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D1111Ul t RnBlnom

Clínica da Pul\ão
- a\ impul\õe\

TRADUÇÃO
André Luis de Oliveira Lopes

EDITOR
José Nazar
Copyright O Edidon<J Mmanli,,/

Trruw ORJGrNAL
Una Clinica d, !.a pubidn: la, inpubion<J, 1989

Direitos de edição cm língua portuguesa adquiridos pela


EorroRA CAMPO MATEMrco
Proibida a reprodução coral ou parcial

EorroRAçAo ELETRONICA
FA - Editoração Ektrônica

TRADUÇÃO
Andrl Luís d, Oliveira Lop"
REvrsAo
Darlenr V. G. Gaudio
EorroR REsroNSAVEL
Jo,INazar

CONSELl-10 EDITORIAL
Bruno Pa'4zzo Nazar
Jo,INazar
Josl Mdrio Simíl Conkíro
Maria Emília Lobato Luândo
Ttresa Pa/.azzo Nazar
Ruth Ferreira Basto!

Rio de Janeiro, 2004

FICHA CATALOGRÁFICA

Rll6c
Rabinovich, Diana 5.
Clínica da Pulsão - as impulsões / Diana 5.
Rabinovich ; tradução: André Luis de Oliveira Lopes ;
editor:José Nazar. - Rio deJaneiro: Companhia de Freud,
2004.
103 p.; 23 cm
Inclui bibliografia
ISBN 85-85717-72-6

1. Psicanálise. I. Nazar, José. II. Titulo


CDD-150.195

• d I t o r a

ENDEREÇO PARA CORRESPOND�NCIA


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Tel.: (21) 2263-3960 • (21) 2263-3891
Centro - Rlo de Janeiro
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Índice

Apresentação .......................................................................................... 7

Primeira conferência .............................................................................. 9

Segunda conferência ............................................................................ 35

Terceira conferência ............................................................................. 49

Quarta conferência .............................................................................. 67

Quinca conferência .............................................................................. 83

Referências bibliográficas ..................................................................... 99


R ecroacivameme, iornou-se claro para mim que escas conferências,
dedicadas espc,ialmcmc à funçáo do mais-de-gozar em sua relação com
a pulsão e o desejo, cinham rnmu eixo, além Jo inccrcsse próprio desces con­
ceicos, um problenu dinico frcq(kmc para aqueles que pracicam a psicanáli­
se, inclusive par.1 coJos .1qudcs que Jcvcm cnfrencar a demanda de um sujei­
co rujo sofrimcnco se aprescnca de forma vaga, imprecisa e que se cende a não
sustencar por csti mesma raz.ão. Duas descrições clinicas "clássicas" são aqui
crabalhadas em sua arriculação: as caracceropacias e as impulsões. Umas pare­
cem assimomáricas; oucras, como por exemplo a bulimia, são fáceis de defi­
nir a parrir de um cricério excerno, obesidade por exemplo, elidindo, desse
modo, a demanda subjetiva em jogo. Acreditamos poder formular, nesse
percurso, como ambas nos indicam a presença de uma cena sarisfação pulsional
que obsraculiza e freia o trabalho clínico com aqueles que se apresencam
dessa fo rma, precisamente enquanto inibe o desdobramento do desejo e da
cransferência. Por esca razão podemos, apres-coup. designar as impulsões e,
parcialmence, as caracteropacias como algumas das formas em que a pulsão se
faz presente na clinica, formas cuja invescigação escá aqui esboçada.
Excluímos des ce volume a última conferência dedicada ao conceico
de caráter em Freud, cuja primeira parte apareceu na revista Escansión, Nueva
&rie, N• 1, escando prevista a publicação da sua segunda e última parte no
segundo número da próxima edição.
Queria agradecer a colaboração que me ofereceu Diana Chorne no
�lccimcmo do texto da,a, conferencias a partir das cranscriçõcs, as
qua11 quiça ccriam, dA: ourro modo, pcrm1nccido como tais.
1

O rema dessas reuniões, cal como está formulado no titulo, "Pulsão, dese­
jo e mais-de-gozar" é, obviamente, muito ambicioso, e não poderemos
esgotá-lo. Minha idéia é, antes, reali,.ar algumas pontuações que se situam
no contexto do curso que dei sobre o conceito de objeto em psicanálise,
cuja primeira parte já foi publicada, e cuja segunda parte, espero, sairá
num futuro próximo; segunda parte na qual rearei o problema da causa
do desejo. Ficava então pendente o cerna do conceito de mais-de-gozar
em sua articulação com o objeto a, vale dizer, a articulação entre o gozo e
o objeto a.
O eixo do que é minha intenção desenvolver ao longo destas aulas é,
então, o conceito dessa função- termo que deve ser tomado em sua acepção
matemática moderna - que Lacan batizou "mais-de-gozar". Se prefiro
referir-me a ele como função é porque, a partir desta perspectiva, pode-se
desenvolver com maior precisão a relação entre o objeto a e a função da
causa do desejo e a relação entre o objeto a e a função do mais-de-gozar.
Desejo e gozo, desejo e pulsão apresentam-se, pois, tendo como dobradiça
essa dupla articulação do objeto a, por um lado com a função de causa do
desejo, por outro, com a função do mais-de-gozar. Cabe não esquecer que
ambas as funções remetem ao objeto a em sua dimensão de real.
Pode-se enfocar este tema a partir de muitas perspectivas e de diver­
sos àngulos. Precisamente, se o termo "mais-de-gozar" está acompanhado
no titulo por outras duu palavras, que são desejo e pulsão, isso se deve a
q� a função do mai1-dc-par i uma espécie de dobradiça entre o concei­
to de dacjo e o de pulllo.
ÜIANA 5. RABINOV!CH
/O

modo esquemático, poderíam os


Se não considerarem o que direi de
certo tempo, Lacan enfatizou o objeto como causa do
dizer que, d urante
(ainda que o problema do gozo já esteja presente no Seminário VII,
desejo
ia da articulação do objeto a com
com a teorização da Coisa). A importânc
real, oscilará entre duas
0 mais-de-gozar está em que o objeto a, como
dimensões: a dimensão da causa, da causa do desejo e a dimensão do mais­
de-gozar.
A primeira, como diz explicitamente seu nome, remete ao desejo
tanto em Lacan como em Freud. A segunda, por outro lado, é uma forma
particular de daboração de Lacan do conceito de objeto pulsional,
inseparável da definição do gozo como satisfação de uma pulsão.
Uma vez que temos presente esta definição do gozo como satisfação
de uma pulsão que, enquanto tal. envolve necessariamente o corpo (escla­
reço, o corpo comprometido pela ação do significa n te, não o organismo
biológico), esta definiç:io estabelece a diferença entre a n ecessidade biológi­
ca e a pulsão. Esce corpo inseparável do gozo, tardará baseante em ser
articulado com o objeto da pulsão na obra de Lacan.
No Seminário VII, A ética cú, psicanálise, o gozo é definido como a
satisfação da pulsão. Este seminário marca um corte ao introduzir a di­
mensão da satisfação pulsional em seu caráter de real, diferenciando-a as­
sim da dimensão imagi n ária - na qual viu-se delimitada inicialmente a
pulsão, e na qual o termo gozo já se faz presente (por exemplo, no Discurso
de Roma) - e da dimensão simbólica que se esboça tanto no Seminário II
como no próprio conceito mesmo de dema n da. Existe, pois, uma solidari­
edade entre os co n ceitos de gozo, corpo e pulsão em Lacan. Ao final do
percurso de Lacan o nó borromeano lhe permitirá articular estas crês di­
mensões do gozo. Mas este é um cerna que não teremos tempo de exami­
nar.
Neste mome n to, o gozo como satisfação da pulsão remete a um cor­
po atrave ssado pelo significa n te, mais
escritamente por essa cadeia
significante que é a demanda,
que se plasma n a fórmula da pulsão no grafo,
$ O D. Esse corpo é, por
excelência, sua sede, só se pode falar de gozo
enquanto gozo do corpo. Nã
o se trata do prazer de viver do organismo
bwlógico, fundando-se seu caráter
necessári o cm uma necessidade lógica e
não biológica.
UMA CLINICA DA PULSÃO

Se a saàsfação de uma pulsão é o gozo, por mais contingente que


seja, inicialmente, seu objeto no pensamento freudiano - mesmo que nele
também se torne necessário depois, através do conceito de fixação -, o
gozo nos remete, sem vacilação, a esse objeto pulsional.
Entre o objeto do desejo e o objeto da pulsão se delineia o lugar do
objeto a de Lacan. No Seminário XI, em resposta a uma pergunta de J .-A.
Miller, acerca da relação entre ambos, Lacan responde com uma afirmação
que é a bússola adequada para situar este problema. O objeto a apresenta
uma comunidade topológica no desejo e na pulsão. O objeto a é, pois,
sempre solidário de uma topologia que, por estrutura, recusa a delimitação
externo-interno, dentro-fora. Estabelece-se, pois, a especificidade da mes­
ma em relação ao desejo e a pulsão.
A dificuldade que: enfrc:nramos se situa, portanto, no intervalo que
vai intermediar o conceito de causa do desejo, em sua articulação com o
desejo, e o conceito de mais-de-gozar que se inclina até a vertente da satis­
fação pulsional. Podemos examinar esta dificuldade em termos freudianos.
Freud, sempre que falou de pulsão, enfatizou a palavra "satisfação"
(&friedigu ngem alemão), enquanto que, do lado do desejo, sempre enfaàzou
a palavra "realização" ( Wunscherfollung em alemão) - esta é sua tradução
tradicional para o castelhano - o "cumprimento" do desejo - tradução
que se encontra na edição da Amorrortu. Evidentemente, cumprimento
ou realização do desejo não é o mesmo que satisfação da pulsão.
O problema de como se articulam estes dois termos está no centro
das dificuldades freudianas a respeito das articulações entre o Isso e o in­
consciente. Isto determina que Lacan, à medida que sua teorização vai
progredindo, ofereça distintas abordagens da relação Isso-inconsciente, que
remetem, precisamente, à abordagem diferencial do desejo e da pulsão.
Estou lhes dando um marco muito geral porque, de qualquer modo,
o conceito de mais-de-gozar - ponto que queria sublinhar - não é equi­
valente ao conceito de objeto a.
Lacan, no Seminário "De um Outro ao outro", ao introduzir o con­
ceito de mais-de-gozar diz: "[... ] o objeto a está preparado especialmente
por sua estrutura para ser um lugar de captura de gozo". Mas, que gozo
captura? Captura esse mais, esse excesso de gozo que é recuperação de uma
perda, ck uma renuncia prévia ao gow. Isto é, o primeiro passo para esta-
11
DIANA s. RABINOVICH

sua condição prévia, é o conceito de


bclecer O conceito de mais-de-gozar,
renu ncia ao gozo .
an
A renuncia ao gozo é, como cal, em boa lógica, terior a sua recupe-
ração; codo ganho acarreta uma perda como sua condição mesma. Não é
casual, portanto, que o mais-de-gozar seja acompanhado de um desenvol­
das matemáti­
vimento acerca de uma aposta, aposta que ocupa na história
cas e da filosofia um lugar eminente, a aposta de Pascal. Vale a pena recor­
dar que, já no Seminário II e em "A carta roubada", uma teoria do jogo de
azar se fazia presente através da série dos ( +) e dos (-), teoria que nesta altura
sofre uma nova discussão.
A renúncia ao gozo é ancerior, em Lacan, ao conceito de mais-de­
gozar. O mais-de-gozar só aparece no Seminário "De um Outro ao ou­
tro", no ano letivo de 1968-1969. Por oucro lado, encontramos o con­
ceito de renúncia ao gozo em semin;lrios anteriores. Encontra-se insinuado
no Seminário VII. A itictl . .. , e já muito desenvolvido no Seminário X, "A
angústia".
A renúncia ao gozo cem um amplo desenvolvimento no Seminário
X. Ali, o objeto a como real, causa de desejo, apresenta uma articulação
peculiar, mas ainda não plena, com o gozo. Para que esta relação alcance
seu pleno desenvolvimento, será necessária a introdução da função de recu­
peração. No nível do simbólico assinala Lacan: "Só se pode falar de um
objeto de gozo como mecáforà'. Desta forma, em cal seminário, o objeto
em sua vinculação com o gozo é um objeto metafórico, vale dizer, produto
da substituição significante, aproximando-se do objeto tal como se apre­
senta, inicialmente, nos circuitos do dom materno. Esta formulação não
deve ser confundida, não cem exatamente o mesmo acento, ainda que te­
nha um íntimo parentesco, com essa metáfora jurídica do gozo - o gozar
de um bem - que Lacan introduz em Mtlis, ainda, mecáfora cuja relação
com O mal-ertar na cultura e A ética da psir.andlise não pode escapar a ne­
nhum leitor de Freud e Lacan.
No seminário sobre a angústia esta problemática se perfila, sobrecu­
�· do lado da renuncia ao gozo do corpo, dizendo ali Lacan que esta re­
nuncia, neccssanamente, porta, em si, a divisão
do sujeito. O objeto apare­
ce, neue contexto, como o resto desse sujeito
atravessado pelo significante,
que t o IU)Cico dividido, $.
UMA CLINICA DA PULSÃO

O S enquanto tal, não resume a identidade do sujeito, nem sequer


essa iden tidade de ser um em dois, porque é um em dois, isto é, um sujeito
dividido, produzido pela concatenação de dois significantes, concatenação
que deixa, por sua vez, um resto, esse resto que é o objeto a. Nesse mesmo
seminário Lacan, de um modo admirável, trabalha a clínica desse objeto
como causa do desejo . No referente ao gozo não aparece, ainda plenamen­
te esclarecida, a ar ticulação entre este objeto e o gozo, mas o gozo é
enfatizado, antes de tudo, como gozo fálico. A referência ao gozo aparece
através do auto-erotismo, com o que se relaciona o objeto causa de desejo.
Falta ainda precisar que esta operação de divisão do sujeito com esse resto
que é o objeto a, fa rá do objeto - e este é o ponto fundamental - um
lugar privilegiado de recuperação, de captura de gozo.
A idéia do a como mais-de-gozar, deixando de lado sua homologia
com a mais-valia marxista que Lacan pontua - recordem que é um semi­
nário de 1 968, em uma época de plena efervescência, onde estes conceitos
circulavam amplamente -, o conceito de mais-de-gozar deve ter então
como contraponto necessário o conceito de perda de gozo. O que quer
dizer perda de gozo? Por que o trabalho psicanalítico levou Lacan, já desde
o Seminário A ética . . . , a enfatizar o gozo como gozo do corpo?
Primeiro ponto: o gozo não é o prazer. Esta é uma diferenciação que
se impõe como um pano de fundo essencial quando se fula de gozo. O
prazer, dirá Lacan, é homeostácico, o gozo, por outro lado, será equiparado
ao mais-além do princípio do prazer. Enquanto equiparado ao mais-além
do princípio do prazer Lacan pôde situar o gozo na dimensão da pulsão de
morte, desi gná-lo como subordinado ao Tânatos. Então, quando dizemos
que o gozo está mais-além do princípio do prazer, a que homeostase estamos
nos referindo? Insisto, produz-se a esse respeito uma mudança desde a épo­
ca do Seminário II - na qual enfatiza-se a presença da cadeia significante
como mais-além do princípio do prazer - até a formulação do Seminário
VII, onde o mais-além do princípio do prazer assume uma forma diference,
a do gozo e do mal (cerna que Lacan desenvolverá depois em torno de Sade
e a perversão, cuja sistematização encontra-se no escrito " Kant com Sade").
C..onvém, contudo, deter-se um instante em precisar em que mais se
apóia a diferença enrre go-w e prazer, a que se deve essa solidariedade entre
o goro e O maia-além do prindpio do pra�r. quer di�r. por qu� o gozo fiu.
14 Ü I A N A S . RAB I N OV I C H

limite c o m a dor. Lacan alertou, antecipadamente, acerca d o caráter


homeostático do prazer em seu contraponto essencial com seu mais-alé m .
Entre o S eminário II e a passagem do gozo ao primeiro plan o da
cena, produzem-se redefinições, tanto do p razer como da ho meost ase, no
que é O campo próprio da psicanálise. No Seminário II, a insistência da
cadeia significante, inseparável do desejo, é ela mesma o mais-além do prin­
cípio do prazer. Em A ética .. ., por outro lado, o desejo fica colocado entre
gozo e prazer, situando-se o mais-além do pri ncípio do prazer nessa dimen­
são pulsional que é o próprio gozo . Esia d i mensão lhe permitirá articular a
pulsão de morre com o problema do mal, j:í d i ferenciada do p roblema da
agressividade i magi nária l<leiniana e seu maniqueísmo. Se no Seminário II
o desejo aparece como um para além da necessidade biológica, da biologia
como real, exterior ao campo anal /1ico, em A ética . . . p roduz-se um desloca­
mento do conceito de homcos1ase, que, todavia, não altera o desejo. O
novo conceito de homeos1ase, desse equ i l íbrio que reaparece no n ível do
princípio do prazer, será claramente defin ido no Semin ário XI quando o
narcisismo se apresentar como a forma de homeostase própria do n/vel
libidinal .
No Seminário XI Lacan faz uma delimitação que se pode não prestar
atenção e que é, todavia, muito freudiana.
Lacan define ali o narcisismo como a forma da homeostase no n/vel
libidinal . Pode-se dizer que o desejo sob a forma do automaton, quer dizer,
a repetição da cadeia significante, é realmente algo anti-homeostáti co para
o o rganismo. O desejo con traria o sujeito no n/vel do que são seus meca­
nismos de auto-regulação biológica. Esta é a contradição que centra o Se­
minário II com o desenvolvimento da série dos (+) e dos (-) em "A carta
roubada" .
Por outro lado, a homeoscase desse corpo, já atravessado pela lingua­
gem, se chamará narcisismo. Portanto, o narcisismo surge, agora, com
uma nova função: marca um ponto de homeostase, enquanto que na época
do estádio do espelho, o narcisismo surgia como relação com Tilnatos r
como anti- homeostático; mas essa é a diferença entre a perspectiva do or­
.
gan i smo h1ológico e o corpo atravessado pelo sistema sign ifica nt e . Nu
.
Semináno l i , o anri-homeosc;hico é o processo primário, enquanto que no
Seminário XI o anri-homeo01 f oco será a tyrhl em relação ao a111om11tt,tt,
UMA CLí NICA DA PULSÃO

solidário do narcisismo. Que fiqu e claro qu e esta é uma interpr etação par­
ticular de Lacan do problema do narcisismo freudiano. Esta interpr etação
é coerente com a declaração explícita, qu e faz Lacan, no sentido de qu e
coda a sua teoria sobre o gozo retoma a teoria energética freudi ana e o
problema da quantidad e e da energia em Fr eud.
Lacan o diz claramente; a qu estão não é (o que foi chamado classica­
mente na psicanálise freudiana) o problema econômico: Lacan o considera
como um problema de economia política. Da( a possibilidade de compará­
lo com a mais-valia marxista. Mas acrescenta algo no que foi dito por
Marx: que a economia política é uma economia pol!tica de discursos; quer
dizer que o que distribui a economia e a pol ítica é como circula o gozo em
um sistema simbólico : pela estrumra do discurso.
Esta idéia, de que há uma economia e uma pol!tica do discurso que
f.u a distribuição do gozo e que o gozo é algo a captar, começa a propor um
problema: se alguém o quer obter, pareceria um prazer; mas por que al­
guém iria querer acumular algo que é tão desprazeroso como em alguns
momentos Lacan pinta o gozo (por exemplo, no Seminário A ética . . . ) ? Esse
com quase apocalíptico que às vezes Lacan usa em relação ao gozo, retorna
sempre com bastante insistência. Por isso o gozo é, em Lacan, o funda­
mento de uma ética. De uma ética que não é a do bem-estar, a do prazer, a
do conforto. Precisamente, o paradoxo freudiano da pulsão de morre e do
mais-além do princípio do prazer, é que o ser humano, ao estar atravessado
pelo significante, tem como bem supremo algo que não é prazeroso. Por
isso Lacan compara e diferencia, de salda, a ética que se infere de Freud da
ética aristotélica. A ética aristotélica supõe um bem supremo cuja flor, diz
Lacan retomando Ariscóteles, é a flor do prazer. A ética freudiana, a que se
deduz não só do Mais-além do p rincip io do prazer, como também de O mal­
estar na cultura, é, ao contrário, uma ética do mal fundamental para o qual
tende o homem. Sua busca não é precisamente a de seu bem, mas a de seu
gozo que está do lado de seu mal, na medida em que o bem supremo não
existe .
Esse problema do mal reaparecerá muitas vezes e todos sabemos que,
quiçá, está presente nas primeiras consultas de quase todos os pacientes:
por que faço i•ro que eu sei que me faz mal ou que me fa,. sofrer? Ou, se
scmp rc quis evitar isso, por quê resulta que isso, que sempre quis evitar, é o
D I A N A S . RA B I N OV I C H
16

que corno a encontrar contra a minha vontade? S e tomarmos, incl wive, �


definição lacaniana do real como o que volta sempre ao mesmo lu gar, �
um cerco padecer que o sujeito mesmo busca, sem saber, e que apareco;
como O bem supremo . Quando é bem supremo? Aqui vem o problem a ao\
qual também me referia antes. Quando está inscrito no desejo como dese-1
jo do Outro. :
O conceito de gozo, o mais-de-gozar cm sua articulação com o dese­
jo como desejo do Outro, náo deve ser con fu ndido com as formulações de
Lacan acerca do Outro do go,.o, do O u t ro da verdade, do O utro do reco­
nhecimento; podemos men(ionar uma pluralidade de O u t ros com maiús­
cula em Lacan. Que o O u t ro srja u m lugar varrido de goro - expressão
que Lacan usa expl icitamente - '"'º ,il:\nilica que con fu ndamos toda clí­
n i ca do gozo com o problcntJ Jo O u , ro do gozo , tal como se apresenta na
pcí''<'rsão.
O Outro Jo gozo ,: um O u t ro cuja existência é cen tral para o perver­
so. 1:. cm sua articulação mm a perversão onde Lacan chega a articulá-lo.
Nas neuroses não se trata do Outro do goro; trata-se, em todo caso, desse
Outro que. de verdade, lamento que esteja tão desvalorizado, que é o Ou­
tro da demanda, porque esse Outro da demanda segue formando parte de
nossa clini ca mais cotidiana, e não é por ser a mais cotidiana que não tem
por que ser banal, ao contrário, diria que, às vezes, é aquela na qual temos
mais responsabi lidades . Mesmo que careça da gravidade ou da fascinação
que cercos Outros, como o do gozo, pode produzi r.
Por que faço esse esclarecimento ? Po rque o mais-de-gozar não é
correlativo ao Outro do goro, mas , pelo con trário, à sua inexistência; jusca­
mence como diz Lacan em "Subversão do sujeito . . . ", "essa fàlta do goro que
faria vão o universo"; essa frase que circula e foi repetida m u itas vezes
-
"que faria vão o universo" - veremos para quem e em que
casos. Encre­
canto, faz vão o un iverso para todos os seres falantes em
um ún ico ponto,
que é O que às vcz.cs não precisa tudo o que se deve
precisar : na medida c m
que não há goro sexual, isto é, que não há
gozo de cada sexo como tal, o
gozo <cxual está perdid o para am bos os
sexos .
O gom í:ilico, que o constitu i como medida
com u m para a mbos O!
onm, J á é uma •uplen cia dc11a ausênc ia
estrut u ral que é o "não há rclaçto­
p roporçJo anual " . lraca-ac da
i nexisre ncia do Ourro sexo, do sexo como
U M A C L I N I C A DA P U L S Ã O

cal, feminino, quer dizer, do universal d a mulher. Esta inexistência pode


ser suprida, manejada , distorcida, negada, recalcada, podemos supor-lhe
uma q uantidade de vicissitudes diferentes, mas não substitui a fórmula: 0
desejo é o desejo do Outro com maiúscula.
No perverso Lacan definiu muito claramente uma fórmula e, a partir
dela, começaram uma série de confusões que convém esclarecer de saída.
A primeira parte da fórmula do desejo perverso: o desejo perverso,
em sua articulação com o desejo do Ou cro, assume a forma da vontade de
gozo. Essa é a forma que assume o desejo do Oucro para o perverso, que
lhe permite ser um verdadeiro crente. Lacan o diz: os perversos são os
úlcimos crentes que escão ficando sobre essa cerra. Crêem no gozo do Ou­
tro, nesse deus do sacr i fício de Pascal. não no deus dos filósofos de Descar­
tes, não no deus da rac ionalidade, mas nesse deus de Abraão, esse deus que
exige o sacrifício como cal . cu j o �ra ndt· cre me é o perverso. Mas essa crença
lhe perm ite escapar da c1 s c ra\·fo do A , ass i m , a vontade de gozo faz do A
barrado um O u rro sem b a n Jr, sem barra. Por isso a fórmula do desejo
perverso como vontade de gozo é equivalente ao desejo impossível da
neurose obsessiva, ao dese j o insatisfe ito da histeria e ao desejo prevenido
da fob ia.
Por que coloco-as em série? Porque são formas diferences (as três úl­
timas em relação às neuroses e à demanda, a primeira em relação ao gozo)
de não se dar por i nteirado da castração. Isco é, são formas de não realizar
o d esej o como d ese jo do Outro, sob a forma da insatisfação, da impossibi­
lidade, da prevenção ou da vontade de gozo do Outro. São limitações
subjetivas frente à realização do desejo como desejo do Outro.
Nesse q uadro, onde há castração há perda de gozo no sentido origi­
nal, tal como é encontrada no Discurso de Roma, formulada como passa­
gem do acoplamento à aliança, comando Lévi-Strauss. Perde-se o gozo
natural, todo, do sexo para entrar nesse embrião humano que se chama,
por al gu m motivo, sexualidade e não sexo.
Quando falo de pulsão, desejo e mais-de-gozar, não estou pensando
pri mo rdialmente na perversão, mas em uma série passível de ser encontra­
da na clin ica e que na França, por exemplo, foi incluída dentro do ca po

da pcrvcrlio; enquanto que na Argentina, seguindo nesse ponto os delme­
'"1Wnco1 d.a eicola inglesa, a 1,;o n hccc mo1 melhor como o cam po da
D I A N A $ . RA B I N O V I C H
18

psicopatia. Refiro-me a u m amplo campo d e p erturbações que apresenta


. .
dificuldades particulares no estabelecimento da relação ps 1canaHnca, da
fcrência como tal, nas quais o paciente chega a análise em posição de obje
e onde se registram o que hoje podemos chamar, com uma expressão mui
geral que merece ser precisada, perturbações da demanda.
Havia algo de verdade nisso de psicopatia, de não admitir os li mit
que se estabeleciam, de romper o setting; também era uma forma indirecai
de falar do problema com a demanda ; especialmente com a demanda de,
amor. Mas creio que, a panir de Lacan, é possível deduzir que se trata de
psicoparologias . chamemo-las assim, que não sao, em si mesmas, estruturas
clínicas. N ão obstante. temos uma ga m a lacaniana que nos permite descrevê­
las . Essa ga ma S<' rdt" re :i sc'ric: passa�<"m ao aw, a ro, acting-out.
Trata-se de' s u j t· i t os qul' n ,1n S<" a p rcsc n 1 am exatamente no que pode­
ríamos chamar umci posi .; :1n dl' o h j c 1 0 <.:ausa, coisa que a histérica pode
simub.r mui t o bc" m . pnr .1 l�u111.1 r.11.ão o objeto tem um lugar particular em
seu discurso. nus. p rerisa mc11 1 c . paricn1es nc ; quais esta posição de objeto
implica um ganho. um ma is-de-gozar, que deve ser perdido ames que a
análise possa ser iniciada, em semido es triro.
Formalização: O que quer dizer "antes que a análise possa ser inicia­
da" ' Quer dizer que esses pacientes nos exigem, às vezes, um longo trabalho
prés.�o. não importa se é cara a cara ou no divã, antes que passe a ocupar o
lugar, por excelência, do sujeira em análise, que é o lugar do sujeira dividi­
do, quer dizer, do sujeito da associação livre; diria que, em última instância,
o importance é a clareza que o analista tenha a respeiro.
Os do is nomes clássicos com que esses transtornos figuram na
psicopatologia foram, por um lado, as impulsóes (como o jogo de azar, por
exemplo, ainda que não seja quando adquire cadter de sintoma compulsi­
vo), e, por outro, as caractcropatias nas quais (como alguns de vocês quiç:I
saberão) eu pensei especialmente quando fiz o percurso da teoria do eu em
Lacan.
O que é importante aqui? Que estes pacientes possam ser definidos
em função de sua estrutura clínica. Por quê? Porque podemos encont rar as
impulsões tanto na perversão, como na psicose, como
na neurose.
O que é que caracteriza casas pa1ologias ? Eu quase me at reveria 1
d1.1má-la1 patologia• do aro, não no se mido do
ato logrado co mo o 1 '°
Ü M A C L I N I C A DA P U LS
ÃO

falho , m � nesse o u�r � s entido q ue dá Lacan q uando diz que O ato,


co m o
cal, im p lica q ue o SUJ e 1to aposte sem O utr o . Quer d izer, que só há ato com
um O utr o barrado , com u m O utr o - não digo ao acaso - incons · istente.
O q ue é q ue se p o de o bservar nesses pacientes? Que há cerca satisfa­
ção, às vezes dir eta, visível , à q ual não p od em r enunciar. Tomem qua lque r
um a das for mas em q ue isso p od e se apr esentar, que vão d esde a bulimia ou
o tabagism o até as drogas maio res. Essas pat o l o gias d o ato pr o põem uma

pe r gunta qu e será um dos eixos do que tenta rei desenvolve r nestas reuni­
ões: são idênticas à patolog i a do fantasma?, sãc um a va r iante da mes ma?
Estas pato l og i as apa recem basicamente vinculadas a o ato em qual­
que r de seus macizes: passagem ao ato, ato e act ing-out, e, obviamente, o
fantasm a desempenha nelas um pape l fund a mental. Estão d o lado do fan­
rasma e remecem ao auto-e rorismo, não se situ am do l ado do sintoma.
F reud mesmo, em uma carta a Fliess anterio r a 1 900, ass:.1ala que
roda adição ( rdere-se e n 1 re ounas ao jogo, à bulim ia , etc.) é um substituto
do aura-e rot i smo. lese que re1oma quando ex a m ina Õ caso de Dostoievski.
Po rém, tudo isso gira em rorno desses "misteriosos" p roblemas freudianos,
que não se confundem co m o rema d a c astr a ção e seu rochedo; me refiro a
esse outro problem a que é o d a adesividade d a libido, a fixação ao objeco
pulsional, o p roblem a do quantum de fixa ção, quer dizer, o p ro b lema da
ene rgética da fixação . Recordem que Freud coloca-o como um dos obstá­
cu los maiores à finalização de uma anál i se.
O conceito de m ais-de-gozar tem seu anteceden te, como lhes reco r­
dava, não somente 110 conceico marxisc a de mais-v alia, mas sob recudo no
conceico freudiano de ganho de praze r (Lustgewin) . Em Freud, este ganho
de p razer alude diretam ente a um aumenco d a s a cisfação pulsional, isco é,
é ro
à dimensão da satisfação da pulsão . Isco implic a além disso, e esse out
esse ganho de gozo, que é a form a como
ponto q ue quero enfatiza r, que
e p ara
p re fi ro t raduzir O ganho de pr azer em Freud, é, quiçá, uma das cha� �
ção que F eud chamo u adcs1v 1da de
enrcnd er na mesma o bra freudiana, a fun r
' nal n t , c sa que ninguém sabe exp
da libid o com o fator const itucio oi licar
i a o

muico b e m o q ue é.
propoe em termos de eco-
Po r outro l ado, esta ene rgética que L acan
a out pólo, que t a mbém cem a ver co � o aro
no mia pol lcica, nos reme te ro
ólo é a m1b1 çio.
e que: já escá pres ente no Seminário "A angústia" . Este p
D I ANA 5. RAB I N O V I C H
10

discursos, LaOIJ
,
Nessa cpoc a, que e, a que vai do Seminário X aos quatro .
ão entre acting- out e passag em ao ato, assim co rn,
p ro póe uma certa oposiç
· certa o posi' ça' o entre sublimaça' o e inibição . São todas temáticas vin
existe
ão da sublimação corn
culadas à satisfação . Recordem a famosa definiç
defesa .
satisfação da pulsão sem recalq ue, sem
Nesse contexto , não é casual que Lacan torne a trabalhar o grafo d
desejo no mesmo Seminár io "De um Ou tro ao outro", onde introduz
mais-de-gozar, e a referência que faz é a sua primeira introdução do graf
no Seminário "As fo rmações do i n c o n s c i e n t e " , com o exem plo d
familio nán·o para explicar o chistt', voltando a insistir, em 1 968, no pro b lc
ma do chiste de modo qut' ct'mos u m a rt'i n cerpretação do grafo no ano e
1 968; recordem qut' os Escrito; sat'm em 1 966 . Realiza , então, um
reincerpreta�-ão do g,Jfo pda pers p,n iva dt' sua articulação com o mais-de
gozar, através , prt'cisamenit', dn ga nho d, gozo próprio da s utileza descri1
por Freud em seu livro.
Quando se faz unu p r i nK i rJ lei cura pergun ta-se por quê aparece aq1
o grafo. O grafo aparece, precisa mence, porque o que Lacan chamou, n
época de "As formações do inconsciente", o objeto metonímico, agora é
objeto como lugar seletivo de captação da recuperação do mais-de-gozar.
Eu lhes disse que partirei de "De um Outro ao outro", mas queri
esclarecer que há aqui um caminho que é a retroação que se pode faze
parti ndo de " De um Outro ao outro", para trás na obra de Lacan, e podt
se, assim, encontrar a antecipação do conceito de mais-de-gozar. Dest
modo, nos seminários mais tardios, se produzirá uma diversificação do
gozos, uma diversi ficação dos mais-de-gozar. Todo gozo, o gozo da allngu
em uma só palavra, o gozo do sintoma, o gozo da mulher barrada, etc.
todos esse gozos são, na reali dade, recuperaçõ e� de gozo pela perda dess,
gozo rodo, que seria o gozo da complem en taridade sexual , que não existe
Então, o conceito de mais-de-gozar, que está inicialm ente arciculadc
com o objeto a, torna-s e conceit ualmen te mais abrang
ente que o objeto li
Pro põe, precisa mente , essa clínica que Lacan chama
ra clíni ca do não-todo
cm relação com as fórmu las da sexuação, no ano
de 1 972 quando, ao relê­
nr-se, por exemp lo, à relação de Kierke
gaard , à corresp ondfocia en 1rc
Kierkcgaard e Regi na, Lacan di1. que Regi
na é capaz de ver um b e m para·
altm do ob1e10 a · Quer d1' zer, um ·-•
gozo que não se esgota na pulslo par,1a1·
U M A C L I N I C A DA P U L S Ã O

