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Capítulo 2

As Condições de Equilíbrio
Thermodynamics - H.B. Callen (1960)

2.1 Parâmetros Intensivos


Devido ao nosso interesse nos processos e nas mudanças dos parâmetros extensivos associados,
vamos nos dedicar prioritariamente na forma diferencial da equação fundamental. Escrevendo a
equação fundamental como

U  US, V, N 1 , N 2 ,  , N r  (2.1)
calculamos a primeira diferencial
r
dU  U dS  U dV   U dN j (2.2)
S V,N 1 ,,N r V S,N 1 ,,N r
j1
N j S,V,,N r

As diversas derivadas parciais que aparecem na equação anterior ocorrem tão frequentemente que é
conveniente representá-las por símbolos especiais. Tais derivadas são chamadas de parâmetros
intensivos e, convencionalmente, utilizam-se a seguinte notação:

U  T, temperatura (2.3)
S V,N 1 ,,N r

 U  P, pressão (2.4)
V S,N 1 ,,N r

U  j, potencial eletroquímico


N j S,V,,N r (2.5)
do j-ésimo constituinte

Com esta notação, a Eq. (2.2) torna-se


dU  TdS  PdV   1 dN 1     r dN r (2.6)

Mais adiante mostraremos que a definição formal de temperatura está de acordo com nossa intuição,
baseada na noção fisiológica do “quente” e do “frio”. Com certeza relutaríamos em adotar uma
definição de temperatura que fosse contrária a essa noção fortemente arraigada, embora qualitativa.
Por enquanto, introduzimos apenas o conceito de temperatura pela definição formal (2.3).
Da mesma maneira, mais adiante veremos que a pressão, definida pela Eq. (2.4), concorda em todos
os aspectos com a pressão definida em mecânica. Com relação aos vários potenciais eletroquímicos,
não temos definições ou conceitos a priori e, portanto, estamos livres para adotar imediatamente a
definição dada na Eq. (2.5).
De passagem, observamos que o potencial eletroquímico é às vezes referido simplesmente como
potencial químico e usaremos alternadamente essas denominações. Porém, devemos também
observar que ocasionalmente, e particularmente na teoria dos sólidos, o potencial químico é definido
como  menos a energia eletrostática molar.

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 1


O termo PdV na Eq. (2.6) pode ser identificado como o trabalho quase-estático đW M , como dado na
Eq. (1.1).
No caso especial do número de mols constante, a Eq. (2.6) pode ser escrita como
TdS  dU  đW M , se dN 1  dN 2    dN r  0 (2.7)

Lembrando nossa definição de calor quase-estático, ou comparando a Eq. (2.7) com a Eq. (1.2),
identificamos TdS como o fluxo de calor quase-estático
đQ  TdS (2.8)

Um fluxo de calor quase-estático para o interior de um sistema está associado com um aumento da
entropia deste sistema.
Os termos restantes na Eq. (2.6) representam um aumento da energia interna associado com o
acréscimo de matéria no sistema. Este tipo de fluxo de energia, embora significante, não é
frequentemente discutido fora da termodinâmica e, por isso, não tem uma denominação conhecida.
Chamaremos   j dN j de trabalho químico quase-estático,
j

dW c    j dN j (2.9)
j

Portanto,
dU  đQ  đW M  đW c (2.10)

2.2 Equações de Estado


A temperatura, a pressão e os potenciais eletroquímicos são derivadas parciais de uma função de
S, V, N 1 ,  , N r e, consequentemente, são também funções de S, V, N 1 ,  , N r . Então, temos um conjunto
de relações funcionais
T  TS, V, N 1 ,  , N r  (2.11)
P  PS, V, N 1 ,  , N r  (2.12)
 j   j S, V, N 1 ,  , N r  (2.13)

