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A SEMENTE
CAIU EM TERRA BOA
OS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE
75 ANOS DE EVANGELIZAÇÃO
AO SERVIÇO DA IGREJA LOCAL (1925-2000)
Sem história,
somos analfabetos
incapazes de ler o presente (Y. Congar)
Iniciei o meu serviço missionário no Niassa, Moçambique, em 1992. Recordo que me causou
profunda impressão o primeiro impacto com as missões destruídas pela incúria e pela guerra.
Caíram os muros, mas ficou de pé uma Igreja local que se manteve viva e missionária, fruto do
trabalho da geração de missionários que nos precedeu.
Com o tempo fui indagando junto de alguns cristãos da primeira geração, testemunhos da
fundação destas missões, que com orgulho me falaram daqueles tempos heróicos e tão sofridos. Por
outro lado, pude colaborar no trabalho, sério e difícil, com que os missionários estão actualmente
recuperando a memória dos pioneiros da evangelização católica: a sua herança pastoral, intelectual
e material. Não por saudosismo ou curiosidade arqueológica, mas pelo vivo interesse que isso em
nós desperta.
Este trabalho de investigação histórica quer ser, nos seus limites, um contributo para este
importante trabalho de recuperação da sua/nossa memória, que é, basicamente, a “memória” desta
igreja local que queremos continuar a servir.
Confrontado com esta situação, motivado pelo facto de muitos desconhecerem a história e o
método de evangelização dos missionários da Consolata em Moçambique, decidi-me a investigar e
a escrever este estudo para ajudar os leitores a conhecer um pouco melhor a origem do presente
eclesial de que somos hoje protagonistas. O amor exige conhecimento. Não podemos amar aquilo
que não conhecemos. Se amamos esta Igreja local, devemos conhecer a Igreja das origens. Se
queremos realizar uma “nova evangelização” não podemos esquecer a primeira evangelização.
Celebram-se, este ano, os 75 anos da chegada dos missionários da Consolata a Moçambique.
Em várias ocasiões se falou de balanço, de dificuldades e de prospectivas para o futuro. Considerei
então oportuno um confronto sério e aprofundado com a experiência concreta vivida em
Moçambique nestes 75 anos de presença e acção missionária.
A estrutura e o conteúdo
O objectivo deste estudo é apresentar, depois de um breve introdução histórica (1ª parte), a
actividade dos missionários da Consolata em Moçambique no período de 1925-2000, enquadrando-
a no ambiente eclesial, cultural, político e sócio-económico do tempo em questão (2ª parte); a
terceira parte incidirá sobre a maneira como os missionários organizaram e concretizaram a
evangelização, ou seja, o seu método missionário.
A partir da documentação e escritos, far-se-á uma reconstrução histórica da evangelização
protagonizada pelos missionários da Consolata no Niassa, Inhambane e Lourenço Marques/Maputo
para, na segunda parte, apresentar o método missionário por eles utilizado.
As fontes e a metodologia
Apresentamos as fontes de que nos servimos para o presente estudo. O núcleo documental
principal é constituído pelos diários, relatórios e cartas que os Superiores locais mandavam para o
Conselho Geral e para a Santa Sé; pelos escritos de alguns missionários (Pedro Calandri, Gabriel
Quaglia, Luís Bosio, Mário Casanova, Domingos Ferrero, etc.), em que descrevem o ambiente –
geográfico e etnológico - onde estava inserida a Missão; e ainda pelos relatos das excursões
apostólicas. Toda esta documentação, conservada no Arquivo do Instituto dos Missionários da
Consolata, em Roma, e no Arquivo Regional IMC de Moçambique, no Maputo, foi por nós
pessoalmente consultada.
Para além dos documentos e escritos que acabámos de mencionar, consultei alguma
literatura referente à época em que se insere o período estudado. Foram sobretudo estudos
históricos, políticos e missiológicos. São imprescindíveis para uma verdadeiro enquadramento
histórico dos factos e a sua correcta interpretação.
Com o suporte da minha experiência pessoal pude compreender melhor os acontecimentos que
aqui apresento. Em primeiro lugar, o facto de ter conhecido pessoalmente alguns dos protagonistas
principais dos factos que descrevo. No Niassa, sobretudo na missão de Mepanhira, tive a ocasião de
conhecer, falar e trabalhar com alguns cristãos da primeira geração e evangelizadores da primeira
hora. A todos eles o meu obrigado.
Agradeço também àqueles que me motivaram a realizar este trabalho e nele colaboraram. Um
agradecimento especial ao P.e Manuel Tavares e P.e Adelino Francisco (Maputo), ao casal de
Leigos missionários IMC, Ricardo e Elisabete, (Mapinhane), ao P.e Darci Vilarinho (Roma), ao P.e
Igino Tubaldo (Turim) e ao P.e Norberto Ribeiro Louro e P.e Francisco Lerma (Roma), que com
paciência leram e corrigiram o texto e apresentaram oportunas sugestões.
FONTES
a)Fontes inéditas
Arquivos
Niassa
AIMC X/404, n.1: Diário da Missão de Massangulo (1929-1933).
AIMC X/404, n.2: Diário da Missão de Massangulo (1933-1936).
AIMC X/404, n.3: Diário da Missão de Massangulo (1936-1939).
AIMC X/404, n.4: Diário da Missão de Massangulo (1939-1942).
AIMC X/404, n.5: Diário da Missão de Massangulo (1942-1944).
AIMC X/404, n.6: Diário da Missão de Massangulo (1945-1946).
AIMC X/404, n.7: Diário da Missão de Massangulo (1947-1948).
AIMC X/404, n.8: Diário da Missão de Massangulo (1949-1953).
AIMC X/404, n.9: Diário da Missão de Massangulo (1953-1957).
AIMC X/404, n.10: Diário da Missão de Massangulo (1958-1963).
AIMC X/404, n.11: Diário da Missão de Massangulo (1963-1971).
AIMC X/404, n.12: Diário da Missão de Massangulo (1971-1975).
AIMC X/411, n.6: Diário da Missão de Mepanhira (1938-1947).
AIMC X/411, n.7: Diário da Missão de Mepanhira (1948-1961).
AIMC X/411, n.8: Diário da Missão de Mepanhira (1961-1976).
AIMC X/405, n.17: Diário da Missão de Mitúcue (1939-1945).
AIMC X/405, n.18: Diário da Missão de Mitúcue (1946-1954).
AIMC X/405, n.19: Diário da Missão de Mitúcue (1955-1960).
AIMC X/405, n.20: Diário da Missão de Mitúcue (1960-1965).
AIMC X/405, n.21: Diário da Missão de Mitúcue (1965-1969).
AIMC X/405, n.22: Diário da Missão de Mitúcue (1969-1972).
AIMC X/406, n.6: Diário da Missão de Unango (1947-1972).
AIMC X/406, n.7: Diário da Missão de Unango (1972-1976).
AIMC X/410, n.1: Diário da Missão de Txatxe/Maiaca (1947-1962).
AIMC X/410, n.2: Diário da Missão de Maiaca (1962-1976)
AIMC X/415, n.1: Diário da Missão de Cobué (1950-1964).
AIMC X/409, n.1: Diário da Missão de Nova Coimbra (1962-1975).
AIMC X/422, n.1: Diário da Missão de Vila Cabral (1962-1978).
AIMC X/408, n.1: Diário da Missão de Nipepe (1967-1975).
AIMC X/407, n.1: Diário da Missão de Nova Esperança (1970-1975).
Inhambane
AIMC X/421, n.1: Diário da Missão de Massinga (1946-1964).
AIMC X/414, n.1: Diário da Missão de Nova Mambone (1947-1959).
AIMC X/416, n.1: Diário do Arcipreste de Vilankulo (1947-1953).
AIMC X/417, n.2: Diário da Missão de Mapinhane (1946-1956).
AIMC X/412, n.1: Diário da Missão de Maimelane (1948-1974).
AIMC X/413, n.1: Diário da Missão de Muvamba (1971-1975).
Lourenço Marques/Maputo
AIMC X/420, n.6: Diário da Missão de Liqueleva (1951-1958).
AIMC X/420, n.7: Diário da Missão de Liqueleva (1958-1966).
AIMC X/420, n.8: Diário da Missão de Machava (1956-1966).
AIMC X/420, n.9: Diário da Missão de Machava (1967-1969).
AIMC X/423, n.1: Diário da Casa regional (1968-1974).
AIMC X/423, n.2: Diário da Casa regional (1974-1975).
AIMC X/423, n.3: Diário do “Lar Missionário” (1972-1975).
b)Fontes editadas
1
Cf. A. RITA-FERREIRA, Agrupamento e caracterização étnica dos indígenas de Moçambique (Lisboa 1985).
2
Para uma análise bem documentada e uma visão completa deste longo período da história de Moçambique é de
grande utilidade a seguinte obra: M. NEWITT, História de Moçambique (Mem Martins 1997).
3
As obras históricas mais importantes sobre a presença dos Portugueses na África Oriental neste período são: A.
LOBATO, Expansão portuguesa em Moçambique, 1498-1530, 3. Vol. (Lisboa 1954-1960); E. AXELSON, Portuguese in
South-East Africa 1488-1600 (Cape Town 1973).
Mombaça). O domínio da costa moçambicana foi assegurado com a construção de fortes em Sofala
(1505) e na ilha de Moçambique (1507). Estas posições costeiras ultrapassavam a simples
necessidade de apoio à navegação para a Índia. Na verdade os metais preciosos, o marfim e os
escravos despertavam o interesse dos portugueses pela exploração do litoral, desde a baía da Lagoa
(explorada por Lourenço Marques em 1544) até às de Sofala e Moçambique, no norte. Além de
Sofala e ilha de Moçambique, os portugueses constituíram logo de seguida fortalezas e feitorias
comerciais em Sena (1531), Tete e Quelimane (1544).
Nesta fase o interior de Moçambique começava a ser percorrido por aventureiros
portugueses. Estes descobriram que os grandes mercados e os seus caminhos de acesso se situavam
sobretudo nos territórios entre os rios Zambeze e Limpopo, na direcção do interior por onde se
estendiam os países ricos de oiro e marfim que eram o império Mocaranga do Monomotapa com os
reinos de Manica ou Chicanga, Quiteve e Sedanda e a sudoeste o reino Abútua. Concentraram
portanto a sua atenção nestas regiões, aproveitando, para o ordenamento do trabalhos e da
organização de forças, o dispositivo de exploração comercial montado pelos árabes. Sofala, assente
então na foz do rio Búzi, constituía a base das actividades no sul. Feitoria bem provida, a ela
desciam os indígenas com oiro, a fazer as suas compras, e dela saíam os comerciantes a correr as
feiras do interior até Manica. Outra porta de entrada para o interior era o vale do rio Zambeze em
direcção ao império do Monomotapa.
Estas possessões portuguesas no litoral e nas margens do rio Zambeze organizaram-se, na
dependência do Estado da Índia. Eram ao mesmo tempo feitorias de comércio ou resgate com os
respectivos feitores e escrivães, capitanias com presídio e capitão, e, sob o ponto de vista
eclesiástico, paróquias com o seu vigário ou pároco.
4
Cf. A. ANDRADE, Relações de Moçambique Setecentista (Lisboa 1955); F. HOPPE, A África Oriental Portuguesa
no tempo do Marquês de Pombal (1750-1777) (Lisboa 1970); A. ISAACMAN, The Prazos da Coroa 1752-1830. A
functional analysis of the political system: Studia 26 (1969) 149-178.
5
Cf. ALCÂNTARA GUERREIRO, Quadros da História de Moçambique (Lourenço Marques 1954) 2, 278.
6
Cf. J. CAPELA, Escravatura. Conceitos. A empresa do saque (Porto 1978) 93-94; F. HOPPE, A África Oriental
Portuguesa no tempo do Marquês de Pombal (1750-1777) (Lisboa 1970) 27, 229.
7
Cf. E. AXELSON, Portugal and the scramble for Africa, 1875-1891 (Johannesburg 1967); R. PÉLISSIER, História
de Moçambique. Formação e oposição (1854-1918), vol. I-II (Lisboa 1987-1988).
e a capital continuava a ser a ilha de Moçambique. Em 1891 dá-se a grande reforma administrativa,
dando ao território o título de Estado da África Oriental divido nas províncias do norte e do sul.
No século XIX concentraram-se na África as atenções europeias com propósitos
colonizadores. A concorrência inglesa em Moçambique manifestou-se logo em 1822, em Lourenço
Marques, e foi-se arrastando até à solução dada por Mac Mahon a favor da posse por Portugal em
1875. Renovou-se no fim do século na célebre questão do “mapa-cor-de-rosa” que reuniria sobre a
administração portuguesa Angola e Moçambique, incluindo o território do actual Zimbabwe,
Zâmbia e Malawi, e que encontrou pela frente o projecto inglês da linha do Cabo ao Cairo. O sonho
português evaporou-se pela eficácia de Cecil Rhodes e pela pressão do “ultimato” (1890), que dava
a vitória ao imperialismo britânico. Depois de diversas discussões, em 1891 foi assinado um tratado
que pôs fim à disputa8. Com a delimitação das fronteiras de Moçambique e Angola ficava
abandonado o projecto de ligar Angola e Moçambique.
Para consolidar a sua presença em Moçambique e pôr fim aos vários focos de rebelião
existentes um pouco por todo o lado, Portugal organizou campanhas de ocupação do território
submetendo os reinos rebeldes à sua soberania. A ocupação administrativa intensifica-se a partir da
passagem da capital para Lourenço Marques, em 1897. A ideologia e a ciência colonial adaptam-se
aos tempos com a criação da Escola Superior Colonial (1906), preparada pela Sociedade de
Geografia, fundada em 1875.
8
Para um maior conhecimento dos meandros deste conflito diplomático: Cf. J. ALMADA, Diligências Diplomáticas
em torno de Moçambique (1858-1890) (Coimbra 1970); PH. WARHURST, Anglo-Portuguese Relations in South-Central
Africa, 1890-1900 (1962 Londres).
9
Cf. L. VAIL, Capitalism and Colonialism in Mozambique (Londres 1980) 187-192.
2.2. CONTEXTO ECLESIAL:
10
No dia 4 de Setembro 1505 o capitão Pero de Anaia, primeiro governador de Moçambique deu início à
construção de uma fortaleza e uma igreja em Sofala. Esta igreja é, provavelmente, a primeira Igreja de Moçambique e o
seu primeiro vigário, o P.e Bartolomeu Fernandes. Nessa ocasião o rei de Portugal, D. Manuel I, ordenava que os
naturais fossem doutrinados nas coisas da fé e recomendava os bons costumes aos portugueses para não causarem
escândalo. O P.e Bartolomeu começou a evangelizar os indígenas e em 1506 administrava em Sofala os primeiros
baptismos. Em seguida, fixaram-se na Ilha de Moçambique os primeiros missionários que exercitavam o culto na capela
do forte, construída em 1507. Cf. J.A. ALVES DE SOUSA-F.A. DA CRUZ CORREIA, 500 anos de evangelização em
Moçambique (Braga-Maputo 1998) 17.
11
Cf. J. GUERREIRO, A acção missionária e a sua organização canónica em Moçambique, no período filipino
(1581-1640). Actas do Congresso Internacional de História dos Descobrimentos (Lisboa 1961) (V, II parte) 179-193.
12
Para um estudo mais aprofundado da acção missionária dos Jesuítas em Moçambique durante este período, ver o
seguinte estudo: A. SILVA, Mentalidade missiológica dos Jesuítas em Moçambique antes de 1759. Esboço ideológico a
partir do núcleo documental, 2 vol. (Lisboa 1967).
evangelização de P.e Luís Mariano ao longo do Zambeze, nasceram as missões de Caborabassa e
Zumbo13.
Com os anos as missões foram-se implantando e os Jesuítas, com sede na ilha de
Moçambique, alargaram a sua actividade a outras regiões: na margem direita do Zambeze - Tete,
Maranguè, Chemba, Sena e Caia – e na margem esquerda do Zambeze (perto do litoral) - Luabo e
Santa Cruz (perto de Quelimane).
Nos finais do século XVII, a missão dos jesuítas teve um declínio progressivo. Os frutos não
correspondiam a tantos esforços: a falta de perseverança cristã, as consequências económicas
provocadas pelo aparecimento do ouro, a tolerância da escravatura, e outros factores concorreram
para o declínio da actividade missionária14.
13
Cf. J.A. ALVES DE SOUSA-F.A. DA CRUZ CORREIA, 500 anos de evangelização em Moçambique, 45.
14
Cf. J.A. ALVES DE SOUSA, Os Jesuítas em Moçambique, 1541-1991. No Cinquentenário do Quarto Período da
nossa Missão (Braga 1991) 64.
15
Para um estudo mais aprofundado da acção missionária dos Dominicanos em Moçambique, ver os seguintes
estudos: C.R. BOXER, A dominican account of Zambezia: Boletim da Sociedade de Estudos de Moçambique 29 n.125
(1960) 4-11; PH. DENIS, Les Dominicains dans la region du Zambéze (1577-1837) : Mémoire Dominicaine (1995/6)
185-208; Ph. DENIS, The Dominicans in the Zambezi Area (1577-1837). How to write the history of a failure?: Studia
Historiae Ecclesiasticae 19 (1993) 6-34.
16
Cf. A. DA SILVA REGO, As missões portuguesas em Moçambique, em: Curso de Missionologia (Lisboa 1956)
337.
17
Cf. Ph. DENIS, Indigenous clergy in Portuguese South-East Africa (1560-1835), em : The making of an
indigenous clergy in Southern Africa (Pietermaritzburg 1995) 26-39.
Factores internos, sobretudo a decadência religiosa, fizeram esmorecer o dinamismo missionário: os
imperadores do Monomotapa eram cristãos apenas de nome; os portugueses, militares e
comerciantes, também não primavam por um comportamento exemplar; os próprios missionários
nem sempre estavam à altura da sua missão.
Por estes motivos, em 1753, alguns anos antes da expulsão dos Jesuítas, o declínio da
actividade missionária era já evidente. A acção missionária extinguira-se quase por completo na
região do Monomotapa e no litoral norte ficando concentrada na zona de Tete e Inhambane18.
Finalmente em 1759, surgiu o decreto do Marquês de Pombal suprimindo as missões dos Jesuítas
em Moçambique. O cumprimento desta ordem, primeiro, no litoral, e, depois, no interior, arrancou
os missionários dos seus postos de evangelização. As missões ficaram entregues aos cuidados de
outras ordens e sobretudo dos Padres diocesanos de Goa19.
Em 1834, com a supressão das ordens religiosas, por Joaquim António de Aguiar, a
actividade missionária em Moçambique viu-se reduzida a bem pouco. Em 1855, apenas dez
missionários permaneciam na Prelazia de Moçambique. Vinte anos depois não permanecia nenhum
missionário no interior. A sobrevivência da presença cristã dependia do serviço prestado pelo clero
diocesano de Goa20. Em 1875, Moçambique dispunha apenas de 8 padres seculares, 7 dos quais
eram goeses21.
18
Cf. A. A. ANDRADE, Relações de Moçambique Setecentista (Lisba 1955) 75ss.
19
Cfr. J.A. ALVES DE SOUSA, Os Jesuítas em Moçambique, 1541-1991. No Cinquentenário do Quarto Período da
nossa Missão, 66.
20
Cf. FORTUNATO DE ALMEIDA, Hstória da Igreja em Portugal, vol. III (Barcelos 1970) 188.
21
Cfr. J.A. ALVES DE SOUSA-F.A. DA CRUZ CORREIA, 500 anos de evangelização em Moçambique, 51.
22
Cf. A. LOURENÇO FARINHA, A expansão da fé na África e no Brasil. Subsídios para a história colonial, vol I
(Lisboa 1942) 356-357.
Francisco Xavier, em 1908. Os Jesuítas estenderam também a sua acção missionária a Móngue
(Inhambane) 23.
Os Franciscanos chegaram a Moçambique em 3 de Junho de 1898. Compunham o primeiro
grupo de missionários os padres António de Santa Maria (superior), Rafael Maria da Assunção e
José Rolim, e os Irmãos auxiliares Salvador Franqueira, Serafim Felisberto Ribeiro e Daniel de
Almeida. Na povoação da Beira, fundaram a Missão de Nossa Senhora do Rosário. Da Beira, os
Franciscanos irradiaram a sua acção missionária até Inhambane e Gaza fundando missões de
Chonguene (1906) e de Mocumbi (1909)24.
Na vigília da revolução republicana em Portugal (1910), a prelazia de Moçambique contava
com 71 padres: 35 do Colégio de Cernache do Bonjardim, 6 padres seculares, 15 jesuítas, 9
franciscanos, 3 salesianos e 2 trapistas. Contava também com a presença das Irmãs de S. José de
Cluny e das Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria.
23
Cf. F.A. DA CRUZ CORREIA, O método missionário dos Jesuítas em Moçambique, 1881-1910 (Braga 1990) 123-
131.
24
Cf. F. FÉLIX LOPES, Missões Franciscanas em Moçambique. 1898-1970 (Braga 1972) 51-174.
25
Cfr. A. SILVA REGO, Curso de Missionologia (Lisboa 1956) 183-184.
Por causa dos magros resultados obtidos pela Lei da Separação e da repressão da liberdade
religiosa que contrariava os sentimentos e crença do povo, as leis anti-clericais foram perdendo
força, e o Governo foi procurando novas formas de entendimento e cooperação com a Igreja. O
Decreto n. 6322, de 24 de Dezembro de 1919, de Alfredo Rodrigues Gaspar, Ministro das Colónias,
e o Decreto n. 8351, de 26 de Agosto de 1922, do mesmo ministro eram já um incentivo para
reactivar a actividade missionária.
A República enveredava assim pelo caminho da compreensão missionária, mas foi preciso
esperar até 1926 para dar início à abolição das disposições legais que contra a Igreja continuavam a
subsistir. De facto, após a revolução nacional de 28 de Maio desse ano, abria-se o caminho para um
entendimento entre a Igreja e o Estado: em particular o Estado queria aproveitar as missões
religiosas não só para a evangelização mas também para a civilização dos autóctones, enquanto
ajudava os colégios de formação missionária.
Os dois decretos do Ministro das Colónias Alfredo Rodrigues Gaspar foram o prelúdio para
a elaboração do Decreto n. 8351, de 13 de Outubro de 1926, do Ministro das Colónias, João Belo,
que promulgou o Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas da África e Timor26. A
terceira parte do preâmbulo passa em revista toda a legislação missionária da República e decide
atribuir imediatamente um subsídio extraordinário para a obra missionária; na parte final promete
um impulso vigoroso às missões por parte do Governo. Em seguida foi extinguido oficialmente o
Instituto de Missões Coloniais (Missões laicas).
Moçambique, no final de 1926, contava cerca de 40.000 católicos. A Prelazia dispunha então
de clero secular (20 portugueses e 7 goeses) em 14 missões e 5 sucursais; de Franciscanos (12
portugueses e 1 italiano) em 5 missões e 3 sucursais; 5 padres franceses da Companhia de Maria
(Monfortinos) em duas estações missionárias; 11 missionários da Consolata italianos em 3 estações
(Miruru, Tete e Mandimba)27.
26
Cfr. A. SILVA REGO, Lições de Missionologia (Lisboa 1961) 150-153.
27
H. PINTO REMA, A actividade missionária de Portugal nos séculos XIX e XX: Itinerarium 43 (1997) 265.
SEGUNDA PARTE
ACTIVIDADE DOS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE (1925-2000)
Introdução
Os primeiros dez anos da presença dos Missionários da Consolata em Moçambique (Tete e
Niassa) foram um período conturbado, mas importante para compreender a sua acção missionária28.
As negociações para a sua entrada foram marcadas por duas atitudes: desconfiança e ambiguidade.
Por um lado, a desconfiança da parte da autoridade política e também da autoridade eclesiástica em
relação aos missionários não portugueses, bem patente durante este período. Por outro, a estratégia
escolhida pelos responsáveis do Instituto em entrar a todo o custo no Niassa, e que não foi
transparente. Foi um período difícil e árido do ponto de vista pastoral. Quem sofreu mais foram os
missionários e as missionárias, quer no corpo, quer no espírito. No meio da tempestade, houve um
missionário que conseguiu levar para a frente um projecto de evangelização e garantir a
continuidade dos Missionários da Consolata em Moçambique: o P.e Pedro Calandri (1893-1967),
pioneiro da evangelização católica do Niassa, fundador e garante da Missão de Nossa Senhora da
Consolata de Massangulo (1928). Era chamado, entre os ayao, de Bwana Cilimba, o que significa
“homem forte de coração e que aguenta com tudo”, e foi muito o que teve que enfrentar para
defender a causa missionária no Niassa durante este período.
O apostolado missionário, realizado em condições difíceis pelo P.e Calandri e restantes
missionários e missionárias na Missão de Massangulo entre o povo ayao, precedeu e preparou o
alargamento do campo de apostolado dos Missionários da Consolata a outros povos do Niassa e de
Moçambique.
28
Para um estudo mais completo destes primeiros dez anos de actividade missionária em Moçambique ver os
seguintes estudos: G. GALLEA, Istituto Missioni Consolata. Fondazione e primi sviluppi (1923-39) Vol. III (Torino
1973), 661-708; I. TUBALDO, I Missionari della Consolata in Mozambico e l'Allamano (Torino 1977), Pro manuscripto;
C. MATIAS DOMINGOS, Os Missionários da Consolata em Moçambique: 1925-36. A sua entrada e as razões dos vários
contrastes, dissertação de Licenciatura (Roma 1993), Pro manuscripto.
Os superiores aceitaram a proposta de D. Rafael de Assunção de irem para a região de Tete,
embora o seu olhar continuasse voltado para o Niassa. No dia 29 de Agosto de 1925, comunicaram
ao bispo o nome dos missionários destinados a Moçambique. Dos oito missionários, todos italianos,
que formavam a primeira expedição, cinco já tinham experiência missionária, adquirida no Quénia:
P.e Victor Sandrone, superior do grupo, P.e Júlio Peyrani, P.e Pedro Calandri, P.e João Chiomio e
Ir. José Benedetto. Os restantes três – P.e Lourenço Sperta, P.e Paulo Borello e o seminarista
Segundo Ghiglia - partiram de Turim (Itália), depois de terem recebido o crucifixo das mãos do
Beato José Allamano. Os missionários provenientes de Itália uniram-se aos restantes no porto de
Mombaça (Quénia) e desembarcaram juntos no porto da Beira no dia 30 de Outubro de 1925. A
alegria de pisar o novo campo de evangelização foi imensa. Agora os missionários tinham pela
frente uma longa distância a percorrer até à Missão de S. Pedro Claver de Miruru (Tete), onde eram
destinados.
29
A Missão de S. Pedro Claver de Miruru tinha sido fundada pelos padres Jesuítas. Com a expulsão destes de
Moçambique pelo governo republicano português (1911), a missão foi confiada temporariamente aos missionários do
Verbo Divino, de nacionalidade alemã. Com o deflagrar da I Guerra Mundial (1914), estes tiveram que abandonar
Moçambique. Cfr. J.A. ALVES DE SOUSA, Os Jesuítas em Moçambique, 1541-1991. No Cinquentenário do Quarto
Período da nossa missão (Braga 1991), 83.
2. A ENTRADA DOS PRIMEIROS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA NO NIASSA
Em Junho de 1926, o P.e Pedro Calandri regressa a Moçambique, acompanhado pelo P.e José
Amiotti. Vinha do Quénia, onde tinha acompanhado o P.e Sperta, com a ordem explícita dos
superiores de ir para o Niassa e fixar residência na localidade de Mandimba. Para não alarmar
D. Rafael de Assunção e as autoridades políticas, que não queriam que os Missionários da
Consolata se fixassem no Niassa, esta viagem foi realizada com grande discrição. Os dois
missionários partiram da Beira, de comboio, no dia 22 de Junho com destino a Blantyre, na
Niassalândia (actual Malawi). Desta cidade, continuaram a viagem de automóvel até à fronteira de
Moçambique, tendo chegado a Mandimba, sede ocidental da Companhia do Niassa, no dia 4 de
Julho (Sábado), onde foram bem acolhidos pelas autoridades administrativas portuguesas. No dia
seguinte, Domingo, celebraram a primeira missa. Quatro dias depois, 8 de Julho, chegava a
Mandimba um outro missionário da Consolata, P.e João Chiomio, vindo da Missão de Miruru.
Tinha feito a viagem de Miruru até Mandimba a pé30.
30
Cfr. Carta de P.e Pedro Calandri a D. Filipe Perlo, Mandimba, 11-7-1926: AIMC VII/1378, n.27.
31
Apontamentos sobre a zona oeste do território da Companhia do Nyassa-Moçambique (1926): AIMC VIII/7,
1927, n.113.
32
W.P. Johnson foi o responsável da Missão de S. Bartolomeu até 1918. Depois de 35 anos de intenso trabalho
missionário foi enviado para Tanganica e substituído pelo reverendo H. Cox. Para conhecer a vida e obra deste pioneiro
da evangelização anglicana no Niassa, ver : B.H. BARNES, Johnson of Nyassaland. A study of the life and work of
William Percival Johnson (London 1933).
Quando o Bispo D. Rafael de Assunção teve conhecimento da entrada dos Missionários da
Consolata no Niassa e da sua fixação em Mandimba, reagiu manifestando o seu desacordo.
Reafirmou em voz alta que nunca tinha autorizado a sua entrada no Niassa e intimou-os a deixarem
quanto antes aquele território. Não tendo eles obedecido às suas ordens, D. Rafael retirou-lhes a
faculdade de exercerem o ministério pastoral. Não podendo iniciar a missão, o P.e Calandri e o
P.e Amiotti, dedicaram o seu tempo ao estudo da língua, à exploração do território e ao cultivo de
tabaco. Entretanto, acolheram e tomaram a seu cuidado um grupo de crianças mestiças33.
A estratégia elaborada pelos superiores de Turim, de entrar a todo o custo no Niassa mesmo
sem a autorização explícita do bispo local, dificultava cada vez mais a acção dos missionários em
Moçambique. Os efeitos de tal estratégia foram: desconfiança de D. Rafael de Assunção quanto às
reais e leais intenções do Instituto e aumento da oposição, de alguns sectores políticos, à presença
de missionários estrangeiros em Moçambique.
Entretanto, quer no Niassa quer na Missão de Miruru, os Missionários da Consolata não
desanimavam nos seus propósitos de evangelização. No dia 18 de Setembro de 1927 chegava um
precioso reforço de pessoal: o P.e Alfredo Ponti e sete irmãs da Consolata34. Mas a situação
mantinha-se ambígua, nomeadamente no Niassa, criando um ambiente de desânimo.
33
Algum tempo depois da chegada dos Missionários da Consolata a Mandimba, apresentou-se um italiano, Pedro
Regina, que veio expressamente de Fort-Johnston (Niassalândia/Malawi). Na sua casa em Kaliwata (a 10 km de
Mandimba) tinha um grupo de crianças mestiças, algumas suas, outras abandonadas pelos seus pais. Pediu aos
missionários que tomassem conta daquelas crianças. O P.e Calandri num primeiro momento recusou, mas passado
algum tempo, não pôde negar-se a um acto de caridade tão urgente.
34
As Missionárias da Consolata foram fundadas pelo Beato José Allamano em Turim (Itália) em 1910. As
primeiras Missionárias da Consolata destinadas a Moçambique foram as irmãs Emma Rinaudo, Valeria Melzani,
Tommasina Moretto, Ananina Tabellini, Faconda Alberti e Benedetta Mattio. Partiram de Turim no dia 3 de Julho de
1927. No dia 17 de Agosto, no porto de Mombaça (Quénia), unia-se a este grupo a Ir. Edvige Grosso e no dia 26 de
Agosto desembarcavam no porto da Beira. No dia 18 de Setembro chegavam à Missão de Miruru. Cfr. P.G. BASSI,
Cenni storici dell’Istituto Suore Missionarie della Consolata. Fascicolo III (Grugliasco 1983). Pro manuscripto, 172-
173.
35
Os ayao, também conhecidos por ajauas, são um grupo étnico oriundo do monte Yao, perto de Muembe
(Niassa), entre o Rio Lugenda e Lucheringo. Parte deles vive no Niassa e outra parte fixou-se na Tanzânia e no Malawi.
Dedicados ao comércio e afectos ao Islamismo, juntamente com os comerciantes árabes da costa, faziam incursões nos
territórios vizinhos, escravizando os anyanja e os macúa. Ofereceram grande resistência à ocupação colonial
portuguesa. Mostraram-se também pouco sensíveis à proposta evangélica, pois encontravam-se identificados com a
religião muçulmana. No século XIX, numerosos “mwalimos” (mestres muçulmanos), vindos de Zanzibar, conseguiram
islamizar a população ayao que até então praticava a região tradicional. A nova religião foi facilmente abraçada, por
melhor se adaptar aos costumes e actividades económicas deste povo. Para um maior conhecimento da cultura e história
do povo ayao, ver as seguintes obras: Y. ABDULLAH, WAyao’we (Blantyre 1952); E.A. ALPERS, Trade, State and
Society among the Yao in the 19th century: African History Studies 10 n.3 (1969) 417-435; M. GAMA AMARAL, O Povo
Yao. Subsídios para o estudo de um povo do noroeste de Moçambique (Lisboa 1990); J.C. MITCHELL, The Yao Village.
A study in the social structure of a Nyasaland tribe (Manchester 1956); L. WEGHER, Um olhar sobre o Niassa, vol. I-II
(1995-2000).
a palhota não ficou pronta, instalaram-se todos numa tenda de campanha e assim viveram de Maio a
Dezembro de 1928. Os leões rondavam a barraca ao cair da noite e pela madrugada, em todas as
direcções. Enquanto as crianças dormiam, o P.e Calandri velava por elas de espingarda em punho36.
Sete meses depois, a 31 de Dezembro de 1928, chegavam reforços: o Ir. José Benedetto,
proveniente da Missão de Miruru, o P.e Ângelo Lunati e um grupo de irmãs da Consolata37. À
medida que se aprontaram as residências provisórias dos Padres e das Irmãs foi possível iniciar a
acção evangelizadora na região. Pouco a pouco foram surgindo as primeiras construções em
alvenaria dotando assim a missão das estruturas necessárias para o seu funcionamento.
36
Cf. L. WEGHER, Un uomo e la sua missione. Padre Pietro Calandri, Pro manuscripto, (Lichinga 1985) 53-54.
37
No dia 4 de Outubro partiram de Itália, juntamente com o P.e Ângelo Lunati, o primeiro grupo de missionárias
da Consolata destinadas ao Niassa: Ir. Antida Castino, Daria Pavese, Caetana Goletti, Bona Magistrelli, Flaminia
Malino e Onorata Foresti. No porto de Mombaça (Quénia), embarcaram outras duas irmãs que completavam a
expedição: Ir. Anastasia Torresin e Remigia Civera. Desembarcaram em Porto Amélia no dia 5 de Dezembro. Na
companhia do P.e Amiotti, seguiram de camião até Massangulo. Depois de uma viagem desgastante, chegaram no
último dia do ano. Cfr. P.G. BASSI, Cenni storici dell’Istituto Suore Missionarie della Consolata. Fasciculo III, 188-
189.
38
Cf. L. WEGHER, Un uomo e la sua missione. Padre Pietro Calandri, 100-101.
39
No dia 25 de Outubro de 1930, D. Rafael de Assunção efectuou a visita pastoral à Missão de Miruru. Informou a
equipa missionária sobre a decisão de todos deixarem a missão. As Missionárias da Consolata estavam destinadas à Ilha
2.6. Anos difíceis (1931-1935): a expectativa de uma resposta definitiva
A missão do Niassa, como todas as obras de Deus, continuou a crescer no meio de grandes
dificuldades internas e externas. Perante a impossibilidade de evangelizar os muçulmanos, a missão
de Massangulo orientou a sua actividade para as escolas e respectivos internatos. Juntamente com
os mestiços frequentavam as escolas da missão alunos vindos de outras zonas e, pouco a pouco,
também os filhos dos muçulmanos.
Bem depressa surgiu o Colégio Pio XI. No primeiro ano de actividade (1930), 30 alunos foram
admitidos na missão; no segundo ano (1931), 350 alunos de ambos os sexos. Em 1931, foi
inaugurado o edifício da Escola de Artes e Ofícios. Iniciou-se a construção da residência dos
padres, em alvenaria, do armazém, da loja e a moagem entrou em funcionamento. No dia 28 de
Agosto, começaram a frequentar a escola os primeiros alunos externos. Na Páscoa, houve dois
baptismos de adultos e oito primeiras comunhões. No dia 27 Julho, o P.e Ângelo Lunati e a Irmã
Flamínia Malino emitiram a sua profissão perpétua.
O ano de 1931 tinha corrido bem, sem grandes sobressaltos. Para 1932 as perspectivas no
Niassa eram razoáveis, excepto quanto ao cansaço do pessoal missionário. O P.e Lunati,
encarregado do colégio, tinha de se empenhar com todas as suas forças para acompanhar os 50
rapazes e as 80 raparigas estudantes. Além disso, com o aumento dos alunos seria preciso alguém
que pudesse dar aulas de música, criar uma banda, um grupo de teatro, etc. O Ir. José Benedetto
fazia milagres, mas estava impossibilitado de atender a tanto trabalho. O P.e Calandri era incansável
e sempre activo. Com a partida definitiva do P.e Amiotti para Itália, no dia 10 de Maio, a
comunidade ficou desfalcada. Em Agosto chegou a Massangulo a nova superiora das missionárias
da Consolata, Ir. Margarida de Maria na companhia da Ir. Amabile Fagnani. Todavia, era evidente a
necessidade de mais pessoal missionário e de meios, mas em Turim os superiores recusavam-se a
reforçar a missão com novo pessoal missionário.
Em 28 de Junho de 1933, foram nomeados o novo Superior Geral dos Missionários da
Consolata, na pessoa do P.e Gaudêncio Barlassina. Os membros do novo conselho geral eram os
padres: Domingos Ferrero, João Chiomio, Victor Sandrone e João Piovano. Dois deles, os padres
Chiomio e Sandrone, tinham estado em Moçambique o que era uma boa premissa para um maior
interesse da nova Direcção Geral pelo Niassa. De facto, um dos primeiros assuntos a que a nova
Direcção Geral prestou atenção foi a situação em Moçambique. Tinha que se clarificar
definitivamente a situação dos Missionários da Consolata. O bispo e a Direcção Geral em Roma
estavam interessados ou não na sua presença e acção evangelizadora em Moçambique?
2.7. O sonho missionário de P.e Calandri: alargar o campo de apostolado aos anyanja e
macúas
Entretanto, o P.e Calandri projectava a abertura de novas missões no Niassa. A sul do Rio
Lugenda, entre a população macua, e a norte, nas margens do Lago Niassa, entre o povo anyanja.
Os macúas e os anyanja, maioritariamente pagãos, manifestavam-se abertos ao apostolado e à
escolarização. O problema é que D. Rafael de Assunção, pressionado por sectores nacionalistas da
sociedade colonial portuguesa em Moçambique, tardava em dar uma resposta positiva aos pedidos
de fundação de outras missões no Niassa, por parte de missionários estrangeiros. Parecia
inclusivamente que a sua atitude era contrária à evangelização do Niassa.
Perante este impasse, o P.e Calandri decidiu apelar para Roma. Em 1935 enviou um relatório à
Congregação de “Propaganda Fide” sobre a evangelização do Niassa, centrada em dois pontos: 1. as
limitações ao apostolado na Missão de Massangulo, 2. a necessidade de intervenção do Vaticano
para desbloquear a situação de impasse criada por D. Rafael de Assunção. Concluía o seu relatório
de Ibo (Cabo Delgado) com os Missionários Monfortinos. Três dias depois partiram para a Beira. No dia 30 de
Novembro, desembarcavam no Ibo. Nos anos que se seguiram, intensificaram a sua actividade em diversas missões de
Cabo Delgado em colaboração com os Missionários Monfortinos. Cfr. P.G. BASSI, Cenni storici dell’Istituto Suore
Missionarie della Consolata. Fasciculo III, 175-178.
lançando um apelo. Caso continuasse o impedimento na fundação de missões católicas entre as
populações macúa e anyanja, estas seriam conquistadas pela propaganda muçulmana e protestante,
e seriam irremediavelmente perdidas para Cristo e para a Igreja Católica40.
Por sua vez os superiores também prosseguiam os contactos com a Santa Sé, confiando na
possibilidade de poder resolver favoralmente a situação dos missionários no Niassa. O Instituto
insistia na importância de ter uma zona própria de acção, mas a Santa Sé queria, primeiramente,
regularizar as relações jurídicas entre a Igreja e o Estado português nos territórios ultramarinos.
Em Outubro, o superior geral, P.e G. Barlassina encontra-se com o Mons. D. Tardini, na
Secretaria de Estado do Vaticano. Este assegurou-lhe que a situação de impasse vivida em
Moçambique se resolveria, ou seja, que mais tarde ou mais cedo um território próprio seria confiado
à responsabilidade dos Missionários da Consolata. Era, então, necessário enviar novo pessoal
missionário.
Entretanto, a Santa Sé decidiu transferir D. Rafael de Assunção para a sede episcopal de Cabo
Verde e nomear Prelado de Moçambique D. Teodósio de Gouveia41.
40
AIMC VIII/7 1935, n. 2: Relazione annuale dello Stato della Missione S.S. Consolata di Massangulo (Nyassa
Portoghese), Massangulo, 30-7-1935.
41
D. Rafael de Assunção foi um grande missionário e bispo. Conseguiu solucionar parte dos enormes problemas e
dificuldades que encontrou na Prelazia de Moçambique, desde a sua tomada de posse. Encontrou hostilidade por parte
do clero secular e dos sectores políticos ligados à maçonaria. Acusavam-no de defender os interesses das congregações
religiosas e dos missionários estrangeiros em detrimento do clero secular e dos interesses nacionais. Por isso, percebe-se
a sua reserva em aceitar a presença dos missionários italianos da Consolata no Niassa. Antes de deixar Moçambique
escreveu uma longa carta ao Papa Pio XI na qual justificava a sua atitude, nomeadamente em relação aos Missionários
da Consolata, e recusava os argumentos de quem o considerava um bispo nacionalista. Cfr. Relatório de Mons. Rafael
de Assunção ao Papa Pio XI na ocasião da sua passagem da Prelazia de Moçambique para a Diocese de Cabo Verde.
AIMC VIII/8, 8, n.81. Para um maior conhecimento da pessoa e obra de D. Rafael de Assunção, ver: C. F. AZEVEDO,
Dom Rafael Maria de Assunção. Um grande Bispo Missionário Franciscano Português. Biografia e Apostolado
Missionário: 1874-1959 (Lisboa 1961).
