Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
M A RIA MONTESSORI
FORMAÇÃO
DO HOMEM
(2.a Edição)
5
maneira tal, que seja possível aos interessados no assunto
terem conhecimento global da obra de Maria Montessori,
e possam compenetrar-se da sua realidade integral, tendo
assim, melhores condições de adoçáo do método, sem des
figurá-lo.
B9te livro deve ser lido por todos os que são educa
dores ou tenham responsabilidade de educar, e cada idéia
nele exposta deverá ser alvo de meditação profunda. É um
livro que deve ser lido e relido muitas vezes. Ele nos sur
preende sempre a cada leitura, pela sua atualidade-profun
didade. Ê daqueles livros capitulados como “livro de cabe
ceira do educador” ,
Para meditação antecipada do leitor, transcreveremos
a seguir um pequeno trecho do livro, inserido no capítulo:
“A Questão Social da Criança”.
— A história das injustiças contra a criança não está
ainda escrita oficialmente e, por isso, não é aprendida nas
disciplinas históricas das escolas, em nenhum grau. Os
próprios estudantes de história, que têm “títulos” e “espe
cializações” nessa matéria, não estão mais interessados em
falar. A história refere-se somente ao homem adulto, pois
pomente ele vive diante da consciência. Dessa forma, os
que se especializam na legislação aprendem infinidades de
leis dos tempos passados e dos tempos presentes, não se
importando de não encontrarem leis promulgadas para os
direitos das crianças.
Assim, a civilização passa por cima de uma questão
que nunca foi um problema social
No capítulo “O Estudo do Homem”, destacamos estes
dois parágrafos iniciais que de pronto despertam o inte
resse t,ara ° que há de vir a seguir:
• u c'i(•ik'i11 romcrnKsc a estudar “o homem” con
seguiria não só fornecer novas técnicas para a educação
das crioncãs © dos jovens, mas chegaria a uma compreen
são profunda de muitos fenômenos humanos e sociais, que
estão envolvidos em espantosa obscuridade” .
“A base da reforma educativa e social, necess.íria aos
í i i •i iliu-:. <!<-ve ser construída sobre o estudo científico
do hntmm desconhecido”.
K maia uma pequena citação para refletirmos orofun-
damante, transcrita no capitulo: “A Sociedade Atual”.
Hoje, h humanidade está vencida e escravizada pelo seu
rio ambienta, permanecendo fraca e indefesa.
*A t tc i' ■ ni crescendo rapidamente, tomando
uma forma diferente da do passado, das lutas entre povos
6
fortes e vencedores e povos fracos e vencidos. Mas, atual
mente, a impotência humana atinge o mais alto grau. Hoje,
não há mais segurança”.
“A própria humanidade é que foi vencida e feita
escrava. O impressionante é que a humanidade, que jaz
em uma terrível escravidão, grita, com um estribilho este-
riotipado, que é livre ou independente” .
No entanto, não só hoje, constatamos que o mara
vilhoso progresso da tecnologia está cercendo o desenvolvi
mento humano, porque ele não foi realizado tendo em
vista o homem como um ser “livre” que deseja ser feliz. O
homem está encontrando grandes dificuldades em adaptar-se,
sofre e se degrada. O progresso espiritual e social não acom
panha o progresso material. Há uma defasagem muito gran
de entre um e outro que precisa urgentemente ser corrigida.
Por que isso está acontecendo?
Será o homem vencido pela máquina?
Toma-se-á o homem escravo dele próprio?
Lendo-se, atentamente, este livro espetacular de Maria
Montessori encontraremos respostas para essas perguntas e
outras indagações que nos afligem e aprenderemos muito
sobre o que é realmente o Homem, o seu valor, o proces
samento de seu desenvolvimento e o respeito que lhe é devido
como Pessoa Humana.
Por fim, poderemos, ao terminar a leitura desta jóia,
sentir o quão atualizada ela está, e quão genial foi sua autora,
criadora do Sistema de Educação que leva o seu nome, o que
não só é perfeitamente válido ainda hoje como também é,
senão o melhor, pelo menos aquele que sabe reconhecer o
valor e o respeito que são devidos ao ser humano.
À Maria Montessori, privilegiada inteligência posta a ser
viços da humanidade, com dedicação e amor, o profundo agra
decimento de todos aqueles seus seguidores que labutam no
setor educacional e, por certo, daqueles muitos que, em breve,
estarão participando conosco da tarefa de constuir um Mundo
melhor.
E à Portugália Editora (Brasil) um agradecimento pela
possibilidade que nos dá de ter, finalmente, ao alcance de to
dos os educadores brasileiros, a obra de Maria Montessori.
7
INTRODUÇÃO
CONTRADIÇÕES
9
Ê também um método que parece egoísta, que parece
querer andar só, não se misturando com nenhum outro; to
davia, nenhum outro método aproveita continuamente a oca
sião para pregar a união e a paz mundial.
Quantas contradições! Não se vê aqui algo misterioso?
Há correntes e educadores importantes, como por exem
plo, a grande sociedade mundial Nevz Education Fellowship,
que pretenderam harmonizar o Método Montessori com ou
tros novos métodos que continuam a surgir vindos de todos os
lugares.
Em toda parte se deveria dar esse passo depisivo: apro
veitar todos os esforços daqueles que, em diversas tentati
vas, têm procurado educar a infância.
É necessário tirar o método de seu isolamento, dar con
dições para que os estudiosos o avaliem, e sobretudo trans
miti-lo da melhor maneira para os professores.
Eu sei que muitos dos que dedicaram sua ida a este
método estão encontrando problemas de cooperação.
Outra coisa estranha é que este método criado para
os “jardins de infância” esteja se infiltrando nas escolas ele
mentares, nas escolas secundárias e até nas Universidades.
Na Holanda, existem cinco Liceu Montessorianos, que
por seus resultados tão bons levaram, o governo holandês
não só a subsidiá-los, mas a torná-los independentes, como
todos os outros colégios reconhecidos. Vi em Paris um colé
gio particular montessoriano que dava aos alunos muitas
segurança, tornando-os independentes e sem temor dos exa
mes como tinham os alunos provenientes de outros colégios
franceses. Na íindia, chegou-se à conclusão de que é neces
sário criar-se a Universidade Montessori.
Mas o método tem seguido também um caminho opos
to e está sendo aplicado em crianças de menos de 3 anos.
No Ceilão, foram colocadas crianças de somente 2 anos de
idade em nossas escolas e o público pede que sejam aceitas
muitos crianças de um ano e meio. Na Inglaterra são muitos
os berçários que usam o nosso método. Berçários montes
sorianos estão sendo fundados também em Nova Iorque.
O que é então este método que parte do recém-nas-
cidjo e tende a chegar aos doutores universitários?
Não acontece assim com outros métodos. O método
Frõebel refere-se exclusivamente às crianças que estão abai
xo da idade escolar, o método Pestalozzi diz respeito somen
te às escolas elementares; os métodos de Herbart conside
ram especialmente a escola secundária. Ainda também en-
10
tip o« métodos mais modernos, podemos citar o método
Decroly, destinado às escolas elementares; o Plano Dalton,
à* escolas secundárias e assim por diante. Ê verdade que os
métodos clássicos estão sendo modificados, mas os educa
dores de uma classe não poderiam ser de outra. Nenhum
professor de escola secundária se preocupa como se educa
nos jardins de infância e, muito menos, nos berçários. Uma
classe é bem diferente da outra e os métodos que hoje se
multiplicam dizem respeito a uma ou outra destas categorias
bem distintas.
Aquele que dissesse que existem escolas secundárias de
método Frõebel, seria considerado um insensato e àquele
que quisesse levar à Universidade os métodos dos berçários,
diríamos que estava brincando.
Mas então, por que se fala seriamente em levar o mé
todo Montessori a todos os graus de educação? O que se
entende por isto? O que se pensa que seja o “Método Mon
tessori” ?
Continuamente são feitos ainda paralelos e aproxima
ções. Confrontam-se, por exemplo, os berçários ingleses
com as escolas Montessori; comparam-se os brinquedos e
o modo de tratar as crianças nas duas instituições, com o
propósito de poder harmonizá-los fazendo deles uma coisa
só. Na América, muitos paralelos foram feitos para har
monizar as escolas froebelianas e as “Casas das Crianças”.
Comparando o nosso material com o froebeliano, se conclui
que todos os dois são bons e seria conveniente usá-los em
conjunto. Existem somente alguns pontos discordantes cotro,
por exemplo, os contos de fadas, os jogos com areia, o uso
do material e outras particularidades que causam muitas dis
cussões. Também nas escolas elementares se continua a dis
cutir sobre métodos para ensinar a ler e a escrever ou para
ensinar aritmética e fala-se especialmente da nossa insistên
cia em ensinar a geometria ou outra coisa mais avançada
durante o período de instrução. Para a escola secundária,
contudo, existem opiniões diversas. Alguns pensam que nós
não levamos bastante em consideração os esportes e alguns
trabalhos, que imprimimos um estilo mais moderno ao en
sino, introduzindo mecânica e trabalhos manuais. Tudo isso
é colocado ainda mais em evidência pelo fato de que os
programas das escolas montessorianas deveriam ser neces
sariamente os mesmos das outras ecolas secundárias, pois de
outra forma os alunos não poderiam ser admitidos na Uni
versidade.
Em suma, nos encontramos em um labirinto. . .
11
O QUE Ê O M ÉTODO M ONTESSORI
O HOMEM DESCONHECIDO
12
.1 poder de locomover-se e manter-se de pé; entretanto, esse
ip <í-m-nascido realiza uma verdadeira criação psíquica. Com
u idade de dois anos, fala, anda e reconhece as coisas e,
pusaidos cinco anos, adquire o desenvolvimento psíquico su
ficiente para ser admitido na escola.
Atualmente, há um grande interesse científico no co
nhecimento da psicologia infantil nos dois primeiros anos de
idade. Por milhares e milhares de anos a humanidade dei
xou de lado a criança, permanecendo completamente insen
sível a essa espécie de milagre da natureza que é o desen
volvimento de uma inteligência, de uma personalidade. Co
mo se desenvolve? Através de quais processos e com que
leis?
Se tudo no universo se sustenta sobre leis fixas, é im
possível que justamente a mente humana se forme ao aqaso,
isto é, sem leis.
Tudo se desenvolve através de processos evolutivos com
plexos; também o homem, que aos 5 anos toma-se um ser
inteligente, deve ter tido a sua evolução construtiva.
Este campo é, pode-se dizer, ainda inexplorado. Existe
um vazio no conhecimento científico dos nossos tempos, um
campo inexplorado, uma incógnita que diz respeito ao pro
cesso de formação da personalidade.
A persistência de uma tal ignorância no grau de civili
zação em que nos encontramos deve ter raízes misteriosas.
Alguma coisa permanece sepulta no inconsciente e é
revestida de preconceitos difíceis de serem superados. Para
que comecemos a exploração científica desse imenso cam
po obscuro que é o espírito humano, é necessário superar
esses fortes obstáculos. Sabemos somente que na psique hu
mana existe um enigma ainda não desvendado pelo nosso
interesse, como sabíamos a algum tempo atrás que existia
uma imensa extensão de gelo no Pólo Sul da Terra. E eis
que hoje é feita a exploração antártica sendo encontrado um
continente sepulto, cheio de maravilhas e riquezas com lagos
quentes e muitos seres viventes, mas para se chegar até lá
foi preciso vencer obstáculos tão grandes quanto a espessura
dos gelos que o recobriam e a friagem de um clima diferente
do nosso. O mesmo se pode dizer da exploração daquele pólo
da vida humana que é a criança.
O homem em idade mais avançada (a criança, o ado
lescente, o jovem, o adulto) provém para nós do desconhe
cido e avaliamos seus vários aspectos assim como são en
contrados.
13
Nôsãos esforços para conduzir o homem nessas várias
idades sao ainda empíricos, superficiais. Avaliamos como cul-
incapazes, a aparência, os efeitos, sem nos preocu-
pfuüio« com a« causas que os produzem. Acertadadamente,
chama jardim da infância à escola das crianças
de 4 mu g fuioH de idade. Podemos chamar desta maneira a
Indas g» rseolai, especialmente as melhores, aquelas onde
sitt. «e procura o bem e a felicidade das crianças,
paia distingui-las das outras onde ainda reina uma cruel ti-
íafija: pois nas escolas que respeitam o ideal froebeliano, os
edm adotes s«i comportam como os bons jardineiros e os bons
rultÍv*dor©i das plantas.
Atrás do bom cultivador está o cientista. O cientista
iíi Ritiga os segredos da natureza e adquire através de suas
dest uIhuIhn conhecimentos profundos que podem conduzi-
i‘ > nlo só a «valiá-la, mas também a transformá-la. Os cul
tivadores modernos, que multiplicam as variedades das
fiorei e da» frutas, que beneficiam as florestas, que mu-
dgiH, pod«moi dizer, a face da terra, têm colhido seus prin-
. ipins técnicos na ciência e não em seus hábitos familiares.