O mais-de-gozar é uma função, o mais-de-gozar não é somente o objeto a,


o objeto a pode capw o mais-de-gozar, através de suas quatro formas tradi­
cionais: voz, olhar, fezes e peito.
O problema que nos propõe a clinica do não-todo, o problema sério,
desde a perspectiva freudiana, é que parece estar cm jogo algo, uma recupe­
ração de gozo, que não é equiparável, enquanto tal, com o próprio do auto­
erotismo e da pulsão parcial . Esta é outra das questões centrais a examinar
em torno do conceito de mais-de-gozar.
Dessa clínica do não-todo que Lacan começa a esboçar nos anos 1 970,
temos três exemplos: a mlsiica, � qual Lacan nega o estatu10 de psicose e de
histeria; o caso J oyce e seus próprios Esrritos. Esses são os crês exemplos de
clinica do não- mdo que deixou L1cm . 'Jem-sc que ver se pode-se pensar
outros e se. precisament e , na med ida cm <J uc é uma clínica do não-todo, só
pode conceber-se rnmo .1 lisc.1 Je 1 )011 J u a n : mille e tré. Quiçá, se trate de
fazer a lisr.1. uma por um.1 . Jc (.1J.1 fo rma e de cada caso: caso místico, caso
Joyce, caso X. Isco .: algo para leva r em conta porque implica, inclusive,
cerca pontuação sobre a 1eoria dos discu rsos em Lacan, sobretudo quando
assinala que o não-rodo é a posição do analista e a descreve como própria.
Esta revisão do grafo, que se produz em 1 968, na qual há al gumas
mudan ças ( confesso que olhei duas ou três versões deste seminário dado
que não há urna edição estabelecida disponível), cem diferenças chamativas
com a versão que aparece nos Escritos.
Este questionamento do mais-de-gozar e sua função, é solidário de
algo que La.can definirá como o par ordenado (S ,-S , ) como conjunto,
dedicando-se não ao S , , mas ao S,. de finido como o conj unto dos
signifi cantes do saber inconsciente, entendendo por saber inconsciente um
saber sem sujeito.
Então Lacan assinala que se o objeto a, como lugar de captação do
mais-de-gozar, pôde sc:r inventado por ele, o diz muito enfaticamente, é
porque se prod uziu uma modificação na relação histórica entre o saber e o
gozo. Esta modifi cação da relação cmre o saber e o gozo é absolutamenre
11,lidíria da uni ficação da ciência ocidental, da nossa ciência, a partir do
1<culo XVI 1 . Lacan di,.: a unificação da ciência corrcla1iva ao descnvolvi­
�nto do capitaliamo implica, não só a criação do mercado cal como o
c.onh.ca:mOli, mu de um mercado do saber.
22
D IANA s. RAB I N O V I C H

Lacan, dessa modificação na rel ação


A psicanálise é um sintoma, diz
e O saber , modifi cação que é histórica e solidária, como cal do
entre o gozo
do saber, onde o saber vale, onde o sab er jj
termo mercado, de um mercado
saber, graças à unificação do campo das ciências,
não é um l uxo, porque o
r na produçã o. Daí que comece a aparecer um termo,
começa a participa
impõe desse seminário ern
que já havia despontado em Lacan, mas que se
A te
diante, 0 de produção, que não é o mesmo que criação. produção reme
à produção de objetos que são pontos de captação de gozo, nesse sentid o,
podem emão advir "bens" no sentido psicanalltico.
Recordem o que lhes disse há algum tempo: a ética da psicanálise
não é a ética do bem-esrar. Os objetos de dispu ta, nesse sentido, os objetos
de captação de gozo, não são objetos que, necessariamente, produzam ou
signifiquem o bem do sujeito a par tir do ângulo das morais ou das éticas
cradicionais, mas, ames , produze m , por es te ângulo, seu mal.
Justameme, o que assi n al a d Lacan é que a produção desses objetos (e
do saber e sua entrada como mercadoria em um mercado onde o saber
começa a valer) é solidária, não da renúncia ao gozo, porque renúncia ao
gozo há desde sempre: na posição do amo hegeliano a renúncia ao gozo,
renúncia a seu corpo, es tá na vida para manter seu prestígio; o que é novo é
que haja, e nisso Lacan insiste, um discurso que promova a produção aua­
vés da renúncia ao gozo.
O que faz Lacan? Uma leitura psicanalltica da tese de Weber sobre a
relação emre o protestamisrno e o nascimento do capitalismo? Não, creio
que não. Lacan marca algo fundamental porque prefere à tese de Weber, as
cicaç.ões de Lutero (que podem ser encontradas no Seminário A ética. . . , e
que algumas vezes parecem saldas das fantasmagorias do kleinismo mais
exagerado).
Lacan relaciona isto com o que será chamado a morte
. de Deus. Mais
importante, nesse caso, que a conotação teológ
ica (apesar de Lacan retom�­
la, porque urna parte desse seminário, que
não teremos tempo de ver, rek­
re-se à aposta de Pascal acerca da existê
ncia de uma vida depois da mor te) ,
é • prec,sa ence, que este discurso
'.11 _ da renúncia ao gozo delim ita O lugar do
" e permite, assim, algo que em
nosso século é evidente, esses prolong,i·
mencos da voz e do olh ar que -
sao o grava dor, a TV e rodos os aparelho
p rolongam cases dois obje tos: s qur
voz e olhar.
Ü M A C L I N I C A DA P U L S Ã O

Esta possibilidade, que surge do discurso da ciência, sublinha a re­


núncia ao gozo para marcar sua recuperação, e assinala o lugar privilegiado
dessa recuperação no objeto a.
Inclusive, esse objeto a como lugar de captação do mais-de-gozar, é a
antipoda do que Lacan definiu como o objeto do dom na cerimônia do
potlatch, quer dizer, do momento em que se faz uma espécie de competi­
ção para ver quem gasta mais objetos de luxo ou quem brinda ou doa mais.
Precisamente porque esses objetos caracterizam-se pela circulação, pelas
estruturas do parentesco, são o que há de mais contrário ao auto-erotismo.
Curiosamente a ciência, e isso é o que Lacan descobre, veio nos
proporcionar uma gama de possibilidades masturbatórias inesperadas
para o século passado . Por isso diz-se tanto que a TV deixa idiota, é o
que se dizia no século passado da masrurbação. Quiçá tivessem alguma
razão . Precisamente, na med i d ;1 c:m que aparece um certo tipo de gozo
auto, auto enquanto au 10-su fic ien1e, o sujeito pode, finalmente, al cançá­
lo por si mesmo e não pode desp render-se dele. A característica desses
gadgets que devemos ao d iscurso da ciência é, precisamente, que se fica
preso a eles , isso é o que habitualmente se diz. Seria interessante per­
guntar-se o que rer ia pensado Freud da adesividade da libido com o
objeco TV.
A partir desse ponto de visca o dom é cotalmence o contrário, é a
festa, a reunião da comunidade, algo assim como o momento de glorifica­
ção do intercâmbio social, enquanco que esses gadgets (palavra que Lacan
conserva do inglês) tendem a isolar-nos e a produzir, ao mesmo cempo que
uma massifi cação, um gozo cada vez mais auco-erótico e autista.
Porém, isso nos leva a que o ser vivo, na medida em que é presa da
linguaguem, perde, como Lacan o diz desde o começo, parte de sua identi­
dade. O a é O resto dessa perda que se deduz da perda fundamental da
ccoria freudiana, que desencadeia a repecição, que é o objc!co como objeco
perdido. A insisrencia de Lacan nesse ponto de articulação com Freud é ali
cansativa , diria, e escá em praticamente todos os seminários .
Insisto: 0 objeto perdido freudiano (perdido por estrutura, não per­
dido na experiência) � o que motiva uma repetição (a utomaton e tychl dife­
renciadas no Seminfoo XI por Lacan) e � o que impulsiona para a desco­
bcrca dCNC objeto que nunca se teve.
DIANA s. RAB I N O V I C H

para enten der porque o desejo s e faz com 1


Lacan nos d á uma chave
Por quê? Porque e ssa iden tidad e de perce�ção da
identidade de percepção.
desde o momento em � ue :ntram os na ps1 can_áli­
qual todos ouvimos falar .
ção do process o pr 1 már10 , nao apon�a tanto (e 1Sto
se, que é O eixo da realiza
do Lacan ) para a percepçao, mas para o
é O que há de ser enfatizado segun
o no comp lemen to é o idên tico e o
termo identidade. O que é buscad
vel por estrutur a, não o desejo obsess ivo
idêntico é o impossível (o impossí
ao desejo do Outro ).
como pretexto frente
vel lógico, não ao
Por que é o impossível? Isso nos conduz ao impossí
aquilo que é impossível é ter
impossível obsessivo. Porque precisam ente
um objeto co mplementar do sujeit o . Lacan o dizia em seu primeiro perío­
do com os term os "perda de naturalidade do o bjeto" para o ser falante e
depois o desenv o lverá co m o a perda do sex o , para ambos os sexos biológi­
co s, na medida em que o ser humano fala.
E aqui é o nde começa mais uma discussã o na te oria de Lacan. Com
esse obj eto perdido que o rganiza a busca e que organiza a realidade, com
esse objeto , resto do processo de divisã o , o sujeito pode identificar-se. Lacan
situa esta identificaçã o no nível do pré-co nsciente freudiano e diz: "o a em
sua função de mais-de-go zar é o que permite unificar o sujeito como sujei­
to de um discurso, no nível pré-co nsciente" .
Isto implica duas coisas: primeiro , que o a co mo mais-de-gozar é um
ponto de identificação que arremeda (e uso o termo arremedar para tradu­
zir o mimer em francês, que às vezes se traduz pel o galicismo mimar, por­
que mimar em castelhano quer dizer fazer carinh o s, não imitar; arremedar
não é exatamente imitar, tem um pouco o sentido de paródia que tem o
term o francês) . Justamente, esse arremedo de unidade que dá o a, 0 dá não
p or ser a causa, mas por ser o lugar de um ganho de gozo. Nesse sentido
transforma-se na co luna vertebral que sustenta o sujeito na instância pré­
conscient freudiana. Lacan acrescenta algo mais: a coerênc
� ia que dá o a
como mais-de-gozar faz, por sua vez, a co erência
de seu eu, moí, não do je.
'' , 0 a, J'á em textos anten. o res, era definido por Lacan
Se o mo, se escreve i/a)
como objet.
o real, causa e també m · de-go zar. O a enquanto
mais- ma1s-de-
gozar, dá ao sujeit o uma Ocasia ·- •
o pamcu 1 ar que o imaginário
reveste.
Esta recuperação de go zo, esta
_ nao• . . fu nç a• o que Lacan desco bre na perver·
sao, Impl ica que esteJ· a 1 I· m i. tad a à
pervers ão. O que Lacan desco bre na
U MA C L I N I CA DA P U LSÃO I . ..-!!:· -..Util� t',.'t.:Af /l,ji,;, í

25
---..:.: .
rv ão é a possibilidad e de que "o termo a do · · 1
P e ers . . . . . ,, fantasm a possa ser ap 1 1· ca -
do sob re o su1e1to d1v1d1do . Isso é o que a perversão ensina , em sentido
escrito, a Lacan .
Porém , se o a forma o núcleo real do eu, lhe oferece sua
coerência,
coca r este a implic a conden ar o sujeito a sua contrapartida: 0 gozo Lacan
diz como perdido , quer dizer, o não-gozo, o desamparo e a solidão.
Aqui é onde podemos voltar as caracteropatias, nas quais a instalação
do
mais-de-gozar no i(a) do eu é predominante. O transtorno do caráter não é
so mente um transtorno do ideal, não é algo que se explique tão somente do
lado do significant e. Explica-se também do lado da identificação com esse
objeto mais-de-gozar que dá consistência e coerência ao sujeito. Lacan diz que
o a, a fabricação do a como mais-de-gozar, está na base do moi, esta fabricação
lhe oferece consistência e essa consistência é uma consistência lógica.
Se observarem, aqui há uma redefinição do imaginário, posto que,
voltando ao grafo, neste ponto precisamente, Lacan diz que a interrogação
sobre o desejo do O urro é o mecanismo fund amental da identificação ima­
ginária. Com o que fica claro que a identifi ca ção com o a como real é
inseparável do i minúsculo : não se pode fazer sem o imaginário.
Lacan o diz assim: "O modo como cada sujeito sofre em sua relação
com o gozo na medida em que só se insere na relação com o gozo através do
mais-de-gozar é o sintoma". E acrescenta, na medida em que (esclareço: ao
estabelecer um mercado do saber) já não existe uma verdade social média,
uma verdade consensual, que possa ser compa rtilhada por rodos os sujei­
tos, isso faz com que as verdades particulares comecem a tomar a diantei ra
e o que La can sublinha nesse ponto que se articula com a nova formul ação
do grafo é que O objeto a, enquanto cal, ocupa um lugar no camp o do
Ou tro, o lugar da verdade como furo. Lacan remete-o à impos sibil idade, à
qual já havia s e referido muitas vezes em "A lógica do fantas ma", de fazer ou
alcança r um fechamento no universo do di scurso, de chegar a fazer um
todo, uma tot alização univers al do di scurso. Então reformula o grafo de
um modo que só de dize r-lhes a pri meira mud ança creio que já se si tu aram.
Todos recordam que em "Subversão do sujeito .... ", n o resum o de "Fo rma­
ções do inconsciente" e em " O des ejo e s ua interpretação", es tão o p iso do
enunciado, outras vezes chamado p iso da demanda, o inferi o r, o p iso da
sugestão e O piso superior, o pi so d o des ejo e da enunciação.
Ü I A N A S . RAB I N O V I C H

A partir daqui Lacan define o piso inferior como piso da enunciação ,


e O superior como p iso da demanda. Com o que desorganiza tudo aquilo
que se tinha ordenado na cabeça com bastante esforço. Por que faz esta
mudança? Precisamente, a mudança se baseia em que muda o sentido do
Outro do piso inferior.
Aqui vocês têm o piso inferior do grafo que, em si, não se modifica.
O que muda é que a linha que vai desde o significado do Outro ao Outro,
com maiúscula, passa a denominar-se agora enunciação e o significado do
Outro é equiparado por Lacan ao S , . O campo do Outro ( não o lugar) é
equiparado ao S 1 , como conj un!O dos significantes. Quer dizer, substitui o
conceito de bateria dos signi ficances.

s 1
s,

Si gnificante Voz

/ (AJ

Por que a linha que vai do s(A) ao A e volta é a l i nha da enunciação?


Se temos que do lado da s1gnc - d o O u rro, que sempre é retroa tiva,
· ·r,1caçao
está o S , , que é O querer d"1zer como antecipado (da p rimeira versão do
grafo l, o S surge em segund o 1 ugar e permite .
· o surgimento
� da s igni fica-
_
çao . . . .
retroauva. f a defin iç·ao d o SUJetto: o que um s1gn1ficante represen ta
.
ame outro s1g mfican .
te ' O que S , representa ante S,. f o que Lacan diz cm
. . .
1 968 · luo é import ante po rqu c O S 2 passa a s1gn1ficar aqui, como no
s cmm· á no· XI , o significame dª u,rverdriingung,
. do recalque primári o qur
U<JUZ o f,.
Pr-� .
ad.tng ou dcsvan ccimen to d o sujeito . S é todo o cam po dos
ugn1
. · r,icanr.c, mcnoa o S , • que é •que 1 e 11gn.
ificant c' ante o qual todos os
U M A C L f N I C A DA P U L 17
SÃO

de m ais virão a representar. Porém, o sujeito da enunciação está colocado


no p ri me i ro piso do grafo , coisa que não acontecia antes quando se ten­
dia a confund i r esta primeira linha, significação do Out ro, com a linha
in fe r io r m-i(a), quer dizer o circuito especular que se desprende da pri­
m eira l i nha .
Lacan explica claramente a fó rmula da pulsão e sua ar ticulação cen­

tral co m a demanda, e por isso a demanda passa ao segundo piso (que


pode r ia estar abaixo, da r ia no mes mo, é uma simples convenção). Porque,
quando Lacan d izia que o p iso da demanda era o piso i n ferio r, esta va traba­
lhando a demanda pelo ângulo do c i rcuito idcafaame do ideal, co m o de­
manda de amor; ago ra se relé, ri d à demanda em sua função pulsi o nal e p o r
isso falará de demanda no piso su perior.
O grafo i n termeddrin e n t re estes dois é:

Sign ifican te
Voz

l (A,/

se recor-
. ga ça- o do Che vuo,?, que,
o n to de m te rro
O n de cu 1 m .i na O P . term in n fórm ul a
_ d o suJe l- 10 . . . "
a a
. de " S u bvers ao
darem, n o terce iro gra fiO 1 s 3
- 0 ' que se m a ntém em 1 968
.
pu
a fó rmu l a da
do fan w ma e não ·t nc1 UI· assi n la qu e o S, como
_ o ló g 1. ca na qu a l
a
ga de m o nst ra � b . conscie nte, não é co nsisce n�
Laan faz u ma lon
n tes, q uer d ize r sa er in . . .. d
co n i· unto d o1 11gn
. . r.1 ca
u ns1s t� ncta lógica o
o rq u e a inco
ico . Isco é �u ndam enca I p da dr man da •
no ocncino ló g o g i ro
. llo • ass um ir
· a a en u nc 1aç
um po do p i so i. n ferio . r o b ng
28
D I ANA s. RAB I N O V I C H

· demanda. No taram que enun ciação e de man.


transforma a enunc1aça- o e m Escrito
.
s-,
.
precisa me nte
os d s
da se m od'fi 1 1caram em relaça'o a alguns text
o

" anto o cam p o do Out ro não é co nsis-


leio-lhes uma citação textual: Enqu
. demanda, isso dá seu alcance à fórmu.
tente a enunc1aça- o adqu,·re O giro da
·
- ", .pd O D , e inclu i a pergu nta o que quer o Outr o ?
la da pulsao
c o m o tal de ser tradu zido
Aqui encontram os um matiz , imp ossível
se formu la no nível d o Outro - 0
para o caste Ihano. Quando a pergunta
sta é D mai úscul da demanda. Em fr ancês
que quer o Outro ). -, a resp o o
.
o

essa resposta é fo rmulada assim por Lacan: 1e me le dema nde, o nde demande
vem a ser pergunta, sentido do qual o termo cas telhan o "demanda" carece e
que, po rtanto, deve traduzir-se por um "me o pergunto" .
Este "eu me o pergunto" (je me le demande) aparece com o a articula­
ção com ess a via do D maiúsculo , na qual não há mais remédio senão
avançar devido à au s ência de co nsi s tência lógica do Outro, que é questio­
n ada p o r um s ujeira já dividid o pela ação do s ignifica n te no piso inferi or.

O $ barrado , produto do Uroerdrdngung, do recalque primário na aliena­


ção s ignifi ca n te, se pergu n ta acerca do desejo do O u tro e se faz a pergunta
enqua n t o s ujeito dividido, em relação a uma demanda-pergunta, a um "eu
me o pe rgu n to" (je me le demande) . Es te é o p o n to em que se pode apreciar
a novidade i n troduzida em 1 968 , na medida em que, por intermédi o da
pergu n ta, a demanda se a r ticula com o desejo, adqui rind o u ma função que
se rela ci o nará co m a s ig n ificação d o O u tro, s (A).

O efeito sujeito n a e n unciaçã o - q uer dizer, no p iso inferi or do


grafo em sua exp o siçã o de 1 968 -, co m o efeito de significação, in stala-se
p ois nesse materna s (A) , s minús c ul o de A maiúscu lo, materna que i ndica a
eme rgênci a de uma s ignificação alie n ada , n a medida em
. que chega recroa-
nvame n te s i. gnificad
.
a do Outro , e que e n quanto s1g · n 1· fi1cação al i· enada - o
veremo s tem uma e s treita relação co m O mais-de-goza
r. A função mes-
--:-

ma da s1gnaficaça· o é a de masca ra r essa co nsequ. . maio . r do d i. s c urs o q ue


. en
, c 1a
é a exclusão do gozo .
Poré m , o mais -de-g ozar é , p o r "
. lo encã ' . ,'fora do signi fi1can te ·
ex ce I encta,
eorno. rela ctoná- o co m a s i. gn ·r,1 c aç _
, a e, pa ra serm o s maIS . p rec
.
i-
sos aind a, segu ind . .
o
o Laca n ' co m os
mei o s de prod uçã o d o mai s- de-go ·
z ar., E m um mom ent o desse
sem ,. n á n. o L a c an praticame n te ide ntl· r,, ca
. i· r,1caça_ o e maIS
'1gn .
-de- goza r. Es ta 1den . t1fic ação é a q u e asseg u ra a
UMA C L I N I CA
DA PU L S Ã O

raci o na lid ad � da afirm ação d e Laca n , q ue jil men cion


ei , seg un do a q ual
O 4 co mo ma is -de - g o za r o ferece a c o erên cia do eu ( mo,� d
tand o -se p ara iss o nas s i g " o pr é-co nsci. ­
i
e nt e , al men nifi caçõ es. A sign i fi caç
ão nesse
po nto já nã o se asse mel � a ªº i m agin ári o , a um a pro
. dução i mag inár ia,
rna s se ap rese nta c o m o 1 n r1 m a m e n re relac i o na d
a co m um efeito de re­
cu pera çã o de g o z o , recu pera çã o qu e masc ara sua
perd a. Trat a-se, pois,
da s ign ificaçã o d o O u tro com o p o mo no q u a l pode
mos deli m i tar uma
pec uliar recu p eração de gozo
.
Vol te mo s , para m e l h o r segu i r is 1 0 , ao
piso super ior do grafo . Lacan
re co ma a se paraçã o q u e: c:s i a bdecc: u c: m re respos tas
e pergun tas entre o
lado esque rd o e d i re i t o d o g r a fo , e xa m i n a n d o , separad
amen te, as per­
g untas e as respo s t a s . Deve m rc:rn rd a r , po i s , que do lado esqu e rdo
re­
mos u m a p r i m c: i r .l rcs p u s r . 1 s i g n i fi crn r c : u S (I{) ba rrad o , o signi
fican te
da cas t ração do O u t ro . q u e: , u l m i n:1 nessa resposta tam bém significante
que é o l (Al . s i t u J n J n - S<· c 11 1 rc .1 1n bos os s i g n i fi can tes as re sp o stas i ma­
ginárias : fa n ,as n1 J . s ( A l . e u . Do l a d o d i re i t o , o das perguntas, re m o s d e
cima a b a ixo o S. o l\,z l . o ( A ) . o d(A) - desejo d o Outro situado à
mes m a a l t u ra q u e: o fa n ta s m a do lado das respostas, pont o a partir do
qual La can marcará o s u rgi men to das pergun tas - e a fórm u la da pulsão,
li O D l .
Aqui têm d es enhado o esquema d as duas pergun tas que convergem
sobre o desejo do O u tro, d(A) .

$0D Me pergunto o que é que tu desejas?


Tu desejas o que te falta.
Convergê ncia d(A)
t
(A) Eu te pergu nto o que é Eu?
Instaura o t u e o S.s.S .

e é o d(A) , desejo do
- o b se rvemos como sobre ess e ponto q u
E nrao,
. . , ação e o da de manda cm
Outro , lu ga r incerm cd1á � 10 e ntre o p iso da enunci
tas. U m a de las parte do (A) do piso
1 %8, Lacan rraz conv cro•r..- duas p ergun
inferio r, da enunci. ação, e ie_u alvo é o eu (jt) ·. " Eu (j"t) te pc 'l!unro (Ir d,-
ue é cu (u q u '11tJt) . Oh iervem q ue Lacan jd havia indicado que
-,uk) o q
D IANA S. RAB I N O V I C H

0 e u (je) shifter não é equivalente a o sujeito d o inconsciente. A pergu nta


que parte do (A) é, pois, uma pergunta-pedido que interroga acerca do eu
e do tu. A resposta à pergunta sobre o eu (je) determina o estatu to do tu, e
frente à inconsistência do campo do (A) faz surgir um tu. " Tu" que , pre ci­
samente, instaura o sujeito suposto saber, pois, introduz um sujeito nesse
campo do (A) no qual, por estrutura, não há sujeito algu m . A demanda­
pergunta da enunciação interroga, então, o eu e o tu; interroga a existência
de um sujeito que seja tal. tanto no campo do Outro como no inconscien­
te. O eu exige a existência do m para existir (esse tem a ronda o ensino de
Lacan desde a época do desejo de reconhecimento, recebendo a esta altura
uma formulação lógica); isto funda, no n ível da estrumra, o sujeito suposto
saber, coisa que J . -A. M ille r ass i n alou claramente ao indicar o caráte r
"transfenomênico" do S.s . S .
A outra pe rgunta parte desse Outro que , no piso superior, é repre­
sentado pela fórmula da puls:ío; ela se formula assim: " Eu me pergunto o
que é que m desejas" Ve me demande ce que tu désires) , sendo sua resposta
" Tu desejas o que te falta" (tu désire ce que te manque) .
Pode-se ver que a trans ferência supõe, pois, de m aneira escrutural­
mence intrínseca para Lacan, esse lugar de convergência das perguntas que
é o desejo do Outro. Ou seja, que essa encruzilhada é o organizador mes­
mo da transferência. Para isso as duas vertentes que se cruzam não devem
ser consideradas em função de uma temporalidade cronológica, m as lógica.
A passagem, encão, da enunciação à demanda, em 1 968, do piso inferior ao
superior do grafo, é condição da suposição de um sujeiro ao saber. Essa
demanda, portanto, é solidária da não consistência do campo do Outro, de
sua não completude, que depende do fato de que não há, em tal campo,
ninguém que possa dizer eu (je) .
Se o saber pode ser suposto ao sujeiro, isso implica que o saber é um
valor, que circula em um mercado, quer dizer, que tem como pano de fun­
do um mercado do saber. Esse mercado do saber é correlativo ao discurso
da ciência, que situa o saber em posição de mercadoria, e, nesse disposi ti vo
peculiar, assim estabelecido, pode fazer sua aparição a psicanálise. Seria
impossível não se pensar que se poderia constituir o S.s.S . como fund an te
de um "qualquer" analista que se declare analista. Na medida em que al­
guém se: declara analista se lhe supõe um saber, saber q ue 1ambém pode se r
UMA CLIN ICA
DA P U LS Ã O

s u pasto a o u tros, que não são analistas e q ue não se declaram


. . com ta is.
· Nesse
(i m1re cnco n cramos o acn n g-ou t, a transferência chamada "
_ selvagem" , etc.
Vemos deline ar-se esta co nve rgên cia
e m torn o do des ejo
do O u tro .
O des envolvime n to de Laca n si tua precisam ente em tal
convergência, en­
tre as duas p e rgu n tas - O que é e u (je) ? e , c u (je) me pergu
n to O que tu
queres ? -, o nó com o qual s e i nscreve o d esejo com o desejo do O
u tro.
Ass i m , entre o eu (je) e o tu , se nodula o desejo como d esejo
do Outro ,
mo bilizando (o tu o i m plica) o S .s.S . , ch ave nesse artificio q ue é o
p róprio
dis curso anal ítico. Esta con vergênci a se formul a em um eu (je) te perg u nto
(dmumde) o que quer ( vru.x) eu (ir) .
A fu nç.io da demanda não pode, pona n r o , ser separada da pergunta
.
Na medida em que .1 demanda a pare ce a n irnlada com o suj ei to dividido na
fórm u la da pulsio, ap,uece cumu u m a pergu n t a que se satisfaz nesse nível
pcçuliar que L.1C'.l n nume.i r.i w m um lermo d i ílci l de traduzir, langagiere,
linguageir.1 . podemos d i ,cr. q u r i! da o rdem de uma satisfação d e um blá­
blá silencioso. que n.io se ,, u ,·t·. que se s a 1 isfaz na mudez mesma da p ulsão.
Do lado d.lS rcs post.lS Lic.1 n d i ferencia o eu (je) do sujeito barrado.
E.sra funçio do e u (Jr) tem seu pri mei ro fundamen to no shifter, ainda q ue
não lhe seja idênrica. O lado das respostas não experimenta m udanças em
rei.ação ao grafu o rigi n al . l.acan roma-o como ponto de partida para exa­
minar a di;ergincia de duas respostas às perguntas cuja convergência cons-
rirui o nó do desejo do O u tro [d(A)] . .
Observem que duas respostas divergem a partir do fancasma, defini­
do po r Lacan com u m termo que também é de difícil tradu ção: rlpondant,
é
que em sua própria estru tura fonética impl ica resposta (rlponse) , que cam­
, avai ou garante, o que respond e cal como o usamos cm nossa língua
Lucm
quan do di ze mos " eu respon do por fulano " por exemp lo.

