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Terapia Analítico Comportamental – O Primeiro Encontro com o


Cliente
Por Esequias Caetano de Almeida Neto Ter, 06/11/2012, Às 10h35 PM  5.9k Views  5

O primeiro encontro com o cliente é o sonho de muitos estudantes de Psicologia,


e, ao mesmo tempo, o terror de vários outros. Inseguros sobre como conduzir a
sessão, estagiários e recém formados sofrem com os respondentes eliciados pela
proximidade da ocasião e com os pensamentos que surgem nesse momento:
Saberei o que perguntar? E se ele falar alguma coisa muito complicada, como
responder? Terei assunto para ficar com ele durante 50 minutos?

Com razão, pois, até então, novo clínico não foi exposto adequadamente à
contingência “primeira sessão” para que pudesse desenvolver repertório de
autoconfiança, e, além disso, não possui qualquer informação sobre o cliente ou
5
aquilo que ele trará como queixa. É natural que fique ansioso e inseguro.
Neste artigo falarei um pouco sobre o primeiro encontro entre terapeuta e cliente,
oferecendo dicas simples para aqueles que estão dando seus primeiros passos
em Psicologia Clínica. Vale ressaltar que estas dicas são bastante gerais e podem
ou não se aplicar conforme cada caso, porém, espero que funcionem como ponto
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de partida para a exposição à contingência e a ampliação do repertório do jovem


terapeuta.
A AUDIÊNCIA NÃO PUNITIVA


“Ninguém acorda de um dia para outro disposto a investir
tempo, dinheiro e dedicação em um tratamento
psicoterápico simplesmente porque não tem outra coisa
melhor a fazer; é preciso que alguma coisa justifique essa
motivação” (Marmo, 2012)

Ao se preparar para a primeira sessão, é importante lembrar que o cliente está ali
porque enfrenta um problema para o qual não encontrou saída, por mais que
tenha tentado. Certamente está fragilizado, exposto a uma série de contingências
aversivas e/ou pouco reforçadoras que, ao longo de sua história, culminaram
naquilo que o levou a buscar ajuda. Além disso, sua situação é tão ou mais
delicada que a do terapeuta: está em frente a um desconhecido, sobre o qual
deposita suas (talvez últimas) esperanças de melhora e possivelmente terá que
falar sobre alguns dos aspectos mais difíceis de sua vida. O que fazer, então?
De acordo com Santos, Santos e Machezini-Cunha (2012), uma conduta
recomendada para a situação é o exercício da Audiência não Punitiva, que por si
só, já é capaz de trazer uma série de benefícios ao cliente. Conforme explicam os
autores, ela promove redução do nível de ansiedade, produção de
autoconhecimento, sentimento de valorização, aumento da esperança de melhora,
entre outras coisas. Praticá-la implica em expressar empatia e acolhimento, sem
qualquer crítica ou julgamento ao comportamento do cliente (Marmo, 2012), que
por mais estranho ou assustador que seja, representa sua melhor adaptação às
contingências até o momento (Conte e Brandão, 2012).
O5 PRIMEIRO CONTATO: ENTREVISTA CLÍNICA INICIAL

Via de regra, os primeiros encontros tem função de acolhimento, coleta de


informações e preparação do ambiente terapêutico para que o cliente tenha
interesse em retornar à terapia (Marmo, 2012). Não é necessário e nem

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recomendável realizar intervenções ou orientações no início do processo, e se for


fazê-lo, é importante ter muita cautela. Na maioria das vezes, o clínico limita-se a
fazer perguntas e dar sinais de que está prestando atenção e compreendendo o
que é dito (Santos, Santos e Machezini-Cunha, 2012). Ele pode lançar mão de
movimentos com a cabeça, paráfrases, leves mudanças de postura na poltrona e
outros gestos com a mesma função.

Silvares e Gongora (1998) chamam este primeiro contato com o cliente de


Entrevista Clínica Inicial (E.C.I.). As autoras apresentam uma estrutura mais ou
menos consensual sobre como ela deve ser conduzida, dividindo-a em três fases.
Ressaltam que esta estrutura não deve ser levada ao pé da letra e deve ser vista
apenas como uma sugestão para as primeiras sessões, a qual cabe ao clínico
julgar se é ou não pertinente aplicá-la em cada caso.
Cada uma das fases apresentadas por Silvares e Gongora (1998) são
apresentadas e discutidas abaixo, onde alio a proposta das autoras à minha
experiência e discussões sobre o assunto que tive em outros contextos
acadêmicos.