Assim também, as flores maravilhosas, de fantástica beleza,
•ií n avos multicoloridos, as orquídeas soberbas, as rosas gi
gantescas, perfumadas e sem espinhos, as várias frutas ma-
tavilhnsas que têm mudado a face da terra, são o produto
do homem que estudou as plantas cientificamente. Foi a ciên
cia qu® fez surgir uma nova técnica, foi o cientista que deu
o impulso para a construção de uma verdadeira supernatu-
tmgá fantasticamente mais rica e mais bela do que aquela
qu# uós hoje chamamos de natureza selvagem.
O ESTUDO DO HOMEM
14
tajoga, uiriM luta contra elementos adversos, para as quais
•*!'> bttHlmn as armas habituais da ciência, isto é, a obser-
iftÇie e a experimentação.
E*l© estudo do homem espiritual, da psicologia, é um
movimento intelectual que está se difundindo desde os pri
meiros unos deste século. O que diz resepeito ao subconsciente
f<»i uma descoberta fecunda. Ela teve início através de estu
da adultos doentes mentais, estendendo-se depois a indi
víduos normais. Mais recentemente a psicologia infantil tam-
Min dômeçou a interessar os estudiosos.
Enquanto esses estudos concluíam que atualmente qua-
í# tõdos os homens têm algumas imperfeições, as estatísti
cas revelavam de maneira indiscutível a quantidade sempre
n ascente dos loucos e dos criminosos e o aumento do nú
mero dos menores, o que nos faz pensar nos danos que des
viam ri humanidade.
As condições sociais, produto da nossa civilização, co
locam evidentemente obstáculos no desenvolvimento nor
mal do homem. Não foram criadas ainda para o espírito
as mesmas defesas criadas para a higiene física. Enquanto
hoje são controladas e utilizadas as riquezas da terra e suas
energias, não foi levada em consideração a energia suprema
que é o intelecto do homem; enquanto são explorados os
ebismos das obscuras forças naturais, não foram iluminados
os abismos do subconsciente. O homem psíquico, abandona
do às circunstâncias externas, está se tornando um destruidor
de suas próprias construções.
Pode-se por isso conceber um movimento universal de
reconstrução, como o único caminho para ajudar o homem
it conservar o seu equilíbrio, a sua normalidade psíquica e
ci sua orientação, nas atuais circunstâncias do mundo exter
no.
Esse movimento não se restringe a nenhuma nação e
a nenhuma direção política, porque tem em mente valo
rizar simplesmente o homem, que é o que essencial mente
interessa, acima de todas as políticas e das distinções na
cionais.
É evidente que para um tal movimento não bastam
mais os conceitos das escolas antigas, onde se ensina de
forma não condizente com os nossos tempos.
A educação é um fato social e humano, um fato de
interesse universal.
15
Ela deve basear-se na psicologia, para defender a in
dividualidade, orientando-a para a compreensão da civili
zação, porque a personalidade, protegida das desordens dos
acontecimentos, torna o homem consciente da sua posição
real na história. Não é evidentemente um syllabua ou
um arbitrário aquele que informa a cultura de hoje, mas
ocorre um syllabus que dá capacidade de compreender as
condições do homem na sociedade atual, com uma visão cós
mica da história e da evolução da vida humana, pois de que
serviria hoje a cultura se não ajudasse os homens a conhe
cer o ambiente do qual devem adaptar-se?„
Enfim, os problemas da educação devem ser resolvidos
baseados em leis de ordem cósmica que vão daquela eterna
construção psíquica da vida humana, àquela mutabilidade
que conduz a sociedade nos caminhos da sua evolução.
O respeito às leis cósmicas é o respeito fundamental.
Somente através dele pode-se julgar e modificar as inúme
ras leis humanas que se referem ao momento passageiro das
construções sociais externas.
A SOCIEDADE ATU AL
16
f.-.i fliiihei»n m Jóia«, se arriscando a ser revistada e despojada
=i^ àsuã i^n» na Alfândega, como se a propriedade fosse um
f iy lf t
N,i go pode viajar com passaportes que são somente obs-
u!,,g par« o indivíduo e não mais uma proteção como era
nr» passado. Nn própria pátria é necessário andar portando
e . ai ttiiH de identidade, com retrato e impressões digitais,
f umo iiati acontecia nem para os criminosos.
Para poder comprar somente o necessário para a sobre-
Ivlncía é preciso, toda vez, apresentar um cartão, sem o
ijüil nfco se recebe nem mesmo o pão, coisa que acontecia
ãiHigaintnte só aos pobres que viviam de esmolas. Ninguém
tmn sfigurença na vida, pois pode acontecer, de uma hora
pata outra, uma guerra absurda, onde todos, jovens e velhos,
mulhéie» e crianças, estarão em perigo de morte. As habita-
tr.êi g#rã0 bombardeadas e as pessoas precisarão refugiar-se
èm subterrâneos, da mesma forma que os homens primitivos
sm iRÍugiavam em cavernas para se defender de animais fe-
fOfCI, O alimento pode desaparecer e milhões de homens mor
rerão de fome e peste.
Eis o homem estraçalhado e nu, que se move rijo e ge
lado pelas intempéries. As famílias se dividem, se destroem;
es crianças ficam abandonadas e andam em bandos como
èelvngens.
Isto não é só para as populações vencidas na guerra; é
pera todos. A própria humanidade é que foi vencida e feita
escrava.
Por que escrava? Porque, vencedores ou vencidos, os
homens são todos escravos, inseguros, amedrontados em dú
vidas, em hostilidade, obrigados a se defender com espiona
gem e patifarias, assumindo e alimentando a imoralidade co
mo forma de defesa. A fraude, o latrocínio tomam novos
aspectos e representam o modo de sobreviver onde as restri
ções chegam ao absurdo. A covardia, a prostituição, a violên
cia tornam-se formas habituais da existência. Os valores es
pirituais e intelectuais que uma vez honravam os homens,
estão perdidos. Os estudos são áridos, fatigantes, sem eleva
ção, tendo somente o objetivo de encontrar um trabalho que,
todavia, é incerto e inseguro.
O impressionante é que a humanidade, que jaz em uma
terrível escravidão, grita, como num estribilho esteriotipado,
que é livre ou independente. Este miserável povo degradado
díz que é superior. O que aconteceu com esses inflizes? Pro
curam como bem supremo isto que chamamos democracia,
47
isto é, que o povo possa dar sua opinião do modo como é go
vernado, j>o8sa votar nas eleições.
Mos o voto não é uma ironia? Escolher quem governa!
Quim governa não pode libertar nenhuma das cadeias que
ligam tudo, que impedem cada atividade, cada iniciativa e
todo poder de proteção.
O proprietário é misterioso. O tirano é onipotente como
um deus. É o ambiente que devora e tritura o homem.
Outro dia, um jovem padeiro que trabalhava numa gran
de máquina de fazer pão, prendeu uma das mãos entre as
engrenagens e estas agarraram depois todo o seu corpo e o
mastigaram. Não é por ventura isto um símbolo das condi
ções nas quais permanece esta humanidade inconsciente e ví
tima de seu destino? O ambiente é comparável àquela má
quina colossal, capaz de produzir fabulosa quantidade de ali
mento e o operário abatido representa a humanidade deses
perada e imprudente, que permanece presa e magoada por
aquilo que deveria trazer-lhe abundância. Eis um aspecto do
desequilíbrio entre o homem e o ambiente, do qual a hu
manidade deve livrar-se, fortalecendo a si própria, desenvol
vendo seus próprios valores, livrando-se de sua insensatez e
tornando-se consciente de seu próprio poder.
É necessário que o homem reúna todos os seus valores
vitais, suas energias, crescendo e preparando-se para sua liber
tação.
Não é mais tempo de combater uns aos outros, de pro
curar subjugar, deve-se ver o homem somente com o objeti
vo de elevá-lo, de despi-lo das íeis inúteis que é&tão sendo
criadas e que o empurram através do abismp da loucura.
A força inimiga está na impotência do homem a respeito
de seus próprios produtos, está na parada do desenvolvimen
to da humanidade. Bastaria, para vencê-la, que o homem rea
gisse e fizesse uma preparação diferente do ambiente que ele
mesmo criou.
18
humanidade e salvar-se. Devemos ser os enfermeiros neste
vasto hospital que é o mundo.
É necessário levar-se em conta que o problema não se
restringe à escola, como são concebidas hoje, e não diz res
peito a métodos de educação, mais ou menos práticos, mais
ou menos filosóficos.
Ou a educação contribui para um movimento de liber
tação universal, indicando o modo de defender e elevar a hu
manidade, ou torna-se-á semelhante a um órgão que se atro
fiou por não ter sido usado durante a evolução do organismo.
Existe em nossos dias, como dissemos, um movimento
científico todo novo, que se apresenta com resultados desli
gados tendentes a uníficarem-se no futuro.
Este movimento, entretanto, não se encontra propria
mente no campo da educação, mas sim no da psicologia. Tam
bém na psicologia não encontramos uma preocupação peda
gógica (conhecer o homem para educá-lo), mas sim, a preo
cupação que vem de encontro aos sofrimentos e às anorma-
liriH dos homens, principalmente dos adultos. A nova psicolo
gia por isso nasceu no campo da medicina e não no da edu-
rnçlo,
Esta psicologia da humanidade doente foi levada tam
bém às crianças agitadas e infelizes, com energias vitais re-
|H(íiiíiImh o recolhidas na anormalidade.
Daste modo, este é o movimento científico que está nas-
para colocar uma barreira aos males espalhados, aju-
ffaíidm 0« ulmos confusas e desorientadas. É este movimento
que precisa sor ligado à educação.
Creiam-me os tentativas da assim dita educação moder
na, f|u# procuram simplesmente livrar as crianças das supos-
t i i ffpliSióe», não são o melhor caminho.
Dei«ar o aluno fazer aquilo que quer, diverti-lo com le-
çgã m upaçftas. levá-lo quase a um estado de natureza selva
gem nio é o suficiente. Não se trata de “liberar” algumas
Ifls, í preeilg rtwvn&trüir e a reconstrução requer a elabora-
eI h f|@ ume "elêndfl fio espírito humano” . É um trabalho pa-
gffeliti, um Mahallio feito de pesquisas, para o qual devem
fggtHhuii ffiilhaiãs tia |>r*fiuoos que se dedicam a esse intento.
A.j.mU qn. trabalha paru essa reconstrução deve estar
iSlEfêlidy p®f Uftí ideal grandioso, bem maior do que os ideais
pdilffeMi fpiè têm promovido melhoramentos sociais, levando
Bi#? a vida material de grupos humanos opri-
^-Lí—; injustiça # na miséria.
Esse ideal é universal, é a libertação de toda a huma
nidade, sendo necessário muito trabalho paciente neste cami
nho de libertação e de valorização do homem.
Observamos no campo das outras ciências quantos tra
balham fechados em seus laboratórios, observando as células
em microscópios e descobrindo as maravilhas da vida; quan
tos em gabinetes químicos experimentam realizações, desco
brindo os segredos da matéria; quantos trabalham para isolar
a energia cósmica* a fim de conquistá-la e utilizá-la! São estes
inúmeros trabalhadores, pacientes e sinceros, que têm impul
sionado a civilização.
Alguma coisa semelhante, como já havíamos dito, é pre
ciso, portanto, também fazer para o homem. Mas, o ideal, o
fim a que se propõe deve ser comum a todos. Ele deve al
cançar aquilo que os livros religiosos dizem a respeito do ho
mem: “Specie tua et pulchritudine tua intende, prospere pro
cede e regna”1, o que podemos parafrasear dizendo: “Com
preenda a ti mesmo e a tua beleza refletir-se-á no ambiente
rico e pleno de milagres e reina sobre ele”.
Poderão me dizer: “Sim, isto é belo e fascinante, mas
cs crianças crescem, os jovens tornam-se homens e não se po
de esperar uma elaboração científica, porque nesse ínterim a
humanidade será destruída”.
Eu responderei: “Não é necessário que o trabalho de pes
quisa seja concluído. Basta compreender a idéia e proceder
sobre as suas indicações”.
Entretanto, uma coisa atualmente já se tornou clara; a
pedagogia! não deve ser guiada, como no passado, pelas idéias
de alguns filósofos e filantropos que estavam impelidos por
sua simpatia, por sua caridade. A pedagogia deve ressurgir
ajudada pela psicologia aplicada à educção, à qual convém
dar rapidamente um nome diferente: Psicopedagogia.
Nesse campo, deverão surgir muitas descobertas. É in
dubitável que, se o homem permanece ainda desconhecido e
reprimindo, a sua liberação vital deve causar assombrosas re
velações. É sobre estas revelações que a educação deverá
continuar, assim como a medicina comum se baseia na “vis
medicatri natural” sobre forças curativas que já se encontram
na natureza e a higiene se baseia em conhecimentos de fi
siologia, isto é, nas funções naturais do corpo. Ajudar a Vida,
eis o princípio fundamental.
20
49 %
Revelações e obsfáculos . . . .
21
Examinemos um pouco esta primeira revelação. Era eví-
dentemente uma revelação de ordem psicológica e bastante
forte para chamar a atenção do mundo. Era uma espécie de
milagre.
Contudo, qual foi a reação especialmente dos cientistas
da época?
A escrita miraculosa não foi atribuída a um fato psí
quico, mas a um ‘‘método de educação”.