S (� Rechaço, não consistê ncia do

t discurso

/, O a Funçã o do je rlpondant
Divergência
i Signi ficação profu ndam en te
s(A)
alien ada
DIANA 5. RA B I N O V I C H

ência, q u e é o desejo do (A), é 0


O garante imaginário d a converg
den mina a funçã o do eu (je) está enc oberto pel os
fantasma. O que Lacan o

ma, sujeito dividi d o e o objeto a. O eu (je) não é


do is termo s d o fantas o

nos d is pól o s divergentes da respo sta.


nem um nem o utro, e se divide
o

direçã o a o pis o inferi o r e s e situ


a no s (A),
Uma das resp o stas diverg e em
d que vim s é a enunciaçã o. A
signi ficado do Outro, o u seja, no nível
o o

pis superi r, para S(/1.), o nde situam o s a demand a.


outra se dirige para o o o o

o s i stema significante en­


O S(/,.) marca o ponto de rechaço em que
significa nte que assegure a co nsi stência lógica do
quanto tal carece de um
significação alienante
discurs o . O s(A) marca uma resposta que é uma
se cinde
articulada com o gozo, o significado do Outro. Este eu (je) que
entre as duas flechas divergentes das respostas é equiparado , por Lacan,
com o eu de "A cisão do eu" de Freud. Nos Escritos, em ''A ciência e a
verdade", Lacan havia equipa r.ido o eu do fa moso artigo freudiano co m o
sujeito barrado, $ . Por ourro lado, cm 1 9 6 8 , Lacan o equipara c o m um eu
cindido entre a incons i stenc ia do Outro e uma significação de goz o que o
aliena.
No que se refere à significação de gozo temos que pontuar duas coi­
sas: 1) a relação existente entre o objeto a em seu valor de verdade co m o
valor de gozo e 2) a relação do objeto a como valor de verdade e referente a
significação. A an:iculação, que não é fácil, passa necessariamente por Fre­
ge y Godel. O retomaremos da próxima vez.
Por hoje devemos interromper, mas queria recordar-lhes que essas
patologias às quai s me referi antes, patologias de identificação co m o a, nas
quais o sujeito chega para nos ver situado no nível do s (A) . nível da enun­
ciação como significação do Outro, têm a meu juízo uma relaçã o peculiar e
emeua com a pulsão. Isto i mpl ica que o sujeito instalado no lugar da res­
posta como sede de um gozo auto-erótico, se quiserm o s usar o s termos
freudianos , n- · · · a aná 1 1· s e n a medida e m que se v ê obturada a
a o p od e in1c1ar
pergunta que constitui o S . s.S.
Ao situarem-se nessa pos1çao, · - esses SUJettos
·
· protegem, s obrem do , a
. .
cons, stênc,a do Outro da verda
d e e nao, com o o perverso, a d o Outro do
gozo. Esse Outro como garante
da verdade está para-além do desejo , não t
um deseJante. Esses pa cient
· es se apresent am, pois, a partir da resposta, n ão
.
a parur da pergunta• espceia · 1 mente a partir da resposta que asse ura •
g
U M A C L I N I C A DA P U L S Ã O

do Outro , meta que alcançam através da identificação com 0


co nsistê ncia
o bj eto a. O problema clínico que nos apresentam é que exige cerro tempo
o, oisa que se verá em um exemplo que trabalharemos mais
de tra balh c
adian te, a ntes que o sujeito se situe no nível do S barrado e abandone essa
Muitas vezes tenho escutado dizer que estes pacientes,
posi ção de obj eto.
or demais freqü entes na consulta, são inanalisáveis, coisa que acredito deve­
�e mais à falta de paciência dos analistas que a uma falta, qualquer que seja,
do paciente.
li

emos retomand � o grafo tal como o havíamos enfocado na reun '.ão


(omec
passada. Para isso , tem cscmo no quadro-negro uma versão resumida
dos elementos centrais que fo r.1 m examinados :

PERG UNTAS

Convergência
Divergência N6 do desejo
Fw,çio com J desejo
do;, do Outro
Vrrfrutnung

Eu tt pergunto
O que é Eu�
Sign i f,açio
o que quer Eur
profundamente
Tu --> Q.
alic-nada
D I A NA s. RAB I N O V I C H

o lugares fund ame� ta is que


Temo s, como ponto d e partida, o s qu at r
ordenam o grafo aos quais La
can situa conceitualmente de manei ra parti-
em p rimeiro lugar � (�), o Outro .
cular. Se partimos das perguntas temo s
, é definid o co mo o do S2 , significante que
sem barrar, luga r que, em 1 968
reúne em um co njunto o s a be r inconsci ente. Esse campo do Outro se
a lógic a, a q ua l deter m i­
caracteriza, estr uturalmente, por sua inconsistênci
piso superior (fó rmula da pulsão),
na que a dem anda se t ranslade para o
cujo pano-de-fundo é que o (A) p assou a ser um /. b arra do po r su a impo­

tência para responder à demanda do piso inferior.


Do lado das respostas, em s(A) passa a situar-se o S, ficando situ ados,
assim, os dois termos que Lacan qualifica como par orden ado S, - S2
(quer dizer, s(A) - (A) respectivameme) . Deste modo, situ a no (A) o
lugar do recalque primário, da U1wrdrdng11ng, que é coerente com a qu ali­
ficação do vetor que une a ambos os t ermos como "enunciação", enquanto
esta é própria do inconscience.
A demanda situada anteriormen te entre o s(A) e o (A), a dupla per­
gunta o que é eu {jt}' e, o que quer eu (je) ?, contém um "cu o s abes", um tu
que é suposição de um sujeito ao inco n sciente, implicação indispensávd
para o estabelecimen to do sujeito suposto ao saber (S.s.S.) . Observem,
po is, que os efeitos que em outros seminários Lacan situ av a nesse mesmo
lugar, os efeitos de sugestão, são dependentes do S.s. S.
A resposta retroativa a essa dupla pergunta é s (A), significação do
Oucco, classicamen te n a leitura do grafo o lugar do sinto m a, da metáfora
simomal. Ela respo n de - é todavia tão somente uma das resposcas, pois
há duas - à dupla pergu n ta-deman da que parte do (A). Essa uma signi­
é
ficação alienada para começar. Fica assim definida uma significação onde o
eu (je) é pego em uma sign ificação, alie n ada enquanto
lhe chega do Outro
recroarivame n ce. Qua n do este desdobramento
é pego no dispositivo do
S.S.S. temos a precipitação de um si n toma próprio
do inicio da an álise.
A pergu n que surge da fórmula da pulsã
. � o par a convergir co m a
ancenor no deseJo do Outro, que passou
primeiro pelo fantasma, cem co mo
segu n da resposta, também divergen te,
o sig n ifica n te do Outro barrado,
S /J), significan te da n ão co nsistfocia do
discurso, ou O que Lacan , em "A
lógica do fantasm a", denom i n a o
"não h� universo do discurso" . E.sra t
U M A C l f N I CA
DA P U LSÃO
37

- cnre uma resposta à deman da• mas à dcmand em


i.,oualm ª
. sua a mculação
.
co
co m o /, barrado do tn nsciente.
O D mai úsculo da p ulsão é ' po is, · tam bém uma dem an d a-perg unta,
ção co m O SUJ. eito do tncon . .
que em sua anicula. sc1e nte na pul sao .
- se situa no
.
s1g01ficante,
nível de p uro causa ndo a pergunta, na medid em que .
.
_
ª a tn-
co ns istê ncia do Outro é um f.1to estrut u ral e nao um acontecimento. Aqu1·
podem os recordar .
esse aparente parado xo de Lacan segundo O qua 1 a
res-
p o sta determt na a pergunta e que só se faz em pergunt as quando se conhe-
cem as respostas . Es ·
sa respos ta, q u e é O S (r• II ) • nos d á um claro exemplo
. que se retere Laca n , pois, essa resposta est á determmando a pró-
da quil o a
. . . .
pna pergu nta, o que 1 mpl1ca uma dep e ndência ló gica da pu 1 sao _ em relação
; . A l.ormul.t
S(f\)
.
qu dara
.
rnnca dessa Jep•,id•
' cnc,a · é o "nao - há re Iaçao
ao e -
. • -. . . . .
sexu al q ue L.ican pos t u l .1ra 111aos au1.1111e ou O seu an tecessor na lógi ca do
fantasm.t, o "não h.1 a i o sex u .1 1 " .
O S (/.) DlJ C(.1 , rn 1 .1 0, . , i 1 1cxi>1ê11cia do sexo, s u a su bstituição pela
sexuali dade - po lun o r Lo e pcrvc "·' - 4uc é inseparável da pu lsão em
Freud e em L.1,,. n . A pcr�u n u d., p u l são é, ponanw, uma pergun ta pro du­
iida a p.utir '-.iJ t"Srru r u rJ ; pl·rgu n t ;i cuja gênese - toda insistência nesse
pomo ser.i insuficiente - é lógica , e não cronológi ca .
Entre o (A) d,, demanda de amor em "As formações do inco nscien­
o,, do saber inconsci e n te em 1 968 e do 5 (/,.) existe, precisam ente, essa
ente
rd..ção fundamen tal que é marcar o salto entre a demanda (inicialm
deir o do
próxima da neces s i d ad e , por s u a transfo rmaçã o n o desfila
entre a de­
ngnificameJ e o desejo . Mas també m indi ca a so l idariedade
o S(j(.) , uma vez que este
mand a capturada na pulsão - não no desejo - e
tência da rel a­
demo nstra o l ugar logi ca mente in icial da castração , da inexis
ria estru tu ra. P r iss desejo p ode
ção sexual como presi d i nd o a próp
o o o

da dem an da, po is não basta


so ­
ção a part ir
separar -se no nível da en u ncia a nece ssida de de que ral
mente a inco nsistênci a do cam po d o Ou tro, mas
ana, com a ausência de
inco nsis téncia esteja reun ida com a castração freudi
c loca em um prim eiro plano uma
com p lemen taridade sex u al. Esta leitu ra o
ma form a que o fu � tasma,
m udan ça de matiz no s(A) que se rom a, da mes
sati sfaç ão da puls ão. Este mat iz an �­
uma sede possível de go1.0, isto é, de
a e do gozo , CUJ •
art icu laçã o do sin tom
� . portan to, à i n tro duç ão da
can.
Pkna �paraç.ã o acr� poste rior em La
D I A N A 5 . RA B I N O V I C H

o nal c nve rge s o � r e o de­


A pe rgunca que parcindo d a fórmul a pulsi �
lugar específi c m q ue o o bJ e Co � (d e 1vado
sej o do Quero , indica .� �
o e
'
o

o nde r co m o o bi eco nacura l ,


própria impossibilidade da demanda de resp
ss que scará p rdid na e scrucura ) , co m o o bj e co
0 da ne cessidad e , e e e e o

o , o bj e co causa d o dese­
pulsi o nal, deve rá arcicular-s e co m o desej o do Oucr
papel n ssa r sp s a ccmral qu e é o fancasma.
jo, para assumir s e u e e o c

Fancasma qu e enquanco axi o ma Lacan, e m "A Lógica . . . ", co ns idera


ao mesmo cempo a chave da significaçã o d o Oucro e cambém aquilo que
melhor obc u ra o rechaço apresentado por S (�) . Na re u niã o passada, aludi
à com u nidade ropológica q u e L1can define no Semi nári o XI co m o própria
do objero a em se u funcionamenco p u lsional e desideracivo. Obs e rve m
q u e na fórm u la da pulsão nos encom ramos com u ma a u sência d o objeco a,
q ue só aparece no grafo no n ível do là n 1 as m a . ls10 mes mo já s i c u a o famas­
ma como sobrede1erm i n aJo pelo desejo e pela pulsão . Se p e rco rremos o
grafo podemos dizer que esse ,, , esse vazio que a pulsão contorna, p ode-se
sicuá-lo de maneira implici1a no n ível da pu lsão (objeto co m o r ecuperação
de gozo) e no n ível do nó do desejo do Ou cto (objeco causa do desejo,
objeto perdido fre u diano) . No n ível do Ou tro (A) , o a aparece em sua
relação com o amor e sua demanda, prolongando-se em s u as formas
revestidas pelo i q u e são i(a) e i '(a ') , i n ttoduzindo-se, pois, no eu com uma
possibilidade de leirura múltipla, desde sua relação com o objeco no fancas­
ma até sua relação com o espec u lar, passando pelas i l u sões do amor, vale
dizer, todas as s u plências do significante do "não há relação-proporção se­
xual".
Lacan nos diz q u e o sujeico é primeiro o objeco. Qu ando se pe rgu nca
o que é para o O u cro como objeto, q u ando su rge essa pergunta do s ujeico
atravessado pelo significante acerca do q u al é o e u (je) , a resposta é d u pla:
por u m lado é o/, barrado, por o u rro o objeco a. Por essa razão a função do
je oscila entre $ e a no fantasma.
Lacan caracteriza esca divisão do c u e n tre oi, e o a do fantas ma co m
u m ccrmo de clara tradição fre u diana: Verle ugnund do e u . Em "A ciên ci
a
e a verdade" Lacan in trod uz a lchspaltung _ correlativa em Freu d da
Ver_leugn ung - como característica da d ivisão co nsrir u i n tc do s ujei to . Di­
r . em
: 15ªº q ue ".,' ntém_ a Verleugn u ng, na medida e m q u e no ano ,eg u i n e
A lóg i ca . . . • s u poe q u e • mesma é i nscpar:lvcl do sujeito no ato. A cisã o
U M A C L IN I C A D P U
A LSA D

do cu freudiana não. é, port anto, articulada com uma d1v1sao " . • do cu cn-
.
cendida como o mo, '"rrancês, mas como uma div1s • que '"
. . • · ao arcta o cu como
]·e. Esta d1v1sao em Lacan é, então, solidária da v.;erleugnung (reneg
. enquanto . . ação
ou des m enndo) d1v 1são do 1·, entre O Pé e o a.
No nível do cu
• .
co mo mo, continuarem os frente a .
frente com a v.;erne1gnung (negação).
. . .
Vale dizer que o eu (;e) se aloia em dois p rodutos da cade ia · i· r,1cante
· s1gn
o r um lado na concaten ação S , - S ,. por out ro no que é
P . _ pro duz1"do po r
essa p rópria concatenaçao, o objeto a , produt o do sim ból"1co que escapa
ao simbólico.
O p roblema clínico ao qual aludi é o que se apresenta com aqueles
sujeitos que reco rrem ao psicanalisia colocados na posiçã o do a, onde O je
se si rua sob a insígnia do a . Quer diur, que o sujeito se apresenta siruado
no lugar em que Lacm coloca d o próprio psica nalista no discurso do ana­
lisra. o de scmblame de " · Esses pacienies, que não são perversos, se apre­
sencam sobrerndo pelo :\ n �u lo do ,1 ue 1 radicionalmenre se chamam
impulsões, c-:ir-,teropat i.1s. e1c l) .isscn1a mcnto nesta p osiçã o é incompatí­
vd com a consrirni\-fo mcs 111.1 Jo S . s . S . e da l fansferência. Estes pacientes
apresen�lffi. <>mbó11 . d i ticul daJes no estabeleciment o da asso ciação livre,
são fenomenologi1..J. 111encc LJ. racrerizados como "duros". A pergunta que
surge e a da relaçio dessas parologias com o fantasma e a pulsão .
O fan tasma . ele também resposta, se apresenta como essa encruzilha­
da que é garanre do desejo do Outro a partir da q u al dive rgem, dissemos,
essa.s duas respostas q u e são 5 (./,..) e s(A) .
Se nos d i rigimos pa ra a resposta inferio r, s(A), convém p recisar a
e
aniculação que em " De um O u tro ao o u tro" se realiza entre significação
gozo. Já na primei ra aula , ao retomar a renúncia ao gozo, Lacan_ assmala
o,
que O mais-de-gozar se funda na enunciaçã o , devend o se r co nsiderad
porcan ro, como efeito do discu rs o .
cerna, o conceito mesm o
Isso nos l eva a revis ar, antes de entrar nesse
· •• · lóg1ca. O p o rq u ê desse desvi o fundam e nta-se claramente
de cons,su;nc1a ·
q ue ass ume a
no enunciado po r Lacan ao defini r a demanda co m o a fo rma
enunciaçã o d evido à inconsis tência d o campo do O u tro. .
. rmal mat emáu co ded
u uv . o
Pa r eam os do far o de que um sistcm a fo d º b as '.· ca -
imp lica um c o njun r fi rma
- p uro ou de ciên cia abst rata - o o

rm os ind efinid o
s; 2 ) p o stu 1 ad os 1m-
rn� n u, p or quatro eleme ntos : 1 ) tc
D I A N A S . RAB I N OV I C H

e finid o s ; 3) d e finições
q u e e nvolv e m o s
plicados p o r es tes te rmos ind
postu lado s e 4) t o r e ma s q ue s e de.
te rmos inde finid os para além dos
e

r e m lógic a m t rmo ind e fi nido (o u


duze m dos postu lado s . Ao u tiliza
u e

-s , prim iro, vitar o dil e ma da ver­


símb olo s e m s ignifi cado ) cons e g ue _
e e e

única v rdad ) g u ndo (d e vido a s e tra­


dade (dado qu e não há u ma
e e e se

) , propo rcion ar várias inte rpre­


tar de símbo los vazio s , s e m signi ficado
a, uma c e rta dimin u ição da
tações válida s. Regist ra-se aqui, s e m dúvid
com a q ue s o fre o conc e ito de
hierarqúa da ve rdade, a qual é sol idária
verdade no ensin o de Laca n .
Esses sistemas propõem , dentro do campo lógico , a p e rgunta acerca
limite de
de qual é o limite de seu desenvol vimenw. Pode- s e chegar a um
desenvolvime nto de u m sisrema dizendo se é verdadeiro , V, ou falso, F.
M as , qual é o critério de V ou F quando não i mervêm termos empíricos?
N esse pomo sur ge o prob lema dos critérios lógicos. Quando podemos
usar crirérios empíricos pode mos prova r mediante experimentos, por exem­
plo, a aplicação de cenas leis x no ca m po, suponhamos, da física. No cam­
po da pura formalização maremárica e lógico-matemática, por outro lado,
não há nenhum rekrente em jogo, entretanto, este implica que um signo
indica-o enquanco objeto .
O primeiro desses critérios lógicos de verdade, em oposição aos crité­
rios empíricos, é o que afirma que um sistema de postulados abstratos deve
ser consisi:ence. O que quer dizer consistente? Uma definição lógica clara é
a que diz que não é poss(vel (ou seja, que está p roibido) deduzir, a partir de
qualquer dos posrulados, um par ou mais de teoremas que se contradigam
entre si. Quando se chega a duas conclusões contraditórias, o sistema
axiomático (o axioma é outro nome do termo indefinido) é inconsisten te e
deve, então, ou bem ser descartado ou bem ser reparado.
Nesse ponto surge um novo problema . Suponhamo s que não exista
um par de teo remas contradi rórios e, portanto, pode-se concluir que o
.
sistema é cons,sten te. Não obstame, é possível seguir dedu,.indo novo s
teoremas, dado que não se esgotaram todas as deduções possíveis de u m
smema e podena .
ocorrer que entre os novos teoremas deduzidos surg isse
uma contradição. Se isso ocorresse, o sistema que consideramos cons isten -
te se tornar:! inconsi stente · portanto , p ara rea 1 .,zar um julzo de . .
. con sisr en cia
necc:u1tamos de todos os teorem as ou tod as as deduçlies de u m
possíveis
Ü M A C L I N I CA
DA P U L S A o
41

Ass im, nos depara mos co m O p roblem a


si stema. do nao
_ f,echamemo do
do di scurso , tema que Lacan enfa tizou
un iverso ' e que em lógica. .
de1Xa
"
- d a poss1º b 1l 'ºd ade de i nconsist·e
estao .
aberta a qu . ncia de um siste ma
Voltemos, para 1Sso, ao problema do "to do" do sistem ·
. a . Pode ocorrer
qu e to dos os teoremas possíve1S não te nha m sido de duz1·d os.
. - . Se tal fosse o
caso, poderia entao s u rgir algum teore ma deriv
. a d o desse Sistem a que fosse
contrad1tó. no com omros teo remas do mesmo , tornand o então
inconsis­
ten te o sis tem a antenormente consistente .
Dessa ma n e i ra , a incons isrência se apresen ta como um risco i ntrínse­
co nos sistemas formais puros . Para com pensar este risco admite-se um
critério opera tivo de consisrência que considera que u m conj unto de pos­
rulados é deno m i nado consistente se ex iste uma int e rpretação dos termos
indefi nidos ou axiomas q u e converc a todos os postulados em afirmações
veríd ic-.is, levando-st, p o r c a n 1 0 , em consideração tão somente as i nterpreta­
ções dos axiomas q u e sej a m pusrul.1Jus verdadeiros.
O resulta.do dt·ssa co nsiscCrll: i a o p erativa é o conj unto concreto, co­
nhecido. de afirmações vc rJJdei ras, que recebe o nom e de modelo. S em
dúvida, é m u i ro mais s i m ples confi rmar a operatividade de u m modelo em
fisica, onde o modelo e m p írico funciona melhor como prova da consistên­
cia de um s is tem a . Nos sistemas matemáticos puros as provas de consistên­
cia se reduze m à bus ca de um modelo, que não é um refe rente empírico,
em outro s iscema m a cemácico já provado o u m elhor provado, isco é, de
sistema
maio r força lógi ca . Em s u ma, desloca -se, então, o problem a de um
ao q ue hab,-
matemáti co a ou cro siscem a macem ático . O qu e corresponde
rualme nce se chamou mecal i n guagem . . .
e como garan ur a
conS1s­
En co ntramo- nos, pois, com o prob lem a d
ei ro sist ma. Todo
t.ência do siscema que vem ga rant ir a cons istên cia do prim
e

ar a dem onst rar


a
o esforço de F rege , dep ois d e Russel e outros, foi cheg
u al d e conS 1s-
dado q u e a prova hab 1t
consis tên cia abso l uta de um siste ma,
· . ... tema.
r<>
-nc1 a só escabelece a con mtcn cia · re1 a t'i va de um sis . ' '
teore ma, dem ons trou a imposst b t-
Godel e m 1 9 3 1 cm seu famo so . • c1a· .
r su a cons 1sten
o d e de mo nstr a
""""' para um
J;À_ .1 ' siste ma' form a l a b strat co m p I etu de e da
da
Nesse p o n co deve m o s i n cro d uz1, r O P ro blc ma
11\com plerw:k dos siS1e mas.
D I ANA S. RAB I N O V I C H

No sentido lógico, a incompletude d e um sistema impli ca que me �


considerado completo no caso em que é possível deduzir dele u ma p rova de
qualquer proposição ou da negação de tal proposição. O sistema será in­
completo na medida em que exigir hipóteses adicionais para provar deter­
minados teoremas, que não são os axiomas, hipóteses que deve tomar de
empréstimo, por exemplo, de outro ramo das matemáticas. O teorema de
Godel demonstra a incompletude dos sistemas formais através dos pomos
de irresolução que estes apresentam . Os pon tos insol úveis são aqueles pon­
tos da dedução em que se apresenram elementos de um sistema que não
podem ser nem afi rmados nem negados. Ao encontrar esses pontos em
que um posrnlado não pode sc:r nem a fi rmado nem negado, isco é, q ue não
podemos decidir a respei10, o sistema não é completo, é incompleto . Esta
i ncomplerude não dcvc ser runfundida cum a que se mencionou antes em
rdação :i co nsistenci., , quer d i , er. 1 1 :1 0 deve ser co n fu ndida com a própria
i nconsistt'ncia.
A i nconsisrt'n(iJ, n-ro rJc m , e: o po11 1 0 cm que existe� em um siste­
ma duas p ropos ições co1H r.1 J i l ó rijs c 1 1 1 n: s i , cada uma delas separadamen­
1

te, é n,rdadeira ou fulsa . mas não in sol ú vel . Na p rova de Gõdel, por outro
l
ado . a incomplerude é gerada por um postulado acerca do qual é impossí­
vel decidir se é verdadei ro ou falso.
Portan to, uma coisa é a i n consistência e o u rra a i ncompletude,
que depo is pode ou não se associar em um sistema determi n ado. Isso
imp l i ca que se deve prestar atenção quando Lacan se refere ou bem a
incomp l e tude ou bem à i n consistência, pois ao longo de seu Seminário
se r efere a ambas .
Voltando ao nosso cerna, centrado na inconsistência nesse Semin�rio
- mas não alheio, como se verá, à incompletude e ao insol úvel -, o pro­
blema é formula.do em relação com Outro do significante. É, porranto,
um problema a r riculado dent ro da lógica do significa n te, não um proble­
ma de ordem emp í rica. Pelo conrrário, é essa lógica que roma signifi ca riva
e que o r ganiza a p róp ria experiência .
.º problema que aq ui enfrentamos é o que propõe o estatuto especial
do obJew em psican�lise, desse objeto que La can delimirou como objeto a.
O p rop�mo de La":" n é justamente de separar tal objeto do enfoque empirista
ali entao predomman cc, di ria inclusive do enfoque fenomenológico até
U MA C LIN ICA D A P U LSÃ
O

ntio im pe ran te, por exemp lo no kleinia nis mo. •·or n essa razão
e
o ob1' etO "
nio é o o b.Jeto p arei'ai , mesmo que sua teorizaça·O se apó'1c cm dito .
obi'ct0•
Lacan pretcnde, po i· s, fun dá-lo em uma exis tê · .
nc1a lóg1ca , nao _ cm uma exis-
. fa to e, nessa b usca .
tê n cia de . .
, o exame da cons 1st · ê nc1a dO Outro do
si gnifi can te é um passo .
indispens ável. O Outro d0 sigm · 'fi•can .
te é inconsis- .
.
tente po r sua própri a dependên cia da estru tura da li nguagem e da 1mpo . .
ssi-
.. .
de assegurar a existência
b1hdade da mesma . . da r e laç·ao sexua 1 , de assegurar
.
ao suj e ito. uma. 1denndade sexuada além de sua incap ac1'd ade de ass egurar-
'.
Ih� u m a 1dcn ndade apen�s. O obieco a é precisame nte esse resto do pró-
prio e ncadeamen to s 1gm_hcance onde essa impossibili dade se faz prese nte.
Encre camo , esse resto deixa de ser me1:ifora para tornar-se real lógi co , vale
d izer, i m possivd lógi.:o , nus um i m possível que conserva com a ve rdade
uma relação que lhe é pe.:uliar.
Podemos , nesse pomo, rernrJar que Lacan, já no Se minário I, defi­
nia ,1 signifi,-.i,-ão n>mo u que re111e1e a outra signi ficação. Este remetimento
que implica unu n> n.:e i 1 11 .1l i 1;1,·:.0 Ja referência lingüfstica, que e ntão já
não era cmpiri,·.1, entendiJ.1 .-omu signi ficação, está na própria base da con­
ccitualização inicial do objero como metonímico. Mas esse obj eto é ainda
pn:sa da meton ímia e da metáfora, pomo no qual p e rmite uma apreensão
fenomenológica do objero, ponto e m que sua articulação ainda está muito
próxima da do kle i n ismo. A delimitação do obj e to co m o real contém sua
-lo
articulação para além da s ignificação, ainda quando possamos registrá
no nível da si gn i fi cação .
o r que o o bJ eto
Tendo p resen te o anter ior, p o de m os nos pe rgun tar p
do ao es o t po e m termos de
" cm "A lógica do fanras ma" é aludi m m em

pri meira si gn ificação e primeiro re fere nte . .


conce itos de refere� te
Para is so d evemo s exam inar, brevem ente , os
m o sab��· Cl ta
d e Fre ge , a quem Lacan, co
ílógico , não lingu" f51i co) na obra u a ras
fi d a "Pro pos1çao do
er
muitas vezes. Fazê- lo n o s per m itirá e n tend m e
. nde esse s dol S termos
outu bro de J 967 para a form ação d o ps1 cana r1s ta" , o
fazem sua apançao. · -
. m o alem ão
Bedmtu11g, uso alta-
Frcge faz um uso paru cul� r do te� nlo pene ll'I·
o dia de ho J e , Pol! .
ica na ' qual
a uso pe<:uliar
IIIG! tc poll mico na l ógica a té
m
1 c1 d r
, om o n o s pe rmite e u
O

r�Rl<>I. po is o que me intc reua " c rcfe rc mc .