Tais relações, que expressam os parâmetros intensivos em termos dos parâmetros extensivos
independentes, são chamadas de equações de estado.
O conhecimento de uma única equação de estado não se constitui no conhecimento das propriedades
termodinâmicas de um sistema. Mais adiante, veremos que o conhecimento de todas as equações de
estado é equivalente ao conhecimento da equação fundamental e consequentemente é completo sob
o ponto de vista da termodinâmica.
O fato de que a equação fundamental de um sistema é uma função homogênea de primeira ordem
tem implicações diretas sobre a forma funcional das equações de estado. Segue-se imediatamente
que as equações de estado são funções homogêneas de ordem zero. Isto é, multiplicando-se cada um
dos parâmetros extensivos independentes por um escalar  a função fica inalterada
TS, V, N 1 ,  , N r   TS, V, N 1 ,  , N r  (2.14)

Segue-se portanto que a temperatura de um sistema composto formado por dois subsistemas
idênticos é igual à temperatura de um deles. Obviamente, isto concorda com nosso conceito intuitivo

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de temperatura. A pressão e os potenciais eletroquímicos também têm esta propriedade (2.14).
Para resumir as considerações anteriores, é conveniente adotar uma notação condensada.
Denotamos os parâmetros extensivos V, N 1 ,  , N r pelos símbolos X 1 , X 2 ,  , X t tal que a relação
fundamental fique na forma
U  US, X 1 , X 2 ,  , X t  (2.15)

Os parâmetros extensivos são denotados por

U  T  TS, X 1 , X 2 ,  , X t , (2.16)
S X 1 ,X 2 ,,X t

U  P j  P j S, X 1 , X 2 ,  , X t , j  1, 2,  , t (2.17)
X j S,X k ...

Logo,
t
dU  TdS   P j dX j (2.18)
j1

O sinal negativo que aparece na Eq. (2.4) mas não na Eq. (2.17) precisa ser explicado. O formalismo
da termodinâmica é uniforme se a pressão negativa, P, for considerada um parâmetro intensivo,
análogo a T e  1 ,  2 ,  ,  r . Em consequência disso, um dos parâmetros intensivos P j da Eq. (2.17) é
P.
Para um sistema simples de um único constituinte o diferencial da energia é usualmente escrito em
termos das quantidades molares e, por completeza, indicamos sucintamente esta forma. Em analogia
com as Eqs. (1.11)-(1.15), a equação fundamental por mol é
u  us, v (2.19)
onde
s  S/N, v  V/N (2.20)
e
us, v  1 US, V, N (2.21)
N

Tomando a variação infinitesimal da Eq. (2.19),

du  u ds  u dv (2.22)
s v

Porém,
u  u  U T (2.23)
s v s V,N S V,N

e, similarmente,
u  P (2.24)
v s

Logo,
du  Tds  Pdv (2.25)

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 3


Problemas – Seção 2.2
2.2-1 Encontre as três equações de estado para um sistema com a equação fundamental
U v0 S3 .
R2 NV

2.2-1 Para o sistema do problema 2.2-1 determine  em função de T, V e N.


2.2-3 Mostre, através de um diagrama (em escala arbitrária), a dependência da pressão com o volume para
temperatura fixa para o sistema do problema 2.2-1. Desenhe tais “isotermas”, correspondentes a dois valores da
temperatura, e indique qual isoterma corresponde à temperatura mais elevada.

2.2-4 Determine as três equações de estado para um sistema com equação fundamental
u  s2  R v2.
R v 20

2.2-5 Expresse  em função de T e P para o sistema do problema 2.2-4.


2.2-6 Determine as três equações de estado para um sistema com equação fundamental
u v0 s 2 e s/R .
R v

2.2-7 Indique esquematicamente a dependência da temperatura com o volume numa expansão adiabática
quase-estática dS  0 para o sistema do problema 2.2.-6.

2.2-8 Subsituindo as Eqs. (2.20) e (2.21) na Eq. (2.25), mostre que obtém-se a forma apropriada da Eq. (2.6).