SEGUNDO PERÍODO: (1936-1950)
Introdução
42
Cf. AIMC, IV/4, n.282, Actas das reuniões do Conselho Geral, 6-5-1936.
sul do Niassa e ao longo das margens do rio Lúrio, entre a população macúa43. No seu relatório,
informava os superiores da existência de algumas centenas de católicos baptizados pelos Padres
Monfortinos da Niassalândia, que eram instruídos e dirigidos por catequistas. No entanto, as
restrições impostas pela autoridade eclesiástica tinham, até então, impedido o alargamento da zona
de evangelização.
Em Moçambique o P.e Sandrone entrou em diálogo com o Prelado de Moçambique. Escreveu a
D. Teodósio de Gouveia, recém-chegado, informando-o sobre a existência de um grupo de católicos
em Mepanhira. Deu-lhe a conhecer a origem daquela comunidade cristã e a sua contínua solicitação
para a fixação de missionários naquela zona, colocando-se à disposição do prelado para assistir
pastoralmente aquelas comunidades e fundar aí uma missão44. A resposta de D. Teodósio demorou
a chegar. Alguns meses depois, P.e Sandrone encontrou-o na Ilha de Moçambique, com quem teve
uma longa conversa. D. Teodósio de Gouveia pô-lo ao corrente das dificuldades por ele encontradas
desde a sua chegada a Moçambique. A situação era crítica. O governo português era contrário à
presença de missionários estrangeiros, em particular italianos, que eram considerados uma ameaça
para os interesses nacionais. Contudo, deu a entender que não era contrário à abertura da missão em
Mepanhira. Era tudo uma questão de tempo. A boa vontade e o interesse do bispo iriam contribuir
para desbloquear o impasse criado em relação à fundação de outras missões no Niassa. No início de
1938 o P.e Sandrone, depois de ter visitado os cristãos de Mepanhira, recebeu a tão suspirada carta
de D. Teodósio na qual o bispo encorajava os Missionários da Consolata a continuarem o seu
apostolado nessa região45
Em seguida, o P.e Sandrone regressou a Itália tendo deixado ao P.e Gabriel Quaglia a
responsabilidade da missão de Massangulo, a cura pastoral dos cristãos de Mepanhira e os contactos
com o Bispo. Finalmente em Julho de 1936, D. Teodósio de Gouveia autorizou os Missionários da
Consolata a fixarem residência em Mepanhira. A nova missão assistiria espiritualmente toda a
circunscrição de Amaramba (actuais distritos de Mecanhelas e Cuamba). No dia 7 de Agosto,
D. Teodósio de Gouveia visitou a missão de Massangulo e aproveitou a ocasião para apresentar em
detalhe ao P.e Quaglia os seus projectos de evangelização no Niassa46.
Finalmente renascia a esperança. Depois de tantas dificuldades enfrentadas, chegara o momento
de concretizar aquilo que os Missionários da Consolata desde sempre desejaram: diversificar a sua
presença no Niassa e evangelizar um povo que desse maiores garantias de adesão ao Evangelho.
Obtida a autorização explicita do bispo faltava apenas a chegada de novo pessoal missionário para
efectuar a abertura da missão de Mepanhira
43
Os macúas do Niassa habitam a região a sul do Rio Lugenda. Têm uma cultura tipicamente matrilinear, em
regime clânico. Os principais regulados macúa no Niassa são: Maúa, Mukwapa, Mecanhelas, Karonga, Muikuna,
Matias e Ciamba. Para um maior conhecimento da história e cultura do povo macúa no Niassa, ver as seguintes
trabalhos: M. BIANCO, I Macúa (Maúa 1951), Pro manuscripto; F. LERMA MARTINEZ, O povo Macúa e a sua cultura
(Lisboa 1989); D. COLOMBO, Mozambico: I valori religiosi del popolo Makua (Bologna 1988).
44
...A presente carta tem por fim fazer chegar a V.Excia o grito de uma incipiente cristandade que invoca o
missionário, é talvez intempestiva; o amor porém de V.Excia Rev. para com as suas ovelhas, anima-me a expor-lhe
desde agora o desejo destes cristãos... Coloco nas mãos de V.Excia esta cristandade. É-nos impossível cuidar deles de
Massangulo, afastado por 350 Km de estradas, mas estou preparado, se V.Excia o julgar conveniente, para enviar dois
missionários de Massangulo a fim de fixarem a própria habitação entre eles. Neste caso digne-se V.Excia de me
comunicar o que tenho de fazer. AIMC VIII/7, 1937, n. 10: Carta de P.e V. Sandrone a D. Teodósio de Gouveia,
Massangulo, 24/4/1937.
45
AIMC VIII/7, 1937, n.5: Carta de D. Teodósio Gouveia a P.e V. Sandrone, Lourenço Marques, 21/01/1938.
46
Aos Missionários da Consolata era confiada a evangelização da zona onde já se encontravam, a Circunscrição
de Amaramba e Mtarika. Um campo de trabalho vasto com 95.000 Km2 de território e uma população aproximada de
124.000 almas. À recém fundada Sociedade Missionária Portuguesa (actualmente Missionários da Boa Nova) era
confiada a evangelização da Circunscrição do Lago, tendo como centro de irradiação a Missão de Unango.
a regulamentação das relações entre o Estado e a Igreja no tocante à actividade missionária além de
estabelecer uma plataforma de colaboração na área da escolarização com repercussões importantes
também na evangelização. Procedeu-se à divisão eclesiástica dos territórios missionários em
dioceses. Moçambique passou a ser uma Província Eclesiástica, com a criação das dioceses de
Lourenço Marques, Beira e Nampula47.
A presença dos Missionários da Consolata em Portugal ficou ligada à acção evangelizadora dos
mesmos em Moçambique e vice-versa. Desde o início, perante as dificuldades colocadas pelas
autoridades coloniais à presença de missionários italianos em Moçambique, pensava-se que,
abrindo uma casa em Portugal, se tornaria mais fácil a aprendizagem da língua portuguesa e a
superação de tantos obstáculos burocráticos48. O Acordo Missionário abriu o caminho para a
fixação do Instituto Missionário da Consolata em Portugal. Em 17 de Dezembro de 1940, o P.e João
Chiomio, procurador do Instituto junto da Santa Sé, foi chamado ao Vaticano. Ao Instituto foi
proposto a abertura de um seminário em Portugal, que serviria também para acolhimento dos
missionários destinados a Moçambique e, no futuro, para a formação de seminaristas
moçambicanos49. Igualmente, foi-lhe dado a conhecer o conteúdo do Acordo Missionário e feitas
algumas propostas de acção para o Instituto, quer na nova diocese de Nampula, quer em Portugal50.
No dia 10 de Junho de 1943 chegou a Portugal o primeiro missionário da Consolata, o P.e João
De Marchi, que se fixou em Fátima onde abriu o seminário do Instituto (3 de Outubro de 1944). A
abertura deste seminário foi acolhida com alegria e entusiasmo pelos missionários do Niassa51.
47
Com a bula Sollemnibus Conventionibus (4-9-1940), a Santa Sé suprimiu a antiga Prelazia Nullius, sufragânea
da Igreja Metropolitana de Goa (Índia), criando a Igreja Metropolitana de Lourenço Marques. Em 18 de Janeiro de
1941, a Santa Sé nomeou D. Teodósio de Gouveia como arcebispo de Lourenço Marques, constituindo-o Administrador
Apostólico das dioceses da Beira e Nampula. Em 21 de Abril de 1941 nomeou D. Sebastião Soares Resende como bispo
da Beira, e em 12 de Maio nomeou D. Teófilo de Andrade como bispo de Nampula.
48
Em 1938, o P.e Sandrone escreveu a D. Teodósio de Gouveia em nome do P.e Barlassina, Superior Geral,
exprimindo-lhe o desejo do Instituto de abrir uma casa em Portugal e solicitando o seu interesse e apoio. Em Portugal,
os missionários destinados ao Niassa podiam estudar a língua e obter um diploma que os habilitasse a trabalhar nas
escolas das missões como professores e como directores. O outro objectivo era o recrutamento de vocações para a vida
religiosa-missionária. Cf. AIMC VIII/7 1938 n. 56: Carta de P.e Victor Sandrone a D. Teodósio Gouveia, Turim, 16-12-
1938.
49
AIMC VIII/7 1940 n. 36: Os Missionários da Consolata no Niassa à luz do Acordo Misionário, Roma, 17-12-
1940.
50
Cf. AIMC VIII/7 1940 n. 36: Carta de P.e João Chiomio a P.e Victor Sandrone: Roma, 17-12-1940.
51
Cf. AIMC X/405 n. 17: Diário da Missão de Mitúcue, 28-2-1945; AIMC VIII/7 1944, n. 4: Carta de
P.e Domingos Ferrero a P.e Gaudêncio Barlassina: Mitúcue, 18-9-1944
52
O P.e Domingos Ferrero (1891-1973) tinha terminado o seu mandato como Vice-Superior Geral do Instituto. A
nova Direcção Geral nomeou-o Superior Delegado dos Missionários da Consolata no Niassa.
53
Os números apresentados exprimiam e confirmavam este progresso. Em 1939 - Padres: 6; Irmãos: 3; Irmãs: 9;
Católicos: 1.580. Em 1940 - Padres: 11; Irmãos: 5; Irmãs: 13; Católicos: 2.326. Cfr. AIMC VIII/7 1940, n.3: Relatório
anexo ao prospecto do estado da Missão do Niassa Português, Massangulo, 30-6-1940.
Em 1941 o P.e Domingos Ferrero transferiu a sua sede da missão de Massangulo para a missão
de Mitúcue, que se tornava assim a nova sede do Superior Delegado. De Mitúcue, missão mais
central, esforçou-se por acompanhar a par e passo a acção apostólica nas várias missões. A presença
do experiente P.e Ferrero no Niassa permitiu reforçar os vínculos de comunhão entre os
missionários presentes em Moçambique e com o Instituto. Com a entrada da Itália na II Guerra
Mundial a comunicação entre Turim e Moçambique tornou-se quase impossível. Através da
correspondência mantida entre o P.e Victor Sandrone, vice-superior geral, e o P.e Ferrero os
missionários do Niassa tomaram conhecimento da difícil situação em que se encontravam muitos
colegas, quer na Europa, presentes no campo de batalha como capelães militares, quer em África,
especialmente no Quénia, onde foram afastados das missões e aprisionados54.
54
Cf. AIMC VIII/7, 1940, nn. 17, 18, 19, 20: Cartas de P.e Victor Sandrone ao P.e Domingos Ferrero.
55
Cfr. Da Casa Madre, Janeiro, (1/1946) 15.
Stagni, André Salvini e Donato Sergi tomaram posse da missão de Unango, o P.e Carlos Lazzaron e
o Ir. Lourenço Baroffio ficaram em Mitúcue e o P.e Emílio Geromet foi para Maúa56.
No ano seguinte chegou a Moçambique um grupo de 12 missionários. Este precioso reforço iria
consentir a abertura da missão do Txaxe (Niassa) e de Mapinhane (Inhambane). Para as missões do
Niassa foram destinados os padres Camillo Ponteggia, José Valle, Mário Filippi, Adriano Severin e
os irmãos Bartolomeu Peretti, Hugo Versino, Mário Natali e Remo Cardinali e para as missões de
Inhambane os padres Pedro Quaglia e Celestino Blassuto e os irmãos José Eusébio e Sílvio Petris.
Em 1948 chegaram apenas quatro novos missionários - P.e João Vespertini, P.e Fernando Piccolo,
Ir. Bartolomeu Calleris e Ir José Chiappa -, todos destinados a trabalhar nas missões do Instituto no
Sul do Save. Nos anos seguintes a entrada de novos missionários diminuiu significativamente.
56
Eis o quadro da distribuição do pessoal missionário do Niassa, em Agosto de 1946: Missão de Massangulo:
P.e P. Calandri (superior), A. Lunati, L. Wegher e Ir. J. Benedetto; Missão de Mepanhira: P.e O. Abondio (superior),
A. Dall'Armi, M. Bianco, Ir. B. Lorenzatto; Missão de Mitúcue: P.e D. Ferrero, L. Bosio (Superior), M. Casanova,
C. Lazzaron, Ir. B. Liberini, C. Maritano, L. Baroffio; Missão de Maúa: P.e G. Gobbo (superior), E. Geromet; Missão
de Unango: P.e F. Stagni (superior), A. Salvini, D. Sergi; Missão de Marrere: P.e L. Oggé (Superior), Ir. J. Arneodo. Cf.
AIMC VIII/7 1946 n. 2: Relatório do 1°semestre: Mitúcue, 6-8-1946.
57
Alguns dados estatísticos referentes à diocese de Nampula no momento da sua criação (1940): Território:
277.980 km2; População: 1.947.836 habitantes; Pessoal missionário: Padres: 42; Clero secular: 9; Sociedade
Missionária Portuguesa: 6; Monfortinos: 16; Consolata: 11. Irmãos: Sociedade Missionária: 6; Monfortinos: 7;
Consolata: 5. Irmãs: Consolata: 27; Vitorianas: 14. Missões-Paróquias: 19.
58
A Santa Sé nomeou como Bispo de Nampula, o Frei Teófilo de Andrade, Superior Provincial dos Franciscanos
da Província Portuguesa. Tinha 60 anos e foi sagrado bispo na Sé de Lisboa a 29 de Junho de 1941. Chegado a
Imediatamente se pôs ao trabalho, seguindo as orientações que recebera de Roma e que a realidade
lhe impunha. Organizou a diocese em arciprestados e confiou cada um deles a uma congregação
missionária. O P.e Domingos Ferrero, superior dos missionários da Consolata, foi nomeado
arcipreste do Niassa59.
A guerra, embora tenha poupado o Niassa, não deixou de afectar indirectamente a acção
missionária. Durante cinco anos não chegaram novos reforços para dar continuidade ao enorme
trabalho pastoral e material iniciado. Os poucos missionários e missionárias estavam
sobrecarregados de compromissos e, consequentemente, cansados.
O ano de 1946 foi assinalado por três acontecimentos importantes: o início da actividade dos
Missionários da Consolata no Sul do Save (diocese de Lourenço Marques); a chegada ao Niassa de
um consistente reforço de missionários com sete padres, um irmão e seis irmãs e a assunção
pastoral de duas missões já fundadas, a Missão de S. António de Unango (Niassa) e a Missão de
S. João Baptista de Marrere (Nampula). Estas novas aberturas sobrecarregaram ainda mais a já
pesada responsabilidade confiada a tão poucos evangelizadores. A área confiada à cura pastoral do
Instituto era enorme. O apostolado era dificultado pelas enormes distâncias entre as povoações e
pela contínua mobilidade da população60.
O Superior Geral, P.e Gaudêncio Barlassina, visitando em 1948 as missões do Niassa constatou
directamente todo este esforço evangelizador realizado pelos missionários e os seus resultados61.
Nampula, realizou-se logo o acto de posse na pequena capela de Nossa Senhora de Fátima (10-11-1941). Para um maior
conhecimento da pessoa e obra do 1º Bispo de Nampula, ver: C.F. SILVA, Diocese de Nampula e o seu primeiro Bispo
(Braga 1954).
59
Com a provisão de 25 de Março de 1942, D. Teófilo de Andrade reconheceu as divisões territoriais confiadas às
congregações missionárias (Consolata, Monfortinos, Sociedade Missionária) e incrementou a responsabilidade destas na
evangelização dessas áreas, constituindo arciprestados. O território missionário do Niassa passou a chamar-se
Arciprestado dos Padres da Consolata e o P.e Ferrero foi nomeado arcipreste (7/4/1942). Cf. Provisão de 25-3-1942,
em: Boletim da Diocese de Nampula II, n. 2 (1942-43) 55, 112.
60
AIMC VIII/7 1946 n. 2: Relatório sobre o estado das missões no Arciprestado dos Padres da Consolata na
diocese de Nampula, Mitúcue, 18-1-1947.
61
Dados estatísticos referentes às missões do Niassa (1948) que bem documentam o progresso verificado no
campo da evangelização e da promoção humana: Missão de S. José de Mitúcue - padres: M. Casanova (superior),
A. Severin, D. Ferrero; irmãos: B. Liberini, C. Maritano, L. Baroffio; irmãs: Amabile Fagnani, Valeria Melzani,
Alfonsina Della Longa, Marcellina Vuillermin, Fiorenza Maggioni. População: 23.700; pagãos: 17.000; muçulmanos:
5.000; católicos: 1.522; protestantes: 400. Estruturas: internato masculino; internato feminino; oficina mecânica; fábrica
de tijolos e telhas.
Missão do Sagrado Coração de Jesus de Maúa - padres: O. Abondio (superior), C. Lazzaron; irmãos: Remo
Cardinali; irmãs: Onorata Foresti, Daria Pavese, Assuntina Riva, Livia Caffaratti. População: 23.000; católicos: 66.
Estruturas: internato masculino; internato feminino; carpintaria; escolas-capela: 12.
Missão de Santa Teresinha do Menino Jesus de Mepanhira - padres: G. Gobbo (superior), J. Valle, M. Bianco;
irmãos: B. Lorenzatto; irmãs: Generosa Bugatti, Antida Castino, Rosangela Bresciani, Eva Negro, Dolores Cozzi.
População: 26.000; católicos: 3.805; muçulmanos: 500; protestantes: 1.000. Estruturas: internato masculino; internato
feminino; escolas-capela: 45
Missão de São Francisco Xavier de Txaxe - padres: M. Filippi (superior), L. Oggé. População: 8.000; católicos:
96. Estruturas: residência; igreja; internato; escola (todas as construções em pau-a-pique); escolas-capela: 9.
Missão Nossa Senhora da Consolata de Massangulo - padres: P.e Calandri (superior), A. Lunati, L. Wegher,
F. Stagni; irmãos: Giuseppe Benedetto, M. Natali; irmãs: Armida Quaglia, Serena Bresolin, Laurina Carminati, Franca
Cavicchi, Renata Allena, Maria Anunziata. Católicos: 400.
Missão de S. António de Unango - padres: C. Ponteggia (superior), A. Dall'Armi; irmãos: B. Peretti; irmãs:
Leonzia Bernasconi, Sira Vimercati, Gianfranca Rota, Ottaviana Trombetta. Católicos: 531.
Missão de São João Baptista do Marrere - padres: D. Sergi (superior), Geromet, A. Salvini; irmãos: G. Arneodo,
U. Versino. Cf. Distribuizione del Personale Missionario. Mitúcue, 25-11-1948: AIMC IX/5-3, n. 327; Relatório das
Missões do Niassa ao Capítulo Geral de 1949. Mitúcue, 5-9-1949: AIMC V/3, n. 282.
Victor Sandrone e João Tolosano e o Ir. Bartolomeu Liberini e duas missionárias da Consolata:
Irmã Serena Bresolin e Rosangela Bresciani. Alguns dias depois, chegavam à missão de
Massangulo, acompanhados pelo P.e Calandri, o qual partiria para Itália no início de Setembro. A
separação da sua Massangulo foi dolorosa. Esperava voltar, mas isso não aconteceu. Depois de
alguns meses de repouso em Itália, os superiores destinaram-no ao Brasil62.
Com a partida do P.e Calandri o P.e Sandrone assumiu a direcção da missão e começou logo a
actuar um programa pastoral que permitisse um tipo de presença missionária diferente daquela que
era seguida até então. Insistiu sobre a necessidade de se dedicar mais tempo à pastoral directa e
menos aos internatos e à escola. Era pessimista quanto a uma possível abertura do povo ayao ao
Evangelho. Mostrava interesse sobretudo pelo povo anyanja e macúa, mais abertos e menos
islamizados. Propunha por isso a abertura de missões entre estas populações num futuro próximo63.
No dia 6 de Dezembro de 1936 chegaram à Ilha de Moçambique mais reforços para a missão de
Massangulo, os padres Gabriel Quaglia, Aldo Dall'Armi e o Ir. Corrado Maritano. Com a chegada
de mais dois padres o P.e Sandrone começou a sondar o lugar para a abertura de uma nova missão.
As suas visitas aos núcleos de católicos existentes à volta de Mepanhira, no sul do Niassa, foi a
ocasião para concretizar este projecto. No início de 1938 o P.e Sandrone partiu para Itália. Ao P.e
Gabriel Quaglia competia, agora, reger a missão de Massangulo e seguir directamente a
comunidade cristã de Mepanhira. Ele não morria de amores por Massangulo. Não era a missão nem
o trabalho apostólico com que sonhava. Tinha tido algumas dificuldades com os alunos mestiços e
não se sentia vocacionado para trabalhar numa missão que vivia quase para si mesma, com as suas
escolas e colégios. Estava desejoso de abrir outra missão fora do povo ayao. Mepanhira era a
possibilidade mais viável.
Em 1940 regressava a Massangulo o P.e Pedro Calandri, depois de quatro anos de ausência no
Brasil. O retorno do pioneiro da evangelização católica no Niassa era muito desejado e a sua
chegada foi alegremente celebrada. Encontrou a missão um pouco em crise. Com os seus
colaboradores, sobretudo o P.e Angelo Lunati e Luís Wegher, procurou com bom resultado elevar a
“sua” missão, a qual ganhou novo dinamismo. Surgiram, contudo, desarmonias com o Superior
Delegado, o P.e Domingos Ferrero. Este queria controlar as actividades da missão, o que bloqueava
as iniciativas do P.e Calandri, superior local, para relançar a missão depois dos anos de crise vividos
durante a sua ausência (1936-1940). Com a transferência do P.e Ferrero para a missão de Mitúcue,
nova sede do superior delegado, a crise foi superada. Continuou porém a haver alguma tensão entre
os dois missionários, o que contribuiu em parte para o isolamento da missão. A missão de
Massangulo consolidou-se sobretudo no sector escolar.
Um acontecimento trágico ensombrou a missão durante este período, foi a morte da Ir. Noemi
Fantin (31/1/1942)64.
62
Cf. L. WEGHER, Un uomo e la sua missione: Padre Pietro Calandri (Lichinga 1985) 167-168.
63
Cf. AIMC, VIII/7, 1936, n.8, Carta do P.e Victor Sandrone ao P.e Gaudêncio Barlassina, Massangulo, 10-10-
1936.
64
No dia 31 de Janeiro de 1942, depois de um longo sofrimento, faleceu na missão de Massangulo a Ir. Noemi
Fantin. Tinha 36 anos. Foi a primeira missionária da Consolata a falecer no Niassa. Cf. AIMC VIII/7 1942, n. 6: Carta
de P.e Domingos Ferrero a P.e Gaudêncio Barlassina, Mitúcue, 5-3-1942.
ler e a mostrar o catecismo a amigos e conhecidos. Visto que a nova religião suscitava interesse,
voltou mais tarde à Niassalândia para contactar com os missionários. Em 1927, apresentava-se aos
padres monfortinos da missão de Nguludi como vindo da terra da "Companhia" (Companhia do
algodão), que na boca dos macúas se tinha transformado em Mepanhira, do outro lado do Lago
Chirua65. O superior da missão interessou-se por conhecer a sua história pessoal, não perdendo a
ocasião de começar a instruí-lo na doutrina cristã. Ele passou a ser conhecido pelo catecúmeno de
Mepanhira. Regressou depois à aldeia de Mpopo, levando consigo alguns catecismos, uma medalha
e um grande crucifixo para a reunião dos catecúmenos. Começou logo a reunir à sua volta um grupo
de simpatizantes. Cada sete dias tocava a "Nipenka" (corneta indígena) e todos se lembravam que
era o "Namurungu" (Dia do Senhor). Na varanda da sua casa tinha fixado o crucifixo, e aí reunia os
catecúmenos. Nestas reuniões lia-se o catecismo e o Evangelho, rezavam-se orações e cantava-se.
Em 1929, com a criação da missão de Palombe, próxima da fronteira com Moçambique, os
contactos do catecúmeno de Mepanhira com os missionários tornavam-se mais frequentes. Na
missão de Palombe, Txipinenga encontrou no P.e Armando Michaud um interlocutor e animador.
Entretanto, continuou a sua preparação para o Baptismo e recebia conselhos sobre o modo como
instruir o grupo de catecúmenos que catequizava na região de Mepanhira, assim como instruções
para baptizar as crianças e os adultos em perigo de vida.
Na Páscoa de 1932, recebeu finalmente o baptismo. Foi-lhe dado o nome de João Baptista,
porque tinha sido o precursor de Jesus Cristo entre os macúas do Niassa. Com ele, foram baptizados
a sua esposa Teresa, os seus filhos Francisco e Maria e 30 catecúmenos de Mepanhira. Fortificado
pelo Baptismo e encorajado pelos missionários, João Baptista Txipinenga, com alguns colegas já
cristãos, começou a visitar as aldeias próximas para aí anunciar o Evangelho.
Em 1933 construía-se a primeira capela em Mpopo. Em Outubro desse ano o P.e A. Michaud da
missão de Palombe visitou pela primeira vez os cristãos de Mepanhira e celebrou a primeira missa
em Mpopo. Em 1934, o P.e Michaud visitou novamente os núcleos de cristãos que se formavam nas
várias aldeias. Visitou as capelas de Cuvinhe, Ciamba, Messossomera, Sale, Curea e Muheya.
Encontrou, nessas capelas, catecúmenos vindos até de Mutuali e Malema (actual província de
Nampula).
Em Outubro de 1936 o P.e A. Michaud encontrou-se em Limbe (sede do Vicariato do
Shire/Niassalândia), com o P.e Victor Sandrone, superior da missão de Massangulo, Como as
autoridades portuguesas não viam com bons olhos que padres estrangeiros entrassem em território
moçambicano para dar assistência religiosa aos católicos, o P.e Michaud pediu ao P.e Sandrone que
os missionários da Consolata acompanhassem esta cristandade a partir de Massangulo. Em seguida,
o P.e Michaud chamou o catequista João Txipinenga e pediu-lhe que fosse à missão de Massangulo
contactar os missionários. Entregou-lhe cartas de recomendação para o chefe do posto
administrativo de Mecanhelas e para o P.e Sandrone. Explicou-lhe que, a partir de então, os
missionários da Consolata eram os responsáveis pelos católicos de Mepanhira. João Txipinenga
partiu para Massangulo para se apresentar aos missionários e combinar com eles a forma e a data da
sua visita a Mepanhira. Manifestou, igualmente, o desejo dos católicos de Mepanhira em terem os
missionários definitivamente na sua terra. Convidou o P.e Sandrone, superior da missão, a visitá-los
e a passar o Natal com eles. A festa do Natal estava próxima e o missionário não pôde satisfazer o
pedido do catequista Txipinenga. Contudo, a sua viagem não foi inútil, pois o missionário em breve
iria visitá-los.
65
A evangelização católica da região sul do actual Malawi foi iniciada em 1901 pelos Padres Monfortinos. Para
um maior conhecimento da história da evangelização e método missionário, ver: H. REIJNAERTS-A. NIELSEN-M.
SCHOFFELLEERS, Monfortians in Malawi. Ther spirituality and pastoral approach (Blantyre 1997).
catecúmenos. Entretanto, o missionário ia sondando qual o local mais propício para fundar a
missão. A sua atenção recaiu sobre Mepanhira. O próprio João Baptista Txipinenga tinha a certeza
que os Missionários da Consolata se estabeleceriam ali, no sopé dos montes Ikuru e Mikoko, não
muito distantes da estrada que ligava o posto administrativo de Mecanhelas (Niassa) ao posto
administrativo de Molumbo (Zambézia). O clima era ameno e a terra fértil66. Feitas as despedidas, o
missionário partiu para Massangulo contente. O ambiente vivido dava as melhores esperanças para
o desenvolvimento de uma cristandade numerosa e viva. O território era bastante povoado e a
população ainda não tinha recebido o influxo islâmico. A seara já estava preparada e as perspectivas
de uma boa colheita eram certas.
Na Páscoa, o P. Sandrone efectuou uma segunda visita à região de Mepanhira, passando desta
vez pela localidade de Curea. Esta visita foi um sucesso, tanto que o missionário regressou a
Massangulo ainda mais animado. Contudo, não teve o privilégio de fundar a nova missão de
Mepanhira. De facto, poucos meses depois foi transferido para Itália, tendo ficado o P.e Gabriel
Quaglia como superior. Antes de partir, visitou pela última vez a comunidade cristã de Mepanhira.
Com eles passou o Natal, tendo baptizado 120 catecúmenos.
Ao P.e Gabriel Quaglia competia, agora, seguir directamente a comunidade cristã de Mepanhira.
Em finais de Abril de 1938 visitou pela primeira vez os cristãos de Mepanhira. A recepção foi
festiva. Lá estavam João Txipinenga e Miguel Misissi e os outros catequistas com um grande grupo
de cristãos e catecúmenos. Depois desta primeira visita voltou a Massangulo determinado a fundar a
missão de Mepanhira. Faltava apenas a autorização explícita do Bispo, a qual chegou algum tempo
depois. Em Agosto o P.e Quaglia visitou de novo a comunidade de Mepanhira para comunicar aos
cristãos que brevemente a missão seria aberta. Confirmou o lugar para a implantação da missão, já
indicado pelo P.e Sandrone. No local, existira outrora uma plantação de tabaco de um colono
alemão, com algumas construções. Com o auxílio dos cristãos deu-se início aos trabalhos de
reabilitação, recuperando os armazéns de secagem do tabaco e adaptando-os como estruturas
provisórias da missão.
No fim de Setembro, o P.e Quaglia visitou novamente a região. Foi uma longa viagem apostólica
que lhe permitiu conhecer grande parte das escolas-capela do Lúrio e de Mecanhelas. No dia 15 de
Outubro reuniu-se com todos os catequistas da região em conselho, num total de 27. Discutiram
vários assuntos referentes ao funcionamento das escolas e da catequese. No dia seguinte,
acompanhado pelo catequista João Txipinenga, prosseguiu a sua visita às escolas-capela das
redondezas. Depois disso, o P.e Quaglia regressou a Massangulo. Na visita seguinte regressaria a
Mepanhira já com o pessoal missionário, para dar início à nova missão.
66
Cf. V. SANDRONE, "La missione del Niassa Portoghese": Missioni Consolata (1/1939) 6.
67
Cfr. AIMC X/411 n.6: Diário da Missão de Mepanhira, 26-11-1938.
não concluída, já era pequena para tanta gente. Após a celebração seguiu-se a catequese, deixando o
terço e a bênção do Santíssimo para a tarde. No dia seguinte chegaram os catecúmenos das várias
escolas para os escrutínios. Depois dos exames, cada um recebeu a sua medalha. O Natal estava à
porta. No dia 23, numa solene eucaristia, foram baptizados 230 adultos em dois turnos. No dia 24,
celebraram-se 25 matrimónios, e à tarde foram baptizadas 40 crianças68. O dia de Natal foi solene.
Houve três missas com muita afluência de fiéis.
Os missionários estavam contentes. A resposta da população à proposta evangélica feita pelos
catequistas nas várias aldeias era positiva. As suas 50 escolas-capela, exigiam agora uma atenção
pastoral que mantinha os missionários num trabalho constante de acompanhamento e animação das
mesmas. Empenharam-se de imediato no apostolado missionário directo, visitando com frequência
as capelas, os doentes e moribundos.
Desde a fundação da missão que se sentia a necessidade da presença de irmãs,
particularmente no sector da promoção humana. No dia 26 de Julho de 1939, chegavam a
Mepanhira as primeiras Missionárias da Consolata: Ir. Amabile Fagnani, Ir. Antida Castino, Ir.
Speranza Longhi e Ir. Rosangela Bresciani. Foram recebidas num clima de grande festa pelos
cristãos e catecúmenos que acorreram das escolas-capela da zona para ver as tão desejadas
Avirgo69. De imediato, encarregaram-se dos doentes, fazendo tratamentos no ambulatório da missão
e nas suas próprias casas, durante as visitas às aldeias. Dedicavam-se igualmente à educação das
jovens e das mulheres.
No dia 11 de Novembro de 1939 D. Teodósio de Gouveia visitou a missão de Mepanhira
tendo administrado o sacramento do crisma a 400 cristãos. Dois anos depois, um novo pastor,
D. Teófilo de Andrade, nomeado primeiro bispo de Nampula, em 19 de Junho de 1941 visitou a
missão de Mepanhira. Nesta ocasião, durante uma solene celebração, D. Teófilo administrou o
sacramento do crisma a um numeroso grupo de cristãos. A missão de Mepanhira recebeu outras
visitas ilustres. No dia 23 de Junho 1945 foi a vez do Bispo da Beira, D. Sebastião Soares Resende.
Em visita pastoral à parte norte da sua diocese (no território da actual Diocese de Gurue),
aproveitou a ocasião para se deslocar a Mepanhira. Antes da divisão da Prelazia de Moçambique em
dioceses, a missão de Mepanhira tinha aberto algumas escolas-capela para além do Lúrio. Com a
criação da diocese da Beira estas comunidades ficaram no território desta diocese. Porém, os padres
de Mepanhira continuavam a ser os responsáveis pelo acompanhamento destas comunidades até à
fundação da missão da Santa Cruz de Molumbo. Nesta visita, o bispo manifestou o seu apreço pelo
trabalho missionário aí realizado70.
68
Cfr. AIMC X/411 n.6: Diário da Missão de Mepanhira, 25-12-1938.
69
Cf. AIMC X/411 n.6: Diário da Missão de Mepanhira: 26/7/1939.
70
O bispo da Beira deixou escrito no diário da Missão de Mepanhira: Visitei esta missão em 23-24 de Junho de
1945. Encontrei aqui imensa satisfação, beleza natural e artística, alegria e piedade, espírito missionário na sua
genuína pureza. AIMC X/ 411 n. 6: Diário da Missão de Mepanhira, 24-6-1945.
nova abertura. Foram escolhidos para tal tarefa o recém-chegado P.e Luís Bosio e o P.e Mário
Casanova.
Na madrugada de 31 de Julho, os padres Bosio e Casanova, acompanhados pelo P.e Quaglia,
partiram da missão de Mepanhira para iniciar a nova fundação. Ao meio dia chegaram a Cuamba e,
depois de uma breve pausa, percorreram os 18 Km que os separavam de Murusso, o local provisório
escolhido para a nova missão. Foram recebidos festivamente pelo catequista Miguel Misissi que,
com alguns cristãos de Mepanhira, tinha chegado alguns dias antes, para preparar a casa onde os
missionários se instalariam. O catequista Miguel não voltou mais para Mepanhira, ficando ao
serviço da nova missão da qual se tornará uma robusta coluna. Depois da oração de agradecimento,
realizaram uma breve inspecção ao lugar. No dia seguinte celebraram a primeira missa. Logo após,
concluíram a construção da residência-palhota. Uma divisão da casa foi transformada em capela, na
qual sobressaía o quadro de S. José, padroeiro da missão. Instalaram as coisas mais urgentes: portas,
janelas e camas; a cozinha seria, por agora, ao ar livre.
O local e a casa de Murusso eram provisórios. O projecto inicial de instalar a missão no sopé do
monte Mitúcue, a 2 km de distância de Murusso, só não se concretizou devido ao obstáculo natural
que impedia o acesso: o rio Mwanda. Era necessário construir uma ponte, mas faltavam os recursos
económicos e os meios técnicos. Era preciso esperar por melhores dias.
A vida quotidiana era uma contínua e intensa preparação para uma acção apostólica fecunda. Os
missionários esforçavam-se por aprender a língua macúa, para melhor contactar com a população e
explorar a região.
71
Cf. AIMC, XIII, 629: L. BOSIO, Vida de acampamento. Notas de diário.
receber o baptismo. Alguns dias depois os missionários regressaram à missão, contentes com tudo o
que viram e confiantes quanto à adesão da população ao Evangelho.
Em Outubro iniciava-se a escola na missão. O primeiro grupo de alunos incluía 14 rapazes das
redondezas de Murusso, que começaram a aprender a ler e a escrever com o professor Romildo
Zama, um jovem formado na missão de Massangulo. O interesse suscitado pela escola superou as
expectativas dos missionários, que temiam que os pais impedissem os rapazes de a frequentar, o que
não aconteceu. O programa de estudo era integral - aprendizagem da língua portuguesa, leitura e
escrita, ginástica, canto e trabalho – com um horário bastante exigente.
No dia 10 de Novembro, D. Teodósio de Gouveia, de viagem para Mepanhira, visitou a nascente
missão. No regresso, passou novamente por Murusso e administrou o crisma a cinco cristãos, tendo
encorajado os missionários a continuarem com entusiasmo o seu empenho apostólico.
Pelo Natal realizou-se o primeiro “msunkano” (encontro de oração e formação) na missão. Na
véspera construíram-se algumas palhotas para albergar cristãos e catecúmenos. No dia 23, pela
madrugada, chegavam os primeiros vindos da capela de Muheya, seguidos, durante o dia, pelos
cristãos e catecúmenos das capelas de Mukatare, Mwitetere, Rapela e Curea. O clima era festivo.
Entre cristãos e catecúmenos eram cerca de 200 pessoas. No dia seguinte procedeu-se à
apresentação e ao registo dos candidatos ao baptismo. A selecção destes baseou-se em duas
condições: dois anos de preparação e o conhecimento, com a relativa explicação, do catecismo.
Depois do exame foram admitidos 47 catecúmenos ao baptismo. À tarde os catequistas deram as
últimas instruções aos catecúmenos e celebraram-se os baptismos. A vigília festejou-se ao som de
cânticos e orações. No dia de Natal foram abençoados 17 matrimónios. Após o almoço os cristãos
partiram para as suas casas72.
72
Cf. AIMC X /405, n.17: Diário da Missão de Mitúcue, pp.7-8.
73
Cf. AIMC X/405 n. 17: Diário da Missão de Mitúcue, p.16.
74
Em seguida a comunidade das missionárias foi enriquecida com a chegada da Ir. Speranza Longhi, que viria a
falecer em 1945.A morte da Ir. Speranza foi muito sentida. Tinha chegado ao Niassa em 1939 e em Mepanhira tinha
emitido a sua profissão perpétua. Um ataque de febre emoglobinúrica levou-a em poucos dias à morte. Faleceu no dia
24 de Junho e foi sepultada no cemitério da missão de Mitúcue. Cf. AIMC X/405 1945 n.1: Lutto missionario alla
Stazione di S. Giuseppe di Mitúcue, p. 2.
tornou-se, como já vimos, a sede do superior delegado dos Missionários da Consolata (P.e
Domingos Ferrero) e da superiora delegada das Missionárias da Consolata (Ir. Emma Rinaudo).
No território confiado aos missionários de Mitúcue existiam uma centena de aldeias, a maior
parte das quais concentradas nas margens dos rios Lúrio, Mwanda, Luleyo e Mpopola, e
subdivididas em três grandes regulados - Matias, Cuamba e Muikuna. Do ponto de vista pastoral-
missionário, o território da missão era constituído por três zonas distintas com características
próprias: 1) zona sul (Lúrio): que pertencia anteriormente à missão de Mepanhira e passou a
depender de Mitúcue, bem como as sete escolas-capela aí existentes; 2) zona nordeste (Luleyo):
onde já existiam alguns núcleos de catecúmenos em Mwetetere, Mukatare e Nesara; 3) zona oeste:
região pouco povoada, em que as aldeias eram dispersas, concentrando-se nas proximidades do
Lago Amaramba. A influência muçulmana era forte e só mais tarde os missionários visitariam estas
aldeias e fundariam as primeiras escolas-capela.
Para conhecer a região oeste e determinar os limites entre a missão de Mitúcue e a missão de
Mepanhira, o P.e Luís Bosio, superior da missão de Mitúcue, efectuou com o P.e Oberto Abondio,
superior da missão de Mepanhira, uma viagem de reconhecimento na região do Lago Amaramba. A
viagem tinha como finalidade contactar aldeias ainda não visitadas, estudar a possibilidade de
fundar novas escolas-capelas e demarcar os limites entre as duas missões. Partiram de Mitúcue no
dia 3 de Novembro de 1942, acompanhados pelo catequista Miguel de Mitúcue e por um grupo de
carregadores, em direcção noroeste. Passaram pelas povoações dos chefes Macawe, Napita,
Mongora, Mpomola, Nansya, Msimburaghe e depois de alguns dias chegaram finalmente às
margens do Lago Amaramba. Dali seguiram viagem para sul em direcção ao Lago Chiuta, passando
pelas aldeias dos chefes Ciwaia e Abudu. Em Chiuta, estabeleceram que o limite entre a missão de
Mepanhira e de Mitúcue passava por este lugar. Nas aldeias percorridas, os missionários visitaram
as famílias e consultaram os chefes sobre a possibilidade de abrir escolas nas suas povoações, mas a
adesão foi fraca pois a maior parte da população era muçulmana.
Terminada a visita, a comitiva separou-se e enquanto o P.e Abondio regressava a Mepanhira, o
P.e Bosio voltava para Mitúcue percorrendo outro itinerário. Passou pelas aldeias dos chefes
Mopiha, onde foi bem acolhido, Muela e por fim chegou à estrada Mecanhelas-Cuamba. Passou por
Mepesseni, onde já funcionava uma escola-capela e chegou finalmente a Mitúcue. Durante 15 dias
os padres Bosio e Abondio percorreram um longo itinerário com cerca de 250 km que os levou a
visitar pela primeira vez a zona noroeste das respectivas missões. Uma região profundamente
islamizada, nomeadamente algumas aldeias da região do Lago Amaramba e Chiuta. Foram poucos
os chefes que acolheram com agrado a proposta da criação de escolas para os seus súbditos75.
Todavia, esta viagem foi importante porque, além de contribuir para delimitar os confins entre as
duas missões, abriu uma nova fronteira de evangelização, numa zona fortemente islamizada.
A actividade missionária era acompanhada pela construção das estruturas necessárias à
consolidação da missão. Neste sentido, Mitúcue teve a honra de possuir a primeira igreja em
alvenaria do Niassa. Depois de longos meses de trabalho, a obra iniciada em Outubro de 1943, foi
consagrada no dia 8 de Setembro de 1945 por D. Teófilo de Andrade. Construída com sacrifício
devido à falta de mão-de-obra e de material, o novo templo dedicado a S. José, que imitava o estilo
românico, permitia acolher de modo condigno o Senhor e o seu rebanho. O principal artífice da
construção foi o Ir. Bartolomeu Liberini.
Em 1947 a missão de Mitúcue viu-se privada do P.e Luís Bosio, fundador e superior da missão,
destinado a Portugal para director do seminário da Consolata de Fátima. Não foi fácil para o P.e
Bosio deixar Mitúcue depois de anos de intenso trabalho, mas, por obediência, aceitou a vontade
dos superiores. No dia 25 de Setembro 1947 celebrou a última missa na missão rodeado pelos
alunos, catequistas e fiéis vindos das várias capelas. Depois da missa, despede-se com saudade da
sua missão, à qual nunca mais regressará76.
75
O P.e Luís Bosio escreveu o diário desta visita apostólica. Cfr. L. BOSIO, "Da Cuamba al Lago Amaramba",
Missioni Consolata n.20 (1947) 191-193; n.22 (1947) 223-224; n.23 (1947) 242-245.
