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RITA DE CÁSSIA SOARES DA SILVA

8049271

Licenciatura em Pedagogia

EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DA ESCOLA


NA EDUCAÇÃO E NA SOCIALIZAÇÃO DE IRMÃO GÊMEOS

Rita de Cássia Soares da Silva - 8049271

Orientadora: Prof.ª Vera Lucia de Faveri F. e Silva

SÃO PAULO

2018

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EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DA ESCOLA
NA EDUCAÇÃO E NA SOCIALIZAÇÃO DE IRMÃO GÊMEOS
RESUMO

Fundamentado na pesquisa de revisão bibliográfica, este artigo tem como objetivo contribuir
para a reflexão e análise das relações fraternas, considerando irmãos gêmeos no contexto da
educação infantil. O papel da escola e as relações sociais que lá ocorrem, são de extrema
importância na formação do indivíduo. Nesta perspectiva, buscamos com esse trabalho
permear o universo da educação infantil na dimensão dos irmãos gêmeos, abordando algumas
características deste grupo, assim como os desafios encontrados no contexto da
competitividade, da comparação e do estereótipo. Como resultado, nos depararmos com
elementos deste universo, que nos possibilitaram uma reflexão sobre o papel do educador,
considerando alguns aspectos da formação da identidade e de como as relações interpessoais
são importantes no sentido de colaborarem ou não para um desenvolvimento pleno e seguro
destes irmãos.

Palavras-chave: educação infantil, irmãos gêmeos, socialização,

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INTRODUÇÃO

Estudar educação infantil, é refletir sobre um dos momentos mais importantes na


formação do indivíduo como cidadão. De acordo com a Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de
1996. Art. 29:

“A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como


finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação
da família e da comunidade” (Lei 9394/ 96, artigo 29). P.49

O presente artigo, tem como objetivo principal proporcionar uma análise reflexiva
para as relações fraternas, considerando irmãos gêmeos no contexto da educação infantil.

Muitas inquietações a respeito de como devemos conduzir a educação de irmãos


gêmeos permearam este trabalho, entre elas: Qual é a melhor forma de conduzirmos a
educação fraterna nos primeiros anos de vida? Devemos ou não separar irmão de gêmeos de
sala? Como deve ser abordado o tema socialização entre irmãos? Irmãos gêmeos se
desenvolvem física e cognitivamente, da mesma forma? O que devemos conhecer para melhor
compreendermos esse universo no contexto da escola? No entanto para melhor compreensão
do tema proposto a pergunta que direciona este artigo se refere à: No papel de educadores,
como podemos contribuir para melhor desenvolvimento e socialização de irmãos gêmeos?

O papel da escola e as relações sociais que lá ocorrem, são de extrema importância na


formação do indivíduo. Em especial, quando tratamos de educação infantil todo um universo
de especificidades se descortina e encontramos inúmeras possibilidades de estudo. Poucos são
os trabalhos desenvolvidos acerca da socialização de irmãos gêmeos nesta etapa. Refletir de
forma articulada sobre os estudos teóricos neste contexto, nos conduz a compreender a
pertinência deste trabalho. Sabemos que conviver, brincar, participar, explorar, expressar e
conhecer-se, são pontos de partida que devem direcionar as práticas pedagógicas, na educação
infantil, focadas no campo das experiências, proporcionando um espaço para vivências, que
possam conduzir a criança à construção do conhecimento. Perceber as relações fraternais é,
portanto de extrema importância para o educador. Vale ressaltar também, que o interesse pelo
tema surgiu a partir das próprias experiências e angústias da autora como mãe de gêmeos.