que l.acan faz dos termo• 1ign ifica çlo e
D I A N A S . RAB I N O V I C H

Frege os dife re ncia cm s e u artigo " Ueber Sinn und Bedeutung", tradu­
ções se é que hi
zido alternativamente, cm geral sem demasiad as explica
como "Sobre o sen tido
alguma, como "Sob re o sentido e a significação" ou
recai sob re 0
e O refe ren te" . Observam que o dissentim ento na tradução
termo Bedeutung, traduzido alternativ amente como "significação" ou "refe­
u
rente", coisa que em inglês e em fran cês também ocorreu (meaning o
referent, sign ification ou reftrrnt respectiva mente), pois o termo Sinn n ão se
prestou à vacilação alguma, stnst em inglês e stns em francês.
Ferratcr Mora, para tomar um dos textos de consulta mais i mportan­
tes de nossa língua entende, por exem plo, o Sinn como conotação - en­
tendida como nora ou conj u nto de noras que determ inam o objeto ao qual
se apli ca um nome, termo ou símbolo - e a Bedeutung como denotação
- objeto ou objetos aos quais se aplica o nome ou símbolo. Espero que se
considere que esta forma de situar os dois termos corresponde ao p roble ma
da significação e o referente que aqui nos interessa.
O mes mo Frege assinalou que a palavra alemã Bedeutung cem dois
sen tidos possíveis: primeiro , signilicação e, segundo, referente. Este últi­
mo é solidário, para Frege, de um uso técn ico do termo, derivado do verbo
deurtn, contido em Bedt'llrung, que significa apon tar, indicar, assinalar, isco
é, que remete à função referencial primeira, a do " isso", a da i ndicação, a do
dedo, o índice apon tando para algo. Frege tinha cabal consciência de que
ao usar o termo como i mplicando referente escava fazendo um uso técnico
do mesmo, escava i ntroduzi ndo uma inovação terminológica.
Frege dá um exemplo que se tornou clássico: estrela matutina e estre­
la vespertina são duas denomi nações cujo referente-signi ficação é o mes­
mo: o planeta Vên us. Este é, então, um referente ou uma significação com
dois sentidos. Outro exemplo é formular 2 + 2 = 4, dizer 2 + 2, ou dizer 4.
Nesse caso temos dois modos diferen ces de nomear algo que cem um ú nico
referente. Desse modo, nos defrontam os a critério de Frege com variações
do nome próprio, as quais podem estar dotadas de mais de um sentido.
Um signo completo para Frcge implica a coexistênc ia de um sentido
e um referente . Mas todos sabemos que existem
_ signos sem re fe ren te
empírico , por exemplo, o un icórn io, topos clássico na lógica.
La can se refe­
re a esse problema m uitas vezes . De acordo com a definição que acaba mos
de dar, o unicórnio seria um signo incomple to, dado que lhe faltaria um de
U M A C LI N I CA DA
P U LSÃ O

o re ferente o u
seus co m ponentes, signi fi caçao - , B .L. .
a eun, tung. Freg
o , op õe então a n e. c o e, nesse
o nt çã li terária à histó ria a fi
P · o · o p1 m de demo nstra r
exi stem sign s mc m etos . D esse m odo · que não
. ' um a co isa é re atar
I a travessia do
Rubicão p or Juho César, e o utra, to talm ente disti nta o
..., • aludir à trag éd"1a de
Shakespear e. , rata-se o u na- o do mesmo Julio Césa 1 . .
. r . No pnmeuo
caso o
nome própn o remete a uma pessoa real , histó ri ca , que é e rente na
. . seu rere
dimensão da hmóna. No segu nd o , remetemos a um refe
ren te literário (a
obra de S hakesp eare) que tem, pa ra muit os, mais realidade que
O referente
histó rico.
O cour de force de Frege é postu lar que no caso da
ficção lite rária 0
referente-signi ficação está co n s 1 itufdo pelos valores de Verdade (V) e Falsi­
dade (F) em si mesmos . O problem a está propost o incorreramence se nos
pergunta mos se o unid>rni o ou J ú liu César existem ou não empi ri camente.
A proposta adcqua,b é se t' 0 1 1 n:in verdadeiro o que deles diz a ficção. Não
se trata de comprovar, po r exemplo, se para os gregos existiam ou não os
sátiros, a verdade dessa fic,·ão no mundo grego. O mesmo podemos dizer
do unicó rnio na Idade l\·l éd i a , na qual sua presença simbóli ca tinha uma
im po rtância peculiar; testemunho disso é a tapeçaria que se encontra, ain­
da hoje, co nservada no Museu de Cluny em Paris .
Na ficção literária funcionam os valores lógicos de verdade e falsida­
de, não os val o res empíricos. Po r esse ângulo, todo signo pode ser conside­
rado uma nominação , coisa que não é nada do agrado dos lógicos empiristas.
Essa posição de F rege não pode deixa r de nos evocar a definição de Lacan
d0 �-..;J º com o um.a fi,cça- o ve rd ªdeira vale dize r' uma ficção sem referente
""""".'" _ '.
empíri co ou signifi ca ção empí ri. ca , CUJO referente é o V do valo r 16gico de
verdade ·
em suas duas
En cont r amos em Lacan o uso dO te rmo Btdeutung
- . . - e A p rimei ra é usada com re1açao
-
acepções possfveLS ' s1gn . 1 fi çao e rcrc rentc. .
ao trad uzt r para o
ca
ao falo e a segun da com re lação ao b .
J to a. Assi m
_
O C
1 emao, : escolheu O termo
�rances • o título de sua con f,c r,;;• ncia . P rofe nda cm. a
. aru go d os e. ·ios. O obi" ero "
••gnificação " S i gn i fi ca ção do fal O ' p ara seu li LJCrl
o rele-
�-" ·
i ucn . pções , mas cl aramente
é
n1do altcrnat1vame ntc com a m bas ace valo r de verdade,
ren � Iógi co · o aé po ca d or d e um
da ficção dc1i dc ra c1va.
r
de
. . peIO co ntrário seu valo r
!tão de um valor cmplrt co ou ereno me nol óg1co. .
nolog
,ua própria fe nom e .
ia
ver� cxp laui r fun da
DIANA s. RA� I N O V I C H

Esta diferença nos permite entender a formulação central que Lacan


realiza na ªProposição. . . " à qual aludi antes. Diz ali ao introduzir a fórm ula
do S.s.S. : " Debaixo da barra, mas reduzido ao padrão de suposição do pri­
meiro significante: o s representa o sujeito que rcsulca dele, implicando no
parênteses o saber, suposto presente, dos significantes no inconsciente, sig­
nificação que ocupa o lugar do referente ainda latente nessa relação terceira
que o associa ao par sign ificante-sign ificado. " [O itálico é nosso] (Momentos
cruciales de la experiencia ana{lh"ca, Manancial, p. 1 3.)
Na parte em itá l ico da citação Laca n susren ca que no lugar cm
que situa o sujeiro como significação, nesse mesmo l ugar está latente e
deverá vir a ocu p:i-lo o referente l areme ai nda não manifesto. Portan­
t o, o lugar da s i g n i fi c"ção de s u j e i t o - s i g n i ficação que permite a ins­

talação do S.s.S . - é "q ude onde deve i nsta l a r-se, p osteriormente, esse
referente que é o objeto ,1. A q u i a p a rece a dupla di mensão em que
i n tervém a Brdnmmg no cu rso de u m a psica nálise; aparece primeiro
como significação do sujeito , si g n i fi cação que, sabemos, remete sempre
ao falo, significação q ue funda o S2 com o suposição de um sujeito
ao saber do inconscie n te, e m cujo l ugar, ao cai r p recisamente dito S.s.S.,
ao final da análise, aparecerá o referente latente, o a, nesse lugar desig­
nado na estrutura. Esta frase de Lacan , para mim inicialmente enigmá­
tica, coma- se clara se temos presente a bivalência do termo Bedeutung
cm Frege.
O s ign o da ficção verdadeira que é o desejo é, pois, um signo co m­
p l cco, dorado de u m a significação, a do sujei to sob o falo, e de um referen­
te, que aparece quando cai a significação de sujei to, o a. Quer dizer que
�odemos dizer que se a fórmu l a se ca l ca in icia l men te na formali zação do
-f
si gno saussurcano ao final torna-se segundo Frege:

s
referente (laten te)

ou seja, urna das formas do signo completo de Frege. Temos, o is, uma
p
notável cocr!nc ia na " Proposi çao
- ... " na med"d ,
I a e m que nela o final de an•-
.
hac se defi n e por um duplo m ov1· m enco: d o l a . . m01
d o do paciente vcr1fi ca
UMA CLí
N I CA DA P
U LS ÃO
47

tuição subjetiva e do lado do ana 1 1st .


uma desti a ' co rreiati·vo da que
--
5 .s . s. • o sur gimento do des-ser sob a form a do .
obJeto .
a • isto é • pot um
da do
ção de S e, p or o u tro, o surg .
im ento do vazi o es lado
a produ 1
sen cial do refetente
. o.
lóg ic
Es ta separação da signi ficação de sui· eito e do re erere
nte que é o 0bºJeto
a • é exatamente o q ue indica o final de a nálise " co
. . mo estabelecimento e
-
separaçao dos dois elementos, cuia coni·unção con f,igura o aga lma• sob cuia .
égide a análise se incia: (-<p) e a.
Na própria disj unção desses dois elementos emerge o des-ser do a, .
. ,. Já
fálico . Des-ser que recai sobre O ana 1 1sta,
P rivado do b nlho __ · trazen do à luz
aquilo que o efeico mesmo de S . s. S. encobre . O tu, sup osto no início da
cransfe rência, cai revdando o des-ser do obJ eto causa , O que cai,· por sua
º

.
vez, de sua própria posi�·ão A credibilidade que se o ferece ao S.s.S. tem seu
fundam ento na presença implkita, late nte do a, no lugar mesmo em que se
sirua a significaç-.io de sujeiw. Vale dizer que, mesmo que não saib amos
qual é, mesmo que não o conheçamos, o a como refere nte lógico está pre­
sente desde o início de coda análise, fundando, em última instância, a trans­
ferência. A aparição desse referente em toda sua verdade de ficção é incom­
paável com a persistência do W.
O a, como referente lógico, situa-se sempre em relação ao Outro
barrado, (.A) . e é aqu ilo que, por excelência, obtura sua inco nsistência. Ao
obrurá-la, faz do Outro um Outro sem barrar, nã o desejante. Esta obrura­
no
ção, é fundamental tê-la presente, é uma obturação lógica que se funda
obje to como esse desejo da operação subjetiva dotado de um val o r de ver­
função de
dade que lhe é próprio, que, enqua nto tal, lhe permite exercer tal
ob ruração.
. . no qual p ode-se
Da pró xima ve:z farei re ferência a um caso cUni·co · freqüente,
0 bservar urna forma de d emandar aná1 1se que, mesm0 que seJ a
.
. e.l t0s que se apresen tam
apresen ta uma dificuldade p eculia r. Trata-se d e suJ a to
. . - es tá latente, mas está em
nao
e m po s i ção de objeto , onde o obJ eto rm a de reco rrer à
d'1 •n rc de n ós, o sujei to se id enu. ficando com eI e. Esta fo
a11 ál'1 . s ma de in stalaçao SS
_ do .s . . Est
a

1 1d
se é inco e rente com a p oss1ºbºlº a d e me ne uro se,
estrutu ra _
f,"� de apre.
\entação não é próp na . de nenhu ma
DIANA s. RA B I N OY I C H

perversão, psicose -, mas torna diflcil o próprio diagnóstico da cstru tu


Cabe recordar que chegar na posição de objeto não é patrimôn io de
nra.
e.
nhuma estrutura em particular. Sujeitos que se apresentam desse m
odo
nos confrontam com certas dificuldades no que diz respeito à e n trad
a ern
an álise, que espero poder trabalhar em relação ao caso que apresent
are i na
próxima aula.
Ili

C ome çaremos hoje com o caso . Não se trata de u ma pacien


te que sofre
uma neurose grave , mas , a me u j u lzo, de
alg uém a que m não é fácil
analisa r. Nem sem p re a grav idade e a dific
u ldade anall cica são solid
ári­
as. Esta form a de apres en tação , q u e é relativ
am e nte freqüen te, cria nos
analist as, ao meno s em m i n h a experi ência, cerca
sensação de impo tên­
cia e de i mpaciê ncia. Não se deve confun dir esses
sen t im e ntos com a
impossibilida de lógica de u ma anális e , porq ue só pod e mos
falar de
inanalisab ilidade quando nos encontram o s co m u m obstác ulo
n o nível
lógico, não quando encontramos um obs tácul o no nlv el da impo tência
ou da impa ciênc ia.

An tes de com e çar que ro esclarecer que incluí o grafo simplificado e o


esquema da alienação, cal como Lacan o apresen ta e m "A lógica do fantas­
ma" . A opção alienan te já não é "ser o se ntido" como o Seminário XI, mas
sofre a n egação compl e men tar d e d e Mo rgan ou lei de dualidade , com é

chamada hab i tualm e nt e e m lógica. Lacan a plica essa negação ao cogito
cartesian o p ara ob te r uma disj u nçã o , u m vel ali e nante e ntre u� "ou eu não
_
penso ou e u não so u ", q ue é a cransreo r maça- o so b a qual o courto ,,. cartesian o
.
podc ser o p e ra t ivo e m psica nál is. e . Po r q ue O me
· 1 u01· O incluo , precis . .
amen-
.
· 1 de "S u bv e rsão do SUJel to.... ,
te, po rque e n t re o grafo na ve rsa_ o erad ,' c1ona
.
e o grafo cal co mo apare ce com as mod 1. f1, caçõ e' s q u e vimos .mcro d uz1'd as por
. -
l..aca n cm " De um Ou t ro ao o u t ro " ' estão esses esquemas da a1 ,en açao q ue
_ . rcssa su bl'm har a
lao fun dam en tais para si t uar a pro bl em ácica qu e me mce
nlvel .clinico.
D I A N A S . RA B I N O V I C H

AJienação

Passagtm a o Ato Repetição

Operação
Verdade

Acting�our

(�.
� resisténcia

ou-ou
Alienação
Ou eu náo penso
Ou eu náo sou

Verdade

In, on1df'n1r
UMA C LíN
I CA DA P U
LS Ã O
51
Vam os ao caso. Não me interessa tant
o e1 uc1. dar ce rtos
ria, como pontuar algu ns mo me ntos d detalhes da
his tó O que podemos c
ham ar em sen-
tido estrito segum · do Lacan: a direção da c ura 0 ueça . _
. o que • evi. dentemen
te' se reconstrói retroativamente a pa rtir do mo m ento atual .
-
dessa pacient e
em anál
ise. N ão é uma análise que esteja em
. seu fiim, é uma anál
ise que
passou por avata res imp orta ntes que, creio , são de interesse
Tra ta-se de um a mulh er jovem ' casad a , tem
. , . 6· Ihos. É uma
VdftOs
P ro fissi onal que trabalha com seu m arido em u
. m com émo · da Grande
Bue nos Aires , está em uma boa posição eco nômi ca e consu 1 ta, prim . eiro
.
Ponto, de um modo ex t remam ente vago • não há na consu I ta nada que
.
. del1 m 1. 1ar bt'm o q u t' ocorre. A ún ica coisa que há é
permita uma queixa
ines pecífica sobre um mal-t'star , mal -esta r que não se sabe bem se é consigo
mesma ou com os dt'mais. parect' oscilar en tre u ns e o u tros. Para a pessoa
que a recebe é evidt' nte q ue ,sta paciente poderia ser incluída, a partir da
visada médica, no quadro da obesidade, mas não faz nenh u ma referência a
ela nessa co nsulta t' não apa rece como sinroma, no se ntido de proposto
s u bjetivamente como prnblema . Antes , as q ue ixas que, como disse, são
inespecífica.s , cen tra m -se em cercos as p e cros i maginarizados de rivalidade,
seja com seus irmãos, seja com se u s cunhados, seja com seus sogros, seja
com seus filhos, seja com seus próprios pais. Isto é algo que poderíamos
siruar, grosso modo , como rivalidades imaginári as , e há também uma quei­
xa em termos de frustração de amor, m as muito ambígua. Tampo uco é
alguém cuja vida estej a caracterizada (no momen to e m que pede análise)
por um excesso de frustraç ões "reais" n e m nada qu e se pareça. Tem vánas
salvo um
análises e terapi as q u e não sabe m u ito bem o q ue lhe de ram,
---L l · o e · ao qu e está pass and o.
Isco cam-
vU<..ilOU á n q u e p ronto para rerenr-se .
. mar bas eante
as
L,
ucm acon tece freqüen temen te, e, às vez s, há q ue s e dis cnm
ndo e
e
.
. terpre taço- e s receb 1 das stam os scuta
era balhosam e n ce , q uanto de m e e

. q a nto c m a ver com aqu i·1 o q ue


quan to do próprio s ujeito está cm Jogo, u e
. . • de terapi-
. a opm 1ao
Padcce com o s ujeito do i n cons ciente . Esc u ca mos antes . · s e não
cana lí uca
. rsas, in cl u indo u m jargão híbr 1'd o d e o r1en
as d•ve . rações ps1
P• i can alí ticas. nte po uco
.
Es ta p acie n te se a p res e n ta com est e pa
no ra ma rea ! me
ne ur ótic o. m as a
cl , p m cla ra m e nre
• ro a receri a por o u tro la d o , aI g u é nta u m ma l - est ar q u<
ún •c. a ª"'" . é q u e e xp e r1.
me
q u e conseg u e d 11.er
.
DIANA S. RA B I N O V I C H

n ã o p o d e definir. Algo q u e Lacan, no quadro que vocês quiçá recor­


dem do Seminário "A a ngústia" , situa ao nlvel do embaraço como pathos.
Tampouco é angústia franca. Então surge a pergunta e é a pergunta
com a qual a analista tratou este caso. Alicia Hartmann , refletiu comi­
go: 0 que fazer com esta pessoa que consulta e não se sabe bem o por­
quê nem para quê? Não pedia nada, a não ser livrar-se dessa sensação
de estar mal si tuada.
Obviamente, creio que descreve algo que vemos com freqüência; esta
forma de se apresentar não é original e acredito que interessa porque pode­
se dizer que esta mulher consul rnva por sua obesidade, por seu excesso de
peso, mas não mencionava isso. Que não mencione isso não é necessari­
amente da ordem de1 negação, pois, quiç:I nesse momento não lhe seja pro­
blema. O que chama a a1enção, sim , é algo que Lacan caracterizou como
fundamental no que di, respei 10 à posiçáo do analisando, é que, aparente­
mente, nâo há pergu nta, é ctn l<'S o analisia que começa a perguntar-se para
que essa pessoa se consulta' O que quer? Justifica-se uma análise? Justifica­
se a entrevista ou não se justifica' O que se passa? Este q uestionamento do
analista muitas vezes leva alguém à supervisão, outras vezes a discuti-lo com
oucros colegas ou a perguntar a si mesmo, não importa; o importante é que
a pergunta se sirua, de salda, do lado da função analltica. Com a qual
muito grosseiramente podemos dizer que o efeito de divisão subjetiva está
do lado do analista, do pergun tar-se acerca desse tipo de s ujeito que não se
faz perguncas. Precisamente, pode-se observar na apresentação desse paci­
ente o que designaria como um ponto de partida caracteropácico. Por que
caracteropático?
Na realidade é dar um sentido novo a algo que, escritamente, a parti r
dos trabalhos freudianos sobre formação reativa e sobre neurose obsessiva
especialmente, dará origem ao que, depois, os pós-freudianos ou os con·
cemporâneos de Freud se questionaram sobre as neuroses de caráter. Nas
neuroses de caráter o sintoma é assimilado ao eu, quer dizer que o sinto ma
não é cgodistônico , para usar a terminologia clássica, mas é egossi n tônico.
Não obstante, o que aqui chamo ponto de partida caraccerop:ltico não fuz
a dessintonia ou a sintonia de um sintoma com o cu. Dado que o ca r:ltrr e
o caractcrop:ltico são coisas que se prestam à confusão, prefiro primei ro
tomar c,,ces temas por um lngulo terminológ ico.
U M A C L I N I CA
D A r u tsA o

O ter mo inglês é cha ra cter' que em ing · lês,


- alé m de ser caráter,
. Os eharacters sao os perso nag é per-
sona m
g e ens de u ma obra
· 0s perso nagens
co m o personag em se a prox i ma
e 0 cad. rer m ma.is . .
de ce rta ins ta1 ação
ção egó ica que parece ser pró pri a desse npo . na
Posi . . de co ns u ltas · A pos1ç · -
ao
mo caracrerop ánca é, portamº• 1
que aq u i cha ª
go qu e corresp onde · a
ma15
ma ce rr a fo r m a d e a s s u m i r o eu (no grafo .
se sit u a no nível do
I·r,a,.
. 1 ai'1
u

mes mo se s itua a ca ractero paria) . Se nos sir u amos no grafo , é


a part i r de
ma re po s ta o n d e s e apresen ta esta pacie - _
. nte ' nao o bsran re nao
há que
u s

esquecer, q u e o sm mma ta m bém é u ma resp os ta, port anto nao _


s e pode
. _
defi nir es ta a p rese m a çao co �:o . própria de um s i t uar-se no grafo do lado
das resp osta s . Há u ma especil 1c1dade que me parece importa nte s u bl i nhar·
Pareceria que há u m a disju nção part i c u lar q u e faz, com q ue al gu ns S UJ· eltOS ·
.
chegue m a uma consu lta a pan i r de uma po s ição, qu e não é a do sintoma
que faz pergu nta. mas .1 de um ch11rt1Cft'1-. a de "uma forma de ser", que não
f.u pergunta . Q u i 1·cí pt>JcrL1 1nos dizer que, n esta pacie nte , este mal -estar
difu so t' algo Jss i m c,J m o um i n comodo cm su a própria pele, ainda não
muito defi nido. Lsa pdc q u i 1-á possa ser o eu, podem ser m u itas co i sas,
mas creio q u e J frase porre n h a "estar in comodado na própri a pele" é bas­
tan te clara para d escreYer esse vago mal-estar, que não faz pergun ta porque
é muito diflcil de p re cis a r, para o suje i to, o q u e é essa pele.
Há dois momen ms onde La ca n faz uma al us ão a i sso: no comentár io
sobre Lagache e também em "Subve rsão do s uje i to . . . " . Nos se minári os
posteri ores, La can ass i nala que é co m u m q u e o s uje i to translade o efe i to de
ci a ao s uj eito do i n co ns­
fading, para O eu , para O moi, e s u ponh a pe rmanên
digres­
ciente. Quan do La ca n faz aqui es te es cl a rec imento, faz uma breve
r o carát r p ls átil do s uj e i to
são acer ca dos p roble mas que i mpl i ca a tr i b u i e u

scient e 0
do i nconsciente ao eu • e • por sua vez, a tribu i r a o sujeito do incon .
u e não é o ca o des s p ai
caráter está vel do e u . Di ríam o s q
se acien tes CUJ O ":
e feito s
s

_ d l m t r os
estar se prod u z na medida e m qu e nao con s egue m e i i a

. _ do
açoes
.
e , e,ee1tos.
q u e se cha mam form .
P. ulsá te 15
. do sujeito do i n co n s c 1cnt
. o de Lagac h e (q ue é, nesse se nr1-
inco nsci en ce. Sobretudo a partir do a mg
. que d e I gum mo d o
do , um artigo chave para o q u e est amos d ,s ' c utl ndo) · o
a

'
tta . , na_ o po d e, apesa r de
n-> - rero pa
r,uc-.., pensa r é que o que aqui. e 1iamo cara c . , mee nor · do gra fo .
•u d o, ser to f ve I do pi s o ,
. tal m e n t e e x p l i ca d o n o n . al O rha mrtrr.
erop a u a n a qu
1,e om esta caracr
l·.nam r ra mo- nos, m u i tas ve s , c
54 D I AN A S. RA B I N O V I C H

0 personagem, está incomodado consigo mesmo. Este é o ponto e m que


alguém pode vir a pedir algo como sujeito. Quando está ptesente esse
incomodo, esse mal-estar, é quiçá o único ponto em que percebemos,
para além do eu, um efeito subjetivo. Isto permite aceitar a consulta e
abrir, digamos assim, um princípio de escuta, uma série de entrevistas
preliminares.
Porém, esses "personagens" que criam incomodo para o sujeito, para
o analista criam uma cerca sensação de que não podem ser comovidos , de
que 1êm al go da solidez de um rochedo, e não o da castração precisamen­
te . . . Não é isso o que está em jogo; em todo caso o analista é o que se sente
cas1rado, começa a sen 1i r-se " i m potente", e começa a assumir realmente
cerra hisierificação . esclareço: o analista e não o paciente. Por isso lhes
es1abdeço que não é algo que nós possamos resolver pelo ângulo das estru­
mras clinicas e do desejo, j,I que isso pode aparecer em estruturas clinicas
mui10 diversas. Ponamo. não nos serve a definição de egossintonia ou
egodistonia: obviamente, nesse "personagem" podem incluir-se alguns sin-
1omas. Parte do processo de análise consisie, às vezes, incl usive em que
esses sintomas apareçam como sintomas, mas o problema não se esgota no
simoma. Isso remeie à homologia entre o eu e o fantasma na qual Lacan
sempre insistiu, na medida em que ambos são resposias ao desejo do Ou­
tto . Observem vocês que o eu e o fantasma como respostas ao desejo do
Oucro se diferenciam, em relação a essa homologia, do sintoma como
resposta ao Outro da demanda, quer dizer ao Outro do piso inferior.
Aqui, em vez disso, nos deparamos com alguém que faz consistir o Ou­
uo, arravés de seu "personagem" . Seu "personagem" , seu characttr, esd.
destinado a 1ransformar o Ouiro em consistente e, por causa disso, a
ocultar sua inconsistência .
Lacan nos disse algo parecido da perversão: mas isto, mesm o que
tenha algumas similiiudes, não é o mesmo que a posição do pe rverso. O
incomodo, o embaraço, o mal-estar, são os pequenos sinais subjetivos que
nos dão a pisca de que podemos continuar escutando. Escla reço isso por­
que o imporcantc dessa presença, que não logra estabilizar-se cm um ponto
dr acolchoamento sintom:itico, me parece algo ao qual se hal de prestar
muita atençio, por isso a indeterminação da queixa, por isso inclusive SC'U
dr1locamcnto falcil, pode ser um dia porque a sogra lhe respon deu mal,
U MA CL(
N I CA DA P U LS
Ao
15
CIO dia porque um dos men i nos teve um
ou . . p ro b iema no ·
al er coisa, e ass im se p ro d uzem suces . co lég10 , outro dia
par qu qu . s1vamente u m
. .
d e1Xam o an alista des arm ado a sén. e de quei-
,cas criviais que · AIguém diz·
as coa" d 1ana
" e se p erg unta : não es ta bom, são as
cois da vida e.._ _ . re mos frente i
a a guém que
· mplesmen ce so uc , nao d a miséria ne urótica ' m . .
si as da m1s én a d .
e viver e
frente à qual n ós n ão temos n ada pa ra o fe recer ·i É um a p erg
unta que va1e
se fazer. Porque' nesses p acientes .
a pe na .
' e ness a paci e nte era
especi al-
mente ev iden. te, as queixas eram real mente triv iais
' quas e da orde m do
. a descrever co mo ce xrura b ásica de um a co
que se poden .
nve rsa con. diana
. , .
n o café . Ape nas isso , e, alem disso, náo das mais intere ssa n tes , mas anrcs
�[ O � � -

Não obsran r e , ne io que •qui esd o incenrivo para n ós: 0 que se passa
com alguém q ue, além d is,u, paga p;i ra isso? Porque afinal, pode pagar um
cafr, não é o mes mo Lj lle p.1�.l í unu sessão. Então al guém se pergu nta 0
que é que esta paócn1c cs1 .1 hu,,;i ndo , porqu e de algum m odo nos vem
buscar: portanto, dc,·e mns cs,u t J r o que é que há nesse pedido ou nessa
buso., o que se pass.1 com es t e sujeito e, ponto essencial, como p odemos
f.u.é-lo surgir.
Primeiro ponto: temos um paciente que não é paciente e que nos
aige paciência; segundo ponto: tampouco se trata de q ue re r comovê-lo
muico rápi do, cem que nos dar al u ma permissã o para comovê-lo, porque
g
podt ser que não queira que o comovam .
pergun ta,
Então esca pessoa a q ual me refiro é alguém que não ce m
que é sua g ordura, mas à
bastante tediosa, e cem algo que salta aos olhos
ade
··-' o rd ura a o besi d
q ""' não faz referência . Além disso, tenha mos cl aro , a g
Fals caff. p ara to mar
é um si nto ma médi co ' n ã o é um sintom a psica n alític o .
. nto ma ; po rq ue
um perso na gem de cearro, não senua sua gord ura co m o si
. difi ni- l a pamr . de um
def, · '- , a priori, para um sujei o com o sm · com a ' é
. n1-..,
a
_ 'd do co m os
ideal , da cávcl , a, e n ca o. cu1
, um I'd ea 1 d e m ag re z
a
.
hmoncamente
assi m co mo pacien-
;,1-_ . _ uir alg
-=au , nao somos dietistas que deve mos con seg s
o
q ue é um a dessa
tQ �lo s e sao _ fi ca cla ro , é
s, de corpo e men te. O . q ue na is o u de ou tro
s co rn os h or mo ª
OOQidadcs que não se acom pan h a d e 1Can eata d e u m su jeito ao quai
tur•,
,.. que c . d uzi-· 1 ª·
pos sam j u1cificl- l a. Ta m pou co se d emos Ili
, ó s n ã o Po . d< a l•u-
IDrdu lLno:_ provo e mromo
ra qu . do e, s e é ass i m n f ro rrda u vo
"
P,..,bn m po uc o
• f,IU claro que eu.e 1inw m a m t. d'ico ra
D I A N A S . RA B I N O V I C H

ma estrutura psicoparológica, quer dizer, há obesidade na neurose , na pe r­


versão e na psicose, e cm todas as variantes de cada uma delas que vo �s
queiram encontrar. Porranto não podemos dizer que seja, no sen tido ps i­
canaHtico da palavra, uma estrutura clinica . Como situá - la? Vamos dcix;l­
la com um sinal de interrogação, provisoriamente.
Esra paciente se caracteriza em sua descrição - ai sim devemos escutá­
la -, fala, em meio a esse tom um pouco reivindicativo e q ueixoso , de que
é alguém que sempre está muiw ocupada, fazendo muitas coisas , sempre
respondendo de um modo ou de outro a demandas diversas , familiares ou
de outro tipo. É, sem dúvida, o que iodo m u ndo pode quali ficar como
uma boa pessoa. Ao seu redor há aqueles que fazem sintoma, especialmen­
te seus filhos. tem i res filhos dos quais dois estiio em anál ise . Entretanto,
tampouco com sintoma> de 11 111;1 exc·essiva gravidade, mas s intomas relati­
vamente freqüentes IIJ i n tl n .: i.1 . l'or< 'n1 , • pa rc�ia como instalada nessa po­
sição, n� qu.tl desde o 1 r.1 b.1lh o rn 1 1 j u 1 1 1 0 com marido em um comércio, até
responder aos seus deveres como mãe e dona de casa, tudo, tudo , estava
cumprido, indus i,·e , respondia às exigências de seus pais e também às de
seus so g ros, quer dizer, também cumpria os deveres com a geração mais
velha. Obviamente, esrava sempre ali onde a chamavam. Então, começará
a pedir rambém? É obediente; se alguém começa a pedir, aventura-se sim­
plesmen te a reproduzir o circuito fatigante que começa a esboçar com o
tédio, o mal-estar ou o cansaço q ue tem com seu "person agem" . Inclusive
uma pcrgunra é pedi r . Em francês a palavra demande, dizia-lhes, mostra a
coincidência dos dois sen tidos, pedir e perguntar. Mas , pergunrar é ram­
bém pedir e especial mente em anál ise .
O q ue fazer? Diria que, em primeiro lugar, escu tar, si mplesme nte.
Escutar as queixas, dizer-lhe que cem razão, por exemplo, e nada mais,
durante um ccm po, até que comece a se mostrar algo mais. Por quê? Em ''A
direção da cura . . . " , Lacan diz que o analista se caracteri za por criar dem an­
da a parrir da oferta. Qual � a aferra analltica aqui? .É basi ca mente uma
oferta de escuta. Eara oferta de cscuta, ncsse caso cm parricular, deve evita r
repetir o cirCIIÍco cm .!pm q u.c H 1itua em uma o1içio de objeto oral,

