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Antero de Quental nasceu em Ponta Delgada no dia 18 de Abril de 1842. Ele frequentou o curso
de Direito em Coimbra de 1858 a 1864 e participou ativamente na vida cultural e política: dirigiu
o jornal O Académico e pertenceu a uma sociedade secreta designada Sociedade do Raio. Cedo,
começa a escrever sonetos, influenciado, confessa, por Alexandre Herculano. As heranças
literárias da família fidalga de São Miguel, onde nasceu, especialmente do avô, poeta, íntimo de
Bocage, também terão nele a sua influência. Do pai, combatente liberal, que em 1832 participa
nas lutas entre D.Pedro e D.Miguel, herda o espírito lutador.
Antero deve ter sido uma dessas almas sensíveis, inquietas, vibráteis, sempre distendidas numa
interrogação, sempre insatisfeitas com as respostas obtidas, almas privilegiadas que iluminam o
que tocam, embora nem sempre possam iluminara si mesmas.
Nesses versos de "Panteísmo" podemos ver condensado todo o drama de sua alma de poeta; um
"desejo aberto", uma "ânsia insofrida e misteriosa", como sinónimos de vida.
Antero viveu numa época em que a nação portuguesa atravessava a tremenda crise provocada
pelo romantismo liberal, cuja revolução vitoriosa no âmbito político-económico-religioso, viu
desfiguradas nos resultados as suas mais sinceras e legítimas reivindicações.
Assim, o mundo herdado por Antero foi o construído pelo Romantismo Liberal que tinha suas
bases na esfera sentimental da vida humana e que na sua acção combativa social já possuía as
origens daquela nova revolução que ia ser empreendida pelos realistas.
Trata-se, assim, de uma ode significativa quanto à grandeza moral de Antero, que exalta
sentimentos como o amor, a justiça, liberdade, igualdade, verdade, que devem imperar e
sobrepor-se às velhas estruturas sociais, dominadas pela injustiça, tirania, egoísmo e
antagonismos sociais, por religiões que adoravam um Deus inexistente.
O vento, por exemplo, imagem tão usada pelos poetas, assume em Antero uma forma
enigmática:
«Ouve-o rugir por essas praias, quando, Que imensa voz que prédicas estranhas!
Feito tufão, se atira idas montanhas, E como freme com terrível vida
Como um negro Titã, e vem bradando... A asa que o libra em extensões tamanhas!»
(O. M. p. 3)
Aí está o vento personalizado, humanizado, imenso poder que precedeu à criação; surgindo
como o símbolo da libertação e oscilando entre uma dimensão temporal e uma espacial.
Perdida a antiga fé no Deus eterno e omnipotente, toda a estrutura de valores morais começa a
ruir também. Extremado negativista, o poeta extravasa em poesia todo seu arroubo destruidor de
crenças antigas e da fé cristã.
E em seu altar os deuses cambaleiam; Que é dos santos, dos altos, das grandezas,
Na urze seca e a aragem ergue um momento. O que temos de eterno e sem enganos,
(O. M. p. 7)
Posto à sombra dos cedros seculares, São teus irmãos, que se erguem! São
canções...
Como um levita à sombra dos altares,
Mas de guerra... e são vozes de rebate!
Longe da luta e do fragor terreno.