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ARTIGO E
especial
Psicopedagogia, Psicopedagogo e a
construção de sua identidade
Edith Rubinstein
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Psicopedagogia, Psicopedagogo: construção de sua identidade
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noção de sujeito/indivíduo tal como compreendi- em Psicanálise; a escrita do mestrado; contato com
da no Iluminismo, pois se compreende o caráter a proposta de Feuerstein; formação na Terapia
relacional da identidade. Como afirma Melucci, Familiar de base sistêmica e construcionista
2004, p. 15:2 social; mais recentemente, participação no grupo
“O eu” não está mais solidamente fixo em de estudos em Análise Pragmática do Discurso,
uma identificação estável: joga, oscila e APD, com as terapeutas Neyde Araujo e Naira
se multiplica: Há jogo é a expressão usa- Morgado3, cuja característica principal é com-
da na linguagem mecânica para indicar preender que a linguagem não é representacional,
que a engrenagem não está rigidamen- mas pragmática no sentido de como é usada sin
te presa em seu encaixe. Diante desta gularmente.
folga o eu pode sentir medo e perder-se. Através dessas visitas territoriais fui cons-
Ou, então aprender a jogar. truindo um dialeto para meu estilo de agência
psicopedagógica. Não é possível saber quem
A partir destas considerações releio meu ca
inicia o dialeto, pois o mesmo se constrói numa
minho pessoal pela Psicopedagogia. Entro em
relação dialógica: criatura e criador entendidos
contato com a minha história de vida pessoal
como diferentes autores, disciplinas e profissio-
e profissional, as quais se entrelaçam. Tive, e
nais que contribuem para o surgimento de um
continuo tendo, oportunidades para fazer inter-
“dicionário psicopedagógico aberto”.
locuções com diferentes autores e formadores.
Também leio e releio o caminhar da Psicope
Nesta caminhada pude traduzir para o meu esti-
dagogia brasileira no artigo Rumos da Psicope
lo as contribuições teóricas que considero úteis,
dagogia Brasileira4, publicado na revista da ABPp.
continuo fazendo leituras polifônicas, escuto Nesse artigo aponta-se o surgimento da Psicope-
as múltiplas vozes que me habitam. Apesar de dagogia inicialmente através da prática clínica
traduzir para o meu dialeto/estilo, ainda percebo para atender àqueles que por diferentes razões
que continuo com mais perguntas, nem sempre não respondiam à demanda da escolarização. Mi-
respondidas, pois o “jogo na e da engrenagem” nha crença atual é que a Psicopedagogia também
está presente. Nessa polifonia não há espaço pode e deve intervir dentro dos muros da Escola.
para concepções totalmente fechadas e inques- Justifico essa posição para dar conta de uma
tionáveis. Este jogo, se por um lado angustia, modalidade de escolarização: “escola para todos
por outro me mobiliza a continuar questionando e cada um”. Dito de outra forma: o psicopedagogo
e por isso mesmo continuar aprendendo e enri- está preparado como o especialista em aprendi-
quecendo a disciplina Psicopedagogia. zagem para acompanhar a equipe pedagógica
Na minha trajetória pessoal, inicialmente a na adequação de programas, projetos, bem como
prática esteve em evidência, porém logo senti atender às questões relacionais envolvidas no
necessidade da compreensão teórica e do trabalho contexto escolar. O “professor tem a chave” na
pessoal (análise) para sustentar minha agência sala de aula, “o psicopedagogo tem a chave” para
psicopedagógica. Suponho que a ânsia por do que a instituição Escola possa lidar melhor com
minar ferramentas é uma demanda de quem a complexidade das questões envolvidas na rede
inicia uma nova profissão, cuja origem acontece composta pelos agentes envolvidos dentro e fora
em cursos de especialização latu sensu. Eu vinha dos muros da instituição.
