Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
Depois do Espaço t, surge a Quase Galeria
Espaço t, espaço de integração pela arte, numa perspectiva de inclusão total, sem
tabus, estereótipos, preconceitos e tudo aquilo que segrega o valor humano.
Valorizamos apenas a aceitação incondicional do outro.
Numa perspectiva transversal da sociedade, dos ricos dos pobres, dos coxos aos
esteticamente intitulados de belos, todos cabem no conceito.
Num mundo cada vez mais desumanizado, solitário, onde todos são ―colocados em
gavetas‖, verificamos que o homem apenas representa o papel que lhe é dado, e
quase nunca mostra o seu verdadeiro interior.
Com o Espaço t, aqueles que por ele passam ou passaram, crescem e entendem
que o verdadeiro homem não é o do ―gaveta‖ mas o do seu interior e entenderam
também o que há na sua verdadeira essência, quer ela seja arte bruta, naife ou
apenas arte de comunicar, é por si só a linguagem das emoções, a linguagem da
afirmação do maior valor humano.
O pensar e o libertar esse pensamento crítico sobre uma forma estética. Esse
produto produz uma interacção entre o produtor do objecto artístico e o observador
desse mesmo objecto; promovendo assim sinergias de identidade e afirmação
melhorando dessa forma a auto estima e o auto conceito daqueles que interagem
neste binómio e se multiplica de uma forma exponencial.
Este é o Espaço t,
E apesar de sempre termos vivido sem a preocupação de um espaço físico, pois
sempre tivemos uma perspectiva dinâmica, e de elemento produtor de ruído social
positivo, ruído esse que queremos que possa emergir para além das paredes de um
espaço físico.
Apesar de não priorizarmos esse mesmo espaço físico, pois ele é limitador e
castrador foi para esta associação importante conseguirmos um espaço adaptado às
necessidades reais e que fosse propriedade desta associação que um dia foi uma
utopia.
Com a ajuda do Estado, mecenas, e muitos amigos do Espaço t, ele acabou por
naturalmente surgir. Com o surgir do espaço do Vilar, outros projectos surgiram
tendo uma perspectiva de complementaridade e crescimento desse espaço, que
apesar de real o queremos também liberto desse conjunto de paredes, fazendo do
espaço apenas um ponto de partida para algo que começa nesse espaço e acaba
onde a alma humana o quiser levar.
Surgiu assim a ideia de nesse lugar criarmos outro lugar, também ele figurativo
embora real, chamado Quase Galeria.
Uma galeria de arte contemporânea com um fim bem definido: apresentar arte
contemporânea Portuguesa nesse espaço, dentro de outro espaço, onde cada
exposição será uma fusão de espaços podendo mesmo emergir num só espaço.
Com este conceito pretendemos criar uma nova visão do Espaço t, como local onde
outros públicos, outros seres podem mostrar
a sua arte, desta vez não terapêutica mas sim uma arte no sentido mais real do
termo que forçosamente será também terapêutico, pois tudo o que produz bem estar
ao individuo que o cria é terapêutico.
Com o apoio das galerias: Graça Brandão, Presença, Reflexus, Modulo, 3 +1, Jorge
Shirley e com a Comissária e amiga Fátima Lambert, temos o projecto
2
construído para que ele possa nascer de um espaço e valorizar novos conceitos
estéticos contribuindo para a interacção de novos públicos no espaço com os
públicos já existentes promovendo assim, e mais uma vez a verdadeira inclusão
social, sem lamechices, mas com sentimento, estética e cruzamentos sensoriais
humanos entre todos.
Queremos que com esta Quase Galeria o Espaço t abra as portas ainda mais para a
cidade como ponto de partida para criar sinergias de conceitos, opiniões e
interacções entre humanos com o objectivo com que todos sonhamos – A
Felicidade.