4,........ ..
p
qu.cr dizer, de MIIIMda lO Oum,; OI ouao, demandam a ela e 1ua posi�
'a f ...... Nlo ' Ullla poliçlo cfo tipo ...._ do
Ourro. - anrn oot1•i1tr rm cl.r "'" nio t • 1 1Ma1 ivi.ladr ohac,t1iva. mas o
Ü t.t A C LI
N I CA D A P U L S Ao
,1
que pa derlamos cham ar. a gencrosi dade oral,
traço que b
descoberto como pró p n o do caráter o ral · e, ,. . _ A rah a n já havia
a e . m clu s1ve • aigué
adianta à d eman d es tá ai 1 an tes que m que até se
o ou tro ch egue
Esse personagem, perso nagem de b ª de man dar.
oa m ae _ ' b oa esposa, b
dora , oc--- bviamente, a torna i m une à cr1nc · ae . oa trabalha-
consis ten te ' e
ela com o a es se Outro . Portamo ' se record � _
!_11 � 11 t�m tanco a
_--:- am os a form u1açao - - -
nas duas reuniões ante ri ore - a que me
re feri s ' que a de man da . .
. . • . . -. - a-�n-ív
a- � a _m consmenc 1a da O u tro ' aq ui ª mco
-el -m-��c1en c1:_I� m
ns,stê ncia do o u tro nao -
ap a re ce, o que aparece em seu l ugar são queixas so b
, . re o O u cro, q ue não é o
mesmo que d 1zer . que o Oucro e m consisc e nce Q
· ue1xas que às vezes faze m
. .
idade para dar um ie1co . .
a sua incapac nessas quei xas q u e tem so b re os
. . . ou-
cros. D1na que ess.1s queixa s sobre o uu cro ab rem o can11n · h_o para um
.
q uesno na menco do O u 1 ru , mesm o que ainda na-0 sei· a m a is· q ue um- es bo-
.
ço Escuca r e, em
.
'ª'.º s enud o , l he da r razão é come�r a_9_uescionar esse
_ - - --
O u cro em sua cons1>1cnc i a .
Ob,·i.lfficncc, e' d i fk i l pcns.t r nessa p o sição da p aci ente e nesse "per­
sonagem" como scp.1 r-.1do do fa masma, mas Lampouco sab emos qual é se u
fantasma. Pode r ia suceder que o fantasma a nível inconscien te não fosse
oral, poderia se r q u e s i m . N ão podemos ass egura r, a pa nir dessa apresenta­
ção, que o seja. E, ponto i mportante, é evide nte q ue pessa posição há, para
este sujeito em particular, um ganh�. Não podemos fazer um
diagnóstico de estrutura clínica p�rqu e tampouco s e manifes ta com o um
desej o insatisfe i to, precavi do ou imposs íve l. Na medida em q ue não é ne­
nhum dos crês, mais nos inclina mos a p e ns a r q ue nos defronramos com
3is-de-gozar
alguém q ue , d e:s se lugar egóico, .obtém cerw�.!:erilllil
q_�f� ao O.urro consiscen ce .
. faze r aqu i. um apon ca menro p ara dife re nciá-lo da p e rversao .
Quena . . O u tro do
. do x1sn ro
N-ao se tra ta do gow ou do ma,s-de -gozo com o fazen e
,
.
s,cua p rv e rso Nesse caso
gozo e o gozo do Out ro, pon to cm q ue se 0 e ·
é a v d ade q ue faz
trata -se de uma neu r ose e , co mo ca l • 0 goz, o na .n eu ros e e r

· r q ue 0 q ue
esta paciente
Ct> nsts ten ce o O u t ro e o seu d eseJO · , 1 sso q u e r d1�e d gozo . Pa re-
tro I ug r
suste nta é ao Outro garan te da verd ade , n ão ao O u
a o

a se m1s c ur
· ar O u tro do .
U,-mc i mportan te csra d .i fere nça porq ue co st u m
O

a •
u scn c i ' diz Laca n, fan a
zo c .
ja
u t ro , go
a
,
� n,i com o p o n to de g oro no O rn cntc
nta do cspcci fica
u

v·a,, "'' univc q ue esi á represe


r,o. bcc po n c o de gozn
DIANA S. RABINOVICH

função d e mais-d e-gozar, pode


pelo mais-d e-gozar e pelo objeto a , cm s u a
garante da verdade, q ue não
sustentar ao Outro cm sua consis tência, como
é O mesmo que a consis tência como garant ia da existên cia do gozo todo. O
é a verdad e toda, não o goro todo e por isso estamos
que susten ta aqui
são.
falando de uma neurose e não de uma perver
m estas entrevis tas
Precisamente nessa paciente à medida que avança
que têm quase um ano, começa m a aparece r alguns temas,
cara a cara,
ar a inconsi stên cia do
pouco a pouco , simples mente ao escutar e ao reafirm
não é a posição que
Outro, quer dizer, a queixa. Observem vocês que esta
se assume com uma Dora , Dora não era uma caractero pática, Dora tem
"
sintomas . Então Freud pode fazer sua fa mosa pergunta: O que você tem
haver com iudo isso?" Aqui não sabemos o que é tudo isso, porque a única
coisa que há são quc:ixJs banais e I riviais, sobre: os obstáculos da vida cotidi­
ana. Isso escabdc:ce que: cam pou(o podemos fazer o questionamen to dire­
ro, "o que voce ced haver?" Po rqu<· p r i m c i ro o Outro tem que bal a.��m
P9W:O, q u er d izer, 1em que: se: proJu,. i r cena deslizamento pelo qual.a.gan­
ho de gozo dessa p�sição de objeto oral que se oferece como diz. Llcan,
c?1110 "pas_co_ ao Outro" , e que assegura assim sua consistência, se vej.a co­
movido. Mas isco implica, em primeiro l ugar, comover ao Outro. Como
se dá nessa análise? Digo análise porque hoje podemos dizer que foi uma
análise, e q u e o é, ainda.
Temos um con traponto que vai aparecendo pouco a pouco e que
não é exacamence u m sintoma, mas que corresponde aos ataques de bulim ia
que vão po u co a po u co sendo relatados . O ponto importan te da bulimi a,
cal como aparece nesse caso , e nem sempre é ass i m , é que apa rece como
u_n:i� �ão, uma i mpulsão para diferenciá-la de uma compu lsão.�
é,..que esta _pessoa s u stenta-se nesse lugar no qual é "pasto d g_evo ração"
a_
dos - · ê no· a
. ourros
_ -- • cada u m tem u ma v 1v · ê nc1a
· d e que nao po d e mais, · uma v1v
de- mal-esr
- - , ·
ar q u e às vezes eh ega à angusua. - _,!__ _ sc
Estes momentos pro mcm-
quando as deman das que lhe fazem os outro, chegam a ccRs -.agn c o u
quando ela não pode responder ao enorme nível de demanda que lhe
,., ch.ct!a- Aí q u n do
é a do cai da cena co mQ objcto. �ç· asse ----- _&!!�d e ,
Outro, através d es se po n to d e gozo , e se produ w�a .. m_ao a ro que <
_- . . z a p· ...,... -
a b u I imia, °
q u an d Já· não po de se sus tentar nessa cona' - '!= esú--po r 1nl5
® "per1<>n agem" e&ó'ico . ponanto, te .
mos o que Lacan caracte ri za cm
UMA C l f N
1c A D A P U ts
Ao

· es crito co mo uma p ass age m ao ato p


seno do . - o teónca. . . ermi ti tc1. -rn
e fazer aqu·1
eq ue n a di gressa uma
P m "A ló gica do fantas ma", q uan do L
E - a can Propõe a o pça- ·
e a ne gaçao se ap t·i ca à int · o a1
form ula qu " ,, u ,,
erse ção dos dois . . ienantc,
círculos' ist
. não ao pens n o em ao so u . Na reali da " o é' ao cu
de, eu n a- o pe
(jt) , m o o
..
eu nao
_
sou
,,
afet n�o" af,era ao eu
(jt), assi com ,,
a ao eu, isto é ' há "
u m nao ser do e
.. u m não pens ar do eu _. Por o utro lado, Laca n no Se rn1ná . . u" e
. n o XI p rop unha
naçã o c om o a opçao entre ser e sen ti do · q u1 .
a alie . A isso se m odifi ca e é
n _ ser do ;e
nao (do eu) , que cara cte ri za O p . uma
opção e tre o " . · - . ens ar tnco .
nscle nte, e
pe nso que 1 m p 1 ica que existe u m ser q ue é pen sar
0 "eu não sem eu (/e).
Lacan di. z em ..A log1c , . a. do n asm ..
fa r a - leva tem po dar-se conta
. de quão
ª
sábio é o que � os d1� - q u e . escolha obrigat ória no sentido da alienação é
a que leva ao e u n ao penso , e q u e, p or outro lado, a opção da anál ise é a
que ba ao "eu não so u " . lsw é de s u ma impor tância, porque qtg_p_acien­
r_es são sujei tos que êheg;i m rnlocadns na posição do "eu não penso" . Por
�to não há pergun r a . LIG1 n d i1 ( n a aula de 1 1 de janeirÓ d� ·1 967 de "A
lógica do fanrasma") q u e .1 escolha do "eu não pens o" permite que surja
algo cuja essência é ser ,i,io-m, em francês é pas-je, enq uanto q ue colocado
na inre"eção de u m eu Ve) penso e um eu (je) sou, quer dizer, algo que se
rusreno. por não ser je. Acrescenta que esse "não je" se positivisa de urna
forma particular que é o Es ou o Isso freudiano. Quer dizer, q ue quando o
"não peoso" se posi rivisa dá um ser que se afirma n o Es, [Isso] ou Isso
freudiano'. La can diz: não é a prime ira, nem a segunda, nem seq uer
ª

tetccira pessoa, é algo de o rdem gram atical. é algo que se mostra na pulsá�
a "uma cri· an ça é ban-
e que ie ex pressa, por exemplo, na frase do fantasm
d.a" · 'M
are.a assi m a articu lação parncu · 1 ar entre o fa nt asm a e a p ulsao pelo
"
lado da escolha do " eu não pen so .

::-----_
• AU · d ,ca uma de-
(Isso), qu e '"
ngua espanhol a compona o prono me dc mon s uat ivo &o . ºnhec ida ou nomeada
u a co isa : cc: rccira pessoa em
tcrrn,nac1.a coisa , capccialmcntc pa ra idcntifid� l a , ou domp ro nom de
:,U e o pro nome pc:uo al E/lo (I sso ), que é. a. fo r ma ra o com p lcm e n t'o a. co.mpan ha��
.....,o u p a
dr n�r ro e número sin g u lar, para o suJc:U o O t radu ç§o se ran a 1m.rvo--sob a
N,..,,..,,

rrngucs a esc a nsr rau


Pf'Pot1çio . A.Mim ' co mo cm lín gua po o &o pd o p ro n o mC' de m b
.,,...,,,,, por trad u1.ir o pronom e dc mo nst rauv ·
1.rw,"'ª ll11
0J (N .T. )
ÜIANA S. RABINOVICH

O eu, o i(a), é solidário desse movimento de modo cal que encontra­


mos algo que é impossível de expressar no grafo. Por quê? Porque resulta
que, aqui, as respostas estão encarnando a resposta fantasmática cuja estr u­
tura definitiva não se conhece, e cujo primeiro esboço aparece nesse luga r
homólogo ao fantasma que é o eu encarnando a satisfação pulsional. Por
isso se produz a bulimia como passag�_ª2 ato, como impulsão, para dar­
lhe seu nome tradicional. É algo associado, não ao sintoma, não �ejo ,
Illas à pulsão, e o mesmo termo de passagem ao ato no-lo diz. Quer dizer,
h� _a,lgo da ordem da satisfação que, ao satisfazer-se nesse "personagçn{ de
formadireta, deixa o sujeito sem lugar, enquanto que, por sua vez , o_�ujeico
di;ejante está como esse sujeito mudo da pulsão. Efetivamente, é um su­
jeito que não pode nos. dizer quase nada, salvo nos mostrar, em ato, essa
curiosa�sfação:.muda)que lhe dá este "personagem" particular que de­
sempenha.
Aqui é onde é maior o risco de errar. Isto é apresentado sob as espé­
cies do i(a) e há q u e esquecer-se do i minúsc u lo, porque se nos ocupamos
dos ideais, do narcisism o em seu sentid o habitual, da beleza, do emagreci­
ment o, da saúde, de qualquer ideal, aí necessariamente vamos para aquilo
que s o lidifica esta p o sição. Há que se levar em conta que o importante
aqui é a falca: o a que está entre parênteses, nã o o i, o a que é vestido por
esse hábico q u e é o i.
Estas são, p ois, apresentações do sujeito do lado da pulsão, não do
lado do desej o , e o s uj eito da pulsã o é um suj eito mudo, cuja dema,,da..é
f!!Yda. P o rém, nós só p odem os analisar as demandas parolantes, as tagare­
las. Já disse ames que Lacan, nesse mesmo seminário afirma que a análise
faz mudar o paciente do "eu não penso" ao "eu não sou", a essa inexistênci a
do eu que é o pensar inco nsciente que gera perguntas. Este passo não pode
ser dado sem as formações do inco nsciente que são as que se situam do lado
direito e o que se pode s eguir nesse caso com cerca clareza, é como com eça
a se esboçar esta passagem pela qual alguém começa a pôr em questão esta
.
posição, e pô-la em questão implica, inexoravelmente, uma perda. Reco r­
dem q u e em "D e um Outro ao outro" Lacan redefine a ferida narcísica
como p erda de gozo, não como perda de auto-escima, distancia ndo -se as­
sim de Fre ud. Po r q u ê? Po rq u e justamente a perda de g o zo comove o i(a),
o a e não o i.
U MA CLI
N t CA DA P U L S Ã
O
61
Como se dá, nessa pessoa , esta comoçao p ela
q uai O sujeito co
d ob rar? Este é o ponto. central. Obse rvem meça a
se des que se que
vo cês que osc,·
1amos en tre
n ag em 1X a des se m '
este Pers al-estar d, fuso e
vár'tas passa s
o
ue se ter p resente que a b ulim ' ª 0de .
aco. !-lá q
· de assu m
.
t r, por exem plo '
' P , tnclusive, assumir· gen ao
outras
(ormas• p . a fo rm a do com prar obJet
o
cessanamente , algo an al.• assim co mo ai ' os, o que não
é sem pre • ne guém se empancurra
ode empanturrar-se ' . de
al1· mencos, p de obi etos de outro t1po
O im portante é
es sa pe ssoa, não é desse lado que comeco · .
que' n . ,-m a se dar as coisas,
mas que
quesnonamenco pelo qual a rec 1
começa um. cerco amaçao começa a ter
conseqü ên cias. Por exemplo : começam queixas po r seu tra balho, d'tz q
. ue é
.
mu ito para ela, rema-se um pouco do trabalho, só estabel ece a decisão de
um cegi m e , de reco rrer a alg � ém que se enca rregue desse regime. Ü-<jwe
me parece mais 1 m � ortan c e e que frente a esta necessidade. de, de v.ez em ,,,
quando, recupe rar !o rças com a i m pulsão, come ça a produzir,se uma vira- '
da da p..ssagem ao ato (que Lacan sirua precisamente do lado..do "eu não , , l-·,
pensil ao accing-out (que esd do lado do "eu não sou") . Recocdem que �
noKti-;;g-ouc o objero esd ind icado , dirige-se a um Otmo, da ordem de ,, ;J,
uma transferência selvagem . plenamente estabelecid�_e _este_ s�_ _a,sgoielha, G 't­
•E:�.com--0 sincoma . Esta paciente começa a produzir cercos acting-out.
Aqui tem-se o direito de fazer uma pergunta , à qual tampouco vou respon-
der boje. Pode-se iniciar, nesses casos, um a análise sem essa passagem por
um acting-out' Pode-se pass ar ao sintoma sob tra nsferência de fo rma dire-
ta, sim ou não' Não sei se há uma resposta geral. Di ria que nos casos q ue
vi, parecia ser necessário um a cting-out, que por sua vez tem algo de a�tin_g-
rencta.
in , po rque em geral vincula-s · e com o d esencad carne nco da transfe .
an lisa n caso de Kns ,0
Mas, à diferença do famoso exemplo que Lacan a o

fu.lha do anal 1Sca, mas


home m dos miolos · frescos, nao esta mos frente a um a ,.
este acttng · lhe dá o sinal de que - j á está co1ocado em Posiça·o anal mca.
. ento e um esq uec1men ro
Nesse caso ' esta pesso a cem um esquecim
que n -ao é qual quer, esquece-se do dtn . para ªgar· C reio q ue é 1mpor-
. h etro P p roduzia
tanr,, porq ue dissemos que h avia algo d a ord em da pe rda que se
pr d uz. Mas
aq ui a
q uando se
posição, na qual h á gan ho d e gozo ,
o
esca an alíti co e não
P.rda est . está d en t ro do m ar co
á desl ocada para o dinhe iro, a que
e, exe m plo • coisa
,,. q ut se apressar em falar de qual quer tra ço an a i por a ato e co mer,
q ual ar de pa ssa r
'l utr u m poderia se sentir ten tad o. E, m Iug
o
D I A N A S. R A B I N O V I C H

se esquece de dar de comer a alguém. Isto é, de dar-lhe o dinheiro . Po r cs cc


ponro de vista é um acting, mas remete a um ponto que, como tal, alude a
sua posição de objeto oral, sem atu:1-lo, coisa que se produzia quando paga­
va regularmente. Como todo acting, nesse caso, este é corretamente sanc i­
onado e não interpretado e se diz a esca paciente que pague sessão por
sessão. o que provoca uma primeira virada na análise. A sessão por sessão
implica, nesse caso panicular, creio, um ponto central que �. se quiserem,
pôr em cena a perda, mas sucessivamente por cm cena o "personagem" com
que ela vem. Lacan quando fula de acting-out remete-o a to act out e diz
que, por alguma rJzão, manteve-se o rrrmo em inglês que significa rep re­
sentar lendo um personagem . ' làmbém podemos ler este acting como um
lapso. Por <ste ângulo ,! um acu logrado, recuperado como fo rmação do
i nconsci(m(' pela imt'rvt"n1,·ãu, J san\·:ío do ;rnal ista . A partir daqui co me­
çam, não vou Jt"1alhá�lu porque nC'io que não é o mais importante, uma
séri( J(' opcr-J1r;ôi:s a1ulíl il'.lS ":c n t r-.1J.1� no <linheiro, referidas ao número de
SC'S.SÔCS, aos n:-.1jus1c-s , ctr. rujo sc n 1 iJo t c.:omover, nessa pessoa, este l ugar, e
que • p,,rJa do d i nheiro soja rn·1J.1 . l) ent regar o di nheiro j:i não é algo que
a coisifica, que a imobiliza no lugar desse personagem, i(a). Aqui enfrenta­
mos rodos os riscos de entrar no imagi nário, de responder às reclamações
imaginárias que isro provoca. Simplesmen te há que fazer operar uma per­
da. uma pe rda de gozo; dar o dinheiro não é, como no primeiro momento,
signo de sua generosidade, mas algo já diferente. Trata-se de inuoduzir
uma dimensão nova para esta pessoa: pedir-lhe dinhei ro não é ser o analista
d.csinrcrc:ss.ado, implica comover a consistência do Outro, porque um ana­
lista desinteressado não pediria dinheiro. A própria paciente d:i um indica­
dor através dos esquecimentos, indica que algo se passa com o dinheiro,
que este não enrra dentro da série de objetos o rais de um modo au tomáti­
co, mas que há alguma diferença .
Imediatament e produz-se um duplo efeito. Por um lado a pacien te
começa um regime com alguém que se encarrega de "adubar" seu narcisismo
o quanto for ncccss�río com grupos e outras coisas, com o que o analis ta
pode se sentir tranqüilo deixando que certas transferênci as laterais ope rem
onde devem operar, enquanto não interfiram na an:ilise. Começa a ema­
grecer e, simulcancamc ntc, um primeiro Outro começa a torn ar-se in con�
1iatcnce sob a figura de seu marido . Este bom senhor niio rinha mudado
Ü M A C LI N
I CA DA P U
L S Ao

nuava sendo exatamente o


da ' con ti rnes mo ' e .
ern "ª nin guém de
d
, co meçando pelo . p róp. rio mar id o ' p orqu fo ra cn -
ren . e um dia es
a s a · . sa senho ra se
e

1a oc mo u ma d am m n s fe1ta. Pri meiro in d tca " do


rev " . .
r de que J á est
su bJet1vo . A p acie
o mom.ento amos
e
n te se revela . . .
em o utr 1 . ms at1s f.cit a, dcs1. ludida
d e mari do, me us1ve tem algo q ue po de ser car
ess acterizado co mo
"d ressão", que deve ser relacio nada com a erd u ma
ep P a de gan ho de go
. a ' o an terio r. Passa um lon go período no qua zo da
,,r u ça . . . l tam pouco fala
de si.
· qual basicamente c r mca os ou tros e ' esp ec,· a1
me.s ma ' no mente , o mar"1 d0·
alhar e, portan t o , tem que pe dir din heiro
Deixa de trab ao man" do . Então
mudam de l ugar; da s e tran sforma e m alg uém que
as coisas . . dem an da. Pode-
d s e n h o r a V 1 S 1 v e l m e n t e i r ri tável po r seu
se izer q u e da m a 1 -esta r
carac terop á tico e seu p eso , s e tra n s fo rma em uma "enchedo ra
de saco" de-
d
ci ida, com o que se pode d i ,.er que, pelo ângulo da adaptação, a análise é
um fracasso. Po r que d i ze mos q u e esd melhor?
Obvia men r e esd n1t· l h o r . c o m eça a ter mudanças físicas m u ito
chamativas e come\-:.l a pergu n 1 a r - sc· sobre uma dimen são que n u nca havia
a.parecido, que um pouco .1go ra a pa rece de forma direta, mas que aparece
auavés de uma série de son hos . aparece em um semi-dizer, em que se p er­
gunta se da pode c1usar o desejo de alguém. Ela s ati s fazia antes , em s ua
cabeça. as demandas ao O u tro, em u m a po s ição que sus tentava o O u cro ,
um Oucro cuj a verdade era o gozo , m as que n ão era o O u tro do gozo como
gozo sexu al . Enco n tramo-nos agora com uma mulhe r ins atis fe ita, insatis­
feica sexualmente, insatisfeita com s eu s filho s , farca de s eus filh os , que des­
cobre que tinha u ma q uan tidade n o tável de filh os , incluin d o sogros , seu
s

gent de cima, digam


pais, em fim . . . , u ma longa li s ta . S acode coda es ca
os
e

. den do quilos o
que as sacod e J. u n to com os q u ilo s e a med I"d a qu e vai pe r
protes to a umen ta velozme nte.
el a
. _ ma s d e pergu ntar-lhe o . que
Agora J á n ão se trata de lhe dar razao, . _ . "ai É
teve q ue ve . da p os 1 ça o mio .
r co m es ta posi ção . Algo m uito d" f.
1 erent
e é da or
-
e

nesse m s an. s faça- o , qu


omen co o nde começa algo, J· u nco com a in . d"'ve rsas . Por
dem da a m i t
cn. ação do es paço da fa 1 ta, que assu me for m uaduz nas
s u o

ou tro , qu e se
CXc mp I0, ap
arece precisamente a 1" dé"i a d e fal tar ao separa-
s er qu as .
ma
_ � de separação , que por um mo men to c h ega a
u
•m.,,,,_
e
. n ro do di nhe 1-
\áti: d [aJ . do e s que c1 m
_ éa f:
a l t u ,
ra.!
e

e tar-lhc o analista, m as Já nao a ão te m fi ss


ad o, c uja ve rd de n ª
e s a desin teress
'''· nãt, � •usc n ca r u m anali t
D I AN A 5 . RABI N O V I C H

m as é perguntar-se acerca de s e u l ugar no desejo do analista. A resposta


aqu i , tampouco, é em palavras, é em atos; se lhe au mentam as sessões ou
um encontro extra. Nessa época começa a se estabelecer, são dois an os e
tanto de tratamento, algo que se assemelha realmente a u m a análise. So­
nhos, associações, trabalho anallrico, que é a etapa na qual esta pessoa cst:I
instalada agora. Quer d izer que passo11 com �i���nção do '!_�ã��_<( ao
"cu não sou", com alguma coisa que é, evidentemente, quc__ a-imp ulsão
cede, começa a se produzir mais accing-out, mais lapsos e IDCtll!!_(1llSsagcns
ao ato . Começa a aparecer algo da ordem do s i n toma, começa a aparecer
algo da ordem da virada para a insat isfação; momentos de p revenção do
desejo. q u e não marcam u m a fobia estru t u ra l, mas a virada, como diz Lacan ,
e n t re es t r u t u ras. Aparecem i n i b i ções , q u e são d e fi n idas como i n i bições, e
aparecem perg u n tas. Apan:ce m , i n cl u sive, recordações i n fantis que ainda
co n t i n u am sendo t rabal hadas. O <J Uc fica claro é q u e se produzi u algo que
af�a_a co nsistência do O u i ro , e ao n como aquilo q u e lhe oferece consis­
tência. e q ue precisamente o O u t ro começa a aparecer como d es ej an te na
medida em q ue , po u co a pouco, vai se delineando a pergunta: posso falw­
lhc? " Posso_ faiµJ-lhe?" i n d i ca um furo no Outro. O "pqs_s o . fa!J!�
transforma depo is, s u cessivamente em um "me faz falta" . Este "me fãz
fal ta não escava pn:sente antes, porq u e na posição em que estava es ta mu­
lher, nada lhe fazia falta, no sentido l i te ra l da frase em castelh an o, quer
dizer nada lhe fazia furo, q ue é o q u e cria essa sensação de i mpenetrabili dade,
q u e se descreve tão grossei ramen te na comratrans ferência.
Aq u i o risco de e rro fundamental é a queda no i m ag inário, dado que
a ari rude mais freq üente é q u e os analistas saquem a b roca e tratem de furar
a pedra ; en tenda-se: de comover a golpes e faz e r u m fu ro à força. Já não se
faz sob a forma da análise das res istências, coisa q u e apn:ndemos a não
fãzer
graças a Lacan , mas sob u ma forma mais "mode rna" , e se chega à con cl usão
de q u e essa pessoa é inanal izável , de q u e não
tem um desejo n:sol uto ou
alg u mas o u tras versões q ue tranqü i l izam, a
nós, os psicanalistas. Precisa­
mente esca é a tentação principal a q u
e se há que resistir. Não é nossa_ _
função cavar a falta. Porq u e cavar a fa l ta é
o q u e faz a própria �11111 ra . A
falta catá na estrutur a, não se h:I que cav:1-la.
pro ovcr a Pa.uascm da o pção aliena
Qual é a n<>ila �- e
::' nte do "cu não pcwo" a&- ''.e,o--11áo
,ou · E, porcanc o, prod uzir necessa riamen
te u ma perda de K!'Z.º• 'l.'!� Pºde
U M A Cl fN I CA D
A PU LSA
o

65
ndo os casos,. ser. viv i da subJ· et tv .
náo , segu . . aine n t, co
o u ' b ri ga tóno que sei a v1v 1da
N•º e o _
com o u dep ressã mo UJna �-
rna -
dep ressao. Mas o · Nesse -Pressão.
co m de O que é i. mp Qso ,�-
--iu1-.
�u ccrto . . o rtan te é q
a pa cie nte começa a se n tir como uma r:cal - ue •penas neste
,nont< nto ta nao
ec ss ár ios crês anos para que alguém chegue a se . ter sessão. For""'
.
0 e nt1r q ue nao