da prática institucional na coordenação como Convivemos com divergências e questiona
orientadora pedagógica. mentos nas definições e concepções sobre nossas
Minha atual formação, ainda em andamento, práxis, mas, como disse anteriormente na ementa,
é fruto de uma semeadura originária do conjunto é preciso:
de experiências: análise pessoal; grupos de es- “a construção de um corpus linguístico
tudos; supervisões com psicanalistas; formação que, paradoxalmente, acolha os diferentes
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Psicopedagogia, Psicopedagogo: construção de sua identidade
estilos/práxis, mas que também expresse com diferentes formas discursivas com maior
um denominador linguístico comum que abertura. No texto Construcionismo social, um
contribua para a identidade da categoria convite ao diálogo, (Gergen & Gergen, 2004)
profissional.” seus autores fazem distinção entre Verdade
Sublinho a necessidade de distinguir as ins- (única e indiscutível) e verdade (versão). Esta
tâncias: área de conhecimento, isto é a disciplina distinção pode, em parte, contribuir para pensar
Psicopedagogia, do profissional Psicopedagogo a ética como mediadora.
que transita na área a partir da singularidade/ “Os cientistas geralmente argumentam
estilo/dialeto, efeito de sua identidade dinâmica. que, através de seus métodos, eles con-
Para analisar e compreender a complexidade seguem chegar cada vez mais perto do
da aprendizagem humana, faz-se necessária a mundo como realmente ele é....
utilização de múltiplas lentes, isto, é disciplinas. Nem todas as ideias construcionistas desva
Não há como negar a existência e a presença lorizam as iniciativas científicas, mas, certa-
das instâncias/categorias que nos permitem mente, desafiam a ideia de que a ciência revela
transitar com e entre diferentes disciplinas e a Verdade”. Gergen & Gergen (2004), grifo meu
áreas de conhecimento. As instâncias: multi- Estes autores construcionistas sociais refe-
disciplinaridade; interdisciplinaridade e trans- rem-se às diferentes tradições de comunidades
disciplinaridade favorecem o diálogo entre as linguísticas (diferentes abordagens), as quais
disciplinas promovendo aproximações para a vão sendo criadas a partir da construção de cren-
compreensão “mesmo que provisórias” das vi- ças e valores e de identificações com diferentes
cissitudes e complexidade do ser humano para compreensões teóricas. A ética neste contexto é
conhecer e aprender. a distinção entre Verdade e verdade. Relaciono
Embora o trânsito pelas diferentes disciplinas esta distinção com o dito popular espanhol do
seja enriquecedor e útil, corre-se o risco de des- poeta Campomar: “Nada es verdad, nada es
viar o olhar do “viajante visitante”. Dito de outras mentira, todo es, segun el color del cristal con
formas: Como dialogar respeitando as escolhas que se mira”.
pessoais, sem que as mesmas interfiram no que A Linguagem é um mediador universal, ela
chamarei de “Integridade da Psicopedagogia”. constrói mundos. Ela é constitutiva, pois somos
A Associação Brasileira de Psicopedagogia vem constituídos pela linguagem e na linguagem.
nestes mais de 35 anos de existência se preocu- Como afirma Grandesso, 2014
pando com a integridade da categoria profis-
“Como seres humanos, estamos sempre
sional num espaço institucional que acolhe as
envolvidos em gerar sentido para nossas
diferentes praxis.
vidas, e fazemos isso interpretando a nós
Urge trabalhar para evitar quebras/cortes
mesmos e ao mundo a nossa volta, dentro
dentro de nosso território profissional devido aos
de um sistema de linguagem e dos cam-
desafios impostos. Não são as diferentes escolhas
pos de sentido em que vivemos.”
teóricas, mas, o radicalismo de “Verdade” única.
Este sim interfere negativamente na integrida-
de da categoria profissional. Como enfrentá-lo? B) A linguagem e a construção da identidade
Como dialogar com a pluralidade de verdades? profissional.