Jorge Oliveira
O Presidente do Espaço t
3
Daniel Melim – Ginguba
“Em minha opinião, não há nenhum [caminho] mais atraente do que andar
no encalço das próprias ideias, tal como o caçador persegue a caça, sem
procurar manter um dado caminho.”1
1.Das imagens que integram o Museu Imaginário de Daniel Melim vejam-se, nesta
exposição, 3 telas de pequeno formato que persistem na perfectibilidade e
detalhismo que se conhece na tradição e história da pintura europeia ocidental…
Para proceder à devida análise e recepção/ apropriação estética, há que
contextualizá-las, relembrando as pinturas apresentadas anteriormente noutras
exposições e galerias. Pertencem já à memória recente da sua iconografia muito
específica e certamente singular. Tais obras evidenciam uma observação, quanto
uma contemplação da maior acuidade articuladas a uma incorporação mental que é
desenvolvida até um requinte exaustivo de celebração imaginativa.
O detalhe é um dos princípios conceptuais peculiares para realizar uma análise
histórica, crítica e estética rigorosas da Arte, em particular no tocante à sua
dimensão iconográfica e iconológica. O extraordinário livro de Daniel Arasse
intitulado Le détail, é um contributo inestimável, nesta focagem. Daniel Melim,
através das suas diferentes séries de pintura, demonstra essa exigência e pertença.
Assim se justifica uma breve alusão a peças de pintura que glosam temáticas da
história pintura e inscritas no seu Museu Imaginário (André Malraux).
1
Xavier de Meistre, Viagem à roda do meu quarto, Lisboa, & etc, 2002, p.25
2
Cesare Pavese – Trabalhar cansa, Lisboa, Ed. Cotovia, 1997, p.71
4
2. Naturezas-mortas (2008) de “vegetais/legumes”: bróculos, alho
francês, couve ou abóbora…
5
Trincha, tinta acrílica, 25x20cm, 2007
6
1.3. De autor não identificado, mas sabendo-se afecto à Escola de
Fontainebleau, Melim, isolou uma das duas figuras femininas do quadro
intitulado Portrait de Gabrielle d'Estrées et de la Duchesse de Villars,
datado de1594. Seja Gabrielle ou seja a Duquesa, a figura feminina oculta
com subtileza a nudez dos ombros, aflorando os seios; o seu olhar oscila
entre a candura e a volúpia que é, absolutamente ignorado pelo seu
companheiro de dupla folha: o símile invertido do retrato de Erasmus,
atribuído a Hans Holbein.
“Quando, de tanto me esforçar, acabava por sair para o mundo exterior, era
para encontrar na minha frente uma realidade que num instante perdera as
suas cores, uma realidade frouxa, sem qualquer rasto de frescura,
cheirando quase a podridão, mas a única que se me ajustava.” 3
3
Yukio Mishima, O templo dourado, Lisboa, Assírio & Alvim, 1985, p.8
7
metodologia de trabalho que decidiu (consulte-se o texto de sua autoria)
proporciona uma concretização que nos obriga a interrogar a provável origem
ou verdade da aparência do visto.
As transfigurações e ritualizações do homem no mundo, presentificado nas
cabeças-corpos desta série, confrontam-se com um duplo dimensionamento do
Todo: por um lado, o mundo como natureza, vida natural; por outro, a
humanidade, a vida como convergência societária. A síntese reside na sua
assunção arquetipal finalizadora. Em ambas acepções do mundo, em ambos
os mundos, a vida apresenta-se na sua unanimidade (ainda que heterogénea e
dissidente), constituída por todas as coisas e não sobejando qualquer. O
homem no mundo vê-se no espelho de toda a humanidade, em peças de
ascendência totémica que denunciam a humanidade inteira, concorrendo para
a impositividade de figurações alegóricas, metafóricas e outras.
As cabeças, aparentemente, preservam o seu anonimato, permitindo a
exploração de traços, volumetrias, efabulações morfológicas, naquilo que de
mais diferenciador e radical possuem os retratados enquanto exercendo função
simbólica e arquetipal.