76
Cf. AIMC VII/1263, n. 34: L. BOSIO, Dalla Missione di S. José de Mitúcue (Niassa) à Cidade Eterna.
2.1.4. A Missão do Sagrado Coração de Jesus de Maúa (1940)
No dia 11 de Julho de 1940, o P.e Gabriel Quaglia e o Ir. Bartolomeu Liberini partiram para
Maúa, para dar início à fundação da missão do Sagrado Coração de Jesus. Instalaram-se
provisoriamente numa casa na sede de Maúa e começaram a percorrer a zona à procura do lugar
indicado onde implantar a missão. Num encontro com o gerente local da Sociedade Algodoeira
(Sagal), este sugeriu-lhes o monte Mukopo, situado a 12 km da sede, como ideal para a fundação.
No dia 15 de Julho visitaram, in loco, o sopé do Mukopo. Puderam verificar com os próprios olhos
que tinham sido bem aconselhados. Os riachos Namikopo e Namissoro asseguravam água suficiente
para as necessidades da missão e a terra apresentava-se fértil. Regressando a Maúa, comunicaram
ao régulo a intenção de fundar uma missão na sua terra. Este acolheu com interesse o projecto dos
missionários e visitou com eles o lugar escolhido. No dia 23 de Julho deixaram Maúa e dirigiram-se
para o sopé do Monte Mukopo, dando início à construção das primeiras palhotas.
No dia 5 de Agosto o P.e João Tolosano, que até então tinha trabalhado em Massangulo, foi
enviado para Maúa como superior da missão e o Ir. Bartolomeu Liberini foi destinado a Mitúcue,
para acompanhar os trabalhos de construção das estruturas da missão. Os padres Quaglia e
Tolosano começaram a visitar as aldeias da região, tentando dar início às primeiras escolas. Na
missão, iniciou-se de imediato a escola, frequentada por 20 alunos.
O local escolhido para a missão era óptimo, mas, em comparação com Mepanhira e Mitúcue,
apresentava maiores dificuldades no apostolado. Enquanto na área destas duas missões tinha havido
uma pré-evangelização, consequência dos contactos da população com as missões de Niassalândia
(Malawi) e do apostolado de alguns neófitos, nesta região de Maúa o influxo cristão era nulo. Além
disso, a influência muçulmana era mais forte entre a população77.
77
Cf. AIMC VIII/7 1940, n. 35: A Missão do Niassa Português. Relatório semestral (1/8/-31/12/1940),
Massangulo 31/12/1940.
Em 1947 o P.e Mário Casanova e o recém-chegado P.e Mário Filippi foram incumbidos de
fundar a nova missão. Feitos os preparativos para a viagem, partiram em direcção ao Txaxe,
passando por Mwetetere, Mukatare, Nesara e Mpwera. No dia 31 de Maio de 1947, festa da SS.
Trindade, chegaram ao Txaxe e instalaram-se provisoriamente numa gruta78. No dia seguinte,
acompanhados pelo grupo de cristãos de Mukatare, Nesara e Mukupira, celebraram a primeira
missa em honra de S. Francisco Xavier, padroeiro da nova missão. Em seguida, ajudados pelos
cristãos, começaram os primeiros trabalhos de instalação. Entretanto, o estado de saúde do
P.e Filippi deteriorou-se com uma forte malária que o obrigou a ficar de cama alguns dias. Em sua
substituição, assumiu os trabalhos o P.e Casanova, que foi por sua vez substituído alguns dias
depois pelo Ir. Bartolomeu Liberini.
78
Cf. AIMC X/410 n. 1: Diário da Missão de S. Francisco de Xavier do Txatxe: 31-5-1947.
79
Cf. AIMC VIII/7 1946 n. 2: Relatório sobre o estado das missões no Arciprestado dos Padres da Consolata na
diocese de Nampula: Mitúcue, 18-1-1947
80
Cf. AIMC VIII/7 1946 n. 29: Carta de P.e Domingos Ferrero a P.e Victor Sandrone: Mitúcue 10-8-1946.
81
Cf. AIMC VIII/7 1934 n. 3: P. CALANDRI, Le Missioni dei 4 distretti del Nord: Massangulo, 2-8-1934.
82
AIMC X/ 406 n. 6: Cf. B. MAZULA, Missão de S. António de Unango: Traços históricos, p.1.
83
Era desejo da Santa Sé, das autoridades eclesiásticas e dos Missionários da Consolata fundar a Igreja do Niassa
sobre bases sólidas. Paralelamente à formação de catequistas para o apostolado, desde o início se pensava e trabalhava
no sentido de promover vocações para o sacerdócio e vida religiosa. Por vontade expressa de D. Teófilo de Andrade,
Bispo de Nampula, o Seminário Menor de Unango começou a funcionar em finais de Outubro de 1942. Foi confiado à
direcção dos padres da Sociedade Missionária Portuguesa. O P.e Serafim Pinto Ferreira foi o seu primeiro reitor. Até à
sua transferência para a Missão de S. João Baptista de Marrere (1947) reuniu 13 candidatos ao sacerdócio, na sua
maioria oriundos das missões de Mepanhira e Mitúcue. Dos alunos enviados pelos padres de Mitúcue, chegou um ao
sacerdócio, o P.e Miqueias Malôa, primeiro sacerdote macúa, ordenado no dia 12 de Dezembro de 1956.
colocando assm todo o Niassa nas suas mãos. No dia 31 de Julho de 1946 os padres Fernando
Stagni, André Salvini e Donato Sergi substituiram os missionários portugueses e as irmãs
Missionárias da Consolata, Ottaviana Trombetta, Amabile Fagnani e Gianfranca Rota, as irmãs
Vitorianas.
84
Com o fim da Companhia do Niassa (1929) o território sob o seu domínio passa para a administração directa do
Estado. Tal território foi dividido em dois Distritos administrativos: Cabo Delgado, com sede em Porto Amélia, e
Niassa com sede em localidade a determinar posteriormente. Em 17 de Outubro de 1931 foi escolhido o terreno no
planalto da serra de Lichinga, junto à estrada de Mandimba a Metangula e a cerca de 146 quilómetros de Mandimba.
Assim nasce a povoação de Vila Cabral, em homenagem ao então Governador-Geral, coronel José Ricardo Pereira
Cabral. O Pe. Pedro Calandri, consultado pelas autoridades, indicou o planalto de Lichinga, bem conhecido por ele,
como o local ideal para a fundação da capital do Niassa. Cf. L. WEGHER, Um olhar sobre o Niassa, Vol.I, (Maputo
1995) 151.
85
Cf. AIMC VIII/7 1947, n. 56: Carta de P.e Domingos Ferrero a P.e Victor Sandrone: Unango, 7-11-1947.
86
Cf. AIMC VIII/7 1946 n. 7: Carta de P.e Domingos Ferrero a P.e Gaudêncio Barlassina: Mitúcue, 7-7-1946.
por dificuldades de ordem politico-eclesiástica. Nos finais dos anos 40, via-se a conveniência de
realizar, quanto antes, esta fundação. Aos interesses de ordem religiosa – dar assistência aos
católicos amatengo, fazer frente à propaganda anglicana e subdividir o imenso território da missão
de Unango – juntavam-se os de ordem política. As autoridades coloniais queriam limitar a
influência inglesa, representada pelas missões anglicanas. Depois das viagens apostólicas
efectuadas pelos padres Pedro Calandri e André Salvini, o P.e Eugénio Menegon, em 1950, deu
início efectivo à Missão dos Santos Anjos de Cobué, nas margens do Lago Niassa.
87
Os missionários chegaram até Chia, sede da missão anglicana de S. Bartolomeu, que ainda tinha os seus
edifícios à beira do lago. O responsável da missão de Messsumba era o venerado P.e H. Cox. O número de cristãos
anglicanos ultrapassava já os 5.000, distribuídos por 47 escolas-capela e assistidos por uma equipa de três clérigos, 50
professores e 30 catequistas. Cerca de 2.000 crianças frequentavam as escolas da missão.
88
Os padres Beneditinos da Abadia de Ndanda (Tanzânia) tinham pedido para fundar uma missão na região do
lago, para assistir os católicos amatengo que tinham passado para o Niassa. O pedido não foi aceite. Os amatengo
tinham-se refugiado porque o régulo Manhai tinha-se recusado a aceitar a autoridade dos ingleses quando estes
procederam ao recrutamento de jovens para a guerra (1940). As autoridades decidiram puni-lo. Para escapar ao castigo
fugiu com o seu grupo para o território português, instalando-se na aldeia de Manhai (1941). Cf. AIMC VIII/7, 1935,
n.3: Carta de P.e Pedro Calandri ao Cardeal Eugénio Pacelli. Massangulo, 28-7-1935.
missionários89. Deste modo, respondendo ao pedido do Chefe Lipoche, o P.e André Salvini
efectuou uma longa viagem apostólica que o levou a percorrer as margens do lago até Chiwindi, no
extremo norte. Partiu de Unango no dia 9 de Janeiro de 1948, passou por Chia e daí continuou a pé
até Ngoo, onde foi acolhido por um padre anglicano. No dia 12 de Janeiro continuou a viagem de
canoa até Mbueka, seguindo por Cobué, Mataka e Manhai. Nesta última localidade, onde já existia
uma escola-capela católica, foi recebido pelo catequista Johannes e pelos católicos que acorreram
para acolhê-lo e participarem na Santa Missa90. No dia seguinte, o missionário reuniu-se com os
catequistas para tomar conhecimento do status animarum e para programar o trabalho pastoral
futuro. O P.e Salvini permaneceu ainda alguns dias em Manhai para tomar contacto com a
população, recolher informações etnográficas e geográficas e verificar as reais possibilidades para a
fundação de uma missão. Localizou nove aldeias que não estavam assinaladas no mapa do Niassa e
apercebeu-se que o fluxo migratório proveniente de Tanganica aumentava a população local.
Aproveitou também para conversar com Shauritanga, filho e sucessor do régulo Manhai, o qual o
informou que seu pai desejava que os missionários católicos fundassem uma missão na sua terra91.
No dia 19 de Janeiro o P.e Salvini embarcou numa canoa com direcção a Munghi, passando por
Samata, Nyanja, Nkumbili e Ngombi, onde fez escala. O mau tempo obrigou-o a prosseguir a
viagem a pé até Liúchi, onde pernoitou. No dia seguinte chegou a Munghi, onde foi recebido pelo
catequista Pedro e por um grupo de cristãos. Acompanhado pelo catequista visitou as famílias
católicas, tendo baptizado seis crianças e abençoado três matrimónios. Nesta localidade funcionava
já uma escola católica de recente fundação. Em seguida, prosseguiu a pé passando por Mpendeka,
onde existia uma escola-capela construída há pouco tempo, na qual administrou nove baptismos e
abençoou três matrimónios. No dia 22 chegou a Lipoche, aldeia sede do régulo, e daí avançou até
Chiwindi. Na região encontrou núcleos de católicos oriundos de Tanganica, ainda assistidos
religiosamente pelos padres Beneditinos. No dia seguinte, embarcou de regresso a casa, fazendo
uma breve paragem em Lipoche para conhecer o parecer do régulo sobre a proposta da construção
da escola. No dia 24 seguiu para Cobué, continuando para a ilha de Likoma, onde se concluía o
Sínodo Diocesano Anglicano, no qual participavam os padres H. Cox e H. Thomas de Messumba.
Findo o encontro, partiu com eles no barco a vapor até Messumba, onde pernoitou na missão. No
dia seguinte, o P.e Cox emprestou-lhe uma bicicleta e o P.e Salvini pôde seguir para Metangula,
onde conseguiu uma boleia de camioneta até Unango.
89
Apesar das dificuldades, a presença missionária anglicana na região do Lago Niassa manteve-se activa. A
missão principal continuou a ser Messumba e as missões secundárias eram Metónia, Unango, Ngoo e Chitege, que
tinham um grande número de capelas e escolas. Existiam capelas dispersas por toda a área, lideradas por padres locais,
responsáveis pela acção pastoral no território da sua jurisdição. As escolas até então numerosas, diminuíram e viram a
sua acção dificultada. O superior era ainda o Padre H. Cox, um missionário inglês muito querido na região.
90
Cf. AIMC VII/1014, n.2: A. SALVINI, Sulle sponde del Niassa (Unango 1948) p.11.
91
Nesta região, habitada pelos amatengo, os católicos eram cerca de 350, aproximadamente um terço da
população. A. SALVINI, Sulle sponde del Niassa (Unango 1948) 12-13.
construir a nova missão. Depois de longos anos de espera e ultrapassadas as dificuldades, era
possível concretizar um antigo sonho92.
O P.e Calandri assumiu o empenho de iniciar os trabalhos preliminares. No dia 12 de Julho de
1950 deixou Massangulo, acompanhado pelo Ir. Bartolomeu Peretti, com destino ao lago.
Percorreram a região com o objectivo de escolher o local ideal para a missão, mas a tarefa não era
fácil visto que essa zona de Chikoa era pantanosa. Depois de constatarem que o lugar não reunia as
condições, foram procurar outro local mais favorável em direcção ao norte. Continuaram a pesquisa
de barco, junto à margem do lago. Depois de uma penosa navegação desembarcaram na baía de
Cobué, no dia 19 de Junho, vigília da festa de Nossa Senhora da Consolata. Finalmente tinham
encontrado o local ideal para fundar a missão do Lago Niassa.
Além da beleza natural do lugar, a proximidade da ilha de Likoma (sede da histórica missão
anglicana) foi outro factor que contribuiu decisivamente para a escolha de Cobué. A festa da
Consolata trouxe a Cobué o presente da primeira eucaristia celebrada à beira do lago. Terminada a
celebração subiram a colina para uma vista de olhos sobre a área circunstante. Não muito distante
dali encontrava-se uma escola-capela católica, dependente da missão de Unango. Procedeu-se à
escolha do local para a implantação da missão. O terreno escolhido situava-se na proximidade do
lago, a 200 m a norte da escola-capela.
Nesse ano, o P.e Calandri voltou a visitar a região do lago e iniciou os trabalhos de implantação
da missão de Cobué, com o fabrico de tijolos, abertura dos alicerces e transporte dos materiais. Em
Novembro chegou ao Niassa o P.e Eugénio Menegon. Depois de alguns dias de permanência na
missão de Massangulo, partiu com o P.e Calandri para iniciarem a fundação da missão de Cobué.
No dia 24 de Novembro chegaram a Cobué. Depois de ter instruído o P.e Menegon sobre os
trabalhos que se deveriam realizar, o P.e Calandri entregou-lhe a tarefa e partiu para Massangulo. O
P.e Menegon dedicou-se de corpo e alma aos trabalhos de implantação da missão.
92
AIMC X/415 n. 1, Diário da Missão de Cobué, p. 4.
2.2. Sul do Save: Inhambane e Lourenço Marques (Maputo)
O ano de 1946 foi assinalado por um acontecimento importante: o início da actividade dos
Missionários da Consolata no Sul do Save como resposta ao convite feito pelo Arcebispo de
Lourenço Marques um ano antes. De facto, em Junho de 1945 o Cardeal D. Teodósio Clemente de
Gouveia, de visita a Roma, teve um colóquio com o Superior Geral dos Missionários da Consolata.
Neste encontro convidou o Instituto a trabalhar na sua extensa diocese, que abrangia os distritos de
Lourenço Marques, Gaza e Inhambane, alegando que não possuía pessoal missionário suficiente.
Além disso, argumentava ainda que a propaganda protestante era muito forte, existindo várias
estações missionárias de diferentes denominações e que havia zonas onde a presença católica era
reduzida a algumas escolas-capela, muitas das quais em decadência. O P.e Gaudêncio Barlassina,
Superior Geral, respondeu positivamente ao pedido de D. Teodósio de Gouveia aceitando que o
Instituto assumisse a evangelização da parte norte do distrito de Inhambane. Regressando a Turim,
o P.e Barlassina informou o Conselho Geral sobre a proposta do Arcebispo de Lourenço Marques93.
O Conselho deu a sua aprovação e imediatamente fez a lista de mais 11 missionários para
Moçambique, cinco dos quais destinados ao Sul do Save. Em Julho de 1946 estes missionários
fundaram a Missão do Coração Imaculado de Maria de Massinga e a Missão do Sagrado Coração de
Jesus de Nova Mambone (distrito de Inhambane).
Em 1947, com a chegada de uma nova expedição de missionários, foi possível efectuar a
abertura da Missão de S. José de Mapinhane, que permitiria a assistência às populações junto à
estrada nacional e às comunidades da circunscrição de Vilankulo, e em 1948 abrir a Missão de
Santa Ana de Maimelane e alargar o campo de evangelização mais a sul até à capital, Lourenço
Marques, onde os Missionários da Consolata assumiram a cura pastoral da Missão de Santa
Teresinha do Menino Jesus de Liqueleva.
93
O D. Teodósio de Gouveia queria que os Missionários da Consolata assumissem, num primeiro tempo, a missão
de Bilene (Gaza), dirigida até então pelos padres Seculares, e posteriormente, a evangelização da parte norte do distrito
de Inhambane. Cfr. AIMC, IV/5, n.1545: Acta do Conselho Geral, reunião de 2-3 Agosto de 1945.
94
O território da zona norte do Distrito de Inhambane estava dividido em três circunscrições administrativas:
Massinga: 23.000 km2 e 43.773 habitantes; Vilankulo: 14.000 Km2 e 58.386 habitantes; Govuro: 16.910 Km2 e 23.138
habitantes.
95
Cf A. RITA-FERREIRA, Povos de Moçambique. História e Cultura (Lisboa 1975) 43.
escassez de pessoal missionário tinham impedido uma efectiva acção evangelizadora. As visitas dos
padres das missões limítrofes eram raras e o apostolado era feito pelos poucos catequistas das
escolas-capela dispersas pelo território. Por sua vez, a presença protestante era numericamente
superior e mais activa do que a católica. Havia uma rede bem organizada de centros de propaganda,
dirigidos por missionários locais, que usavam sempre a língua xitshwa e tinham livros estampados
nesta língua. Os católicos baptizados eram um pequeníssimo grupo, insignificante em termos
numéricos. A maior parte da população praticava a religião tradicional com todos os seus ritos96.
96
Indígenas: 246; europeus: 88; mestiços: 57. Os catecúmenos eram cerca de 1000, na sua maioria alunos das
escolas. Cf AIMC/VIII, 8, 1946, n. 2: Prospecto do Estado das Missões do Arciprestado de Vilankulo. Massinga, 16-
01-1947.
97
Cf. AIMC, VIII/8/1946, n.12: Carta de P.e Gabriel Quaglia a P.e Gaudêncio Barlassina. Massinga, 11-08-1946.
Mambone para Massinga, o P.e Maggiore deixou Massinga para ir fundar a Missão de Mapinhane e
o P.e Tolosano trocou Nova Mambone por Mapinhane.
Entretanto, surgiam os primeiros frutos do trabalho, nomeadamente o desenvolvimento da
Missão de S. José de Mapinhane, o baptismo de catecúmenos, a entrada de três seminaristas de
Massinga no seminário diocesano e a abertura de escolas. Os missionários esforçavam-se por
estudar as línguas locais e prepararam um catecismo bilingue Português-Xitshwa98.
Contudo, o apostolado no Sul do Save apresentava-se difícil, de modo particular entre a
população adulta que mostrava indiferença e até hostilidade à pregação dos missionários. As visitas
ao domicílio e a assistência aos doentes eram dificultadas pela desconfiança da população. Por isso,
os baptismos in extremis eram raros. Os católicos eram poucos e viviam distantes das sedes das
missões. A frequência aos sacramentos era baixa. Em parte, esta atitude devia-se à falta de
preparação e à raridade da presença do sacerdote nas comunidades. No passado, os próprios
professores-catequistas demonstravam um certo desinteresse em participar nos encontros de
formação a eles destinados.
A obra de evangelização continuava a realizar-se quase exclusivamente nas escolas. Mesmo
assim, durante esse ano, os frutos foram escassos por causa da falta de alunos e da pouca preparação
dos professores-catequistas. O ciclone e a seca obrigaram muitos jovens abandonar as suas aldeias,
emigrando para as cidades e, principalmente, para as minas da África do Sul. As escolas de Nova
Mambone, Maimelane e Mapinhane que prometiam bons resultados ficaram quase vazias. A missão
de Massinga foi a que teve mais movimento missionário.
As missões enfrentavam também dificuldades de ordem material, nomeadamente a escassez de
material como argila, pedra, madeira para as construções, a falta de mão-de-obra e as chuvas
irregulares. Tudo isto comportava muito trabalho e despesas enormes, absorvendo tempo e energia
que os missionários deviam dedicar ao apostolado. Estas dificuldades não impediram a implantação
das missões e o seu desenvolvimento material. O violento ciclone que em Março de 1948 percorreu
a região norte Inhambane causou graves danos materiais às missões destruindo as construções já
edificadas.
98
Cf. AIMC, XIII, n. 679: Catecismo Católico em língua Xitswa e Português (Lourenço Marques 1948)
99
A Missão de S. José de Môngue, fundada pelos Jesuítas, foi a primeira a ser criada na zona de Inhambane (5 de
Maio de 1890). Porém, não se desenvolveu muito porque em 1910 D. Francisco Ferreira da Silva propôs que passasse à
categoria de simples estação missionária e que se criasse uma nova missão em Homoíne, que viria a ser fundada pelos
padres Franciscanos em 1911. Em 1923 a Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Inhambane foi confiada aos
Franciscanos que a elevaram a missão. A Missão de Inhambane, além do concelho do mesmo nome, tinha a seu cargo a
evangelização da circunscrição de Massinga. Cf. F. F. LOPES, Missões Franciscanas em Moçambique 1898-1970, 336.
anos pelos padres Franciscanos. Os missionários iam tomando contacto com a população, estudando
o território e visitando as sete escolas a eles confiadas, procurando também o lugar para a fundação
da missão. Acabaram por se instalar em Mangonha, a 7 km da sede administrativa de Massinga,
onde iniciaram logo as construções provisórias da residência, capela e escola em pau-a-pique. O
P.e Gabriel Quaglia, superior do grupo dos Missionários da Consolata no Sul do Save e arcipreste
de Vilankulo, fixou em seguida residência nesta missão100.
No dia 13 de Dezembro de 1947 chegava a Massinga o primeiro grupo de irmãs da Consolata: Ir.
Tarcisia Imboldi, superiora, Floriana Jericijo, Irene Schwarz, Marchina Raineri, Gian Carla
Ferraris101. Com a sua chegada abrem-se novas perspectivas para o apostolado. Com este reforço a
missão de Massinga/Mangonha continuava a ser a missão que registava maior movimento
missionário. A pouco e pouco transformou-se num centro de intensa actividade pastoral e escolar.
Em 1948 os baptizados católicos eram 500. Funcionavam 13 escolas, frequentadas por cerca de
3000 alunos. Nessa altura, os padres chegavam já à região de Funhalouro, onde funcionava uma
escola-capela. A comunidade missionária era formada pelos padres Osvaldo Peressini e João
Vespertini e pelo Ir. José Chiappa. As Missionárias da Consolata, além do trabalho no dispensário e
das visitas às povoações, começavam a fazer apostolado directo na escola.
100
Cf. AIMC X/421, n.1: Diário da Missão de Massinga, pp. 1-6.
101
Cf. AIMC X/421, n.1: Diário da Missão de Massinga, pp. 3-6.
102
Já em 1926, o P.e António Ribeiro, superior da Beira, num relatório enviado aos superiores de Portugal,
manifestava o interesse de abrir em Nova Mambone uma sucursal missionária: Para tornar mais eficaz o
desenvolvimento religioso desta missão (Beira) era de grande necessidade uma sucursal ou missão na região de
Mambone. É dali que vem o maior contigente de serviços para esta cidade. Com um pouco de tradições cristãs que
ainda conservam, são os que mais se aproximam de nós. Regressando às suas terras, sem ninguém que os assista, tudo
perdem de novo. Relatório do Superior da Beira, para o Prelado Reg. corresp. expedida, em: F.F. LOPES., Missões
Franciscanas em Moçambique 1898-1970 (Lisboa 1972) 472.
103
Eis o conteúdo da Provisão: Havemos por bem criar a Missão do Sagrado Coração de Jesus, de Govuro,
coincidindo a sua área jurisdicional com os limites da Circunscrição do mesmo nome, extinta a Missão de
S. Boaventura de Mambone. Livro de Provisões do Arcebispado de Lourenço Marques, em: F. F. LOPES, Missões
Franciscanas em Moçambique 1898-1970 , 473.
armazém e casas caíram por terra. Os missionários procuraram remediar de imediato os danos, mas
a situação permanecia difícil104.
Apesar das dificuldades, trabalhava-se com entusiasmo. Na festa do Sagrado Coração de Jesus
de 1948 davam entrada no catecumenado 40 alunos. Algumas semanas depois, o P.e José Bottacin
visitou Inhassoro e escolheu o lugar para a construção da escola. No dia 16 de Agosto de 1948, a
missão de Nova Mambone acolhia o primeiro grupo de irmãs da Consolata, formado pelas irmãs
Tarcísia Imboldi, Floriana Jericijo e Marchina Raineri, provenientes de Massinga105.
104
Em: Da Casa Madre, n. 58 (Agosto 1948) 42.
105
Cf. AIMC X/414, n. 1: Diário da Missão de Nova Mambone, pp. 9-42.
106
Cf. AIMC X/416, n. 1: Diário do Arcipreste de Vilankulo, pp. 1-4.
107
Cf AIMC X/417, n. 2: Diário da Missão de Mapinhane, pp. 1-3.
Mambone, sendo substituído pelo P.e Celestino Blassuto. Em Maimelane, as dificuldades do
apostolado são as mesmas que nas outras missões. A propaganda protestante é muito forte e bem
apetrechada, possuindo a Bíblia traduzida em Xitshwa108.
108
Cf. AIMC X/417, n. 2: Diário da Missão de Mapinhane, pp. 1-6.
109
Cf. AIMC, VIII/8, 1948, n. 4: Carta do Cardeal Teodósio de Gouveia ao P.e Gaudêncio Barlassina, Superior
Geral. Lourenço Marques, 17/9/48.
TERCEIRO PERÍODO (1951-1965):
INCREMENTO DA EVANGELIZAÇÃO E PROMOÇÃO HUMANA
E ORGANIZAÇÃO DO INSTITUTO MISSIONÁRIO DA CONSOLATA EM
MOÇAMBIQUE
Introdução
Durante o período de tempo entre 1951 e 1965, que antecedeu e preparou o Concílio
Vaticano II, a Igreja Católica conseguiu implantar-se em todo o território moçambicano. Para
salvaguardar esta expansão eclesial, os bispos chamaram várias congregações missionárias para
trabalhar nas suas dioceses. Com os subsídios do Estado e a chegada de novos missionários, a
evangelização prosseguiu o seu caminho com mais entusiasmo e planificação. Fundaram-se missões
em quase todas as circunscrições administrativas, construíram-se estruturas para consolidar o
trabalho missionário, nomeadamente igrejas, escolas, internatos, hospitais, maternidades e os
primeiros seminários. Expressão deste esforço missionário foi a criação de novas dioceses:
Quelimane em 1954; Porto Amélia (actual Pemba) em 1957; Tete em 1962; Inhambane em 1962 e
Vila Cabral (actual Lichinga) em 1963.
As primeiras missões fundadas pelos Missionários da Consolata cresceram, dando por sua vez
origem a outras missões que, entretanto, foram surgindo. Neste período foram criadas seis missões
no Niassa: Nossa Senhora da Conceição de Vila Cabral (1960); Nossa Senhora da Assunção de
Nova Coimbra (1962); São Miguel de Nova Freixo (1962); Nossa Senhora do Loreto de Cureia
(1962); Rainha Santa Isabel de Esperança-Litunde (1965) e Santo Condestável de Marrupa (1965).
Na Arquidiocese de Lourenço Marques e diocese de Inhambane foram erigidas também seis
missões: S. Gabriel Arcanjo da Matola (1951); Sagrada Família da Machava (1956); Nossa Senhora
do Rosário de Muvamba (1960); Santa Teresinha do Menino Jesus de Liqueleva (1962); Santo
Condestável de Boane (1963) e Nossa Senhora de Fátima de Vilankulo (1964). Realizaram-se as
primeiras ordenações de sacerdotes locais, entre os quais o primeiro missionário da Consolata
moçambicano, o P.e Amândio Dide em 1965 (Itália). Aumentou o número de seminaristas e de
irmãs locais. Todo este enorme esforço de evangelização por parte dos Missionários da Consolata e
seus colaboradores preparou o terreno para o despontar das novas dioceses de Inhambane (1962) e
Vila Cabral (1963).
À imagem do que acontecia por todo o Moçambique, a pastoral praticada pelos Missionários da
Consolata dava um espaço cada vez maior às obras de promoção humana (escolas, hospitais,
oficinas), as quais, absorviam tempo aos agentes de pastoral. A evangelização directa, que tinha na
visita às aldeias o seu elemento metodológico fundamental, não foi abandonada, mas deixou de ser
a opção prioritária. Deu-se maior importância à formação cristã das novas gerações, através da
escola. Os baptismos passaram a ser administrados maioritariamente aos alunos e cada vez menos a
adultos, sobretudo no Sul do Save. Não se promoveu suficientemente o sentido comunitário da
celebração e da vivência da fé. A velha geração de catequistas (de João Txipinenga e companheiros)
foi acantonada e substituída por uma nova geração de professores-catequistas melhor preparados
intelectualmente, mas menos identificados cultural e religiosamente, e por isso mesmo menos
zelantes.
A exigência de mais missionários era cada vez maior. Os superiores do Instituto,
principalmente a partir de 1956, procuraram prover de pessoal missionário as missões de
Moçambique, embora houvesse solicitações de outros campos de apostolado em África e nas
Américas. Neste período, os missionários destinados a trabalhar em Moçambique foram:
Grupo do Niassa: Ir. Albino Henriques (1957); P.e Mário Teruzzi (1958); P.e Luís Fiorini, P.e
Manuel Tavares, P.e Joaquim Alves Ferreira, P.e José Lopes Pequito, Ir. Afonso José Nunes,
Ir. Vicente Dias Crisóstomo, Ir. Benjamim Prata, Ir. Miguel Domingues Santos (1959); P.e Mário
Spangaro (1961); P.e Mário Teodori, Ir. Alexandre Moura Valente (1963); P.e Vidal Moratelli
(1964); P.e Gelindo Scottini, P.e Ernesto Motta (1965).
Grupo de Inhambane e Lourenço Marques: Ir. José Cardinali (1955), P.e Lourenço Stimoli,
Ir. António dos Reis Gonçalves, Ir. Francisco Neves da Silva (1957); P.e João Merlo, P.e Aldo
Mongiano, P.e Manuel Marques, P.e Artur Rodrigues (1958); P.e António da Costa Gaspar, P.e
Francisco Marques, Ir. José Soares de Almeida (1959); P.e Henrique Da Croce (1961); P.e Silvestre
Liberini, P.e Ferdinando Piccoli (1963); P.e Silvestre Bettinsoli, P.e João Armando (1964);
P.e Joaquim Ferreira de Almeida, P.e Artur Marques (1965).
O Instituto assentava raízes sólidas em Moçambique com a chegada deste expressivo
contingente de religiosos, onde já se encontravam jovens padres e irmãos portugueses e brasileiros.
Por isso mesmo, era necessário que o Instituto se organizasse internamente para melhor responder
às exigências da vida religiosa e do apostolado. O novo Superior Geral, P.e Domingos Fiorina,
procurou acompanhar de perto a vida dos missionários através de visitas e de uma intensa
correspondência, para lhes dar orientações claras sobre uma presença evangelizadora mais
significativa. Insistiu muito sobre a importância da comunhão entre os membros, impulsionando
deste modo, a criação da Região Moçambique, com um único superior a coordenar os grupos do
Niassa e de Inhambane e Lourenço Marques. Até então, devido à distância geográfica e outros
condicionalismos, estes dois grupos formavam duas entidades independentes.
Neste período de tempo registaram-se as mortes de cinco missionários da Consolata. No dia
20 de Outubro de 1951 faleceu na missão de Mapinhane o P.e Pedro Quaglia. Tinha 38 anos de
idade e foi o primeiro missionário da Consolata a morrer em Moçambique. Cinco anos depois
falecia o P.e Gabriel Quaglia (irmão mais velho do P.e Pedro Quaglia), a 15 de Novembro de 1956,
em Joanesburgo quando viajava para Itália à procura de tratamento médico mais adequado. A sua
morte causou tristeza e deixou vazio um lugar difícil de preencher. Com a sua experiência e
entusiasmo, orientara a fundação das missões de Mepanhira, Mitúcue e Maúa. Mais tarde o Cardeal
D. Teodósio de Gouveia quis que fosse ele o responsável do grupo que iniciou as actividades dos
missionários da Consolata na Arquidiocese de Lourenço Marques. O P.e Gabriel Quaglia foi um
missionário extraordinário e completo. Num corpo frágil e doentio, vibrava um espírito forte.
Possuía muitos dons. Era bom escritor, poliglota, etnólogo, pintor, arquitecto (foi ele o autor do
projecto das igrejas de Mepanhira e Mitúcue), músico, fotógrafo, etc. Ele foi também o mestre de
uma geração de missionários no Niassa e em Inhambane. Nesse mesmo ano falecia, na Missão de
Maiaca, o Ir. Bartolomeu Lorenzatto. Em Moçambique desde 1938, colocou a sua competência
técnica ao serviço das construções das missões de Massangulo, Maúa, Mepanhira e Maiaca.
Sobrecarregado de trabalho, viria a falecer no dia 29 de Abril. A sua construção mais famosa é, sem
dúvida, a Igreja de Santa Teresinha do Menino Jesus de Mepanhira. Em 1960, viriam a falecer
outros dois beneméritos da evangelização do Niassa: o Ir. Bartolomeu Liberini e o P.e Ângelo
Lunati. O irmão faleceu em Nova Freixo no dia 26 de Novembro. Depois de uma fecunda
experiência missionária no Quénia, chegara ao Niassa em 1936, trabalhando em diferentes missões
onde, com o seu suor surgiram muitas construções. Era um homem de oração e sacrifício, o seu
testemunho religioso edificava aqueles com quem convivia. Alguns dias antes morrera em Portugal
o P.e Ângelo Lunati, outro pioneiro da evangelização do Niassa, onde chegara em 1928. Foi o fiel e
incansável colaborador do P.e Calandri na edificação da Missão de Massangulo e o organizador do
sector escolar. Depois de 30 anos de actividade em Moçambique, foi destinado a Portugal onde
faleceu pouco tempo depois da sua chegada.
110
Cf. Carta de P.e Domingos Fiorina, Superior Geral, aos missionários da Consolata de Moçambique (3-10-
1951): Bollettino dell’Istituto Missioni Consolata 14 (1952) 43-44.
111
Cf. Carta circular do P.e D. Fiorina, Superior Geral, aos missionários da região de Moçambique. Turim, 16-2-
1956: Bollettino dell’Istituto Missioni Consolata 29 (1956) 18-23.
112
Cf. Carta conclusiva do P.e D. Fiorina, Superior Geral, ao P.e D. Ferrero, Superior Delegado, Mitúcue,
4/11/1955: AIMC IX/6-5, n.131.
113
Cf. Carta circular do P.e D. Fiorina, Superior Geral, aos missionários da Região de Moçambique. Machava, 8-
9-1965: Bollettino dell’Istituto Missioni Consolata 29 (1965) 28-30.
1.2.Criação e funcionamento da Região de Moçambique
Depois de ter realizado um óptimo trabalho na formação de novos missionários no seminário
do Instituto, em Fátima (Portugal), o P.e Aldo Mongiano foi nomeado superior da Delegação dos
Missionários da Consolata em Moçambique pelo Conselho Geral, em 1958 114. Para as funções de
conselheiros foram escolhidos o P.e Osvaldo Peressini, vice-superior e os padres Ângelo Lunati,
Mário Casanova e Amadeu Marchiol115. O pessoal missionário do Arciprestado do Niassa,
Arciprestado de Vilankulo (Inhambane) e o grupo de missionários que trabalhava em Lourenço
Marques, passaram a depender deste novo conselho.
Apesar de ser inexperiente quanto às problemáticas de Moçambique, o P.e A. Mongiano
esforçava-se por desempenhar bem a sua função de superior. Partilhava as responsabilidades com os
seus conselheiros, estudando os vários problemas. Após a sua nomeação, visitou todas as missões e
contactou com todos os missionários, inteirando-se do seu trabalho pastoral e esclarecendo-os sobre
a nova situação jurídica criada com a erecção da Delegação de Moçambique.
No ano seguinte, os padres A. Mongiano e E. Menegon representaram os missionários de
Moçambique no IV Capítulo Geral do Instituto Missionário da Consolata (Turim, 4 de Maio a 23 de
Junho de 1959), no qual o P.e D. Fiorina foi reeleito superior geral.
Por decreto de 5 de Novembro de 1960, a nova direcção geral erigiu a Região dos
Missionários da Consolata de Moçambique, cuja padroeira passou a ser Nossa Senhora de
Fátima116. Pouco depois, foram nomeados os quatro conselheiros do superior regional,
nomeadamente os padres E. Menegon, A. Marchiol, M. Manuel Marques e J. Pequito117.
Tendo em conta a distância entre Inhambane-Lourenço Marques e o Niassa e a consistência
numérica dos missionários que trabalhavam neste último distrito foi criada a Delegação do Niassa e
para o cargo de superior delegado foi escolhido o P.e Eugénio Menegon (12 de Janeiro de 1961),
que assumiu também o cargo de arcipreste do Niassa, transferindo-se do Cobuè para Vila Cabral.
Tinha como conselheiros os padres Camilo Ponteggia e José Pequito.
Em 28 de Março de 1963 o P.e Aldo Mongiano foi reconduzido como superior da Região de
Moçambique, o mesmo acontecendo com os quatro conselheiros118.
114
Cf. Carta do P.e Domingos Fiorina, Superior Geral, aos missionários da Região de Moçambique. Turim, 20-3-
1958: ArqRegMoç. B.10, n.21.
115
Cf. Carta do P.e Aldo Mongiano aos missionários da Região de Moçambique: Matola-Rio, 10-4-1958.
ArqRegMoç. B 11, n.1.
116
Decreto 162/60: Consultado o Conselho Geral do Instituto na reunião do dia 30 de agosto de 1960; visto o
Rescrito Ap. n.4296/60 do dia 7 de Setembro 1960; visto o Decreto n. 49/58 com o qual se erigia a Delegação,
entendemos erigir, e de facto erigimos a Delegação de Moçambique em Região de Moçambique do Instituto Missões
Consolata, a norma das Constituições, conferindo à mesma os deveres, direitos, faculdades, concessões, privilégios e
favores que disfrutam as outras Regiões do Instituto Missões Consolata, “servatis servandis”, e colocamo-la sob a
protecção da SS. Virgem de Fátima. Turim, 5-11-1960: Bollettino dell’Istituto Missioni Consolata 24 (1959-1960) 34.
117
Cf. Carta do P.e Aldo Mongiano, Superior Regional, aos missionários de Moçambique. Machava, 4-10-1961:
ArqRegMoç. B 10, n.41.
118
Cf. Carta de P.e Domingos Fiorina, Superior Geral, ao P.e Aldo Mongiano, Superior Regional de Moçambique.
Turim, 28-3-1963: ArqRegMoç. B 12, n.113.
professores/catequistas: 48; catequistas: 113; escolas: 60; alunos: 5.945; escolas de artes e ofícios:
7; aprendizes: 305; dispensários: 6; consultas médicas: 1.236.707 119.
Nesta ocasião, o Superior Geral sugeriu a troca de pessoal missionário entre as diferentes
missões. A mais beneficiada foi a missão de Massangulo. Depois dos constantes apelos do
P.e Calandri, o P.e Fiorina via a conveniência de investir mais nesta missão, considerando as suas
particularidades e história. O P.e Ernesto Motta chegou para colaborar com os padres Ângelo
Lunati e Luís Wegher nas escolas. Foram destinados os padres Oberto Abondio e Emílio Geromet
para o apostolado nas escolas-capela que, com o seu dinamismo missionário contribuíram para o
aumento das comunidades cristãs. A Escola de Artes e Ofícios adquiriu mais vida com a chegada
dos irmãos Hugo Versino, Bartolomeu Peretti e Lourenço Baroffio. Igualmente visitada pelo
Superior Geral, Cobuè prosseguia com os trabalhos de construção da missão em ritmo lento, por
escassez de materiais e de mão-de-obra. No entanto, o P.e Menegon, com o auxílio do experiente
P.e Calandri, levou para a frente os trabalhos com a construção da barca Consolata e da lancha
Santos Anjos, que facilitaram o transporte de materiais pelas águas do lago. Em Agosto foi
destinado a esta missão o P.e André Salvini, com o encargo de assistir as escolas-capela. Estavam
reunidas as condições para que o trabalho pastoral e material procedesse de modo mais regular,
com a presença fixa dos padres Menegon e Salvini.
O ritmo de trabalho nas outras missões era bom. A missão de Mepanhira era aquela que
apresentava maior movimento. No dia 20 de Setembro de 1951 inaugurava-se a monumental Igreja
de Mepanhira e o primeiro grupo de irmãs da Congregação da Imaculada Conceição emitia a sua
profissão religiosa.
Na festa de Nossa Senhora da Consolata, a 20 de Junho de 1953, missionários, autoridades
civis e religiosas reuniram-se à volta do P.e Calandri e companheiros para celebrar as bodas de
prata da Missão de Nossa Senhora da Consolata de Massangulo (1928-1953). Apesar das
dificuldades do apostolado, a obra missionária realizada contava nos seus registos 1.456 baptismos
e 106 matrimónios celebrados. Mais significativa, sem dúvida, era a obra realizada no campo
escolar, especialidade da missão, em termos quantitativos e qualitativos. Desde os humildes inícios
de 1928 até à data, 3.528 alunos e 973 alunas tinham frequentado a escola de Massangulo. Os
missionários constatavam com alegria que a quase totalidade destes jovens já estavam inseridos no
mundo do trabalho, de norte a sul de Moçambique, nos mais diversos sectores de actividade. Por
outro lado, a desconfiança e adversidade inicial da população ayao tinha-se atenuado. Sem
aderirem abertamente ao cristianismo, compreendiam que a religião cristã possuia um suplemento
de caridade e dinamismo. O milagre de Massangulo estava na conquista da amizade da população.
Em Julho de 1958, pouco depois da sua eleição como Superior dos Missionários de
Moçambique, o P.e Aldo Mongiano viajou para o norte em visita aos missionários do Niassa.
Depois de uma paragem em Nampula, onde se encontrou com D. Manuel Medeiros Guerreiro,
sucessor de D. Teófilo de Andrade na direcção da diocese, prosseguiu viagem para a missão de
Mitúcue onde trocou impressões com o Arcipreste, P.e Domingos Ferrero. Em Massangulo, além de
conhecer a missão, reuniu-se com os conselheiros da Região de Moçambique para o Niassa. Visitou
ainda as missões de Unango, Cobuè, Mepanhira, Maúa e Maiaca. Durante este tempo teve a
possibilidade de falar com todos os missionários e verificar, de perto, o trabalho por eles realizado.