Escrita e natureza não se podia juntar. A escrita é a con-
seqüência, em geral, de uma paciente e ingrata preparação
na escola, é uma recordação de áridos esforços, de penas su
portadas, de castigos infligidos e de tormentos para todos que
são alfabetizados. Deveria ser um método verdadeiramente
maravilhoso aquele que tinha êxito em obter resultados tão
brilhantes em uma idade precoce. A curiosidade surgiu em
torno deste método educativo que oferecia a prova de haver
finalmente encontrado um meio para vencer rapidamente o
analfabetismo, que é encontrado nas populações, mesmo nas
mais civilizadas.
Quando apareceram alguns professores da Universida
de dos Estados Unidos da América para estudar pessoal
mente este método, o único material que eu tinha para
mostrar eram as letras do alfabeto, separadas uma das outras,
letras que tinham a forma de objetos manejáveis e móveis
e de grandes dimensões.
Alguns destes professores se ofenderam, acreditando que
eu zonbava deles, sem respeitar sua dignidade. Em outras
esferas começaram a dizer que em tudo isso não havia serie
dade, que falar em milagres era uma mistificação. Sabendo
então que em vez de livros comuns, usávamos objetos, que
poderiam ser adquiridos ou vendidos, tinham medo de
imiscuir-se em coisas de comércio. Uma espécie de amor
próprio afastava da atenção dos grandes esta manifestação
que todavia estava ligada a uma incógnita de ordem psico
lógica. E assim surge um obstáculo, uma barreira intrans
ponível entre aquela experiência iluminadora e as pessoas que
pertenciam à alta esfera cultural, aquelas que pela sua cultu» *»
superior teriam podido dècifrá-la e utilizá-la.
Vejamos uma outra forma de preconceitos.
Os pequeninos que escreviam infatigavelmente eram
uma realidade que centenas e milhares de pessoas podiam
constatar. Muitas pessoas puderam se convencer de quo as
letras do alfabeto eram simplesmente ali colocadas, isol.i.l
e nenhum professor fazia esforços para ensinar a escrs
22
As crianças, isto sim, faziam evidentemente esses progressos
por si mesmas.
I Qualquer um podia pensar então que todo segredo con
\ sistia em haver feito das letras do alfabeto objetos isolados
e móveiá. Que descoberta simples e genial! Por que —
diziam muitos com mágoa — por que eu não pensei nisso
antes? Mas, disse alguém, não é, de fato, uma descoberta.
Já na Antigüidade Quintiliano usou um alfabeto móvel deste
gênero. E assim, caso eu tivesse querido aparecer como uma
genial inventora, seria desmascarada.
Ê curioso entretanto constatar a inércia mental, assim
difusa, que se fixava somente no objeto externo, sem ver
a possibilidade de encontrar algum novo fato psicológico que
considerasse a criança. Uma verdadeira barreira mental
comum a todos, cultos e incultos.
Todavia, era simples pensar: Se a História recorda ainda
o alfabeto móvel de Quintiliano, deveria recordar ainda mais
as realizações a ele devidas.
Será que pessoas entusiasmadas, cheias de alegria, per
correram as ruas de Roma carregando letras do alfabeto
como se carregassem bandeiras? A população, através da
quele mágico contato, aprendeu a escrever por si só, sendo
«s ruas de Roma e as paredes das casas recobertas de
palavras escritas? Todos aprenderam a ler sozinhos, não só
Mi ui romanas, mas também as gregas?...
A História haveria por certo registrado esse fato impo
nente mas. ao contrário, recorda somente as letras móveis,
líítfto não são as letras que têm um influxo mágico; a magia
filo estú nas letras mas sim na psicologia da criança. Nin-
jfUém atf» agora chegou a admitir isso.
Âquelei preconceitos de não crer no extraordinário, a
¥§F§BíihM *1« mostrar-se crédulo para quem quer manter sua
dfiíiidade r superioridade cultural é comum e é um dos
que escondem o novo e inutilizam uma descoberta.
t Ijhh <!* '•coberta deve ter sempre algo novo e a coisa
ffêãp A lima porta aberta para aqueles que têm coragem de
ttm« porta que dá acesso a campos ainda inexplo-
l«fÍPS| um« |H*11M lüntéBtica, maravilhosa, que deveria atingir
a jo if ig j í i í i y i t j ,
Ôü homens de cultura superior são os que deveriam
m t Ê i m m , tornar se ob exploradores destes campos,
uma Ikmmhiu mental e emocional impedindo as
mjE já i».»iir-«iMii o gosto pelos contos de fadas da
ij sgiirto ram giauutiur uma exceção para esta regra.
Já o famoso banquete de Vangelo exprime este fato eterno,
simbolicamente: é necessário um certo grau de simplicidade
e de pobreza para entrar em novos reinos.
Uma história pitoresca que se refere a este fato é encon
trada nos milagres dos cavalos de Elbefld, os quais se expri
miam por meio de um alfabeto e faziam cálculos matemá
ticos. O público afluiu, gente comum e também cientistas.
Mas o Dr. Pfungst, aluno do laboratório de psicologia de
Berlim emitiu sua opinião: “Os experimentos com cavalos
eram causados por terem sido adestrados e não pela suposta
inteligência dos mesmos”. Dessa maneira, o interesse desa
pareceu, os cientistas que estavam interessados se afastaram
e o velho Von Osten que havia feito a descoberta sobre seus
amados cavalos, morreu humilhado. Depois dele, entretanto,
um jovem, Kroll, repetiu as mesmas experiências com os
cavalos de Von Osten e com outros cavalos cujos milagres
psíquicos eram melhores, especialmente para matemática.
Desta vez os cientistas tiveram coragem e muitos deles
aceitaram o fato, mas por não poder explicá-lo, o colocaram
no campo da psicologia. Assim fizeram Kraemer, Ziegler de
Stoccarda, o professor Beredka, do Instituto Pasteur, o
Dr. Claparède, da Universidade de Genebra, Freudenberg,
de Bruxelas, e muitos outros.
É necessário notar que se tratava de cavalos. Com rela
ção à criança existe um maior número de preconceitos
acumulados e de interesses práticos, sobretudo o interesse
de defender a criança dos esforços mentais e dos precoces
trabalhos intelectuais. As crianças são para todos, seres va
zios, às quais convém somente os jogos, o sono e os contos
fantásticos; um trabalho mental sério para tão delicadas
criaturas parece sacrilégio. Ainda mais depois das insistentes
publicações da senhora Bühler, mulher de um conhecido
psicólogo de Viena e pessoa de alto relevo na psicologia
experimental. A Sra. Bühler chegou à conclusão de que as
faculdades mentais das crianças, antes dos cinco- anos, são
absolutamente negativas para toda forma de cultura. Dessa
maneira, foi ela a mensageira, em nome da ciência, de um
abafamento em nossas experiências, sendo estas atribuídas
unicamente a um método de educação incerto e discutível.
Então começaram as críticas; foi dito primeiramente
que não era necessário sacrificar a vida mental dos peque
ninos para obter resultados inúteis porque um pouco mtiw
tarde, depois dos seis anos de idade, todos podem aprendei
24
a ler e a escrever e se sabe com quanto esforço e sacrifício.
Ê preciso afastar a primeira infância do trabalho penoso
do estudo! Cleparède, grande autoridade em pedagogia, des
creveu por conta da New Education Fellowship os males
que atingem os escolares por causa do estudo na escola!
Ê verdade, disse Claparède, que estudar é uma necessidade
da nossa civilização, mas se o estudar produz nas crianças
um mal é preciso prejudicar o menos possível! Dessa ma
neira as escolas novas procuraram eliminar e pouco a pouco
conseguiram que fossem eliminados dos programas muitos
estudos não necessários, como a geometria, a gramática,
muitas partes da matemática etc., substituindo-os pelos jogos
ao ar livre.
O mundo oficial da educação diante disso, separou-se
do nosso trabalho. Quanto aos professores que aprenderam
conosco, eram principalmente pessoas dedicadas à educação
nas creches* froebelianas, e unindo os jogos de Froebel com
o nosso material científico de desenvolvimento mental che
garam à conclusão de que todos os dois eram bons, podendo
ser usados cm conjunto desde que não fosse introduzido o
alfabeto, a escrita ou matemática nas escolas das crianças
de tenra idade.
Foram, pois, os professores das classes elementares que
tentaram a experiência com o alfabeto, não chegando a
provocar nenhum entusiasmo, nenhuma explosão. Restou
somente nas escolas comuns um modo mais livre de estudar
e de dar ocupação individual e objetiva.
O milagre foi oficialmente desmentido, não chegando a
interessar à psicologia moderna. Ficou para mim o trabalho
<1e indagar cs segredos da psicologia infantil revelados nessa
e xperiência, porque ninguém melhor do que eu podia isolar
a.jueles fatos reais da influência educativa que o pudessem
te» provocado. Era evidente para mim que alguma energia,
particular fri crianças daquela idade, se manifestava e por
tanto existia.
Me rímo que a experiência ficasse limitada somente àquele
primeiro grupo de crianças, o fato representava a descoberta
>iê pofleies que permaneciam ocultos na psique infantil.
Oalvani não pensou que fosse um milagre quando viu
movei «*# urna rã morta que estava na balaustrada de sua
jciHêlá Hfi houvesse pensado que se tratava de um milagre
dê Fêgayrrêiçiio ou de uma ilusão ótica, estaria dissipada
«qugiã t ut iosidada insistente de sua inteligência indagadora,
i s # >i iiioita se* move, então deve haver uma energia que
25
a faz mover-se, e desta forma foi descoberta a eletri
cidade.
A manifestação da eletricidade e suas aplicações esta
vam distantes daquele fenômeno revelador,
Mas se alguém quisesse literalmente repetir a experiên
cia, para prová-la, não obteria o milagre e acreditaria ter
sido uma ilusão indigna de entrar para o campo da ciência.
Revelações anteriores
26
m
*
27
evidentemente não compreendeu bem a pronúncia, compre
endeu Ditonato e colocou como terceira letra um T. O inspe
tor, devotado a seus métodos educativos, corrigiu rapida
mente repetindo mais claramente seu nome: Di Donato.
O menino não se confundiu, para ele é claro que não se
tratava de correção de erro e sim de não haver ouvido bem.
Pegou o t, e em vez de colocá-lo na repartição do alfabe-
tário, deixou-o de lado sobre sua mesa. Compôs com tran-
qüilidade o nome e quando chegou ao fim utilizou o t que
havia deixado de lado. Então, o nome estava todo impresso
em sua mente e a interrupção não trouxe nenhuma dificul
dade. Ele sabia desde o começo que precisava de um' t para
completar o nome. Foi isto que impressionou vivamente o
inspetor. O erro foi a mais eloquente prova da verdade.
Confesso que não acreditava neste fato surpreendente mas
agora estou convencido. Devo dizer: Incrível, mas verdar
deiro! Depois sem pensar em louvar a criança como havia
pensado em corrigi-la, disse-me: Congratulo-me com a se
nhora! É realmente um método notável. Ê necessário aplicá-
o nas escolas. Eis que, para um técnico de educação, podia
existir somente um método melhor ou pior. O fato psicoló
gico permanecia estranho. A barreira de preconceitos de um
educador tornava impossível a compreensão do fenômeno.
Com os métodos comuns — disse — nem mesmo uma
criança de nove anos poderia fazer o mesmo. O cumprimento
era dirigido a mim.
Todavia tratava-se de uma questão de memória. A idéia
de que pudesse existir uma forma de memória diferente
daquela das crianças maiores era inconcebível. A criança
pequena devia ter uma memória mais fraca que a das cri
anças mais velhas.
Mas o que havia na memória dos pequeninos? Eviden
temente a palavra estava esculpida em sua mente com todos
os detalhes dos sons que a compunham e numa ordem exata.
A palavra se imprimia, permanecendo inteira na mente e
nada podia cancelá-la. Aquela memória tinha uma qualidade
diferente: colocava na mente uma espécie de visão e a
criança copiava com segurança aquela visão clara e fixa.
A M NEM E
28
Quando hoje os psicólogos modernos consideraram uma
outra forma de memória no inconsciente, que pode fixar-se
também através das gerações, reproduzindo exatamente ca
racterísticas da espécie, quiseram dar-lhe um outro nome:
Mneme.
A Mneme, nas suas infinitas gradações, baseia-se nos
próprios fatos da vida e da eternidade. Após esta consta
tação, poder-se-ia reconhecer, na mente da criança de qua
tro anos, uma fase de desenvolvimento psíquico na qual a
mneme está propriamente no limear da memória consciente,
quase a confundir-se com esta, manifestando-se, todavia
como a última característica de um fenômeno que tem pro
fundas raízes.
Aquele último indício da mneme vinha de muito longe
e estava ligado às forças criadoras da linguagem. A lingua
gem materna já estava formada no inconsciente, e com pro
cedimentos diferentes dos da mente consciente. Esta é a
linguagem que se fixa na personalidade como uma caracte
rística da raça e que é diferente das línguas estrangeiras
que podem ser adquiridas com a ajuda da memória consci
ente: linguagens sempre imperfeitas, que são mantidas so
mente com exercícios contínuos.