_ e _ ter uma

qu e
, é algo que o areta. Antes o analista pod i
e
m codo caso podia
-
pro v ocar
. .
ca -ª= � � -
cena i rri çao, im . , ..
d
agi naria ou n -ao,
nder, etc, 0
as ituaçõ es, mas nao exi ma a sens a çã o d segun ­
do s e aiarm e fren te ,
a ausê n cia do
.
an alista.
Até o m o mento em que se produ z esta virada na tran e • .
. srerenc1a, era a
ciente que estava no lugar de um obieto que devi a obcurar um
P a
. 0urro, ou
seJ· a' fazê-lo consistente. Apenas .
quando se prod uz essa vua · da, o anal ista
começa a mudar como .
analista para a posição de obi· eco Po
· demas apenas
pensar no estabelecimento de uma neurose de trans ferência que começa a
estabilizar-se, e, depois, o novo problema será " liquidá-la"; mas esse é ouuo
problema. Nesse m omento em que o analista co meça a fazer falta está
esboçado esse referente latente que, de algum mo do , tem a ver com O dese­
jo da paciente.
Aqui é o nde se abre uma interrogação, que não tem resposta até que
esta análise avance mais e que não sei se o fará al guma ve:z.. Esta posição de
objeto que garante a consistência do Outro, esre pers onagem, este "caráter"
no qual esta mulher chegou instalada, nada nos assegura que sej a seu fan­
tas ma fundamental . De modo cal que rem os que nos perguntar, nova me n­
te, que relação há entre o eu, o mais-de-goz ar e o axi o ma fancasm ácico, para
ter um pouco mais clara qual é a diferença entre essa paciente e um perve r­
so, por exe mpl o ; e n tre esta paci en te e sua pecul iar apresencaçã� , ou cam­
do
bé m, ent re esta paciente e um psicónc . o que, 1g · uai men ce • p ode vir coloca .
no 1 ugar de objeto. d e m s tirar é que. vu
A primeira conc lusão que p o
o
tura . Freud
col0 d no lugar
• c:t o de obj ero não é pam. moru • · o de ne.nh . a estru
-· um
o form u 1a, em " - . ça" ; es cá d"1 to caxa uva me nte p or Lacan
Bate - se n uma cnan
ern "A 1 g1. e n vo1vim · encos que
ó ca do fantasma" , e culmin a co m o tai nos des z C re io que
Lacan rar e á, ça de go os.
posteriormen te, em corno da d"f. I e ren se pod.e
estão e1aras . b
o se rv ou , n ão
as três etapas; a parnr do que aqui se. . m os co nd utr
co n eI UIC· ac e1to. n •0de
erca do fantasma fun dame nta1 desse su1 s s e lugar,
e que
q ue aigo • d ne
nos diz acerca dos s ujeitos que vem co loca
os
66 D I ANA s. RABJ N O V J CH

vêm muito freqüentemente como chegam à consulta as crianças, o que não


significa que sejam infantis. Vêm colocados na posição que se popularizou
como "objeto do Outro", mas cuidado, só na medida em que dão consis­
tência a este Outro, na medida em que estamos com um adulco a quem
ninguém traz, mas que simplesmente está incomodado com essa posição ,
podemos pensar isso que descrevemos hoje aqui.
IV

o · e vamos reto mar o q uad rà ngulo de " lógi


H J A ca do fa n easma..
' on de Lacan
vin c ula o cu nao p � ns � co m o I sso e o ueu não sou" com o
- "

inco nscien -
,1

c<, q uer dizer, que o p n meo ro esd a rt iculad o co m O desejo e O segun


do co m
, pu lsão. Nesse q uadro, s u rge a scgu i n , e perg u nta: Por q ue Lacan
to ma
como paradig ma o co,�irv c.m cs i a n o ? Suponho q ue recordarão que estão
presentes na obra de Laca n d i lcrc n , cs interpretações do cogito carcesiano.
A im porcinc i a q u e ce m esta versão (na q u al se aplica ao cogito a lei
de dualidade de de M o rga n ) consiste em q u e ao transformar o cogito em
um ..ou eu não penso o u eu não sou", Lacan introduz dois elemencos
diferenciais. Primeiro : s i t u a de u m modo novo a relaçã o entre o objeto
a l em s u a dimensão de gozo : como objeto p u lsion a l) e o ser; segundo:
articula esse objeto a co m O (-<p) , q u e r d izer com o falo e a castração . É
0 que no Se
m i n á r i o "A a n g ú s t i a " Lac a n s i tua como a funç ão da
derumescé ncia, aq u il o u e põe l i m ite a o gozo e que se a rtic ula si multa­
q
neam ente com o p e n s a r ·
D o lado do a Lacan situa o ser (é um ser q ue ,g · ua!mente será "falso
'
se ") , e !d do outro
t do l a do do falo ' s i t u a o pens a r. Se d e u m l adO está O ' . •
es tá o in· . cartesia no pnv•-
co ns cie nte. M as , q u a l é a amc ulaçao - q ue O c ,uito
o,,.
lcgia para
pe rm itir esta di feren ça?
. havi· a crabalhado
Aq u ,· é onde e n t ra o u tro ele m ento, q u e Laca n Já da
Vúia.s . nasci mcn ro
ca rtes ia no e o
. vezes , q ue é a correlação e n tre o cogi to da fu n dação da
c1cncia l
· pa ra Laca n , a irisca ura ção d o cog,'to é i nseparávc
cic. n cia
, no sen ti do da ciênci a mode rna.
D I A N A S . RAB I N O V I C H

@ .
Es

Punge m ao aro
@
Repetição
Alienação

Porém, se partimos desse ponto, podemos pensar que o cogito inscala


uma novidade, que se si rua historicamente na mesma época em que surge o
mai. Há insistentes alusões de Lacan ao sécul o XVII como, por exemplo ,
sua referência a La Rochefoucauld, e também a outros moraliscas que criti ­
cavam o amor próprio, como fundamento dessa forma particul ar da subje­
tividade moderna que é o moi. O si mesmo, poderiamas dizer ta mbém .
Mas o moi é correlativo desse outro movimento que é a instal ação do
cu Cje) . Este é, para Lacan, o ponto de origem, estrucural , não hiscó rico ,
necessário para funda r a existência disso que chamará o sujeito do inco nsci·
ente. Não é que o je seja o sujeito, esc l areço-o, é O que permiti rá, em rod
o

caso, a Freud concci tual iza r esse sujeito do inco nscie n te.
·
Nes se sentido, "o passo cartesiano", como o chama Lacan, é ao me.s
mo tempo pas, passo e pas, negação, "não".
,
Descarrcs instaura isso que é necessário para O surgi men to da cilncia
que é o jr, Lacan defi ne explicitamente o je como um conjun to vuio (q
u er

diu:r conjunt o que nlo contém nenhum e lemento) , inlcus ive o diz C(llll
U M A C LIN IC A DA P U L
SÃO

áfora, q ue com o textu al mente do sem iná '


r• o, a esse
ffl e c . . J.• ..nada O
uf11. a,, _ 0 há nada em seu inte nor. Este conJ· un to vaz.. mo-
0 3 10 que é O
bfiia ' . ca : post u la sua existên cia, seu ser, d1z ' L i• te m uma
er1s u a can ' co mo
eira,c - do problema da int errogação sob re forma de
se rn bacaça r se - o se r que tinh
d e ofi a aré entao. O rech aço da a carac-
. do a filos .' . qu estão do s er é, .
rer1za . to d a cienc1a. Este recha ço se . po ts , o que
· O nascimen ªJu sra à defi niçao
cir3c certza h da e e - que
m o avia dado w
V r rfo ng, isto é, da fo raclusao - . 'trata
ele rnes . . . -se aqui dª
s uJ elto, que fiica ass i m reduz ido a este conJ. unro az.
(orac ulsão do . . . . v io, que
ad a c e m em se u mre nor, o que cond iciona (como sem pre que ha' um
n a
algo retorn e no real. O que retorna no real é o que pec
, raclusão) que
1o . es i-
n cha m a o dermo, o resfduo, os restos , O lixo , que deIXa
ficamente Laca · m as
liza çõ es hu man as. Estes restos, graças à ciência, se m ultipli cam até 0
civi
loc alização das lixe iras nucleares é, nesse momento, um
ponto de que a
ma g rave: ond e pôr o lixo da produção da ciência?
p ro ble
Deste modo, a v e rdade da ali enação não é o que crê o marxismo,
nem o que acreditava H egel; a verdade da alienação reside, precisamente,
nesse resíduo. Esse resíduo que é o objeto a, é o que não serve para nada,
não sem razão é resfduo . Este j á não é um conceito de alienação como
alheamento no Outro, como um estar presa do Outro, como ser depen­
dente do Outro, termos que Lacan explicitamente rechaça, mas que impli­
ca algo muito diferente que é a criação d e uma nova forma social correlativa
da ciê n cia: o mercado .
O mercado t e m uma função muiro partic ular; não se craca de qual­
quer me rcado porque, como sabem, o mercado p e rsa existiu. Não necessi­
tamos esperar a civilização ocidental para conh ecê-lo, os dias de mercado
a
existiam na Idade Média. Creio que não há civilização onde não se tenh
. · as, co m u ma esp écie
conheci·do. Mas o mercado anônim o, com 1 eis pr6p n
e
de O urro qu ao qual pre fere-s
e regula os intercâm bios, um Oucro b arrado . o que 0
Pensar na- o b · · 0 rnaq u ia vé hc
ac rado, e ao qual se lh e s upoe _ •Jm s uJ elt _ o .im pli ca
lllanej a desd
e não se sabe onde, quan do co mo q ai q uer Quero na ber
be r, onde O sa
u
Ull} su · e
· , este m ercado é b as i cam en te um m ercad 0 de sa
1 ito
Pela i st .
n aia çao - da ciência torna-se me rcadon a. · u como
mo deseJº o
Na
p,..""a _ med'd I a em que o sujeito forac u
1 /d O re torna co c áveis), nesse
llÇao dos gad . en te descar
gets da ciênci a (que
são em1ne n cern
D IANA s. RA B I N O V I C H

ponto d e retorno como resíduo se produz o q u e La can chama o silencia.


mcnto do gozo.
Este é um ponto importante e Lacan estabelece uma diferença en tre
o silêncio do gozo e o que poderíamos chamar o calar-se da pulsão.
Se voltarmos a Descartes, a relação "torcuosà' que está presen te desde
os pré-socráticos en tre o pensar e o ser é deixada de lado, recusada e, cito a
fórmula de Lacan , "é substituída pela instauração do ser do eu (je) ".
Voltemos ao caso da aula passada , pois, é nesse ponto onde aparece
uma característ ica que apresenta essa paciente, esta s i m , generalizável. Não
é generalizável a forma de encrar em análise, mas é generalizável como po­
sição subjeciva de codo sujeico falance: o que é o generalizável? Já Lacan (a
pri meira rderência a ism a cem em "A ident ificação") quando fala da co n ­
clusão cam,s iana "penso , logo sou" qualifica o eu (je) como uma passagem
ao ato. Recordo que a primeira w,. que o li me causo u assombro, por q ue
essa dedução filosófica era cons iderada uma passagem ao ato? Esca tese do
Semi nário "A idemificação" com i n ua sendo válida no Seminário ''A Lógi­
ca . . . .. , onde já é mais precisa . Lacan diz ali que freme à formulação tradici­
onal "penso, logo existo" , o que há de se q uestionar é a conexão lógi ca
representada pelo "logo" (o ergo latino) . Por quê? Porque esta forma de
conexão lógica é equivalente à implicação material estóica. A impli cação
macerial é a segui n te: "se e somente se 11 então b". Com uma característi ca :
a tábua de verdade da implicação é sempre verdadeira, salvo em um caso, 1 )
d o verdadeiro i n fere-se o verdadei ro; 2) d o falso pode-se i nferir o verdadei­
ro ; 3) do falso pode i n ferir o falso; 4) mas o que não é possível é que do
verdadeiro se i n fi ra o falso. De modo ral que basta assegurar o "eu pen·
so" , d i rá laca n , para que a concl usão seja necessa riamente verda deira. Se
o eu penso é verdadeiro , necessariame n te o eu sou também o será. Por
sua vez, invenendo o argumen to (porq ue coma d uas formas dife ren ces
cm dois momentos d i feren ces) pode-se dizer que se a conclusão é verda·
dei ra o "eu penso" pode ser falso, ou pode ser verdadeiro e d ar a con clu ·
são verdadeira.
Por que Lacan i nsiste nesse problema da implicação ? Porq ue de u m
pensamen to falso pode-se inferir uma conclusão verdad eira, e isso é algo
que, para lacan, se rá vál ido para a in terprecação. De uma i n rerp reraçio
nl
falu p ode-se ti r a r um a conseqüên cia ve rdadeira e, de fin o , La can dedica
-�
U MA CLfN
I CA DA P
U LSAo

di n vá rios seminário s p ara dis cut '


a a te . ir este p rn b
f11:!l·s laça'o com a mterpretação. le m a da i mp
li ca� _
.
efll p ém , aqui o que Lacan sub linha
or é que a Inst .
alaçã0 desse
. , po rtanto, esta•b e 1.ecer -um " ser do 1.e,, . Entao eu (j,)
i f11Ph ca a
.
im portanc1a, n ao do penso nem
_ , "eu pens
o, logo eu
bra su
sou" co do sou, m as do
eu, (je) . .
Quan do Lacan faz a-transformação com b ase na negação
ou eu nao sou " de de Morgan,
o pe nso , o que m ostra)· Mostra que
••00 eu nã a ne.gaça_ o reca,.
). Isro é, que há um pens ar sem ;·e e um
w bre o eu (je
,
En ra0 , a e
. .
scolha p rimeira, fo rçada, da alien aça-0 , nos rem ete ª =µ � �
. . do quadr ao pólo que
á m arcado na hnha superior ângulo (pág 80 no ong . m . ai) com
est .. . · o
com uma flecha d mgida para o "eu na-0 pens »
o da ali enação, ; Lacan d.12
I

. . o
.
que é a escolha obngaróna da alienação para todo sujeito.
O problema ao qual me referi na reunião passada é O da dificuldade
que estabelece o fa ro de que alguém chegue à análise situado nessa posição,
mas há que se esclarecer que esta posição na estrutura não é obviável, é uma
escolh a forçada e, inclusive , Lacan em "A Lógica do Fantasma", diz que 0
lado do Isso, do "eu não penso", existe esse modo "exemplar" - e obser­
vem que a palavra é exemplar - de instauração do sujeita, que é a passa­
gem ao ato . A passagem ao aro aparece definida aqui como uma instaura­
ção do sujeito . Pode-se i r aos antecedentes mais imediatos, ou não tão
imediat os, mas, em rodo caso , o que a mim me parece mais significativo é
o que Lacan já diz em "A angústia", onde sustenta que a passagem ao ato,
no que se re fere a fórmula do fantasma, situa-se sempre do lado do sujeito
e O caracteriza como momenro de máximo emba raço, de máxima emo ção,
no qua dro de dupla entrada que faz dos afetas e acrescenta: '"e O suJ· eito
enq uanto apaga ao máximo pela palavra que o b arra" · V,0Iran do à "A
do .
lógi ca do ran · · .
eito im plica
e tasm
a" , temos q ue, neces sana men ce, o p r
ó p rio suj
al. Cer-
urna passagem
ao ato em seu ponto inaugu . ra 1 , em seu ato inaugur
tarnente , isc . _ . qut 'á m · ca de pa ssagem ao
o nos afasta mt1it0 da conotaçao ps1 "'
aro D ado "eu não penso
· que a opção alienante obn. gatón. a o 1 eva até o m um
até o 61 O mo s co
P do Isso como instauração do ser d O eu, nos depara
Prob[em a qu . iní cio da anál15e ' , mas
e é o que descrevi como obstácu1 O ao
que ta m bé . . seu c ur so , mesmo
m é um dos obstáculos mais imp ortanres em . pro ble mas.
q Ue possa
te r começado sob o modo trad1. c10 . na1 e se m munos
72 DIANA s. RAB I N O V I C H

O que isto implica? Isto implica que os casos que descrevi nos são
especialmente difíceis quando isto aparece no principio, mas o que dizia ao
final do caso que apresentei não impede que a outra face desse caso sej am
aqueles outros casos nos quais este ponto - sigo referindo-me às neu roses
- torna-se a maior resistência à análise. É o ponto em que um sujeito
pode inclusive dar por pseudo-te rminada sua análise . Veremos por que
digo pseudo-terminada.
Se voltarmos agora ao esquema, vemos que o característico da opera­
ção analítica é inclinar o sujei t o a partir da opção alienante, para o lado da
outra opção, para o lado que Lacan ca racteriza enfaticamente como impos­
sível, inicialmeme, p.ira o sujeito, que é a escolha do "eu não sou". Quer
dizer, a escolha do inconscieme a{ onde na outra vez situava o accing-ouc.
A linha que vai d.i .ilienaçâo a1é o inconsciente, Lacan a caracteriza
como operação verd.ide . Do bdo da alienação como primeira opção temos
ou t ro ganho, 01mo bcndkio, que é o gozo da posição inicial do "eu não
penso". Este pomo de gozo como o ca racteriza Lacan - a palavra que usa
é "po mo· - é algo que se opõe à verdade; opõe-se, se olharem o grafo (pág .
80 no original) , pelo sen t ido em que os vetores estão orientados diferencc­
mence, em meio a que há um vetor diagonal, que é o vetor da transferência.
Esce ,·ecor da transferência terá que ser a resultante das outras operações,
mas a transferência como cal, como atualização do inconsciente - defini­
ção que cercamente recordam do Seminário XI - é algo delimitado a esta
altura e é delimitado na medida em que, a partir da passagem ao ato, se
produz algo que podemos caracterizar como fundamental na obra de Lacan,
que é o surgimento do conceito de ato anaHcico. Não vou entrar agora no
detalhe do concei to de aco anaH t ico, queria somente referir-me a alguns
pontos que fazem a relação do gozo com a ve rdade.
O objeto a é definido em "A lógica do fantasma" de duas maneiras
contraditórias . Por um lado, Lacan o chama a verdade da estrutura. Po r
oucro lado, Lacan o chama pomo de gozo, todavia, não é um mais-de­
gozar. O p roblema do valo r de gozo já aparece claramente escabdcci do
nesse sc'.11 imi r io. A questão aqui é a seguinre: se dizemos que do lado do
Inconsciente temos o "eu não sou", desse lado se ab re um pensar se m cu,
po rque se dissemos que o "não sou" afeta o cu, o qu" não existe é o je. lsw
l.acan havia visto desde o Seminári o I I , inclusive , retoma a mesma palavrl
73
es in io , quan do analisa, p
u n se sem ár or cxernp lº•
que usa • d o e u do sonh ad or nos difc re n o sonho de
lrma•
Jj.speis� o . ntes p erson ag
' co o uma m istura en s do sonh
-o m de sui" ei r o s, co . o, carac-
d . rn o u rn s e . o p ol
icriza!l mpossi bilidade de u m suj eito te r
o
u ma u, nica . UJ n icéfa.10 '
"'º a ,·
CO o inco ns cien te temos u m pe nsar sem 1-,' enten
cabeça. Então,
do
d
lado. É para esse l a d o que se orie nta a d a-se ' u rn pensar
téc . . sem
nica da associaçã
5uJ.el C0· 0 r1vre, que
. a emergên cia de algo que é pró pr io do inc . onscie .
perrn1te nte: o efeito de
verdade.
Porém , do outro lado, .
do lado do Isso, do la do
do ..c u nao penso" ' há
. .
se r sem ;r. Lara n eq u ipar a e ss e ser ao Isso freu diano • ao u, "- ao [Isso)
u fll .. sso] " nao • e• n m a . . .
Esse [I e pnme,ra, nem a seg unda, nem
a terceua
_ c n c ndcndo sempre por ter<:cira pesso a aquela da
pessoa '. qual se fala -,
J..;ican n os o k rc-,e "'.'.rn, 1 Jdos moddo J m o, do 1ipo " (isso] fal à' , " [ :s so]
dio�·. " [ isso) bnlha e- esdarc-,e, 1 med 1a1 amcnre, que o proble ma desces
enunci•dos é que se p rot .1 11 1 J 11 1 11.1 u rn fusiío ou a um erro, que é crer que
0 ·:Isso)" en um·ÍJ J si m o mo ; 1 1 .1 0 ld nada cnunriado, a estrutura se enun­
"' sozinha.
O que c:1,J.:1crrz.1 cm· ·· [ i ss o / h r i l ha", " [ isso] chove" ou " [isso] fala" é
Ilgo cuja e.sencú. diz Licrn . é ··,üo ser eu", pas-je. E aqui vem um jogo
mai.ro dificil de trad uz i r e que é o eixo de coda a crítica que faz Lacan. Com
rsro quero lhes dizer que não cem nenhuma graça em castelhano, porque
� tenho ourra forma de traduzi-lo. Se ponho o "não" só perco o jt,
digamoi. o ;r habirualmence obviado em castelhano . Então precisamente
i na
0
f/llS-Jt, em sencido estrico , é aquilo que na teoria lacaniana subsciru
Otrurura a di ferença eu _ não-eu , no sentido do moi tradicio nal e no
por momentos,
!Cncido freu diano do termo , cal como Freud p ôde propor
P<>r aempl o, em " Pulsões e suas vicissitu des" .
prec 1Sameme, esta incxmenc . . • .
ia d o eu 1v• ; ) d o suie1 · · co do inco nsciente
- �n ca rac teriza com o u m pas-je, quer d 1zer
º
nao - eu � v • é .� . �

nao
·
!lirgc da •ncc rseção d as duas negaçõe s. O que tçm • em comu m o ..eu
Palso" O • "t e h;I um ser que
_ e eu não sou" é que h á um pens a r que nao • tem ; li ) ·•
� tcrn · mence o eu v•
J t. No s dois o que é nega do em co mu m é P recisa ·t"
'li<)º nn
po r tan te é que é esta e
,o rm a de "não ser dO J •
ali onde Lacan se para º fi,ca men re ' 0
n�I do
r e do p ensa r, como Isso e 111 · con scicn re · Es peci nem
..._ �
. . m a gun da '
se
'"" �,acte ri, .a eaac [ 1110 1 é que nlo é ne m a pr1. m elfa, ne
D I A N A S . RAB I N O V I C H

a terceira pessoa, o diz com uma clareza pouco habitual, diz: " [Isso] é tudo
aquilo que, no discurso, enquanto estrutura lógica, é pas-je, é o resto da
estrutura gramatical, é o suporte do que está na pulsão". Lacan acrescenta
depois: �·o suporte do que está cm jogo na pulsão, isco é, no fantas ma" . É a
primeira vez que Lacan articula desse modo pulsão e fantasma. Já havia
falado do fantasma sustentando o desejo, agora aparece o fantasma justa­
mente como sustentação da pulsão. O que indica isco? Indica, temporária­
mente, um novo estatuto do fantasma, que não escava presente ante­
riormente. Recoma e mod ifica, assim, o que escava presente no estádio do
espelho, já que é no famoso L no circuito 11 - 11', onde estavam situados -
recordam-se - o libidinal como tal e a fó rm ula do fantasma.

Agora voltam a se unir, mas em função de sua articulação em uma


economia do gozo, que não é a mesma que a da libido objetal e nardsica.
O exemplo disso, do que está em jogo na pulsão no nível do fantas·
ma, é "uma criança é batida" , o tradicional exemplo freudiano. "Uma cri­
ança é batida" é uma frase que se mostra, mas que não se comenta. Respec­
tivamente, convém recordar como Freud não pode delimitar, cm "Pulsões
e seus destinos", a pulsão sadomasoquista e o exibicionismo-voyeurismo
sem uma passagem pela estr utura gramatical, especificamente pelos cem·
pos verbais.
fu estruturas gramaticais próprias da pulsão são o resto da estru tu ra
lógica, nada têm a ver com o pas-je, elas dão sua lei à função do desejo . Esta
formulação também é uma novidade. Nesse ponto, a opção aliena nte o bri ­
gatória do "cu não penso" , quer dizer do Isso, dá como pri m e i ro ,
U MA CLINI
CA D A P U LSÃ
O

so, e daí se seguem tod as as conseq ü .


. en te , o Is ências: qu er dize r que
I011caJI' lei do desejo e a s ustenta ção do ran "- tas
,.1; surse a ma
""' •· diferen ces frases (referi ndo-se às frases gram · . .
rw at1ca1s do es t'l
I o das
"
u d trabalha em Pu Isoes · e se us des tinos") d
ete r mina
.
m ' conscqüen-
ue Fre .
e
q d s disti n tos m q ue o sujei to se al oja ne1as. Rc
e, m o
((Jllcnc ca rdemos que
o
. . .
a c m q ue u m su1e1to se a 1 OJ a na est r utura co mo P� b� do �m
a fo - o . �
,.; de apagamen to , como d i rá Lacan) , é O que ca ractenza o qu e
JII... 1110 . . cha-
'"" o su bicuva e, des c e modo , o q u e ca racte r iza a dc,e , sa ta1 com
JIII pos i .,.. . o
•- a c a
o m , por
exem plo , no a mgo sob re Lagache nos Es,,,·•OS, . O U , 10-
UIca n . , .
� c t ros Se m m a n os , e m q u e: a defesa é definida como equiva-
dusi C , m ou _
ição do su 1e 1 1 0 . A t e ago ra essa posição do s ujeito havia sido
icn lC à pos
m rt rt l ac i onada com u s u j c i c o do i n co nsciente . Agora, a posição sub­
st p
J ul ,
itt iw apartcc an i c u lJ � cu m J p s;\o . 1-1 :1 portanto, uma dete rminação
pulsional da pos ição s u h j c 1 i v.1 q u e 1 cm a ver com a de fesa, como defes a

cncendida enquan t o ddt's.1 p l' i m .u i a fre m e ao gozo ; coisa que Lacan fala
em A mi:i,•..•
mc:s m o que J i n J ., nâo seja a rticulada como algo próp rio da
in.muração do sujciro. dado q u e , cm tal semi nário, está mais inte ressado
:m problema da Coisa .
Por que i nsisto canto nisso? Po rque o termo instauração subj etiva,
� c:sci presente desde "A identi ficação" , em s u a re lação com o cogito
nto
Q..'IC! Íano, culmi na aqui, em "A lógica do fantasma ", co mo o contrapo
pc-n:iw q ue dá a chave desse termo que já menci o nei, q ue Lacan introduz
na "Pro posi ção de ou rubro de 1 967 para a formação do psicanal ista", que é
• rcnno "des titui ção" s u bj etiva . Pode-se dizer q u e a destit u ição subj e tiva é,
co mo
Pl?cisamcn cc aquil o q u e , do lado do sujeit o, ma rca o final de análise
COntrap1x co à "
i nstitui ção" s u bjetiva da passage m ao ato .
se
Pa r qu e haja "a o" tem que haver desti t u ição s u bje tiva , po rq ue
. a t d do
nao fo r as · .. .. vo me ap ro xi man o
u m, o q ue temos é passagem ao ato -
u
ca . e que
(lroblcm po • . d a est ru t u ra lógi
a u co a po u co . Este l:s, q u e é o resto , s
detenni n m · n a p or s u a vez a
d eter i '
L - a a po si· ção do sujeit o e p o r ess a r azão o de fi nc
-in aca n
iaa · ap a rece - L
PDllçõcs vi nculadas como fan t asma, reCJ sa mc n-
llt, 111 _ � p
,. como u m comp leme n to cu1· a fu n ção c. 1un d a men cal • .
.. . a � a no 0 ut ro,
0b
o O tro . I t o � . o bt rar a i n co n si, st!nci
"111 ru rar a falta n u s u
111,' q uc,
rc r 1a hcr aurca do A barra do, (/. ) ,
DIANA s. RAB I N O V I C H

A essência do Isso, que é a estrutura gramatical, impli ca uma Bttkutun .


g
Re cordem que quando falei da Bedeutung, assinalei o sentido amblguo que
lhe dá Lacan segu indo Frege, para quem é, por um lado, a signi ficação e,
por outro, o referente. Quando Lacan fala do Isso, se refere à Betkutung
como referente. Introduz, respectivamente, uma espécie de neologismo, 0
que chama um "pensamento-coisá', condensando as d uas palavras, ou, tam ­
bém, "representação de coisa" no inconsciente. O problema da representa­
ção de coisa está muito detalhado em A Ética . . . , onde é identificada com 0
significante. Aqui, por outro lado, toma aquilo que faz referência às coisas,
à Coisa como referente fundamental, não às coisas realistas , mas a esse refe­
rente particular que é o objeto a. Precisa que não se trata de coisas indizí­
veis, mas, precisamenre, de coisas deli mitadas por um dizer. Quando se
produz o movimenro pelo qual se passa, através da operação verdade, do
"eu não penso" ao "eu não sou" do inconsciente, e se esboça a possibilidade
da destituição subjeciva, o que se mostra é que a opção do Isso é afetada
pelo que seria o conrraponto da desticuição subjetiva, o destino do analista
ao final da análise, que é o "desser". O "desser", ao qual já me referi, como
destino do analisca, implica a queda do sujeito suposto saber, quer dizer, a
queda da transferência. A análise da transferência é, precisamente, a elimi­
nação do sujeito suposto saber e sua redução a esse deser, que é puro vazio,
que é, por sua vez, resíduo, que é o objeto a.
Mas, para ir um pouco mais devagar, o que é, precisamente, que
caracteriza o inconscienre? É uma Bedeutung, enrendida agora como uma
significação (Lacan remete ao seu artigo "A significação do falo"), retoman­
do o conceito de castração pela perspectiva da alienação. Em "A lógica do
fan tasma" a operação castração se sicuará no quarto vértice.
A castração é, aqui, correlativa da subjetivação da satisfação sexual.
O que quer dizer isto? Que o problema, em psicanálise, q uando falam os
de satisfação, é que supomos um sujeito que se satisfaz. A satisfação sub ­
jetiva necessi ta, para produzir-se - esse é O ponto importan te -, da
castração . Não há genitalidade nem sexo, como insistirá Lacan, só há
castração e sexualidade . O falo, o (-cp) , sua significação, é aqu ilo qu e
fracassa em chegar a articular, no nível do i nconsciente, um pensa men to
adequado à relação do sexo.
U M A C L IN I CA DA
r U LSA o
77
• ap arece a p
rimei ra form l çã
u a o de Laca
"q ui ai " , que é " nao - h á ato sex n que an tcc,:
de ao •não
ex u ual " . Po de-se diz ·
,d ação s . er· porque não
hl ai ' h á a to e m se u se n ado m ais ge ral ' ' f,
d h;i
e.x u l ere nte da mo tr ici dade
aro s e da
reflex a,
a,"'o leva a u m novo p ólo . Laca n eq u1p .
1sro nos - ara, nesse po nt
o, duas
. a5 . a alie naçã o e a repençao . . Ex iste um a nova f,orm .
coi s · . . . a de tratar a repeu-
ca,acten za est se máno . Por quê? .
Porque, p11 me1r .
q u e o,
m
ç:10 Lacan reto-
e
. .
·:1 conhecido que é que mem ó11a e repeti ça- 0 nao- sao
ma al go 1 _ . a mes ma
. cl usi ve, que sao o con tráno; que a memória é ho meos tá .
caisa·, in . h
. . nca e que a
·..,; é an n - om eostá !l ca e está ma is-além do princí
repe Ur0 pio do prazer. uer
Q
. , q ue a reperição não pode ser deduzida das coordenadas do pnnc . íplO
.
d 1zc . .
razer. S eg undo, pa ra que b a i a repe 11ção, tem que haver
do p certo des do-
que exige uma primeira e uma segun da vez; com
br.U!lenro rem po ral u ma