Seria o diálogo sempre possível? Não há respos- Como mencionei anteriormente, a lingua-
tas prontas. Acredito que a ética pode ser uma gem constrói mundos. A construção do termo
forma de limite que viabilize diferentes práxis, PSICOPEDAGOGIA, que nomeia o campo de
ela pode ser a “medidora de conflito”. ação de uma categoria profissional, não surgiu
As ideias advindas do Construcionismo Social repentinamente. Historicamente, outras denomi-
têm me ajudado a identificar, nomear e dialogar nações foram sendo utilizadas como: Pedagogia
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Terapêutica; Reeducação; Reeducação Psico Questiono o uso dos termos híbridos neu
pedagógica, até que finalmente os psicopedago ro-aprendizagem; neuro-psicopedagogo; neu
gos admitiram e escolheram uma forma que ro-pedagogo; como expressão das escolhas
expressasse a praxis e não apenas a prática. teóricas do profissional cujo objeto de estudo é a
O grupo que fundou a Associação “gastou horas aprendizagem humana. A linguagem não é ino
a fio” na escolha dos termos Psicopedagogia e cente. Estas denominações ao privilegiar foco
Psicopedagogo que envolveu discussões fundadas nos aspectos orgânicos, mais especificamente no
nas nossas experiências pessoais, pois vínha- cérebro, deixam de lado a visão do sujeito como um
mos de formações diferentes. Mas, apesar das todo que se manifesta através da mente e de sua
diferenças, havia um querer dialogar “com” e singularidade. Se a linguagem não é inocente,
“entre” diferenças para fundar inicialmente a qual a utilidade e o sentido da inclusão do prefi-
Associação Estadual de Psicopedagogos de São xo neuro? Como conversam entre si os conceitos
Paulo e posteriormente a Associação Brasileira de mente, cérebro, sujeito, subjetividade nesta
de Psicopedagogia. Nossas conversas giravam concepção?
em torno do “Quem somos?”. Percebíamos que Uma contribuição importante dentro da valo
nossas visitas e o trânsito pelas outras áreas do rização da linguagem no contexto psicopedagó
conhecimento, como a Psicanálise; Sociologia, gico é o conceito do pragmatismo linguístico in
Psicolinguística; Neurologia; Psicomotricidade, troduzido por Wittgenstein, na década de 40, que
entre outras, eram úteis para compreender a foi sendo assimilada na Filosofia. Como apontam
complexidade envolvida no aprender. as terapeutas Araujo e Morgado3:
O enriquecimento advindo da visita a outros
“As teorias pragmáticas da linguagem
territórios demandava tradução para o idio
têm um extenso e longo percurso na his-
ma psicopedagógico no território específico da
tória da filosofia americana. Aqui segui-
Psicopedagogia. Estudar e compreender o ser
remos a tradição iniciada por Wittgenstein
aprendente a partir de diferentes áreas de conhe
e Austin e desenvolvida pelos filósofos
cimento não nos faziam declinar de nosso objeto
contemporâneos Donald Davdson e Ri-
de estudo, a aprendizagem humana. Não nos
chard Rorty. O pragmatismo linguístico
tornávamos psicanalistas, sociólogos, linguis-
afirma que a linguagem é um conjunto
tas, psicomotricistas. A Transdisciplinaridade
de habilidades naturais formadas por
serviu para enriquecimento da práxis a partir da
sons e marcas articulados com sentido,
leitura polifônica dos conteúdos das diferentes
intenção e força performativa (...) Com
disciplinas.
a linguagem somos capazes de criar ou
Passados tantos anos da fundação da Asso-
ciação Brasileira de Psicopedagogia, que surgiu inventar coisas e eventos novos e impre-
inicialmente como Associação Estadual de Psico- visíveis, inclusive de reinventar-nos.”
pedagogos de São Paulo, podemos afirmar que Como essa abordagem influi na identidade
essa disciplina, e área de trabalho, distingue-se profissional e disciplinar? Se a linguagem faz
como especializada em Aprendizagem Huma mundo pela performatividade, há que se pergun-
na em diferentes contextos. Academicamente, tar como está sendo construída essa identidade?
a formação profissional acontece em curso de Atualmente, a comunidade científica e o públi-
pós-graduação latu sensu, cuja finalidade é co de modo geral estão familiarizados com termos
formar especialistas. Dentro da categoria de es- Psicopedagogia e Psicopedagogo. A identidade
pecialização latu sensu, o desafio é dar continui- do psicopedagogo é dinâmica no sentido de que
dade à formação pois, o curso é “ pontapé inicial ela se constrói a partir do conjunto de necessi-
do jogo”, é preciso muita experiência, técnica e dades, crenças, compreensões teóricas e práti-
conhecimento para ser um “bom jogador”. cas. Esse conjunto complexo produz diferentes
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discursos que representam diferentes aborda- relações do mesmo com o seu entorno. As mu-
gens psicopedagógicas. Este é um fato incon- danças discursivas decorrem de novas formas de
testável e saudável. lidar com o aprender, como também pelo con-
Nos cursos especialização e nas supervisões, a teúdo das narrativas usadas para se descrever
maioria dos alunos em formação formula duas o modo como o aprendente se relaciona com o
perguntas recorrentes: 1) O que nos diferencia conhecimento e o saber.