2.3 Parâmetros Intensivos Entrópicos


Se, ao invés de considerarmos a equação fundamental na forma U  US,  , X j ,   com U como
variável dependente, tivéssemos considerado S como dependente, teríamos obtido o formalismo
anterior de maneira invertida mas equivalente. Adotando a notação X 0 para U, escrevemos
S  SX 0 , X 1 , . . . , X t  (2.26)

Tomamos uma variação infinitesimal para obter


t
dS   S dX (2.27)
k
X k
k0

As quantidades S/X k são denotados por F k ,

F k  S (2.28)
X k

Observando cuidadosamente quais as variáveis que são mantidas constantes nas diversas derivadas
parciais, e usando o cálculo das derivadas parciais, revisto no Apêndice A, podemos demonstrar que
Pk
F0  1 , Fk   , k  1, 2, 3, . . . (2.29)
T T

Estas equações também podem ser obtidas, isolando dS na Eq. (2.18) e comparando o resultado com
a Eq. (2.27).
A despeito da relação entre F k e P k , existe, em princípio, uma diferença muito importante entre elas.
De fato, os P k são obtidos pela diferenciação de uma função das variáveis S, . . . , X j,... e são
consideradas como funções dessas variáveis, enquanto que F k são obtidos pela diferenciação de uma
função de U, . . . , X j , . . . e são consideradas como funções dessas variáveis. Isto é, num caso a entropia
é membro de um conjunto de parâmetros independentes, e no segundo caso a energia faz esse papel.

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Ao fazermos manipulações formais na termodinâmica, é extremamente importante escolhermos uma
dessas formas e manter sempre essa escolha. Muita confusão vem da indecisão entre essas duas
alternativas dentro de um mesmo problema.
Se a entropia é considerada dependente e a energia, independente, ou seja S  SU, . . . , X k,... , esta
análise é referida como sendo na representação da entropia. Se a energia é dependente e a entropia
independente, ou seja U  US, . . . , X k,... , iremos nos referir à análise como sendo na representação da
energia.
O desenvolvimento formal da termodinâmica pode ser realizado ou na representação da energia, ou
na representação da entropia, mas a solução de um dado problema numa das duas representações
pode ser a mais conveniente. Em vista disso, desenvolveremos as duas representações
paralelamente, embora a discussão apresentada numa representação requeira apenas um breve
esboço na outra representação.
A relação S  SX 0 ,  , X j ,   é chamada de relação fundamental entrópica, o conjunto de variáveis
X 0 ,  , X j ,  é chamado de parâmetros extensivos entrópicos, e o conjunto de variáveis F 0 ,  , F k ,  é
dito ser um conjunto de parâmetros intensivos entrópicos. Da mesma maneira, a relação
U  US, X 1 , . . . , X k , . . .  é dito ser a relação fundamental energética, o conjunto de variáveis
S, X 1 , . . . , X k , . . . é chamado de parâmetros extensivos energéticos e o conjunto de variáveis P 1 , . . . , P j , . . .
é chamado de parâmetros intensivos energéticos.

Problemas – Seção 2.3


2.3-1 Determine as três equações de estado na representação da entropia para um sistema com a equação
fundamental
v 1/2
0  s 5/2 .
u 3/2
R v 1/2

2.3-2 Mostre, através de um diagrama (em escala arbitrária), a dependência da temperatura com o volume para
pressão fixa para o sistema do problema 2.3-1. Desenhe essas “isóbaras” correspondentes a dois valores da
pressão, e indique qual isóbara corresponde à maior pressão.