úni ca vez. não há repe c i ção poss ível . Ass o ciado dire ramente com a
com pulsão à reperição , Laca n pos c u l a que "o merab o lismo da pulsão o u das
pulsóes, e a função do objeco como perdido, estão relacionados com a repe­
riçio". O qu e quer dizer isco' Que a alienação obrigaró ria do Isso no "e u
não penso" e na operação verdade em di reção ao lado do inconscieme, são
duas funnas diferentes do sujeiro se apresentar no que diz respeito ao náo-
1'• ao não-eu; uma no nível do i n co nsciente e o utra n o nível do Isso. Mas
ambas rêm com o condição a repetição; reencontramos, assim, a separação
emre a ryché e o automaton. A ryché está do lado do "eu não penso" e o
/JlJl/1111dfon está do lado do "eu não sou" .
O que vemos s u rgi r nesse p o n to do desenvo lvimen to de Lacan, é que
ª realidade do sexo aparece co m o aquilo do qual não dá co nta nem O in­
consciente , n em o Isso , na medida em que não há co mplem entari dade
homem- mulher tercei ro
a n ível signi fica nte, senão através de um eleme nto
u al é
que . é O falo. O q ue signifi ca q u e não há ato sexual? Não há arn sex
eq wvalen te a ass mtr em s u
di ze r que há sujei tos e que um sujeito deve se u

sexo e em sua 1 . ass um
· ir em sua relaçao
re açao- com a sexual 1da d e . para se
co m a ua 1 · gn i fi cante que lhe
. sex l I' dade, o sujeito necessita de algo no n {ve si
"""' de p drao - . da é O fui 0·
a de medida, esse padrão de medi
. encontramos
lacan , há muit o , falou do falo e de seu val or de t �oca , o
llo . <
Sern inário tra uss e à ge nes
IV on de há referê ncias explíc i tas a Lévi -S
D I A N A S . RAB I N O V I C H

como cal do valor auavés da troca falos-mulheres-crian ças n a cultura . Co­


nhecemos esse valor do falo, é o que gera o valor da m ulher como objeto
fálico, criando um objeto particular que circula no mercado; quer dizer, em
um l ugar onde certos valores podem circular. Isto é fundamental em rel a­
ção ao con ceito de demanda. O objeto na demanda adquire este valor, é
um valor compartilhado que lhe oferece o caráter de dom.
Já cm "A angústia" , Laca n havia estabelecido o objeto privado, parti­
cular, que é o objeto a como ca usa, como não comparlvel com o objeto de
troca. Vol ra a rewmar esra não compa1i bilidade, e substitui a antinomia
marxista tradicion al "valor de uso-valor de troca", por o utra an tinomia que
é a que pesa em psicanálise, a qu.11 se s i 1 u a emre o valor de troca e o valor de
gozo. Esta é a primeira .ipari,;ão do 1ermo valor de gozo que será, dois anos
mais carde, o mais-de-goLir.
O que é que i nteressa a ! "'"·"' aqui? l 111 crcssa-lhe a economia da pulsão.
Mas a ,:conomia da pulsão não e' u m a economia energética é, como lhes
disse na prime i rJ reun ião, u m., t·co nomia política do gozo e, como toda
policie-a. se articula com uma polít ica de discursos.
Lacan coma e reformula o conceito de mais-valia de Marx e o concei­
to de unidade de valor, baseado no fato de que o valor não se produz pela
equiparação de dois elementos homogêneos . Na produção de valor há dois
elementos que são heterogêneos entre si. O próprio do valor de gozo é ser
um valor heterogêneo ao valor de troca, porque não pode circular. l.acan
i ntroduz os dois sencidos em que usa a palavra gozo : 1 ) "gozar de", que
significa gozar de um bem como propriedade, ponto em que o gozo vira
uma metáfora de gozo e a propriedade, isco é, vi ra ao nlvel do incercâmbio
ou do val or de troca e 2) gozar como gozo próprio do corpo.
No primeiro sentido fala-se de que se goza de uma m ulher, isco é,
que se a possu i. O valor de gozo como gozo do corpo, circula no nlvel do
processo primário, sendo o fundamen co econômico do i nco nscien te. Esta
economia do gozo implica uma energia que lhes é própria. O ter mo ener­
gia é uma óbvia alusão a Preud, mesmo que Lacan remeta a Aris cócc les.
Volto a algo que havia deixado em suspenso antes; qua ndo Lac:an
1n rrod uz "o ato" , a.sinala que "o aro" é aquele pomo em que o sujei to se
ue
cala . Eatahclcce, então, que en tre calar e s ilenciar há uma dis1 inc ia, p ,, rq
U M A C lf N 1 c
A DA P U L S
Ao

. " ão lib e ra o sujeito da lin gua ge rn,


19
calar d ,z n "
o . c ulmine n esse ato ' e (for mu la que h . rnes rno que a essência d
J· e 1to avia rne nCl· on o
su d a demand a cal a a pulsão co meç a" ado da outra
·q- Es valo r de gozo é um valor rnudo
º . - )
te en quanto cal
-' m silên cio . O que Freud cha mava o silê n cio . a, não enqu
esia e · e - . da pulsão tern aq . anro
. ensão diferente, a sat ts raçao. subj etiva não p rovoca a fal u, urna
Jj m a· A ,..,
r_, a prov
d eseJ · 0 • não a pu I sao. _ Po r isso qu ando O su . .
ie1t o co rne , nao .
_ irnp
o-
ca O de um p e rcu . . ça on a
men t so an alíti co _ .
•n ic10, fi na! ' rneio
em que m . ou
o o r

distin tos em uma mes ma a nálise _ em


m c s , a entrar nessa
01o en o
di m ens-ªº
lsão começa a desemp enhar u m pap el • não tem nad
e,-.. que a pu . a a dizer' e
. Po r isso Lacan situará , ali, o ponto de máx'1rna rem . , .
isso é cerco. .
. facilmente, tenc,a. Esta
cala da p ode, muito não estar no ·
inlc,0 para ins
Sacisfaça' o
. .
. talar-
esso analítico. A mstalação
se, depois, no proc dessa s atisfação muda, cala-
da, não silenci osa, no p rocesso a nalítico, te rá conseqüências muito irnpor­
rantes po rq ue gerará essa outra forma de resistência que, rnais tarde, aparecerá
na obra de Lacan e que será denominada gozo do blá-blá.
O sexo se apresenta como um enigma para o s ujeito. Pode-se dizer
que assim como há possibilidade, no nível do desejo (ou de s uas formas
variáveis, impossível, insatisfeito e p recavido) , de identificar-se co m o dese­
jo do O u tro, não há, por outro l ado, forma de identificar-se com a satisfa­
ção do O u tro . Este é, quiçá, o limite no qu al esta satisfação aparece mar­
cando um ponto de real, fundamen tal, como impossível, p orque é, por sua
va., um ponto de identificação imposs ível. O sujeito pode identificar-se
com o desejo do Outro; a histeria o revela, Freud descreve u -o, não é novi­
dade. Mas qua ndo Lacan diz: não há gozo do O u tro, está referindo -se não
s ue o Outro do significante é um Outro que é um deserto de gozo , q ue
óªq
0 é po ssível iden-
está esvaz,ado · de gozo, m as, que com o gozo d o Ourro na- u-
tificar-se . desei· o de algu m O
da manei ra como nos I' d ent1' fi1camos co m O
tro n a his teri . ute.
a.
Es te po nto de não transfe renc1a ' . do gozo tem u m limite ; esse .Im
. r o d
está dad0 p · mas no mte r1 o
elo fato de que o gozo se t ransfe re, sim , . de gozO • é 0
pro . nsferência
se ce. sso p nrnário. Isto é, Freud m esm o re_a.i, ava d ª t ra. amente ,
d
n r,. o que Lacan da r á em RAdiofonia à meton ím ia , mas , recis
á �o im plica um
ess a • dé i m r1
a da tra nsfe rência de gozo de nt ro d o p ro cesso p r1 rte ela
gOzo ab sol . qu e, fi nalm en te , fo rma pa
Uta rnent e auto-erótico , c0 1sa
D IAN A S . RAB I N O V I C H

a d a pulsão . Isco é, da pulsão parcial co mo e rnin


escrucura fre ud ian cntt.
.
mcncc auco-crócica
é
o reformula�a do segu inte lll
Ncsce pon co preci_so, a cas ��� odo: a
ica a p ro1b1çao do auto-ero tismo e, espccjfi
cas eraça-0 com o tal impl . <:anicn.
E s a pro1" b_ ,º ça- o d o auto-erom mo é O que
ce, do auco-cro tism o fálico. � di s11a
o parcial.
impo ri:ância e seu lugar à pulsa _
A ince rdição do auco -erousmo, em qualquec de suas focmas, CO IJlc.
çando pda forma princeps , que é a do falo, é uma ope cação de subtração
desse gozo calado , quer dizer, produz perda de gozo . Na medi da Cl!l que
prod uz perda de gozo cria . s i m u h a ne.i m e n ce, a possibil idade de s ua cccupe.
ração . mas de uma recupera \·áu que a esta ah ura da obra de Lacan csm
re prese n tada , b•sicunc 1 1 1 e , pr lus po mos de gozo que são as quatro fo rmas
do objeto "· O ubjc1u •111:rndo lirnciona nesse lugar de recupe ração de
gozo, enquanto i m p l irando u m ., "" isfoção cal ada, por um lado, e não uma
n.-a.liução, mar,-a ,, fa11 1.1.s m.1 rn 1 1 1 0 d i fc rcnie em sua articulação com a pulsão
em rebç.io a sua a n i culaç.iu wrn o desejo por outro. Por quê? Porque esu
inrerdiç.io do aura-erotismo. que daqui pra fren te começa a rer um peso
cada vez mais fone em Lacan, i m p l i ca articular o auto-erotismo como o
concrário da croca. É o que, em algum momento poscerior de sua obra,
chamará gozo aucisca e esce gozo , que não é o gozo da relação sexual nem
do ato saua.1, implica um ganho ao qual o sujeico, quando reco rre a análi­
se, deve renunciar. Mas deve renunciar a ele para recupe rá-lo de uma for­
m.i diference .
Há cercos caminhos da repecição, do voltar a percorrer os circuiCOS
f.aci liw!os , para dizê-lo cm cermos do " Projeto . ", que são inseparáveis do
..
conceito de gozo. Este percurso dos mesmos caminhos
faz a sacisfaçi
o

subjetiva. Porca mo, a repeti ção não Cfl1


é algo de que o sujeico se libene
análise : pelo menos da compul são •
à rcpecição estrutu ral não h:l liberaçi ·
Este é um dos pontos que Lac ·
an chamará pon tos incur:lveis da escr ucu!3
O automatom e a tychl não
são obviáve is .

ª
Es ce p roble ma de torna r a percorrer os mesmos ca mi nhos para
nar e ncontrar uma satisfação , não uma realiza
io;
ção cul mina e m algo q '''
ue

qui ç.t, problcmllt ico e


que tem a ver com uma fras� de La can que dii q
llt

clac: jo � encarna i' o 11(1


. como caatração, is10 é, co mo (-q,) e o a co (ago
ue-
rl

· ·
PIJ<.anallt ico) -e con imu, cum o um fingimento pelo qual o an alisll elfl
o<periência como analis an d o e aq ui
e< sua .• . lo a q ue fi cou red
u p o s ro saber em tal expe nen cia . Fi n g,r esquecer seu uzido o s
. .
u1e1ro
s I ato é ser causa
' isto nos eva ao próximo p o nto, co
processo rn o q ual queria ter d esse
Por que quan.d o Lacan faz to da s estas f,or mi nar.
mu la Ço- es, que se relacion
de anál ,se, por que est e moment
co m o fi nal . o é correlativ
o a sua teoriza çã arn
do aro an alln co por. um 1 ado , e co rrela tivo por outro, o
. gi. nal que ex1Ste no camp o psi à p roposta, quiçá .
mais on ca nal{u. co •
acerca do que é
dad e an al ltica ? Todos estes temas, em Laca n, sao . .
_ so 1 idá urna socie-
nos d e urn a reflexão
e são mais ou menos contemporân eos ao per/odo q ue va,. desde a
na de Paris, em 1 964 , à "Proposiça fundação
da Escola freudia · _o d
e outubro de 1 967...•
.msm. u1. o passe com o proced •
e m q ue imento .
O fi nal de análise é algo mu i to comenta do , mas tenh amos
. - claro que
é um termo que Lacan 1mp o e com uma pregnância particular. O que se
cost uma esquecer é o context o n o qual o tema do final de análise assume
um peso central e para quem . Basicamente quem assume este peso são os
psicanalistas.
Quand o Lacan escolhe o term o "Escolà' faz uma referência explicita
à, escolas de fil o s o fia antiga . Em "Kant com Sade", p u bl i cado em 1 963,
que não é o m omento da redação o riginal, texto correlativo ao Semi nário A
Ética . . . , encontram o s, nos p rimeiro s parágrafos, uma frase que diz assim:
"A alcova sadiana pode ser equiparada a esses lugares nos qu ais as escolas de
filosofia tomaram seu nome, Academia, Li ceu, Stoa". Refere-se, respecti­
vamente, à Academia de Piarã o , ao L i ceu de Ari stóteles e à Stoa dos Estói­
cos send o es tes o s n o mes dos ginási o s o nde se reuniam as esco las .
como
A alcova sadiana é uma esco la comparável a essas porque ''Aq ui ,
lá [quer dizer na alcova de Sade da mesma e, o rma que nas escolas de filosofia
antiga} . prepara-se a ciência retifi cand o a posiçã o da ética" · .
edade anali nca , na
Lacan ambicion o u fundar uma Escol a, um a Soci · falou
isso
qual "se preparas se a ciência re tifi cando a posi· ça- 0 da éti cà', por
de urna éti. ca · do pS 1ca . nai'IS[a. Porque,
da psicanálise e não de uma é u ca · psicaná-
p re ci· same assa da éuca da
nte, não há nada mais fáci 1 , qua nd° se p rca do que deve
l ise à é ti. ca liçõe ace
do psicanalista, que cair gera 1mente em u é0
u i é q ai
s

se r 0u do . pro blem3 aq
que não deve ser um p s1cana1 ,· s ta. O or to e· pro-
ess
dever daq a u m bom p . rencia
uel e que está encarregado de conduz ir o q ue dife
à
do
cesso parc . ál'
, se. B o m port
,cular que se cham a uma an
82 D I ANA s. RA B I N OV I C H

q u e esperavam a s escolas clássicas de filosofia, que esperavam dese m bocar


na sabedoria, no i deal do sábio, na fusão, na contemplação, ou no que fosse
do ser s u p remo; o q u e produz a psicanálise é a derrocada desse s ujeito s u­
posto ao saber, que é o sábio, o ser s u p remo ou Deus, de acordo com os
nomes que queiram lhe dar.
Lacan insiste, não há possibilidade, a partir de Freu d , de um retorno
ao pensamento do ser; rodo rerorno ao pensamento do ser que implique
desconhecer a relação fundamental entre o significante e a sexuali dade, entre
a p ulsão parcial como sexualidade polimorfa, perversa, a uto-erótica e a
inexistência do ato sexual, implica, necessariamente, cair no ocultismo de
Jung, e cita a famosa frase de uma carta de Freud a Jung acerca do rio de
lodo do ocultismo.
A insistência de Lacan não é casual, porque o lugar da psicanálise é
solidário do lugar da ciência . Onde se prepara a ciência, se fo rclui o s ujeito.
Aí está o psicanalista e está a psicanálise. Al i estão as novas problemáticas
éticas que vão s u rgindo, e a esta lei não escapa a p rópria psicanálise.
Quando Lacan propõe sua tese da historicidade do inconsciente e da
hisroricidade das resistências, por exemplo, o que marca é que a função de
uma Escola de psicanálise é, p recisamente, a de não só garantir que seus
membros sejam capazes de co nduzir uma cura, mas também a de assegurar
- não garantir, precisamente - que se p roduza em seu con texro, o ques­
tionamento permanente daqueles pontos de real como impossível , onde o
psicanalista , na cura analítica e fora dela, é convocado uma vez que exerce a
psicanálise.
V

ueri a i n icia r. hoje retomando o qu adr.'ingulo apresen tado


� . na terce .1ra aula na pági. na 50 ' ao
q ual me rden . .
, no vértice sup e rio r es
querdo, onde se
..
sirua a alre rnanva ahenanr e ou eu não penso ou e u não sou",
e onde en-
contra m o s situada a repetiçã o. Vou deter-m e nesra funça·o d · -
a repençao,
que Laca n re toma em sua ex posição do S e mi nário "A iden tifi cação",
quer
dizer, em termos de t r•ço un.í rio.
Existem temáticas que insistem em sua prese nça no que diz respeito
à repetição. Em primei ro lugar, nunca es tá ause n te , n as considerações de
Lacan, a diferença entr e a re p e tição freudiana e a me mória entendida como
adaptação vir:a.l. Se, por ou tro lado, v emos desponrar a insistên cia de Lacan
em articular a re pe tição freudiana com o gozo, ve mos art icular-se a proble­
mática da repeti ção como repe tição de goro. Re petição de gozo que n ão
podemos deixar d e relacionar com o que n o Seminário XI se ap resenra
como ryche, encon tro fracassado, malog ro do e n co n tro com o obj eto como
perdido.
A repe ti ção como automaton, como re pe nçao · - da cadeia signifi cante
podem os ras t reá-la no Seminário l i , na sé r ie dos (+) e dos (-) (rambé�
presen te nos EJcritos . . . n i· fi, ca n re q ue determ1-
e m "A car t a roubada . ) , sén e s i g
na O suje ito,
da qual o suj e i to é efe ito e não agen te . . ndível
No que diz respeito à relação entr e re pen.ça·o e gozo ' é , mpre-sci
i nt r0d u 1r rep n· ça o. Esta
z · a dimensão do a to em sua aru· cula ça· 0 co m a .
e

a rt i cula . me n to de Lacan ao
- tem como ponto d e par t i' d a O ques u o na
çao n ro a
s tio name
Ctl ncett· o d uecer, é u. m q ue
�lda., :u teo
e ato sex ual que ' nao • se d eve esq 1ta 1
l"d a de " ou , me Ih or
rii.ações psicanalíti cas cm w rno d ª " gen
D I A N A S . RAB J N OVICH

ainda, de seu mito. Nesse ponto Lacan propõe o problema inver tendo seus
termos habituais (os das conceitualizações psicanalíticas) , pois, sua pergu n­
ta pode formular-se assim : como a relação sexual pode se constituir como
ato no ser falante ?
Tendo presente esta pergunta devemos, primeiro, retornar à repeti­
ção. Entre as considerações que insistem no percurso lacaniano, encontra­
mos a íntima relação estrutural entre o objeto perdido freudiano e a repeti­
ção, dado que aquele constitui o fundamento mesmo da repetição. Portanto,
a reconsideração da repetição é solidária da reconsideração do objeto a.
Objeto que se apresenta, agora, não só como resto, mas, também, como
produto . O objeto a, já o dissemos, articula-se, desce modo, com a produ­
ção e não com a criação significa nce. No Seminário XVI, " De um Outro
ao outro", referindo-se à pulsão, assinala que, através do conceito de pulsão,
a psicanálise chegou à descoberta dos meios de produção da satisfação
pulsional, vak dizer, do gozo , meios que já foram conceituados (Seminário
XI) como monragens pulsionais. A montagem pulsional é, pois, um meio
de produção da satisfação . Isto supóc que, na pulsão, a satisfação produzida
implici um sujeico que se satisfaz com ela e, além disso, que tal satisfação "fu
as vezes de" , "ocupa o lugar de", esse vazio criado pela inexistência do ato
sexual. As expressóes "faz as vezes de" e "ocupa o lugar de", são formas de
traduzir essa difícil expressão que Lacan usa em francês: tenant lieu, expressão
que, às vezes, encontrarão erroneamente traduzida como lugar-tenente. O
próprio horizonte de consciruição da pulsão é a impossibilidade do aco como
aco sexual. Precisamente, a dificuldade é formulada em termos de quão pro­
blemático é articular, no ser falante, a satisfação e a dimensão subjetiva. É ali
onde a sexualidade perversa polimorfa de Três emaios se situa, substituindo o
aco sexual encendido como complementaridade de ambos os sexos.
Já no Seminário XI Lacan caracterizou o sujeico pulsional em termos
de uma subjetivação acéfala. Podemos situar esta subjetivação acé fala em
relação à opção alienante "ou eu não penso ou eu não sou", do lado da
escolha do Isso, do "eu não penso", onde encontramos um ser sem eu (jt)
que, ao positivizar-se, se apresenta como caractedstico do sujeico da pulsão.
Temos aqui a conjunção entre a lógica e a corporeidade, entre a lógica
alienante e o corpo . Esta conjunção produz esse gozo de borda próp rio da
pulaáo que ocupa o lugar da impossibilidade do ato sexual.
m corno desse furo central • desse
� en cão • e vazio central
'. 1' to estrurnra , em re1 a ção a es sa satis faça- o de bor " ' da Co.1sa,
o sU J '
qº' " a pulsão; 1 og lst1ca da' uma 1ogIsttca ·
· q ue corresponde às d•v ' ersas p .
d,fcsa n .
uls1o n al esse
os i ções sub'JCtt-.
Jj g o z o p . N disp osit ivo - .
fiente ao situa se, a repeuça-
o, como
'/al ozo.
t ição de g
repC ,., se con texto se mscreve a relação ent re ato , go
1,es . zo e repeti. ção. De-
ass
. t ·.� ,,,en te, cal co.mo o . malamos desde a p rime ira reumao ·- , a
promo-
fin1 ••�·· z inica é separável da
o na cl m arti culaç -
a 0 da
çáO do go . pul sao
- com a séne
to - ato - act m g-ou c. Não ach o muito d i· "crc1· 1 s1cua
passagem ao a · r es ta
de em re la ç co m o �ue, cm Freud, se expressava em ter mos da estreita
ão
crfa .
,dação q ue gu arda a pulsao com a momc1d ade. Não é à toa que O seminá­
ia-se com uma crít ica a wda co ncepção emp irista e bio­
rio so bre O ato inic
isca que re d u za o ato a um reflexo o u a um pólo motor da resposta de
log
um o
rgan ismo . N ão .: 1 ngc'n u a . cm Lacan , a transposição do conceito de
res ra à dime n são signi li,., n t c , rncrcn tc com sua conservação do termo
pas
aro, n:ssituado não como .1 rcs1Hist ;1 do organismo ao Um welt, mas como
unp!icação da s u bjetividade. p roJ u w da captura significante na ação hu­
mana. Em s ua JJ1il ise de H a m let no Semi nário VI, uma vez diferenciada a
confusão teórica que sustenta a noção de fantasia inconsciente, própria do
k!ruiismo - confundir a fórmula do fantasma, � O a com a fórmula da
�. S O D, confusão p resente no eixo a - a ' do esquema L -, a dificul­
d3de do neurótico &en te ao ato é o ponto de partida de uma releirura da
cbnanda a partir de seu fu ndamento pulsional, que abre o caminho para
os desenvo lvi mento s sob re O gozo do Seminário A ética . . . É por isso que a
relação deman da-p ergu n ta é retomada no n ível do grafo mostrando come
0 ato im lica
p o sujeiw do s i gn i fi cante no ci rcuito do ganho e perda de
se, coma·
gozo, ou sej a, da satisfação pulsional . A motricidade cra nsfo rma- .
r substi tui ª saas
ic com p omísso do suJ· eiw no aw com essa satisfação que
� da compl em entaridad e sexual .
. O s UJ· ctt· o no pet i o : t
01to inrc · ato nos é apresenta do com o d up 1 o 1 aço da re çã
no r to poló gico no qual o significante " parece sig m fi1 a $i mcs " · ' car
mil "
11 ·r,
Nã 0 dcvc mo s esquecer de sublin har esse " pa rece • dado qu e '
gn, IC.ant . nc si·g ni fica a s1 mes
11\Q F e - l ..a ca n o disse de mil maneiras - nu a
edida e m que '
· ·. <> d up 1 <> 1 a ço que dá a chave desta fo rmu 1 a r;
........_ .,.. o , na m
..,...11,ãr, do 11. . ·,.11 ,is que, por K r en
gn i fica n te cm um tí ni co traço, repc1 1.,:-o P'
D IA N A s. RABINOVJCH

um único traço, e m um único movimento, não implica a descontinuidade


significante, não implica o intervalo, mas a manutenção da continuidade.
Nessa repetição, então, na qual em um único movimento traçam-se dois
laços, repetição, insisto, que faz surgir um dois que não é mais que um, isto
é, que é alheia a toda unificação, a todo fuzer do dois Um, o sujeito pode
surgir "[ . . . ] como equivalente [prestem atenção, não diz idêntico] a seu
significante, mesmo que por isso não estej a menos dividido" . Equivalência
não é identidade.
Todo cone que produ, es1a repetição acarreta uma mutação do sujei­
to, altera sua posição subjeriva. Qual é a mutação, a al teração produzida no
sujeito, só será aprec iada unu ,·e, rea lizado o corce. Assi m , a antecipação
do aco, não necessa riamcmc, dá co n t a do ess encial do mesmo: suas conse­
qüencias. O ato, no qual u s u j c i w pers i s i c como d i vidido, só pode ser
definido rnmo cal. ., pu,um11·i, por suas conseqüências . Para quali ficá-lo
Lacan uciliza o ccrmu \ t'r/,.,11g1111 ".�· t e r m o q u e cm Freud, com sabem, é
solidário da pc:rv ers.io e que fo i i ra d u ,.iJo como renegação ou desmentido.
Se ccscolhe ccs« n,rmo e' , prcC 1sa111 c n 1 c , porq ue lhe permite caracterizar a
ambigüidade dos ete i cos do aco. Am bigüidade que i mpede o sujeito de
reconhecer ( re renham a reaparição do reconheci mento) , não se trata de
conhecer os efeitos do aro, devido j ustamente à m utação experimentada
pelo sujeito . Um ato verdadeiro é inseparável da modificação da posição
subjeciva, modificação que impede ao sujeito re-conhecer-se nele .
Desse modo o sujeito que "comete" o ato - convém guardar esre
.. cometer" com seu remetimento ao penal -, necessariamente, encontra
modificada sua posição, não reconhecendo-se al i onde está . A Verkugn ung
não é, pois, para Lacan solidária da perversão, mas constitutiva do sujeito
em sua divisão por ação do significante. O ato não é, pois, unificação do
sujeito; pode-se dizer, inclusive, que o ato é correlativo, no nível do eu
(mo,) , a certa despersonal ização, que ind ica este não se reconhecer, este se
desconhecer. Isto é, que o ato tem o desconheci mento ou o l i mite ao
reconhecimento do sujeito como seu correlato. O alcance i naugura l do ato
é não reconhecido pelo próprio sujeito que o executa e, ao qual, modifica .
Eua d imensão do ato é inseparável da inex isttncia do ato sexual: há
ato, em ger a l , por que não há ato sexual, sendo esre o ato em que o sujeiw
- não o organ i,mo hiológico - poderia fundar .. ,c como ser se. uado. Tud<>
. 'a anal{cica, su b l i nha Lacan , atenta co ntra es possi
ci ta bilidade
cJI"riln sig11 1. fican te fal ta - J' á desde o s emi. nário dedicado às
,,. do ps ico-
011c"'.' cantc de "A m u lhe r" , esse significant
j'/0 oifi e que seria O comple-
0 sag " hornem" ,
O que per m1. t1na
. .
ftS .- do signi fican te dizer p ara todo homem,
meo!O lh er . Po tan to, p ara a per n a
gu t à q ual nos referimos inicial­
11
r
da m
tl2 !O n ta acerca de como, no ser fal ante , p ode se fundar
p pergu n - a relaça·o
lfl"' ' ,3
.nce a to ao co mo cond u ta re fl exa, motora etc , a
ai co mo • • · resposta é a
e o a to sexu a l .
1 3d d ..
u

. 1. b 1'J'd .
1!f!P055 ibili dade t ra ça o h or a zonce no qu al se emoldura a sexua-
f.s ta imp oss
fre udiana , co m a-a p o ss ível a partir dessa mesma impossi-
ul · on al
r1d. a. de p Sl
d eve- se a asso que . pa ra o s e r fa lan ce, a sexu alidade substitua 0
D
bihda e· . . .
o assu ma a tu . nç ao_ d e s agr n' fiaca n c e que permmrá uma assun ção
e O fal
sao . . nos en s i na a expe riênc ia p s i .ana l !c i ca, da relação sexu al para am-
'ª ·
patCU
s i c ua - st' , pu as , nu pólo de uma unificação de dois em
t,os os sexos. O falo
ue adq u i re um ca râ 1 n idc.1 1 . p rt't is a m t' n te p orque é um real encendi­
um q
d,:, .;omo impossi"d lógiru. :\, ,·u ncci 1 11;1\·ócs psicanal íticas situam-se ness a
penpw iva ideal . clc\'a n d n n Ld i r i s m o à c a t ego r i a de geni t a lida de,
mncroduzindo cbndcs 1 i n .1 111cn 1 r os3 u n i fi cação na relação sexual que a
=ição freudiana dcmo nst rJ 1 111 possívcl .
�io encon tramos no saber i n consciente nenhuma resposta ao ato
scmal, nenhuma possibilidade de fu ndar o ser como sexuado que escape ao
tündammto do s i gn ifi cante fálico . Ao nível do i nconsciente o a to sexual
f:zz furo, não há respos ta ao ser co mo sexuado. Lacan diz claramente ecr
111a resenha do Semi nário "A lógica do fantasm a" (Resefzas de ensefzanZA
Maaaria1, Bs. As. , pág . 43) " [ .. . ] não há aro sex u al com o subentendido
.
que .ucada aos requisi tos para a fi rmar no sujeiro a certeza de pertencer
� �·- Este fu ro re met e não ao desejo, mas ao gozo , ou sej a, à s a tisfu
\.O. Fia cla ro q u e n ão há i n s tauração do suj e i to como sexuado no a �
IClual.

ra:'
q ua1q
'111
Se ª psi can ál ise
rrad icionalmc n t c encontra a significação sexual CI
� r te, o pós- freudismo , ao renegar a primazia fálica, se enredo
r CX 11tir o a to scic ua I b . .
so o precexro d a .. geni' ta l I d ade. ; me1 us1ve
. COI
º

