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A opção por este tema explico-a por duas motivações: uma que
da Descoberta e Conquista.
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Fernando Pessoa: “Ó mar salgado, quanto do teu sal / são lágrimas de
Portugal!”.
Tão grande foi a voga desses escritos e tantos foram eles, que
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de relatos revela-se fundamental não apenas para o conhecimento das
se integravam.
literatura, focando-a,
O estilo
muitos dos quais não possuíam capacidades para dar brilho à sua prosa,
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tempo depois), adquirem, talvez por isso mesmo, um tom de verdade e de
estranha que os hostilizava. Daí que talvez não seja exagero o que nos
la tragedia historica, la más real de todas por haber sido vivida; talvez,
como primores da nossa língua, pois, como alguns dos seus autores
factos, sendo secundária a perfeição literária, tanto mais que muitos dos
intelectuais.
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poder comunicativo, por representarem a própria experiência, embora
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incumprimento desta determinação, pela incapacidade de relatar
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Autênticos “best-sellers”, desconhece-se, em geral, qual seria a
tiragem dessas “relações”, mas sabe-se que muitas delas eram impressas
exemplares.
O Documento Histórico
da História Trágico-Marítima.
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segunda metade do séc. XVI, de quando se datam o declínio do trato das
ascensão.
papel nuclear e activo nos negócios das nações, para isso necessitou
refugiar.
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A rota do Cabo, aberta em 1497-1498 por Vasco da Gama e
afirmar que uma viagem na Carreira da Índia era então “sem qualquer
declínio ?
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A Carreira da Índia exigia sobretudo acomodação perfeita ao
indostânica.
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ser possível à armada aproveitar a monção do norte e dirigir-se
em finais de Fevereiro,
seria possível
aproveitar ventos
favoráveis no Atlântico
em Julho ou Agosto,
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Apesar da atracção exercida pelas hipóteses, mais ou menos reais,
que estes pouco mais água tivessem visto que a do Tejo, como afirma
Boxer citando o Padre António Vieira, dado que a grande maioria não
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dos armadores particulares era mais frequente encontrar-se um capitão
viagem. Ao piloto exigia-se uma observação atenta ao voo das aves que
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útil para ultrapassar o desconhecimento e as dificuldades de navegação
na região. Por outro lado, à partida de Lisboa não era também caso raro
diversos estratos sociais: nobres que partiam para o Oriente para ocupar
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missionários, gente do terceiro Estado em busca de melhores condições
fumados.
para encher as unhas, e dão provimento para três semanas: eis que na
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As más condições de higiene e o mau acondicionamento dos
calmaria a que a nau esteve sujeita “se danno la mayor parte de las cosas
el agua se corrompia; las pasas, los higos e outras muchas cosas, com
grande calma, se deñaram”. Beber urina, água do mar, comer couro, ratos
frequentes.
água doce que pudesse ser usada para a lavagem de roupas ou do corpo
coberto de piolhos.
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atingia tais proporções que se tornava difícil encontrar quem
Uma das mais graves doenças que atingia muitos dos embarcados
seus efeitos:
“ [...]
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afirmou Belchior Barreto, em 1551, “quase todos se pelejam ora huns ora
esses naufrágios?
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falhar as manobras de entrada na barra de um determinado porto
de escala ou de destino.
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é apontada por todos os autores como causa suprema dos desastres
marítimos.
Holandeses em 1602.
cobiça; e por isso não é maravilha que percais tantas naus e tantas
vidas”.
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fardaria em barda, que subia no convés até à altura dos castelos,
estava tão podre que, quando deu à costa, Nuno Velho Pereira a
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desconhecimento sobre o seu destino, testemunhado pela
documentais
consultadas. Este é o
desapareceram em
determinada fase da
tenham restado
quaisquer testemunhas
ou sobreviventes
expressão do tempo.
naufrágios podiam ser motivados, não por uma causa eficaz isolada,
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ataque pirata. Em algumas situações não é muito correcto
desfavoráveis.
maior intensidade.
O documento humano
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Referidas as causas das tragédias, vejamos seguidamente, qual o
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noite disputavam-se às cutiladas os lugares, ferindo e matando sem
piedade.
precipitavam-se
desordenadamente sobre os
aos religiosos, com muitas lágrimas e gemidos, com tão pouco tino e
ordem que todos se queriam confessar juntamente e em voz tão alta que
culpas em voz alta, tão graves e enormes, que foi necessário ir-lhe o
de condição que não estivesse nas boas graças dos chefes. Por isso se
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compreende aquele episódio da ama que não quis largar a filha de D.
pobre mulher que, não podendo ser salva, quer levar para o fundo do mar
procedimento:
oficiais tão pejado, por ir muito carregado, com todo o grosso debaixo
mar seis pessoas que foram tomadas nos ares, lançadas nele, onde
vendo o pobre homem que não tinha nenhum remédio, pediu uma talhada
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corriam risco com o peso excessivo começaram a lançar a carga humana,
até que o batel desafogado pudesse tomar o rumo. Alguns, que sabiam
sacrifício.
Sucedia muitas vezes que a nau dava à costa. Então todos ou quase
guia. Porém, grande parte dos guias disponíveis apenas os sabia conduzir
nas redondezas da sua aldeia, pois, como nos diz o narrador da relação
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os caminhantes, “como a gente daquela terra não se afaste muito dos
confiança posta nestes ex-náufragos era bem maior que a que suscitam
qualquer cafre.
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muitas vezes peçonhentas, provocando grande sofrimento, matavam-se e
sofrimento e desespero.
A situação chegou a ser de tal modo grave que “houve pessoas que
bebiam mijo”, tendo quatro delas morrido por causa disso, e outras por
noite. Conta Manuel Godinho Cardoso que “por ser ainda Inverno nesta
terra o frio era grande”, e que, apesar da muita lenha que nela havia,
as tempestades de areia.
por vezes, mesmo, matar. Boa parte das vezes, não ousavam meter-se
directamente com os portugueses por causa das armas de fogo que estes
transportavam.
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Todas estas dificuldades causavam, obviamente, inúmeras mortes,
despida por acção dos cafres, “lançou-se logo no chão, e cobriu-se toda
com os seus cabelos, que eram muito compridos, fazendo uma cova na
areia, onde se meteu até à cintura, sem mais se erguer dali”, vindo a
Muitos outros casos poderiam ser citados de mortes bem duras que
Índico.
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Que o menor mal de todos seja a morte”.
fidalgo de avós godos, que morrem aos gritos nestas páginas; são
Bibliografia consultada
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BRITO, Bernardo Gomes de – “História Trágico-Marítima” – 2 vols. Fixação do texto,
Soares, José Saramago e Maria Lúcia Lepecki. Edições Afrodite. Lisboa, 1971-
1972.
1988.
Lisboa, 1951.
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SÉRGIO, António – “Em torno da História Trágico – Marítima”, in “Ensaios”, vol.
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