Quer no sector pastoral, quer na promoção, constatou que todos trabalhavam seriamente e num
contexto muito difícil, devido às distâncias, escassez e mobilidade da população em algumas
regiões, diferenças de língua, islamismo, número insuficiente de missionários e problemas de saúde.
Cada missão se esforçava por se apetrechar com as estruturas necessárias, daí que o movimento de
obras e construções era grande. Em Mitúcue construía-se o internato feminino, confiado mais tarde
à direcção das irmãs diocesanas do convento de Mepanhira. Na construção das igrejas, Cobuè
119
La missione del Niassa Portoghese nel 1951: Missioni Consolata 53 (1951) 256.
avançava a bom ritmo, enquanto Massangulo dava os primeiros passos e Maúa acabava de abrir os
alicerces120.
Nos anos seguintes, sobretudo entre os macúas, os frutos recolhidos eram abundantes.
Todavia, os missionários constatavam com preocupação a diminuição do entusiasmo que a
população manifestava no passado. Com o passar dos anos diminuiu o número de catequistas e, em
compensação, aumentou o número dos professores. Esta mudança teve consequências negativas
sobre o funcionamento das comunidades cristãs nas escolas-capela mais distantes do centro da
missão. Diminuíram as conversões e a frequência aos sacramentos. As escolas enfrentavam algumas
dificuldades, sobretudo na qualidade do ensino ministrado, que não era satisfatória. Nesta altura
colocavam-se grandes esperanças nos internatos das missões onde os alunos estudavam e eram
formados à disciplina, frequentando regularmente os sacramentos. Era entre estes alunos e alunas
que se manifestavam as vocações para a vida religiosa e sacerdotal121.
Com o objectivo de relançar a actividade missionária e inserir o pessoal recém-chegado, em
Setembro de 1961, o P.e A. Mongiano e o P.e E. Menegon, Superior Delegado, procederam ao
intercâmbio do pessoal entre as missões. Assim, o P.e Casanova foi nomeado superior da missão de
Mepanhira, o P.e Geromet, superior de Maúa, o P.e Ferrero, superior de Mitúcue, o P.e Teruzzi,
superior de Cobuè, o P.e Menegon, superior de Vila Cabral, o P.e Abondio, coadjutor em Maúa, o
P.e Oggé, coadjutor em Unango, o P.e Spangaro, coadjutor em Mepanhira, o P.e Tavares, coadjutor
em Mitúcue, o P.e Joaquim Ferreira, coadjutor em Massangulo e o P.e Luís Fiorini, coadjutor de
Cobuè122.
Em Janeiro de 1965, após a criação da Diocese de Vila Cabral, foi inaugurado o Santuário de
Nossa Senhora da Consolata de Massangulo por D. Eurico Dias Nogueira. Os trabalhos iniciaram
em 1954 e foram dirigidos pelo Ir. L. Baroffio. Obra idealizada pelo P.e Calandri, é admirável a sua
original arquitectura e a quantidade de obras de arte que adornam o seu interior, grande parte delas
da autoria do próprio e dos alunos da escola de arte de Massangulo. Assistiu comovido ao acto de
inauguração do santuário, pois esta obra tinha-lhe custado muitos sacrifícios e também algumas
críticas. Já idoso e cansado, tinha passado a direcção da missão para as mãos do P.e Camílio
Ponteggia, em 1962, até então superior em Unango.
120
Cf. Relatório da visita aos missionários do Niassa (Diocese de Nampula) apresentada pelo P.e Aldo Mongiano
ao P.e Domingos Fiorina, Superior Geral. Matola, 21-10-1958: ArqRegMoç B. 12, n.14.
121
Cf. Relatório do estado da Missão IMC do Niassa do ano 1960. Mitúcue, 29-1-1961. ArqRegMoç: A 5, n.20.
122
Cf. Carta de P.e Aldo Mongiano, Superior Regional, a P.e Domingos Fiorina, Superior Geral. Machava, 2-10-
1961: ArqRegMoç. B 12, n.82.
123
Cf. L. WEGHER, Un uomo e la sua missione. Padre Pietro Calandri, Manuscrito, (Lichinga 1985) 290.
Em 1951 concretizou-se a transferência da Missão de São Francisco Xavier, do sopé do
Monte Txaxe para o do Monte Maiaca. O isolamento, a escassez da população, a insalubridade do
lugar e outras dificuldades convenceram o P.e M. Filippi da conveniência de transferir a missão
para um local mais favorável. Escolheu o Monte Maiaca, junto ao Rio Masekesi, e aí iniciou os
trabalhos de construção124. Em 1953, a residência dos padres já estava construída e nesse ano
chegaram a Maiaca novos reforços: o P.e D. Sergi e o Ir. B. Lorenzatto. De imediato as obras se
intensificaram com a residência das irmãs, os internatos masculino e feminino e o próprio trabalho
pastoral, num local onde já funcionavam 12 escolas-capela. Em 1955 deu-se início à construção da
igreja, que foi inaugurada no dia de Natal de 1957. Nesse mesmo ano, 2 de Julho de 1957, as
missionárias da Consolata iniciaram a sua actividade na missão de Maiaca.
Os Missionários da Consolata viam a urgência de criar condições para a constituição de
uma futura diocese no território confiado à sua responsabilidade pastoral. Para isso, além de
consolidarem as missões já existentes, era necessário fundarem outras novas. Por provisão de 29 de
Dezembro de 1960, D. Manuel de Medeiros Guerreiro criou a Missão de Nossa Senhora da
Conceição. Situada na periferia da cidade de Vila Cabral (Lichinga), o seu território foi
desmembrado da Paróquia de São José de Vila Cabral e era assistida pelos padres da missão de
Unango. O primeiro superior foi o P.e E. Menegon, coadjuvado pelo P.e Joaquim Alves Ferreira.
Situada em território ayao, contava com apenas 184 católicos.
No dia 15 de Agosto de 1962, festejava-se a erecção da nova Diocese de Vila Cabral e D.
Manuel de Medeiros Guerreiro celebrava o seu 25º aniversário de ordenação episcopal, enquanto
assinava o decreto com o qual erigia as paróquias de S. Miguel de Nova Freixo (actual Cuamba), de
Nossa Senhora de Loreto de Curea (ambos os territórios desmembrados da Missão de S. José de
Mitúcue) e de Nossa Senhora do Lago de Metangula (desmembrada da missão de Cobuè).
124
Cf. M. FILIPPI, Alcuni ricordi di vita missionaria in Mozambico, p. 4: AIMC VII/1498 n. 26.
125
O primeiro Bispo de Vila Cabral, D. Eurico Dias Nogueira, nasceu em Dornelas do Zêzere (Portugal) no dia 6
de Março de 1923. Ordenou-se sacerdote em Coimbra a 22 de Dezembro de 1945, tendo partido para Roma onde se
formou em Direito Canónico. Em Outubro de 1948 iniciou o exercício do seu ministério sacerdotal em Coimbra,
repartido por inúmeras actividades. Em 10 de Julho de 1964 foi escolhido pelo Papa Paulo VI para primeiro bispo da
nova Diocese de Vila Cabral, tomando posse por procuração, em 6 de Setembro. No dia 6 de Dezembro de 1964
recebeu a ordenação episcopal em Coimbra, tendo chegado à sede da sua diocese em 2 de Janeiro de 1965. Cf. Anuário
Católico de Moçambique: 1966 (Lourenço Marques 1966) 451-452.
126
Cf. CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE MOÇAMBIQUE, Anuário Católico de Moçambique: 1966 (Lourenço Marques,
1966) 474.
P.e Joel Carlos como seu director. O P.e Manuel Tavares foi nomeado director do Lar Académico
João XXIII e professor de Moral na Escola Técnica. Indicou como pároco de Nova Freixo, o
P.e Joaquim Alves Ferreira e como pároco interino de Vila Cabral o P.e Jorge Camejo. Fundou
também as missões sucursais do Santo Condestável de Marrupa e da Rainha Santa de Esperança de
Litunde (Majune). Fez um reajustamento nas áreas das missões e das paróquias, para tornar mais
fácil a sua evangelização. Pelo mesmo motivo, fez a divisão da diocese em dois arciprestados com
sedes em Vila Cabral e Nova Freixo. O primeiro arciprestado abrangia as paróquias e missões entre
as populações anyanja e ayao e tinha como arcipreste, o P.e E. Menegon. O segundo, que
compreendia a área macúa, tinha como arcipreste, o P.e D. Ferrero127.
127
Cf. Carta de D. Eurico Dias Nogueira aos superiores das missões. Vila Cabral, 20-8-1965: ArqRegMoç. A 2,
n.104.
128
Cf. Relatório do estado da Missão IMC do Sul do Save do ano 1956. Mapinhane, 5-2-1957: ArqRegMoç: A 5,
n.8.
Para ter uma ideia mais completa da situação dos missionários, o P.e Aldo Mongiano visitou
em Junho de 1958 as missões do Arciprestado de Vilankulo, começando pela missão de Massinga,
onde pôde trocar impressões com o P.e J. Paleari, superior da missão e novo arcipreste, sucessor do
P.e Quaglia. A impressão captada sobre os missionários e seu trabalho era positiva. Trabalhavam
com dedicação. Na missão de Massinga/Mangonha, além do P.e José Paleari, trabalhava o
P.e Armanno Armanni. Em Mapinhane, o P.e Gerardo Gumiero, novo superior, tinha como
colaboradores o P.e Artur Rodrigues e os irmãos José Cardinali e António Gonçalves. Na missão
de Maimelane trabalhavam os padres Celeste Blasutto e Manuel Maria Marques e o Ir. José
Eusébio. Em Nova Mambone, a equipa missionária era constituída pelo P.e Amadeu Marchiol e
pelo Ir. Sílvio Petris.
Nesta data, o pessoal missionário era insuficiente para dar resposta a todos os empenhos
pastorais assumidos pelo Instituto, uma vez que o número de missionários era idêntico ao de 1949.
Nos últimos dez anos os empenhos pastorais tinham aumentado, mas não os obreiros da missão, o
que gerou lacunas na escolarização, na formação dos cristãos e dos catecúmenos, em particular. Em
Massinga/Mangonha o movimento era grande e as obras de construção da igreja já estavam
concluídas. Na missão de Mapinhane a situação era um pouco difícil, devido ao período de
incerteza que se seguiu à morte do P.e Gabriel Quaglia. No que respeita a Maimelane e Nova
Mambone os trabalhos de evangelização e promoção corriam tranquilamente129.
O apostolado continuava a percorrer a via do catecismo escolar. As escolas eram alavancas que
faziam com que a evangelização católica progredisse, em detrimento da propaganda protestante.
Muitos dos alunos que frequentavam as escolas das missões eram membros de outras igrejas e
através da escola aderiam à Igreja Católica. Outros não tinham filiação religiosa bem definida e a
escola tornava-se um autêntico catecumenado. Entre todas, a missão de Massinga/Mangonha era a
que dava frutos cristãos mais espontâneos e abundantes. No campo do ensino esta missão
apresentava também óptimos resultados. A afluência escolar era mais constante que o habitual e os
chefes locais pediam, insistentemente, escolas e professores para as suas aldeias. Nas missões de
Mapinhane e Maimelane a frequência era boa, mas mantinha um certo carácter de pressão, caso
contrário poucos frequentariam a escola.
Com o objectivo de superar os desafios pastorais e as dificuldades sentidas no apostolado, era
necessário diagnosticar as suas causas e encontrar um conjunto de soluções. Numa reunião realizada
em Massinga/Mangonha de 20 a 24 de Agosto de 1962, os missionários do Arciprestado de
Vilankulo, em conjunto com o superior regional, avaliaram e programaram a sua actividade
pastoral. Os assuntos tratados foram a formação dos cristãos ou acção evangelizadora dos
missionários, a perseverança dos cristãos e meios para os defender, o funcionamento e rendimento
das escolas e professores e a vida e acção dos religiosos. Durante este importante encontro
trocaram-se ainda impressões sobre os registos das missões, relação com as autoridades civis,
residências, economia, etc130.
129
Cf. Relatório da visita aos missionários da Arquidiocese de Lourenço Marques, apresentado pelo P.e Aldo
Mongiano ao P.e Domingos Fiorina, Superior Geral. Matola, 30-6-1958: ArqRegMoç B. 12, n.8.
130
Cf. Reunião dos missionários do Arciprestado de Vilankulo: Massinga, 20-24 de Agosto de 1962. ArqRegMoç.
B11,n.16.
abrangia completamente os regulados de Mazive e Manhice. Esta zona além de muito povoada,
tinha bastantes escolas.
O cardeal erigiu a missão em honra de Nossa Senhora do Rosário em 8 de Setembro de
1960, tendo esta iniciado oficialmente as actividades em 1 de Janeiro de 1961. O seu fundador foi o
P.e Artur Rodrigues, missionário da Consolata português, grande trabalhador e que deu um forte
impulso à missão, com a colaboração do Ir. José Soares de Almeida. Construiu as primeiras
instalações provisórias, escavou um poço, abriu machambas, inaugurou em 1963 a residência dos
padres e, em seguida, os edifícios escolares, posto sanitário e maternidade. Mas nem só de obras
vivia a missão. Em 21 de Maio de 1965 chegavam a Muvamba as primeiras Missionárias da
Consolata, para colaborarem no apostolado. O movimento religioso era apreciável, expresso pelo
número de 7.578 católicos, em 1965.
A criação da Missão de Nossa Senhora de Fátima de Vilankulo foi em 1 de Julho de 1964,
erigida pelo primeiro bispo de Inhambane, D. Ernesto Gonçalves Costa, com território
desmembrado das missões de Mapinhane e Maimelane. A sede da missão foi fixada no centro da
vila, onde residia também a autoridade administrativa do concelho. A sua superfície não era muito
extensa, mas densamente povoada. Da Missão de S. José de Mapinhane, desmembrou-se a área das
escolas de Chiruala, Chaxane, Pambara, Faiquete, Machocomane, Ilhas do Bazaruto, Santa Isabel e
Cabo de S. Sebastião, e da Missão de Santa Ana de Maimelane separaram-se as áreas de S. Lucas
de Bungul, S. Carlos de Chipingamonga, Santa Filomena de Macunha e Chuambo. Por insuficiência
de pessoal, a missão de Vilankulo continuou ainda a ser assistida pastoralmente pelo superior de
Mapinhane. Finalmente, em 7 de Abril de 1965, tomou posse da missão o P.e Osvaldo Peressini, até
então pároco da Matola. Com entusiasmo deu início ao seu trabalho pastoral, assistindo a
comunidade cristã da vila que tinha como ponto de referência uma pequena capela e as oito escolas-
capela já existentes no seu território.
131
Relevos sobre a população indígena e assistência espiritual na missão de Matola-Rio e Machava. Matola-Rio,
25 de Novembro de 1959: ArqRegMoç. B14. n.64
132
Arquidiocese de Lourenço Marques, Anuário 1957 (Lourenço Marques, 1957) 59.
Apesar das dificuldades, dois anos após a sua fundação, a Machava tinha aumentado para
4.140 católicos nativos e as escolas-capela já eram dez: Machava-sede, S. Vicente de Paulo
(Bonhiça), S. João Baptista (Anhana), S. João de Brito (Quilasse), S. Damaso (Singatela), S. José
(Slumene), S. António de Lisboa (Mochisso), S. Pedro e S. Paulo (Mulotona) e S. Gabriel das
Dores (Mualasa). Estas escolas eram frequentadas por 1.631 alunos133.
Inicialmente o lugar de culto era uma capela, que desde logo se revelou pequena e inadequada.
Em 1960 os cristãos de origem europeia organizam-se no sentido de construir uma igreja em
alvenaria, concluída e inaugurada em 1964. Em 1963 chegava a colaboração pastoral das irmãs da
Apresentação de Maria.
133
Relevos sobre a população indígena e assistência espiritual na missão de Matola-Rio e Machava. Matola-Rio,
25 de Novembro de 1959: ArqRegMoç. B14. n.64
134
Relevos sobre a população indígena e assistência espiritual na missão de Matola-Rio e Machava. Matola-Rio,
25 de Novembro de 1959: ArqRegMoç. B14, n.64.
135
Carta do Arcebispo de Lourenço Marques ao P.e Aldo Mongiano. Lourenço Marques, 28 de Novembro de
1959. ArqRegMoç B14. n.65
Para unir forças e melhor responder aos desafios colocados, os Missionários da Consolata
presentes no Arciprestado de Lourenço Marques reuniram-se a 12 de Julho de 1965 para analisar a
situação religiosa-pastoral. Da avaliação emergiram os seguintes aspectos negativos: existência de
uma fraca prática religiosa, quer na participação na missa, quer na frequência aos sacramentos; um
baixo nível moral com uniões matrimoniais irregulares; muita instabilidade nas famílias e práticas
pagãs e supersticiosas; percepção dos deveres religiosos e morais como um peso; inexistência de
um sentimento comunitário de Igreja, sendo a religião considerada uma questão pessoal; baixo
interesse pelas actividades da Igreja, expressa na escassa colaboração dos cristãos nas festas,
construções, etc. e facilidade em passar do catolicismo às seitas protestantes, especialmente para o
sionismo. As causas indicadas para esta fraqueza religiosa eram as preocupações materiais e o
desejo de melhorar o nível de vida em detrimento da dimensão espiritual, o insuficiente contacto
dos padres com os cristãos, a falta de método missionário e a escassez de livros de cânticos e
catecismos adaptados.
Todavia, nem tudo parecia negativo na análise feita. Havia também alguns sinais de esperança.
As comunidades cristãs estavam a formar-se, alguns catequistas eram zelantes, a acção da Legião
Maria era muito positiva. A alternativa para inverter as situações negativas era que cada missionário
se deveria esforçar por levar para a frente um trabalho pastoral mais profundo do ponto de vista
espiritual e educativo136.
136
Situação espiritual dos cristãos das missões de Matola, Machava, Liqueleva e Boane. Machava, 12 de Julho de
1965. ArqRegMoç. B.13.
QUARTO PERÍODO (1966-1974)
RENOVAMENTO DA EVANGELIZAÇÃO À LUZ DO CONCÍLIO E INSTABILIDADE
POLÍTICA
Introdução
O Concílio Vaticano II criou um clima de esperança e de renovação na Igreja em Moçambique.
Vários sectores da sociedade abriram-se a uma nova visão de Igreja e de pastoral missionária, fruto
da renovação conciliar. Redescobriu-se um modelo de Igreja visto como comunhão de comunidades
responsáveis, houve um renovamento na evangelização com a introdução de novos métodos
pastorais, novo espírito ecuménico, etc. A exigência de uma evangelização autêntica e profunda fez
surgir experiências e iniciativas locais relevantes, como por exemplo a fundação de centros de
formação de animadores e catequistas, semanas nacionais de pastoral, cursos de inserção para
missionários, entre outras. Muitos missionários tentaram desfazer binómios que caracterizavam a
evangelização de então, nomeadamente escola-capela, professor-catequista ou Igreja-Governo.
No início dos anos 70, os Missionários da Consolata não podiam ficar indiferentes a tudo aquilo
que acontecia à sua volta. O avanço da luta de libertação nacional, o endurecimento da política
colonial, o silêncio comprometedor de quem deveria falar e agir, levou os missionários a unir a sua
voz àqueles que denunciavam as situações de injustiça e a aliviar a dor de quem sofria.
A revolução de 25 de Abril de 1974, que corrigiu o déficit de democracia existente em Portugal,
abriu as portas à descolonização dos territórios ultramarinos. As consequências deste acontecimento
decidiram em parte o futuro de Moçambique e da sua Igreja. Tinha chegado o momento da
liberdade que lhe permitiria construir o seu futuro.
137
A sua publicação seria suspensa em 1974 por vários motivos: restrições impostas às publicações religiosas,
diminuição do pessoal missionário na Região, dificuldades de comunicação, etc. A sua publicação seria retomada mais
tarde, em 1982. Cf. Nota explicativa: Encontro n. 15 (1982) 2.
mais na pastoral. Todavia, estas tentativas de renovação nem sempre alcançaram os resultados
propostos138.
Procedeu-se ao estudo em grupo dos documentos conciliares, quinzenalmente. Naturalmente que
a renovação conciliar não passava apenas pela leitura dos documentos, mas pressupunha uma
revisão espiritual interior a nível comunitário e individual. Para ajudar os missionários a alcançar
este objectivo, cada grupo – Niassa, Inhambane e Lourenço Marques - constituiu uma comissão
coordenadora composta por três missionários, para a renovação da vida e actividade missionária,
em conformidade com a doutrina do Concílio Vaticano II. O Superior Regional, P.e A. Mongiano
insistia na necessidade de cada missionário fazer uma leitura atenta dos documentos conciliares, no
sentido de cada qual se tornar apto para fazer esta renovação da vida religiosa e pastoral139.
138
Cf. G. FRIZZI, La missione del Niassa nel crogiuolo della rivoluzione: Documentazione IMC n. 3 (1980) 17-18.
139
Cf. Carta de P. Aldo Mongiano aos missionários da Região Moçambique. Machava, 30 de Dezembro de 1966.
ArqRegMoç. B11, circular, n. 14.
140
No dia 8 de Julho de 1970 o Conselho Geral nomeou os conselheiros da Região Moçambique nas pessoas dos
padres António Gaspar (vice-Superior Regional), Manuel Tavares, Emanuel Maggioni e Artur Marques. Cf. Carta de P.
Mário Bianchi, Superior Geral, a P. José Paleari, Superior Regional. Turim, 9-7-1970: B 10, n. 59.
141
O novo superior da Delegação do Niassa era o P.e Manuel Tavares (11-8-1970), eleito em substituição do P.e
Eugénio Menegon.
142
Cf. Actas da reunião dos missionários do sul do Niassa com o Superior Geral. Mitúcue, 6-6-1970:
Arq.RegMoç. B. 13, n. 152; Actas da reunião dos missionários do norte do Niassa com o Superior Geral. Mitúcue, 8-6-
1970: ArqRegMoç. B. 13, n. 151.
todos os missionários do sul e uma representação do norte143. Esta reunião foi um acontecimento
de grande importância para a vida da Região, pois pela primeira vez os missionários do norte e do
sul tiveram a possibilidade de se encontrar para estudarem juntos os problemas, apontarem soluções
e cimentarem a união entre si.
O resultado do trabalho realizado ficou registado nos Actos da Conferência Regional que
espelhavam o esforço feito pelos missionários para se adaptarem à situação concreta, à luz das
deliberações do Capítulo Geral de renovação, o primeiro depois do Concílio. Ficou patente o
empenho em renovar o apostolado, através da ênfase colocada nos valores africanos (n. 15),
promoção humana (n. 16) e promoção vocacional de sacerdotes diocesanos e religiosos
missionários (n. 48). Todo o espírito dos Actos da Conferência exprimia a vontade dos missionários
de permanecer em Moçambique, não obstante as dificuldades do momento e o dinamismo para
realizar uma evangelização autêntica e eficaz144.
Todavia, na I Conferência Regional não foi tomada nenhuma decisão quanto à unificação da
Região de Moçambique, o que contrariava as orientações dadas pela Direcção Geral. Este foi um
dos motivos, entre outros, que levou o Superior Geral a visitar novamente Moçambique. O P.e M.
Bianchi chegou a Lourenço Marques no dia 20 de Janeiro de 1972. Visitou em primeiro lugar as
paróquias da capital, tendo seguido depois para as missões de Inhambane e, finalmente, do Niassa.
A visita permitiu debater todas as situações e problemas sobre a união regional, apostolado,
avaliação da situação sócio-política e rumos para o futuro. Estas questões deveriam ser discutidas
em conjunto na Conferência Regional ordinária do ano seguinte.
143
Para conhecer o desenvolvimento dos trabalhos da I Conferência Regional dos Missionários da Consolata de
Moçambique, consultar a Acta da Conferência. I Conferência Regional de Moçambique. Nova Freixo-Mapinhane,
1971: ArqRegMoç. R. 1.
144
Cf. INSTITUTO MISSIONÁRIO DA CONSOLATA, I Conferência Regional da Região Moçambique (Nova Freixo –
Mapinhane, 1971).
145
II Conferência Regional (Mapinhane, 22 a 25-1-1973: Encontro. Orgão informativo IMC n. 8 (1973) 3-4.
tarefa de concretizar esta união. A segunda parte da Conferência Regional seria a ocasião para
tomar essas medidas.
A segunda parte da conferência foi preparada a nível dos grupos de Vila Cabral, Nova Freixo,
Inhambane e Lourenço Marques. No dia 24 de Agosto, em Nova Freixo, reuniu-se a comissão
encarregada de elaborar o esquema para os trabalhos da Conferência Regional e três dias depois,
iniciava-se em Mitúcue a segunda parte, que se iria prolongar até ao dia 1 de Setembro de 1973.
Trataram-se questões sobre a vida espiritual e as comunidades missionárias, o apostolado para a
formação de comunidades adultas e a animação missionária e vocacional. Concluída a conferência,
o novo conselho reuniu-se com o Superior Regional para tratar alguns assuntos relacionados com o
movimento de pessoal.
146
Cf. Carta dos Missionários da Consolata aos bispos de Moçambique. Nova Freixo 14-1-1971. ArqRegMoç. A.
3, n. 46.
147
Cf. Carta de D. Custódio Alvim aos padres da sua arquidiocese. Lourenço Marques, 26-12-1970. ArqRegMoç.
A. 3, n. 47.
Missionários da Consolata, reunidos em Mapinhane para a segunda parte da Conferência Regional,
prepararam uma resposta com data de 3 de Fevereiro de 1971. Enviaram a carta aos bispos e aos
superiores das congregações religiosas presentes em Moçambique, na qual discordavam do teor da
mensagem confidencial do arcebispo aos seus sacerdotes, pelas afirmações reproduzidas, por uma
certa apreciação dos acontecimentos e pela aceitação da culpabilidade do P.e Célio148. Os
Missionários da Consolata não receberam nenhuma resposta à carta confidencial dirigida à
Conferência Episcopal, mas sim uma carta defensiva de D. Custódio Alvim149. Semanas mais tarde
foi elaborada uma resposta final do Instituto, com algumas considerações à carta do arcebispo de
Lourenço Marques150. Em seguida, a 23 de Março de 1971, 24 missionários da Beira, solidários
com o Instituto, subscreveram uma carta dirigida a D. Custódio Alvim Pereira, sobre a expulsão do
P. Célio Regoli e a carta por ele enviada aos Missionários da Consolata. O bispo é acusado de
graves distorções pastorais e de traição à Igreja e ao Evangelho, em clara contradição com as
directrizes do Concílio Vaticano II151.
Maior clamor causou a expulsão de Moçambique dos Missionários de África, vulgarmente
conhecidos por Padres Brancos. Estando ao corrente da insatisfação dos seus missionários em
Moçambique, o P. Theo Van Asten, Superior Geral dos Padres Brancos, visitou-os em Fevereiro de
1971. Falou com D. Francisco Nunes Teixeira, Bispo de Quelimane e presidente da Conferência
Episcopal de Moçambique, acerca dos problemas da Igreja em Moçambique que, segundo ele,
afectavam os seus missionários e que colocavam em questão a sua permanência nas missões onde
exerciam a sua actividade152. Antes de tomar uma decisão sobre permanecer ou abandonar, o P. Van
Asten reuniu o seu conselho em Roma e consultou todos os superiores gerais das congregações
presentes em Moçambique, entre os quais o P. Mário Bianchi, Superior Geral dos Missionários da
Consolata, comunicando que, devido à situação insustentável criada entre a Igreja e o Governo, a
melhor solução seria sair.
Depois da decisão tomada pelo seu conselho geral, o P. Van Asten envia duas cartas, uma
dirigida aos próprios membros e outra aos bispos moçambicanos interessados, dando a conhecer a
deliberação de retirar todos os seus missionários de Moçambique, por dever de consciência e por aí
existir uma Igreja que aceita a mordaça do estado. Os Padres Brancos entendiam assim sair deste
estado de grande ambiguidade em nome também da africanização da Igreja, alegando ainda que os
bispos não davam sinais de querer corrigir a sua atitude em relação ao regime colonial português153.
Informaram, por fim, os bispos que deixariam as missões de Tete e da Beira, onde trabalhavam, no
final do ano lectivo, para não prejudicarem os alunos.
O Governo português reagiu à carta do Superior Geral dos Padres Brancos, considerando-a
ofensiva à dignidade nacional e contrária aos princípios e às leis constitucionais. Tratava-se de um
documento que punha em causa a política portuguesa ultramarina e abalava os conceitos de um
Portugal uno, indivisível e pluriracial. Considerando esta atitude uma intromissão nos assuntos
internos do Estado e uma injúria às leis constitucionais, o Governo antecede-se à data de saída
estabelecida pelos Padres Brancos de Moçambique e determina a sua expulsão, num prazo de 48
horas.
Perante a expulsão dos Padres Brancos, os Missionários da Consolata, reunidos na missão de
Mitúcue por ocasião dos exercícios espirituais, tomaram uma posição de solidariedade para com os
148
Cf. Carta dos Missionários da Consolata aos prelados e superiores religiosos. Mapinhane, 3-2-1971.
ArqRegMoç. A. 3, n. 48.
149
Cf. Carta de D. Custódio Alvim aos reverendíssimos padres e irmãos da Consolata. ArqRegMoç. A. 3, n. 49.
150
Cf. Carta dos Missionários da Consolata aos prelados e superiores religiosos. Lourenço Marques, 7-3-1971.
ArqRegMoç. A. 3, n. 50.
151
Carta de um grupo de padres da Beira a D. Custódio Alvim. Beira, 23-3-1971. ArqRegMoç. A. 3, n. 56.
152
F. NUNES TEIXEIRA, A Igreja em Moçambique na hora da independência (1955-1975) (Coimbra, 1994) 20-21.
153
Para um conhecimento do conteúdo das cartas ver: E. GONÇALVES COSTA, A obra missionária em Moçambique
e o poder político (Braga, 1996) 38-42; I. TUBALDO, Una Chiesa su strade difficili. Mozambico fra passato e futuro
(Bologna, 1994) 99-102.
seus colegas. Todos se manifestaram ao lado dos Padres Brancos, lembrando a posição por eles
tomada, juntamente com outros sacerdotes da Beira, na ocasião da expulsão do P.e Regoli.
Reconhecendo ser muito difícil trabalhar em tais circunstâncias, a maioria dos missionários, porém,
não era favorável à imitação do gesto dos Padres Brancos. Mesmo assim, no dia 28 de Agosto de
1971, um grupo de 17 missionários da Consolata escreveu uma carta ao Superior Geral, P.e M.
Bianchi, interrogando-se sobre a atitude do Instituto perante a saída dos Padres Brancos e sobre a
validade do trabalho missionário em Moçambique154.
A Direcção Geral respondeu com uma circular a todos os membros, na qual dava directrizes para
a permanência em Moçambique. Em primeiro lugar recusava a insinuação, feita pelos subscritores
da carta, de que a Direcção Geral teria decidido unilateralmente manter os próprios missionários em
Moçambique, sem os interrogar sobre esse facto. O P.e M. Bianchi respondia, afirmando que o
Conselho Geral não tomara nenhuma decisão sobre esse argumento, simplesmente porque nenhum
missionário de Moçambique propusera a alternativa de sair ou permanecer, nem antes, nem depois
da partida dos Padres Brancos. Acrescentava ainda que, se algum missionário, por motivos pessoais
sérios, desejasse deixar Moçambique poderia fazê-lo, não se responsabilizando o Instituto pelas
consequências pastorais daí derivantes. No final da carta, a Direcção Geral manifestava uma vez
mais a sua solidariedade para com os Padres Brancos e dava algumas recomendações necessárias
para uma presença missionária mais significativa, num momento particularmente difícil. Era
necessária prudência, unidade e menos sensacionalismo155.
Depois de ter visitado os missionários em Moçambique em 1972, o Superior Geral, P. Mário
Bianchi, explicava a decisão de permanência do Instituto da Consolata deste modo: “os
missionários permanecem em Moçambique(…) porque amam os africanos e querem trabalhar e
sofrer com eles para construir uma sociedade e uma Igreja livre, autenticamente sua”. A decisão
de permanecer fundamentava-se nas mesmas motivações eclesiais que levavam outros a partir, isto
é, o desejo de dar um contributo para a liberdade e maturidade do povo moçambicano156.
Entretanto, urgia ocupar o vazio provocado pela saída dos Padres Brancos. D. Manuel Vieira
Pinto, Bispo de Nampula e Administrador Apostólico da Beira, pediu ao Superior Geral dos
Missionários da Consolata para aceitar, pelo menos, a paróquia de Munhava (Beira)157. Depois de
ter consultado a opinião dos Missionários da Consolata de Moçambique, o P.e. M. Bianchi
respondeu que não havia possibilidade de assumir tal encargo pastoral, sobretudo pela escassez de
pessoal. Além disso, os missionários teriam dificuldade em ocupar o lugar deixado vacante pelos
Padres Brancos, se perdurassem os sinais que os tinham levado a sair de Moçambique158.
154
Cf. Carta de um grupo de missionários da Consolata de Moçambique ao Conselho Geral. Mitúcue, 28-8-1971:
ArqRegMoç. B. 13, n. 176.
155
Cf. Carta da Direcção Geral aos Missionários da Consolata de Moçambique. Turim, 11-10-1971: ArqRegMoç.
B 12, n. 219.
156
Cf. Carta de P.e Mário Bianchi, Superior Geral, aos missionários de Moçambique (10-4-1972): Bollettino
Ufficiale 36 (1972) 64-67.
157
Cf. Carta de D. Manuel Vieira Pinto, Bispo de Nampula e Administrador Apostólico da Diocese da Beira ao
Superior Geral, P.e Mário Bianchi. Beira, 21-7-1971: ArqRegMoç. B. 13, n. 132.
158
Cf. Carta de P.e Mário Bianchi, Superior Geral, a D. Manuel Vieira Pinto, Bispo de Nampula e Administrador
Apostólico da Beira. Turim, 21-9-1971: ArqRegMoç. B 12, n. 216.
34 anos de idade e quando muito havia a esperar do seu dinamismo missionário. Um acidente de
mota truncou-lhe a existência terrena na tarde de 11 de Maio, em Nova Freixo, onde era pároco. O
P.e Pedro Calandri faleceu no dia 12 de Agosto, com 74 anos de idade, após uma longa vida
missionária, gasta quase inteiramente ao serviço do Niassa. Ele, que foi o pioneiro da evangelização
católica nesta terra. O seu funeral e sepultura, em Massangulo, foram a expressão eloquente do
quanto era considerado e amado por todos.
No dia 17 de Outubro de 1972 falecia o P. Guerrino Prandelli com apenas 29 anos, atingido pela
explosão de uma mina, na estrada entre as missões de Belém e Nova Esperança. Partia, mas ficava o
exemplo da sua generosidade, da sua maneira de ser franco e expansivo e da sua profunda visão dos
problemas africanos, fruto de um estudo feito à luz da fé. Foi sepultado na missão de Unango159.
A 26 de Outubro de 1973 falecia o P. Domingos Ferrero, na missão de Mitúcue onde fixara
residência. Tinha 82 anos de idade. Durante muitos anos, enquanto superior religioso e eclesiástico
do grupo do Niassa, dirigiu a vida religiosa e apostólica de gerações de missionários. A sua vida foi
moldada pela figura do pai fundador dos Missionários da Consolata, Beato José Allamano. Amar
Jesus sacramentado, confiar fielmente na Virgem Consolata e obedecer à Igreja e às directrizes do
Instituto. Distinguia-se na prática do axioma o bem deve ser bem feito e sem rumor. Foi sepultado
no cemitério de Mitúcue.
159
Para um maior conhecimento da vida e obra deste missionário ver: Guerrino Prandelli missionario uomo di
speranza (Lamarmora-Brescia 1998)
160
Cfr. Diocese de Vila Cabral. Resumo dos dados estatísticos. Vila Cabral, 31-12-1967. ArqRegMoç A2, n. 87.
perpetrados pelos militares e colonos feriam a consciência dos missionários, tendo alguns tomado a
iniciativa de denunciar os comportamentos reprováveis. Os atritos com as autoridades também
desgastavam pelo clima de suspeita e desconfiança que suscitavam. Entre dois fogos, os
missionários procuravam ser testemunhas de paz e de justiça.
161
Cf. A. BARROSO HIPÓLITO, A pacificação do Niassa. Um caso concreto de contra-guerrilha (Lisboa, 1970) 36-
44.
162
Cf. Carta de P.e Aldo Mongiano aos missionários da região de Moçambique. Machava, 11 de Novembro de
1964. ArqRegMoç. B. 11, circular n. 12.
mais tarde. Na constituição dos aldeamentos, os militares procuravam concentrar as populações em
áreas determinadas, para evitar que fossem contactadas pelos guerrilheiros. Porém, estes
aldeamentos, construídos de improviso e em situações de emergência, estavam longe de
corresponder às condições de respeito pela dignidade da pessoa humana. Os missionários
conviviam e sofriam com esta situação, não apenas em Nova Coimbra, mas também nas missões de
Unango, Nova Esperança e Maúa.
Por se encontrar no meio da linha de fogo entre a Frelimo que se albergava nos montes Mbemba
e o exército colonial que estava aquartelado na Cantina Dias no lado oposto da missão, em
diferentes ocasiões, também a missão de Unango sofreu com os ataques da Frelimo (25 de Maio de
1965, 13 de Dezembro de 1966, 11 de Dezembro de 1970 e Agosto de 1971) e as retaliações dos
militares portugueses, nomeadamente o cerco à missão em 11 de Agosto de 1967.
Viajar, em algumas zonas do Niassa, era algo muito arriscado. No dia 18 de Janeiro de 1966, o
carro onde viajavam o P.e Mário Teruzzi, P.e Inácio Mondin e Ir. Bartolomeu Peretti foi atacado
por um comando da Frelimo, armado de metralhadoras e bazucas, na estrada entre Vila Cabral e a
missão de Unango. Por milagre os disparos só feriram o P.e. Mondin, que foi transferido em
seguida para o hospital de Nampula, para tratamento163. Algumas semanas depois, a 31 de Março
de 1966, mais dois missionários sofreram um ataque, desta vez os Padres Eugénio Menegon e
Mário Terruzzi, tendo o primeiro ficado ferido. A missão de Unango e Nova Coimbra passaram a
estar isoladas.
A guerra e a insegurança começaram a ir para o sul e alastraram-se a todo o Niassa. Na zona de
Catur, missão de Massangulo, multiplicaram-se as infiltrações da Frelimo. Também na região de
Mecanhelas e Maúa se verificaram ataques. A pouco e pouco, Nova Esperança passou a ser a
missão mais isolada do Niassa devido, sobretudo, às minas colocadas na estrada. E viajar tornou-se
extremamente perigoso. Os missionários não se renderam ao medo e por isso decidiram ficar e
sofrer com o povo. O P.e Guerrino Prandelli encontrou a morte quando o carro em que viajava,
entre Belém e Majune, fez rebentar uma mina, a 17 de Outubro de 1972. Estava consciente do
perigo mas decidira igualmente fazer a viagem a fim de prover de mantimentos a missão onde a
fome se fazia sentir.
D. Eurico Dias Nogueira, em conjunto com os missionários, não se cansou de apelar para a
reconciliação e paz. Numa carta colectiva classificaram a guerra em curso como uma obra
diabólica, afirmando que a melhor forma de a fazer terminar, era desenvolver o progresso material
e espiritual da população. Para isso era necessário fomentar o seu bem-estar físico através da
construção de habitações condignas, assistência médica e melhoria dos salários. Mas importava
fazê-lo acompanhar de um progresso espiritual idêntico, com uma cultura de base para todos,
preparação de elites dirigentes e uma educação sólida da juventude. Era também necessário que
desaparecessem certas atitudes humilhantes e autoritárias em relação à população, substituindo-as
por uma legislação justa. A Igreja mantinha-se disposta a continuar o seu esforço de evangelização
e promoção humana, permanecendo firme na defesa da verdade e da justiça em favor de todos os
necessitados, sobretudo os mais desprotegidos e pobres164.
163
Cf. Carta de P.e Aldo Mongiano, Superior Regional, a P.e Domingos Fiorina, Superior Geral. Machava, 31-1-
1966: ArqRegMoç. B 12, n. 175.
164
Cf. Progresso factor de paz no Niassa. Mensagem Pastoral do Bispo e demais missionários de Vila Cabral.
Vila Cabral, 6-9-1967: ArqRegMoç A2 n. 89.
missionária se tornou mais efectiva. Possuía inicialmente sete escolas-capela: Esperança-sede,
Niputa, Nova Beira, Revia, Mantiha, Vessa e Milo. O P.e José Pequito foi o fundador da missão e
com o seu zelo organizou a comunidade cristã numa região em grande parte islamizada, mas não
refractária à evangelização. A partir de 1967 iniciaram-se os ataques da Frelimo e os combates com
a tropa portuguesa em toda a área da missão. Graças ao bom trabalho do P. Pequito, a missão
tornou-se o centro de equilíbrio de toda a zona. Abriu escolas nos aldeamentos e fez chegar a
assistência médica aos mais necessitados. O trabalho pastoral também dava frutos, com um número
consolador de catecúmenos e baptizados, especialmente entre os alunos das escolas. Em Julho de
1970, o P.e Pequito foi destinado a Portugal, sendo substituído, num primeiro momento, pelo P.e
Eugénio Menegon, e a partir de 1971 pelos padres Salvador Forner e Guerrino Prandelli que
passaram a residir aí165.
No dia 13 de Maio de 1966 foi criada a Missão de Nossa Senhora de Fátima de Mecanhelas. A
localidade de Mecanhelas, situada a 45 km de Mepanhira e próxima da fronteira com o Malawi,
estava no centro de uma região muito povoada e possuía em algumas aldeias uma elevada
percentagem de baptizados.
A vasta rede de escolas-capela necessitava de uma boa assistência e parte dessa rede
desenvolvia-se na direcção oposta à de Mepanhira. Para as assistir pastoralmente não eram
suficientes as visitas regulares do missionário. Era necessária uma presença mais estável. O P.e
Mário Spangaro, que trabalhara até então na missão de Mepanhira, foi encarregado de iniciar a
implantação da missão. Fê-lo com grande sacrifício pessoal e competência. Decorridos apenas dois
anos sobre a fundação da missão, já tinha terminado a bonita e espaçosa igreja de Mecanhelas,
dedicada a Nossa Senhora de Fátima. A comunidade cristã também aumentou de modo
espectacular, pois em 1971 o número de baptizados era já de 8.651166. Pouco depois da inauguração
da igreja, o P.e Spangaro teve de se retirar para Itália por motivos de saúde. A cura pastoral da
missão ficou a cargo do P.e Eugénio Menegon e, mais tarde do P.e Guido Gobbo. Em Abril de
1974, o P. Spangaro regressou a Mecanhelas com as forças retemperadas, mas depois de um ano
teve de regressar a Itália, sempre por motivos de saúde. Todavia o seu coração continua em
Mecanhelas. Em 1970 as missionárias da Consolata iniciaram a sua presença em Mecanhelas
prestando serviço no hospital local.
