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FACULDADE ASSIS GURGACZ – FAG

Curso de Arquitetura e Urbanismo


Disciplina de Planejamento Urbano e Regional II
Professoras Denise Schuler e Michele Sedrez

BREVE HISTÓRIA DO URBANISMO


Solange Irene Smolarek Dias

1 INTRODUÇÃO

O termo “urbanismo” é um neologismo inventado há mais de um século. Este significado designa uma
realidade específica: o surgimento no final do séc. XIX de uma nova disciplina que se apresenta como uma
ciência e uma teoria da cidade “distinguindo-se das artes urbanas anteriores pelo seu caráter reflexivo e crítico
e pela sua pretensão científica”.

O termo “urbanismo“ passou a englobar uma grande parte do que diz respeito a cidade, obras públicas,
morfologia urbana, planos urbanos, práticas sociais e pensamento urbano, legislação e direito relativo a cidade.

O pensamento urbanístico moderno, é uma criação específica do espírito ocidental. É portanto essencial
reconstituir a evolução do urbanismo ocidental, no final do qual nascerá o urbanismo moderno.

Há duas fontes intelectuais do urbanismo moderno, ambas da Renascença. A primeira é a De re Aedificatoria,


de Alberti, que procura conceituar de maneira definitiva as regras racionais que propiciam uma criação
harmoniosa, tanto de uma casa quanto de uma cidade. A segunda é A Utopia, de More, primeiro modelo
espacial e ideológico completo de uma realidade futura.

Antes da afirmação de um discurso teórico autônomo que pretende fundar sob seu único domínio a realidade
urbana, desenvolve-se no Ocidente uma longa fase preparatória. É só de maneira progressiva que uma parte
da humanidade se distancia de uma visão do espaço urbano condicionada pela religião, pelo sagrado, por
práticas e representações sociais que por sua vez está em conformidade com uma determinada concepção de
mundo.

A antigüidade greco-romana contribui para amenizar os laços de dependência que ligam a religião à
organização do espaço constituído. Na Idade Média, embora toda a sociedade esteja imersa num ambiente
profundamente religioso, são as autoridades leigas que procuram estabelecer um domínio no espaço urbano. A
partir da Renascença, os fundamentos urbanísticos autônomos se encontram colocados, mas a ruptura com o
passado não está de fato consumada. Se a razão se impõe cada vez mais, a utopia está presente ainda nas
portas das cidades.

É a Revolução Industrial que engendra o urbanismo moderno, provocando uma rejeição efetiva das concepções
tradicionais da cidade e utilizando como recursos a utopia.

2 O URBANISMO DA ERA INDUSTRIAL

A Evolução Urbana nos Séculos XIX e XX

Se a população mundial aumenta prodigiosamente nos últimos dois séculos, o crescimento da população
vivendo nas cidades é mais rápido ainda. Enquanto a população mundial quadruplica após 1850, a população
urbana se multiplica por dez. Este grande inchaço é conseqüência dos progressos técnicos e científicos
realizados a partir da metade do séc. XVIII.

É a Europa ocidental que desencadeia o processo, logo seguida e posteriormente ultrapassada pelos Estados
Unidos

Nos países onde ocorre o progresso técnico, o aumento da produtividade do trabalho acarreta um aumento da
produção global, o que possibilita o crescimento demográfico e a elevação do nível de vida.
Paralelamente, a estrutura da população ativa se transforma. Enquanto no início do séc. XIX todas as nações
ocupam 80% de sua população no setor primário (agricultura), 8% no secundário (indústria) e 12% no terciário
(serviços), assiste-se nos países industrializados a uma verdadeira fundição do primário em benefício do
secundário e do terciário. Posteriormente, em função de um novo progresso da produtividade na indústria, o
secundário diminui por sua vez em benefício do terciário, que é o grande beneficiário do desenvolvimento
econômico.
Assim, nos países desenvolvidos, um número restrito de agricultores (5 a 10%) é suficiente para alimentar o
conjunto de habitantes. Ora, eles são 80% dois séculos antes. Isso significa que todos os excedentes, que
exploram as terras menos rentáveis, são obrigados a partir. O êxodo rural transforma-os, mesmo a contragosto,
em citadinos. O despovoamento do campo acarreta o aumento da população nas cidades.

