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SEÇÃO I

Princípios gerais da
entrevista efetiva
1 A entrevista inicial:
panorama

As quatro tarefas
– Construir uma aliança terapêutica
– Obter a base de dados psiquiátricos
– Entrevistar o paciente para elaborar o diagnóstico
– Negociar um plano de tratamento com o paciente
As três fases
– Fase de abertura
– Corpo da entrevista
– Fase de fechamento

AS QUATRO TAREFAS DA ENTREVISTA DIAGNÓSTICA

A entrevista diagnóstica, na verdade, tem como meta final o tratamento,


não o diagnóstico. É importante manter esse objetivo em mente durante
a entrevista, ou o paciente poderá não retornar para uma segunda con-
sulta, e seu diagnóstico, rigorosamente elaborado segundo os ditames
do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, quarta edição
(texto revisado) (DSM-IV-TR), vai acabar esquecido em um prontuário
fechado, dentro de um arquivo.
Estudos mostram que até 50% dos pacientes abandonam o trata-
mento antes da quarta sessão, e muitos não retornam depois da primei-
ra (Baekeland e Lundwall, 1975). Os motivos para o abandono são mui-
tos. Alguns pacientes não retornam porque não formaram boas alianças
com seus clínicos, outros porque não estavam, de fato, interessados em
se tratar, outros, ainda, porque as entrevistas iniciais foram suficientes
para levantar seu moral o bastante para que eles superassem seus estres-
sores (Pekarik, 1993). Disso se conclui que, muito mais do que o diagnós-
tico, durante a entrevista inicial também são vitais: a construção da alian-
ça, o reforço do moral e a negociação do tratamento.
As quatro tarefas da entrevista inicial se fundem umas às outras.
Você estabelece a aliança terapêutica enquanto escuta seu paciente. O
próprio ato de fazer perguntas promove a aliança, pois tendemos a gos-
tar de pessoas que expressam curiosidade a nosso respeito. Enquanto
faz perguntas, você formula possíveis diagnósticos, e refletir sobre as
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opções consideradas conduz, naturalmente, ao processo de negociar um


plano de tratamento.

Construir uma aliança terapêutica

A aliança terapêutica forma os alicerces de qualquer tratamento psicoló-


gico. O Capítulo 3, A aliança terapêutica, enfoca diretamente a aliança,
e os Capítulos 4 a 10 fornecem várias dicas para melhorar o rapport com
seus pacientes.

Obter a base de dados psiquiátricos

Também conhecida como história psiquiátrica, a base de dados psiquiá-


tricos inclui informações pregressas relevantes para a apresentação clí-
nica atual. Esses tópicos são abordados na Seção II, A história psiquiátri-
ca, e incluem o histórico da doença atual (HDA), a história psiquiátrica,
a história médica, a história psiquiátrica familiar e aspectos da história
social e de desenvolvimento. Compilar essas informações é a essência da
entrevista e, ao longo dessa etapa, você terá de se esforçar para cons-
truir e manter a aliança. Também terá de fazer incursões freqüentes à
tarefa seguinte, entrevistar para o diagnóstico.

Entrevistar o paciente para elaborar o diagnóstico

A habilidade de entrevistar a fim de elaborar um diagnóstico – sem pare-


cer que está lendo uma lista de sintomas e sem se deixar distrair por infor-
mações menos relevantes – é uma das mais importantes para o clínico, e
você terá de aperfeiçoá-la e desenvolvê-la durante toda a sua vida profissio-
nal. A Seção III, Entrevista para elaboração de diagnóstico, é dedicada a
essa habilidade e contém capítulos sobre a arte da testagem de hipóteses
diagnósticas (Capítulo 18) e diversos capítulos sobre transtornos especí-
ficos, que enfocam como usar perguntas para identificar e explorar os
principais transtornos do DSM-IV-TR (Capítulos 20 a 29).