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METODOLOGIA

Definir como direcionar um trabalho exige do pesquisador um olhar cauteloso, pois


via de regra pode-se perder o rigor científico, durante a investigação dos assuntos. Um dos
procedimentos utilizados atualmente, é conhecido como pesquisa bibliográfica, que não raro
confunde-se apenas ao limiar da revisão de literaturas ou textos. Fato que ocorre devido a não
percepção de que realizar uma revisão bibliográfica é a base, para qualquer tipo de pesquisa.
Faze- se, então obrigatório compreender que a pesquisa bibliográfica se refere a um conjunto
de procedimentos organizados que não pode ser aleatório e que tem como foco o objeto de
estudo em questão (LIMA; MIOTO, 2007)
Logo, podemos entender que a pesquisa bibliográfica, é uma ação científica, que a
partir de uma inquietação ou indagação, dá substrato à construção do processo de ensino e até
reconstrução de uma realidade, pois associa a ação e o pensamento já que “nada pode ser
intelectualmente um problema se não tiver sido, em primeiro lugar, um problema da vida
prática” (MINAYO, 2001, p. 17). Esse pressuposto no orienta ao caminho exploratório-
descritivo da pesquisa bibliográfica, que deve ser percorrido e explorado de forma clara,
sistematizada e com detalhamento das fontes a serem utilizadas, pois estas nos guiarão em
todo o processo de desenvolvimento e análise da pesquisa. (MINAYO, 2001)
Sendo assim estabelecer os procedimentos metodológicos, é uma tarefa importante e
definitiva para que o trabalho, tenha a devida credibilidade naquilo que se propôs a apresentar
A revisão bibliográfica, apresenta de acordo com Alves-Mazzotti (2002), dois
propósitos, um deles é a contextualização do problema e o outro é análise das possibilidades
para a organização do referencial teórico. O material coletado, deve ter como procedência,
fontes científicas que são livros, artigos, teses e dissertações, também podem ser utilizadas as
fontes de divulgação de ideias, neste caso revistas, sites, vídeos e etc.
Este trabalho, propõe a realização de um levantamento bibliográfico, que nos permita
refletir sobre a educação infantil no contexto de irmãos gêmeos. Para tal, recorreremos a
Zilma de Moraes Ramos de Oliveira, com objetivo de compreendermos os fundamentos da
educação infantil, em suas obras: Educação Infantil: fundamentos e métodos e também
Educação Infantil: muitos olhares. Buscaremos em Vygotsky e Luria & Yudovich,
embasamento teórico e compreensão do aprendizado e desenvolvimento. As bibliografias que
nos apresente o universo dos irmãos gêmeos, permitindo assim a articulação com o tema

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proposto, será baseada artigos científicos, publicados e já revisados, assim como teses e
dissertações.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Alicerçamos a reflexão sobre o tema proposto, considerando inicialmente que


fundamentos éticos, políticos e estéticos, formam a base estrutural da educação infantil e são
elementos essenciais para o direcionamento e para assegurar, não só o direito à educação, mas
também alcançar os objetivos de aprender e desenvolver, proporcionando um espaço para
vivências e relacionamentos, que possam conduzir a criança à construção do conhecimento.
(DAMASCENO, 2015).

Neste pressuposto, vale ressaltar que a infância não é uma etapa da vida composta por
passividade e nem tão pouco a criança deve ser definida com um ser frágil. Muitas pesquisas
na área da psicologia, psicolinguística e educação, apontam para a riqueza do universo e da
comunicação infantil. As crianças “são aquelas “figurinhas” curiosas e ativas, com direitos e
necessidades”. Sendo assim a escola deve buscar uma aproximação cultural, onde a
linguagem e a cognição sejam também elementos estruturais para o desenvolvimento do
indivíduo em cada fase da sua vida. (OLIVEIRA, 2011, p.45)

Zilma de Moraes Ramos de Oliveira, em seu livro Educação Infantil: fundamentos e


métodos, nos auxilia e compreender melhor os aspectos desta fase, quando nos diz que:

Na educação infantil, hoje, busca-se ampliar certos requisitos necessários para


adequada inserção da criança no mundo atual: sensibilidade (estética e interpessoal),
solidariedade (intelectual e comportamental) e senso crítico (autonomia, pensamento
divergente). p.50

Desafios surgem diariamente no universo da educação infantil e sob esta ótica, podemos
considerar que além das questões que abordam o indivíduo nas dimensões da vida em
sociedade dentro e fora do ambiente escolar, temos uma questão pouco explorada, mas nem
por isso menos relevante, que é a compreensão do universo dos irmãos gêmeos. Atualmente,
segundo Vieira (2011) as técnicas de reprodução assistida, contribuíram para um aumento das
gestações gemelares. Estima-se que o número de gestações múltiplas aumentou em 30% nos
últimos 20 anos, por consequência também houve um aumento no número de irmãos gêmeos
em idade escolar.