A Gênese do Urbanismo Moderno

A Revolução Industrial, que nasce na Inglaterra, lança toda uma população operária nas cidades, que não estão
preparadas para acolhê-las. Resulta uma proliferação de cortiços. As famílias operárias amontoam-se em
locais estreitos e sem conforto em Lille, Liverpool e Manchester. Aos olhos dos contemporâneos, é toda a
cidade que está doente. Balsac classifica Paris de “cancro“. Médicos, filantropos, sociólogos, economistas,
romancistas, diante das epidemias e da delinqüência, vêem aí os frutos envenenados dos cortiços, as infeções
de uma cidade má, acusada de corromper a raça humana, de destilar o vício e o crime.

Uma série de pensadores repudia a noção tradicional de cidade e elabora modelos que permitem reencontrar
uma ordem perturbada pelo maquinismo. É desta pesquisa que nasce a principal corrente do urbanismo
moderno, a corrente progressista.

A Corrente Progressista

Baseia-se numa concepção abstrata do homem, indivíduo mutável no tempo e no espaço. A ciência deve
portanto permitir a definição exata de um modelo urbano perfeito que convenha a todo grupo humano.

Desde 1901 o arquiteto Tony Garnier elabora um plano da cidade industrial, onde se encontra quase tudo o que
está na base do urbanismo atual. Os “arquitetos racionalistas“ constituem, a partir de 1928 um movimento
internacional (CIAM - Congresso Internacional de Arquitetura Moderna). Em 1933 os arquitetos do CIAM
elaboram um manifesto doutrinal : “A Carta de Atenas“. Verdadeiro catecismo do urbanismo progressista, este
documento teve muitas idéias de Le Corbousier.

O urbanismo progressista é obcecado pela modernidade. A cidade do séc. XX devia ser de seu tempo, afirmar
a contemporaneidade de tudo aquilo que se traduz como o avanço da técnica: a indústria, o automóvel, o avião.

Há uma preocupação desvairada pela higiene, que se concretiza nas exigências de sol e verde.

A Carta de Atenas exige construções altas, afastadas umas das outras, isoladas no verde e na luz. Um outro
teorema do urbanismo progressista é a abolição da rua, denunciada como anacrônica, barulhenta, perigosa,
contrária aos imperativos de luminosidade e higiene. A Carta de Atenas exige que os imóveis sejam
implantados longe dos fluxos de circulação.

O modelo progressista fundamenta-se na análise das funções urbanas acompanhadas de zoneamento:


habitação, trabalho, lazer. A circulação é concebida como uma função distinta, independente em relação às
edificações, com diferenciação de vias segundo velocidades.

O esquema urbano é concebido para o homem-padrão. Em qualquer lugar do mundo. Tanto para as grandes
como para as pequenas cidades. Qualquer que seja o regime político ou o nível de desenvolvimento
econômico. Deste volume de realizações surgem Chandigarh, a partir dos planos de Le Corbousier e Brasília,
com planos de Niemeyer. Encomendados pelos presidentes Neru e Jucelino, respectivamente, constituem
grandiosas manifestações do urbanismo e da estética progressistas.

Edifícios públicos gigantescos que dominam imensos espaços vazios constituem uma escultura urbana de
inspiração cubista, à base de volumes geométricos simples. Em Brasília os bairros habitacionais não diferem
muito dos conjuntos habitacionais de Singapura, Paris e Moscou.
As Dificuldades : O Urbanismo Contra a Cidade.

O modelo urbanístico dominante é hoje amplamente contestado. Paralelamente, a cidade saída do passado,
contra a qual foram dirigidas as ironias e as ofensas do urbanismo progressista, é objeto de uma reabilitação
que felizmente não é sempre póstuma.

Um urbanismo desumano. Esta é a principal crítica endereçada atualmente ao modelo dominante. Ë forçoso
constatar essa recusa pelo usuário das cidades modernas e do sistema de valores que lhes é subjacente. Cada
vez mais nossa sociedade recusa as caixas de habitação e o concreto que invade e que agride a cidade antiga
e desnatura os espaços rurais.

