
um mesmo objetivo pode ser realizado com o auxílio de lugares muito
diversos, e isso depende da situação argumentativa em que se está. Daí sua
teoria ser funcional e não apenas estrutural, pois é sempre em função da
situação que tal ou qual linha de argumentação se mostra adequada ou útil.
A linha de argumentação sustentada na quantidade nem sempre
é expressão necessária da universalidade, o mesmo se dá com a da
qualidade, ainda que, no geral, expressem as ideias indicadas acima.
Por exemplo, a ideia de alta qualidade de um time de futebol pode ser

2 As palavras “topos” e “lugar” são utilizadas normalmente. No entanto, uma


expressão mais clara para nós, os falantes contemporâneos, é “esquema de
argumentação”.

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126 Rita Pimenta

apresentada a partir da quantidade de vitórias que obteve, sem que, com


isto, se julgue que aquela equipe é desprovida de singularidade. É no e
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pelo discurso que podemos apreender o funcionamento das linhas de


argumentação comuns, bem como quando elas se tornam particulares a
um conhecimento, uma ciência, diria Aristóteles.
Perelman e Olbrechts-Tyteca propõem que as relações estabelecidas
pelos homens não são provenientes ou do cálculo ou do acaso, mas do
embate argumentativo entre si no dia a dia. Por esta razão é que podemos
afirmar que as premissas e conclusões são historicamente situadas. Ora, a
condição histórica das premissas não é menos verdadeira quando o que
está sendo considerado por nós são as questões educacionais.
Para Perelman e Olbrechts-Tyteca (1996, p. 21), o homem não
é uma tabula rasa, mas um indivíduo complexo com conhecimentos,
valores que devem ser levados em consideração. “Com efeito, como a
argumentação visa obter a adesão daqueles a quem se dirige, ela é, por
inteiro, relativa ao auditório que procura influenciar”.
Mais ainda, o auditório é sempre uma construção, uma delimitação
produzida pelo orador. É nesse sentido que uma argumentação, para ser
eficaz, deve levar em consideração os aspectos do auditório tais como: o
psicológico, o social ou o ideológico. É a partir daí que se percebe o papel
relevante do auditório e como este deve ser encarado na argumentação.
Para Meyer (1996, XXI), no prefácio ao Tratado da Argumentação: a nova
retórica, o trabalho de Perelman foi um considerável avanço teórico por
buscar um caminho “Entre a ontologia, dotada de uma flexibilidade oca,
mas infinita, e a racionalidade apodíctica, matemática ou silogística, mas
limitada” tomando “uma terceira via: a argumentação que raciocina sem
coagir, mas que também não obriga a renunciar à razão em proveito do
irracional ou do indizível”.

Considerações finais

Em nossas pesquisas, defendemos que a formação de professores


carece da compreensão e/ourevisão da retórica na sua condição de
sistema. Acreditamos que ela, a retórica, deva ser primeiro entendida

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como uma forma de racionalidade, ao lado da silogística, da dialética e


da poesia, depois como a arte (técnica) da persuasão.
Entender a retórica como uma forma de racionalidade significa
não a reduzir à arte do discurso bem-formulado, muito menos a uma
técnica do convencimento. Conforme Höffe (2008), Aristóteles, como
mostramos acima, foi o grande responsável pela sistematização da

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retórica. O Estagirita
prática, relativa ao fimvia a retórica
último do serconsiderando
humano, istoduas
é, à perspectivas:
felicidade, nãouma
no sentido normativo, mas no sentido empírico e outra perspectiva, a
cognitiva, não demonstrativa, é claro, mas uma cognição que beberia na
fonte do verossímil. Além disso, reconhecia a neutralidade de valor da
retórica, diferentemente de Cícero e Quintiliano.
Não pertencendo ao domínio das proposições necessárias, isto
é, das ciências demonstrativas, a verdade na retórica está comprometida
com as proposições válidas. O domínio da retórica é aquele que contém
“exatamente as coisas sobre as quais se tem de entrar em conselho
consigo mesmo ou com os outros (I 2, 1357a2ss)” (HÖFFE, 2008, p. 61).
Na direção apontada acima, Höffe (2008, p. 61) qualifica a retórica
como uma “teoria de racionalidade da vida”, pois ao tempo em que nela
não há qualquer referência a uma anticientificidade, é possível também
ver que Aristóteles não atribuiu valor somente ao logos, mas, também ao
ethos, o caráter do orador que o torna verossímil, e ao pathos, as paixões
que este orador amplia, estimula ou minimiza nos ouvintes. As paixões
ocuparão lugares fundamentais na racionalidade retórica, amplamente
utilizada por nós professores.
Na sistematização que Aristóteles realiza acerca do campo da
retórica, vemos uma investigação sobre a relação do orador, objeto do
discurso e ouvinte, bem como dos três gêneros de discurso público:
o judiciário, o deliberativo e o epidíctico e, conhecemos também uma
análise das condições psicológicas, éticas e políticas a respeito das quais
um orador pode despertar não somente o interesse a respeito de uma dada
questão, mas, além disso, pode negociar a distância entre os indivíduos
sobre essa mesma questão, tal como nos sugere Meyer (2007). É aqui,