de professores particulares? 2) Como lidar com Sara Paín foi quem primeiro nos apontou a
a expectativa de resultados pedagógicos ime- necessidade de escutar o discurso dos adultos
diatos? Estas perguntas me convidam a fazer significativos para a descrição das hipóteses
outra: qual a diferença entre um Psicopedagogo a respeito da origem das dificuldades. Sara
e de um Neuropsicopedagogo? Entre Educação e também nos convida a olhar o todo através das
Neuroeducação? Pedagogia e Neuropedagogia? quatro estruturas: corpo, organismo, estrutura
A que vieram essas denominações? simbólica/desejo e a cognição/inteligência. Po-
Continuando com a metáfora espacial: visi- deríamos considerar essa concepção como per-
tam-se territórios estrangeiros, mas, é necessário tinente ao corpus linguístico comum à categoria
voltar para o TERRITÓRIO DA PSICOPEDAGO- profissional? Quais seriam as consequências?
GIA. Este possui um idioma próprio, o qual se Na prática significa considerar a subjetividade
manifesta através de diferentes dialetos/estilos/ SEMPRE presente.
praxis que vão surgindo a partir das diferentes A construção de uma linguagem comum que
defina e delimite o campo profissional do psi-
comunidades linguísticas que adotam determi-
copedagogo é complexa não somente devido
nadas tradições teóricas que por sua vez são atra-
às diferentes concepções de práxis, mas, sobre
vessadas pelas contingências culturais; acasos;
tudo, devido também à ampliação do campo
paradoxos, os quais são elementos enlaçados às
profissional. Hoje, psicopedagogos estão inse-
biografias e identidades pessoais.
ridos em diferentes setores que não lhe eram
Entendo que o eixo central da Psicopedago-
familiares inicialmente, tais como empresas;
gia é a “aprendizagem humana com suas vicis-
hospitais; abrigos, entre outros. Não há como se
situdes”. Este eixo é o objeto de estudo, pesquisa
pensar numa identidade fixa e fechada, pois são
e fundamentalmente é o “órgão de sobrevivência
as novas demandas da sociedade que desen-
humana”5 e também seu destino, pois “nascemos cadeiam novas formas discursivas para o fazer
para aprender ” (Trocmé, 2006). Saber e con- psicopedagógico. A mobilidade identitária, além
siderar essas características da aprendizagem de demandar formação continuada, requer es-
faz toda a diferença na ação pedagógica e psi- pecializações construídas em ação para atender
copedagógica. Mas, paradoxalmente, aprender novas demandas.
não é fácil nem natural, consequentemente as Aceitar a existência de estilos/práxis/dialetos
vicissitudes do aprender são condições perti- diferentes que descrevem um objeto comum,
nentes6. Isso não impede admitir a existência isto é, o ser que aprende, implica na construção
e a presença de dificuldades de aprendizagem de relações que envolvem ideais desafiadores
que demandam cuidados específicos. como: acolhimento do diferente; disponibilidade
Vale retomar os termos Reeducação e Psicope- para diálogo; curiosidade para conhecer diferen-
dagogia Dinâmica. Na Reeducação o foco/lente é tes pontos de vista; olhar para o diferente sem
a prática e a exercitação para educar novamente e preconceitos. Não é suficiente a disponibilidade
resolver a questão com a mudança de comporta- intelectual, cognitiva. A subjetividade está sem-
mento. Quando a lente usada para compreensão pre presente na disponibilidade para negociar,
do conflito/problema é Psicopedagogia Dinâmica, confirmar, “calibrar o sentido” das diferenças nas
a mudança é uma consequência de deslocamen- descrições, nomeações e concepções dos termos
tos não apenas do sujeito, mas das relações e nas usados.