Negociar um plano de tratamento e comunicá-lo ao paciente

Os cursos de graduação e as residências quase nunca ensinam como


negociar e comunicar um plano de tratamento, mas essa talvez seja a
coisa mais importante que você pode fazer para garantir que o paciente
vá aderir ao tratamento recomendado. Se ele não compreender sua for-
mulação, não concordar com seus conselhos e não se sentir confortável
para lhe dizer isso, a entrevista terá sido inútil. Veja a Seção IV, Entrevis-
Entrevista psiquiátrica 25

ta para tratamento, para dicas sobre a arte da educação dos pacientes e


da negociação no contexto da clínica.

AS TRÊS FASES DA ENTREVISTA DIAGNÓSTICA

A entrevista diagnóstica, como a maioria das tarefas da vida, tem come-


ço, meio e fim. Embora isso possa parecer óbvio, os entrevistadores no-
vatos muitas vezes perdem essa idéia de vista e esquecem de estruturar
ativamente a entrevista e de controlar seu ritmo. O resultado, em geral,
é um final dominado pelo pânico, no qual 50 perguntas são espremidas
nos últimos cinco minutos.
É verdade que há uma enorme quantidade de informações a serem
obtidas durante a primeira entrevista, e o tempo pode parecer um inimi-
go. Excelentes entrevistadores, no entanto, raramente se sentem pressio-
nados. Eles têm a capacidade de obter grandes quantidades de informa-
ção em um período breve, sem dar ao paciente a sensação de estar sendo
conduzido de forma apressada ou encaixado em uma estrutura prees-
tabelecida. Um dos segredos de um bom entrevistador é a capacidade de
estruturar de maneira ativa a entrevista em suas três fases.

Fase de abertura (de 5 a 10 minutos)

A fase de abertura inclui conhecer o paciente, ficar sabendo um pouco a


respeito de sua situação de vida e, então, calar-se e lhe dar alguns minu-
tos para que possa contar, sem interrupções, por que veio procurá-lo.
Isso será discutido em mais detalhes no Capítulo 3, pois a fase de abertu-
ra é um período crucial para a construção da aliança: o paciente está
tomando uma decisão inicial quanto a sua confiabilidade. Essa fase se
baseia em uma cuidadosa preparação pré-entrevista, abordada no Capí-
tulo 2, Preparações logísticas: o que fazer antes da entrevista. A atenção
à logística garante que você esteja completamente atento à relação com
seu paciente durante os primeiros cinco minutos.

Corpo da entrevista (de 30 a 40 minutos)

Ao longo da fase de abertura, você vai elaborar algumas hipóteses


diagnósticas iniciais (Capítulo 18) e se decidir quanto a algumas priori-
dades a serem exploradas durante o corpo da entrevista. Por exemplo,
você pode decidir que depressão, ansiedade e abuso de substâncias são
problemas prováveis para determinado paciente. Vai delinear uma es-
tratégia de entrevista para explorar esses tópicos, que irá incluir pergun-
tas sobre a história da doença atual (Capítulo 13), história de depressão,
ideação suicida e abuso de substâncias (Capítulos 20, 21 e 24), história
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familiar desses transtornos (Capítulo 16) e uma avaliação detalhada para


verificar se o paciente, de fato, satisfaz os critérios do DSM-IV-TR (Capí-
tulos 20, 21 e 24) para cada transtorno. Depois de completar essas tare-
fas prioritárias, poderá passar para outros tópicos, como a coleta da his-
tória social/evolutiva (Capítulo 17), a história médica (Capítulo 15) e a
revisão psiquiátrica de sintomas (Seção III).

Fase de fechamento (de 5 a 10 minutos)

Mesmo que você possa se sentir tentado a continuar fazendo perguntas


diagnósticas até o final da consulta, é essencial reservar pelo menos cin-
co minutos para a fase de fechamento da entrevista, a qual deve incluir
dois componentes: (a) uma discussão da sua avaliação, usando as técni-
cas de educação de pacientes descritas no Capítulo 30, e (b) um esforço
para chegar a um acordo negociado sobre planos de tratamento ou se-
guimento (Capítulo 31). É claro que, no início de sua carreira, vai ser
difícil produzir uma avaliação coerente imediata, sem o apoio de horas
de supervisão e leitura pós-entrevista. Essa habilidade vai melhorar muito
com a prática.

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