É claro que as letras móveis representavam um objeto
relacionado aos sons fixados na mente da criança e provo
cavam a linguagem tangível no mundo externo. O interesse
demonstrado pela escrita provinha de dentro; era ainda
vibrante uma sensibilidade criativa, como aquela destinada
pela natureza para fixar a linguagem falada no homem e
era esta sensibilidade que despertava o entusiasmo pelo
alfabeto.
O alfabeto italiano tem somente vinte e um sons e com
ejp-B podem ser compostas todas as palavras, infinitas, a
ponto de não ser possível contê-las em um volumoso dicio
nário. F.ssnn vinte e uma letras eram, pois, suficientes para
tppiesentar o patrimônio de palavras que a criança havia
à iumulado durante o seu desenvolvimento; para fazer ex-
piodii, íjuatie de improviso, toda a linguagem acumulada e
sufi» iente para a criança viver com entusiasmo o seu mi-
IfiffOi
A D ISCIPLIN A
29
Recordemo-nos das questões sobre disciplina e veremos
o fenômeno estupendo apresentado por aquelas crianças
que, deixadas livres para escolher suas ocupações, para
fazer sem perturbação seus exercícios, ficavam em ordem
e silenciosas.
Eram capazes de permanecer assim todo o tempo, até
mesmo quando a professora estava ausente. A conduta co
letiva de harmonia social e a qualidade de suas caracterís
ticas, sem inveja, sem competição, levavam, em vez disso,
a ajudas recíprocas e causavam admiração. Elas eram aman
tes do silêncio e o procuravam como a um verdadeiro prazer.
A obediência desenvolvia-se em sucessivos graus de perfei
ção, levando finalmente a uma obediência feita com prazer,
dir-se-ia, com ansiedade de obedecer muito semelhante a
dos cães, quando seu dono arremessa longe um objeío para
que ele lhe traga de volta. Para obter este estranho fenô
meno a professora não contribuía ativamente, pois ele não
era conseqüência direta da educação e por isso, não havia
ensinamentos nem exortações, nem prêmios nem castigos,
tudo acontecia espontaneamente.
Portanto, este fato inusitado devia ter alguma causa,
ser produto de alguma influência. Aos que me solicitavam
explicação, eu podia somente responder: Ê a liberdade; da
mesma forma que para a explosão da escrita eu havia res
pondido: É o alfabeto móvel.
Recordo que um Ministro de Estado, sem excessiva
observação ao fato da espontaneidade, disse-me: A Senhora
resolveu um grande problema: soube reunir disciplina e
liberdade. Este não é um problema que diz respeito à admi
nistração da escola, ê um problema que diz respeito à
administração das nações.
Evidentemente, também neste caso. estava subentendi
do que eu tivesse o poder de obter tais resultados. Eu havia
resolvido um problema. Era mesmo impossível, dada a men
talidade das pessoas, conceber esta outra idéia: Na natureza
das crianças pode advir a solução de um problema insolúvel
para nós, deles vêm a fusão das coisas que para nós são
contrastantes. Seria justo dizer: Estudemos também estes
fenômenos! Trabalhemos juntos para penetrar nos segredos
da psique humana! Mas, que do interior da alma infantil,
pudéssemos tirar qualquer coisa de novo, útil para todos nós,
oualauer luz sobre fatos obscuros da conduta humana, isto
não era compreensível.
É interessante recordar as opiniões e as críticas que
30
vinham de toda parte: dos filósofos como dos pedagogos e
das pessoas comuns.
Alguns destes últimos simplesmente me julgavam uma
inconsciente: Vós não sabeis o que haveis íeito e não vos
apercebeis de haver concluído uma érande obra! Outros
diziam como se o fato fosse uma espécie de exposição fantás
tica ou um sonho que eu houvesse formado: Como pode ser
desta maneira otimista com relação à natureza humana?
Mas a grande luta, que não é mais interrompida, é derivada
dos filósofos e dos religiosos, os quais atribuíam os fatos,
que tantas centenas de pessoas haviam constatado, a opiniões
minhas. Era para alguns uma seguidora de Rousseau, con
cordando com ele em acreditar que tudo no homem é bom,
mas tudo se destrói no contato com a sociedade e, havia
colocado na escola uma espécie de romance, como Rousseau
o havia colocado em um livro.
Todavia, discutindo comigo, não se revelava nenhuma
explicação clara ou convincente; uma pessoa conhecida es
creveu num jornal muito sério: A Montessori é uma pobre
lilósofa. Padres religiosos achavam-me quase contra a fé e
muitos chegaram-se a mim para explicar o fato do pecado
Ktiglnal. Podem imaginar o que deveriam pensar os calvi-
nlsífiH, ou, em geral, os protestantes convictos, da maldade
iíiili do homem!
Ademais eram outros os princípios da filosofia relati-
ttgg è natureza da alma humana que vinham ofender tam-
Mm õ» princípios da técnica da educação escolar. Falava-se
tjn J£6U ensinamento como de um método apriorístico, o qual
! >n prêmios e castigos, propondo-se a obter a discipli-
íffp eites recursos práticos. Julgaram-no um “absurdo”
a também uma contradição quanto às experiências
}-■ »• Ifi-iS universais e ainda um sacrilégio porque é dito que
f l i y i pNMidn os bons e castiga os maus, e este é o mais real
«HitfHitÁ. tilo da moral.
■ ÜiHiVt até um grupo de mestres ingleses que fizeram um
públido declarando que, se fossem abolidos os casti-
|p| gtei ief inm demitidos de seus ofícios porque não pode-
tfiuèer ipm castigos.
t »t»| O® castigos! Não ocorreu-me que fosse uma institui-
ibí Índipengável, dominante na vida de toda a humanidade
« lifltilí Todíit ui homens crescem sob esta humilhação.
iafefi n castigo foi feita investigação da Liga das Nações,
igt Ciífiêhtt; e 0 Inst ituto J. J. Rousseau organizou uma pes-
!rtW Education Fellowship. Foi perguntado
31
aos institutos de educação e a particulares “que espécie de caa
tigos eles usavam para educar as crianças”. É curioso que, ao
■ invés de se ofenderem por uma investigação indiscreta, todos
se apressaram em dar suas informações e alguns institutos pa»
reciam orgulhosos de seu modo de castigar.
Alguns, por exemplo, disseram que era proibido o cas
tigo imediato, para que não fosse dado sob sentimentos d«
ira; mas o castigo era deligentemente dado no fim de sema
na, no sábado de repouso, quando se aplicava friamente «
dose de castigo merecida durante toda a semana. Algumas
famílias disseram: “Nós não somos violentos. Quando a cri
ança faz alguma coisa errada, a mandamos para a cama sem
jantar”. Não há dúvida que o castigo violento estava em gran
de voga: bofetões, pauladas, insultos, encerramento, terríveis
sustos imaginários. A lista conseguida pela Liga das Nações
no nospo século era a continuação da sabedoria de Salomão:
“Aquele que não usa o bastão com seu filho é um mau pai,
porque condena o filho ao inferno”.
Eu pude comprar em Londres os açoites, que se vendiam
em grande quantidade e eram usados ainda pelos mestres, se
bem que tal uso viesse do passado.
A necessidade destes “meios indispensáveis” para a edu
cação demonstra que a vida das crianças não foi e não é de
mocrática, nem a dignidade humana é respeitada.
Desde a Antigüidade está levantada uma barreira mais
no coração do que na mente do adulto: as forças interiores
da criança não são vistas pelo lado intelectual nem pelo mo
ral.
Nas minhas experiências, as revelações destas obscuras
forças interiores haviam eliminado os castigos. Mas tudo isto
surgiu tão rapidamente que, permanecia incompreensível e
provocara escândalo.
Deixe-me fazer um paralelo ilustrativo: quando se indi
ca um objeto a um cão, apontando com o indicador a dire
ção, para que vá buscá-lo, o cão olha fixamente para o indi
cador e não para o objeto indicado. Seria mais fácil que o
cão mordesse aquele dedo do que compreender e andar na
direção em que está o objeto.
A barreira dos preconceitos agia do mesmo modo, as pes
soas viam em mim aquele dedo indicador e terminavam por
mordê-lo.
Parecia impossível aceitar simplesmente os fatos eviden
tes. Deviam ser obra de qualquer pessoa que os houvesse pro
duzido ou os houvesse imaginado.
32
%
ORDEM E BONDADE
33
Até mesmo na organização social externa deverá haver
uma ordem como fundamento. As leis sociais que regem os
cidadãos, a polícia que os controla, são necessárias para obter
o enganjamento social; e mesmo os governos maus, injustos
e cruéis, que levam à guerra, que é o pior feito e o mais desu
mano, baseiam-se na disciplina e na obediência dos soldados.
A bondade de um governo e sua disciplina são coisas dife
rentes. Também na escola, sem obter a disciplina dos alunos,
a instrução não poderá progredir, contudo, podem haver for
mas de educação boas e más. Na minha experiência, a ordem
entre as crianças era proveniente da misteriosa e oculta dire
tiva interna, que só podia se manifestar através da liberdade.
Para conseguir aquela liberdade seria necessário que
ninguém interferisse para impedir a atividade espontânea das
crianças, num ambiente preparado, que satisfizesse sua ne
cessidade de desenvolvimento.
Antes de chegar a ser “bom” é necessário entrar “na or
dem das leis da natureza”. Depois deste plano é possível ele
var-se e ascender em uma “supernatureza” onde é necessária
a cooperação da consciência.
E quanto ao mau, à “maldade” , é portanto necessário
distinguir a “desordem” da decadência em planos morais in
feriores. Ser “desordenado” com respeito às leis naturais que
dirige o desenvolvimento normal das crianças não é necessa
riamente ser “mau”. De fato, os ingleses usam termos dife
rentes para a maldade das crianças e para a dos adultos: cha
mam à primeira nauéhtiness e à segunda evil ou banciness.
Agora, podemos dizer com segurança: nauéhtiness infan
til é uma “desordem” com respeito às leis naturais da vida
psíquica em via de construção, não sendo, portanto, maldade,
mas comprometendo a normalidade futura no funcionamento
psíquico do indivíduo.
SAÜDE E DEVASTAÇÃO
34
%
35
método terá como fundamento uma espécie de “higiene psíca”
que auxilia o homem a crescer com boa saúde mental.
Isto não diz respeito à teoria filosófica sobre a natureza
boa ou má dos homens e tampouco a outras idéias abstratas
sobre o que seja o “homem normal” , mas é um fato prático
que se pode tornar universal.
36
%
mais ou menos sucesso em realizar os projetos da vida, come
ça a ter interesse nas coisas externas, podendo vir a ter então
inveja pelo sucesso dos outros. A coisa então é diferente e
pode-se conceber um julgamento de “bondade’' ou de “malda
de” , isto é, de defeitos de ordem moral contra a sociedade,
que podem justificar a intervenção corretiva da educação.
EDUCAÇÃO D ILA TA D O R A
37
está superada, sendo então possível discutir os problemas da
filosofia. Mas esses se dirigem antes à grandeza transcedente:
44a obtenção de Deus” , a idéia elevada do mundo e do destino
individual. De fato, aqueles que querem lutar contra o “pe
cado original” o fazem dirigindo os homens para a grandeza
da redenção.
A AQUISIÇÃO D A CU LTU RA
38
cem livres de absorver, como de exprimir-se segundo os pro
cedimentos naturais da mente absorvente.
Dir-se-á que também o professor faz parte do ambiente
e, de fato é que a criança não pode aprender assim, como se
acredita, só peia obra de um professor que lhe explica as coi
sas mesmo que seja o melhor e mais perfeito de todos os mes
tres. A criança, ainda aprendendo, segue as leis interiores de
formação mental e há um intercâmbio direto entre o ambiente
e a criança, enquanto que o professor com suas ofertas de in
teresses e suas iniciações, constitui em primeiro lugar um tra
ço de união.
Pode-se observar melhor a aprendizagem quando as ex
periências são intensificadas e determinadas com o propósito
de conhecer intimamente estes fenômenos. Pode-se constatar
em muitas crianças colocadas em condições adequadas, uma
paixão pela matemática, pelos grandes números, pelas gran
des operações aritméticas, como também pelos cálculos de ní
vel muito superior, como o estudo das potências dos números,
a extração da raiz quadrada e cúbica e especialmente pelos
problemas de geometria.
Também é constatada a capacidade de aprender muitas
línguas simultaneamente e de estudar a gramática e o estilo,
í ilo, por exemplo, uma criança de 8 anos na índia que se in
teressou em ler poemas em língua sânscrita (língua morta) e
traduzindo as histórias védicas do industânico para o inglês,
tmbnt« sua língua materna fosse o gujarati, isto é, um dialeto
hindu. Dessa forma, sua cultura foi estendida através de línguas
vivai a mortas de países estrangeiros.