Contudo, isto de certa forma é inevitável, devido a evolução econômica e demográfica. No pós guerra, na
Europa, é necessário construir abundantemente em função das destruições, do crescimento demográfico e do
êxodo rural que acompanhava o crescimento econômico e o progresso social. Volta-se para uma produção
maciça de habitações sociais. Os grandes conjuntos habitacionais proliferam-se. Esse urbanismo, embora sob
certo ponto de vista insatisfatório, ao menos assegura à grande massa da população o benefício das principais
conquistas da técnica moderna tanto no sanitário quanto no econômico. Ë um grande resultado. Mas poder-se-
ia ter adotado fórmulas de habitat mais humanas.

O emprego do concreto e de outros materiais modernos é inevitável. Jamais se construirá como no passado,
em nome do qual nos regozijamos ou não. Os materiais e as técnicas modernas permitem um grande aumento
da produtividade: a construção necessita de bem menos horas de trabalho humano que outrora. No mais, o
metal e o concreto armado permitem alturas e cargas impossíveis para a pedra e a madeira. Esse aumento da
produtividade é algo excelente, pois o trabalho humano é caro nas sociedades industriais, mesmo quando é
pouco produtivo.

Se a produtividade na construção não tivesse aumentado nos últimos cem anos, não se pagaria aos operários
como se paga atualmente. E, como o número de horas de trabalho necessárias para um dado edifício teria
permanecido bastante elevado, a construção seria bem mais cara: viveríamos cinco em cada cômodo. Para
subsistir nas sociedades industriais, a atividade da construção exige uma produtividade o mais alta possível.
Esse imperativo proíbe praticamente em nossos dias o emprego de material tradicional, desuniforme, lento para
separar, trabalhar e colocar no devido lugar.

A civilização dos cortadores de pedra e dos montadores de belos telhados está praticamente morta. Nós somos
uma triste civilização de empilhadores de tijolos furados, de concreto de estruturas metálicas. Tal é o prêmio
técnico, da nossa vida materialmente fácil e da nossa habitação decente.

Tudo isso está unido de maneira indissociável, e ninguém pode fazer nada, não mais os urbanistas e os
arquitetos que o comum dos mortais. Não é o emprego do concreto que se deve censurar no urbanista
progressista, mas o fato de ter erigido como dogma a superioridade estética intrínseca do concreto.

Sobretudo a grande culpabilidade do urbanismo progressista é de apresentar a cidade futurista, com seus
imóveis coletivos gigantes, formigueiros extremamente confortáveis com inúmeras células habitacionais, como
o lugar da felicidade perdida. De modo que quando chega a hora de construir bastante e depressa, arquitetos e
urbanistas, impregnados da ideologia progressista, julgam normal e desejável a realização de grandes
conjuntos. O grande pecado do urbanismo progressista é ter imposto o ideal não confesso de um universo
kafkiano, à base de espaços desestruturados e de gigantescas “máquinas de habitar“, para homens-máquina.

De Volta a Uma Concepção Mais Tradicional da Cidade

A cidade volta a ser moda, a cidade verdadeira, com ruas de pedestres, lojas, oficinas. Desde 1961, a socióloga
americana Jane Jacobs, analisando os prejuízos do urbanismo e da renovação urbana nos Estados Unidos,
mostra que o abandono da rua acarreta o desaparecimento das principais vantagens da vida urbana:
segurança, contato, formação das crianças, diversidade das relações. Ela acrescenta que a estrita aplicação do
princípio do zoneamento esvazia durante o dia os bairros habitacionais: reina então um sentimento de tédio que
reforça a padronização da arquitetura.

Quanto aos espaços verdes e terrenos circunvizinhos destinados a jogos nos conjuntos habitacionais, eles
favorecem a delinqüência de grupos adolescentes: lá eles encontram um espaço mais favorável que a rua para
seus delitos, pois eliminam a vigilância dos adultos. J. Jacobs observa que nos bairros sem atração para o
público, os parques não fazem mais que acentuar “o tédio, a insegurança e o vazio“. Para ela, o essencial é
refazer as ruas, que ela deseja vivas, animadas, comerciais, locais de sociabilidade e de segurança. Suas
idéias inspiram parcialmente a reordenação do centro de grandes cidades como Boston e Filadélfia.