Também em 1966, a 17 de Setembro, surgiu a Missão de Santa Maria de Belém. A sede era junto
à estação de caminho-de-ferro que ligava Nova Freixo a Vila Cabral e ocupava um vasto território
de 7.200 km2, desmembrado da missão de Nova Esperança. A construção da residência missionária
foi iniciada em 1970 pelo P.e João Baptista Coelho, que em Abril de 1972 voltava para Portugal.
Foi substituído pelo P.e Oberto Abondio, que assumiu a cura pastoral de Belém. Região
essencialmente “ad Gentes” em 1974 contava apenas com 561 católicos167.
A Missão de São João de Brito de Nipepe foi fundada em 1967, com território desmembrado da
missão de Maiaca. A recente fundação estava situada na localidade de Nipepe, uma região que fora
sempre promissora do ponto de vista missionário. A grande extensão territorial e a existência de
inúmeras escolas-capela da missão de Maiaca aconselhavam, desde há muito, uma nova abertura.
Durante as visitas a estas escolas-capela, o P.e Mário Filippi, fundador da missão de Txaxe-Maiaca,
costumava permanecer algum tempo em Nipepe onde tinha construído uma pequena casa, para ali
implantar uma missão. No entanto, isto só aconteceria quando a jovem missão de Maiaca se
consolidasse. Em 1967, o P.e Filippi iniciou sozinho a fundação da missão de Nipepe, tendo
recebido mais tarde a colaboração do P.e Franco Gioda. Nesta missão instalou-se também uma
165
Cf. S. FORNER-G. PRANDELLI, Esperança. Quadro panorâmico (Esperança, 1972) pp. 8. AIMC X 407/1.
166
Cf. CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE MOÇAMBIQUE, Anuário Católico de Moçambique: 1971 (Lourenço Marques,
1972) 145.
167
Cf. CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE MOÇAMBIQUE, Anuário Católico de Moçambique: 1974 (Lourenço Marques,
1974) 190.
comunidade de Irmãs da Imaculada Conceição, de Lichinga. Em 1974, Nipepe contava já com
5.633 baptizados168.
Em Dezembro de 1971 foi criada a Missão de Nossa Senhora Mãe da Igreja de Nova Freixo.
Estava ligada ao seminário menor sediado na cidade. As comunidades cristãs que constituíam a
nova paróquia foram desmembradas da paróquia de S. Miguel que ficou limitada ao território
urbano e seus arredores e estavam confiadas à cura pastoral dos padres do Seminário de Nossa
Senhora Mãe da Igreja. A nova paróquia contava com um total de 2.165 católicos (1974).
Em 16 de Abril de 1972 realizou-se a última abertura missionária: a paróquia de Nossa Senhora
da Paz de Nova Madeira, que foi criada para assistir os colonatos existentes nos arredores de Vila
Cabral. Era assistida pelos missionários da Missão de Nossa Senhora da Conceição de Vila Cabral
e, mais tarde, por causa da guerra, pelos missionários de Nova Freixo.
168
Cf. CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE MOÇAMBIQUE, Anuário Católico de Moçambique: 1974, 189.
169
O novo prelado nasceu na freguesia de Rebordões (Portugal), em 2 de Abril de 1923. Pertence à Companhia de
Jesus e fora ordenado sacerdote em 11 de Julho de 1953, tendo sido missionário na China e em Moçambique. Foi eleito
bispo de Vila Cabral em 10 de Novembro de 1972.
170
Cf. Relatório sobre a situação da Diocese de Vila Cabral apresentado pelo P.e Manuel Tavares, vigário
capitular, a D. Luís Ferreira da Silva. ArqRegMoç. A 2, n. 3.
171
Cf. Carta de D. Luís Ferreira da Silva aos Missionários. Vila Cabral, 7-9-1973: ArqRegMoç. A. 2, n. 55.
172
Cf. Carta de D. Luís Ferreira da Silva aos Missionários. Vila Cabral, 7-9-1973: ArqRegMoç. A. 2, n. 55.
2.2. Movimento missionário na Diocese de Inhambane
Em 1971 os Missionários da Consolata celebravam 25 anos de presença na Diocese de
Inhambane. Tudo começara a 7 de Junho de 1946, data em que foi criada a Missão do Imaculado
Coração de Maria de Massinga, em Mangonha. Seguiu-se a fundação de outras missões. A Missão
do Sagrado Coração de Jesus de Nova Mambone, São José de Mapinhane, Santa Ana de
Maimelane, Nossa Senhora do Rosário de Muvamba, Nossa Senhora de Fátima de Vilankulo e
finalmente, Nossa Senhora da Consolata de Funhalouro. Todas elas tiveram um início duro e cheio
de dificuldades, que a tenacidade e o entusiasmo dos pioneiros levou de vencida. No começo os
missionários viviam em palhotas, mas pouco a pouco as casas em alvenaria começaram a surgir e,
nesta fase, todas as missões já estavam dotadas de sólidos edifícios.
Depois de 25 anos de intenso trabalho, os números falavam dos frutos da entrega total a Deus
por parte destes missionários, em benefício destas populações. Em 1970, o Arciprestado de
Vilankulo apresentava a seguinte estatística referente ao movimento religioso: 47.821 católicos
(47.136 africanos, 389 europeus e 296 mestiços), 1.176 baptismos de adultos, 828 baptismos de
crianças, 3.412 catecúmenos, 182 matrimónios, 14 sacerdotes, 4 irmãos e 15 irmãs.
Também nos últimos anos tinham chegado alguns missionários, nomeadamente o P.e António
Ferreira Antunes, P.e. José Alessandria, P.e Mauro Calderoni (1968), P.e Armanno Armanni (um
regresso), P.e Carlos Giannini (1969), P.e André Brevi, P.e José Tavares Matias (1971) e P.e
Alfredo Dias Ferreira Dionísio (1972).
As missionárias da Consolata alargaram neste período o campo da sua acção evangelizadora
abrindo novas comunidades nas missões já existentes. No dia 11 de Novembro de 1971 iniciaram a
sua actividade na missão de Maimelane dedicando-se preferencialmente à catequese, saúde e
promoção da mulher. No dia 1 de Novembro de 1972 deram início à sua presença na paróquia de
Vilankulo prestando serviço no hospital da vila.
173
Missão de Nossa Senhora da Consolata de Funhalouro. Relação anual (1969). ArqRegMoç. B 14, n. 197.
174
O nome – Centro de Promoção Humana do Guiúa - foi inspirado na encíclica “Populorum Progressio” n. 42. O
centro pretendia proporcionar a formação integral de todo o homem, por isso escolheu-se o adjectivo humano, em vez
de social, estando também contida a formação religiosa e catequética. Cf. A. FERREIRA ANTUNES, Centro de Promoção
Humana do Guiúa: Encontro IMC-Moçambique: n. 2 (1971) 2-3.
salas de convívio e um secretariado para os catequistas. Estes recebiam uma formação
especializada, com aulas de cultura geral e outras disciplinas, de acordo com a missão em que
trabalhariam. Cada família de catequistas dispunha de um terreno para cultivar o necessário à
própria subsistência. Os cursos duravam dois anos e a equipa formativa era constituída por padres
da Consolata, franciscanos, diocesanos e pelas irmãs Franciscanas Missionárias de Maria.
Com a criação do centro catequético foi erigida, em 4 de Julho de 1973, a Missão de Santa Isabel
do Guiúa. Contava com 3.064 católicos, distribuídos por sete escolas-capela. O seu primeiro pároco
foi o P. A. Ferreira Antunes, director do centro catequético. A missão nascia para dar aos
catequistas a possibilidade de exercerem o seu ministério pastoral enquanto frequentavam o
curso175.
175
Cf. CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE MOÇAMBIQUE, Anuário Católico de Moçambique: 1974, p. 70.
QUINTO PERÍODO (1975-1980)
PRESENÇA E ACTIVIDADE DOS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA NO PÓS-INDEPENDÊNCIA:
PROVAÇÃO E PLANIFICAÇÃO PASTORAL
Introdução
No dia 7 de Setembro de 1974, o Governo português e a Frelimo assinam os acordos de Lusaka
(Zâmbia) e a partir desse momento, Moçambique passa a ter um governo de transição. Poucos
meses depois, a 25 de Junho de 1975, era celebrada a independência. Os missionários acolheram
com entusiasmo e expectativa a mudança política, e estavam dispostos a cooperar generosamente
nesta arrancada histórica.
O pós-independência, nomeadamente o período entre 1975 e 1980, foi um tempo difícil para a
Igreja, tendo sido provada no corpo e no espírito. O novo Governo procedeu à nacionalização das
escolas, hospitais e outras obras de promoção das dioceses. Um grupo consistente de missionários
deixou Moçambique. Alguns religiosos, religiosas e sacerdotes locais laicizaram-se. Muitos cristãos
deixaram a prática religiosa, por vários motivos. A maior parte dos catequistas-professores, que até
aí estavam ocupados a tempo inteiro e eram remunerados pelas dioceses, abandonaram as suas
funções para entrar no funcionalismo público.
Apesar das dificuldades e dos limites impostos não faltou o optimismo entre cristãos,
catequistas (principalmente os da primeira geração), padres e irmãs locais, missionários e todos os
que permaneceram fiéis. Mesmo com o futuro incerto, não houve tempo a perder. Investiram-se,
novamente, todas as forças na evangelização e logo surgiram iniciativas e experiências pastorais
muito significativas. Foram tentativas válidas que responderam de modo adequado aos desafios do
momento.
176
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 3-6.
177
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 3-6.
Na Província de Inhambane, as nacionalizações de 24 de Julho de 1975 foram executadas de
modo semelhante, embora não tenham sido cometidas tantas arbitrariedades178. Todos os bens de
produção foram inventariados e nacionalizados em 1976. Em Massinga e Muvamba o inventário
incluiu as residências missionárias, que foram ocupadas entre 14 e 24 de Fevereiro de 1977. Cada
missão permaneceu apenas com uma das residências, que deveria servir padres e irmãs. Na maioria
dos casos foram ocupadas as residências das irmãs, com a excepção de Massinga, em que se
entregou a casa dos padres. Apesar da nacionalização dos bens, os missionários permaneciam na
área das respectivas paróquias e exerciam o ministério pastoral.
Em 1979, como em todo o país, as medidas repressivas contra a Igreja aumentaram. No dia 17
de Março verificou-se o sequestro e encerramento da igreja de Nova Mambone. A 11 e 13 de Junho
encerraram-se as igrejas das missões de Massinga, Muvamba, Mapinhane e Maimelane. Tudo foi
inventariado e nacionalizado. Em Massinga foi expressamente proibido rezar, mesmo na residência
dos missionários. No dia 21 de Junho foi, também, nacionalizado o catequistado que aí funcionava e
os catequistas foram mandados para as suas casas.
Na Machava (Maputo), a residência paroquial foi submetida a inventariação por duas vezes.
Em Agosto de 1975 nacionalizaram as viaturas e o material do escritório. Na Matola, a missão foi
invadida por uma multidão armada com o objectivo de expulsar os padres, pois tinha-se espalhado o
boato de que os missionários tinham ali armas escondidas. Os padres estavam impedidos de visitar
algumas escolas-capela, que eram guardadas por soldados e proibidos de frequentar as comunidades
cristãs, pelo que o ambiente era deveras tenso179.
1.1.2.Restrições à liberdade
As nacionalizações visavam retirar à Igreja o seu espaço de influência sobre a população. Não
tendo conseguido com as medidas já postas em acto, o governo decidiu tomar outras mais radicais
que dificultassem a evangelização. Assim, as actividades religiosas passaram a ser autorizadas,
apenas nas poucas igrejas e capelas que ainda permaneciam abertas ao culto. Fora desses locais, não
era permitido organizar celebrações litúrgicas ou catequese. Os missionários não estavam
autorizados a desenvolver qualquer actividade religiosa nos centros de ensino, aldeias comunais e
antigas zonas libertadas, sobretudo no Niassa. A dada altura, começou a ser obrigatória uma guia de
marcha ou salvo-conduto (autorização por escrito do responsável político, distrital ou local), para
que os missionários e bispos pudessem visitar as comunidades afastadas do seu lugar de
residência180. Esta medida visava controlar e limitar o movimento e, consequentemente, dificultar a
actividade evangelizadora da Igreja. A guia de marcha nem sempre era concedida de imediato e por
vezes era até negada.
A partir de 1978 as restrições aumentaram. Na linha das deliberações do III Congresso da
Frelimo, decidiu-se concentrar o pessoal missionário nos centros urbanos, restringir o seu
movimento, exigir uma autorização para bispos e padres celebrarem fora dos seus locais de
residência e controlar o trabalho apostólico dos catequistas e animadores. Tais decisões foram
aplicadas, sobretudo, entre 1978 e 1979 e de modo mais radical na Província do Niassa.
No Niassa, aliás, os abusos praticados contra a pessoa dos missionários foram uma constante a
partir de 1977. Foram presos os padres Eugénio Menegon (12 de Agosto de 1978), o P.e César
Cavaleiro, jesuíta, (25 de Setembro de 1978), sendo em seguida afastados do Niassa. Também
foram presos o bispo D. Luís Ferreira da Silva e os padres Norberto Louro e Severino Bordignon
(12 de Setembro de 1979) em Mepanhira e conduzidos sob escolta até Lichinga, onde foram
libertados com a proibição de sair da cidade. Da mesma forma, o P.e José Barros, deslocando-se da
178
Em 1976, as nacionalizações em Inhambane foram nas seguintes datas: missão de Massinga em 30 de Junho,
missão de Muvamba em 1 de Julho, missão de Funhalouro em 5 de Julho, missão de Nova Mambone em 8 de Julho,
missão de Mapinhane em 13 de Julho e missão de Maimelane em 14 de Julho.
179
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 6-7.
180
Cf. Comunicação aos missionários da Diocese de Lichinga sobre alguns aspectos da actividade missionária.
Lichinga, 29-9-1978: ArqRegMoç. A 2, n. 20.
missão de Esperança para Lichinga, foi impedido de regressar. O P.e Estêvão Jardim, jesuíta, foi
preso em Lichinga (6 de Julho de 1978) e depois expulso. O P.e Severino Bordignon foi preso em 7
de Novembro de 1978 e permaneceu dois meses na cadeia. O P.e Estevão Mirassi, diocesano, foi
preso em Cuamba (10 de Outubro de 1978), conduzido a Lichinga e assassinado, em 6 de
Novembro de 1978, em lugar incerto enquanto era transportado para o campo de reeducação de
Mtelela.
Em 13 de Julho de 1978 ocorreu um caso que envolveu os bispos de Moçambique e o Delegado
Apostólico. Os bispos viajaram até Lichinga para celebrar o 25º aniversário de ordenação sacerdotal
de D. Luís Ferreira da Silva e foram impedidos de inaugurar a Igreja de Nsinje, sendo mandados de
volta para as suas dioceses. Por seu lado, o Delegado Apostólico, Mons. Francisco Colasuonno,
teve de permanecer em Lichinga durante três dias em residência fixa e vigiada, sem qualquer
comunicação com o exterior. O ano de 1978 foi caracterizado pela proibição, quase geral, de se
visitarem comunidades cristãs e, por isso, a actividade missionária ficou muito reduzida.
Em 1980, a população do Distrito de Mecanhelas foi aterrorizada por um grupo de soldados,
apelidados de esquadrão da morte, que pegaram fogo a diversas capelas das comunidades de
Mepanhira e Mecanhelas e praticaram vários actos de vandalismo. Os mesmos indivíduos, durante
um comício anti-religioso realizado em Mecanhelas em 21 de Junho de 1980, humilharam
publicamente o P.e Adriano Severin181.
Na Diocese de Inhambane, a maioria dos padres e das irmãs foram obrigados a viver
conjuntamente numa só residência, pois todas as outras casas lhes foram tiradas. Era uma tentativa
de impor ambiguidade e de obscurecer o modo de vida consagrada dos missionários, entre o povo.
Alguns missionários foram também humilhados e acabaram até por ser expulsos de
Moçambique. Foi o que aconteceu aos padres Armanno Armanni e Mauro Calderoni, na missão de
Massinga. No dia 16 de Maio de 1977, apresentou-se uma comissão vinda do Maputo, enviada pela
Direcção Nacional de Educação e Cultura, com a incumbência de explicar as nacionalizações ao
povo e aos missionários. Com essa finalidade foi convocado um comício, durante o qual se acusou
os missionários de resistência às nacionalizações, alienação das famílias no centro catequético da
missão e mobilização das famílias para rezar por todo o distrito. Terminado o comício e sem
qualquer explicação, os dois missionários foram presos e conduzidos até à prisão de Massinga, onde
lhes foram retirados os documentos. Logo depois, foram levados para a prisão de Inhambane, onde
passaram a noite. No dia seguinte foram libertados, mas com residência fixa na casa do bispo.
Também as irmãs foram obrigadas a sair da missão de Massinga. Algumas semanas depois, a 20 de
Junho, foram-lhes restituídos os passaportes e deixados em liberdade provisória. No dia 22 de Julho
foi comunicada oficialmente a expulsão do P.e Armanni e do P.e Calderoni, dentro de 24 horas. Os
dois missionários, depois de tudo terem tentado para anular a sentença, tiveram que abandonar
Moçambique no dia 11 de Agosto182.
A repressão registada sobre os brancos em 1974 e 1975 provocou um êxodo maciço destes. Nos
subúrbios de Maputo a revolução teve particulares consequências. Machava e Matola, dois centros
industriais habitados quase totalmente por europeus, assistiram à saída deles e a uma mudança
radical em pouco tempo de toda a população. Pastoralmente as consequências foram graves, o que
levou à dispersão da comunidade cristã. Os europeus partiram e os moçambicanos abandonaram a
prática religiosa. Em pouco tempo as escolas-capela foram reduzidas a escolas e a maioria dos
cristãos deixou de se reunir.
Nestas circunstâncias particularmente difíceis, os missionários procuraram permanecer, sofrer e
adaptar-se. Apesar do ambiente adverso e até repressivo conseguiram encontrar algum espaço para
agir. O seu comportamento contribuiu para mudar a opinião desfavorável formada a seu respeito.
181
Cf. Relação dos acontecimentos verificados em Mecanhelas: ArqRegMoç. A 3, n. 1.
182
Cf. Comunicado da Diocese de Inhambane às comunidades cristãs. Inhambane, 22-8-1977: ArqRegMoç. A 3,
n. 4.
1.2. Resposta dos Missionários aos desafios do tempo novo
183
Entre 1974 e 1975, a Direcção Regional teve algumas alterações: o P. Brazão Mazula substituiu o P. Manuel
Carreira, destinado a Portugal e o P. Artur Marques substituiu o P. Aldo Mongiano, nomeado Bispo de Roraima
(Brasil). O Conselho Regional reuniu-se quatro vezes: 27 de Setembro de 1974 (Mitúcue), 29 de Abril de 1975
(Mitúcue), 23 de Julho de 1975 (Lourenço Marques) e 29 de Agosto de 1975 (Unango). Cf. Acta das reuniões do
Conselho Regional: ArqRegMoç. R. 3, p. 13-25.
184
Representaram os missionários da Região Moçambique no VI Capítulo Geral do Instituto, realizado de 2 de
Junho a 8 de Agosto de 1975 (Itália), os padres Manuel Tavares e Francisco Lerma.
185
Cf. Acta das reuniões do Conselho Regional. Maputo, 10-11/11/1976: ArqRegMoç. R. 3, p. 25-31.
Inhambane. De 1 a 26 de Abril de 1980 foi novamente possível visitar o Niassa, com a autorização
do Ministério do Interior186.
A partir de Roma, a Direcção Geral do Instituto, da qual fazia parte o P.e Manuel Tavares,
seguia com atenção o desenrolar dos acontecimentos em Moçambique. Manifestava a sua
solidariedade com os missionários e sempre que possível fazia-se presente localmente, para
conhecer a situação e incutir coragem. Chamado pelo Superior Geral em Abril de 1977, o P.e
Marchiol desloca-se a Roma com a missão de informar a Direcção Geral sobre a situação que se
estava vivendo em Moçambique. Alguns meses depois a Direcção Geral retribui a visita. O segundo
conselheiro geral, P.e Luís Serna, chega a Moçambique. De 21 a 31 de Outubro visitou os
missionários do Niassa na companhia do P.e Marchiol. Uma visita marcada por um imprevisto.
Ambos foram presos no dia 28 de Outubro, durante a visita aos missionários de Cuamba. Foram
reconduzidos a Lichinga e no dia 31 de Outubro foram despachados para Maputo, sem poderem
concluir o seu programa de visita às restantes comunidades missionárias. Sem as mesmas
vicissitudes, puderam continuar a visita às comunidades de Inhambane.
Um ano depois, foi a vez do Superior Geral, P.e Mário Bianchi, visitar Moçambique para
efectuar a visita canónica aos Missionários da Consolata. Permaneceu de 12 de Dezembro de 1978
até 8 de Janeiro de 1979. Visitou em primeiro lugar os missionários presentes em Inhambane, de 15
a 20 de Dezembro. E de 23 a 31 de Dezembro visitou o grupo do Niassa, tendo chegado apenas a
Lichinga e Cuamba, onde os missionários o esperavam. De 1 a 8 de Janeiro visitou o grupo de
Maputo. Em Setembro de 1980 foi a vez do P.e Manuel Tavares, Vice Superior Geral, visitar
Moçambique. Com uma autorização do Ministério do Interior - Secção de Culto, foi possível visitar
todos os missionários nos seus locais de trabalho e fazer reuniões colectivas com os membros do
grupo do Niassa, Inhambane e Maputo187.
186
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 8-9.
187
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 8.
da Matola, paróquia de Boane, paróquia da Machava e Liqueleva. Além disso, estavam empenhados
na assistência aos doentes do Hospital Central, secretaria da Caritas Moçambicana e apoio a
paróquias desprovidas de sacerdotes, casos de Benfica e Catedral188.
188
Cf. Relação da Região de Moçambique para o Capítulo Geral IMC de 1981 (Maputo, 19-2-1981) 9-10.
salina. Na missão de Maimelane estava o P.e J. Alessandria e três irmãs da Consolata, que não
sentiam grandes dificuldades, nem com as estruturas, nem com o povo. Em Vilankulo residia o P.e
A. Brevi e três irmãs da Consolata. Duas irmãs estavam inseridas nos serviços de saúde e, por isso
mesmo, pouco se podia fazer na pastoral além de reanimar as comunidades cristãs. Na missão de
Mapinhane trabalhava o P.e José Matias, onde tinha sido nacionalizado o centro catequético. Em
Muvamba a equipa missionária era formada pelo P.e Adelino da Conceição e por três irmãs da
Consolata. Tinham dificuldades com a actuação do grupo dinamizador local. Na missão de
Massinga estavam o P.e Mauro Calderoni, o P.e Armanno Armanni e três missionárias da
Consolata. Toda a equipa missionária trabalhava no centro catequético, que ainda não fora
nacionalizado. A missão de Funhalouro foi fechada devido ao seu isolamento e o P.e João Armando
foi transferido para Mapinhane. As suas comunidades ficaram sem assistência religiosa.
Em 1979 o número de missionários da Consolata presentes na Diocese de Inhambane tinha
atingido um mínimo histórico. À excepção de Vilankulo que tinha um padre e um irmão, todas as
outras missões só possuíam um missionário. Em contrapartida, havia um grupo de duas ou três
irmãs da Consolata em todas as missões, que trabalhavam na evangelização e promoção. Os
missionários viviam, mais do que nunca, uma vida simples, pobre e bastante evangélica. Não
tinham propriedade própria. Tudo fora confiscado. Pastoralmente, trabalhava-se em comunhão com
toda a diocese, no sentido de constituir comunidades autosuficientes, vivas na fé e com os
ministérios essenciais.
No grupo de Inhambane havia um total de seis missões em funcionamento: Imaculado Coração
de Maria de Massinga, Nossa Senhora do Rosário de Muvamba, São José de Mapinhane, Nossa
Senhora de Fátima de Vilankulo, Santa Ana de Maimelane e Sagrado Coração de Jesus de Nova
Mambone.
Em 1979, trabalhava em Massinga o P.e André Brevi, ecónomo do grupo de Inhambane, três
irmãs da Consolata e uma equipa de catequistas. Esta missão continuava a ser uma das maiores e
mais activas comunidades cristãs da diocese, onde funcionava também uma escola para formação
de catequistas. O P.e Brevi estava impedido de se deslocar fora da sede da missão, para prestar
assistência religiosa às comunidades. Na missão de Muvamba, o P.e Adelino Francisco, que fazia
parte da equipa de formação de catequistas de Massinga, continuava a desenvolver a sua actividade
pastoral, embora com algumas dificuldades visto que não podia sair para assistir as comunidades
cristãs. Na missão de Mapinhane, desde 1974 que o P.e José Tavares Matias se mantinha como
superior, animador pastoral da zona norte da diocese e único missionário da Consolata aí residente.
O seu contributo pastoral era apreciado, colaborando com três irmãs da Consolata e uma equipa de
catequistas, obtendo ainda guias de marcha para poder visitar as comunidades. Na missão de
Vilankulo o P.e J. Armando, que tinha substituído o P.e André Brevi, fazia comunidade com o Ir.
Pedro Bertoni, que assistia as viaturas de todas as missões com a sua competência técnica. A
actividade pastoral era bastante reduzida. Na missão de Maimelane encontrava-se o P.e José
Alessandria que assistia pastoralmente as comunidades cristãs com a colaboração das missionárias
da Consolata. Em Nova Mambone estava o P.e Artur Marques, substituto do P.e Amadeu Marchiol
na direcção da missão. Na missão funcionava ainda uma salina, propriedade do Instituto, que apesar
das dificuldades, trazia ao grupo uma preciosa ajuda para estar inteiramente ao serviço do
apostolado, sem necessidade de se entregarem a tarefas estatais que limitavam a liberdade de acção
no campo religioso189.
189
Cf. Relatório do grupo de Inhambane. Maputo, 16-12-1978: ArqRegMoç. A 3, n. 37.
paróquia da Matola estava o P.e Luís Ferraz e três missionárias da Consolata, que assistiam também
a missão de Boane. O apostolado nestas paróquias era difícil devido à mudança da população. No
lar missionário estavam três aspirantes e um teólogo, que por dificuldades de horário e falta de
pessoal, não eram assistidos condignamente. Na casa regional, na Avenida Eduardo Mondlane,
residia o Ir. José Eusébio, que prestava serviços vários.
Em 1979, o grupo de Maputo era constituído por cinco missionários. O pároco da Matola era o
P.e Luís Ferraz, coadjuvado pelo P.e E. Menegon, que em 1978 fora forçado a abandonar o Niassa
pelas autoridades. À frente da paróquia da Machava continuava o P.e Jaime Marques. Ambas as
paróquias tinham visto a sua pastoral deteriorar-se. Um bom número de católicos abandonara a
prática religiosa e procurava-se, então, reorganizar a vida cristã segundo as linhas da pastoral
diocesana. Na casa regional residia o Superior Regional, P.e Amadeu Marchiol e o Ir. José Eusébio.
190
Cf. RELATÓRIO PARA A ASSEMBLEIA NACIONAL DE PASTORAL, A Igreja em Lichinga na organização das
comunidades, 8-9.
191
Cf. G. FRIZZI, La missione del Niassa nel crogiolo della rivoluzione: Documentazione IMC n. 3 (1980) 19-26.
para a pastoral da família e preparação de animadores para assistirem à celebração do Matrimónio,
como testemunhas oficiais da Igreja segundo as normas recebidas da Santa Sé192.
2.2.Diocese de Inhambane
Guiada pelo seu novo pastor, D. Alberto Setele, a Diocese de Inhambane fez um programa
pastoral trienal como resposta aos desafios do pós-independência. Em 1975, primeiro ano do Plano
Trienal de Pastoral, tomou o propósito de “promover em todas as missões uma mentalização
eficiente sobre os temas fundamentais do cristianismo, e actuais para o Moçambique de hoje”. Este
empenho foi positivamente correspondido pelas comunidades cristãs, que se esforçaram por
descobrir os valores escondidos no seio da revolução. Em 1976, a Assembleia Diocesana de
Pastoral, reunida no Guiúa (30 de Novembro a 3 de Dezembro), analisou e constatou que o Plano
Trienal de Pastoral continuava válido na sua globalidade. Decidiu-se que todas as forças dos
agentes pastorais da diocese deveriam ser canalizadas para os objectivos de “Reestruturar a Diocese
de Inhambane a partir dos seus próprios recursos humanos e económicos; estar atentos aos dons do
Espírito Santo e comprometer-se em integrá-los na estrutura desta Igreja local”. Auscultando toda a
diocese, o Secretariado de Acção Pastoral sintetizou todas as aspirações nos seguintes objectivos: 1.
Basear a pastoral da diocese sobre os catequistas de comunidade; 2. Detectar e seleccionar líderes;
3. Estruturar equipas móveis para a formação e assistência a catequistas, para num segundo plano
dar assistência religiosa a zonas pastorais mais desfavorecidas; 4. Elaborar textos de apoio,
particularmente esquemas de homílias e rituais para sacramentos e sacramentais; 5. Incrementar a
pastoral vocacional e promover encontros de aprofundamento teológico da vida religiosa193.
192
Cf. Avaliação pastoral. Relatório da Diocese de Lichinga apresentado por D. Luís Ferreira da Silva. Lichinga,
1979: ArqRegMoç. A3, n. 19.
193
Cf. Relatório da Diocese de Inhambane. Triénio de Pastoral (1974-1977). Texto apresentado na Assembleia
Nacional de Pastoral (Beira, 8-13/9/1977). Inhambane, 15-8-1977: ArqRegMoç. C. 1, n. 11.
194
Cf. Relatório do encontro de reflexão pastoral na Matola e plano-base da nova pastoral da Arquidiocese:
ArqRegMoç. B 14, n. 229.
SEXTO PERÍODO(1982-1992):
PRESENÇA DE CONSOLAÇÃO E PROFETAS DA PAZ
Introdução
Se os primeiros anos depois da independência, como acabámos de ver, foram difíceis para a
Igreja e para os missionários, a década de 80 foi-o ainda mais. À medida que diminuíam as
restrições à liberdade religiosa outros factores, sobretudo a guerra, contribuíram para que a
actividade pastoral fosse drasticamente condicionada. A guerra civil que afectou todo o país de
1982 até 1992 causou insegurança, sofrimento, destruição e morte. Neste contexto, a Igreja
mostrou-se solidária com o povo sofrido e os missionários em primeira linha compartilharam o seu
calvário. Com o passar dos anos a guerra privou sempre mais as comunidades cristãs da presença e
acompanhamento da parte dos missionários. A vida paroquial desapareceu quase por completo em
muitas missões e nesta situação valeu a assistência à distância por parte dos missionários e o zelo
apostólico dos animadores e catequistas os quais, mais uma vez, demonstraram com os factos a
maturidade cristã das suas comunidades195.
A partir de 1983, a guerra civil travada entre o exército e a Renamo, Resistência Nacional
Moçambicana, estendeu-se a todo o país. A guerrilha encontrou terreno fértil no descontentamento
generalizado que se sentia entre a população, desiludida pela falência dos planos económicos do
governo e pelo abuso da autoridade. Contudo, era a própria população que sofria com a guerra.
Cada ano que passava aumentava o número de mortos, destruição e miséria. A Renamo serviu-se
também do rapto de missionários para chamar a atenção internacional e infelizmente, alguns foram
barbaramente assassinados em consequência dos ataques.
Os missionários e as comunidades cristãs tinham pela frente um novo tipo de apostolado: a
presença, partilha do sofrimento, o martírio e a reconciliação. Embora os efeitos dramáticos da
guerra estivessem sempre diante dos seus olhos, a esperança que os movia era maior que todos os
perigos. Todavia, não procuraram fazer-se passar por heróis nem propagandear a sua coragem.
A partir de 1982 notou-se um lento mas progressivo melhoramento nas relações entre o
Estado e Igreja. Mais do que uma inversão ideológica, esta mudança foi motivada pela resistência
passiva do povo, crise de confiança na ideologia marxista-leninista, o colapso económico, as
intervenções corajosas da Igreja e o dialogo aberto dos Bispos com a autoridade e a perseverança
dos cristãos e missionários. Outro aspecto positivo do ponto de vista eclesial, em estreita conexão
com a inversão ideológica, foi o número crescente de cristãos que regressavam à Igreja e de
catecúmenos que se preparavam para receber o sacramento do Baptismo.
195
Um exemplo desta maturidade cristã das comunidades e do zelo apostólico dos seus responsáveis é
testemunhado pelo P.e Franco Gioda na sua visita à missão de Nipepe, privada de acompanhamento pastoral directo dos
missionários desde a nacionalização da missão, em 1985: Celebrei a Santa Missa na grande igreja de Nipepe despojada
de tudo mas rica de fé. Dei por mim junto do altar submerso por uma maré de gente e tive a sensação de ter junto de
mim todos os Padres que trabalharam nesta terra: P.e Mário Filippi, P.e Luís Fiorini e P.e Oberto Abondio.
Restituíram tudo, menos o moinho e a escola. ...Mas isto é secundário. O que conta é uma Igreja viva que cresceu e se
torna adulta. O isolamento tornou a comunidade cristã unida na fé e na oração. Realizei muitos encontros e cursos nos
dois meses que aqui estive. Há uma sede da Palavra de Deus que causa impressão. Mas também ali começaram as
dificuldades da guerrilha. A gente desloca-se de um lado para o outro subdividindo as comunidades, o que torna difícil
um trabalho sistemático. Fui onde me deixaram ir, mesmo aos lugares mais difíceis. É bom que sintam visívelmente que
vivemos com eles e partilhamos da sua vida. Quanto suor e quanto sangue não custou o transporte da Bíblia, do
Leccionário “Masu a Muluku” e do Catecismo, desde Chea-Chea a Maúa? E são 210 kms. Desafiando todos os
perigos para ter, junto a si, o conforto da Palavra de Deus. Tudo está nas mãos dos animadores, como aliás já há anos.
Os grupos de oração multiplicam-se e expandem-se como nódoa de azeite. Contei mais de cem! Uma vez por semana,
grupos de famílias reunem-se para rezar e ler o Evangelho. Estarei atento a este sinal do Espírito. Carta do P.e Franco
Gioda ao P.e Norberto Louro, superior regional, Maúa, 25-2-1985: Encontro: Órgão informativo I.M.C. de
Moçambique, n.31 (1986) 8-9.
1. ORGANIZAÇÃO DO INSTITUTO MISSIONÁRIO DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE
Nesta década (1982-1992) muitos acontecimentos se sucederam que tocaram fortemente os
missionários da Consolata presentes em Moçambique. Além da situação sócio-politica num
contexto de guerra que fez os missionários viver momentos dramáticos, verificaram-se
acontecimentos positivos: o aumento do número de missionários e a sua internacionalização,
abertura a novos sectores pastorais, nomeadamente o serviço na formação do clero local, a
organização do seminário do Instituto para a formação de missionários moçambicanos, etc.
A figura e acção do Superior Regional nestes anos atribulados foi de grande importância.
Ele e o seu Conselho procuraram promover a comunhão dentro da Região e animar os confrades,
sobretudo nos momentos difíceis que nunca faltaram nestes anos. Os membros do Conselho
Regional representavam os três grupos de missionários: Niassa, Inhambane e Maputo. Reunia-se
duas vezes por ano: em Fevereiro e em Julho. Dadas as dificuldades de transporte e o isolamento
em que se encontravam alguns conselheiros, raramente todos os membros estavam presentes nas
reuniões.
Secretariados regionais propriamente ditos não existiam. Havia um missionário encarregado
da Pastoral e outro encarregado da formação e animação missionária. A situação de isolamento
vivida durante tantos anos não permitiu que a Região Moçambique se estruturasse nestes sectores.
196
O Conselho Regional ficou reduzido a três missionários em consequência da diminuição do pessoal missionário
em Moçambique. No dia 2 de Novembro de 1982, numa reunião dos missionários de Inhambane e Maputo, foi
escolhido um novo conselheiro em substituição do P.e Adelino Francisco, sequestrado pela Renamo. Foi eleito o P.e
Jaime Marques. Cf. Reunião plenária dos missionários do sul: Encontro IMC-Moçambique n.15 (1982) p. 8.
197
Cf. Acta da reunião do Conselho Regional. Maputo, 5-2-1982: ArqRegMoç. R. 3, pp. 45-47.
198
O boletim “Encontro ” IMC, nascido em 1971, deixou de se publicar em 1974. Foi retomado em Dezembro de
1982. O responsável da redacção era o P.e Francisco Lerma. Cf. Encontro IMC-Moçambique n.15 (1982) p. 2.
199
Em Agosto de 1984 pediu-se aos missionários que, além de votarem para a escolha do Superior Regional, se
pronunciassem sobre a constituição do Conselho Regional. No dia 20 de Agosto de 1984, na casa regional, procedeu-se
ao escrutínio dos pareceres e votos. Sobre o número dos conselheiros do próximo Conselho Regional, a maioria votou a
favor de que fosse composto por quatro conselheiros, em vez dos anteriores dois. Para a eleição do novo Superior
Regional, primeiro escrutínio, o P.e André Brevi obteve 6 votos. Não tendo sido conseguida a maioria de dois terços
exigida no primeiro escrutínio, procedeu-se a um segundo escrutínio no dia 26 de Setembro. Dos 24 missionários
enviaram o seu voto 20. O P.e Adelino da Conceição obteve 7 votos. Também nesta segunda votação não se conseguiu
a maioria de dois terços exigida pelas Constituições, pelo que se procedeu ao terceiro escrutínio, realizado no dia 30 de
Outubro. Dos 23 votos chegados, 16 optavam pelo P.e Adelino da Conceição que estava na paróquia de Massinga. O
eleito não aceitou o cargo, apresentando os seus motivos numa carta que enviou a todos os membros da região.
o Superior Geral, P.e José Inverardi, tomou a seguinte decisão: pediu a P.e A. Brevi que continuasse
durante seis meses no cargo de Superior Regional, até à próxima Conferência Regional, na qual
seria eleito o novo superior e seriam postas as bases para o caminho futuro da região200.
1.1.1. A IIIª Conferência Regional (1985): P.e Norberto Louro, Superior Regional
A IIIª Conferência Regional teve início no dia 26 de Maio de 1985, Domingo de
Pentecostes, com a participação de 20 missionários e do P.e Rafael Lombardo, Vice-Superior Geral.
A Conferência Regional anterior realizara-se em 1973, sendo longa a expectativa: doze anos de
transformações profundas na vida de Moçambique, bem como na vida interna da região. Tal
expectativa foi satisfeita por uma Conferência Regional bem organizada, animada pelo espírito de
oração e pelo desejo activo e participante de todos os presentes. Os temas tratados foram: vida dos
missionários, pastoral, promoção vocacional, organização da região, administração, etc. O ponto
forte desta Conferência Regional foi a unidade regional. Constatou-se que desde a criação da
Região única (1973) não tinha havido verdadeira comunhão regional e que este era um dos
problemas que mais se fazia sentir. Foram apontadas as causas desta situação e as pistas para o
futuro. No dia 1 de Junho procedeu-se à renovação da Direcção Regional. Ao terceiro escrutínio
resultou eleito o P.e Norberto Ribeiro Louro. Como conselheiros foram escolhidos o P.e Jaime
Marques (Vice-Superior Regional), Henrique Redaelli, José de Jesus Barros e Artur Pereira
Marques. A Conferência terminou no dia 5 de Junho201.
No dia 8 de Junho de 1985, depois de ter dialogado com cada grupo nos dias anteriores, o
P.e Norberto Louro reuniu-se com o Conselho Regional, para analisar vários problemas da Região.
Aproveitando as indicações do Conferência Regional foram escolhidos os titulares dos vários
serviços regionais: ecónomo regional, P.e Jaime Marques; animador e formador vocacional, P.e
Adelino Francisco; responsável do Secretariado da Pastoral, P.e Francisco Lerma; Procuradoria, P.e
Luís Ferraz. Passou-se em seguida ao exame da situação e colocação do pessoal.
1.1.3. Escolha da nova Direcção Regional (1990): P.e Franco Gioda, Superior Regional
Consultada a Direcção Geral em Roma, esta comunicou que se procedesse a uma única votação, e quem fosse
escolhido, ainda que só com maioria relativa, seria o novo Superior Regional. No dia 26 de Dezembro procedeu-se ao
quarto escrutínio. Teve a maioria dos votos o P.e André Brevi. Parecia que finalmente se tinha encontrado o Superior
Regional. Só que, perguntado se aceitava a direcção da região para mais um triénio, o P.e André Brevi respondeu que
não. Cf. Eleição do novo superior Regional: Encontro IMC-Moçambique n. 24 (1984) 2-3.
200
Cf. Eleição do novo superior Regional. 4º escrutínio: Encontro IMC-Moçambique n. 25 (1985) 3-4.
201
Cf. Terceira Conferência Regional: Encontro n.26 (1985) 7-11.
202
A reeleição do P.e Norberto Louro como Superior Regional e do respectivo Conselho verificou-se no dia 10 de
Agosto de 1987 durante a Assembleia Regional realizada no Maputo. Do novo Conselho Regional faziam parte os
padres Francisco Lerma, Adelino Francisco, Franco Gioda e José Salgueiro.
203
Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, 4ª Conferência Regional (Maputo 1988).
No dia 18 de Junho de 1990 foi escolhido o novo Superior Regional na pessoa do P.e Franco
Gioda, que tinha sido nomeado pároco de Cuamba. Como conselheiros foram escolhidos o P.e
Francisco Lerma, vice-superior, o P.e Salvador Forner, o P.e José Fernando da Rocha Martins e o
P.e André Brevi. Durante a segunda metade de Julho o novo Superior Regional iniciou a visita às
comunidades do Niassa e em seguida às de Inhambane para conhecer aquela zona e entrar na
realidade das comunidades que não conhecia. Escolheu como sua prioridade: ajudar todos a crescer
na unidade e na fraternidade. Tendo nos seus desejos e aspirações muito idealismo e também um
pouco de utopia, procurava concretizar quotidianamente tudo o que sonhava da realidade
missionária.
As dificuldades desses anos plasmaram a sua fé e uma caridade “concreta”, que se
manifestavam na sua presença lá onde podia chegar. Deixar-se programar por Deus e pelo próximo.
É o dom da nossa vida. Fantasia evangélica.
204
Cf. Visita do Padre Geral a Moçambique: Encontro n.15 (1982) pp.2-6.