A tudo isso pode-se acrescentar ainda o interesse pelas
ititiai du natureza, a prodigiosa memória para os nomes e, es-
U atila > Uto, o prazer de aprender as classificações complica-
d#§ das plantas e dos animais: classificações que são muitas
incei 1as e embaraçosas para a memória, e que o órgão
nfit hit glíolíu do programa escolar acreditando ser um esforço
i&Âtil
() tiHmrfüin pelas “classificações” revelou-se através de
af« ifiatÊi iai móvel feito com símbolos; era evidente o prazer
dfe fifül uini ordem mental entre as imagens colocando cada
lifiliU lii tdãdfi em seu lugar. Não era por certo uni exercício
p | Sliínuriiaçif', ma» sim de construção, como o que fazia
ygta erínüçá pequena com a areia molhada. As muitas idéias
y § H ftofttii podei iam sor reunidos em fascinantes construções;
39
assim como com o material de matemática pode-se ordenar e
construir o sistema decimal, reunindo as unidades em hierar
quias sucessivas tão claras, que a aritmética se apresenta como
uma conseqüência da ordem das unidades. Assim, desta ma
neira acontece com os fatos históricos que são classificados ao
lado de datas e posição geográfica, construindo na mente um
sistema de fatos culturais no tempo e no espaço.
A natpreza criativa também assim procede. Na constru
ção da linguagem (língua materna) na criança, esta é, primi-
tivamente, construída pelos sons das palavras e pela gramáti
ca, isto é, pela ordem na qual a palavra deve estar para ex
primir o pensamento. Esta é a primeira construção fundamen
tal que se completa, pouco depois dos dois anos de idade, com
uma quantidade relativamente escassa de palavras. Depois a
linguagem se enriquece espontaneamente com novas palavras,
que encontram uma ordem já estabelecidas para atender a tudo.
O processo adotado, na nossa experiência, sobre cnança
até os nove anos de idade pode estender-se a idades mais
avançadas, podendo-se afirmar que: em todos os graus esco
lares é necessário não impedir a atividade individual, que, des-,
ta forma, obedece a um “procedimento natural de desenvol
vimento psíquico”. É verdade que o professor, à medida que
a cultura se eleva, tem um ofíciò sempre mais importante, que
consiste em “estimular o interesse” comumente compreendido
no ensino, porque as crianças, quando se interessam por um
argumento, tendem a permanecer longo tempo, a estudá-lo ou
a prová-lo até que atinjam uma espécie de “maturação” atra
vés da própria experiência.
Depois disso, tal aquisição está não só garantida, mas
tende a estender-se sempre mais largamente. Agora, o pobre
professor se encontra obrigado a andar além dos limites a que
se havia proposto para os seus ensinamentos. A sua dificulda
de então não está em ter êxito em “ensinar”, mas no saber
responder à exigência inesperada da parte de seus alunos, e
no dever de ensinar a cada um coisas a que não se havia pro
posto.
A instrução tende a estender-se por força própria. Mui
tas vezes, após um longo repouso, uma suspensão de trabalho,
ou imediatamente após o período de férias, os alunos não con
servam a memória das coisas aprendidas, mas freqüentemente
a cultura se enriquece como por força mágica. Após as férias,
são revelados os poderes de absorver o ambiente mais facil
mente do que antes.
40
O procedimento da atividade espontânea consiste algu
mas vezes em um trabalho voluntariamente intensificado e
complicado, que absorve todas as energias mentais por horas
inteiras e até por vários dias consecutivos. Recordo de um me
nino que queria desenhar um rio, o Reno, tendo em conta to
dos os afluentes, e para isso deveria buscar os tratados de geo
grafia em livros não escolares; para seu desenho ele utilizou
uma daquelas cartas milimetradas que são usadas pelos enge
nheiros em seus desenhos, usando compassos e vários instru
mentos reunidos com grande paciência no seu intento, Certa-
mente, ninguém teria mais presteza em tal trabalho.
De outra vez vi um jovem que se propôs a executar uma
multiplicação gigantesca de um número de trinta algarismos
por outro de vinte e cinco. Os produtos se acumulavam tanto
qu© o jovem surpreso teve que recorrer ao auxílio de dois com
panheiros que se ocuparam em colar folhas para conter a ope-
í ação monstruosa no seu enorme desenvolvimento. Depois de
iliiii dias consecutivos de trabalho a multiplicação ainda não
I»avia sido terminada, só terminando no terceiro dia, e os jo-
vatm ©m vez de aborrecidos, pareciam orgulhosos e sastifeitos
du giande trabalho cumprido.
Recordo-me ainda, de quatro ou cinco crianças que se
P? opuseram a executar, em conjunto, a multiplicação algébrica
de {odo o alfabeto por ele mesmo: de fazer o “quadrado do
glfãbêtü", Também desta vez a operação requeria o trabalho
o.uíni wd d© colar sucessivas tiras de papel as quais atingiram
iiiti n uBMimento de cerca de 10 metros.
©a <rubalhos pacientes tinham como efeito tornar a men-
is imãs forte ©ágil, como se faz um pequeno ginástico para o
41
vilhoso do que a própria execução, pois a mente da criança
tinha evidentemente essas qualidades particulares, para reter
nela todo esse processo.
De outra vez, uma criança qué havia aprendido a extra
ção de uma raiz quadrada com os processos indicados pelo
nosso material, mostrou-se intensamente interessada em extra
ir raízes pof si só, mas com um processo diferente, inventado
por ela, que entretanto não sabia explicar.
Poderia citar inúmeros exemplos. Um dos mais extraor
dinário foi o paciente trabalho de uma criança que analisou
gramaticalmente, por escrito, todo um pequeno livro, sem tro
car de ocupação até haver completado seu trabalho que foi
feito em dias sucessivos.
Estas manifestações psíquicas revelam uma espécie de
mecanismo formativo, são exercícios que não têm nenhuma
utilidade externa, nenhuma aplicação prática. Não seria pos
sível impô-los como se poderia fazer com uma ginástica física,
porque sabe-se ser impossível sustentar artificialmente um in
teresse vivo e ininterrupto, uma atenção constante por coisas
em si pouco atraentes e sem objetivos. É realmente um esfor
ço espontâneo e tão grande que seria impossível provocá-lo.
Embora pareça “perda de tempo” o que se apresenta em tan
tos jovens na variedade de suas ocupações, aqueles mesmos
jovens fazem progressos excepcionais em todos.os ramos da
cultura e também da arte.
Em uma escola indiana, onde havia um mestre especial
para música e para a dança, um grupo de crianças freqüente-
mente se reunia na sala de música quando o mestre não esta
va, e improvisava bailados que o mesmo não havia ensinado
e que diferenciavam muito dos movimentos rígidos da arte in
diana, e várias crianças tocavam os instrumentos rítmicos
acompanhando com uma espécie de canto coral inventado por
elas próprias. Todo mostravam um intenso interesse que não
era somente prazer. De tempos em tempos ouvia-se na escola
aquela música inesperada.
Eis então os fenômenos que são muito diversos daqueles
considerados na educação corrente em relação à psicologia “es
colástica” , a qual considera somente a “vontade” e o “esforçoM
que seriam fatos proveniente das reflexões do intelecto ou dm
coações externas. Aqui, ao contrário, surge do interior de ca»la
reflexão ou aplicação prática e utilitária, uma espécie *1«
ÉLAN V ITA L, a “explosão de manifestações improvisadas #
insuspeitadas”. Todavia, o “progresso” , na real aquisição d#
42
cultura, é evidentemente ajudado por esta energia interior,
muito mais que um esforço voluntário e imposto. E os resul
tados que se conseguem não estão diretamente em relação
com esses estranhos exercícios de paciência e de trabalho cons
tante; mas parecem, antes, pertencerem a mcanismos “interio
res” , que, agindo, dão um impulso de desenvolvimento a to
da a personalidade no seu conjunto.
De fato, uma das conseqüências mais indiretas é a for
mação do “caráter”. As crianças não fazem somente progres
sos na aquisição quase maravilhosa da cultura; mas, parecem
mais conscientes de si, donas das próprias ações, mais seguras
t-tn sua conduta, sem hesitação de timidez ou de medo, pron
tas também para uma adaptação com outras pessoas, com o
ambiente e suas eventualidades. A alegria de viver e a disci
plina parecem consequência mais destes atos interiores que
«148 circunstâncias externas. Elas estão então prontas para do
minar o ambiente. Por estarem equilibradas e mais capazes
ti# orientarem-se e de valorizarem a si mesmas, mostram-se
tmiilo calmas e harmoniosas; e também, por isto, encontram
yffU) maior facilidade em adaptarem-se com outras pessoas.
No decorrer de nossas experiências encontramos também
Bípii « força esmagadora dos preconceitos. Ao mesmo tempo
Mi11 «jua todos se lamentavam da falta de cultura na vida civil
d# ímíssu» tempos, e colocavam em evidência a sua absoluta
iièt gsãidade, opunham-se, quase em defesa da criança, ao de-
Ifttvoivimento cultural nas nossas escolas.
A fun.n da inércia mental via quase como uma heresia
^«datôgirH e mais ainda psicológica, estas revelações de nos
sas ailauças e combatia o oferecimento de nossos materiáis
fftí# ajudavam tal desenvolvimento. Contra isso vinham ado-
fiUidt) a§ «ifini obertaií sobre o cansaço mental das crianças nas
Pfêfíl# comuns e nos acusavam de forçar as energias intelec-
Itiiii de eriençe, ou denunciavam o nosso intelectualismo. Nós,
ft| ff=m i í t ealavamos completamente inocentes de tudo isso.
J p aúMpifeâ deacrlçfles dos fatos, dos quais citamos somente
Hjfeyui) fie# páginas anteriores, prova que eles nos surpreen-
tfinUí «jiianfn «Irspertavam a maravilhada susepeita nos
44
Mas que são os preconceitos, que “impedem” ver a crian
ça de um ponto de vista diferente do habitual, isto parece
ainda inconcebível. Os que se ocupam da psicologia infantil,
ou de educação, devem levar em consideração não os precon
ceitos sociais dos quais se ocupam os homens modernos, mas
outros preconceitos, os que se referem diretamente à criança,
esta criança nos seus atributos naturais, nos seus poderes, nas
condições anormais de vida.
Observando os preconceitos religiosos, poder-se-á, talvez,
compreender melhor a grandeza e o significado das religiões,
mas não a personalidade natural da criança. Tolhendo os pre
conceitos das castas sociais, poder-se-á intensificar o acordo e
« harmonia entre os homens na sociedade mas não por isso
Vfif melhor a criança. Se muitas formalidades nas relações so-
i iais são reconhecidamente fúteis, pertencentes a uma época
|M»n«ada, far-se-á a reforma dos costumes, mas não é por isso
que se verá melhor a criança.
Tudo quanto parece contribuir para um progresso social
o» adultos pode completamente prescindir, na opinião
comum, das necessidades vitais do ser infantil. O adulto tem
íjpfipFf visto na sociedade, no seu progresso, somente o adul
to, ©mcriança tem permanecido um extra-social, uma incógni
ta dü equação da vida. Daí nasce um preconceito de que a
vida da criança possa modificar e melhorar somente com o en-
ÜR*m preconceito este que impede de ver o fato de que a cri-
jlfiça se Coitrói por si mesma, de que há um mestre dentro de-
te» d# que «té mesmo possui um programa e uma técnica edu-
# de que nós, reconhecendo este mestre desconhecido,
pgdiüiiiofi Ipi o privilégio e a fortuna de nos tomarmos seus
fipÉShmtèa m Bitus fiéis servidores, ajudando-a como coopera
das
nutro* preconceitos são a conseqüência lógica dis-
I I M* m qu© a mente da criança é vazia, sem direção e sem
bH# f, Hpfflfito, nó« temos a grande e completa responsabili-
I Aê H^gfifhè Im, de guiá-la e de comandá-la; que sua alma
g unia quanl idade de defeitos, tende a decadência e à
igtulê © flutuar como uma pluma levada pelo vento
ifiiri, diHeui«»9 estimular e encorajar, corrigir e guiar
iM il
i, ê ©r>iã*mi coisa. A criança — diz-se — não
I lÜ&fflffltOS « é, pois, incapaz de servir a si mes-
f sdnhsi sfe êj-i^au a fazer tudo por ela, sem pensar que
jirvU por si «ó, Grande peso esta criança sob
45
nossos cuidados e nossa responsabilidade. O adulto diante dela
está seguro de que deve “criar” nela um homem, e que a in
teligência, a atividade socialmente útil, o caráter deste homem
que chegou em sua casa será portanto obra sua.
Nasce então o orgulho juntamente com a ansiosa respon
sabilidade. Essa criança deve um infinito respeito e gratidão
aos seus criadores, aos seus salvadores, e se, ao invés disso, se
demonstrar um rebelde, é julgada e deve ser corrigida, sub
metida até à violência, se necessário. Essa criança para ser
perfeita, deve ser absolutamente passiva, isto é, deve obedi
ência rigorosa. Ela é um perfeito parasita de seus pais, a fim
de que os pais assumam todo o peso econômico de sua vida,
ela deve depender absolutamente deles. Ê o filho! Ainda que
já tenha se tornado um homem, fazendo a barba todas as
manhãs para ir à Universidade, continua contudo dependen
do do seu pai e de seus professores como quando era criança.
Fará o que o pai quiser e estudará como querem seus mestres.
Permanecerá um extra-social mesmo quando formado, tendo
talvez 26 anos.
Não poderá escolher um estado matrimonial, sem o con
sentimento do pai, até a maioridade que é estabelecida não
por seus desejos e sentimentos, mas por uma lei social feita
pelos adultos e igual para todos.