2.3-3 Determine as três equações de estado na representação da entropia para um sistema com equação
fundamental
u   s 2 e v /v 0 .
2 2

2.4 Equilíbrio Térmico – Temperatura


Agora estamos preparados para ilustrar as várias implicações interessantes do princípio de valores
extremos que postulamos para a entropia. Considere um sistema composto fechado consistindo em
dois sistemas simples separados por uma parede que é rígida e impenetrável à matéria, mas que
permite o fluxo de calor. Os volumes e os números de mols de cada um dos sistemas simples é fixo,
mas as energias U 1 e U 2 podem variar livremente, sujeitas à restrição de conservação,
U 1  U 2  constante (2.30)
imposta pela condição de sistema composto fechado. Admitindo que o sistema vá para o equilíbrio,
queremos encontrar os valores de U 1 e U 2 . Pelo nosso postulado fundamental, os valores de U 1 e
U 2 são aqueles que maximizam a entropia. Portanto, pela condição matemática usual para um

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 5


extremo, concluimos que no estado de equilíbrio uma transferência virtual infinitesimal de energia do
sistema 1 para o sistema 2 não produzirá nenhuma mudança na entropia do sistema global. Ou seja,
dS  0 (2.31)

A aditividade da entropia para os dois subsistemas nos fornece a relação


1 2
S  S 1 U 1 , V 1 , . . . , N j , . . .   S 2 U 2 , V 2 , . . . , N j , . . .  (2.32)

À medida que variamos U 1 e U 2 por transferência virtual de energia, a variação da entropia é

dS  S 1 dU 1  S 2 dU 2 (2.33)


U 1 1
V 1 ,...,N j ,... U 2 2
V 2 ,...,N j ,...

ou, empregando nossa definição de temperatura,


dS  1 dU 1  1 dU 2 (2.34)
T 1 T 2

Pela condição de conservação [Eq. (2;30)], temos


dU 2  dU 1 (2.35)
de onde se obtém

dS  1  1 dU 1 (2.36)
T 1 T 2

A condição de equilíbrio [Eq.(2.31)] requer que dS se anule para valores arbitrários de dU 1 , donde
1  1 (2.37)
T 1 T 2

Esta é a condição de equilíbrio. Se a equação fundamental de cada um dos subsistemas for


1
conhecida, então 1/T 1 seria uma função conhecida de U 1 (e também de V 1 e N k que, porém, são
meramente constantes). Da mesma forma, 1/T 2 seria uma função conhecida de U 2 e a equação
1/T 1  1/T 2 seria uma equação em U 1 e U 2 . A condição de conservação U 1  U 2  constante
fornece uma segunda equação, e essas duas equações, em princípio, determinam completamente os
valores de U 1 e U 2 . Para prosseguirmos e realmente obtermos os valores de U 1 e U 2 seria
necessário conhecermos as formas explícitas das equações fundamentais dos sistemas. Porém, na
teoria termodinâmica, aceitamos a existência das equações fundamentais, mas não adotamos suas
formas explícitas e, portanto, não obtemos respostas explícitas. Nas aplicações práticas da
termodinâmica, as equações fundamentais podem ser conhecidas, ou por observações empíricas (em
termos de medidas a serem discutidas mais adiante), ou dos cálculos da mecânica estatística
baseados em modelos simples. Desta forma, a termodinâmica aplicada é capaz de fornecer,
explicitamente, resultados numéricos.
A Eq. (2.37) pode também ser escrita como T 1  T 2 . A escrevemos na forma 1/T 1  1/T 2 para
enfatizar que nossa análise é formulada na representação da entropia. Ao escrevermos 1/T 1 ,
indicamos uma função de U 1 , V 1 , . . . , enquanto que T 1 implicaria uma função de S 1 , V 1 , . . . .
Porém, o significado físico da Eq. (2.37) mantém a igualdade das temperaturas nos dois subsistemas.
Uma segunda fase do problema é a investigação da estabilidade do estado final previsto. Na solução
dada, não exploramos completamente o postulado básico de que a entropia é um máximo no
equilíbrio, mas apenas investigamos as consequências do fato dela ser um extremo. A condição para
que seja um máximo, exige, além da condição dS  0, que

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d2S  0 (2.38)

As consequências desta condição levam às considerações de estabilidade, para as quais daremos


toda a atenção no Capítulo 8.