205
Cf. Visita Canónica do P.e José Inverardi, Superior Geral: Encontro n.23 (1984) 5-6.
funcionava como elo de ligação entre todas as comunidades. O seu era um ministério de animação e
informação necessário para superar o isolamento das comunidades e encorajá-las na sua presença de
consolação. A acção do P.e Norberto Louro e em seguida do P.e Franco Gioda no meio dos
missionários, era sobretudo uma presença de irmãos, de orientadores que partilhavam o caminho
pessoal e comunitário de cada missionário.
A partir de 1982, depois de um longo período de espera, começaram a chegar novos
missionários a Moçambique206. Depois de uma clara diminuição, houve finalmente um pequeno
aumento207. A chegada de novos missionários veio dar mais ânimo aos compromissos pastorais
assumidos e permitiria de seguida retomar o trabalho de animação vocacional e formação de
missionários da Consolata moçambicanos. Com a chegada de novos reforços e para intensificar a
vida comunitária, optou-se por comunidades consistentes. A pouco e pouco, terminaram os casos de
missionários isolados. Incrementaram-se os valores da vida comunitária e intensificou-se a
planificação conjunta mediante a elaboração do projecto comunitário de vida em cada comunidade
missionária.
Outro aspecto positivo da vida comunitária, e que constituía uma novidade, era a
internacionalidade da maior parte das comunidades. A inserção dos missionários recém-chegados
oriundos da Europa, América e África, foi feita tentando responder às exigências da inculturação.
Realizaram-se cursos de inserção cultural e estudo da língua em Inhambane e no Niassa.
Por outro lado, a chegada de novos missionários contribuiu para insuflar nas comunidades
ideias novas, entusiasmo e zelo. A juventude e a experiência ajudaram a formar comunidades
apostólicas capazes de viver a dimensão do Pentecostes num Moçambique em guerra208.
206
A distribuição dos missionários da Consolata em Moçambique em 1982 era a seguinte. Diocese de
Lichinga: Padres José Barros, Camilo Ponteggia, Oberto Abondio, Luís Wegher (Lichinga); José Frizzi, Vidal
Moratelli, José Fernando da Rocha Martins (Cuamba); Adriano Severin (Mecanhelas); Norberto Louro, Adriano Prado
(Marrupa). Diocese de Inhambane: Padres Artur Marques, Francisco Lerma (Inhambane); José Tavares Matias
(Guiúa). Maputo: Padres André Brevi, Luís Ferraz, Eugénio Menegon, Augusto Fatela, Ir. Pedro Bertoni, Ir. José
Eusébio (Casa regional); P. Jaime Marques (Machava). Diocese da Beira: P.e Amadeu Marchiol. Encontravam-se
temporariamente fora de Moçambique os seguintes missionários: Padres Guido Gobbo e Adelino Francisco (Portugal).
207
Eis a lista dos missionários que vieram reforçar o grupo dos missionários da Consolata de Moçambique entre
1982-1990: P.e José Salgueiro da Costa, P.e Henrique Redaelli (1982); P.e Aquileu Fiorentini, Franco Gioda (1983);
P.e Ivanilson Brun, Mário De Carli, João Morando, Élio Rama, Ernestino Venturi (1984); P.e Miguel Njue, José
Rurunga (1985); P.e Salvador Forner (1986); P.e Alceu Agarez, Christian Fernandez Moores (1987); P.e Ariel Granada
Serna, Joseph Otieno, John Peter Njoroge, (1989); P.e António Rusconi, Agostinho Squizzato, José Torres Neves,
Ricardo Castro, Ir. Daniel Ndihu (1990).
208
Cf. Carta do P. Franco Gioda, Superior Regional, aos missionários: Encontro-Moçambique n. 46 (1992) 2.
algumas muito próximas das missões. A própria missão de São Francisco Xavier de Maiaca,
transformada em centro educacional pela Frelimo, foi ocupada e em seguida transformada numa
base operacional da Renamo.
Em 1985, em todo o país, a situação de guerra, fome, nudez e miséria que se vivia era fonte
de sofrimento e insegurança para toda a população. Às acções da Renamo, o Governo respondeu
com medidas repressivas: a promulgação das “leis dos crimes”, a “lei da chicotada”, públicas
punições para quem tivesse atentado contra a segurança nacional. Infelizmente, a sua aplicação foi
sujeita a abusos. Foi também colocada em prática a “operação produção” através da qual milhares
de moçambicanos das grandes cidades, sobretudo do sul, encontrados sem cartão de trabalho, foram
deportados para o Niassa. Abandonados no planalto durante o inverno e sem meios de subsistência,
muitos acabaram por morrer ou engrossar as fileiras da Renamo. Para enfrentar a guerrilha foi
decretado o serviço militar obrigatório.
O sofrimento do povo aumentava assustadoramente: fome, destruição e morte. A Igreja
Católica respondeu a esta situação de sofrimento com uma presença efectiva e afectiva entre a
população martirizada e com os apelos à paz e reconciliação entre as partes em conflito. Tiveram
grande impacto as cartas pastorais dos Bispos as quais ajudavam a tomar consciência da situação
trágica na qual Moçambique estava mergulhado e na necessidade de encontrar soluções para a
guerra.
Os Missionários da Consolata, como os demais religiosos de outras congregações,
compartilharam o calvário do povo e beberam com ele o cálice amargo do sofrimento: ataques,
viagens em coluna, fome, sequestro e morte.
209
Cf. L. WEGHER, Crónica do grupo do Niassa: Encontro-Moçambique n.32 (1987) 12.
210
Cf. F. LERMA, Vilankulo: situazione generale alla fine di 1987: Da Casa Madre n. 4 (1988) 23.
Alessandria para que preparasse as suas coisas e os acompanhasse até ao mato. Depois dos inúteis
protestos, o missionário partiu para o seu incógnito destino211. No dia 26 de Setembro juntaram-se a
ele o P.e Adelino Francisco e as Irmãs Teotina Cariolato, Bona Pischedda, Rosella Casiraghi e
Agnes Mainhardt, que tinham sido sequestradas a 16 do mesmo mês na missão de Muvamba. A
estadia na primeira base durou um mês, de 26 de Setembro até 26 de Outubro. Uma paragem que os
ajudou a recuperar as forças perdidas e que os impeliu a fazer tudo o que era possível para tornarem
menos insuportável o cativeiro. Passaram o tempo a rezar, a ler e a meditar. Pairava sobre as suas
cabeças a incógnita de quando e como acabaria esta aventura. A 26 de Outubro, escoltados pelos
guerrilheiros, deixaram o acampamento. Caminharam cerca de 200 quilómetros para noroeste em
direcção ao rio Save. Pelo caminho caíram em duas emboscadas das tropas regulares. No dia 20 de
Novembro chegaram a base. O calvário deste grupo de missionários durou até à noite de 25 de
Novembro de 1982, altura em que foram libertados na fronteira com o Zimbabwe, depois de terem
caminhado mil e duzentos quilómetros a pé, atrás dos guerrilheiros, totalmente percorridos em
ziguezague pelo meio do mato, alimentando-se como melhor puderam212.
Nessa mesma altura, no dia 20 de Novembro de 1982, a Renamo atacou a missão de Nova
Mambone com o objectivo de sequestrar os missionários. A argúcia e determinação do P.e Amadeu
Marchiol e Ir. Pedro Bertoni evitou o cativeiro, fugindo quando tiveram a primeira oportunidade213.
Todavia, por motivos de segurança, a missão foi encerrada temporariamente.
No dia 8 de Novembro de 1985, num ataque a uma coluna militar próximo de Metarica
raptaram a Ir. Luisa Amalia, missionária da Consolata, da missão de Maúa que viajava para
Cuamba. Depois da emboscada a missionária foi capturada e levada até à base. Durante meses não
se soube do seu paradeiro, circulando até a notícia de que teria sido morta. Ficou com os
guerrilheiros pelo espaço de 270 dias, sendo libertada em 13 de Agosto de 1986 devido à
intervenção do Vaticano e de várias organizações.
No dia 1 de Março de 1992, nas proximidades da missão de Massangulo, o carro no qual
viajava o P.e João Coelho Baptista, pároco de Mandimba e Mitande, foi alvo de uma emboscada de
guerrilheiros da Renamo e ele ficou ferido numa perna. Quatro pessoas que viajavam com o
missionário caíram mortas no ataque. O missionário foi transportado para a base da Muakanha,
onde ficou pelo espaço de um mês sendo em seguida libertado214.
211
Cf. Crónica de uns dias. Missão de Maimelane, 19 de Julho de 1982: Encontro n. 15 (1982) 9-10.
212
Para uma descrição mais detalhada do cativeiro e libertação destes missionários, ver a crónica escrita pelos
mesmos. Cf. Acordar, preparar e avançar! Cativeiro e libertação: Encontro n. 16 (1983) 3-10.
213
Cf. Mambone. Assalto à Missão (20-11-1982): Encontro n. 17 (1988) 5-6.
214
O P.e João Coelho Baptista narrou o atentado e rapto por parte da Renamo no livro que ele próprio escreveu: O
sangue que a terra bebeu (Fátima 1993).
A um certo momento, quando se encontravam a cerca de quinze quilómetros de Massangulo,
sai do mato um homem armado que os manda parar. Obedeceram prontamente e o P.e Rocha saiu
do carro e dirigiu-se para ele para ver o que queria. Nesse preciso momento, um grupo de cerca de
vinte indivíduos armados cercaram o carro e começaram a disparar, à queima-roupa, sobre o carro e
sobre as pessoas. O P.e Rocha atirou-se para o chão a gritar dizendo que eram padres. Já no chão,
foi atingido com uma bala na coxa, que o deixou a sangrar sem se poder levantar. Entretanto, uma
bala atingiu o Pe. Ariel na cabeça, no parietal direito, perto do olho. Teve morte imediata. Das
outras pessoas que seguiam no carro, ficaram feridas duas crianças com certa gravidade.
Apenas o fogo cessou, os guerrilheiros, quase todos adolescentes, correram ao assalto e
deitaram a mão a tudo o que havia. Depois da pilhagem o comandante deu ordem de retirada.
Quando os guerrilheiros se retiraram, a Irmã Rebeca, com grande dificuldade conseguiu
conduzir o carro até Massangulo. Dado que havia poucas possibilidades de prestar o necessário
socorro aos feridos, partiram de seguida para Lichinga, onde chegaram à tarde, acompanhados por
viaturas de uma empresa estatal. O P.e Rocha, com as duas crianças feridas, foi internado no
hospital, enquanto o corpo do P.e Ariel foi levado para a residência episcopal.
No dia seguinte, Sábado, dezasseis de Fevereiro, dia em que os missionários da Consolata
festejam o seu Fundador, Beato José Allamano, foi realizado o funeral. Na Catedral de Lichinga o
Sr. Bispo presidiu à Missa exequial. O corpo do P.e Ariel foi em seguida sepultado no cemitério da
missão de Santo António de Unango, Mbemba, onde jazem outros missionários e missionárias da
Consolata falecidos no Niassa215.
215
Cf. J. COELHO BAPTISTA, O Sangue que a terra bebeu (Fátima 1993) 123-132.
216
Cf. F. LERMA, Mártires do Guiúa (Turim 2001) 13-17.
3. A ATITUDE E ACTIVIDA DOS MISSIONÁRIOS: PERMANECER A TODO O CUSTO
217
Eis o testemunho de P.e Franco Gioda, pároco de Maúa, Nipepe e Maiaca, numa carta escrita ao Superior
Regional: Caro Norberto, não tenhas medo. Não me exponho ao perigo, mas não posso deixar de fazer o que a minha
vocação exige e aquilo mesmo que o Senhor faria. A fadiga nada me custa porque sei que a minha presença é
esperança e vida. Conheces o drama e a situação de tragédia da gente daqui. Já não há vontade de sobreviver, deixa-
se correr; falta até vontade de construir a própria palhota ou de cultivar a terra. O homem está destruído. Portanto,
levar a esta gente o anúncio e a esperança de Jesus justifica que se corram todos os riscos, mesmo a vida se for
necessário. Ver o Padre cansado, esfomeado, sujo, enlameado, a partilhar com eles o perigo da guerra faz
compreender concretamente que alguém os ama, os procura. Carta do P.e Franco Gioda ao P.e Norberto Louro,
Superior Regional, Maúa, 25-2-1985: Encontro n.31 (1986) 9
218
O Superior Regional, P.e Norberto Louro, após um encontro com os missionários presentes no Niassa em 1985,
comentava com estas palavras o espírito de abnegação e sacrifício dos missionários: Em Lichinga, sempre o mesmo!
Padres e Irmãs que fazem mais do que podem por serem poucos e ainda julgam que fazem pouco porque a guerrilha
não lhes deixa espaço nem estradas, Padres idosos com ganas ainda de irem para zonas de fronteira reabrir missões
impossíveis fechadas há anos; Padres recém-chegados de uma Europa consumista e farta a viverem a missão difícil e a
vida carecida de tudo, com estupendo entusiasmo, nesta martirizada terra. E todos, todos, com escrúpulos de fazerem
pouco. Muito é realmente o que fica por fazer mas nos ultrapassa. O sofrimento do povo, a guerra, a morte, as aldeias
queimadas, os “despejados” da operação produção. Tudo isso dá sensação de ineficácia do nosso trabalho. N. LOURO,
Uma pausa, três experiências: Encontro n. 23 (1984) 14.
219
A partir de 1984, o P.e Franco Gioda passou a visitar as comunidades cristãs das missões de Maúa, Nipepe e
Maiaca de bicicleta, passando as noites nas palhotas abandonadas pela gente que foge à guerra. Eis o seu testemunho
numa carta enviada ao P.e Norberto Louro, Superior Regional: Dou-me conta de que algo está a mudar. Desloco-me
sempre de bicicleta por causa do perigo das estradas minadas. Não sei quantos quilómetros terei feito nos últimos
meses, mas estou a constatar que o facto de parar e dormir nas comunidades é muito positivo em ordem a entrar nos
problemas do povo e das comunidades. Custa-me, mas tenho que aproveitar este tempo em que as zonas de Nipepe e
continuava a queimar as pontes e a colocar minas nas estradas. As viagens tornaram-se cada vez
mais difíceis. Apesar da situação lastimosa da população que tinha que fugir de um lado para o
outro, que via queimar as suas casas e roubar o pouco que tinham, e talvez por causa de tudo isto,
havia nos seus corações uma grande abertura à religião. Os baptismos e matrimónios eram
numerosos.
Em mais de uma circunstância foram testemunhas oculares da violência da guerra. No dia 8
de Dezembro de 1988, a vila de Maúa foi novamente atacada. Aos padres e irmãs nada aconteceu e
preocuparam-se em sepultar os mortos e curar os feridos. Em Nipepe surgiu em 1988 um centro
catequético no meio da guerra. Cinquenta famílias, bem aconchegadas à volta da igreja. Um centro
daqueles, naquele lugar e naquelas circunstâncias, era um desafio à bondade de Deus. Em Janeiro
de 1989 Nipepe foi atacada. O P.e Frizzi encontrava-se lá. Estava celebrando a Missa quando se deu
o ataque. Muitos dos catequistas e seus familiares foram levados. No dia 21 de Novembro de 1990 a
sede de Maúa foi outra vez atacada. Mais de 20 pessoas perderam a vida durante o ataque e muitos
foram os feridos. Também a residência dos missionários foi atingida por uma bazuka que explodiu
contra a casa abrindo um buraco na parede do quarto de um dos missionários, que felizmente estava
ausente na missão de Nipepe. Alguns dias depois, a 3 de Dezembro, a vila de Maúa foi novamente
atacada. A residência dos padres passou a ser o refúgio da população durante a noite220.
Também os missionários de Mecanhelas, a um certo momento, se encontraram isolados do
resto do país. As estradas minadas e os contínuos ataques da Renamo à linha-férrea de Entre-Lagos
a Cuamba impediram o contacto com os restantes missionários do Niassa. Contudo, podiam viajar
até ao Malawi. Foi o caso dramático que se deu com o P.e Adriano Severin. Em Fevereiro de 1986,
estando sozinho em Mecanhelas, sofreu uma embolia cerebral, tendo sido evacuado para Blantyre
(Malawi) em condições muito difíceis.
No dia 16 de Agosto 1986 falecia em Lichinga de hemorragia cerebral o P.e Camilo
Ponteggia. Um mês antes tinha celebrado as Bodas de Ouro sacerdotais juntamente com o seu
companheiro, o P.e Oberto Abondio. Tinha chegado a Moçambique em 25 de Abril de 1947.
Depois de uma breve experiência missionária na missão de Mitúcue e na incipiente missão do
Txatxe (Maiaca) foi nomeado superior da missão de Unango. Em Agosto de 1962 foi eleito superior
da missão de Massangulo em substituição do P.e Pedro Calandri. Em 1972, o P.e Ponteggia deixará
Massangulo com destino a Vila Cabral onde exerceu as funções de ecónomo, secretário e vigário
geral da diocese até à sua morte. Foi sepultado no cemitério da missão de Unango.
Maiaca estão abandonadas. O Administrador dá-me autorização e sou praticamente o único a deslocar-me pela zona.
Até agora o Senhor protegeu-me a 100%. Vive-se em clima de medo permanente. Ninguém viaja. Quando for possível
irei a Marrupa. A situação eclesial é boa. Há um regresso à Igreja muito forte. As aldeias foram abandonadas. As
únicas escolas são as da vila de Maúa. As nossas antigas missões de Maúa e Maiaca também foram abandonadas
definitivamente. Carta de P. Franco Gioda, Maúa, 25-2-1985: Encontro n.23 (1984) 10.
220
Cf. Carta do P. Adriano Prado ao P. Franco Gioda: Encontro n.43 (1990) 17.
221
Cf. Reunião plenária dos missionários do sul: Encontro n.15 (1982) 8.
Com grande esforço os missionários conseguiam visitar de barco as comunidades do litoral
da missão de Maimelane. A situação na região era dramática: guerra, fome e nudez. A população de
Maimelane, refugiada no litoral, foi a que mais sofreu as consequências da guerra e da fome. A
missão de Mapinhane era visitada regularmente, apesar da insegurança da estrada devido aos
ataques contínuos da Renamo. Em 1986 a vila de Vilankulo sofreu uma investida da Renamo que
causou um número elevado de vítimas.
A missão de Nova Mambone ficou sem missionário residente a partir de 28 de Novembro de
1982, em consequência do ataque da Renamo. A assistência e apoio possíveis eram prestados pelo
P.e Amadeu Marchiol que residia na Beira, onde assumiu a responsabilidade pastoral da paróquia
do Macuti. Durante o ano de 1984 ele visitou aquelas comunidades diversas vezes. Nesse ano
morreram muitas pessoas devido à seca e consequente fome. Fez o possível e o impossível para
socorrer a população com envio de leite, farinha e outros géneros alimentares222. Da cidade da
Beira, o P.e Amadeu Marchiol continuou a assistir pastoralmente a missão de Nova Mambone. Em
1987 regressou a Nova Mambone e em seguida juntaram-se-lhe outros dois missionários: o P.e
André Brevi e o Ir. P. Bertoni. Construíram uma casa a meio caminho entre a vila e a salina. O sitio
era mais seguro que a missão de Doane. Em Massinga a situação era idêntica. Os missionários
continuaram isolados com a guerra às portas da vila. Em 1988 a missão de Muvamba foi atacada
pela Renamo.
Durante a guerra os missionários da Consolata continuaram a prestar a sua colaboração pastoral
no Centro Catequético de Guiúa. Depois do seu encerramento por imposição da autoridade política
(21 de Maio de 1983), o mesmo foi reaberto em 1985 continuando a prestar um serviço qualificado
à formação dos catequistas e animadores a nível diocesano223. Todavia a guerra tornava a zona do
Guiúa insegura, tanto que o Centro Catequético acabaria por ser atacado em diversas circunstâncias.
A província de Inhambane nestes anos de guerra foi a mais atingida pela fome. Entre 1982 e
1983 na região entre Massinga e Nova Mambone morreram 50.000 pessoas em consequência da
fome224. Este triste cenário de morte esteve sempre presente nos anos da guerra e foi testemunhado
pelos missionários, os quais tentaram fazer tudo o que estava ao seu alcance para aliviar a dor das
populações225.
Apesar dos limites impostos pela guerra e suas nefastas consequências os missionários
mantiveram-se pastoralmente activos. A programação pastoral a nível paroquial e diocesano era
uma constante. Na assembleia diocesana de pastoral, realizada em Inhambane de 25 a 27 de
Novembro de 1985, foi feita a avaliação das actividades pastorais e a programação diocesana.
Optou-se por um objectivo pastoral geral: dar continuidade ao trabalho de formação de
comunidades cristãs adultas. Dentro desta linha, a assembleia achou que a concretização deste
objectivo deveria incidir sobretudo sobre a formação cristã das famílias através de acções concretas
como: campanha de regularização da vida matrimonial, baptismo dos filhos das famílias cristãs,
preparação séria dos jovens para a vida matrimonial, recuperação das famílias afastadas da prática
cristã226.
222
Cf. Relatório do ano 1984 da Missão de Mambone. Beira, 10-2-1985: ArqRegMoç. C 1, n. 17.
223
Cf. Reunião anual dos missionários. Programação diocesana de Pastoral (1986). Inhambane, 25-27/11/1985:
ArqRegMoç. C. 1, n.19.
224
Cf. Relatório da região de Moçambique para o VIIIº Capítulo Geral (1987), p.17.
225
Em 1988, viajando do Guíua para Nova Mambone, o P.e André Brevi escrevia: Tive oportunidade de rever
muita gente conhecida em Maimelane e Mapinhane e de ouvir suas notícias. Infelizmente são quase só notícias tristes.
Falam de sofrimento, de privações e da morte de parentes e irmãos das comunidades. São quase todos deslocados de
guerra à espera de regressar às próprias aldeias, mas ninguém sabe quando isso será possível. Esta realidade fere-nos
cada vez mais e faz-nos sofrer. Com muitos deles tínhamos feito, no passado uma caminhada difícil, imediatamente
depois da independência e esperávamos viver dias melhores… mas tudo parece tão sombrio! Como sombras de morte
provocadas pela fome que será terrível nos próximos meses se, entretanto não chegar a paz. A. BREVI, Vigília de Natal
de 1988: Encontro n. 39 (1989) 17.
226
Reunião anual dos missionários. Programação diocesana de Pastoral (1986). Inhambane, 25-27/11/1985:
ArqRegMoç. C. 1, n.19.
3.3. O grupo de Maputo
Na diocese de Maputo, os missionários da Consolata continuavam a prestar serviço pastoral na
zona periférica da cidade: Machava, Liberdade e Liqueleva. Entretanto em 1982, a paróquia de São
Gabriel da Matola foi entregue ao cuidado pastoral dos padres Jesuítas. Em compensação o Instituto
assumiu a responsabilidade pastoral da paróquia da Liberdade, incluída na zona pastoral da
Machava. Esta zona pastoral, confiada aos missionários da Consolata, compreendia, além da
Machava, Liqueleva, Tsalala e Bairro da Liberdade. Com o passar dos anos, assistiu-se nestas
paróquias, com satisfação, ao regresso à prática religiosa de muitos cristãos que se tinham afastado
pelo vento da revolução227.
Em 1988, nos anexos da paróquia da Machava, começou a funcionar o seminário de Nossa
Senhora da Consolata onde foi acolhido o primeiro grupo de seminaristas do Instituto228. Em 1992,
o seminário deixou as instalações provisórias da paróquia da Machava para passar a ter a sua sede
definitiva na Matola. Deste modo, os missionários voltavam novamente à Matola, dez anos depois
de terem saído.
227
Em 1985, o P.e Ernestino Venturi, recém-chegado a Moçambique, apercebeu-se que a aproximação dos
cristãos à Igreja era um dado de facto consolador na paróquia de Liqueleva e Machava depois da debandada geral
provocada pela revolução: Agora o clima é de regresso à Igreja. “Padre, me confiava um antigo cristão, durante o
tempo difícil da revolução em relação aos crentes até 1981, na nossa missão, ficámos muito poucos e na comunidade
apenas 4 ou 5; perseverámos e agora a igreja está cheia”. Conscientes e contentes os cristãos procuram com zelo
missionário o regresso dos seus irmãos. E. VENTURI, Crónica de Liqueleva. Encontro n. 25 (1985) 8.
228
Cfr. A. CONÇEIÇÃO FRANCISCO, O Seminário IMC: Encontro n.36 (1988) 13-17.
229
A “Caritas” Moçambicana começou a sua acção em 1977. Seu primeiro secretário geral e organizador foi o P. e
Jaime Marques, missionário da Consolata.
A pouco e pouco a Igreja emergiu como força capaz de dar esperança ao povo e consistência ao
caminho para a liberdade e para a paz. Neste sentido, a Conferência Episcopal publicou várias
cartas pastorais em que apelava à paz e à reconciliação das partes em luta (Frelimo-Renamo)230.
Lentamente as relações entre o Estado e a Igreja melhoraram. Com a visita do Papa a Moçambique
(17-19/9/1988) teve início um diálogo aberto e profícuo. A posição do governo em relação à Igreja
mudou substancialmente.
A partir de 1990 houve grandes modificações político-económicas: a revisão da constituição, o
abandono do marxismo-leninismo como ideologia do Estado, a privatização da economia, o
reconhecimento da liberdade de expressão e o pluripartidarismo. Estas medidas contribuiram para
criar o ambiente favorável à paz e reconciliação.
Finalmente, ao meio-dia do dia 4 de Outubro de 1992, o presidente da república de
Moçambique, Joaquim Alberto Chissano, e o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, em Roma,
assinaram o tão suspirado Acordo Geral de Paz. Este acordo, que punha cobro a 15 anos de guerra,
era fruto da habilidade dos negociadores, pacientemente orientados pela Comunidade de Santo
Egídio, e do perseverante trabalho de formação nos valores do perdão e reconciliação, efectuado
pela Igreja no terreno231.
O acordo de paz foi celebrado em toda a parte com muita alegria e algum cepticismo. Um
acontecimento importante para a nação, para a Igreja e para o Instituto pois irá obrigar a rever os
seus programas de trabalho232. No novo contexto sócio político e eclesial que está nascendo
aparecem no horizonte novos desafios: participação democrática na vida pública e inculturação da
fé.
230
CEM, Um apelo à paz; Comunicado às comunidades, (Maputo 1983); Pastoral sobre a conversão e a
reconciliação, (Maputo 1983); A urgência da Paz (Maputo 1984); A paz é possível (Maputo 1985); Um apelo à paz
(Maputo 1985); Cessem a guerra, construam a paz (Maputo 1986).
231
Cf. R. MOROZZO DELLA ROCCA, Mozambico. Dalla guerra alla pace. Storia di una mediazione insolita (Milão
1994).
232
Cf. Região de Moçambique. Pré-relatório para o Capítulo Geral (Maputo 1992) 3.
SÉTIMO PERÍODO(1993-2000):
O TEMPO DA RECONSTRUÇÃO
Introdução
A esperança cristã baseada em Deus e na bondade do coração humano continua a caracterizar o
momento presente e a suster a presença e a acção missionária. Com o acordo geral de paz entrou-se
numa nova fase da história de Moçambique a qual exige lucidez e humildade para lograr capacidade
de escuta e mudança.
Até então, a evangelização era a preocupação prioritária porque não havia espaço de liberdade
para projectos de desenvolvimento e promoção. Com o advento da liberdade e da paz, a Igreja
mobilizou-se para colaborar na reabilitação económica e moral do país.
Com a assinatura do acordo geral de paz começa um momento novo na história de
Moçambique. Depois de várias décadas de opressão e de guerra, os moçambicanos têm a
possibilidade de viver finalmente livres e em paz. É tempo de trilhar caminhos novos: um sistema
político novo (democracia, multipartidarismo, eleições livres), uma nova economia (mercado livre),
liberdade de expressão religiosa, etc. Deu-se início à reconstrução das infra-estruturas danificadas
pela guerra (estradas, escolas, hospitais, missões, etc.); o repatriamento de milhares de refugiados, a
realização das primeiras eleições livres e democráticas (1994). À estagnação de muitos anos,
sucedeu um crescimento económico devido às privatizações e ao afluir de capitais vindos de fora.
Por outro lado, antigos males persistem em sobreviver: pobreza crescente devido à inflação e à
dependência económica do exterior; corrupção generalizada; desemprego; aumento da
criminalidade e violência, sobretudo nas cidades; famílias desintegradas e crianças abandonadas. As
assimetrias no plano social são por demais notórias.
Neste contexto de reconstrução, a Igreja Católica esforçou-se por dar o seu contributo na
renovação moral e económica do país. Criou infra estruturas de promoção humana através da
criação de escolas, centros para crianças desnutridas, ajuda aos deficientes físicos, assistência aos
refugiados, doentes e velhos, etc. A Igreja empenhou-se também na recuperação das estruturas que
lhe tinham sido confiscadas pelo Governo. Ao mesmo tempo, fizeram-se escolhas significativas
para a requalificação dos agentes pastorais, sobretudo através dos seminários e dos centros pastorais
e catequéticos.
Pode-se constatar sobretudo uma Igreja que soube escolher a ministerialidade como dimensão
que lhe caracteriza a vida e cada expressão. Esta ministerialidade não foi só a resposta a um
momento de emergência, mas forjou um estilo diferente de vida e de evangelização. Ela é já uma
planta viçosa que dá frutos.
233
Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, Vª Conferência Regional. Missionários da Consolata em Moçambique:
Qual Missão? Qual Missionário? Qual Espírito? (Maputo 1994).
234
Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, VIª Conferência Regional. Missionários da Consolata, 75 anos em
Moçambique: desafios da Missão “ad gentes” (Maputo 2000) 24.
ministérios. O Instituto da Consolata tem colaborado economicamente, sempre que necessário,
nestas iniciativas e também na publicação de material catequético e outras publicações235.
Tem-se também procurado favorecer uma pastoral sectorial que atinja os profissionais,
especialmente professores, enfermeiros e outros, de modo que possam ser objectos e sujeitos de
evangelização.
O Instituto da Consolata tem, além disso, intensificado o seu compromisso nos serviços
qualificados à Igreja local, nomeadamente na formação do clero local e dos religiosos e religiosas
dirigindo o Seminário Inter-diocesano de Nampula e ensinando noutras instituições da Igreja
(seminário S. Pio X, seminário Santo Agostinho, Instituto Maria Mãe de África, etc.)236.
235
Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, Vª Conferência Regional Missionários da Consolata em Moçambique:
Qual Missão? Qual Missionário? Qual Espírito? (Maputo 1994) 10.
236
INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, VIª Conferência Regional. Missionários da Consolata, 75 anos em
Moçambique: desafios da Missão “ad gentes” (Maputo 2000) 25.
237
Os missionários da Consolata organizararam a Comissão de Justiça e Paz em conjunto com as missionárias da
Consolata. Esta comissão tem como finalidade imprimir no modo de evangelizar uma dimensão que seja sensível aos
direitos da pessoa humana e que se comprometa a defendê-los. Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, VIª Conferência
Regional. Missionários da Consolata, 75 anos em Moçambique: desafios da Missão “ad gentes” (Maputo 2000) 45.
missionários e do clero local aumentaram para ambas as partes: um maior empenho missionário,
maior profundidade, autenticidade e maturidade da parte de todos238.
Elas merecem ser apoiadas e encorajadas. A VI ª Conferência regional estimulou a realização
de experiências significativas no campo da inculturação, manifestou o seu apoio às já existentes e
renovou o seu propósito de ajudar a Igreja local a assumir o papel que lhe compete neste campo239.
Neste período, o Centro de Estudos Macuas de Maúa e o Centro de Promoção Humana do Guiúa
deram um valioso contributo no âmbito da inculturação litúrgica e catequética assim como na
inserção cultural dos missionários e missionárias recém chegados.
No referente ao diálogo inter religioso, alguns missionários procuraram aprofundar o seu
conhecimento da religião tradicional e do Islamismo através do estudo e de contactos com os
responsáveis religiosos (régulos, curandeiros, mwalimos e outros), privilegiando as festas, os
acontecimentos do ciclo vital e estações do ano como momentos propícios para o diálogo.
238
Cristianismo com rosto moçambicano. Intervista ao P.e José Frizzi: Fátima Missionária 45 (1999/2) 18-20.
239
INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, VIª Conferência Regional. Missionários da Consolata, 75 anos em
Moçambique: desafios da Missão “ad gentes” (Maputo 2000) 37.
240
Carta do P.e Pedro Trabucco, Superior Geral, aos missionários da Consolata da Região de Moçambique:
Bollettino IMC n. 71 (1996) 15-30.
missionário. O dilema destes anos foi e continua a ser: estar presentes nas antigas missões, embora
com grande custo e sacrifício, ou então abandonar. Abandonar o campo semeado e conservado com
tanto sacrifício foi considerado sempre uma traição à vocação missionária, porque, saindo, ninguém
poderia assumir tal tarefa. Com o progressivo aumento do clero local e a chegada de novas forças
missionárias foi possível entregar algumas missões.
241
INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, Missionários da Consolata. Vª Conferência Regional: Qual Missão, qual
Missionário, qual Espírito? (Maputo 1994) 21.
242
Secretariado Regional. Encontros de grupo: Encontro n. 52 (1995) 4-5.
linguístico Ayao, à volta da cidade de Lichinga e reforçar a actividade missionária nas zonas de
Majune, Mbemba (antiga missão de Unango) e Mandimba.
Em 1996 as duas comunidades fundiram-se numa única comunidade missionária, com sede na
nova casa de Lichinga. O objectivo era de dar maior consistência à vida comunitária e maior
coordenação ao trabalho pastoral, vivido em contextos muito diferentes e periféricos. Nesse mesmo
ano foi criada a comunidade missionária de Mandimba, constituída pelos Padres João Coelho
Baptista e Rosalino Dall’Agnese.
Na zona sul do Niassa existem três comunidades missionárias: Mecanhelas, Cuamba e Maúa. A
equipa missionária de Mecanhelas tem a responsabilidade pastoral da missão de Mecanhelas e de
Mepanhira; a equipa missionária de Cuamba tem a seu cargo o cuidado pastoral das missões da
paróquia de Cuamba e da missão de Mitúcue, e a equipa missionária de Maúa tem à sua
responsabilidade as missões de Maúa, Maiaca, Nipepe (em seguida cedida à diocese) e Marrupa.
A zona sul é a região mais evangelizada de toda a diocese de Lichinga. Todas as paróquias têm
um número elevado de comunidades cristãs, que desenvolveram grandemente a dimensão
ministerial. Estas três equipas missionárias actuam cada uma com o seu próprio estilo pastoral
forjado ao longo dos anos, esforçando-se por partilhar entre si as respectivas experiências. Tem sido
um enriquecimento para o grupo a experiência formativa e pastoral dos finalistas de teologia do
Instituto que têm feito o seu estágio pastoral nas paróquias do sul do Niassa como preparação prévia
para a ordenação sacerdotal. Ultimamente, dois sacerdotes diocesanos venezuelanos, agregados ao
Instituto, prestam serviço pastoral na diocese de Lichinga: o P.e Ricardo Avila (Nzinje) e o P.e
Alberto de Jesus (Cuamba).
243
A Universidade Católica começou a funcionar em 1996: na Beira funciona a faculdade de Economia e Gestão
de Empresas e em Nampula a faculdade de Direito e Ciências da Educação. Em 1999 foi inaugurada em Cuamba
(Niassa) a faculdade de Agronomia.
2.1.4. Grupo de Inhambane
O grupo de Inhambane é constituído por 4 comunidades missionárias – Nova Mambone,
Vilankulo, Massinga e Guiúa – as quais assistem pastoralmente 8 missões/paróquias: Nova
Mambone, Maimelane, Vilankulo, Mapinhane, Muvamba, Massinga, Funhalouro e Guiúa.
Na missão de Nova Mambone a actividade da salina retomou o seu ritmo e deu-se início à sua
modernização. Além desta actividade realizam-se outras iniciativas de promoção e
desenvolvimento. Em 1996 chegou o P.e Francisco Lerma para o incremento da pastoral e o Ir. José
Cardinali. Em 1998 incorporaram-se nas actividades da missão as Irmãs Palotinas.
A vila de Vilankulo é a sede da comunidade missionária que presta assistência a três missões:
Vilankulo, Maimelane e Mapinhane. Em 1997 as Missionárias da Consolata despediram-se de
Vilankulo para voltar a residir na missão de Maimelane, entretanto recuperada. A missão de
Mapinhane foi também reactivada e recuperada. Pela sua posição estratégica é o lugar de reunião
para o grupo. Com essa finalidade foi recuperada a espaçosa residência dos padres. A chegada das
Irmãs Agostinianas Missionárias (31/5/1995) permitiu a abertura da Escola Secundária que tomou o
nome do P.e Gerardo Gumiero. Esta escola secundária, dedicada a este missionário da Consolata
que muito fez em prol da educação nesta região, foi inaugurada em Fevereiro de 1996 e é fruto da
colaboração das paróquias do norte da diocese. No ano 2000 chegou a Mapinhane um casal de
leigos missionários portugueses, o Ricardo e a Elisabete Sapina Santos, enviados pela Região
Portuguesa dos Missionários da Consolata no âmbito do projecto missionário laical “Sai da Tua
Terra”. Prestam um serviço qualificado na escola secundária, ensino e administração, e na
pastoral244.
A comunidade missionária de Massinga, composta por três padres, que têm à sua
responsabilidade o cuidado pastoral das comunidades cristãs da missão de Massinga, Muvamba e
Funhalouro. No Guiúa, os missionários da Consolata dedicaram-se nestes anos à restruturação do
Centro de Promoção Humana e organização pastoral do mesmo, além do cuidado pastoral das
comunidades da paróquia de Santa Isabel.
244
Os primeiros leigos missionários a chegar a Moçambique foram o Sr. Giancarlo Pegoraro e Paulo Deriu (1998)
destinados a trabalhar na missão de Mecanhelas. Mais tarde, no ano 2000, chegou o leigo Xavier Ramírez, venezuelano,
no seguimento de uma sugestão do P.e Sandro Faedi. A VIª Conferência regional de Moçambique (2000) pronunciou-se
sobre o tema dos leigos IMC, declarando-se aberta á sua inserção nas suas actividades, mediante a formação destes, a
apresentação de um projecto claro de trabalho, a constituição de comunidades próprias, se possível, e a assinatura de um
contrato com o Instituto. Cf. INSTITUTO MISSÕES CONSOLATA, VIª Conferência Regional. Missionários da Consolata,
75 anos em Moçambique: desafios da Missão “ad gentes” (Maputo 2000) 34.
Conselho regional deu o seu parecer positivo à criação de uma rádio local católica, que é pertença
da Arquidiocese de Maputo.
Na cidade da Matola funciona o seminário filosófico Nossa Senhora da Consolata. Os padres
encarregados da formação dos seminaristas do Instituto colaboram na pastoral das paróquias da
Machava e Liqueleva e no ensino no seminário Santo Agostinho e Pio X.
No início de 1994 deu-se a abertura de uma nova comunidade do Instituto no Maputo, a casa do
Noviciado São Paulo245. A comunidade era formada pelo P.e Norberto Louro, mestre dos noviços, e
pelo P. e Eugénio Menegon, director espiritual e pelo P.e Ernestino Venturi, ecónomo.
Provisoriamente, os 11 novíços – 6 moçambicanos e 5 congoleses – iniciaram o ano do noviciado
nas instalações do Seminário da Matola. No dia 19 de Março o noviciado transferiu-se para a sua
sede no bairro Laulane, tendo sido inaugurado oficialmente pelo Sr. Cardeal José Alexandre no dia
29 de Junho desse mesmo ano.
245
Em Junho de 1992 a Direcção Geral escolheu a região de Moçambique como a segunda sede do noviciado
inter-africano. Em resposta a esta solicitação do Instituto, o conselho regional aceitou de bom grado a projecto do
noviciado em Moçambique. Sensível a uma formação mais inserida no meio do povo, a Região de Moçambique propôs
que a sede do futuro noviciado fosse na antiga missão de Mangonha/Massinga ou Mapinhane (Inhambane). Em Agosto
a Direcção Geral respondeu afirmando que a sede do noviciado devia ser no Maputo. Em seguida procurou-se um lugar
nos arredores do Maputo. Acabou-se por adquirir um edifício ainda em construção de propriedade das Irmãs do
Calvário, situado no bairro de Laulane, um dos tantos bairros periféricos da capital.
TERCEIRA PARTE:
ALGUNS ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DO
MÉTODO DE EVANGELIZAÇÃO DOS
MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE
1. Aprendizagem da língua e cultura local
1.1. A aculturação dos Missionários da Consolata em Moçambique
O conhecimento da língua era indispensável para comunicar com o homem ayao, macua,
anyanja, vatshwa ou mandau. Perceber e falar a sua língua era conditio sine qua non para
evangelizar. Não eram suficientes os gestos, os sinais ou o recurso ao tradutor. Servindo-se de
gramáticas já existentes e sobretudo dos contactos quotidianos, houve missionários que, pouco a
pouco, conseguiram aprender e falar bem as línguas locais.
A maior parte dos pioneiros da evangelização, os padres Pedro Calandri, Gabriel Quaglia,
Mário Casanova, Oberto Abondio, Luís Bosio, Mário Fillipi, Adriano Severin, José Paleari,
Osvaldo Peressini etc., conheciam e usavam as línguas locais. Interessavam-se não só por falar e
estudar a língua para melhor evangelizar, mas dedicavam-se, inclusivamente, à investigação
filológica, na elaboração de gramáticas e dicionários para uso próprio, penetrando na estrutura da
língua e contribuindo para o seu desenvolvimento. Esta geração de missionários assumiu seriamente
o sacro dever de estudar e falar as línguas indígenas.
Com o tempo começaram a aparecer os primeiros trabalhos linguísticos e catequéticos em
língua ciyao, macua e xitshwa, nomeadamente gramáticas246, dicionários247, catecismos, livros de
oração e de cânticos248. No Niassa os padres Calandri, Casanova, Filippi e Severin deram às línguas
ciyao e macua uma nova dimensão e dignidade, passando de línguas exclusivamente orais para
línguas escritas e veículos audio-visuais da mensagem cristã249.
No Sul do Save, entre outros, distinguiram-se no conhecimento das línguas xitshwa os padres
Gabriel Quaglia, José Paleari, Armanno Armanni, José Matias. Também o P. Amadeu Marchiol, a
trabalhar desde 1956 em Nova Mambone, soube penetrar na alma do povo mandau com
persistência, conhecendo a sua cultura e língua.