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Dias e Fonsêca (2013), ressaltam que não é recente, a curiosidade e o interesse pelos
gêmeos e nos lembra que na história da humanidade essa condição fraterna aparece nas
fábulas, na religião, na mitologia e até mesmo em obras de ficção em novelas, séries e livros.
A exemplo temos os irmãos Esaú e Jacó, figuras bíblicas que aparecem em Gênesis, Rômulo
e Remo que de acordo com a mitologia são os fundadores de Roma, Castor e Pólux, que
representam o mito do signo de gêmeos; os irmãos Corso da obra de Alexandre Dumas,
Cosme e Damião entre outros.

Apesar do exposto acima, Vieira e Branco (2010), nos alertam sobre os riscos de
tratarmos as concepções sobre os gêmeos de forma generalizadas e estereotipada. Partindo
desta premissa, o que nos parece uma reflexão lógica, demanda do professor um olhar
sensível e pontual, pois o processo de individualização está demarcado pela sensibilidade do
educador em perceber como se desenvolve cada um dos irmãos.

Sendo assim, para melhor compreensão sobre a questão do desenvolvimento no


contexto dos irmãos gêmeos, devemos estar atentos ao subsistema familiar, denominado,
fraterno ou fratia, que é onde os irmãos estão inseridos e se constitui em uma das mais
duradouras relações, considerada a mais importante do ciclo vital. Seu início ocorre no
momento do nascimento e no caso dos gêmeos, essa relação torna-se um vínculo ainda mais
evidente. (SILVEIRA, 2002)

No entanto Oliveira (2009), apoiada nos estudos de Vygotsky, nos apresenta um olhar
relevante onde, reforça a ideia de que o homem se desenvolve a partir da sua interação com as
pessoas, no meio social e ainda apresenta um olhar para essa questão, pois ela defende a,

[...] aquisição de conhecimentos como um processo construído pelo indivíduo durante


toda a sua vida, não estando pronto ao nascer, nem sendo adquirido passivamente
graças as pressões do meio. Segundo ela, o desenvolvimento se constrói na e pela
interação da criança com outras pessoas de seu meio ambiente, particularmente com
aquelas mais envolvidas afetiva e efetivamente em seu cuidado. (2009, P.30)

Isto posto, podemos discutir que apesar dos vínculos fraternos, o ambiente da escola é
considerado um ótimo local para proporcionar interação dos irmãos para além do subsistema,
pois nele encontramos os elementos necessários para o desenvolvimento de forma integral,
que proporciona a convivência entre as crianças da mesma faixa etária. (OLIVEIRA, 2012).

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Adriana Oliveira e Maria Cerveny (2010), no texto “O vínculo entre irmãos”,
reforçam a percepção que a separação dos gêmeos, não é garantia para um melhor
desempenho e nem tampouco ao fracasso ou dificuldades no desenvolvimento. Elas afirmam
que a relações entre irmãos não podem ser associadas de forma exclusiva a ambientes
compartilhados ou não. O fato de irmãos estarem ou não na mesma sala de aula, não
representaria de acordo com as autoras, um problema já que ambientes escolares em sua
maioria podem não ser totalmente desligados.

Alguns estudos afirmam que manter irmãos gêmeos na mesma sala de aula, se justifica
pelo fato de que haverá maior equilíbrio emocional. Em caso de separação a relação fraterna
dos gêmeos os conduziria a um estresse e de certa forma até uma angústia que poderia
impactar negativamente no desenvolvimento de ambos. (WEBBINK; HAY; VISSCHER,
2007, apud RODRIGUES, 2014). David et al. (2007), em suas pesquisas constataram que
irmãos gêmeos que ficam juntos na pré-escola, apresentam maiores chances sucesso
acadêmico, do que os que foram separados de forma impositiva.