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clínico ainda voltado para a reeducação psico- adequada, ela é importante enquanto etapa que
pedagógica. Minha preocupação naquela época, expressa e orienta a direção da intervenção. Os
quando iniciei meu trabalho, era “o domínio de resultados apontados na avalição são provisó-
métodos e técnicas que melhor contribuíssem rios e específicos, são como uma “foto datada”.
para as mudanças específicas”. O texto em Será a partir da continuidade da intervenção que
questão era a transcrição de uma conferência serão melhor compreendidos os estilos de apren-
do Colóquio: “A Dislexia em questão”, realizado dizagem e as questões com a aprendizagem.
em 1970, em Paris, da autoria de Chassagny, O fracasso escolar e o desajuste para lidar com
da equipe médico-psicopedagógica. Ele, que o “aprender a viver” inevitavelmente causam
inovou ao cunhar a expressão “Pedagogia Re- sofrimento e desgaste para o sistema de vida
lacional da Linguagem”, afirmava: humano como um todo, pois atingem: família,
“Não temos a intenção de transformar escola, aprendente, sociedade.
a reeducação em psicoterapia analítica. Alguns setores descrevem e qualificam como
Mas não vejo problema no fato de que soluções “mágicas” as intervenções medicamen
nossa reeducação seja uma psicoterapia. tosas nas questões relacionadas à atenção
No centro de uma relação, de um encon- e inquietação corporal. Volto a sublinhar que
tro com uma criança ao redor do objeto seria insensatez desconsiderar o organismo e
linguagem, encontramos a linguagem, os benefícios das substâncias que, em algumas
a técnica do reeducador e também a situações, podem contribuir para o funciona-
relação terapêutica, porque, salvo que mento mais harmônico do ser humano. Porém, é
se esteja diante de um muro ou de um fundamental critérios para a escolha das inter-
gravador, toda relação dual de pessoa a venções que se balizam por solução “certeira e
pessoa implica numa relação afetiva”. mágica”. Onde estão as equipes multidiscipli
A preocupação com a priorização de mudanças nares disponíveis ao diálogo aberto entre as di
funcionais não seria uma retomada histórica da ferentes disciplinas com profissionais que por
Reeducação, quando o profissional que se de elas transitam? Como construir comunidades
dicava à reabilitação o fazia sob orientação do linguísticas abertas que admitam diferentes
médico? caminhos para a dissolução dos problemas de
É imprescindível considerar a presença da or- aprendizagem e suas diferentes causas?
ganicidade na aprendizagem, porém como parte A dificuldade/impossibilidade para dialogar
do todo e não isoladamente. Alguns profissio- com comunidades linguísticas muito diferentes
nais de comunidades linguísticas identificados me remete ao poder do discurso social. Na Idade
com a valorização de aspectos orgânicos e com Média, o discurso era: o destino depende do di-
as descrições dos códigos internacionais de vino. O Iluminismo inaugura outra explicação
doenças validam, qualificam e valorizam práti- para o desafio existencial: o Homem através da
cas fundadas unicamente em pesquisas científi- inteligência e do conhecimento científico tem
cas, especificamente na quantitativa. Na prática poder para controlar sua vida. O pensamento
o discurso se manifesta através de ações como: moderno, cartesiano introduz as bases para a su
diagnósticos fechados; ações cientificamente pervalorização do científico.
comprovadas e resultados previsíveis. Este ainda está presente no discurso idealista
Identificada com abordagem dinâmica na da Educação que tem como objetivo desenvolver
Psicopedagogia e do construcionismo social, en- as competências do bom professor e as compe-
tendo que o termo “diagnóstico psicopedagógi- tências do bom aluno. Estes discursos valorizam
co” expressa a visão essencialista, fechada. Há a técnica e a metodologia como dispositivos fun-
profissionais da área da Psicopedagogia que se damentais para atingir os objetivos. Mas, apesar
preocupam em “fechar diagnósticos”. Considero da ênfase na capacidade de planejamento, nem
a terminologia Avaliação Psicopedagógica mais sempre conseguem mobilizar seus alunos. Por
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outro lado, há docentes que surpreendem e naud: “ A reflexão sobre a própria prática é em si
se destacam pelos resultados alcançados com mesma um motor essencial de inovação”. Mas,
“alunos-problema”7, pois se balizam por práti- avalia Pereira: quando Perrenaud, em seus estu-
cas diferenciadas das tradicionais. Na minha dos avalia o bom professor como aquele que em
leitura, eles pertencem a uma “comunidade situações adversas: analisa o que sentiu e fez,
linguística” identificada com a visão da Psico- pensou, o faz não para julgar, mas para analisar
pedagogia dinâmica: a sua própria prática identificando aspectos re-
“Tendem a lutar contra o fracasso escolar lacionais que poderiam ser melhor conduzidos7.