2.5 Correspondência com o Conceito Intuitivo de Temperatura


No exemplo anterior, vimos que se dois sistemas são separados por uma parede diatérmica, o calor
fluirá até que os dois sistemas alcancem a mesma temperatura. Esta predição está de acordo com
nossa noção intuitiva de temperatura, e é a primeira de várias observações que irá reforçar a
plausilibilidade da nossa definição formal da temperatura.
Explorando nosso exemplo com mais detalhe, vamos supor que os dois subsistemas estejam
inicialmente separados por um parede adiabática e que as temperaturas dos dois subsistemas sejam
quase, mas não completamente iguais. Em particular, vamos admitir que
T 1  T 2 (2.39)

Considera-se que o sistema esteja em equilíbrio com relação ao vínculo adiabático interno. Se agora o
vínculo adiabático interno for removido, o sistema deixa de estar em equilíbrio, e haverá fluxos de calor
através da parede, aumentando a entropia do sistema composto. Finalmente, o sistema atinge um
novo estado de equilíbrio, determinado pela condição de que os valores finais de T 1 e T 2 sejam
iguais e com o maior valor possível da entropia consistente com os demais vínculos. Vamos agora
comparar os estados inicial e final. Se S denota a diferença da entropia entre os estados final e inicial,
temos
S  0 (2.40)

Mas, como na Eq. (2.36), encontramos

S  1  1 U 1 (2.41)
T 1 T 2
onde T 1 e T 2 são os valores iniciais da temperatura. Pela condição de que T 1  T 2 , encontramos
agora que
U 1  0 (2.42)

Isto significa que o processo espontâneo que ocorreu foi um no qual o calor fluiu do subsistema 1 para
o subsistema 2. Concluimos, portanto, que o calor tem a tendência de fluir do sistema com maior valor
de T para o sistema com menor valor de T. Isto está novamente de acordo com nossa noção intuitiva
da temperatura. Devemos observar que estas conclusões não dependem de nossa hipótese de que
T 1 é aproximadamente igual a T 2 ; esta hipótese foi feita simplesmente com o propósito de se obter
a Eq. (2.41) matematicamente simples, que, não fosse isso, exigiria uma formulação em termos de
integrais.
Se avaliarmos nossa noção intuitiva de temperatura, baseada nas sensações fisiológicas de quente e
frio, perceberemos que ela se fundamenta em duas propriedades essenciais. Primeira, esperamos que
a temperatura seja um parâmetro intensivo, tendo o mesmo valor numa parte do sistema como no
sistema inteiro. Segunda, esperamos que o calor tenha a tendêndia para fluir de regiões de altas

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 7


temperaturas paras as de baixa temperaturas. Essas propriedades implicam no equilíbrio térmico
associado com a igualdade e homogeneidade da temperatura. Demonstramos que nossa definição
formal da temperatura possui essas propriedades, tal que com isso confirmamos que nossa definição
é intuitivamente satisfatória.