O neuropsicólogo de origem russa, Alexander Romanovich Luria foi, sem dúvida, um


dos principais pesquisadores dos processos psíquicos do século XX. Seus trabalhos são
estudados e revisitados, até os dias de hoje. Juntamente com Yudovich, (1987) publicou um
pequeno livro, onde apresenta a sua pesquisa acerca de linguagem e desenvolvimento
intelectual, realizada com gêmeos univitelinos. Os gêmeos aos cinco anos de idade,
apresentavam problemas de atraso no desenvolvimento oral e toda a convivência dos mesmos
se reduzia a interação entre os irmãos e ao núcleo familiar. Sendo assim, durante três meses
esses irmãos foram separados e apenas um recebeu um cuidado especial, focado em
treinamento verbal.

A separação conduziu os irmãos a buscarem novas formas de comunicação e


curiosamente, ambos melhoraram o desenvolvimento linguístico. Um outro dado apresentado
é que, no irmão que passou por um processo de treinamento e (re) educação, pode-se notar
uma alteração na estrutura oral e principalmente na compreensão verbal, além de inúmeros
progressos nas operações cognitivas. Esses dados, são importantes não apenas para a
discussão sobre mantermos irmãos gêmeos separados ou não. Eles demonstram o quanto o
professor deve estar atento aos processos culturais e de linguagem na organização do
pensamento. (LURIA; YUDOVICH, 1987)

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Como podemos perceber, as opiniões se dividem, não existe um consenso para definir
qual é a melhor alternativa. Nos parece que o mais importante é observarmos o
relacionamento e as especificidades dos irmãos, considerando inclusive a relação parental,
pois conforme Vygotsky, “o aprendizado das crianças começa muito antes de elas
frequentarem a escola. Qualquer situação de aprendizado com a qual a criança se defronta
na escola tem sempre uma história prévia”. (VYGOTSKY, 2007, p. 94). Isto é pais e
professores, podem certamente chegar a um denominador comum, respeitando o espaço e as
necessidades de cada um, sempre considerando que a criança é também um sujeito histórico.
(OLIVEIRA; CERVENY, 2010).

Neste ponto o presente trabalho, vai buscar em Vygotsky (2006), elementos que de
forma articulada, podem contribuir na compreensão o universo dos irmãos gêmeos. Pois
Vygotsky, se apropria da ideia de que não existe um conhecimento já pronto, eles estão em
constantes processos de mudança, já que o tempo todo os indivíduos recebem novas
informações. Essas informações auxiliam na reorganização dos significados, permitindo uma
melhor percepção do mundo e até uma mudança na visão do mesmo.

Para Vygotsky, o desenvolvimento e o aprendizado do homem acontecem quando


estamos em contato com o outro. No universo infantil, a criança aprende quando se relaciona
em seu ambiente uma vez que, “todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem
duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois, no nível intelectual; primeiro, entre pessoas
e, depois, no interior da criança. ” (2007, p. 57-58).

Podemos entender, portanto, que o processo de desenvolvimento e aprendizado ocorre


em primeiro lugar, na interação da criança com o outro, o que para Vygotsky se define como
função interpsicológica. Na sequência a função intrapsicológica ocorre no interior da criança.
Para que isso ocorra é necessário que se estabeleça uma interação entre as pessoas.
(VYGOTSKY, 2007).

Com base neste pressuposto, Zanella observa que:

“Essas interações que o indivíduo estabelece com as pessoas que o cercam, seja na
escola ou em outro ambiente, exercem, portanto, papel fundamental no
desenvolvimento humano, pois é a partir da internalização dos signos socialmente
construídos que as funções intrapsicológicas se constituem o que vem a ressaltar a
gênese social da consciência humana. ” (1994, p.100)

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Oliveira, ainda a partir do pensamento de Vygotsky, nos diz, que:

“Especial importância é atribuída então ao fator humano presente no ambiente. É


através da interação com outras pessoas, adultos e crianças que, desde o nascimento, o
bebê vai construindo suas características: modo de agir, pensar, sentir e sua visão do
mundo, seu conhecimento. ” (OLIVEIRA, 2009, p. 30)

Na proposta de reflexão sobre a importância do papel da escola na socialização e na


educação de irmãos gêmeos, não podemos deixar de pensar no pressuposto de Vygotsky,
quando ele nos mostra que são os desafios apresentados nas interações das crianças com
diferentes pessoas nas mais diversas realidades desde o seu nascimento que as conduz ao
desenvolvimento e não as necessidades básicas naturais. (OLIVEIRA, 2012, p.62)