de seus alunos, a praticar metodologias Estamos familiarizados com o conceito de
mais ativas e criativas e a respeitar seus clínico no sentido de debruçar-se, inclinar-se
alunos enquanto sujeitos particulares, diante do paciente. Cifali, 1991, apud Pereira7,
detentores de uma singularidade a ser ex- oferece outra conotação para o conceito de clínico
plorada em sala de aula, por trazerem ne- para a prática educacional, o qual visa trazer uma
cessidades muitas vezes contrárias àquelas parte dos conhecimentos teóricos como respostas
definidas previamente pelos planos de às situações vividas, o que obriga o professor a re-
curso e conteúdos programáticos”7. fletir sobre sua ação, compreender os fenômenos
A educação é uma profissão impossível como e a rever sua prática. Mas, é Perrenaud quem, ao
afirma Freud, porém o impossível “não é sinônimo reler Cifali, propõe:
de irrealizável, mas indica que algo não pode ser “O clínico é o que perante uma situação
integralmente alcançado”8. Isto me faz relacionar complexa, possui as regras e dispõe de
a transmissão advinda da educação como algo meios teóricos e práticos para: a) avaliar
incontrolável, marcado pela ignorância, isto é, a situação; b) pensar numa intervenção
não se sabe como cada uma no encontro pedagó- eficaz; c) pô-la em prática; d) avaliar sua
gico significa o conteúdo transmitido a partir de eficácia aparente; e) corrigir a pontaria.
suas próprias afetações. O aluno que responde Ensinar não consiste em aplicar cegamen
ao apelo de seu mestre, o faz por consideração te uma teoria nem conformar-se com um
ao mesmo, isto é, por amor ao outro. modelo. É, antes de mais nada, resolver
A aquisição do conhecimento depende estrei problemas, tomar decisões, agir em situa-
tamente da relação do aluno com o professor, ções de incerteza e, muitas vezes, de emer
ou com o psicopedagogo. Qual é o resultado de gência. Sem para tanto afundar no prag-
uma intervenção psicopedagógica que valoriza matismo absoluto e em ações pontuais”
primordialmente habilidade e funções desconsi- Termino minha reflexão a respeito do cien
derando “necessidades muitas vezes contrárias tífico e do cientificismo com a contribuição de
àquelas definidas previamente pelos planos de Perrenaud, que coloca o educador/psicopedagogo/
curso e conteúdos programáticos” ou pelos cami- terapeuta na posição de intelectual que sensivel-
nhos traçados a partir de diagnósticos fechados? mente e subjetivamente pode lidar com imprevis-
Saindo da posição positivista e idealista da tos, desequilíbrios, incertezas, como dispositivos
Educação e da Psicopedagogia, Pereira no artigo: pertinentes e presentes no ato pedagógico e no
“O relacional e seu avesso na ação do bom pro- encontro psicopedagógico.
fessor”7 apresenta reflexões de autores (Shön, Esta ação não se distancia do pensamento
Cifali, Perrenaud), que construíram alternativas científico na medida em que a teoria e prática
para analisar a ação pedagógica a partir de si- estão presentes, bem como a avaliação a poste-
tuações problemáticas nas quais se apresentam riori que permite reformulação criteriosa. O que
conflitos, instabilidades, incertezas. Estas são en muda neste modelo? É a inclusão da relação entre
tendidas como constitutivas, isto é, pertinentes. os atores. Não é um protocolo enquanto script
Isto não significa aceitação tácita das mesmas. pré-determinado que conduz a cena na qual os
Demanda reflexão como prática, afirma Perre- atores e autores contracenam.
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SUMMARY
Psychopedagogy, Psychopedagogue and the construction of its identity
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