A segunda geração de missionários não seguiu o exemplo destes pioneiros, com raras
excepções, quer no Niassa, quer em Inhambane. A aprendizagem das línguas locais foi relegada
para segundo plano em detrimento de outras actividades, permanecendo como um desejo
eternamente adiado. Todavia, houve missionários que se esforçaram, por retomar e dar continuidade
aos trabalhos linguísticos dos pioneiros. Estes traduziram os principais textos litúrgicos e
catequéticos, para facilitar aos fiéis a participação activa nos actos litúrgicos. Antes da
independência, no contexto ayao, o P. Guerrino Prandelli dedicou-se ao estudo da língua ciyao e à
tradução dos textos litúrgicos, mas a sua morte prematura bloqueou os trabalhos nesta língua do
norte do Niassa. No ano de 1972, em Massinga, foram impressos 1.500 exemplares do Ordinário da
Missa (2ª edição), opúsculos com o ritual do Baptismo, do Casamento e dos enterros na língua
xitshwa, cuja tradução foi coordenada pelo P.e Emanuel Maggioni250.
Para suprir a lacuna existente no que respeita à aprendizagem das línguas locais por parte dos
missionários, o Conselho Regional decidiu em 1971 que aos missionários recém-chegados deveria
ser facultada a possibilidade de estudar as línguas locais por um determinado período de tempo.
246
Cf. M. CASANOVA, Appunti di lingua Elomwe (Mitúcue 1947): AIMC XIII-472.
247
Cf. M. FARMAR FILIPPI, Dicionário elementar português-macua (Maiaca, 1963): AIMC XIII-473.
248
Mavekelo ni Itxipo (Nampula, 1950); Katekismu ya Mahusiho a Katolika (Nampula 1950); Okumi wa Apwiya
Yesu Kristu (Nampula, 1950).
249
O P.e José Frizzi deu continuidade ao trabalho linguístico iniciado pelos missionários da primeira geração.
Entre outros trabalhos, ampliou e publicou o dicionário do P.e Mário Filippi: Vd. Dicionário Emakhuwa-Português.
Português-Emakhuwa (Maúa, 1992).
250
Cf. Crónica de Massinga: Encontro n. 3 (1972) 11.
Para os missionários do Niassa optou-se pela organização de cursos de língua em Mepanhira e pela
frequência do curso de inserção e língua macua do Centro Catequético de Anchilo (Nampula), para
o qual foi enviado o P.e Francisco Lerma. Ainda em 1971 e não havendo nenhum curso organizado
para os missionários destinados a Inhambane e Lourenço Marques, cada comunidade devia
organizar semanalmente momentos de estudo da língua251. Só no ano seguinte começou a funcionar
um curso de língua Xitshwa no Centro do Guiúa, frequentado com bom aproveitamento pelo P.e
José Matias da missão de Mapinhane. De facto, este jovem missionário tornar-se-ia com o tempo
um bom conhecedor desta língua.
No contexto linguístico macua-xirima o trabalho de estudo e de tradução foi bastante
desenvolvido depois da independência pelos padres Adriano Severin e José Frizzi, de modo que
hoje os textos litúrgicos e catequéticos estão todos traduzidos e publicados. Muito deste trabalho foi
levado para a frente com tenacidade e competência pelo P.e José Frizzi, chegado ao Niassa em
1975. Desde os primeiros meses dedicou-se ao estudo da língua e cultura macua e, em 1980,
quando os missionários estavam proibidos de saír das cidades, o P.e Frizzi, então pároco de
Cuamba, começou a rever o dicionário macua. Esta obra, preparada pelo P.e Filippi, corria o risco
de se perder. Enriqueceu-a com novos vocábulos e deu-lhe uma veste ortográfica oficial. Num
segundo momento passou a recolher e a rever outras obras em macua-xirima.
Além dos trabalhos realizados no campo linguístico, salientam-se igualmente os estudos sobre
a cultura local. No contexto macua destaca-se a tese de doutoramento em Missiologia apresentada
em 1987 pelo P.e Francisco Lerma sobre a cultura macua252 e o trabalho do P.e Luís Wegher sobre
os usos e costumes do povo ayao253.
251
Cf. Verbal das reuniões do Conselho Regional. Lourenço Marques, 21-23/3/1971: ArqRegMoç. R. 3, n. 2, p. 5.
252
Cf. F. LERMA MARTINEZ, O povo macua e a sua cultura (Lisboa, 1989).
253
Cf. L. WEGHER, Um olhar sobre o Niassa. Traços históricos-etnológicos. Vol. I-II (Maputo, 1995/1999).
254
G. FRIZZI, Inculturazione della “Makeya”, centro focale della religiosità Macua (Mozambico): Euntes Docete
53 (2000) 93-107.
Em 2000, a VI Conferência Regional estimulou a realização de experiências significativas no
campo da inculturação, apoiando as já existentes e renovando o propósito de ajudar a Igreja local a
assumir o papel que lhe compete neste campo.
255
Cf. Nulumo na Exirima. Olepa, osoma, osuwela ikano saya (Maúa 2000); Sohimmwa ni solempwa s’exirima.
Literatura oral e escrita Xirima (Maúa 2000).
256
Cfr. G. FRIZZI, La traduzione della Bibbia in lingua Macua-Scirima. Metodi, fasi e difficoltà di un’avventura
stimolante: Euntes Docete 51 (1998) 125-134.
fundamental em ordem a uma inculturação efectiva fundada em bases antropológicas. Neste
sentido, e em colaboração com o Secretariado de Acção Pastoral de Inhambane, está sendo
efectuado um trabalho de recolha da tradição oral (provérbios, contos, cânticos) nas missões de
Nova Mambone, Vilankulo, Mapinhane, Massinga e Guiúa.
O Centro de Guiúa realiza todos os anos o curso de inserção cultural, linguística e pastoral para
os missionários recém-chegados. No sector das traduções, o mesmo Centro promove a publicação
de textos literários (gramáticas, cursos de alfabetização e pequenos dicionários em Xitshwa.
Gitonga e Xichope), subssídios catequéticos e litúrgicos em ordem à inculturação das celebrações
nas comunidades cristãs.
257
L. BOSIO, Em busca de almas: AIMC/XIII, 270, p. 1.
258
L. BOSIO, Em busca de almas: AIMC/XIII, 270, p. 1.
259
Cf. AIMC VIII/7 1939, n. 23: Carta de P.e Gabriel Quaglia a P.e Victor Sandrone: Mepanhira, 4-4-1939.
acompanhantes, e durante semanas e até meses, percorriam centenas de quilómetros para visitar as
comunidades das paróquias de Maiaca, Nipepe, Maúa e Marrupa.
Ainda hoje, a visita sistemática às comunidades cristãs dispersas no vasto território paroquial é
um dos pontos essenciais da metodologia missionária consolatina.
260
L. BOSIO, Vida de acampamento. Note di Diario: AIMC/XIII-269.
261
AIMC VIII/7 1940 n.1: Prospecto do Estado da Missão no Niassa, Massangulo, 6-8-1940.
262
Nas vésperas da independência funcionavam nas missões do Niassa nove dispensários onde se fazia uma média
anual de cerca de meio milhão de curativos, oito maternidades onde nasciam cerca de 700 crianças por ano e dois
infantários com cerca de 60 crianças assistidas. Cf. Relatório sobre a situação da Diocese de Vila Cabral apresentado
pelo P.e Manuel Tavares, Vigário Capitular, a Dom Luís Ferreira da Silva: ArqRegMoç. A 2, n.3.
trabalho de assistência aos doentes do Hospital Central do Maputo, do Sanatório da Machava e dos
presos da Cadeia da Machava. A visita e o apoio aos doentes e necessitados passaram a ser a sua
principal tarefa e os hospitais e prisões passaram a ser a sua paróquia, não obstante a grande
desconfiança inicial e os entraves à presença de um padre num hospital ou na prisão. Com a sua
persistência e caridade o P.e Menegon conseguiu que todas as portas se abrissem263. Com os anos
organizou um apreciado serviço de apoio espiritual e material a doentes e presos, conseguindo
também envolver outras pessoas neste trabalho.
263
CF. E. MENEGON, Experiências: praticando as obras de misericórdia. Encontro n. 29 (1986) 5-8.
264
No relatório enviado à Santa Sé em 1942 o P.e Domingos Ferrero sublinha, como um dado importante, o
dinamismo missionário dos catecúmenos. Cf. AIMC VIII/7 1942, n. 1: Relação enviada à S. Congregação dos Assuntos
Eclesiásticos Extraordinários, Mitúcue, 1-8-1942.
265
Cf. Conselho da primeira reunião do Conselho de Presbíteros da Diocese de Vila Cabral. Vila Cabral, 7-9-
1968. ArqRegMoç. A 2, n. 87.
266
Cf. AIMC VIII// 1938, n. 2: Relatório anual da Missão de Nossa Senhora da Consolata de Massangulo,
Massangulo: 15-7-1938.
4.2. Colégio para catequistas, centros catequéticos e centros pastorais paroquiais
Os missionários esforçaram-se desde sempre por formar os seus colaboradores pastorais. Logo
nos primeiros anos de presença dos Missionários da Consolata em Moçambique, cada missão
realizava reuniões periódicas de formação-programação-revisão para catequistas. Desde o início se
pensou em criar colégios para formar catequistas. A ideia era fundar um centro que formasse
catequistas-professores para todas as missões. Porém, este projecto inter-paroquial de formação de
catequistas só se concretizou nos anos 50, na missão de Mitúcue. Inicialmente, cada missão se
preocupou em formar os seus próprios catequistas através de encontros periódicos de formação.
Pouco a pouco, foram surgindo colégios para jovens aspirantes catequistas-professores267. Esta
instituição estava ligada ao internato, e daí, o objectivo era formar localmente os próprios
catequistas, seleccionados entre os alunos mais capazes e disponíveis da missão. A sua formação
era integral, abrangendo a componente literária, religiosa, moral e prática. O ensinamento religioso
compreendia a catequese, história da Igreja, noções da religião tradicional, etc. Os missionários
davam extrema importância à formação moral e espiritual dos candidatos.
Os catequistas recém-formados eram colocados nas escolas-capela para coadjuvar ou substituir
a primeira geração de catequistas. Alguns destes, os que mais se distinguiam pelas suas capacidades
intelectuais, eram enviados para aperfeiçoar a sua formação e obter um diploma na Escola Normal
de Habilitação de Professores de Unango, fundada em 1942.
Antes de assumir a responsabilidade de uma escola-capela, o recém-formado catequista-
professor era aconselhado a contrair Matrimónio, preferivelmente com uma rapariga formada no
internato feminino da missão a qual, possuindo uma certa formação religiosa, poderia assim
participar activamente na missão educativa do marido catequista. No fim do curso, antes de ser
enviado para uma escola-capela como catequista-professor realizava-se a cerimónia do mandato
oficial. O superior da missão, como sinal do mandato missionário, entregava ao catequista o
crucifixo ou um outro símbolo religioso.
Nos anos do pós-concílio foi realizado um grande investimento de pessoal e de meios na
formação dos catequistas a nível nacional. Os Missionários da Consolata deram a sua colaboração
no Centro Catequético Interdiocesano de Anchilo (Nampula) e, sobretudo, no Centro Catequético
do Guiúa (Inhambane). A nível diocesano, os Missionários da Consolata promoveram iniciativas de
formação para catequistas, destacando-se a criação do catequistado da missão de Curea (1973-
1975), no Niassa, fundado e dirigido pelo P.e Francisco Lerma e a criação do catequistado da
missão de Massinga/Mangonha (1973) e de Mapinhane (1974), na diocese de Inhambane.
Com a independência, a maior parte destes catequistados foram encerrados devido às
nacionalizações. Apesar das inúmeras dificuldades encontradas manteve-se activo o Catequistado
do Guiúa (Inhambane). Os Missionários da Consolata, em colaboração com os padres Franciscanos
e as irmãs Franciscanas Missionárias de Maria, prestaram um válido e qualificado serviço de
formação de gerações de catequistas e animadores. O programa formativo desdobrava-se em três
dimensões: vida litúrgica, vida comunitária (compreendia a formação propriamente dita com
tempos de aulas, estudo e tempo de trabalho) e vida pastoral (todos os catequistas apoiavam as
comunidades cristãs mais próximas do Centro aos Domingos, principalmente no que diz respeito à
evangelização e formação das mesmas)268.
Com o decorrer dos anos as paróquias tornaram-se centros formativos para os diversos
ministérios. Uma estrutura presente em todas as paróquias era o centro pastoral onde os catequistas,
animadores e responsáveis dos vários ministérios se encontravam para encontros de partilha e
cursos de formação. Paralelamente, as equipas missionárias produziam diversos subsídios de
catequese, liturgia e formação para catequistas e animadores.
267
Em 1942, nas quatro missões em funcionamento no Niassa já existiam três colégios para catequistas Cf. AIMC
VIII/7 1942 n. 1: Prospecto do estado da Missão no Niassa. Arciprestado dos Padres da Consolata: Niassa Português,
Mitúcue, 1-8-1942.
268
Cf. J. TAVARES MATIAS, Centro Catequético do Guiúa: Encontro n. 18 (1984) 8-9.
4.3. A actividade pastoral dos catequistas
Nos primeiros anos, o essencial da actividade do catequista era o contacto com os "pagãos". Ele
era o intermediário entre o missionário e a população. A sua presença era indispensável para vencer
a desconfiança em relação ao missionário europeu e para iniciar o processo de conversão da religião
dos antepassados ao cristianismo. O catequista era muito mais do que um mero repetidor. A
doutrina cristã explicada por ele, à sua maneira e na sua própria língua, era muito mais
compreensível e ganhava mais facilmente novos cristãos269.
Com a multiplicação das escolas-capela no território das missões, os missionários confiavam a
cristandade local à directa responsabilidade dos catequistas. Quando o catequista vivia e trabalhava
no mesmo local, começava a sua obra de evangelização entre a sua família e amigos. Pouco a
pouco, visitava todas as famílias da aldeia e depois de ganhar a simpatia destes e do chefe,
persuadia os pais ou os tios a deixarem que as crianças frequentassem a escola que ele dirigia. Com
a formação de um grupo de simpatizantes e de catecúmenos, o catequista dava início à instrução
religiosa. Ensinava o catecismo, explicando as principais verdades da fé cristã e esforçando-se para
convencer os catecúmenos a abandonarem as práticas não cristãs e a observarem os Dez
Mandamentos. Nas principais festas litúrgicas, o catequista deslocava-se à missão com os
baptizados e catecúmenos, para participar nas celebrações litúrgicas. Nestas ocasiões solenes os
candidatos eram inscritos no catecumenado, os catecúmenos aperfeiçoavam a sua preparação para
os sacramentos e os que terminavam a sua instrução faziam os exames de admissão aos
sacramentos. Todos participavam nas funções litúrgicas e nas múltiplas actividades que se
organizavam. Quando o número de baptizados aumentava, o catequista reunia a comunidade na
capela para as orações diárias e para a celebração da Palavra dominical. E cada missionário visitava
várias vezes ao ano a comunidade, quer para confessar e celebrar a Missa, quer para se certificar da
actividade do catequista.
269
Em 1944, a missão de Mitúcue tinha ao seu serviço 21 catequistas nas povoações e dois na missão (Miguel
Misissi, catequista-mor e Dionísio Mirassi, professor da escola da missão). No relatório enviado pelo superior da missão
ao bispo, sublinhava-se deste modo a importância da colaboração dos catequistas na evangelização: O trabalho deles é
de grande auxílio à missionação porque só assim se pode entrar na alma do pagão. Muitos deles têm o espírito dos
verdadeiros discípulos do Senhor e fazem sacrifícios para ensinar à gente, às vezes em aldeias muito afastadas da
própria. AIMC X/405 1944 n. 7: Relatório anual enviado à diocese, Mitúcue: 31-12-1944.
270
Cf. P. CALANDRI, Pequeno Catecismo em Ciyao-Português de D. António Barroso (Massangulo 1934).
271
Cf. G. QUAGLIA, Catecismo Católico em língua Xitswa e Português (Lourenço Marques 1948).
272
Cf. Hosi ya Hina Jesu Kristu (Mapinhane 1951).
em língua macua (Mavekelo ni Itxipo) 273, Leccionário para Domingos e Festas (Masu a Muluku),
diversos textos sobre os ministérios e temas de catequese para a Primeira Comunhão, Crisma e
Matrimónio.
Em 1983 foi publicado o Catecismo de Adultos, coordenado pelo secretariado pastoral
diocesano. Foi um trabalho de colaboração entre as equipas missionárias do Niassa para a
evangelização. Um texto base para a catequese dos catecúmenos adultos profundamente bíblico e
dividido em sete partes e uma introdução: Deus criador e a infidelidade do Homem; Jesus Cristo; o
Povo de Israel; o Novo Povo de Deus: a Igreja; os sacramentos; os Mandamentos e Viver com
Deus. O apêndice apresenta resumidamente as grandes religiões e as principais orações cristãs. O
texto em macua foi concluído no final de 1983. Depois da primeira edição policopiada, foi
imprimido em 1987274.
Nesse mesmo ano saiu a segunda edição do Masu a Muluku, o missal festivo em língua macua
com as leituras dominicais e festivas dos três ciclos A-B-C e o Ordinário da Missa e demais
sacramentos, tudo com excelente apresentação tipográfica275. A nível diocesano prepararam-se
também textos litúrgicos e catequéticos em língua cinyanja e em ciyao.
Na Diocese de Inhambane, os Missionários da Consolata colaboraram na publicação de
material catequético e litúrgico, onde se destaca o catecismo Nza Kholwa Hosi. Tratava-se de temas
para o catecumenado, numa edição completamente revista e adaptada às exigências do Directório
do Catecumenado, baseados num texto já existente anteriormente em língua xitshwa276.
273
Em 1982 e 1987 saíram novas edições do livro de cânticos em macua “Mavekelo ni Itxipo”. Este devocionário,
continuação lógica do livro preparado pelo P.e Mário Casanova em 1950, já chegou à sua 3ª edição, fruto de uma
revisão dos textos e ampliação do número de orações e cânticos.
274
Cf. Ekatekismu ya Makatekumeni ni Asitokwene (Roma 1987).
275
Cf. Masu a Muluku. Sowerenka sa eyakha A.B.C, Ifesta sitokwene, Masakramenti (Roma 1987).
276
Cf. Nza Kholwa, Hosi. Secretariado da Acção Pastoral (Inhambane 1983).
277
Na véspera da fundação da missão de Mepanhira, o P.e Victor Sandrone, nas suas visitas às escolas-capela do
Lúrio, baptizou dezenas de catecúmenos já catequizados. Na primeira celebração litúrgica realizada em Mepanhira no
Natal de 1938, foram baptizados 230 adultos e 40 crianças. Cf. AIMC X/411, n. 6: Diário da Missão de Mepanhira: 23-
24/12/1938. O primeiro baptismo oficial da Missão de S. José de Mitúcue foi celebrado in articulo mortis pelo P.e
Mário Casanova no acampamento de Murusso. Cf. AIMC X/405, n.17: Diário da Missão de Mitúcue: 6-10-1939. Na
véspera de Natal desse ano, administrou-se o baptismo a 45 catecúmenos provenientes das escolas-capela cedidas pela
Missão de Mepanhira. Cf. AIMC X/405, n. 17: Diário da Missão de Mitúcue: 24-12-1939.
278
Cf. AIMC VIII/7 1939, n. 3: Relatório anexo ao prospecto do estado das missões do Niassa Português:
Massangulo, 11-12-1939.
279
Cf. AIMC VIII/7 1942, n. 2: Relação anexa ao prospecto do estado das missões no Niassa Português: Mitúcue,
1-8-1942.
280
O P.e Domingos Ferrero, numa carta escrita ao Superior Geral, reafirma a conveniência desta opção:
Poderíamos baptizar quase em massa, mas exigimos muito no que diz respeito à catequese, e este parece-me o método
mais conveniente. AIMC VIII/7 1944, n. 4: Carta de P.e Domingos Ferrero ao P.e Gaudêncio Barlassina: Mitúcue, 18-
9-1944.
Por ocasião das grandes celebrações litúrgicas os cristãos e os catecúmenos das escolas-capela
reuniam-se nas respectivas missões para aperfeiçoar a sua preparação para a recepção dos
sacramentos281. Estas grandes assembleias, além de completarem a instrução daqueles que recebiam
os sacramentos, constituíam um momento de formação para todos os cristãos. Eram dias
providenciais, densos de instruções e de momentos de oração282.
281
No Niassa esta assembleia litúrgico-catequética, na sede das missões, era denominada Msunkano. Cf. AIMC
X/411, n.6: Diário da Missão de Mepanhira: 19-12-1938.
282
Nos relatórios enviados à Santa Sé e aos superiores, o P.e Domingos Ferrero várias vezes colocou em evidência
o empenho e a generosidade demonstrada, nestas circunstâncias, por esta jovem cristandade. Cf. AIMC VIII/7 1943 n.
2. Relação anexa ao prospecto do estado das missões no "Arciprestado dos Padres da Consolata" na Diocese de
Nampula: Mitúcue, 30-1-1944.
283
Cf. G. FRIZZI, La missione del Niassa nel crogiolo della rivoluzione: Documentazione IMC n. 3 (1980) 19-26.
da missão, nomeadamente na agricultura, construções, etc. Além de contribuir para a viabilidade
económica das missões, o trabalho manual tinha como objectivo ajudar a população a adquirir hábitos
de trabalho. Ao proporem a dignidade do trabalho livre e remunerado, os missionários precaviam os
possíveis abusos de que era vítima a população, por parte das autoridades e dos colonos.
O trabalho organizado e disciplinado foi um aspecto educativo válido da acção evangelizadora.
Tanto nas missões do Niassa, como nas de Inhambane, formaram-se muitos operários em diversas artes,
desde pedreiros e carpinteiros até sapateiros e mecânicos, tipógrafos e fotógrafos. Os missionários
interessavam-se também pelo ensino da agricultura, introduzindo novas técnicas para melhorar os
métodos de cultivo e enriquecendo a dieta alimentar do povo com novos produtos.
7.2. As construções
O trabalho e as construções eram realizadas, não por divertimento, mas por necessidade e como
método formativo. A fundação de uma nova missão requeria muito trabalho, terreno desbravado,
fabricação de tijolos e telhas, madeira, estradas, etc. Os missionários começavam por dar o exemplo,
trabalhando eles mesmos, fabricando os primeiros tijolos para as construções, cortando madeira,
desbravando a terra para a agricultura. Com o seu próprio trabalho formaram gerações de pedreiros e de
carpinteiros incutindo-lhes o amor pelo trabalho e pelo ofício. A maior parte das missões cresceu
gradualmente, tomando proporções consideráveis. Depois da construção da residência dos missionários
e missionárias, edificavam-se as escolas, os internatos, os dispensários, as oficínas, as carpintarias, etc.
No Niassa as missões de Massangulo, Mitúcue e Mepanhira sobressaíam pelas suas estruturas e
grandeza. Em Inhambane eram as missões de Nova Mambone, Mapinhane e Mangonha/Massinga que
possuíam mais infra-estruturas.
O trabalho das construções cabia a todos, mas os irmãos eram os verdadeiros mestres nestas
tarefas. Os irmãos José Benedetto, Bartolomeu Liberini, Bartolomeu Lorenzatto, Corrado Maritano,
João Arneodo, Lourenço Baroffio, Hugo Versino, entre outros, foram autênticos "factotum", mestres em
todas as artes e ofícios, construção, serralharia, mecânica, carpintaria, etc.
Com a independência, as nacionalizações e os vários anos de guerra que se sucederam, a incúria
destruiu grande parte destas infra-estruturas. A partir de 1992, com o fim da guerra e após a devolução
dos bens nacionalizados às dioceses, começou o paciente trabalho de reconstrução das antigas missões.
284
Por exemplo, no ano de 1943 as despesas das quatro missões do Niassa foram de 390.649.00 escudos. A maior
entrada era constituída pelo subsídio atribuído pela diocese: 257.429.00 escudos: Cf. AIMC VIII/7 1943: Prospecto do
estado das missões no Niassa Português, Mitúcue, 31-12-1943.
Desde sempre a Igreja deu grande importância à educação escolar da juventude africana. As
escolas eram consideradas faróis de civilização e canteiros de neófitos. D. Rafael de Assunção,
Prelado de Moçambique (1920-1936), costumava afirmar que a civilização cristã em África se
preparava nas escolas e se completava na Igreja.
Os Missionários da Consolata estavam convencidos da importância da escola como meio de
promoção humana e instrumento de evangelização. Por isso, empenhavam-se de alma e coração no
trabalho de ensino da população indígena. Percorriam as aldeias sensibilizando as autoridades
tradicionais e as famílias para a importância da escola como veículo de progresso. Ao início foi
difícil, porque nem sempre os interessados compreendiam a importância do saber ler ou escrever.
Na região de Mepanhira e do Lúrio, além das escolas protestantes, os missionários que ali chegaram
encontraram algumas escolas católicas fundadas pelos Padres Monfortinos do Niassalândia
(Malawi). Preocuparam-se em reactivá-las e multiplicá-las. Este esforço debateu-se com bastantes
dificuldades, especialmente impedimentos burocráticos, escassez e pouca formação dos professores,
falta de dinheiro, etc.
Depois do Acordo Missionário de 1940, o Governo português promulgou o decreto-lei nº 31207
de 5 de Abril de 1941, vulgarmente conhecido por estatuto missionário, no qual confiava a educação à
responsabilidade das dioceses. As escolas dependiam do Governo, mas o missionário tinha liberdade de
acção como organizador e responsável pelo funcionamento geral dos programas, formação e sustentação
dos professores. Os missionários presentes no Niassa, conscientes da importância da educação para o
desenvolvimento e evangelização, não perderam a oportunidade de investir tempo e meios na promoção
da escolarização. Apesar de algumas dificuldades, surgiram escolas em todas as missões. Massangulo e
Mitúcue permaneceram aos olhos da população local, autoridades e do próprio Instituto da Consolata
285
como um exemplo bem sucedido de promoção do homem africano através da escola .
Um dos primeiros desafios foi a preparação de professores. Para lhe fazer face foi criada em
1942, na Missão de Unango, a Escola Normal de Habilitação de Professores, para onde cada missão
mandava os melhores alunos dos internatos.
285
Nas vésperas da independência o sector da educação no Niassa estava praticamente na dependência da diocese
e a cargo das missões: uma escola de professores de posto em Vila Cabral com 120 alunos; 10 lares e internatos
masculinos com 790 internos; 10 lares e internatos femininos com 500 internas; duas escolas de Artes e Ofícios
(Massangulo e Mitúcue), 282 escolas e postos escolares com 17.890 alunos e 9.172 alunas. Cf. Relatório sobre a
situação da Diocese de Vila Cabral apresentado pelo P.e Manuel Tavares, Vigário Capitular, a Dom Luís Ferreira da
Silva: ArqRegMoç. A 2, n. 3.
286
Cf. AIMC VIII/7 1945, n. 2: Relatório das missões do Niassa enviado à Santa Sé: Mitúcue, 21-1-1945.
muitos alunos especializavam-se nas mais diversas profissões: carpinteiro, marceneiro, mecânico,
sapateiro, pedreiro, alfaiate, encadernador, tipógrafo, etc.
Atentos às necessidades e anseios das populações, a partir dos anos 60, os Missionários da
Consolata colaboram com as dioceses de Vila Cabral e Inhambane na introdução e incremento do
ensino secundário. Em 1965 foi criado o Colégio de São Teotónio, transferido em 1966 para Nova
Freixo. Dirigido pelas Irmãs Doroteias, o Colégio de São Teotónio era frequentado por duas
centenas de alunos do 1º até ao 5º ano do liceu. Em 1973 foi criado o Colégio Externato do Lago,
dirigido pelas Irmãs Dominicanas do Rosário e o Colégio de Mitúcue, dirigido pelas Missionárias
da Consolata. Em 5 de Julho do mesmo ano, os Missionários da Consolata criaram o Colégio de
Massinga (Inhambane), com o ciclo preparatório e liceal e externato misto. O director do colégio
era o P.e Dionísio Ferreira e com ele colaboravam os padres Armanno Armanni e Mauro Calderoni
e as Missionárias da Consolata.
Todas estas instituições de ensino foram nacionalizadas no pós-independência, passando para a
directa administração do Estado.
9.3. Os internatos
O internato era uma preocupação que estava sempre presente na mente dos missionários quando
faziam uma nova abertura. Uma infra-estrutura indispensável para alojar e formar rapazes e meninas no
ambiente característico da missão. O internato dava vida e dinamismo à missão e simultaneamente dava-
lhe uma certa regularidade devido ao horário das várias actividades. Desde sempre se investiu muito nos
internatos, por ser um meio fundamental para formar os jovens, longe da influência do ambiente
tradicional onde viviam. Sem o internato havia a forte convicção de que a escola não era suficiente para
formar uma base cristã sólida. Deles deveriam sair os jovens mais preparados para formar novos lares
287
cristãos e constituir fermento evangélico destinado a fazer levedar toda a massa .
Além da instrução escolar, o internato incutia nos alunos o amor ao trabalho, à prática das
virtudes cívicas e religiosas e a frequência aos sacramentos. A vida no internato distribuía-se entre o
estudo, a formação religiosa, exercícios de piedade, trabalho e recreio. Nem todos os alunos eram
cristãos pelo que, durante a permanência na missão, se preparavam para receber o Baptismo. Os
alunos que mostrassem aptidões e boa vontade eram escolhidos e formados para serem catequistas,
professores ou mesmo, enviados para o seminário diocesano.
287
Visto que só com os elementos formados na missão se podem realizar obras duradoiras, empregamos os nossos
esforços para educar rapazes e raparigas para serem os elementos dum povo novo, de um próximo amanhã. AIMC
X/405, n. 17: Relatório anual da missão de Mitúcue: Mitúcue, 31-12-1944.
288
AIMC VIII/7 1935 n. 2: Relação anual do estado da Missão de Nossa Senhora da Consolata de Massangulo:
Massangulo, 5-7-1935.
289
Cf. AIMC VIII/7 1935 n. 2. Relação anual do estado da Missão de Nossa Senhora da Consolata de
Massangulo: Massangulo, 5-7-1935.
Também na missão de Mepanhira, logo nos primeiros anos, surgiu um notável movimento
vocacional. Na relação do ano de 1939 o P.e Gabriel Quaglia informava a Santa Sé sobre a
existência de um grupo de vocacionados nesta missão, um dos quais até já estudava latim290. Antes
da criação do seminário menor diocesano de Unango, estes jovens que se sentiam chamados ao
sacerdócio foram acolhidos e formados na missão de Massangulo.
Em 1940, a Santa Sé sugeriu a criação de um seminário no Niassa, garantindo o seu apoio. Na
mesma altura foi proposta a abertura de um seminário em Portugal, para onde pudessem ser
enviados a terminar a sua formação os alunos provenientes do Niassa291. Em 1944, por provisão de
D. Teófilo de Andrade, primeiro Bispo de Nampula, foi criado o seminário menor da diocese, a
funcionar na missão de Unango (Niassa), onde já existia a Escola de Habilitação de Professores de
Posto Escolar. Os frutos do seminário de Unango foram os primeiros sacerdotes moçambicanos
diocesanos, os padres Miqueias Elias Maloa, originário de Mitúcue, e Leandro Feliciano da Cruz,
cuja família era originária do sul de Moçambique e residente no norte do Niassa. Ambos transitaram
para o Seminário Maior da Namaacha no ano lectivo de 1949-1950, concluindo ali o curso
filosófico e teológico. Foram ambos ordenados presbíteros em Dezembro de 1956, em Nampula.
Em 1947 o seminário de Unango foi transferido para a missão de S. João Baptista do Marere, 8
km a oeste da cidade de Nampula. Aqui, como em Unango, o seminário funcionava no mesmo
edifício da Escola de Habilitação de Professores de Posto Escolar. A direcção do seminário foi
entregue aos Missionários da Consolata, que já respondiam pela missão. Com a chegada do novo
bispo de Nampula, D. Manuel de Medeiros Guerreiro, este decidiu encerrar o seminário em 1952.
Ao encerrá-lo, prometeu erigi-lo novamente, logo que pudesse, em lugar adequado e com edifício
próprio. Os anos passavam e o bispo não se decidia a reabrir o seminário diocesano. Foi então que
os Missionários da Consolata decidiram abrir um seminário “clandestino” (seminario in
catacumbis) na missão de Massangulo, onde se formavam os jovens provenientes dos internatos que
manifestavam vocação sacerdotal. Esta iniciativa audaz, diga-se de passagem, não agradou nada a
D. Manuel de Medeiros Guerreiro292.
Só em 1959, o bispo de Nampula erigiu o Seminário Menor de Nossa Senhora de Fátima de
Nampula em lugar adequado e edifício próprio, a 6 km de Nampula, na estrada nacional Nampula-
Nacala. A direcção foi confiada aos Padres da Sociedade Missionária e na data da sua fundação, em
8 de Setembro de 1959, tinha sete alunos.
Com o aumento do número de vocações no Niassa, o primeiro Bispo da Diocese de Vila
Cabral, D. Eurico Dias Nogueira, fundou a 13 de Maio de 1967 o Seminário Menor Nossa Senhora
Mãe da Igreja de Nova Freixo (Cuamba). No ano lectivo de 1967-1968, sete jovens iniciavam ali os
estudos preparatórios e os alunos que até então se matriculavam no seminário menor de Nampula,
passaram a frequentar o seminário menor de Nova Freixo, com aulas no Colégio de São Teotónio.
O seminário foi confiado à responsabilidade dos Missionários da Consolata. O P.e Emílio Oggé foi
o primeiro responsável do seminário, sendo substituído em seguida pelo P.e Elísio da Assunção.
Com os anos a promoção vocacional aumentou e em 1968 a diocese de Vila Cabral contava 36
seminaristas: dois no curso teológico, dois na Filosofia e 32 no curso dos liceus. Em 1975, ano da
nacionalização e encerramento do seminário, o reitor era o P.e Brazão Mazula e tinha 55 alunos.
Nos inícios dos anos 70 foi ordenado o terceiro sacerdote diocesano originário do Niassa, o P.e
Estevão Paulo Mirassi.
Também na diocese de Inhambane os Missionários da Consolata se esforçaram por promover o
clero local, mas talvez com menos resultados que no Niassa. No dia 12 de Setembro de 1971, D.
Ernesto Gonçalves da Costa fundou o seminário menor diocesano de Inhambane.
290
AIMC VIII/7 1939 n. 3: Relação anexa ao prospecto do estado das missões no Niassa Português, Massangulo,
1-12-1939.
291
Cf. AIMCVIII/7 1940, n. 36: I Missionari della Consolata al Niassa alla luce dell'Acordo Misssionario (1940):
Carta de P.e João Chiomio a P.e Victor Sandrone: Roma, 17-12-1940.
292
Cfr. L. WEGHER, Un uomo e la sua missione. P. Pietro Calandri (Lichinga 1985) 291-292.
Depois da independência os seminários foram encerrados e só a partir de 1983 as condições
sócio-políticas permitiram que se concretizassem os primeiros esforços para a sua reabertura. Em
Agosto desse ano, no centro catequético de Anchilo (Nampula) realizou-se o IIIº Encontro
Interdiocesano sobre Vocações e Seminários, da zona pastoral do norte (dioceses de Pemba,
Nampula e Lichinga) e decidiu-se a abertura do Seminário Interdiocesano São Carlos Lwanga. O
P.e Norberto Louro, que trabalhava em Lichinga, foi nomeado reitor e com entusiasmo, lançou-se à
obra com os primeiros 11 seminaristas. Funcionando em instalações provisórias, com organização
frágil e sem quaisquer garantias perante a lei, o seminário arrancou e superou todos os obstáculos. O
P.e Norberto Louro assumiu a direcção do seminário durante dois anos, até à sua nomeação como
Superior Regional dos Missionários da Consolata. Depois de um breve interregno foi substituído
por um outro missionário da Consolata, o P.e Artur Marques, que até então trabalhara na Diocese de
Inhambane. Ao P.e A. Marques coube a tarefa de transferir o seminário para a estrutura do antigo
seminário de Nossa Senhora Rainha dos Apóstolos, cujo edifício acabava de ser devolvido à
diocese (1988).
Em Maputo, os Missionários da Consolata deram também o seu contributo à formação do clero
diocesano através do trabalho do P.e Augusto Fatela, como administrador na construção do
Seminário Maior de Santo Agostinho, e do P.e José Salgueiro, na campanha de recolha de fundos
para a construção do mesmo. A partir de 1990 os padres Higino Tubaldo e Francisco Ponsi,
começaram a leccionar no seminário maior. Em seguida, a colaboração dos missionários da
Consolata alargou-se ao campo do ensino com a actividade docente dos padres Francisco Lerma,
Hipólito Marandu e Jaime Patias. Na Diocese de Inhambane, a reabertura do seminário menor
diocesano foi confiada à responsabilidade do P.e André Brevi, no início dos anos 90.
Mesmo sem pessoal missionário suficiente e devidamente preparado, os Missionários da
Consolata integraram-se com boa vontade num trabalho que lhes tinha sido confiado pela Igreja
local.
293
Alguns meses depois da chegada dos missionários a Mepanhira, já o catequista João Txipinenga manifestava ao
P.e Gabriel Quaglia o seu grande desejo de ter um filho sacerdote e uma filha religiosa. Cf. G. QUAGLIA, Johannes, un
catechista d'eccezione: Missioni Consolata (1939/7) 104.
294
AIMC X/411, n.6: Diário da Missão de Mepanhira, p. 19
Na relação anual de 1946, o P.e Domingos Ferrero, superior dos Missionários da Consolata
e arcipreste para o Niassa, informava a Santa Sé da origem e primeiros passos desta importante
iniciativa295. No dia 19 de Março de 1947, mais duas jovens entravam para fazer parte do grupo das
aspirantes. Em seguida, o P.e Ferrero pediu autorização ao bispo de Nampula para iniciar esta
congregação de irmãs diocesanas nativas. D. Teófilo de Andrade autorizou-o a organizar e
acompanhar a nova congregação e aprovou as constituições que o mesmo redigira. No dia 8 de
Dezembro de 1947, sob a protecção da Imaculada Conceição, titular e padroeira, iniciou-se
oficialmente o Instituto das Irmãs da Imaculada Conceição. Depois de três anos de preparação, um
grupo de sete jovens deu entrada no postulantado. A Ir. Antida Castino foi encarregada da formação
das postulantes, sob a dependência do P.e Ferrero296.
Depois de um ano de postulantado, este primeiro grupo deu início ao noviciado. No dia 8 de
Dezembro de 1948, na Igreja provisória de S. Teresa do Menino Jesus em Mepanhira, realizou-se a
cerimónia da vestição religiosa do primeiro grupo de noviças: Teófila Mirole, Margarida Munúkua,
Maria dos Anjos Malessani, Inês Munúkua, Gaudência Palombe e Florência Mirole. Para a
cerimónia foram convidados os católicos das escolas-capela da missão e foram muitos os que
acorreram. Estava presente na celebração o Superior Geral dos Missionários da Consolata, P.e
Gaudêncio Barlassina, que efectuava a visita canónica aos missionários operantes no Niassa. As
jovens aspirantes tinham sido preparadas pelas irmãs da Consolata, responsáveis pela sua
formação297. No mesmo dia, outras cinco aspirantes iniciavam o postulantado: Madalena Mulima,
Teresa Malessani, Serafina Mape, Águeda Macengua e Bona Munúkua.
Durante o noviciado, o P.e Guido Gobbo, substituto do P.e Abondio na direcção da missão,
fazia diariamente uma conferência às noviças, tratando o tema dos votos religiosos e deixando à
irmã Antida, mestra das noviças, a explicação das constituições e do regulamento.
No dia 20 de Setembro de 1951, depois de três anos de noviciado, as seis primeiras noviças
consagram-se a Deus com a emissão da profissão religiosa. Eram as primeiras religiosas da primeira
congregação moçambicana298. A celebração foi presidida por D. Manuel de Medeiros Guerreiro,
bispo de Nampula. Como pastor, durante a homília, manifestou a sua alegria ao ver a Igreja
enriquecida com tal dom. Depois da celebração, D. Manuel elegeu a Madre Geral da nova
congregação, na pessoa da Ir. Generosa Bugatti, e as conselheiras: Ir. Antida Castino, mestra das
noviças, Ir. Rosangela Bresciani, Ir. Dolores Cozzi e Ir. Eva Negro, todas missionárias da
Consolata. Em 1954, a Ir. Generosa deixou a missão de Mepanhira e o cargo de Madre Geral, que
por vontade do bispo, passou para a Ir. Amabile Fagnani, Superiora Delegada das Missionárias da
Consolata no Niassa. Em 1955, foi a vez da Ir. Antida Castino ser substituída pela Ir. Eva Negro.
No dia 21 de Janeiro de 1952, as Irmãs da Imaculada Conceição receberam as constituições
revistas pelo ordinário diocesano. No dia 20 de Setembro de 1954, em pleno Ano Mariano, o
segundo grupo de noviças emitiu a sua profissão religiosa: Ir. Manuela Milima, Teresa Mape,
Gabriela Malessani, Angélica Mape e Carmela Munúkua. A partir de 1954, cada grupo de noviças
emitia a primeira profissão religiosa e a pouco e pouco a comunidade das Irmãs da Imaculada
Conceição cresceu e ganhou uma fisionomia própria. Pela primeira vez em 20 de Setembro de 1960
emitiram os votos perpétuos as primeiras cinco irmãs da congregação: irmãs Teófila Mirole,
Margarida Munúkua, Inês Munúkua, Gaudência Palombe e Florência Mirole.
Em 20 de Setembro de 1955, sob proposta do Superior Geral dos Missionários da Consolata,
P.e Domingos Fiorina, o bispo de Nampula confiou a formação das irmãs diocesanas,
295
AIMC VIII/7 1946 n. 47: Relatório anexo ao prospecto do estado das missões do “Arciprestado dos Padres da
Consolata" na diocese de Nampula: Mitúcue, 1-1-1947.
296
O P.e Domingos Ferrero, no relatório desse ano, informou a Santa Sé deste importante acontecimento: Cf.
AIMC VIII/7 1947: Relatório anexo ao prospecto do estado das missões do “Arciprestado dos Padres da Consolata"
na Diocese de Nampula: Mitúcue, 20-1-1948.
297
Cf. D. FERRERO, Le Prime Suore Indigene della Diocesi di Nampula: Missioni Consolata (1949/6) 123.
298
O rito da primeira Profissão foi precedida pelo rito de tomada de hábito de cinco postulantes: Manuela Milima,
Teresa Mape, Gabriela Malessani, Angélica Mape e Carmela Munúkua, as quais foram admitidas ao noviciado.
exclusivamente às Missionárias da Consolata. Em 1961 a Ir. Eva Negro foi substituída pela Ir.
Nicoletta Berrone no encargo de Mestra das Noviças e superiora do convento de Mepanhira. Em
Setembro desse ano, D. Manuel Medeiros aceitou a sugestão da Madre Geral, Ir. Amabile Fagnani,
para que as irmãs fossem destinadas a outras missões para fazerem o tirocínio pastoral. Assim, no
dia 11 de Outubro de 1961, sob a guia das Missionárias da Consolata, as primeiras quatro irmãs
foram destinadas à missão de Mitúcue para ficarem encarregues da assistência no internato
feminino, ensino e dispensário. Foi também estabelecido que durante as férias deveriam regressar,
por um mês, à Casa Mãe de Mepanhira para os exercícios espirituais e contacto com a sua
comunidade.