Sendo assim, se pensarmos nas relações fraternais, elas por si só não poderiam
sobrepor as relações interpessoais com os sujeitos do ambiente escolar. No entanto cabe a
escola oportunizar essa interação, que vai além dos adultos, pois as experiências das crianças
umas com as outras, podem ser ricas no sentido de que proporcionam identificação e
aproximação. (OLIVEIRA, 2012) logo, por consequência geram um ambiente que favorece
para que os irmãos gêmeos, criem e desenvolvam seus próprios laços e relacionamentos,

Vygotsky (2007), ainda nos lembra que a escola é um ambiente propício para o
desenvolvimento cognitivo, pois neste espaço ocorrem mediações e relacionamentos que vão
mobilizar processos externos e internos que juntos desencadearão a aprendizagem e o
desenvolvimento do intelecto.

O tema socialização, nos conduz quase que de forma imediata a pensarmos sobre a
construção identitária, uma vez que a mesma não se encontra alheia aos diversos contextos
que acompanham o percurso das crianças neste ambiente. Podemos de certa forma
compreender que a experiência vivida na escola, na dimensão de seus pares, professores e
comunidade escolar, participa ativamente da formação da identidade do sujeito. São essas
experiências individuais ou em conjunto, que combinadas estruturam o processo de formação
de identidade no contexto do universo escolar. (DUBET; MARTUCELLI, 1996, p. 62, apud
LIMA, 2014)

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Se durante a vida escolar as crianças vão construindo as bases da sua identidade a
partir da socialização, cabe um olhar para refletirmos sobre a questão dos gêmeos neste
processo. Vieira e Branco (2010), em seu trabalho “Cultura, crenças e práticas de
socialização de gêmeos monozigóticos”, nos leva a crer que sim, pois segundo as autoras, os
grupos de socialização, tanto na escola como no ambiente doméstico, acabam de forma
imperativa influenciando na construção da identidade dos gêmeos. São as crenças dos pais,
seus valores e a forma como percebem e reagem ao comportamento dos filhos, também as
atitudes e expectativas dos professores em relação as ações que acabam por via de regra
participando na construção do próprio indivíduos, no caso na construção da identidade dos
irmãos, tanto individualmente como mutuamente.

Harris (2007, apud Vieira e Branco, 2010), ainda ressalta que as experiências dos
irmãos, que por consequência apoiam e auxiliam na construção das identidades, são
estruturadas por meio das expectativas que os grupos sociais, “professores, colegas de sala,
(…) e outras crianças com quem convivem” (Vieira e Branco, 2010a:584).

Um exemplo do exposto acima, é como as pessoas de modo geral possuem uma visão
de que a gemelaridade obrigatoriamente é um fator de aproximação entre esses irmãos. Não se
pretende discutir aqui as questões genéticas e biológicas intrinsicamente associadas aos
gêmeos, no entanto vale refletir sobre a ótica de autores como Stewart (2003) que apresenta e
defende que a gemelaridade pode ser definida como um fenômeno construído socialmente.
Neste caso, o que se pensa sobre o que é “ser irmão gêmeo” tem influência nas relações
interpessoais com esses irmãos e a partir deste pressuposto deles com o mundo. (Stewart,
2003, citada por Vieira e Branco, 2010, p 582).

Por fim, devemos também em nosso caminho de reflexão, pensarmos a respeito das
características que definem as relações gemelares. Entre várias, citamos aqui a questão da
competitividade, da comparação e do estereótipo.

No que se diz respeito a competitividade, de acordo com Tourette (apud Cherro,


1992), cada irmão procura alguém com que poderá ou deverá competir. A competição, pode
estar diretamente ligada a relação parental em forma de tríade, ou seja, cada gêmeo
competindo, por exemplo pela atenção do seu pai e/ou sua mãe. Esta tríade permanece na
escola, onde cada irmão disputa com seus amigos de classe e com o próprio irmão. Neste
ponto o papel do professor é importante, pois pode reforçar este sentimento de competição ou
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ao contrário pode conduzir as angústias, a tratando-os como os dois indivíduos e não uma
unidade. Vale ressaltar que constantemente se pratica erro comum quando se pensa em
gêmeos, uma vez em muitos casos, “gêmeo” também acaba sendo entendido quase como um
sinônimo para “idêntico”. (Stewart, 2003

Segal e Russel (1992, apud Stewart, 2003), apresentam uma outra questão além da
competitividade: a comparação. Segundo os autores a comparação é um dos motivos que
levam as escolas a optarem por manter gêmeos em classes separadas. Ela existe dentro e fora
da dimensão escolar e pode ser de natureza pedagógica ou social. Neste caso cabe aos
educadores um olhar sensível, inclusive para propor uma separação de classe se for o caso.