Sociólogos e psiquiatras constatam que um bairro considerado deteriorado e insalubre pode revelar-se muito
mais sadio socialmente do que um bairro renovado pelos urbanistas; é o que testemunham as estatísticas
relativas aos distúrbios mentais, ao alcoolismo e à delinqüência.

A abolição da rua e sua substituição por grandes espaços vazios se traduzem por uma certa desintegração
mental dos habitantes, enquanto que uma forte estruturação do tecido urbano é, ao contrário, acompanhada de
uma forte estruturação psíquica dos habitantes.

O modelo urbano progressista, com seus grandes conjuntos habitacionais e seus espaços livres pode, portanto,
revelar-se favorável ao desenvolvimento da imoralidade. Se os bairros recentes respondem aos imperativos da
higiene e da salubridade física, sua arquitetura e seu espaço desestruturado podem ser fonte de angústia,
escondendo uma certa insalubridade psíquica.

A idéia de refazer as ruas ganha terreno a cada dia. “A cidade readquiriu coragem e passou a lutar. Fala-se
novamente das ruas. Fala-se da vida citadina“. Mas isso supõe tornar bastante flexível as regras do
zoneamento, que dissociam a função da habitação das demais funções urbanas. Senão, realizam-se somente
ruas mortas de cidades-dormitórios. E antes mesmo de dar vida às ruas a tarefa mais urgente consiste em
interromper a destruição das ruas existentes. Elas constituem um capital urbano que nos coloca na
incapacidade de substituir por qualquer coisa da mesma qualidade.

Um Problema sem Solução : O Gigantismo Urbano

Poucos temas têm tanta repercussão em nossa época como o dos aspectos negativos da megalópolis; caráter
inviável da grande cidade, problemas de circulação e de abastecimento, esgotamento nervoso dos habitantes,
poluição, etc.

De fato, as grandes aglomerações urbanas gigantes do século XX não possuem mais nada daquilo que no
passado chamava-se cidade. Enquanto cidades como Nova Iorque, Londres ou Paris expandem-se na escala
de uma região, outros agregados de zonas urbanas justapostas formam enormes conurbações, como a do Ruhr
na Alemanha, ou da costa leste dos Estados Unidos, invadindo imensos territórios.

Todavia, no início do século, grandes cidades como Londres e Paris ocupam ainda um espaço relativamente
limitado. Os seis milhões de habitantes da aglomeração londrina ocupam uma área num raio de 20 km ao redor
do centro: os quatro milhões de habitantes de Paris e de seus subúrbios concentram-se num círculo de 20 km
de diâmetro. Mas no período entre as duas guerras mundiais as duas capitais conhecem uma explosão
espacial sem precedentes: em Londres assiste-se à triplicação do espaço urbanizado.

Nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, as autoridades britânicas tomam plena consciência dos
inconvenientes que representa a concentração num espaço limitado de uma grande parte da população e da
infra-estrutura industrial do país. Segundo as conclusões do relatório Barlow (1940) é adotada, logo após a 1ª
guerra, uma política de descentralização industrial que se apoia na criação de cidades novas, tanto na região
de Londres quanto em outras partes da Inglaterra. O “Plano da Grande Londres“ , elaborado por Sir Patrick
Abercrombie, estabelece um cinturão verde ao redor da aglomeração existente e prevê a criação de oito
cidades novas a aproximadamente 40 km da capital.

Nas últimas décadas do séc. XX, há um prenúncio de crescimento desenfreado das metrópoles. No entanto, se
as metrópoles da Europa Ocidental e da América do Norte apresentam ora inconvenientes inerentes à sua
enormidade, elas são, por outro lado, o local de um alto nível de vida. Mas não ocorre o mesmo nas grandes
cidades da maioria de outros países.

Na Moscou comunista, um quarto da população vivia em apartamentos exíguos, muitos deles possuindo
apenas um banheiro e uma cozinha para várias famílias. Ë nos países do Terceiro Mundo que o gigantismo
urbano se revela mais assustador. Sua característica particularmente desumana resulta do imenso crescimento
demográfico do país onde a ciência e as técnicas médicas do Ocidente foram introduzidas artificialmente,
rompendo o equilíbrio existente entre fecundidade e mortalidade “naturais “.