Com o fim genérico de colaborar na evangelização e educação, desde o início se
providenciou à sua preparação intelectual e prática de modo a desempenharem bem a sua pastoral.
Depois da criação da Escola Normal feminina, em Nampula, para a preparação de professoras, o
bispo determinou que algumas se preparassem para obter o diploma de professoras. As primeiras
quatro irmãs entraram nesta escola em 1959.
Mais tarde, o novo bispo da Diocese de Vila Cabral, Dom Eurico Dias Nogueira, procedeu
ao exame das constituições e regulamento para efectuar a sua promulgação definitiva e obter a
completa autonomia da congregação diocesana da Imaculada Conceição. Entretanto, o bispo
confiou a direcção da congregação à Ir. Nicoletta Berrone, em substituição da Ir. Amabile Fagnani,
dando-lhe como conselheiras duas irmãs moçambicanas, nomeadamente a Ir. Gaudência Palombe e
a Ir. Madalena Apili.
Na vigília da independência, entre 31 de Julho e 4 de Agosto de 1974, as Irmãs da
Imaculada Conceição reuniram-se em Nova Freixo para reflectir sobre a renovação da vida religiosa
da congregação. Estavam presentes o novo bispo, D. Luís Gonzaga Ferreira da Silva, todas as irmãs
da congregação, e a irmãs Maria Pia Tambosi e Fida Boccolari, missionárias da Consolata.
Reflectiu-se sobre a vida religiosa em geral, natureza e fim da congregação, conselhos evangélicos,
vida comum e oração, formação humana, formação religiosa e organização da congregação. Nesta
data foi eleito o novo conselho da congregação, totalmente moçambicano, com a Ir. Madalena
Apili, superiora geral, Ir. Manuela Graciano, 1ª conselheira, Ir. Cristina Jaime, 2ª conselheira e
mestra das noviças, Ir. Carmela Munúkua, 3ª conselheira, Ir. Teófila Luciano Mirole, 4ª conselheira
e Ir. Maria Domingas João, ecónoma.
299
AIMC IV/4 1937 n. 216: Carta de P. Victor Sandrone a P. Gaudêncio Barlassina, Massangulo, 19-6-1937.
se preparar para ser missionário. Consultado, o Superior Geral, P. Fiorina, deu a sua autorização.
Depois dos estudos em Fátima, Filipe Couto seguiu para a Itália onde fez o ano de noviciado, tendo
emitido a primeira profissão religiosa em 2 de Outubro de 1963. Em seguida estudou Filosofia em
Roma e Teologia na Alemanha. Foi ordenado sacerdote no dia 21 de Dezembro de 1969, em Vila
Cabral, por D. Eurico Dias Nogueira. No dia 17 de Outubro de 1963 partiam para Portugal mais
dois jovens moçambicanos: João da Silva Viana Cossa e Carlos Machili. João Cossa tinha 23 anos,
era oriundo da paróquia da Machava e estudava na Escola Industrial de Lourenço Marques. Carlos
Machili, anglicano convertido ao catolicismo, era originário da missão de Cobué e entrara no
seminário diocesano de Nampula, porque o Instituto ainda não tinha seminário próprio em
Moçambique. Nenhum dos dois chegou ao sacerdócio.
O primeiro moçambicano a ser ordenado sacerdote missionário da Consolata foi o P.e
Amândio Dide Munguambe, natural de Inhambane. Entrou no Instituto em 1964, vindo
directamente do seminário maior de Lourenço Marques, já estudante de Teologia. Foi enviado de
seguida para a Itália onde fez o noviciado e emitiu a primeira profissão a 2 de Outubro de 1965. Um
ano depois, a 18 de Dezembro de 1966, foi ordenado sacerdote. Continuou em Itália e especializou-
se em música sagrada, com uma tese sobre a música chope. Em 1971 os superiores insistem para
que ele venha para Moçambique, para trabalhar na Diocese de Inhambane, proposta que o mesmo
não aceitou. Em seguida foi destinado pelos superiores para o Brasil.
300
Verbal da Reunião do Conselho Regional: Machava, 27-29 de Agosto de 1964: ArqRegMoç, B 12. p.2.
Instituto. Com a independência a experiência terminou, pois os irmãos professos acabaram por
abandonar a vida religiosa301.
301
Cf. E. MENEGON, Appunti relativi ad una esperienza di fratelli in Mozambico-Delegazione Niassa. Anni 1960-
1970 (Loria, 1988) 1-2.
302
Cf. Verbal da Reunião do Conselho Regional: Machava, 27-29 de Agosto de 1964: ArqRegMoç, B. 12. p. 3.
303
Cf. Actas da reunião dos missionários de Lourenço Marques com o Superior Geral. Lourenço Marques, 23-5-
1970: ArqRegMoç B. 13, n. 150; Actas da reunião dos missionários do sul do Niassa com o Superior Geral. Mitúcue,
6-6-1970: ArqRegMoç B. 13, n. 152; Actas da reunião dos missionários do norte do Niassa com o Superior Geral. Vila
Cabral, 8-6-1970: ArqRegMoç B. 13, n. 151.
304
Cf. Verbal das reuniões do Conselho Regional. Lourenço Marques, 23-30/10/1971: ArqRegMoç R. 3, pp. 7-8.
305
Cf. Carta do P. José Paleari, Superior Regional, ao P. Mário Bianchi, Superior Geral. Lourenço Marques, 4-
11-1971: ArqRegMoç B. 13, n. 167.
306
Cf. Verbal das reuniões do Conselho Regional. Lourenço Marques, 23-30/10/1971: ArqRegMoç R. 3, p. 6.
eram do grupo dos irmãos oblatos da Consolata. O noviciado teve início no dia 7 de Novembro de
1971.
Concluído o noviciado, o diácono Brazão Mazula foi ordenado sacerdote no dia 7 de Janeiro de
1973 na igreja anglicana de Messumba, onde tinha sido baptizado. Foi um acontecimento
significativo do ponto de vista missionário e ecuménico. Participaram católicos e anglicanos e o
bispo anglicano permitiu que os seus fiéis fizessem a comunhão juntamente com os católicos.
A partir do Concílio Vaticano II, inspirando-se nos decretos Ad Gentes sobre a actividade
missionária, Unitatis Redintegratio sobre o diálogo ecuménico e na declaração Nostra Aetate sobre
o diálogo inter-religioso, os missionários tornaram-se promotores do diálogo com as outras igrejas
cristãs e com os muçulmanos. O Niassa, com o seu multifacetado contexto religioso, foi sem dúvida
a região onde se realizou o maior número de experiências e com bons resultados. Os primeiros
missionários tinham já desbravado este terreno. A credibilidade moral do P. Pedro Calandri, a quem
chamavam Bwanacilimba (homem de coração forte), teve uma grande influência sobre os
muçulmanos ayao. Defendeu-os até ao extremo, contra as injustiças das autoridades coloniais e
agentes do algodão. A sua amizade e o seu relacionamento com os missionários anglicanos também
eram bem conhecidos por todos.
307
Cf. A. CONÇEIÇÃO FRANCISCO, O Seminário IMC: Encontro n.36 (1988) 13-17.
11. 1. O Islamismo
11.1.1. A presença e influência muçulmana no Niassa
A islamização do Niassa teve início no século XIX, sobretudo através dos contactos comerciais
com a população muçulmana do litoral. De facto, os comerciantes árabes de marfim e de escravos
penetraram no Niassa e com facilidade islamizaram a população ayao e parte da população macua que,
308
seguindo o exemplo dos chefes, considerava a religião islâmica muito fácil e cómoda .
Após a chegada ao Niassa, percorrendo todo o território, os Missionários da Consolata
verificaram com os próprios olhos a crescente islamização da população ayao, anyanja e macua, até há
poucos anos ainda pagãs. Embora o islamismo tenha penetrado na cultura, assimilando os costumes,
muitos muçulmanos (sobretudo entre a população macua) só o eram aparentemente, sendo mais lógico
chamá-los islamizados. Assumiram, essencialmente, a parte litúrgico-formal do islamismo - jejum,
oração e purificações - conservando a antiga crença nos antepassados, o direito e a moral. Não houve
portanto, uma verdadeira conversão. Houve, sim, uma profunda influência que criou um sincretismo
309
religioso, uma religião híbrida .
Em oposição à religião tradicional que tem uma dimensão estritamente familiar, o triunfo do
islamismo deveu-se principalmente à sua característica de religião universal, colectiva e aglutinadora,
que interligou um povo dividido, plasmando um corpo social que os chefes políticos raramente
conseguiram estabelecer. Percebe-se assim a dificuldade que um muçulmano tem em deixar a sua
religião para se converter ao cristianismo.
308
Cf. F. J. PEIRONE, A tribo Ajaua do alto Niassa e alguns aspectos da sua problemática neo-islâmica (Lisboa,
1967) 37-50; L. WEGHER, Um olhar sobre o Niassa, vol. I (Maputo, 1995) 295-317.
309
P. CALANDRI, Gli Ayao e il musulmanesimo (Massangulo, 1931) 1: AIMC XIII/389.
310
No relatório anual enviado a Roma, o P. Pedro Calandri alertava para a urgente necessidade de fundar uma
missão entre o povo macua para impedir a sua crescente islamização. AIMC VIII/7 1934, n. 2: Relatório anual do
estado da Missão de Nossa Senhora da Consolata de Massangulo à S. Congregação "Propaganda Fide": Massangulo,
5-7-1935.
311
D. FERRERO, Missioni cattoliche e Islamismo: Missioni Consolata (1956/3) 63.
muçulmanos era cordial e pacífica. Os missionários apreciavam a laboriosidade e fidelidade dos
312
trabalhadores muçulmanos e estes a sua generosidade .
Para esta relação contribuíram gestos de estima recíproca, trocados em diversas situações.
Significativo foi o gesto de Dom Eurico Dias Nogueira, primeiro bispo da Diocese de Vila Cabral, ao
dirigir uma Carta Fraterna (1966) aos muçulmanos do Niassa, na qual acentuava os traços de união
313
religiosa entre cristãos e muçulmanos, isto é, os pontos de contacto entre o Evangelho e o Alcorão . A
carta teve um bom acolhimento entre a comunidade muçulmana e foi muito apreciada. As relações
amistosas continuaram durante o seu governo pastoral e o do seu sucessor, Dom Luís Ferreira da Silva.
11. 2. Protestantes
11.2.1. Notas históricas sobre a evangelização e presença protestantes
Os primeiros evangelizadores do Niassa eram anglicanos. Em meados do século XIX, os
missionários da U.M.C.A. (Universities Mission Central Africa), seguindo os passos do pastor David
Livingstone, penetraram no Niassalândia (actual Malawi), no sul e oeste do Lago Niassa, no Zambeze e
no Shire. Mas, devido às lutas entre angones e ayaos e às febres que faziam grande mortandade, tinham-
se retirado em 1860. Mais tarde, partindo de Zanzibar, atravessaram o Rovuma, falaram com o régulo
Mataka em Muembe e chegaram ao Lago Niassa, a Chiteje. Instalaram-se na Ilha de Likoma, em frente
de Cobué (10 km), e dali evangelizaram a parte oriental do Niassa, fundando missões e escolas. Era ali
que residia o bispo anglicano com jurisdição sobre o Niassalândia, parte do Tanganica e Niassa. Os
missionários anglicanos E. Steere, A. Smythies e W. P. Johnson fundaram em 1880 a Missão de
Messumba, a 10 km de Metangula. Com o tempo surgiram as missões secundárias de Metónia, Unango,
314
Ngoo, Chiteje e um número grande de capelas e escolas .
A partir de 1920 outras igrejas não-católicas, como a Igreja Baptista e a Igreja Evangélica,
iniciaram a sua acção evangelizadora no sul do Niassa entre a população macua, a partir das missões
situadas na Zambézia e no Niassalândia.
Uma vez que os missionários protestantes de origem europeia eram considerados indesejáveis
pelas autoridades portuguesas, por serem acusados de defensores dos interesses ingleses, estes
missionários formavam pastores locais para evangelizar a população, através da abertura de escolas e
capelas nas povoações.
312
D. FERRERO, Missioni cattoliche e Islamismo: Missioni Consolata (1956/3) 63.
313
E. DIAS NOGUEIRA, Carta Fraterna aos Muçulmanos: Missão em Moçambique (Vila Cabral, 1970) 70-81.
314
Cf. G. H. WILSON, The History of the Universities’ Mission to Central Africa, UMCA (London, 1936); R.
STUART, Os Nyanja, o UMCA e a Companhia do Niassa: 1880-1930: Revista Internacional de Estudos Africanos 3
(1985) 9-41.
315
No relatório enviado à Santa Sé, o P. Gabriel Quaglia informava que a recém-fundada missão de Mepanhira,
além de potencializar a acção evangelizadora católica entre o povo macua, contribuiria para neutralizar a presença
protestante. AIMC VIII/7 1938 n. 2: Relatório anual do estado da Missão de Nossa Senhora da Consolata de
Massangulo - Niassa Português à Congregação dos Negócios Eclesiásticos Extraordinários. Massangulo, 5-12-1938.
para o culto católico e anglicano (exemplo de Massengere e Luiça) e houve até retiros para
sacerdotes anglicanos e católicos, orientados pelo vigário geral da diocese.
Também os missionários presentes no sul de Moçambique tiveram que conviver com as igrejas
protestantes, que chegaram no princípio do século XX. No início dos anos 40, as relações eram
poucos fraternas, mas o ambiente mudou no pós-concílio. Em Julho de 1971, a equipa missionária
da missão de Massinga organizou um encontro ecuménico com os pastores das igrejas protestantes
das zonas limítrofes, experiência que se repetiu alguns dias depois em Anhane, sede distrital da
Igreja Metodista Episcopal Unida. No culto intervieram o P. Emanuel Maggioni com a pregação e o
P. Mauro Calderoni com a oração. Todos ficaram contentes com este momento ecuménico que
apagava tantas incompreensões e abria um caminho novo de relacionamento316.
Hoje, o diálogo e a colaboração ecuménica têm-se consolidado na dioocese de Inhambane. No
campo bíblico, por exemplo, o Centro de Promoção Humana do Guiúa colabora com a Sociedade
bíblica nas traduções da Bíblia em Gitonga e Cichope, e na revisão da tradução da Bíblia em
Xitshwa, através do trabalho dos membros da comissão diocesana de tradução.
316
Cf. Massinga. Noticiário: Encontro n. 2 (1971) 3-4.
CONCLUSÃO
RECORDAR É VIVER
O Instituto comemora
Neste ano feliz:
“Os 75 anos
da presença no País”.
Recordar é viver
O labor dos “Pioneiros”;
os suores, até o sangue
dos gloriosos Mensageiros!
Semearam a semente
Em terrenos muito duros;
nós herdamos, nós colhemos
os seus frutos já maduros.
O exemplo luminoso
Desses nossos Pioneiros
De “Justiça, Paz e Amor”
Faz de nós os Mensageiros.
Estimulam-nos à luta
Contra o mal, a tirania;
pois lutaram e sofreram
pela Paz e harmonia.
Só unidos no trabalho
Forjaremos mundo novo.
Trabalhemos sem descanso
Pelo bem do nosso povo.
DATAS PRINCIPAIS
PARA A HISTÓRIA DA EVANGELIZAÇÃO
DOS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE (1925-2000).
10-8-1924: D. Filipe Perlo, Superior Geral dos Missionários da Consolata, ordenou ao P.e
João Chiomio e ao P.e Luís Perlo, missionários no Quénia, que façam uma viagem de estudo
a Moçambique.
5-4-1925: O P.e Luís Perlo chega a Lourenço Marques (Maputo) e encontra-se com D. Rafael
Assunção, prelado de Moçambique, ao qual apresenta um plano de evangelização. Obtém do
Bispo a autorização de entrada dos Missionários da Consolata em Moçambique (6-4-1925).
3-7-1925: A Congregação de Propaganda Fide autoriza a entrada dos Missionários da
Consolata em Moçambique.
29-8-1925: D. Filipe Perlo escolhe os 8 missionários da Consolata que o Instituto enviaria
para Moçambique: P.e Vítor Sandrone (superior), Júlio Peyrani, Pedro Calandri, João
Chiomio, P.e Paulo Borello, P.e Lourenço Sperta, seminarista Segundo Ghiglia.e o Ir. José
Benedetto.
14-9-1925: O Beato José Allamano, fundador dos Missionários da Consolata, faz a entrega do
crucifixo aos três missionários que partem de Turim para Moçambique.
Missão de Miruru-Tete
30-10-1925: O primeiro grupo de Missionários da Consolata provenientes de Turim - P.e
Borello, P.e L. Sperta, seminarista S. Ghiglia, juntamente com P. G. Chiomio (vindo do
Quénia) - desembarca no porto da Beira.
23-11-1925: Os quatro Missionários provenientes do Quénia – P.e V. Sandrone, P.e G.
Peyrani, P.e P. Calandri e Ir. J. Benedetto – desembarcam no porto da Beira.
6-3-1926: Os primeiros Missionários da Consolata chegam à missão de S. Pedro Claver de
Miruru
18-9-1927: O primeiro grupo de Missionárias da Consolata (7 irmãs) chegou à missão do
Miruru.
25-10-1930: A autoridade eclesiástica decide retirar os missionários da missão de Miruru.
Missão de Massangulo
4-7-1926: Os padres Pedro Calandri e José Amiotti chegam a Mandimba (Niassa).
20-5-1928: O P.e P. Calandri funda a missão de Nossa Senhora da Consolata de Massangulo
entre o povo Ayao.
31-12-1928: Chegada à Missão de Massangulo do primeiro grupo de Missionárias da
Consolata.
1939 1952
P.e Luís Wegher P.e Célio Regoli
P.e Guido Gobbo
P.e Domingos Ferrero 1954
Ir. João Arneodo P.e Amadeu Marchiol
P.e Inácio Mondin
1946
P.e Luciano Oggé 1955
P.e Emílio Geromet Ir. José Cardinali
P.e Sérgio Donato
P.e Carlos Lazzaron 1957
P.e Fernando Stagni P.e Lourenço Stimoli
P.e Mario Bianco Ir. Albino Henriques Rosa
Ir. António dos Reis Gonçalves P.e João Monteiro da Felícia
Ir. Francisco Neves da Silva P.e Elísio Ferreira da Assunção
1958 1968
P.e Aldo Mongiano P.e António Ferreira Antunes
P.e Manuel Maria Marques P.e Manuel Carreira
P.e Artur Luís Rodrigues P.e José Alessandria
P.e João Merlo P.e Adriano Prado
P.e Manuel Carreira Junior
1959 P.e Mauro Calderoni
P.e Luís Fiorini
P.e Joaquim Alves Ferreira 1969
P.e Manuel Tavares P.e Armanno Armanni
P.e António da Costa Gaspar P.e Carlos Gianini
P.e Mário Teruzzi P.e Franco Gioda
Ir. José Nunes Afonso P.e Guerrino Prandelli
Ir. José Soares de Almeida P.e Ernestino Venturi
P.e Henrique Redaelli
1960 P.e Salvador Forner
P.e José Lopes Pequito
Ir. Vicente Dias Crisostomo 1970
Ir. Benjamim Prata P.e Severino Bordignon
Ir. Miguel Domingos Santos P.e João Guidolin
P.e Herculano Neves da Silva
1961 Diac. Armindo Ferreira Vaz
P.e Mário Spangaro Ir. Tarcisio Lot
P.e Luís Fiorini
P.e Silvestre Liberini 1971
P.e Henrique Da Croce P.e Francisco Lerma Martinez
P.e André Brevi
1963 P.e Jaime Marques
P.e Mário Teodori P.e José Tavares Matias
Ir. Alexandre Moura Valente Ir. Pedro Bertoni
Ir. Agostinho Lanza
1964
P.e Silvestre Bettinsoli 1972
P.e João Armando P.e Alfredo Dias Ferreira Dionísio
P.e Vidal Moratelli P.e Victor Gatti
P.e José Fernando da Rocha Martins
1965
P.e Gelindo Scottini 1974
P.e Joaquim Ferreira de Almeida P.e Augusto Fatela
P.e Artur Marques P.e José Jesus Barros
1966 1975
P.e José Capelo P.e José Frizzi
P.e Luís Ferraz
P.e João Baptista Coelho 6º Período: 1982 a 1992
1967 1982
P.e José Salgueiro da Costa
7º Período: 1993 e 2000
1983
P.e Aquiléo Fiorentini 1993
P.e Franco Gioda P.e Hipólito Marandu
1984 1994
P.e Ivanilson Brun P.e Jaime Patias
P.e Mário De Carli Sem. José Ricardo Bocanegra
P.e João Morando Sem. Domingos Forte Oliveira
P.e Élio Rama Sem. Joaquim Guiza Pinzón
Ir. Carlos Manuel Margato da Ponte
1985
P.e Miguel Njue 1995
P.e José Rurunga P.e Luís Andriolo
P.e Henrique Córdoba
1987 P.e Vasco Campos Gomes
P.e Alceu Agarez
P.e Christian Fernández Moores 1996
P.e Rosalino Dall’Agnese
1989 P.e Aldo Parodi
P.e Ariel Granada Serna P.e Filipe José Couto
P.e José Torres Neves P.e Rogelio Alarcón
P.e Joseph Otieno Ir. Ayres Osmarin
P.e Agostinho Squizzato
P.e Francisco Ponsi 1997
P.e John Peter Njoroge P.e Felix Odongo
Ir. Daniel Ndihu Ir. Raimundo Ayieko
1990 1998
P.e António Rusconi P.e Giancarlo Sandro Faedi
P.e Ricardo Castro P.e Ricardo Guillén (agregado)
Ir. Martinho Kirimi Sem. Guilherme Pinilla
1991 1999
P.e João Franco Graziola P.e Carlos Alberto Gaspar Pereira
P.e José Vinci P.e Bruno Pepino
P.e Henry de Jesus Taborda Sem. Valentim Camale
Diácono João Carlos Nascimento
2000
1992 P.e Alberto Jesus (agregado)
Ir. Agostinho Bonetti P.e Manuel Domingos Magalhães
Sem. Carlos Alessio Biella Sem. Fábio Malesa
Sem. Diamantino Guapo Antunes
LISTA DOS SUPERIORES E RESPECTIVOS CONSELHOS
Missão de Miruru-Tete
Superior do grupo dos Missionários da Consolata (1925-1929): P.e Victor Sandrone
Missão de Massangulo
Superior da Missão de Massangulo-Niassa (1928-1936): P.e Pedro Calandri
Superior da Missão de Massangulo-Niassa (1936-1938): P.e Victor Sandrone
Grupo do Niassa
Superior Delegado do grupo do Niassa (1938-1940): P.e Gabriel Quaglia
Superior Delegado do grupo do Niassa (1940-1949): P.e Domingos Ferrero
Superior Delegado do grupo do Niassa (1949-58): P.e Domingos Ferrero.
revisto:ok 139
Região de Moçambique (1973-1975)
P.e Manuel Tavares: Superior Regional
P.e Aldo Mongiano, Vice-superior
P.e Armanno Armanni: 1º Conselheiro
P.e Manuel Carreira: 2º Conselheiro
P.e Mário Teodori: 3º Conselheiro
revisto:ok 140
P.e José Rurunga: 1º Conselheiro
P.e Alceu Agarez: 2º Conselheiro
Ir. Pedro Bertoni:3º Conselheiro
revisto:ok 141
OS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA EM MOÇAMBIQUE (2000)
Membros da Região Moçambique
Descrição 2000
Padres 38
Irmãos 9
Estudantes Professos 1
Padres Agregados 2
Leigos Missionários 5
Total 55
Faixas Etárias
Faixas Etárias Padres Irmãos Estudantes/Leigos
30 - 39 anos 6 6 6
40 – 49 anos 10
50 – 59 anos 10 1
60 – 69 anos 10 1
70 – 79 anos 3
80 – 89 anos 1 1
A Média das idades na região é de 56 anos
Presença/actividade em Moçambique
Presença em Moçambique Distribuição dos Missionários por
actividades
Comunidades 17 Pastoral 33
Paróquias 25 Formação 9
Seminários 3 Universidade Católica 3
Noviciado 1 Centro Catequético 2
Universidade Católica 1 Direcção Regional 3
Centro Catequético 1 Promoção Humana 2
Serviços religiosos 1
revisto:ok 142
O CONTRIBUTO DOS MISSIONÁRIOS DA CONSOLATA
PARA O CONHECIMENTO E EVANGELIZAÇÃO DE MOÇAMBIQUE
NO CAMPO LINGUÍSTICO, ETNOLÓGICO, HISTÓRICO E PASTORAL
1. BÍBLIA (traduções)
Língua Macua:
Watana wa Nanano (Roma 1997). Tradução em língua Macua-Xirima do Novo Testamento.
A Bíblia integral em Macua-Xirima já está traduzida sendo a sua publicação prevista para o ano 2002.
Masalmu. Eyinlo y’ekristu (Roma 1997). Tradução e comentário em língua Macua-Xirima do livro dos
Salmos.
2. CATECISMOS
Língua Ciyao:
CALANDRI P., Pequeno Catecismo em Ci-yao-Português. Tradução do Catecismo de D.
António Barroso (Massangulo 1934).
CALANDRI P., Majiganyo ga Egreja Katolika (Massangulo sd).
CALANDRI P., Masomo ga M’malembo Gamaswela. Cilangano cakala (Unango sd).
CALANDRI P., Umi wa Ambuje wetu Yesu Kristu. Tradução em Ci-yao da vida de Nosso
Senhor Jesus Cristo da obra de São Francisco de Sales (Massangulo 1945)
CALANDRI P., Katekismo ja Akatolica (Massangulo 1950).
Língua Macua:
CASANOVA M., Katekismu ya Mahusiho Katolika(Pinerolo 1950).
CASANOVA M., Okumi wa Apwiy’ahu Yezu Kristu (Nampula 1950).
Ekatekismu ya Makatekumeni ni Asitokwene (Roma 1987)
Muluku onnakitthana miyo (Braga 1987).
Língua Xitshwa
QUAGLIA G., Catecismo Católico em língua Xitswa e Português (Lourenço Marques 1948).
QUAGLIA G., Hosi ya Hina Jesu Kristu (Mapinhane 1951). Vida de Jesus traduzida do Cinyanja.
QUAGLIA G., Zigonzo za Kristo (Mapinhane 1951)
SECRETARIADO DA ACÇÃO PASTORAL, Nza Kholwa Hosi (Inhambane 1983): Catecismo/temas
para o catecumenado de adultos.
SECRETARIADO DA ACÇÃO PASTORAL, Missal em Xitshwa (Inhambane 1998): Policopiado.
SECRETARIADO DA ACÇÃO PASTORAL, Ha Khozela (Inhambane 2000): Ritual do catecumenado,
dos Sacramentos e Funerais.
3. LITURGIA
Língua Ciyao:
CALANDRI P., Mabuku ga Mapopelo ni ga Nyimbo (Massangulo sd).
Missale Romanum in vernaculo “Yao” (Unango 1971).
Nymbo ya Ci-yao (Massangulo 1958). Livro de cânticos.
Twapopele Mlungu (Unango 1971). Ritual dos Sacramentos.
Língua Macua
revisto:ok 143
Buku a Mavekelo (Nampula 1950).
Mavekelo ni Itxipo (Roma 1987).
FILIPPI, M., Evangelho dos Domingos e dias festivos em língua Elomwé (Maiaca 1960).
Masu a Muluku. Sowerenka sa eyakha A.B.C, Ifesta sitokwene, Masakramenti (Roma 1987).
Língua Xitshwa
Muphahlo wa Missa (Inhambane 1968): Ordinário da Missa.
Ha Kombela (Inhambane 1986): Devocionário.
Yimbelelelani (Inhambane 1994): recolha de cânticos em língua Tshwa.
Língua Cindau
Missal em cindau (Nova Mambone 1996): Policopiado.
Cânticos em cindau (Nova Mambone 1976): Policopiado.
4. DICIONÁRIOS E GRAMÁTICAS
Língua Ciyao:
CALANDRI P., Dicionário Ciyao-Português e Português-Ciyao (Massangulo sd). Pro
manuscripto.
CALANDRI P., Gramática de língua Ciyao (Massangulo-sd) Pro manuscripto.
Língua Macua
CASANOVA M., Appunti di lingua Elomwe (Mitúcue 1947): policopiado.
FILIPPI M., Dicionário elementar Português-Macua (Maiaca 1963).
FRIZZI G., Dicionário Emakhuwa-Português; Português-Emakhuwa (Maúa 1992).
FRIZZI G., Gramática de língua Macua-Xirima (Maúa 1992).
Língua Xitshwa
AA.VV., Dicionário Português-Xitshwa e Xitshwa-Português (Inhambane 2000).
PALEARI G., Note di Grammatica Xitswa (sl 1955).
5. ANTROPOLOGIA-ETNOGRAFIA
FRIZZI G. ,Nulumo na Exirima. Olepa, osoma, osuwela ikano saya (Maúa 2000).
FRIZZI G., Sohimmwa ni solempwa s’exirima. Literatura oral e escrita Xirima (Maúa 2000).
revisto:ok 144
FRIZZI G., Miruku ni Ethale. Sohimmwa sa Makholo (Maúa 1993).
7. LITERATURA
8. HISTÓRIA
9. TEOLOGIA-PASTORAL
revisto:ok 145
ÍNDICE DE NOMES
LUGARES317
Abudu Doane Lugenda (rio)
África do Sul Dornelas do Zêzere Luiça
Amaramba Estevel Luleyo (rio)
Anchilo (Nampula) Etatara Lúrio (rio)
Anhane Etiópia Lusaka ( Zâmbia)
Bazaruto (Inhambane) Faiquete Mabote (Inhambane)
Beira Fátima (Portugal) Macawe
Belém (Mitande) Fort-Johnston (Malawi) Machava (Maputo)
Beluluane Funhalouro Machocomane
Benfica (Maputo) Gaza Macovane (Inhambane)
Bilene (Gaza) Govuro Macunha
Blantyre (Malawi) Guiúa Magude
Boane (Maputo) Gurue (Zambézia) Mahanhana
Bonhiça Homoíne Maiaca
Boroma (Tete) Ibo (Cabo Delgado) Maimelane
Brasil Ikuru Majune
Bungul Ilha de Moçambique Malakontera
Cabo de S. Sebastião Índia Malawi
Cabo Delgado Infulene Malema (Nampula)
Cabo Verde Inhambane Mandimba
Cantina Dias Inharrime Mangonha
Catur Inhassoro Manhai
Chaxane Itália Manhice
Chia Jangamo Maniamba
Chicomo Joanesburgo (África do Manica
Chikoa Sul) Manjacaze (Gaza)
Chinonanquila Kaliwata Mantiha
Chipingamonga Laulane Mapanzene
Chirua (Lago) Lhanguene Mapinhane
Chiruala Liberdade Maputo
Chiteje Lichinga Marrere (Nampula)
Chiwindi Likoma (Malawi) Marrupa
Chuambo Limbe (Malawi) Masekesi (rio)
Chupanga (Beira) Lingamo Massangulo
Ciamba Linguni Massinga
Ciwaia Lioma Mataka
Cobué Lipoche Matias
Cociwa Liqueleva Matola (Maputo)
Cuamanhira Lisboa Maúa
Cuamba Litunde Maubo
Cumare Liúchi Mavila
Curea Lourenço Marques ( Maxixe (Inhambane)
Cuvinhe Maputo) Mazive
Cya Lucheringo (rio) Mbemba
317
Foram omitidos os nomes: Moçambique, Niassa, devido ao facto de aparecerem inúmeras vezes.
revisto:ok 146
Mbueka Munghi Quelimane
Mecanhelas Munhava Quénia
Mepanhira Murusso Quilasse
Mepesseni Mussumbuluco Quissico (Inhambane)
Messalo (rio) Mutuali (Nampula) Rapela (Nampula)
Messossomera Muvamba Rebordões (Portugal)
Messumba (missão) Mwanda (rio) Revia
Metangula Mwetetere Rio das Pedras
Metónia Namikopo (monte) (Inhambane)
Mikoko (monte) Namissoro (rio) Roma (Itália)
Milo Nampula Roraima (Brasil)
Miruru (Tete) Namucopo Rovuma (rio)
Mitúcue Nangombo Sá da Bandeira (Angola)
Mochisso Nansya Sagal
Mocodoene (Inhambane) Napita Samata
Mocumbi (Inhambane) Ncue Save (rio)
Mogora Ndanda Shauritanga
Molumbo (Zambézia) Nesara Shire (rio e vicariado)
Mombaça (Quénia) Ngombi Singatela
Môngoe Ngoo Slumene
Mopiha Nguludi (Malawi) Sofala
Morrumbene (Inhambane) Nhacengo Tambera
Mpendeka Nhacolo Tanganica (Tanzânia)
Mpomola Niassalândia (Malawi) Tanzânia
Mpopo Nipepe Tete
Mpwera Niputa Tsalala
Msimburaghe Nkumbili Turim (Itália)
Mtelela Nova Coimbra Txaxe
Muakanha Nova Esperança (Majune) Umbelusi
Mualasa Nova Freixo (Cuamba) Unango
Muaquiua Nova Madeira Vessa
Muela Nova Mambone Vila Cabral (Lichinga)
Muembe Nsinje Vilankulo
Muheya Nungo Wakupsa
Muikuna Palombe (Malawi) Zambeze (rio)
Mukatare Pambara Zambézia
Mukopo Panda (Inhambane) Zanzibar (Tanzânia)
Mukupira Pemba (Cabo Delgado) Zumbo (Tete)
Mukwapa Porto Amélia (Pemba)
Mulotona Portugal
revisto:ok 147
PESSOAS318
A. Barroso Hipólito António Ribeiro Christian Fernández
A. Smythies António Rusconi Moores
A. Lunati Aquiléo Fiorentini Companhia de Jesus
A. Rita-Ferreira Ariel Granada Serna Conferência Episcopal de
Adelino Francisco Armando Michaud Moçambique
Adriano Garcês Armanno Armanni Congregação da
Adriano Prado Armida Quaglia Imaculada Conceição
Afonso Dhlakama Artur Marques Corrado Maritano
Afonso José Nunes Artur Rodrigues Cristina Jaime
Agnes Mainhardt Assuntina Riva D. Alberto Setele (Bispo
Agostinho Bonetti Augusto Fatela de Inhambane)
Agostinho Lanza Avelino Pereira Branco D. Alexandre José Maria
Agostinho Squizzato Ayres Osmarin dos Santos (Arcebispo do
Agueda Macengua B.H. Barnes Maputo)
Albasino Notiço Bartolomeu Calleris D. Custódio Alvim Pereira
Alberto de Jesus Bartolomeu Liberini (Arcebispo de Lourenço
Alberto Maggiore Bartolomeu Lorenzatto Marques)
Alberto Manjoro Bartolomeu Peretti D. Ernesto Gonçalves
Alberto Trevisiol Beato José Allamano Costa (Bispo de
Albino Henriques Benedetta Mattio Inhambane)
Alceu Agarez Benjamim Prata D. Eurico Dias Nogueira
Aldo Dall'Armi Bociri (António Taimane) (Bispo de Vila Cabral)
Aldo Mongiano Bona Magistrelli D. Filipe Perlo (Superior
Aldo Parodi Bona Munúkua Geral dos Missionários da
Alexandre Moura Valente Bona Pischedda Consolata)
Alfonsina Della Longa Brazão Mazula D. Francisco Ferreira da
Alfredo Dionísio Bruno Pepino Silva (Bispo da Prelazia de
Alfredo Ponti Caetana Goletti Moçambique)
Amabile Fagnani Camilo Ponteggia D. Francisco Nunes
Amadeu Marchiol Cardeal Eugénio Pacelli Teixeira (Bispo de
Amândio Dide Cardeal Maglione Quelimane)
Ananina Tabellini Carlos Alberto Gaspar D. João Evangelista de
Anastasia Torresin Pereira Lima Vidal (bispo de
André Brevi Carlos Biella Aveiro)
André Salvini Carlos Giannini D. Luís Ferreira da Silva
Angélica Mape Carlos Lazzaron (Bispo de Vila
Ângelo Lunati Carlos Machili Cabral/Lichinga)
Ângelo Rota Carlos Margato da Ponte D. Manuel de Medeiros
Antida Castino Carlos Matias Domingos Guerreiro (Bispo de
António da Costa Gaspar Carmela Munúkua Nampula)
António dos Reis Celestino Blassuto D. Manuel Vieira Pinto
Gonçalves Célio Regoli (Bispo de Nampula)
António Ferreira Antunes Celso Pinto de França
António Gonçalves César Cavaleiro
318
Foram omitidos os nomes: Missionários da Consolata, Missionárias da Consolata devido ao facto que
aparecem inúmeras vezes.
148
D. Teodósio de Gouveia Fiorenza Maggioni Irmãs do Calvário
(Arcebispo de Lourenço Flamínia Malino Irmãs Dominicanas do
Marques) Florência Mirole Rosário
D. Rafael de Assunção Floriana Jericijo Ivanilson Brun
(Bispo da Prelazia de Franca Cavicchi J.A. Alves de Sousa
Moçambique) Franciscanas de N.S. das J.C. Mitchell
D. Sebastião Soares Vitórias Jaime Marques
Resende (Bispo da Beira) Franciscanas Missionárias Jaime Patias
D. Teófilo de Andrade de Maria João Armando
(Bispo de Nampula) Francisco Lerma João Arneodo
Dalmácia Colombo Francisco Marques João Baptista Coelho
Daniel Ndihu Francisco Neves da Silva João Chiomio
Daniel Polela Francisco Ponsi João da Silva Viana Cossa
Daria Pavese Franco Gioda João De Marchi
David Livingstone Frelimo João Guidolin
Diamantino Guapo G. H. Wilson João Merlo
Antunes José Gallea João Monteiro da Felícia
Dionísio Ferreira Gabriel Quaglia João Morando
Dolores Cozzi Gabriela Malessani João Nascimento
Domingos António José Gaudência Palombe João Piovano
Domingos Ferrero Gaudêncio Barlassina João Tolosano
Domingos Fiorina Gelindo Scottini João Txipinenga
Domingos Forte Oliveira Generosa Bugatti João Vespertini
Donato Sergi Gerardo Gumiero João XXIII
Eduardo A. Alpers Gian Carla Ferraris Joaquim Alberto Chissano
Edvige Grosso Giancarlo Pegoraro Joaquim Alves Ferreira
Eduardo Steere Giancarlo Sandro Faedi Joaquim Ferreira de
Élio Rama Gianfranca Rota Almeida
Elisabete Santos Gil Estevão Nhantumbo Joaquim Guiza Pinzon
Elísio de Assunção Guerrino Prandelli Joel Carlos
Emanuel Maggioni Guido Gobbo John Peter Njoroge
Emílio Geromet Guido Motter Jorge Guilherme Nampape
Emma Rinaudo Guilherme Pinilla José Alessandria
Ernestino Venturi Gungunhana José Amiotti
Ernesto Motta H. Cox José Benedetto
Estêvão Jardim H. Thomas José Bottacin
Estevão Mirassi Henrique Córdoba José Cardinali
Eugénio Menegon Henrique Da Croce José Chiappa
Eva Negro Henrique Redaelli José Eusébio
Federico J. Peirone Herculano Neves da Silva José Frizzi
F. Nunes Teixeira Hipólito Marandu José Inverardi
F.F. Lopes Hugo Versino José Jesus Barros
Fabio Malesa Inácio Mondin José Lopes Pequito
Faconda Alberti Inácio Saure José Martins da Rocha
Felix Odongo Inês Munúkua José Otieno
Fernando Laina Irene Schwarz José Paleari
Fernando Piccolo Irmãs Agostinianas José Ricardo Bacanegra
Fernando Stagni Missionárias José Rurunga
Fida Boccolari Irmãs da Apresentação de José Salgueiro da Costa
Filipe José Couto Maria José Soares de Almeida
149
José Tavares Matias Mário Natali Ricardo Avila
José Torres Neves Mário Spangaro Ricardo Castro
José Valle Mário Teodori Ricardo Guillén
Júlio Peyrani Mário Teruzzi Ricardo Sapina
Laurina Carminati Martinho Kirimi Rogelio Alarcón
Leonzia Bernasconi Mauro Calderoni Romildo Zama
Livia Caffaratti Miguel Msissi Rosalino Dall’Agnese
Lourenço Baroffio Miguel Domingues Santos Rosangela Bresciani
Lourenço Sperta Miguel Njiue Rosella Casiraghi
Lourenço Stimoli Miqueias Maloa Salvador Forner
Luciano Oggé Mons. Domingos Tardini Segundo Ghiglia
Luís Andriolo Mons. Francisco Serafim Pinto Ferreira
Luís Bosio Colasuonno Serafina Mape
Luís Castro Noemi Fantin Serena Bresolin
Luís Fiorini Oberto Abondio Sérgio Vieira
Luís Perlo Onorata Foresti Severino Bordignon
Luís Perlo Osvaldo Peressini Silvestre Bettinsoli
Luís Wegher Ottaviana Trombetta Silvestre Liberini
Luisa Amalia P.G. Bassi Sílvio Petris
M. Gama Amaral Padres Beneditinos Sira Vimercati
Madalena Apili Padres Brancos Sociedade Missionária
Madalena Mulima Padres Franciscanos Speranza Longhi
Manuel Carreira Padres Jesuítas Tarcísia Imboldi
Manuel Domingos Padres Monfortinos Tarcísio Lot
Magalhães Palotinas Teófila Mirole
Manuel Maria Marques Papa Paulo VI Teotina Cariolato
Manuel Ramos Pinto Paulo Borello Teresa Malessani
Manuel Tavares Paulo Deriu Teresa Mape
Manuela Graciano Pedro Bertoni Theo Van Asten
Manuela Milima Pedro Calandri Tommasina Moretto
Marcellina Vuillermin Pedro Sisto Carrau Valentim Camale
Marchina Raineri Pedro Trabucco Valéria Melzani
Margarida Maria Pio XII Vasco Campos Gomes
Margarida Munúkua R. Morozzo della Rocca Vaticano
Maria Anunziata R. Stuart Vicente Dias Crisóstomo
Maria Domingas João Rafael Jeane Victor Gatti
Maria dos Anjos Malessani Rafael Lombardo Victor Sandrone
Maria Pia Tambosi Rafael Ruxula Vidal Moratelli
Mário Arnaldo Raimundo Ayieko William Johnson
Quissimuço Ramos Pinto Xavier Ramírez
Mário Bianchi Rebeca Julião Y. Abdullah
Mário Casanova Remigia Civera
Mário De Carli Remo Cardinali
Mário Filippi Renata Allena
150