Ele então deve obedecer até para morrer, quando a so
ciedade lhe diz: “Parasita, prepara-te para matar ou ser mor
to!” e se não fizer isto, isto é, o serviço militar, não encontra
rá um lugar na sociedade; será um delinqüente.
Tudo isso desliza no mundo como as águas calmas de
um regato sobre os prados. Esta é a preparação do homem. E
a m ulher.. . é ainda mais dependente e condenada na vida.
As normas deste modo de viver são as bases da socieda
de. Ninguém pode ser chamado bom se não segui-las.
Dessa forma, desde o nascimento até que todas as regras
ditadas pelos adultos sejam executadas, a criança e o homem
dependente, isto é, os jovens, não são considerados como um
homem pela sociedade. Ao jovem estudante então se diz:
““Pense em estudar, não te ocupes de política, nem de idéias
diferentes daquelas que te foram impostas; tu não tens direi
tos civis”.
O mundo social abre-se somente depois desta espécie dn
preparação ditadorial.
46
É necessário reconhecer que durante a história da civi
lização houve uma evolução. Enquanto no direito romano o
pai podia matar o filho pelo direito que a natureza lhe dava
de havê-lo criado, e as crianças fracas e disformes podiam ser
mortas, jogadas no fundo de um penhasco (o penhasco Tar-
pea), que tinha essa função depurativa da raça, o Cristianis
mo coloca além do filho, a criança deformada sobre uma lei
que faz com que respeite sua vida. Mas isso não é tudo. Não
■ e pode matar materialmente a criança.
Pouco a pouco a ciência, sob forma de higiene, chega até
à “proteger” a vida da criança das doenças e das crueldades
evidentes, mas acautela-se em ditar as condições sociais ne
cessárias para proteger a vida de todas as crianças.
A personalidade infantil permanece sepultada sob os
preconceitos da ordem e da justiça. O adulto que está
sempre interessado em defender seus próprios direitos,
tem entretanto esquecido a criança e nem ao menos se aper-
.eirfnj disto. Sobre este plano a vida tem continuado a de-
seuvolver-se e complicar-se até o nosso século.
Derivam do conjunto de tais conceitos os preconceitos
pa» limiares, que são impostos com louváveis objetivos de
pMjteyão e de respeito pela infância.
Por exemplo, a criança pequena não pode ser admitida
em nenhuma forma de trabalho, mas deve ser abandonada
g uma vida de inércia intelectual, podendo somente brincar
de Um esrto modo estabelecido.
Per iiso, se for descoberto, um dia, que a criança é
iifti giãiiijfi trabalhador, que pode aplicar-se verdadeiramente
g rum mncentração, que pode instruir-se, que tem uma dis-
gÉ&jggj em rí própria, isto parecerá uma fábula que não
££3ii?ãtê rui praia mas sim aparecerá como um absurdo.
A» alíMiçoe» não se fixam nesta realidade, por isso, não
#f=§ytle ttn lu/er refletir que pode haver um erro por parte
eis âduítu O fato é simplesmente impossível, inexistente ou,
nio seria.
iHm. a maior dificuldade de libertar a criança e ilumi-
ust teus {.«HÍmrn não está em encontrar uma educação reali-
mas sim em vencer os preconceitos que o adulto
Ésgftfyhi fHUti ei«, Por isso, diziam que se devia reconhecer,
fpU^«F s i oiiifKiluf s6 os preconceitos relativos à criança,
jíf y temt pui outros preconceitos que o adulto construiu
§us vida.
pit# luta contra o* preconceitos é uma questão social
=
I 4 ffisuvH. u'*§ dava acompanhar a renovação de sua edu
47
cação. É necessário preparar um caminho positivo e deli
mitado para este objetivo. Se temos em vista diretamente
e somente os preconceitos relativos à criança, então uma
reforma do adulto andará par e passo, porque derrubará
um obstáculo que está nele. Esta reforma do adulto tem
uma importância enorme para toda a sociedade: representa
o despertar de uma parte da consciência humana que está
descoberta pelos impedimentos estratificados, e sem isso
todas as outras questões sociais tornam-se também obscuras,
e seus problemas insolúveis A consciência fica ofuscada
não em alguns adultos, mas em todos os adultos, porque
todos têm crianças e estando ao lado delas com a cons
ciência ofuscada, agem inconscientemente; não usam aqui
a reflexão, a inteligência, que em outros campos os con
duzem a um progresso. Existe verdadeiramente um ponto
cego, como o do fundo da retina. A criança, esta desco
nhecida, esté projeto de homem, incompreendida, julgada
algumas vezes como um acidente matrimonial que abre um
caminho de sacrifícios e de deveres, não desperta em si
maravilhas e admiração.
Deixe que descreva um complexo psicológico: suponha
que ao natural, a criança possa aparecer como um milagre
divino, como os homens vêem a figura de Jesus Menino,
figura inspiradora de artistas e poetas, esperança de reden
ção para a humanidade inteira, figura augusta a cujos pés
os reis do Oriente e do Ocidente depositaram devotada
mente suas dádivas. Esta criança, Jesus, é todavia, tam
bém no culto, uma verdadeira criança, um recém-nascido
inconsciente. Ora, para quase a totalidade dos pais, senti
mentos grandiosos desabrocham com o nascimento de seus
filhos, que vêm idealizados pela força do amor! Mas depois,
esta criança cresce, começa a trazer aborrecimentos. Quase
com remorso procuram então defender-se dela, ficando con
tentes quando dorme e procuram fazê-la dormir o máximo
possível. Se possível, colocam-na em mãos estranhas ou
entregam-na a uma enfermeira para que ela a mantenha
longe o maior tempo possível. E se a criança, este ser des
conhecido e incompreensível, que age por impulsos inconi-
cientes, não se submete, castigam-na, combatem-na, e ela,
sendo frágil, sem nenhuma arma de defesa em sua inteli
gência e força, deve a tudo suportar, Há então um con
flito na alma do adulto que a ama, em princípio talvBi
não sem pena, não sem remorso. Mas depois o mecani»*
48
éf *
49
OM BIH S
50
vel à mais alta sociedade e tornando-se um fato universal.
Toria sido lógico que todos os adultos se fizessem pre-
imites a este novo trabalho, pois aquele era um direito
que não se baseava unicamente na rutura violenta de pri
vilégios, mas exigia um esforço de aperfeiçoamento. Pen-
fõu-10, ao contrário, unicamente na criança e sobre ela ex-
*luaivamente se concentrou o esforço para tal conquista.
Eis aqui, pela primeira vez na história do mundo, a
<Hinça “mobilizada” , meninos e meninas, todos igualmente
§> licitados para o serviço na escola, como em tempo de guerra
Hiõbiliza-se a juventude masculina para o serviço militar.
Todos conhecem a lamentável história! A criança foi
•'lipnada em vida, pois durante toda a infância ficou apri-
Fechada em celas nuas, sentada em bancos de
inárlgira, sob o domínio do tirano que lhe impunha até
como ele queria, aprender o que ele queria e fazer
•jhfí nlp queria. A mão delicada da criança devia escrever,
; sua mente criadora devia fixar-se nas áridas formas do
ifnt mi o que não revelavam nenhuma das vantagens que
^ deln. As vantagens as encontrara o adulto.
Uuanhil histórias de martírio são registradas! As crian-
■ torturadas, seus dedinhos presos às canetas foram
• rum vara e forçados a um exercício cruel. São muitos
s =ním#nt08 daqueles prisioneiros que tiveram até a espi-
fItifiid torcida pela condenação de permanecer sentado
- >-H um banco de madeira dia após dia, ano após ano,
; *• 1« i1p 1í«adíssima idade de crescimento. Na aglomera-
ft* promiscuidade das doenças, sofrendo frio, assim viveu
- naquele campo de concentração. Isso durou até
d?« du século passado. A vantagem era um direito do
--Hi. oiti da criança, mas a ninguém pode ela ser grata,
I HÍftfUim procurou ajudá-la em suas penas. Contudo
r f niigMlem Ainda nos pais aqueles sentimentos naturais de
; meúttf r» amor materno e paterno pelo nascimento do
; É i os ífisf inlo» de proteção aos pequeninos, comum até
- «ítji Animais.
* o#tui ts explica isso, senão como um fenômeno mis-
= dn fõnii iiiicia, ou melhor, o que mais que isto pode
r o iiMMIíf:; e os preconceitos dirigidos à criança?
à fifíssu féfiulõ, procurou-se seriamente atenuar esses
SHéfPUrlo transformar a educação, construindo
p i * AÍs iBdlsâ, inAi* bonitas e modernas, mas isso en-
| i p td u h figura da criança incompreendida e vista
= tiMhtuH,
51
III — AS NEBULOSAS
O HOMEM E OS ANIMAIS
52
<«mcterísticas do adulto como o homem. Muitos animais,
como os cabritos, os cavalos, os bovinos, sustentam-se quase
«ubitamente de pé e durante o aleitamento correm em dire-
çfto u mãe.
Os. próprios macacos, que são considerados os mais
próximos do homem, apenas nascidos, são vistos vivazes e
inteligentes agarrando-se com energia ao corpo da mãe que
Rio necessita levá-los nos braços. A macaca mãe salta sobre
as árvores com seu recém-nascido que a agarra com os braços
t somo se não bastasse ele também foge e a mãe cansa de
r@$it@endê~lo para mantê-lo próximo.
A criança, ao contrário, permanece inerte por longo
i&inpo. Não fala, enquanto todas as outras espécies rapi
damente adquirem o latido ou o miado, enfim, reproduzem
l»jf hereditariedade os sons da língua fixa, limitada e pró-
priR li« espécie. Todos os cães, de todas as partes do mundo
e de todas as raças ladram, todos os gatos miam, assim
iodas as aves têm o seu próprio gorgeio, um canto
t a i-íio @ uma linguagem própria que está dentro das ca-
tiiiltleas da espécie.
A longa inércia e incapacidade da criança é verdadei-
n íumíê exclusiva do homem. Na idade na qual um bovino
; - <«)>»* de reproduzir, se bem que tenha um corpo bem
dei que o homem e mais ou menos os mesmos órgãos
íisáaidfigoij este está ainda em um estado infantil e bastante
Ífíf?§ê da maturidade.
1 <jm estudam somente a evolução da forma do corpo
d l seuá tespectivos órgãos, para deduzir a descendência
• >1.« homem e dos animais, não observaram todavia
tttffctenln atenção as diferenças que se revelam sobre
— mtsteilfwa característica da longa infância humana
i aíiéa iHiin isso um vazio que a teoria da evolução ainda
^5 s s R ild ft R U .
li# fstu, poder-se-ia concordar logicamente que o ho-
í um símio evoluído por longos esforços de adaptação
somente por obra desses esforços, porque
Hüt§ evidente semelhança entre o corpo do homem e
= dfi üüéêi o <) crânio e a face de uns restos humanos
#8<» bastante semelhantes e próximos ao de um
«Rpeilo» As articulações e o esqueleto em geral têm
-- iurpipendente«. Aquele que pensa que o homem
Iffl d l via também trepar nas árvores não faz mais
üu !uK h comum desenvolvido fantasticamente
# bíífifes ppliRfliogrâfico« de Tarzan. Mas uma coisa per-
53
manece inexplicável. Pode-se supor um homem primitivo,
de tipo morfológico inferior, que se agarra nas árvores,
mas não se pode admitir que tenha havido um recém-
nascido que falasse, que se agarrasse à mãe, que se pusesse
de p? e subitamente corresse! É difícil encontrar uma razão
pela qual o homem ao mesmo tempo que evolui para uma
espscie superior, isto é, homo sapiens, deva ver o seu recém-
nascido surgir passivo, mudo, sem inteligência e incapaz
de fazer por anos inteiros aquilo que fazia em épocas pre
cedentes à evolução! Portanto, um dos caracteres verdadei
ramente humanos, distintamente diferenciados está no recém-
nascido.
Não importa que o fato até hoje não possa ser expli- I
cado. O fato existe e é fácil deduzir que se o recém-nascido I
do homem mostra tão grave inferioridade em relação aos I
filhotes dos mamíferos, esse deve ter uma função especial
que os outros não têm.
Esta função não advém da hereditariedade das formas
infantis precedentes sendo, portanto, relativa a qualquer ca
racterística nova, acrescentada durante a evolução.
Esta característica não se reconhece observando o ho
mem adulto, reconhece-se com evidência somente observando
a criança.
Qualquer coisa de novo aconteceu durante os processos
evolutivos que conduziram à realização do homem, da mes
ma forma que uma característica nova sobreveio com respeito
aos répteis, às aves e aos mamíferos, isto é, o sangue quente
e seus cuidados instintivos pelo ovo e respectivamente pelos
filhote para proteção da espécie. A verdadeira diferença
entre as aves e os répteis não está nos eventuais dentes,
no bico do archeopterix * ou na áonga cauda de muitos
vertebrados, mas sim naquele amor maternal que no início
não existia e que surgiu ao mesmo tempo em que o sangue
quente. São mutações da evolução e portanto não são unica
mente transformações.