O aumento populacional segue uma progressão geométrica pois há o crescimento do número de nascimento e
a queda da taxa de mortalidade. Contrariamente ao que se passou no Ocidente, o crescimento demográfico
precede o progresso econômico, ao invés de acompanhá-lo. Foi necessário, “a posteriori “, suscitar a
sobrevivência do excedente populacional.

A explosão urbana no terceiro mundo cresce assustadoramente. Caracas quintuplica sua população depois da
Segunda Guerra mundial. Em São Paulo, Lima e na Cidade do México ela triplicou. Em Argel e Teerã a
população triplicou e quadruplicou, respectivamente, nos últimos 20 anos do séc XX. O Cairo, concebido para
três ou quatro milhões de habitantes, conta aproximadamente com 10 milhões.

Menos ainda que as cidades européias do séc. XIX, as cidades do Terceiro Mundo não conseguem acolher as
massas humanas que para elas fluem. São rodeadas de imensos subúrbios feitos de favelas. Em Lima, 1/3 da
população vive em favelas. Mesmo Brasília possui suas favelas.

Em algumas destas cidades gigantes não existe nem mesmo eliminação de esgoto e coleta de lixo. Os detritos
acumulam-se na periferia em verdadeiras colinas sobre as quais vive um povo miserável de mendigos e das
quais retiram sua subsistência. Trata-se, portanto, no final das contas, de uma situação bastante pior que
aquela das grandes cidades ocidentais do séc. XIX. E os problemas se agravam ainda mais por alguns países
não poderem ou não desejarem interromper seu absurdo crescimento demográfico.

Se na Índia, no Zaire ou no Brasil deixa-se a pequena cidade para se amontoar nas favelas, é porque existe
diferença de nível entre as grandes cidades e o campo, totalmente incapaz de possibilitar a sobrevivência ao
enorme excedente populacional. Apesar de sua miséria dramática, a cidade gigante do terceiro mundo é o local
de esperança, onde talvez se tenha a chance de obter um emprego produtivo e, portanto, um salário.

3 CONCLUSÃO

Até a Revolução Industrial, apesar de uma evolução da imagem urbana, permanece válida a definição da
cidade dada pela Enciclopédia : “Um conjunto de edifícios dispostos em ruas e cercados por um muro comum“.

Com a chegada do progresso técnico e da civilização industrial, essa visão tradicional é superada,
multiplicando-se os problemas com os quais uma cidade se depara: crescimento demográfico, condições de
habitação da população operária e, sobretudo, enriquecimento global da sociedade, que se traduz pelo fato de
que cada um se beneficia com um espaço mínimo cada vez mais significativo, de objetos materiais cada vez
mais numerosos e complexos e de uma quantidade crescente de prestações de serviços.

Desses novos problemas nasce o urbanismo moderno, que se pretende uma ciência, mas que é na realidade
alimentado de utopias com caráter totalitário mais ou menos confesso. Em particular o urbanismo progressista,
cuja influência é predominante, decorre em grande medida de modelos utópicos como os de Fourier, veiculando
uma ideologia anti-urbana, que confunde a distinção tradicional entre espaço urbano e espaço rural. De modo
que o urbanismo progressista resulta paradoxalmente no que mesmo Marx preconiza, em nome de uma
ideologia anti-rural, a abolição da diferença entre cidade e campo e uma urbanização generalizada deste último.

Os resultados obtidos pelo urbanismo moderno são de um valor discutível, mas de uma amplitude arrasadora:
isto se deve não a uma suposta qualidade enquanto ciência, mas às possibilidades geradas pelos meios
técnicos que a civilização industrial coloca à disposição dos arquitetos, dos engenheiros e dos urbanistas.
Graças a esses meios, o urbanismo progressista prossegue, ao menos no Ocidente, a alojar decentemente os
homens.

Mas ele não prova que as vias utilizadas são as únicas nem as melhores. Elas constituem em todo o caso uma
negação e mesmo assassinato da cidade. Quanto ao espaço rural, ele é simplesmente abandonado no
percurso natural de uma urbanização difusa, que em uma geração o descaracteriza com construções de rara
mediocridade. A salvação do que resta ainda das paisagens e dos sítios constitui uma das tarefas prioritárias do
urbanismo atual e futuro.

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