Atenda-se à titulação das pinturas:
1. Careto
2. Mafarrico
3. Diabo
4.Soldado
5.Pescador
6.Mulher
7.Guarda
4
Novalis citado por Rui Chafes, Wuerzburg, Bolton, Landing, Lisboa, Assírio & Alvim – 1998, p.149
8
A percepção aproximativa, entre o pensamento de Novalis e as especulações
cosmológico-antropológicas susceptíveis de serem extrapoladas a partir da
leitura destas pinturas reflectem visibilidade criacional do homem ―cifrado‖ no
mundo. Denotam afinidades, reflectindo uma comum influência de
endereçamento cosmológico de Platão (veja-se Timeu, 2ª secção),
concretamente, quando o filósofo, antes de abordar o problema na sua ordem
social e política, se refere de forma demonstrativa ao homem na sua pertença
ao universo, sendo o próprio universo: pois o homem se apresenta como um
universo em redução, um microcosmo sujeito às mesmas leis e determinações
que as do macrocosmo.5
As peças-símbolos de Daniel Melim fruem a sua presença matérica nas
pinturas, pertencendo aquilo que constitui o chamado ―imaginário colectivo‖. 6
Quanto, pertencem também ao imaginário pessoal e singular do autor. Se
assim o entender, o autor pode gerar inúmeros elementos que venham a
povoar as suas telas em devir. Tratar-se-á de aumentar esta espécie de família
de seres imaginários, parafraseando Jorge Luís Borges. Aí, podem ascender a
um tempo mítico, circular – o tempo do eterno retorno, seguindo Octávio Paz –
por contraposição ao nosso tempo linear, o dos humanos. Mas onde, por vias
da criação nos é permitido conviver entre fronteiras de mítico e factual…
Os seres imaginários de Daniel Melim comungam com os espíritos da água, do
ar, mas sobretudo com os da terra que, desde os primórdios da humanidade,
se congregam numa visão cosmológica do Ser. A terra opõe-se
simbolicamente ao céu. É o aspecto feminino, que contém, que suporta. É
densidade, fixação e condensação; é a perfeição passiva: ―Universalmente a
terra é uma matriz que concebe as fontes, os minerais, os metais.‖ 7
As cosmogonias surgiram de uma arte combinatória entre a imaginação e a
sua irreversível tendência racionalizante. O acto da imaginação é um acto de
carácter mágico, uma espécie de encantamento em que se evocam os
"objectos" desejados, de modo a que se possam possuir, através da figura do
humano.
Estes elementos icónicos permitem-nos esboçar uma categorização, uma
espécie de gramática visual, a partir da sua definição constitutiva, tendo em
consideração a combinatória das vertentes: formal com a intencional e
simbólica, de modo a instaurar uma iconologia específica, correspondente ao
conceito de homem e de humano transmitido, progredindo para uma leitura de
foro antropológico/simbólico.
Possuem a força e vontade de poder que se associam aos fetiches. Daniel
Melim concebe uma interacção efectiva entre real e imaginário, concretizando
um "mundo" onde os valores de existência e não-existência se presentificam
em síntese dinâmica.
Concluindo:
5
Platão pretendeu com esses desenvolvimentos dar uma explicação geral para o mundo, recorrendo à
enunciação da sua Teoria das Ideias.
6
Cf. C. Jung, O Homem e seus símbolos, Botafogo, Ed.Nova Fronteira, 1987
7
Cf. Jean Chevalier e Alain Geerbrandt, Dictionnaire des Symboles, Paris, Robert Laffont, 1969, pp. 940
e ss.
9
1. as unidades icónicas das Séries, referidas inicialmente, são fragmentos
simbólicos, detalhes virtuosísticos do mundo, tanto quanto as peças-
pinturas, trazendo o humano até reduções de consistência, articuladas
entre si pela perfectibilidade representativa e conceptual;
2. as peças de pintura de pequeno e concentrado formato são aforismas
que remetem para a genuinidade e lucidez de pensamento poético,
como é caso da obra de Manoel de Barros...