2.6 Unidades de Temperatura


As dimensões físicas de temperatura são aquelas da energia dividida pelas dimensões de entropia.
Mas ainda não temos uma dimensão para a entropia; de fato, suas dimensões podem ser
selecionadas de forma muito arbitrária. De fato, se a entropia for multiplicada por qualquer constante
dimensional, obteremos uma nova função de dimensão diferente, mas com as propriedades de
extremos exatamente as mesmas e, portanto, também aceitável como entropia. A única restrição que
devemos manter é que o produto da temperatura pela entropia tenha as dimensões de energia. De
uma maneira simples, podemos resolver esta arbitrariedade adotando a convenção de que a entropia
é uma grandeza adimensional; do ponto de vista mais eficaz da mecânica estatística, esta é uma
escolha fisicamente razoável. Consequentemente, as dimensões de temperatura são as mesma da
energia. Porém, da mesma forma como torque e trabalho têm as mesmas dimensões, mas são tipo de
grandezas muito diferentes, elas são medidas em unidades diferentes (cm-dyn e erg,
respectivamente), assim a temperatura e a energia devem ser cuidadosamente diferenciadas. As
dimensões de ambas, energia e temperatura, são [massa  (compimento) 2 /(tempo) 2 ]. As unidades de
energia são Joules, ergs, calorias etc. As unidades de temperatura ainda precisam ser discutidas.
Mais adiante, na discussão sobre máquinas termodinâmicas e ciclo de Carnot, vamos mostrar que a
razão entre as temperaturas de dois dados sistemas pode ser medida diretamente e sem
ambiguidades. A mensurabilidade da razão das temperaturas detemina a escala de temperatura, a
menos de uma constante multiplicativa. A temperatura de algum sistema padrão escolhido
arbitrariamente pode ser especificada livremente, e as temperaturas de todos os outros sistemas são
então determinadas univocamente, com valores diretamente proporcionais à temperatura escolhida do
sistema de referência.
Várias escolhas de um sistema de referência, e várias atribuições de valores à sua temperatura levam
a diferentes escalas de temperatura. A escala de temperatura Kelvin absoluto é obtida atribuindo-se o
número 273,16 à temperature de uma mistura de gelo puro, água e vapor d’água em equilíbrio mútuo;
um estado que mostramos mais adiante em nossas discussões sobre “pontos-triplos” para determinar
uma única temperatura. A correspondente unidade de temperatura é chamada de grau Kelvin,
designida pela notação K. A temperatura do sistema gelo-vapor d’água é 273,16 K.

A escala Fahrenheit absoluto é obtida atribuindo a temperatura de 9 273, 16  491, 688 o R ao referido
5
sistema gelo-vapor d’água. A unidade, denotada por o R, é chamada grau Fahrenheit absoluto, ou grau
Rankine. Temperaturas em Fahrenheit absoluto são simplesmente 9 vezes a correspondente
5
temperatura em Kelvin absoluto.
(...)
Embora se tenha definido a tempeatura formalmente em termos de uma derivada parcial da relação
fundamental, veremos de passagem o método convencional para introduzir o conceito de temperatura
da forma como foi desenvolvido por Kelvin e Caratheodory. Primeiro, define-se o fluxo de calor đQ de

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forma muito parecida com a que introduzimos em conexão com o princípio de conservação da energia.
Das considerações de certos processos cíclicos infere-se a existência de um fator integrante 1/T tal
que o produto deste fator integrante pela diferencial inexata đQ é uma diferencial exata dS
dS  1 đQ (2.43)
T

A temperatura e a entropia são introduzidas pela análise da existência de fatores integrantes em tipos
particulares de equações diferenciais chamadas formas Pfaffianas.

Problemas – Seção 2.6


2.6-1 Por definição, a temperatura de um sistema composto de gelo, água e vapor d’água em equilíbrio mútuo
vale exatamente igual a 273, 16 K. A temperatura de um sistema gelo-água a 1 atm de pressão é então medida e
obtém-se o valor 273, 15 K com imprecisçao na terceira e quarta casas decimais. A temperatura de um sistema
água-vapor (i.e., água em ebulição) a 1 atm é também medida e vale 373, 15 K  0, 01 K. Calcule a temperatura do
sistema água-vapor d’água com 1 atm de pressão, com seus prováveis erros, nas escalas Celsius, Fahrenheit
absoluto e Fahrenheit.

2.6-2 A “constante de gás” R é uma constante cujo o valor é R  1, 986 cal/mol K ou R  1, 986 cal/mol o C.
Expresse R em unidades de J/mol o F.