Ainda em Stewart (2003), encontramos uma discussão sobre os estereótipos, que


normalmente envolvem questões emocionais. Uma delas é que existe um estereótipo de que
um irmão gêmeo sempre saberá e compreenderá o que o outro irmão sente. Esta
representação, pode levar os irmãos a um processo de ansiedade e confusão, mais uma vez
recorrendo no erro de tratar os irmãos como unidade e não como indivíduo.

Juntamente com a competição, comparação e estereotipagem, via de regra


encontramos os rótulos. Neste contexto, é muito comum que os gêmeos sejam rotulados como
um sendo “bonzinho” e o outro “levado”, um como “o sociável” e o outro como “o sério”, ou
apelidados como “gordo e magro”, “alto e baixo”. Esses rótulos podem trazer uma sensação
de desprestígio para o rótulo negativo, “o mau” e popularidade para o rótulo positivo, “o
bom”.

Neste cenário tão desafiador a questão da gemelaridade, pode e deve ser equaciona pelos
profissionais envolvidos, principalmente no que se diz respeito a educação infantil, já que a
construção social se dá de alguma forma, neste universo. Apesar do biológico, os gêmeos são
indivíduos que se veem constantemente, confrontados com as expectativas de terceiros, além
das próprias descobertas e necessidades. Logo é relevante minimizarmos essas expectativas
enfrentarmos esses desafios a partir da compreensão de que é necessário perceber os irmãos
gêmeos como os indivíduos, para além da dupla. (STEWART, 2003:268).

CONCLUSÃO

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A relações fraternas neste trabalho, apresentadas pelo prisma da gemelaridade, nos traz
uma oportunidade de refletirmos sobre o papel no educador neste contexto e também, como
podemos contribuir para a socialização dos irmãos no âmbito da educação infantil.

De fato, a gemelaridade como objeto de estudo, aparece em sua grande maioria nas
áreas da medicina e psicologia. No entanto, estas bases científicas, se cruzam com as ciências
das humanidades que nos apresentam o fenômeno dos irmãos gêmeos como um processo de
construção não só do indivíduo e das suas identidades, mas também, nos permitem um olhar
para o sujeito histórico, que se socializa e se desenvolve a partir do meio em que convive.

Ao nos depararmos com elementos deste universo, foi possível conduzir uma reflexão
sobre alguns aspectos da formação da identidade e de como as relações interpessoais são
importantes no sentido de colaborarem ou não para um desenvolvimento pleno e seguro
destes irmãos. Esta reflexão permanece quando abordamos algumas características deste
grupo, como a competitividade, a comparação e o estereótipo, uma vez que essas
características somadas ao ambiente se traduzem no comportamento e ações, que envolvem
não só os irmãos, mas também professores, amigos e comunidade escolar. Isto, nos
possibilitou uma discussão sobre a vantagem ou a desvantagem de mantermos ou não irmãos
gêmeos na mesma sala de aula, ou não, além de nos auxiliar a pensarmos nos irmãos gêmeos
como indivíduos e não como uma unidade. Embora a genética e os aspectos biológicos
estejam presentes, devemos estar alertas ao papel docente neste processo.

São muitas as possibilidades e desafios que se apresentaram durante o percurso da


leitura e do desenvolvimento deste trabalho. Isto porque foi necessário um determinado
esforço para escolha das bibliografias que na sua maioria não são de pesquisadores
brasileiros. No entanto, foi possível identificar alguns trabalhos nacionais e com base nestes
autores, pude encontrar um apoio para articulação do tema. Acredito que o trabalho proposto,
pode contribuir de forma singela para a construção conhecimento ainda emergente sobre as
relações fraternas gemelares, possibilitando abertura para novas pesquisas.

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