8
Manoel de Barros, Livro sobre o Nada, Rio de Janeiro, Ed. Record, 2001, p.67
10
Estas pinturas são feitas sobre vidro. O vidro é colocado entre quem pinta e o objecto
que, em cada ocasião, for o modelo da pintura. Como no perspectógrafo renascentista, o
observador tem de escolher cuidadosamente o seu ponto de vista e estar absolutamente
quieto durante o processo de criar a imagem, durante muitas horas. As pinturas são
feitas com tinta acrílica.
Depois de feita a imagem, é dada sobre o vidro uma última camada de tinta muito
espessa. Quando esta camada seca, a pintura é retirada inteira do vidro. Esta autónoma
placa de tinta é o que se expõe, colando-se com fita-cola dupla à parede da exposição, à
maneira de um poster.
Daniel Melim
11
DANIEL MELIM
Ginguba
Num primeiro momento, o autor apresenta reproduções do primeiro livro de pintura que
viu em criança: "A Pintura nos Grandes Museus". O livro é apresentado enquanto objecto,
aberto, e o que se vê do seu conteúdo são apenas as reproduções das pinturas, não o
texto. Escolheram-se planos do livro que reproduzissem retratos individuais. Neste caso,
o vidro é sobreposto directamente ao livro aberto, e o processo de pintura é como que um
scan selectivo efectuado sobre este.
O segundo núcleo é constituído por pinturas feitas a partir de esculturas. As peças foram
feitas maioritariamente em barro, sendo destruídas logo após a realização da pintura.
Cada peça apresenta a cabeça de uma figura. As pinturas são executadas no mesmo
local onde o barro para as peças é retirado da terra: no Alentejo. Neste segundo núcleo, o
vidro é colocado como no perspectógrafo renascentista (entre o pintor e o modelo-
escultura), tendo o pintor que ficar exactamente no mesmo local durante várias horas e
trabalhar sempre com um olho fechado.
O avô do autor viveu no Alentejo, em África e era o dono do primeiro livro de pintura que
este viu. O avô chamava o autor de Ginguba.
Daniel Melim (Coimbra 1982) é licenciado em Artes Plásticas - Pintura pela Faculdade de
Belas Artes de Lisboa e esta é a terceira individual nesta Galeria. Tem participado em
várias exposições colectivas, tais como no Prémio EDP Jovens Artistas de 2008. As suas
obras figuram em várias exposições institucionais e privadas.
12
Careto. 2009. Tinta acrílica. 82.5 X 78.5cm
13
Mulher. 2009. Tinta acrílica. 80 x 56cm
14
Mafarrico. 2009. Tinta acrílica. 79 x 55cm
15
Pescador. 2009. Tinta acrílica. 72.5 X 74.5cm
16
Soldado. 2009. Tinta acrílica. 60 X 68cm
17
Diabo. 2009. Tinta acrílica. 69.5 X 73cm
18
Guarda. 2009. Tinta acrílica. 76.5 x 67.5cm
19
Do Primeiro Livro de Pintura que o Autor viu. 2009. Tinta acrílica.37 x 59,5cm
20
Do Primeiro Livro de Pintura que o Autor viu. 2009. Tinta acrílica.37 x 61cm
21
Do Primeiro Livro de Pintura que o Autor viu. 2009. Tinta acrílica.37 x 60cm
22
DANIEL MELIM
http://a-pintura.blogspot.com
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
PROJECTOS
2008 – Colaboração no Atlas - Projecto de Desenho, org. de André Romão, Gonçalo Sena e Nuno Luz
2007 – Residência artística na Eira33, pesquisa processos de desenho colectivo.
BIBLIOGRAFIA
Oliveira Luisa Soares de, Construir – Desconstruir, Os novos significados na arte contemporânea, in
Construir-Desconstruir, Galeria Forma d’Arte, Estoril, 2006
23
24