2.6-3 Dois sistemas particulares têm as seguintes equações de estado:


1  3 R N 1
T 1 2 U 1
e
1  5 R N 2
T 2 2 U 2
onde R é uma constante tendo o valor R  1, 986 cal/mol K. O número de mol do primeiro sistem é N 1  2 e do
segundo, N 2  3. Os dois sistemas são separados por uma parede diatérmica e a energia total no sistema
composto é de 6. 000 cal. Qual é a energia interna de cada sistema em equilíbrio?

2.6-4 Dois sistema com as equações de estado dadas no problema 2.6-3 são separados por uma parede
diatérmica. Os respectivos números de mols são N 1  2 e N 2  3. As temperaturas iniciais são T 1  250 K e
T 2  350 K. Quais são os valores de U 1 e U 2 depois que o equilíbrio foi estabelecido? Qual é a temperatura de
equilíbrio?

2.7 Equilíbrio Mecânico


Uma segunda aplicação do princípio de valores extremos da entropia dá resultados ainda mais
simples e portanto é útil que o procedimento se torne claro. Consideremos um sistema composto
fechado consistindo em dois sistemas simples separados por uma parede diatérmica móvel que e
impenetrável ao fluxo de matéria. Os valores dos números de mols são fixos e constantes, mas os
valores de U 1 e U 2 podem variar, sujeitos apenas à condição de fechamento
U 1  U 2  constante (2.44)
e os valores de V 1 e V 2 podem variar, sujeitos apenas à condição de fechamento
V 1  V 2  constante (2.45)
O princípio de valores extremos requer que não haja variação da entropia em processos infinitesimais
virtuais consistindo na transferência de calor através da parede e do deslocamento da parede. Então,
dS  0 (2.46)
onde

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 9


dS  S 1 dU 1  S 1 dV 1 
U 1 1
V 1 ...N k ... V 1 1
U 1 ...N k ...

 S 2 dU 2  S 2 dV 2 (2.47)


U 2 2
V 2 ...N k ... V 2 2
U 2 ...N k ...

Das condições de fechamento


dU 2  dU 1 (2.48)
e
dV 2  dV 1 (2.49)

então

dS  1  1 dU 1  P 1  P 2 dV 1 (2.50)


T 1 T 2 T 1 T 2
Como esta expressão deve se anular para valores arbitrários e independentes de dU 1 e dV 1 , temos
1  1 0 (2.51)
T 1 T 2

e
P 1  P 2  0 (2.52)
T 1 T 2

Embora essas duas equações sejam as condições de equilíbrio na forma correta, adequada à
representação da entropia, observa-se que elas implicam em condições físicas da igualdade tanto da
temperatura como da pressão:
T 1  T 2 (2.53)

P 1  P 2 (2.54)

A igualdade das temperaturas é justamente nosso resultado anterior para o equilíbrio com parede
diatérmica. A igualdade das pressões é a nova característica introduzida pelo fato de que a parede é
móvel. Obviamente, a igualdade das pressões é exatamente o resultado que esperaríamos com base
na mecânica, e este resultado reforça nossa escolha da função P como a pressão mecânica.
O leitor pode indagar por que consideramos o problema de uma parede diatérmica móvel, ao invés do
caso aparentemente mais simples de uma parede adiabática móvel. Infelizmente, este último é um
problema delicado que não tem uma solução física única. Como as dificuldades deste problema são
muito especializadas, não o consideramos aqui, mas faremos uma discussão no Apêndice C para o
leitor interessado.

Problemas – Seção 2.7


2.7-1 Dois sistemas particulares têm as seguintes equações de estado
1  3 R N 1 , P 1  R N 1
T 1 2 U 1 T 1 U 1
e
1  5 R N 2 , P 2  R N 2
T 2 2 U 2 T 2 U 2
onde R  1, 986 cal/mol K. O número de mols do primeiro sistema é N 1  0, 5 e o do segundo, N 2  0, 75. Os

Termodinâmica / Prof. Abraham Moysés Cohen 10


dois sistemas estão contindos num cilindro fechado, separados por um pistão diatérmico móvel. As temperaturas
inciais são T 1  200 K e T 2  300 K, e o volume total é de 20 litros. Qual é a energia e o volume de cada sistema
em equilíbrio? Quanto vale a pressão e a temperatura?