A FUNÇÃO DA CRIANÇA
’
A criança deve ter uma função especial que não aquela
de somente ser o mais débil em relação ao adulto. Ela ftÉít
54
é
55
cias que a criança não era surda nem incapaz de falar
porque aprendeu a conversar em francês, aprendendo depois
até a ler e escrever nessa mesma língua. Era considerado
por sua aparência um surdo-mudo porque tinha vivido longe
dos homens, das pessoas que falavam,
A linguagem, pois, desenvolve-se ex novo da própria
criança. Ela se desenvolve naturalmente, isto é, tem este
poder hereditário, mas a desenvolve por si mesmo, em si
mesmo, absorvendo-a do ambiente. Nada é mais interessan
te que os recentes estudos de psicologia relativos a obser
vações exatas sobre o desenvolvimento da linguagem das
crianças.
As crianças absorvem de certa forma inconscientemente
a linguagem de forma gramatical e enquanto permanecem
aparentemente inertes por muito tempo, de um momento
para outro (ou melhor dizendo, no espaço de dois anos e
três meses mais ou menos), mostram um fenômeno quase
de explosão de uma linguagem já totalmente formada. Logo,
houve um desenvolvimento interno durante o longo período
no qual o pequenino era incapaz de exprimir-se. Ele estava
elaborando nos mistérios de seu inconsciente toda a lingua
gem com as regras que colocam as palavras na ordem gra
matical necessária para exprimir o pensamento. Isto é feito
pelas crianças com respeito a todas as línguas possíveis, das
mais simples, como as de certas tribos africanas, às mais
complicadas como o alemão ou russo, sendo todas absorvi
das exatamente durante o mesmo período de tempo; pois
em toda raça a criança começa a falar pelos dois anos de
idade. Foi assim certamente no passado. As crianças roma
nas falaram o latim, tão complicado nos casos e nas decli
nações, tão difíceis de serem aprendidos pelos jovens de
nosso tempo que freqüentam as escolas superiores e na índia,
os pequeninos falaram o sânscrito, que é de uma dificuldade
quase insuperável para os estudiosos de hoje.
A língua Tamil, no Sul da índia, por exemplo, é difi
cílima para nós, com aqueles sons e aquelas acentuações
quase imperceptíveis que mudam o sentido do discurso so
mente elevando ou abaixando um pouco o tom de voz, mas
os pequeninos de dois anos nas vilas e nos desertos hindus
falam o Tamil.
Da mesma forma uma das grandes dificuldades para
quem estuda a língua italiana é recordar o masculino e o
feminino dos nomes, pois não há nenhuma regra e como
se não bastasse, alguns nomes podem ser masculinos no
56
*
$7
existem unicamente nebulosas, as quais têm o poder de
se desenvolverem espontaneamente mas, somente, alimenta
da pelo ambiente, por aquele ambiente que ó tão variado
nas formas de civilização? Eis porque o embrião humano
deve nascer antes de completar-se e poder desenvolver-se so
mente após o nascimento, porque suas pontencialidades de
vem ser estimuladas pelo ambiente.
As “influências internas” serio muitas, como o são no
crescimento físico durante os processos dependentes dos ^ens,
por exemplo, a influência de vários hormônios. Ao invés disto,
no embrião espiritual, existem sensibilidades dirigentes. Por
exemplo, no caso da linguagem, nota-se naa averiguações sen-
soriais, que o senso da audição parece ser o menos desenvolvi
do durante a primeira semana de vida. Todavia é com o sen
so auditivo que devemos colher os sons mais delicados da
palavra. Conclui-se, portanto, que o ouvido não ouve somente
como sentido, mas é guiado por sensibilidades especiais para
recolher do ambiente precisamente os sons das palavras e
esses não são unicamente sentidos, mas provocam reações
motoras nas delicadas fibras das cordas vocais, da língua, dos
lábios que são despertados, entre tantos filamentos apropria
dos, deste modo, para reproduzir estes sons. Todavia, eles
não são expressos imediatamente, mas sim armazenados na
expectativa do tempo em que a linguagem deverá nascer, da
mesma forma que a criança na vida intra-uterina, forma-se
sem funcionar sendo depois estimulada a nascer, num deter
minado momento, quando seu organismo passa a exercer suas
funções.
Estas são suposições, mas resta o fato que havendo desen
volvidos internos direitos da energia criativa, estes desenvolvi
mentos podem chegar à maturação antes de manifestar-se ex
ternamente.
Quando depois se manifestam eles são caracteres cons
truídos para formar parte da individualidade.
A M EN TE ABSO RVEN TE
58
m
59
que fazem através dos oceanos e desertos para chegar ao seu
destina È, entretanto, dificílimo aprender uma língua compli
cada como o latim, o alemão ou o sânscrito e os estudantes
levam quatro, cinco e até oito anos para estudá-los sem toda
via conhecê-las perfeitamente. Uma língua viva, mas estran
geira, não se aprende nunca totalmente; qualquer erro de gra
mática ou “sotaque estrangeiro” revela que aquela não é a lín
gua materna de quem fala. E esta língua estrangeira se não é
cuidada continuamente, será esquecida còm facilidade.
A língua materna nao está fixada na memória consciente,
está depositada em uma memória diferente semelhante à que
os psicólogos modernos, biólogos e psicanalistas chamam
“mneme” ou a “memória da vida”, aquela que detém a forma
transmitida por hereditariedade, através da infinidade dos
tempos e que é considerada como um “poder vital”.
Talvez uma comparação superficial possa ilustrar esta
diferença; a comparação entre a fotografia e a representação
gráfica feita conjuntamente com a ajuda da mão e da inteli
gência, ou seja, a escrita, o desenho, a pintura. Uma máquina
fotográfica com seu filme pode captar num instante qualquer
coisa que lhe chegue através da luz, não sendo um feito maior
captar a figura de uma floresta, ou de uma árvore isolada, um
grupo de pessoas com o ambiente que as circundam ou uma
faCe isolada. Qualquer que seja a complexidade da figura, esta
se fixa do mesmo modo, no mesmo átimo de tempo: o átimo
no qual o obturador se abre e os raios luminosos penetram
para trocar o filme. Se desejamos fotografar a capa de um li
vro, que contém unicamente um título, ou uma página inteira
coberta de escrita fina, o processo e os resultados são os mes
mos.
Entretanto, se quisermos reproduzir um desenho a mão,
isso resulta num trabalho mais ou menos fácil e laborioso e o
tempo que se emprega em reproduzir o perfil de um rosto é
bem diferente do necessário para representar uma pessoa in
teira ou um grupo de pessoas, ou mesmo uma paisagem. O
desenho também não reproduz, ainda que queira, todos os
detalhes, tanto que, para ter-se um documento de um objeto
ou a posição de um corpo exige-se a fotografia e não um dese
nho. Assim, escrever o título de um livro é coisa fácil e ligeira
comparada a copiar uma página extensa de escrita. Enquanto
a mão trabalha, o objeto se vai representando com a evidên
cia de sua lentidão, de seus esforços sucessivos. Mas, n máqui
na fotográfica após captar a imagem, permanece como antes
e nada aparece nela da imagem possuída. É necessário colocar
60
o filme em um lugar escuro, expondo-o a seus reativos qu
agem quimicamente, fixando a imagem longe da luz que
produziu. Após a fixação da imagem pode-se lavar e expor
filme à luz pois a imagem permanece indelével reproduzind
todas as particularidades do objeto fotografado.
Analogamente parece agir a mente absorvente. As imf
gens também aqui devem permanecer ocultas na obscuridad
do inconsciente para serem fixadas por misteriosas sensibíl:
dades, sem que nada apareça exteriormente, sendo soment
depois que o milagroso fenômeno se completa, que a conquii
ta criativa levada à luz da consciência então se firma, indelc
vel, com todas as suas particularidades. Ainda no caso da lir
guagem, esta explode pouco depois dos dois anos, encontrar
do-se em seus lugares as particularidades dos sons, dos pref:
xos e sufixos da palavra, das declinações e das conjuraçõe
dos verbos e das construções das sintaxe. Ê a indelével lingus
gem materna; é uma característica da raça.
A mente absorve! Maravilhoso som da humanidade!
Sem que participe com seu esforço, somente “vivendo’
o indivíduo absorve do ambiente até mesmo um fato complí
xo da cultura, como é a linguagem.
Se essa forma essencial permanecesse no adulto, com
seriam facilitados os estudos! Imaginemos, se pudéssemos i
a um outro mundo, digamos, ao planeta Júpiter e lá encon
trar homens que somente passeando, vivendo, absorvesser
toda a ciência sem estudá-la, adquirindo habilidades sem o
esforços de exercícios! Diríamos nós: “Que milagre afortuna
do” ! Pois bem, essa forma fantástica da mente existe; é
mente dos pequeninos. Ê um fenômeno que permanece escor
dido nos mistérios do inconsciente criativo.
Se isso acontece com a linguagem, para aquela constri;
ção de sons foriada pelos homens durante séculos e milênio
de esforços intelectuais, para esculpir a expressão de pensa
mentos é fácil reconhecer que deve, analogamente, fixar-se n
criança os caracteres psíquicos que diferenciam uma raça d
outra, ou seja, os hábitos, os preconceitos, os sentimentos
em geral todas as características que sentimos “encarnadas
em nós, ou ainda, malgrado as modificações que a nossa inte
ligência, a lógica, o raciocínio, estariam dispostos a produzii
Oandhi disse um dia: “Eu poderei aprovar e seguir muito
dos costumes dos povos do Ocidente, mas jamais poderei car
celar em mim a adoração à vaca”. E quantos pensariam: “Siir
minha religião é absurda segundo a lógica, mas permanec
em mim um sentido misterioso de devoção aos objetos sagra
61
dos; uma necessidade de implorar para viver”. Esses homens
crescidos com as impressões de seus tabus, ainda que tornan
do-se doutores em filosofia, não puderam cancelá-los. A crian
ça çonstrói-se verdadeiramente, reproduzindo em si mesma,
como em uma forma de mimetismo-psíquico, as caracteríticas
dos homens que a circundam. E assim, crescendo, não torna-se
simplesmente um homem, mas transforma-se em um homem
de sua raça.
Com essa descrição tocamos um segredo psíquico de im
portância vital para a humanidade: o segredo da adaptação.
A AD APTAÇÃO
62
%
63
O CONTATO COM O MUNDO
64
%
65
íar-se dela e levá-la sempre ainda que a criança naturalmente
aumente de peso.
Um missionário francês, que havia estudado especialmen
te os costumes dos povos de Bantu, na África Central, mara
vilhou-se com o fato de que as mães não têm em mente a
idéia de separar-se de seus filhos considerando-se quase como
um só corpo. A criança é parte da mãe. Tendo assistido a uma
solene coroação real, aquele missionário viu a rainha chegar
com a criança ao braço e receber a honra soberana tendo seu
filho junto a si. Ficou maravilhado com o fato de que as mu
lheres de Bantu pudessem amamentar por tanto tempc, que
geralmente era de dois anos inteiros, isto é, durante toda a
época que interessa atualmente aos nossos psicólogos mo
dernos.
Não queremos considerar revolucionários esses testemu
nhos naturais. Nós que observamos com admiração, estamos
dispostos a atribuir o mérito desses costumes, o caráter tran-
qüilo dessas crianças que não são difíceis e não apresentam
“problemas” como os nossos. O segredo está contido em duas
palavras: leite e amor.
A natureza, a sábia natureza, deve ser a base sobre a
qual pode-se construir uma supernatureza ainda mais perfeita.
É certo que o progresso deve superar a natureza e tomar di
versas formas, porém não pode proceder atabalhoadamente.
Essas breves citações abrem um caminho prático para a
afirmação genérica que começa a invadir nosso mundo cien
tífico: “a educação deve começar ao nascer”.
CONCLUSÃO
56
a criança comece por absorver o ambiente completando com o
seu trabalho, com as experiências gradativas sobre o ambien
te que n circunda, o seu desenvolvimento infantil. É com ab-
íiorgfiíi inconsciente e depois com atividades sobre as coisas
ejdõfnii que ela nutre e desenvolve sua qualidade humana.
Eli» eon^trói-se, forma suas características, alimentando seu
espírito,
S© o desenvolvimento se limitasse ao físico, a criança
«cria condenada a uma espécie de fome, jamais saciada pe
la sua mente e cairia nos males profundos da “desnutrição
peíquica”. Nada de humano poderia desenvolver-se normal
mente nela. São poucos os que descobriram que as anomalias
psíquicas, evidentes na infância moderna, reveladas aos fins
dos primeiros anos de vida são provenientes de duas coisas:
“desnutrição mental” e “falta de atividade inteligente e es
pontânea”. São devidas a uma repressão das energias vitais,
destinadas a desenvolver a alma do homem; a uma demolição
das leis que guiam passo a passo o crescimento da criança.
O mundo civilizado torna-se um imenso campo de con
centração onde todos os homens que nascem são relegados
e feitos escravos, diminuídos em seus valores, alienados em
seus impulsos criativos, subtraídos dos estímulos vivificantes
que cada homem tem direito de encontrar entre os que o
amam.
Esta expressão vaga deve ser concentrada assim: “É ne
cessário construir uma nova educação que começa ao nascer.
É preciso reconstruir a educação baseando-se nas leis da natu
reza e não em preconceitos que prejudicam o homem”.