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128 Rita Pimenta

no âmbito das negociações, que os professores também precisam se


reconhecer e cabe à Filosofia da Educação, além de provocar reflexões
sobre os fins da educação, investigar os modos pelos quais professores
e alunos negociam distâncias, para se fazerem entender.
A retórica comporta, segundo Reboul (2000), quatro grandes
funções: a função persuasiva, a função hermenêutica, a função heurística
e, finalmente, a função pedagógica. Nesta última, o relevante é que
a retórica, com as ferramentas que ela comporta, ensina-nos que o
discurso persuasivo implica a compreensão e a possibilidade da invenção
(descoberta) dos argumentos mais fortes, portanto, mais persuasivos.
Assim, quando um professor estabelece um plano de ação, encadeia

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30/01/2018 A função pedagógica da retórica: a racionalidade que negocia distâncias
argumentos de modo coerente, cuida do estilo, encontra as melhores
construções argumentativas e as figuras mais adequadas e fala com
entusiasmo, a questão que podemos fazer é: essas ações não são próprias
da retórica? Defendemos que o estudo da função pedagógica da retórica
permite ao professor explorar esta racionalidade e técnica em todas as suas
potencialidades formativas e humanas, pois “[...] aprender a arte de bem
dizer é já e também aprender a ser” (REBOUL, 2000, p. XXII).
Neste texto, propusemos recuperar a retórica em sua função
pedagógica, tomando como norteador desta função a seguinte orientação:
o que vale para produzir o discurso persuasivo, vale para sua análise,
permitindo a realização de uma crítica rigorosa dos mais diversos
discursos. Portanto, o resgate da retórica, em sua função pedagógica,
possibilita questionar os pensamentos que procuram alicerçar-se em
argumentos carregados de ideias supostamente inabaláveis.

Referências

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Lisboa: Guimarães Editores, LTD., 1987.

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Tradução e notas de Manuel Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto
e Abel do Nascimento Pena. Lisboa (Portugal): Imprensa Nacional,

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A função pedagógica da retórica: a racionalidade que negocia distâncias 129

Casa da Moeda, 1998. (Estudo Gerais, Série Universitária, Clássicos de


Filosofia).

BERTI, Enrico. As razões de Aristóteles. Tradução de Dion Davi Macedo.


São Paulo: Edições Loyola, 1998.

HÖFFE, Otfried. Aristóteles. Tradução de Roberto Hofmeister Pich.


Porto Alegre: Artmed, 2008.

MEYER, Michel. As bases da retórica. In: CARRILHO, Manuel Maria


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(Portugal): Edições ASA, 1994.

______. Prefácio. In: PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA,


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PERELMAN, Chaïm. O império retórico: retórica e argumentação.

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30/01/2018 A função pedagógica da retórica: a racionalidade que negocia distâncias
Tradutores:
Edições ASA,Fernando
1993. Trindade e Rui Alexandre Grácio. Porto (Portugal):

PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da


Argumentação: a nova retórica. Tradução de Maria Ermantina Galvão G.
Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

REBOUL, Olivier. Introdução à Retórica. Tradução de Ivone Castilho


Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

VERNANT, Jean-Pierre. As origens do pensamento grego. São Paulo: DIFEL,


1984.

Recebido em: 10 de abril de 2015.


Aprovado em: 01 de junho de 2015.

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