1) Introdução
O clínico cumprimenta o cliente e o acompanha até a sala de atendimento,
dizendo seu nome e função. Caso o cliente comece a falar sobre seu problema na
sala de espera ou nos corredores, convém pedir educadamente que aguarde até
adentrarem o local adequado, explicando que outras pessoas podem ouvi-lo e
quais são as possíveis consequências dessa exposição. Se o cliente estiver muito
ansioso, o clínico pode utilizar procedimentos específicos para ajudá-lo a se sentir
melhor, como por exemplo, pedir que respire calma e lentamente, prestando
atenção na entrada e saída do ar dos pulmões.
É importante que o terapeuta já esteja com a sala preparada para receber o
cliente. Todo e qualquer instrumento (prancheta, gravador, etc.) que o terapeuta vá
usar, deve estar pronto antes de o cliente entrar.
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2) Desenvolvimento
Esta é a principal e mais extensa etapa da sessão. Através de perguntas,
observações ou outros métodos, o terapeuta levanta dados que permitam uma
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análise geral e preliminar do problema do cliente. Essas perguntas devem partir


do geral para o particular, afunilando as informações. Normalmente um simples “o
que te trouxe à terapia?” é o bastante para que o cliente comece a falar.
A partir das primeiras informações
obtidas, o terapeuta tem condições de
formular novas perguntas mais
específicas e direcionadas, buscando
compreender melhor o que já foi
exposto. Alguns dados relevantes a
serem investigados são: Desde que
momento o cliente percebe o problema?
Como estava sua vida naquela época?
Em que situações o problema acontece, atualmente? O que acontece logo após
sua ocorrência? O que as outras pessoas dizem a respeito? Com que frequência
ele acontece?
Nesta fase, o terapeuta deve, principalmente, demonstrar atenção e interesse pelo
que o cliente está dizendo e estimulá-lo a falar mais. Se o relato estiver
acompanhado de respondentes como choro, tremores intensos, grandes
alterações na respiração, entre outros, a coleta de informações passa para o
segundo plano e o acolhimento assume importância central na sessão. Acolher
implica em silenciar quando o cliente não conseguir falar, oferecer um lenço
quando ele estiver chorando, validar seu sofrimento através de frases como
“percebo o quanto é difícil falar sobre isso…”, “parece ter sido muito difícil para
você…”, ou adotar outras atitudes com função semelhante. Caso algum tema seja
aversivo em excesso, o terapeuta pode abordar temas secundários até que o
cliente seja capaz de falar sobre o tema principal.
Novos temas devem ser abordados seguindo a mesma sequência dos anteriores,
partindo do geral para o particular. As informações devem ser coletadas e
organizadas de forma que possibilitem a realização de análises funcionais
preliminares 5e a compreensão geral do caso, que deverá ser complementada ao
longo das demais sessões. Em outro post devo abordar o assunto com mais
calma e apresentar um roteiro didático para a realização de análises funcionais.
Algumas pessoas não respondem bem a perguntas abertas, e nestes casos, o
terapeuta pode questionar de forma mais específica e direcionada, pedindo

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descrições passo-a-passo das situações relatadas pelo cliente. Uma boa forma de
fazê-lo é pedindo um exemplo concreto de uma situação em que o problema
apareceu. Através do exemplo, o terapeuta pode investigar a ordem em que os
eventos ocorrem, a forma como o cliente responde e se sente diante deles, o que
as outras pessoas dizem sobre a respeito, entre outras coisas, ajudando o cliente
a organizar as informações por meio de perguntas bastante específicas: O que
aconteceu primeiro? Quando você fez isso, de que forma ele reagiu? Como você
interpretou essa reação? Como se sentiu diante dela? Outras pessoas reagem de
forma semelhante diante de você?
Clientes com dificuldades para descrever contingências requerem um cuidado
especial do terapeuta. Clínicos inexperientes podem se irritar com a situação,
apresentarem as perguntas de forma agressiva ou invasiva ou realizarem análises
precipitadas e pouco amparadas por dados.