� ª
ÍUricli ndo 1Cx 11.1
l i da de puls
ional ligada ao objeto a, essa a-sexuali dade di
COtn ° fundam t de u m a sexualidade gen ital mo delada, no Cll
a.. �•n11111c, en o
' por tum pl o , aob re o s eio e n lo sob re o falo, su bsmui.,.
· ·r1
• DIANA s. RAB I N O V I C H

cm última instância do falicismo por u m objeto significante se io, que


"faz as vezes de" significante de A mulher. Dai em diante uma mu lher só
pode ser mãe.
fu dificuldades com a satisfação levam a caracterizar o sinto ma, q ue
no gra fo , recordo-lhes, situa-se em s(A) , como modalidades da ins atisfação.
Novamente podemos seguir o fio freudiano se recordamos isso q ue F reud
denominou beneficio primário da enfermidade em sua relação com o sin­
toma. Ponto que designa a infiltração do si ntoma pela satisfação, ou seja,
pelo gozo que o exibe como rebddia ante a insatisfação. Essa i nfiltração do
sintoma pelo gozo i m rodu, uma d i mensão que escapa ao sintoma definido
como metáfora, que remete a essa d i mensão que a histeria pro moveu sem­
pre a um primeiro plano, med ian1e essa log/s1 ica que lhe é própria, a da
conversáo, a d i mensão Jo nnpu rumo s u porte: nccess:írio do goro.
Esca. din1cnsáo do (orpo i.: 0 1 1 1 0 s u porte do gozo leva a pensar em um
Outro que ji n.io ,: o Uutro do si�11i lica 1 1 1 c , O u t ro lugar da verdade - ao
qual S<"ntprc �mctr o s i n runu nl·urclt ico -, m as um Ou tro sede do gozo.
A ma.rei signiticrnte rem wmn su p erfície primeira o corpo, essa etiqueta,
dir-.í Lican , esse lug-.lf onde escrever. Somente a inscrição da marca na
superficie do corpo introduz a castração entendida como perda de gozo:
variante da alienação que estabelece um vel alienante entre corpo e gozo.
5" a opção alienante nos leva primeiro do lado do "eu não penso", do
Lado do Isso, do lado do pulsional, já temos ali uma reduplicação da aliena­
ção por ação da marca significante sobre o corpo que separa corpo e gozo.
Operando a marca, a escolha obrigatória é a do corpo, ficando, tão somen­
te, o gozo como recuperação de uma perda sob a forma desse mais, essa
superioridade de gozo, que Freud já delimitou a nlvel pulsional. São as
montagens pulsionais do corpo , essas que bordeiam o furo da Coisa, as que
serão meios de produção desse mais-de-gozo que o objeto a caprura. O
gozo - supostamente todo - recupera-se por uma re-prod ução na mon­
tagem pulsional. Mas o gozo todo, o da relação sexual se ela fosse possível,
ase, gozo não existe. O mais-de-gozar é correlativo do não-todo da verda­
de; se o um se recupera como superioridade, a outra só pode se dizer pda
metade. Este corpo marcado pelo significan te é um corpo subjeti vado,
prccísamcn tc c11a subjetivação acéfala da pulsão Mas , dali em dia nte , 0
.
1U�1u, fica priaionciro da marca , é sua víti ma, fi ca a sua more!, e o goJO·
levan d c m e le esse o b'
iaOº. cscapdaescJO
.
o o

cm F cud ( q ue n
Je to est
rutur
alm
o do
r
ão Po r aca en te Per .
0 b,e t ex .
cia d e sa
. sO n as
ce n a el .
di do que
�o
da p . er iên tJSfação) , ess e ass 1 ca
. qu e n ão se co 111ente eh
fllª d ns a-
ve s tígi o o fu ro a Co tsa, a-s CJtu egue fal '
. ' d
a a e1a • ar, deIXan
cofll0 e d e m cui. d0
çá
du o d . essa sup n o n ade de gozo as bordas se
p. to que a pu ls fo rma a
ã0 recupe
cl cado, p o is, qu e o ter mo "pa rci al " p . ra. Nada .
1 n i ar a qu al. ifi ca r a puI mais
, 0 gozo qu e p ro d uz , nao s e rá sem pr_ são ; sua sa
e llla 1s do tisfa•
ça0• que p ar te d
rdido • rodo , qu e nun ca ex isti u • a li , on de . esse gozo
pe . "' impera o s ig
a n vo . r. nesse po n to n I'ficante, ex
CO u�o • mico rc cro q ue o gozo ceto
de bo rda p as
ivale nte dess e gozo sexual , gozo q ue se . sa a ser
eq u ri a to do se ex1 .
. . . - susse . G ozo par .
a u m su1euo, n a o a um organis cial
que sa nsfaz mo b'10 l óg1c .
o , que sup
nc1on am e n to d a p · e ao
suj eito n o fu . ulsão co mo s ujei co de
o
um a san. sfação alh
' . . eia
à n(CCSSI'da d e b '10 l og1ca .
O obj eto a, e n t ão , pode r,! ser, enqua nto objeto perdid
o , causa do
. . . . . .
dese j o . d 1v1 d 1r o s u 1 c 1 t o , cm J 1' - 1 o; m as ser:! • a s sim mesm o , 1 ugar de captu-
. . . . .
ra do mais-d e-goza r na s,1 1 1 s t:i ,·ao p uls1onal . Sua função de causa vincula-
st co m a perda; s ua fu n ,·.io de m a i s - de-gozar vi ncula-se co m a recupera­
ção da perda . Reú n e e m s i , pa radoxa l m e n te poderia-s e d izer, a perda e a
recuperação.
O gozo da pulsão parcial penetra, portanto, es tr uturalmente, a cas­
cr.ição como operação de um vel alienante entre gozo e co rpo . O mais-dc­
gozar co mo recu peração não é, e ntão, a trans gressão da castração , p ois sua
própria existê ncia ar ticul a-se com a cas tração, lhe acata. Ond e ouve opera­
se se�tido,
ção da marca s i gn i fi ca n te sobre o corpo há perd a de gozo e, nes
val r d e gozo , p ois es
sa
o goz o torna -se
casrração. Por operar-se esta perd a,
o

perda é an ulação de goro . . lib ra de


r_ � co� go =
c.sta m arca sobre o corpo, es sa ma rca qu e um
. uído agora e m
carne, se qu isere m , rem e te ao traço u ná n o, m as ind .
re fo r m u lar O pro-
novo con tex zo, per m i te
to . Esta ma rca , so li. d ár i, a d o go mos de fe ri a
d
blcma qu ál isc c m te r
e clas s i ca m e n te foi p ropos to e m ps i. can d a ' na medida
re r '
m cn to des sa e
i
Darc!si. ca. El
a se dem on st ra como o eru n d a . . d a marca so b
re 0
ue a fe rid a o n gi. ná n a ólico ,
crn q se aprese n ta com o cica t riz d ess a po i o s i mb
mo o
co r L aca n co. utu
io nal , s ra
rpo. O t er mo "ci ca triz" é p rop o s to po ,
. m en te c ica triz p uls a
n 1
••g · r, n te, z é, p rccis a ' oi s, c
m um
,_ •ca da f eri da . A ci ca t ri mo - no s , p
En co nt ra
"" b.i •da • q
ue a feri d a nards ca enco b rc.
D I AN A S . RAB I N O V I C H

dimensão cm q ue o narcisismo, o estádio do espelho mesmo, têm como


fundamento a subjetivação que introduz a marca, a cicatriz pulsional, ci ca­
triz sobre a qual poderá logo instalar-se o eu (mo,).
Qual é, então, a relação entre esta marca, produto da castração como
separação do corpo e o gozo, e a castração em sua relação com o falo? Pode­
se responder que a castração, incluindo aquela que recai sobre o falo, to rna­
se i nterdição do auto-eroiismo. Nesse contexto não deve surpreender que
Lacan se refira ao "objeto falo" , pois, pelo ângulo do au to-erotismo, o falo
nada tem a ver com aquilo que remeie à reprodução, à relação sexual, às
esuuluras do pa�ntesco, elemen ,an:s ou não.
Esta formulação da cast ração como interdição do auto-erotismo, ser­
ve a Lacan para zombar de cenas formu lações filosóficas a partir de um
con,raponlo c:nue au1u-crucismo r rd.1\·:ío sexual . A perspectiva em que
Lacan c:s..:olhc �, rcla1rii-ãu sexu�, I envolve, necessariamente, um "para Outro",
vale dizer, a i ncl usão do p,mm,11rr. 1-:.Ssc para outro, que no falanteser im­
plica a oucro sujeito , Jlgo .1s s i m , se poderia dizer, como um sujeito suposto
ao Outro sexo, ao i n trod uzir essa suposição de sujeito, nos leva à outra
escolha da al ienação, aquela que se marca pela operação verdade e cujo
veto r culmina no vértice do "eu não sou" do inco nsciente, no qual a impos­
sível s i gn ificação do sexo é substi tuída pela significação fálica.
Este "para outro" se opõe ao "para si" da primeira escolha, a do "eu
não penso" , própria do auto-erotismo e do que, e ntre aspas, pode qualifi­
car-se como um gozo '"'aucisca .
n

O "para outro " revela o partenaire como também marcado pelo


signifi can te e remete, sem dúvida, a esse S ($.) . a esse rechaço, que assinala a
verdade do Ou tro como a castração, o não há O utro do Outro, a ausência
de metalinguagem. Recordemos que, para Lacan, a castração é, primordi­
almente , castração do Ou tro, e, portanto em primeira instância, da mãe,
tal como Freud o indica. M as sobre este Outro já operou o esvaziamen to
de gozo, o que, na conjunção sexual humana, deixa aberta essa proble máti­
ca dimensão que lhe é própria, a do ideal de gozo do Outro, do gozo do
s,:mclhame.
Ne,sc pomo faz sua aparição lógica o direito, o gozo se torna metiifu­
ra, ,e: traruitivisa, di ga mos, a partir da noção de possessão. Goza-se de . . .
u m bc:m, u m a mul her, etc. , ten ta-se recuperar o gozo perdido d o Outro
UMA
CtrN1
cA D A
P U L S .\
o

b dessa possessão mesma, d essa 91


arf1V me táfo ra ·
s c am en co d o q u e o qu e . Qu1. çá nada
l P r6Prio Fre u mostre meIh
e5 re de
o O
d de 0r
Passagem d o gozo corp oral à sua met áf fin i u co mo caráte r an
onde a or a • a p ossess ão al •
.t t0 evi d en te. Esca pa, d esse m odo , a p do corpo ' é
mu . ergu nr "
, .. Pergu n ta q ue, creio, n ão vale a p en . . ª aquil o do que se
goza, . a ins is tir goza,
nisso • ce n
o. tra-se no go
fem in in . .
ar
zo
É di fíci l deix . de o bserva r a relaçao en tre
- est a posscssão, m
çao qu e Lacan fez do É "
do gozo , e essa desc n d tpo, cm fun etáfora
e m t e rmos d e ser ou ter O falo
ça-0 de uma lógi
acrib u ti va, (en conrrarn- na ca
darame nte em
" Si gni fica ção do falo ) . A pa ssagem à metá fiora
II

. . da po ssessão im
desconh eci m e nto d a marca, da cicatriz e da pe rda ma P üca o
, . ugu ral do gozo
Po rém . por tras deste ser o u te r O falo • se es e
. boça o ralo do gozo
o bJ e � o, se arr1. � u 1 a co m o auto-erotismo
esst
que, como . que organiza, ret;oati­
vamence , os o bJetos parc1a1s . Por t r ás d o falo do i n te rcam
. . • b"10 surge, de
novo o fulo a u c o-eró11co em sua fnttma re lação com O ob,·eto a, 1ugar, por
' . . _
acelênc1a, na co n r u n çao sex u al do partenaire. O tom zombetei ro de Lacan
em ro r n o d a relação enrre "pesso as" , aponta para essa dimensão em que 0
sujeiro es quece que o pa rrenaire é "objeto", aq u ilo com o q ue se satisfaz,
insrrumenro de s u a sarisfação. Assim, q u anto mais o sujeito faz do Ourro
um sujeirn, quanto mais o personaliza, s e p o deria dizer, incl us ive quanto
mais o h u maniza, mais se aliena desse Out ro como marcado pelo s ignifican­
te, e mais se encaminha para a obtu ração da castração do Ourro, mais se
aliena da ve rdade da estrutura , da inexistênc ia do Ou tro s exo. O casal, pois,
reme te ao mico bíblico, 0 da costela de Adão, mas para ambos os sexos . Ali
onde há p rimazia do falo, há p romoção ao lugar do O u tro , dessa p�e que é
o ob.Jeto a; primazi a questionada pelo q ue s e po de deno mm · ar "mico m,,oder-
"- ·
no, o ua sinc ronia dos gozos, próp no, , d "al mas bo ndosas .
, d"trá Lacan e

r 1 fi ca como sua
prod uça- o.
Mas vol temos ao gozo e ao qu e L acan q ua
. p roduça - 0 não
· ção ' p o t s ' a
A 1 déta ' de prod u ção não é eq u ival e nte à d e ena . ente . No nível da
i mpli ca o ex nihilo de algo ext st
' mas a trans for mação por que Laca
n
te · e n m ica é m Pe rg un tar-se
º"ª
in trod uz esta
co ô isto é claro, mas co nv
c urso que cu1
mm · 3 na in tro du -
di fe rença, o q ue exig . e ce rto p er e d do d es envo1vt-·
de ,u n o
ção e des dob ramen ro dos qua tro d i" sc ursos , pa no
lllenco do discu
rso analít ico .
D I A N A 5 . RA B I N O V I C H

O conceito de produção, solidário do conceito de trabalho, i mplica a


transformação de uma matéria prima. Qual é essa matéria prima cm nosso
caso? Se me permitem um pequeno rodeio, queria recordar-lhes que Laca n
equipara o gozo com uma substância, uma ou.ria, a única válida em psican á­
lise, isto é, que não desdenha recorrer a, neste caso Aristóteles, recurso sig­
nificativo. Signi fi cativo, pois Koyré, mestre de Lacan no que se refere à
epistemologia, insistiu - da mesma forma que outros, não é o ún ico - no
obstáculo epistemológico que representou para a filosofia e a ciência grega,
sua dificuldade para pensar em processos gerados a partir do nada. A filiação
do conceito de criação ex nihilo - inseparável do signi ficante -, filiação
j udaico-criscã, produz esse embrião pecu liar que é a ciência ocidental ao
cruzar.. se com a t radição grega : poderia se falar de uma mútua fecundação
dessas duas trJd ições, visível no neo-platonismo do fu:nascimento. Não
obstante, tanto para Placáo como pa ra Aristóteles, uma criação sem matéria
era da ordem do i m pcnscl v d , Jo i m poss ível de con ceber. Portanto, que em
rda1.,"io J.O mais-de-gozar s u rja a d i mensão da matéria que se transforma, é
coerente com o fato de dedarar s u bstância ao gozo . Quando nos movemos
n a dimensão da criação não podemos falar de modificação, de transforma­
ção de matéria.
Po rém, retomemos nosso fio. A matéria prima em j ogo é o corpo,
dado que, por defin ição, o gozo é gozo de um corpo; sem sua sede material,
o corpo, n ão há gozo possível, quer seja perdido ou recuperado. Sobre essa
matéria opera, em primeira instância, o significante p roduzindo a falta,
vale dizer, a perda. Essa falta, essa perda que resumi mos em psicanálise, a
partir de Lacan , como não há relação-proporção sexual; esse furo da Coisa,
i n terdição do gozo materno, do gozo desse Outro primordial, cuja borda,
vimos, passa a formar parte da montagem pulsional enca rregada de produ­
zir a satisfação. Para prod uzi-la i nstalam-se sobre o corpo dispositivos
s ign ificantes que o transformam em meio de produção. Por que não com­
parar esta transformação com o exe mplo clássico de Lacan acerca das rela­
ções do real com o si mból ico, no exemplo da usina que encontr amos no
Semi nário N? Assinala ali que nada menos natural que a energia prod uzi­
da pela usina. Essa energia é produzida pela fórmula mínima que a defi ne
na flsica e que pressu põe um enorme dispositivo s i m bólico apl icado.
chapado, sobre a natu re,.a (o rio, o clima, etc . ) , sobre o real (entendido aqui
u •u C LI
N 1 c, D A. P U
LSA o

cxcerior ao simbó l ico ) .


o O co rpo co
co mº ara n ós, na mesm a rel ça- rno organi
d o • P a o de srn0 b 101
5 1·cua exter ·io rid · 6 gic
· o escá
, à usin a : é , em ps i canáli se u ade que
1 aça 0 . ' m co rp o . a natu reza
ce ar q ue esre organism o _ P as · rn 1 t1co. em
ar tta do pel Não ob•t
ceco rd a li n guage ante, cabe
a1 ode-se con ceder cerca marge m de m_éo , .
un,co ao
qu P . auto nomi .
. a' cuJ. a in
ui tas vezes , nesse cam po li mi te e en ig . trus ão det
,nos, m máti co q ue ecca-
· o m á ti co. Este real é hete ro gên eo ao s ign . . Lacan deno
mi nau
ps•co ss . ifi ca n te e nao _
ara co m o real i n terno ao siste ma sim ból ' . pode ser eq
p do ico , re al que
P0 demas defi
ui-
m sslve I . Pensa uo J p or esse â ngul _
co o i m p o . - o , nao pode esca p ar-
nir
a
.
p roposiçao do An u -éd i p o de D e Ieuz nos a .inge-
n u id de da e e G uanari por
. . . exe mplo,
nde m o real do orga n is m o e s ua en ergé
q ue co nfu uca própri a co m
lsão . a eco no-
mia política da p u
Pod enws, c n t á o , 1 i rC1 r u m a pri meira concl usao - .. a cnaç. ao
. ._ , ex nihilo é
. _
,ond 1ç10 JJ p ro J u , .1 0 . M .1 > . e cs i c é 11 111 11anro ess encial , na- é _
. suJ apan, _ nus
. . _ .io _ _ .
o a cnaça· o
q ue bz ') " ·" 'º d i scu rsos lacania nos , m- o. a pro d uçao. - Re-
. . .
comarr1 este pon 1 0 m .1 _1 s .1 d 1 .1 1 1 1 r . m a !. q ueria, a gora, tirar uma segunda con-
� _
clusão que bz .1 P "' P " ·' est r u t u ra do Jiscurso analltico : a ausência de cria­
ção e J presen,c.1 dJ p ílld u ,·.ío nos mostram muito claramen te po r que Lacan
sempre susten rou que .1 p s i ca n á l ise não é uma sublimação .
Se ,-olearmos a essa s u bstância que é o gozo e tivermos presente que
Lacan sublinha q u e cal s u b s tância dever ser entendida aris cotélicamence,
deduzirem os q u e ela não pode ser atribuída ou predicada de n enhum sujei­
to. Isto é, que não é um a t r i b u to , que resiste a se i ncluir em um:. lógica do
ser e do ter, a pesar de q u e ela é , o sabemos, aristotéli ca. Es ce é um p
onto

. · menros de Laca n em to rno do


que nos permi te pensar q u e o s d esenvo 1 vi
gozo segue m m u i to d e p e r c o seu d esenvo 1 v 1men · to de uma lógica da .
.
· {' . ·
unva c nvin ha ao deseJO , CUJ O
quan un cação da sexuação . Se a I óg1ca am·b o
. ça_ o ,
. . da qu ann fica
sign ificado é o falo O goro exi ge por o u tro 1 d 0, essa ló g ica ª
ul ciplic idad e possfveI de
e é a parti r dela q ue Lacan pod rar a m
' erá exp 1 o
'
recu perações de
gozo . assinala
.
o so b re
0 fun casma,
D este m odo, quan d o l.acan , n o semi' nán fuz mai s que

) u com u m (-) •
o
- .•ne
·
q Ue nao se pode q ual ificar o goro co m um ( + o . li car à ,,
cara cce za . Podemos ap • uma
enfat11..ar es ·
ta dimensão subscan ci al q ue O n.
e , porq ue es re <
. p recisam ent n�
'tgn•ficanre os ( +) e os (-) , mas não a o gozo , ) o ntabilizá-la, n:spa
, m d a. C
111L .
'JIQnua , é maci'r ia. O que pod e mos [:17.cr
co
D I A N A S . RA B I N O V J C H

Lacan. Aqui, um esclarecimento: a perda d e goro, a instalação d o furo po r ação


do significante, seu recorte do corpo, a negativiz.ação, não se aplicam às recupe­
rações de gozo, a elas, tão somente, podemos contá-las, registrar sua distribui­
ção. Assim, em Mais, Ainda, vemos esboçar-se um gozo, o de mulher barrada,
que se distribui em um espaço topológico, o da compacidade, e cuja con tabili­
dade é a enumeração, a da lista, a do Don Juan mozartiano. Por esta razão a
libra de carne de O mercador de Ventza não é uma metáfora: aponta para 0
pagamento necessário que exige a substância gozante .
Da mesma fo rma q u e a maioria das substâncias, a libra de carne
não abunda, é escassa , e é o signi ficante que determ ina s ua p rópria es­
cassez e a necessidade de sua produção. É escassa pois exige tam bém
avançar para a l é m do p r i n c í p i o do pra,.er, nessa d i reção anti-biológica
que Freud batizou pulsão Jc m o r t e . Nesse sentido, a distribuição do
gozo c o n d i c i o n a as p d c i cas do p razer, mas en fa tizemos, não está a ser­
viço do p razer.
Os meios de produção do gozo , d issemos até o momento, são mon­
cagens pulsionais . Não obstante, no seminário dedicado aos quatro discur­
sos, vemos deli near-se uma nova di mensão do gozo relacionada com os
meios de produção. Efetivamente, Lacan retoma o saber inconsciente, o
S,, que havia instalado no nível do (A) do piso inferior do grafo, para situar
nele um crabalho, trabalho que é necessário para a produção do mais-de­
goz.a.r. Qt aJifica, inclusive, o inconsciente, ironicamente, como o trabalha­
dor ideal. Este trabalho p roduz mais-de-gozar - aqui fundamentalmente
sob a fo rma do objeto a -, mais-de-gozar, ·produto que na estrutura de
lugares do discurso encontra-se em disj unção com a verdade. Recordemos
os lugares nos quatro discursos:
A dupla barra en tre verdade e produção indica precisamente sua
disjunção . Para além dos significantes que se situam nesses lugares, qual­
quer que sejam eles, por estarem situados ali, ficarão em disjunção. Essa
disjunção é caracterizada por Lacan em Radiofonia "como o passo de real
que sustenta de modo unívoco nos quatro discursos, tanto em seu progres­
'° com em sua regressão" (refere-se aqui à rotação dos significantes em
sc:ntid.o progrc11ivo ou regressivo, não a um progresso ou um regresso pcn­
oadot linearmente), e o car�ter "operatório" de cal passo de real t "uma
pe a sincro nia en
. . '?º que rom. tre term
"'"s/ uJI [a disiun çao - ] ". os semp r
e di 6eren t .
se r "-·
na r es, Justame
nte
PA"

r· No discurso anallt1co o l u.,,,.


.

o- da verdade
escrutu ra, S ,. e o S o d p é oc up
!'. � rod ução . O im ado pelo
saber
po
o em d 1si unçao e , p o nan to - rtan te para guardar da
.,.. bos estã
.... ' • n ao p o d e . é que
. ifican te . Nesse senti d o , a p ro du,.;; a n1 cula r-se
s1gn . 0 de S ,_ a cadeia .
1 ,az u m CO nttapo nt
pro dução do dis curso do m.-
lar com a estre q ue é o .
ob/eto a . Entr
o particu-
discursos vemos co mo agente e pro du ,.. .
rõ o lnt c ambos os
ercamb iam 1 u
e. por ourro lado, verda d e e utro garcs po r um
lado o .
Esse saber que ocupa o l ugar da verdade é e 1
e que m p roduz as
cias do S do mes1re . o o bj eto a . Esse sab er in . te .
1nstân-
, . . co nscien situado no 1ugar
do out ro, e esse t raba l hador ideal , uab alh ador que pro duz mai .
s- de-gozar a'
mas não ve rdadt. R.-co rd.-mos que Lican equ ipa rará · de cena pers-
. . ' a pamr
.
o d1s curso do m.-s1 r.- com o incon sciente ,/ precisam
··
r......-uva, ente porque
. _ . ..
nele se prod ul J ,01K� 1.-11.1ç:w s1gn d 1can1.- S _
, s,.
Porém , e o 1 n,onsci en t .- qu.- produz mais-de- gozar em seu próprio
discurso. ma1s-d.--gm.1 r q u e . j.l o d isse, funda-se, simultaneamente, em Freud
e em :\farx. 1'.fais-dc-go,.i r q u e é Lustgtwinn em Freud, e que estabelece o
valor de gozo e sua contabil idade como aquilo que subjaz à econo mia do
saoo inconsciente, q ue oferece o mecanismo mesmo do mercado como
mercado da verdade . A estrutura exige um gasto, um dispêndio de goro.
Aqui a disj unção dos dois lugares inferiores adquire toda a sua im­
portância, pois ela recai sobre a verdade e a produção. Esta disjunção �co­
va-
ma o vel alie nan te sob a fo rma de verdade e mais-de-gozar, lugar respeca
" .. " pens " A pr o dução é,
mente de um eu não sou e d e um eu nao - o ·
· • 1 ; ) é essa operaça
preasamen re, a máq u i. n a nao pens ante; o pensar sem eu V t
o

- É a verdade como 1 u-
straçao .
verdadc que cul m i nava , recorde m- no, na ca esse é 0
o ' mas - e
gar q ue rege o discurso e que dá o senn. do dO rra balh a de ' onde
nte, a ver d
po n ro - o trabalho não pro d uz verd ad e. Prec is ame a var
. . - ra
. . du
re
. men ro de g z , um
q uer que se prod uz.a , determ ina um esvaz ia as
o o
·ªnr ro duz , m
ça• o , 1 .
de gozo. Assi m, a verdade opera no se nt i· dO da casrra vazt •·
ela é cs
-� ucm a ap azigua. Apazigu a-a na me 1
d·� �� s �e do prazer,
. d o rin dp io
ma i s -alé "'. � contti·
�n ro de gmo e des se mo do , li mite ao oza r, pelo
. praze r. O ma is- de g
�"'1. ern ce rro sentido, do p r6pr10
'
11() , anul a a
verdade, a torn a i rrisór ia.
D I AN A S. RA B I N O V I C H

acan enfatiza esta o p osi ção en tre 80Zo


Em "O sabe r do psicanal ista'' L
n va den o m i nação pa r a o s l uga res própri os
e ve rdade . Int ro duz al i µma . .
o

i ção que aqui n o s


inte re ssa. E nco nt rarnos
dos d iscu rsos que acent ua a o p o s
o segu i nte m o do :
os lugares defin ido s d

I gozo
Lugar do Agente I Sembla nie _.,. Lugar do outro

/
/ Lugar da pro d ução I mais-de-gozar
Lugar da Verdade

ico que não experimen ta


Observemo s que O lugar da verdade é o ún
em disjunç ão, no lugar da produ ção que
m odifi ca ções . Encont ra-se agora
sendo tal, com o mais-de-g m.ar. Isto i m plica que em qual quer
co ntinua
dos quatro discursos a produção é o mais-de-gm.ar, quer se trace do o bjeto
a, do S , . do S, ou do $. Po rtamo. o ma is-de-gozar co m o recuperação atra­
vés da produç-:io , não é aqui p,urimônio exclusivo do objeto a. Deve-se ter
presente este retorno n;i esc r i t a dos lugares nos discurs o s , na medida cm
que indica a gene,aliza\':iO do nuis-dc-go1.a r, que assinala o objeto como
sendo um dos pontos em q ue o gow pode ser recuperado, mas não o úni­
co. Vale dizer, que em wdos os discursos há produção de mais-de-gozar
sob as espécies de cada um do s quatro significa n tes que os compõe.
Esse reco m o contém, portanto, a diferenciação de g oz o s. Mantém,
não obscance, a relação entre o mais-de-gozar e a produçã o e a distinção do
mais-de-gozar co m a verdade. A produção i m plica, s i m ul taneamente, um
trabalho e, como cedo trabalho uma entro pia, u m a perda. A verdade não é
o trabalh o , mas ao contrário lhe dá seu sentido, não sua significação
. A
significação se coloca do lad o da pro duçã o , nã o da verdade.
Temos, pois, que o saber inco nsciente trabalha, j á dissem os que Lacan
o q uali fica de trabalhad or ideal, e,
ao trabalhar, inclui-se entre o s mei os de
p ro dução de goro. Aqui podem verificar a especificida
de do go ro do blá­
blá, do goro da al!ngua em uma só palavra
, que faz do própri o s igni fican te
aparara de goro, mas aparato de gozo
que nã o é equivalente às m o ntagens
puls1 o nais. Esta dime nsa· o do goro
. e sua recuperação n o s m · tro d uz em um
funcio name nto dos sign 1' fiica nce
s no 1· 11co nsc1. ente funci. o name nto no qua1
a repetição tem uma fun ça- o crucia ·
· l . ..,.. ' o rre r o s mesm os ca m 1 •
, o rnar a perc
nhos, as mesmas sendas no
. n! ve 1 das •el'3CI. 1 ltaç
. o cs. .
. o nscicnccs. nl o '"'
• . mc
.A
e.orn o se disse , reme te à ho . . . ( ·o
mcostase do narc1S 1smo, ao freio que o p n· n c P 1
U M A C L I N I C A DA P U L S Ã O

do prazer coloca ao seu mais-além, como pode ser, também, a sede de um


gozo em que a repetição, como irrupção do gozo da marca, infiltra os pró­
prios processos inconscientes, infiltração que faz da metonímia e da metá­
fora, processos de con tabilidade do gozo, transfer ência a metonímia e
condensação a metáfora. As formulações de Radiofonia conservam aqui
toda a sua importância.
É, pois, no próprio ponto de perda onde devemos buscar a recupera­
ção, nesse ponto de entropia do trabalho do saber se condensa e se transfere
um mais-de-gozar que se apresenta como o desejo mesmo dessas sendas do
automaton. A distinçáo taxativa, então, entre o automaton e a tyché em
termos de gozo, é posta em questão. I rrompe no nível do saber inconscien­
te uma recuperação de gozo acerca da qual podemos nos perguntar se não
se apóia ali a diferença entre o que Freud denominou cargas ligadas ou não
ligadas no inconsciente . A dimensão do mais-além, do não ligado, não é
por acaso essa dimensão onde a produção de gozo opera, onde o trauma se
faz presente no interior mesmo da estrutura, tornando impossível sua tem­
perança pelo principio do prazer, vale dizer sua ligadura?
Esra pergun ra, que procuraremos resolver no próximo ano, nos leva­
rá a percorrer o caráter na obra de Freud, e em outros autores, a partir da
perspecriva que ela abre. O gozo que infiltra o caráter, o caráter como
marca arriculada com o gozo , indica o caminho pelo qual Lacan , na última
etapa de seu ensino , reordena os modos de satisfação tal como o expusemos
nesse conjunto de aulas e nos propõe novas interrogações e novas respostas
que, quiçá, permitam dar conta dessas irrupções de gozo que são as impulsões
e as caracteropatias.
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