2.8 Equilíbrio Relacionado com o Fluxo de Matéria


Um exemplo final, empregando o princípio da entropia máxima, nos dará alguma luz sobre a natureza
do potencial químico. Consideremos o estado de equilíbrio de dois sistemas simples conectados por
uma parede rígida e diatérmica, permeável a um único tipo de matéria N 1  e impermeável a todos os
1 2
demais N 2 , N 2 , . . . , N r . Procuramos pelos valores de equilíbrio de U 1 e U 2 e de N 1 e N1 . A
variação virtual da entropia no processo virtual apropriado é
1 2
dS  1 dU 1   1 dN 1  1 dU 2   1 dN 2 (2.55)
1 1
T 1 T 1 T 2 T 2
e as condições de fechamento
dU 2  dU 1 (2.56)
e
2 1
dN 1  dN 1 (2.57)

donde se obtém
1 2
1  1 1 1 1
dS  dU 1   2 dN 1 (2.58)
T 1 T 2 T 1 T
1
Como dS deve se anular para valores arbitrários de dU 1 e dN 1 , encontra-se as equações de
equilíbrio
1  1 (2.59)
T 1 T 2
e
1 2
1 1 1 2
 2 (também  1  1 ) (2.60)
T 1 T

Então, assim como a temperatura pode ser vista como uma espécie de “potencial” para o fluxo de
calor, e a pressão pode ser vista como uma espécie de “potencial” para variações de volumes, assim o
potencial químico pode ser visto como uma espécie de “potencial” para o fluxo de matéria. A diferença
de potencial químico fornece uma “força generalizada” para o fluxo de matéria.
A direção do fluxo de matéria pode ser analisado pelo mesmo método usado na seção 2.6 para
analisar a direação do fluxo de calor. Se admitirmos que as temperaturas T 1 e T 2 são iguais, a Eq.
(2.58) torna-se
2 1
1  1 1
dS  dN 1 (2.61)
T
1 2 1
Se  1   1 , dN 1 será negativo, uma vez que dS deve ser sempre positivo. Então, a matéria tende a
fluir de regiões de altos potenciais químicos para regiões de baixos potenciais químicos.
Nos próximos capítulos, veremos que o potencial químico fornece a força generalizada não apenas
para o fluxo de matéria de um lugar para o outro, mas também para suas mudanças de fase e para

Capítulo 2: As Condições de Equilíbrio 11


reações químicas. Logo, o potencial químico tem um papel de destaque na química teórica.
As unidades de potencial eletroquímico são calorias por mol, Joule por mol ou qualquer unidade de
energia que se queira por mol.

Problemas – Seção 2.8


2.8-1 A equação fundamental de um tipo particular de sistema de dois constituintes é
S  NA  NR ln U 5/2V  N 1 R ln N 1  N 2 R ln N 2
3/2

N N N
N  N1  N2
onde R  1, 986 cal/mol K e A é uma constante desconhecida. Um cilindro rígido fechado de volume total igual a 10
litros é dividido em duas câmaras de igual volume por uma membrana rígida diatérmica, permeável ao primeiro
componente, mas impermeável ao segundo. Numa das câmaras, coloca-se uma amostra do sistema com
1 1
parâmetros originais N 1  0, 5, N 2  0, 75, V 1  5 litros e T 1  300 K. Na segunda câmara coloca-se uma
2 2
amostra com parâmetros originais N 1  1, N 2  0, 5, V 2  5 litros e T 2  250 K. Depois que o equilíbrio é
1 2
estabelecido, quais são os valores de N 1 , N 1 , T, P 1 e P 2 ?

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