3) Encerramento
A medida que a sessão se aproxima do fim, o terapeuta deve evitar abordar novos
temas ou retomar temas que gerem algum grau de perturbação emocional. É
importante verificar também se o cliente está com alguma dúvida importante sobre
o que foi conversado em sessão e apresentar uma síntese do que ele falou,
expressando, quando houver, confiança em bons resultados. Esse feedback é
importante por que contribui para que o cliente sinta-se mais seguro e
compreendido, aumentando as chances de retornar para a sessão seguinte.
Costumo pedir um feedback ao cliente também, perguntando o que achou da
sessão e se algum ponto em especial chamou sua atenção.
Caso o terapeuta sinta que não será capaz de atender adequadamente aquele
cliente, deve encaminhá-lo a alguém que seja. O cliente deve ser informado que o
profissional para o qual está sendo encaminhado possui melhores condições de
ajudá-lo.
Os últimos minutos da sessão podem ser dedicados a explicar ao cliente o
funcionamento
5 geral da clínica, formas de pagamento, procedimentos para
remarcação de sessões, política sobre faltas não comunicadas, entre outras
coisas. É importante também que o terapeuta fale sobre a natureza de um
processo terapêutico que, muitas vezes, precisa tocar em assuntos “doloridos”,
mas que isso é necessário, da mesma forma que o médico precisa tocar na ferida

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para tratá-la. A depender do nível de ansiedade no começo da sessão, estas


informações podem ser dadas ainda no início, e se for possível, é mais
adequado.
Referências
Conte, G. C. S.; Brandão, M. Z. S. (2012). Eventos a que o clínico analítico-comportamental deve
atentar nos encontros iniciais: das vestimentas aos relatos e comportamentos clinicamente relevantes.
In.: Borges, N. B.: Cassas, F, A. Clínica Analítico Comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto
Alegre: Artmed.
Marmo, A. (2012). A que eventos o clínico analítico-comportamental deve estar atento nos encontros
iniciais?. In.: Borges, N. B.: Cassas, F, A. Clínica Analítico Comportamental: aspectos teóricos e
práticos. Porto Alegre: Artmed.
Santos, G. M.; Santos, M. R.; Marchezini-Cunha, V. (2012). A escuta cautelosa nos encontros iniciais:
a importância do clínico analítico-comportamental ficar sob controle das nuances do comportamento
verbal. In.: Borges, N. B.: Cassas, F, A. Clínica Analítico Comportamental: aspectos teóricos e
práticos. Porto Alegre: Artmed.
Silvares, E. F. M; Gongora, M. A. N. (1998). Psicologia Clínica Comportamental: a inserção da
entrevista com adultos e crianças. São Paulo: Edicon.

4.5
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Escrito por Esequias Caetano de Almeida Neto


Terapeuta Comportamental, com especialização em Clínica Comportamental pelo Instituto de Terapia por
Contingências de Reforçamento (Campinas, SP), com Treinamento Intensivo em Terapia Comportamental
Dialética pelo Behavioral Tech | A Linehan Institute Training Company (Seattle, Washington/ EUA) e
Formação em Terapia de Aceitação E Compromisso e Terapia Analítica Funcional pelo Instituto Continuum
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(Londrina, PR). É sócio da Ello: Núcleo de Psicologia e Ciências do Comportamento, onde atende a adultos
individualmente, em terapia de casais e terapia de família, além de prover Supervisão Clínica e Treinamento
para Terapeutas Comportamentais. É fundador e diretor geral do Portal Comporte-se: Psicologia e Análise do
Comportamento (www.comportese.com), onde também coordena a equipe de colunistas de Terapia
Comportamental Dialética. Coorganizou os livros Terapia Analítico Comportamental: dos pressupostos
teóricos às possibilidades de aplicação (Ed. Esetec, 2012) e Depressão: Psicopatologia e Terapia Analítico
Comportamental (Ed. Juruá, 2015). Atua como consultor de Comportamento e Cultura para a Rádio Clube

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29/08/22, 07:29 Terapia Analítico Comportamental – O Primeiro Encontro com o Cliente - Portal Comporte-se

(AM 770) de Patos de Minas e escreve sobre Psicologia e Saúde Mental para o jornal Clube Notícia
(https://www.clubenoticia.com.br). É sócio afiliado da Associação Brasileira de Análise do Comportamento
(ACBr) e, entre os anos de 2015 e 2017, foi membro da Comissão de Comunicação da Associação Brasileira
de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC).


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