A educação de hoje não se baseia nem mesmo na ciência
dos homens porque, atualmente está se desenvolvendo um
tratamento para os pequeninos “logo ao nascer”, que se apóia
somente no que a higiene acredita e prevê, isto é, boa nutri
ção, especialmente a artificial, facilitando o afastamento da
mãe que acha conveniente não ter mais leite e o isolamento
da criança em um berçário, confiada a uma mulher desconhe
cida e privada do amor materno. A criança é também conde
nada a dormir na escuridão artificial, procurando defendê-la da
luz do dia. Quando esta sai para o mundo externo, é levada
«m um carrinho coberto de modo que não veja nada e quando
vira a cabeça tem diante de si somente a pajem, que é uma
espécie de enfermeira, comumente velha, pois sup5e-se que os
velhos têm irais experiências para cuidar das crianças. O c..
67
rinho afetuoso de uma bela e jovem mãe permanece ignorado
à criança. Ela é um corpo vegetativo; os médicos especialistas
e os psicanalistas ousam dizer definitivamente que ela é um
“tubo digestivo”. O silêncio necessário ao sono, substitui a voz
humana que fala, este “tubo digestivo” é bem estudado: onde
são medidas quantidades e qualidades de alimentos rigoro
samente regulados e graduados. O corpo é pesado regularmen
te para acompanhar seu crescimento. Os carinhos, o apalpar
dos membros, sugeridos pelo instinto materno são abolidos,
todavia foi a natureza que os inspirou e são, portanto, estímu
los para a vida, reclamados pela consciência; são massagens
delicadas que preparam os músculos inertes através de um
exercício passivo que é necessário quando os movimentos
voluntários não estão ainda desenvolvidos.
Algo verdadeiramente estranho! Existe até o temor de
que os carinhos e contatos com a mãe sejam perigosos e inde
centes podendo suscitar os instintos sexuais naqueles que ape
nas chegaram ao mundo. Dessa maneira, as crianças estão
em perigo de perder o seu caráter e o poder de adaptação e
orientação no mundo complicado no qual nasceram,
Ê necessário que a sociedade desperte de erros tão pro
fundes e liberte esses prisioneiros da civilização, preparando
para eles um mundo adaptado as suas necessidades supremas,
que são necessidades psíquicas. Um dos trabalhos mais urgen
tes na reconstrução da sociedade é a reconstrução da educa
ção que deve ser feita, dando à criança um ambiente apro
priado para sua vida. Pois bem, o primeiro ambiente é o mun
do, e os outros ambientes, como a família, a escola, devem
corresponder à satisfação daqueles impulsos criativos que são
guiados pelas leis cósmicas para realizar o aprefeiçoamento
humano.
Quando os preconceitos forem dominados pelo conheci
mento, aparecerá então no mundo a “criança superior” , com
seus poderes maravilhosos que hoie Dermanecem escondidos;
aparecerá então a criança que está destinada a formar uma
humanidade capaz de compreender e de controlar a presente
civilização.
AN ALFABETISM O MUNDIAL
68
*£>)
tf
69
Grandes obstáculos se opuseram logo a estas tentativas
pois não haviam experiência precendentes que pudessem ser
vir de orientação. Incorreu-se em muitos erros. Os países ori
entais, pode-se dizer que são afortunados, pois mesmo havendo
obstáculos, os erros puderam ser evitados! A experiência feita
no Ocidente é para eles de grande valor. O caminho já está
traçado e pode-se avançar a grandes passos em direção ao fim
desejado.
Na Europa, os erros derivados da inexperiência em reali
zar rapidamente sobre um plano total a educação infantil, re
caíram sobre suas crianças. Eles foram vítimas de uma forma
de escravidão ainda não havida na história da humanidade.
Poucos conhecem que o primeiro impulso para realizar
este colossal esforço social veio de uma revolução que deu
início a novos tempos na Europa, pois assinalou os princípios
das grandes descobertas científicas e o avançado uso das má
quinas.
A Revolução Francesa de 1789 apresentou um estranho
fenômeno. Entre as selvagens violências de uma inssurreição
popular, o próprio povo exigiu que entre os direitos do homem
estivesse o de possuir linguagem mais elevada, isto é, a lin
guagem escrita. Era um pedido estranho e sem precedentes.
Não havia nada a fazer contra a reação do poder opressivo
que empobrecia o povo.
O povo não queria somente pão e trabalho como fez
depois, segundo os ensinamentos de Marx, nem se limitava
a exigir uma mudança nas hierarquias sociais e no governo
político, mas reivindicava o direito humano do ser instruído
para poder usar também esta arte. II da Declaração dos Di
reitos do Homem e do Cidadão, sancionada em 1791: “A livre
comunicação dos pensamentos e das opiniões é um, dos di
reitos mais preciosos do homem” : cada cidadão pode, portan
to, faiar, escrever e publicar livremente. Foi por certo uma
das poucas vezes que ao invés de uma diminuição de traba
lho, o povo pediu para fazer uma nova aquisição com um
esforço que cada indivíduo deveria cumprir por si só, à custa
de penosa fadiga.
O pedido nascia de algo bem maior que o desejo de rom
per as cadeias da tirania. De fato, foram necessários três anos
para estabelecer os princípios de uma nova vida social e para
abater a monarquia; mas foi necessário um século para esten
der ao povo o conhecimento da linguagem escrita.
Se bem que o grito de guerra fosse “liberdade” , esta con
quista não foi feita através da liberdade, pois se fez necessária
70
a coerção. A realização prática de colossal tarefa não foi atin
gida pela destruição de uma monarquia que havia desfrutado
do povo, mas foi conquista de uma outra monarquia: o pri
meiro Império Francês. Napoleão, paladino da Revolução
Francesa, fortaleceu o povo e, percebendo ser impossível que
as velhas pondições fossem restabelecidas, levou decisivamen
te o povo para uma nova vida. '
Vê-se então a plebe da França transformada, por seu
toque mágico, numa onda que quebra os aguilhões seculares.
Seu gesto épico deu nascimento à unica e verdadeira con
quista que até hoje permanece: a elevação do nível intelec
tual do povo, segundo os direitos do homem.
Com o código de Napoleão, a educação obrigatória faz
sua primeira aparição nas legislações das Nações. Uma vez
que Napoleão impôs o seu código aos povos da Europa, esse
princípio de educação conquistou não só a França, mas todo
o Império logo após as terríveis destruições da guerra.
A educação obrigatória foi estabelecida em muitos Esta
dos europeus, passando depois à América, e iniciando assim a
lenta e difícil tarefa de eliminar o analfabetismo. Todas as
nações civis daquele tempo a assumiram.
A educação das massas abre um novo capítulo na histó
ria humana que continua a dsenvolver-se e a expandir-se. Era
uma tarefa que requeria um trabalho mental de cada indiví
duo e a tarefa era confiada às crianças.
Nos primeiros anos do século X IX , a criança entrou na
História como elemento ativo do progresso da civilização, mas
ao rnesmo tempo ela aparece como uma vítima. A criança não
podia compreender, da mesma forma que o adulto, a necessi
dade dessa conquista essencial à vida da sociedade. Mobiliza
da aos seis anos de idade, a infância sentiu só os sofrimentos
das prisões e a escravatura de ser forçada a aprender o alfa
beto e a arte de escrever: qualquer coisa árida e aborrecida
da qual não podia julgar nem a importância nem as vanta-
t.ens futuras. Relegada aos bancos pesados, impulsionada por
castigos, aprendeu sob a coerção, sacrificando não só o seu
débil corpo como também sua personalidade.
Assim, sempre aconteceu na penosa história dos homens.
Todas as grandes conquistas são obtidas à custa de escrava
tura. Os grandes monumentos egípcios, a expansão marítima
de Roma, tiveram como necessidade primordial o sacrifício
de homens, forçados com açoites ao duro e monótono traba
lho de transportar blocos de pedra e de mover g s remos. Tam-
W-m para esta nova conquista de um grau mais alto de intelí-
71
gência, para adquirir o uso universal do ler e escrever, a hu
manidade teve necessidade de escravos e os escravos foram
as crianças.
No princípio do século X X , foi iniciadG um movimento
para aliviar as condições das crianças condenadas a “estudos
forçados'*, porém, por mais que se tivesse feito nesse sentido,
a criança está ainda hoje longe de ser considerada na pleni
tude de seus direitos naturais de homem.
Não se está ainda suficientemente persuadido de que a
criança que estuda na escola é um homem em potencial; que
seu valor não consiste unicamente em ser o meio de elevar o
povo a um nível mais alto de cultura, de atingir os objetivos
nacionais, de conseguir as vantagens práticas para a sociedade.
Ela possui os “seus próprios valores” e se a humanidade deve
ser melhorada a criança deverá ser melhor conhecida, sendo
respeitada e ajudada, porque a humanidade permanecerá im
perfeita como o é agora se persistirem os diferentes níveis de
desenvolvimento e as conseqüentes desarmonias que não lhe
permitem avançar no caminho para o progresso. A sucessão
dos infaustos eventos de nossos dias demonstra que é urgente
e essencial cultivar as energias humanas.
Nos países onde atualmente a educação obrigatória faz
sua primeira aparição, podem ser muito importantes as expe
riências precedentes, podendo estas partirem de um alto nível.
Não é preciso mais considerar a criança como um meio de
progresso, como um escravo que sobre suas costas deve acu
mular o peso do progresso da civilização. A educação deve
começar ajudando o desenvolvimento da própria criança e,
portanto, como incremento à potencialidade do povo.
As necessidades da criança, as ajudas necessárias para
sua vida, devem ser as preocupações fundamentais da educa
ção moderna.
“Necessidades das crianças” não são. somente as da vida
física. As da inteligência e as da personalidade como homem,
são muito mais urgentes e muito mais elevadas. A ignorância
é ainda mais fatal ao homem do que a desnutrição e a po
breza.
Muitos pensam que o respeito pela criança e a considera
ção por sua vida psíquica significa não esforçá-la, isto é, evitar
o trabalho mental. Ao contrário! Quando se leva em conside
ração como base as energias naturais ou, em outras palavras,
quando o plano da educação segue psicologia especial do de
senvolvimento humano, alcançar-se-á não só um vasto e rápi
72
do progresso na cultura mas se reaiizará também uma inten
sificação dos valores pessoais.
Os progressos da nossa civilização apóiam-se em bases
científicas. A educação, pontanto, deve também ser colocada
6obre essas bases.
Aprender a ler e escrever é o início da educação obri
gatória, o fundamento no qual se baseia e é considerado como
um dos muitos objetivos da instrução. É necessário, portanto,
que seja distinto de todo o resto da cultura. A posse da arte
de escrever não é uma pura habilidade mas representa a posse
de uma forma superior de linguagem que se acrescenta à lin
guagem natural, completando-se e integrando-se com ela.
A linguagem falada se desenvove natural mente em cada
homem, pois sem ela o homem seria um infeliz, um extra-so
cial, um surdo-mudo.
A linguagem é uma das características que diferencia
o homem dos animais. Ê um dom natural dado somente a ele,
uma expressão de sua inteligência. De que adiantaria possuir
inteligência se o ser humano não fosse capaz de compreender
e transmitir seus pensamentos? Sem linguagem, como poderia
associar-se a outros homens para alcançar um propósito co
mum, para executar um trabalho?
À linguagem falada se desenvolve naturalmente em cada
dos que estão perto e esta é a razão pela qual os homens,
desde a mais remota antigüidade, procuram outros meios, para
transmitir mais longe seus pensamentos e para fixar suas re
cordações. Sinais gráficos foram gravados nas rochas ou escri
tos em peles de animais. Destas tentativas, através de inúme
ras transformações, chegou-se ~gfadualmente à invenção do
alfabeto. Foi uma aquisição da máxima importância! “Esta
conquista — diz Diringer — é muito maior e mais importante
do que qualquer outra para o progresso da civilização, porque
ela pode unir o pensamento de toda a humanidade através do
desenvolvimento este sucessivo das gerações. A aifabeto con
sidera não somente este desenvolvimento externo, mas a pró
pria natureza do homem, porque completa a linguagem natu
ral, atingindo uma outra forma de expressão.”
Se o homem é superior aos outros animais que não pos-
#U#m uma linguagem articulada, então, o homem que pode
lt*r e escrever é superior aos outros homens que podem somen
te falar. Somente aquele que escreve possui a linguagem ne-
cèBsúria à cultura dos nossos tempos portanto, a linguagem
escrita não pode ser considerada somente como uma matéria
de estudo e uma parte da cultura, pois é ela uma característica
do homem civilizado.
O progresso da civilização de nossos dias não pode florir
entre homens que possuam somente a linguagem falada, sendo
portanto o analfabetismo o maior obstáculo ao progiesso.
Recentemente, por acaso, tive conhecimento de uma notí
cia. Na China, além dos movimentos e Chiang-Kai-Shek e dos
comunistas, há um outro movimento, nascido de um jovem
que está dedicando sua inteligência para simplificar a escrita
chinesa. Isto vai de encontro a uma necessidade de seus país,
que ninguém até agora havia compreendido. A atual escrita
chinesa requer o conhecimento de pelo menos 9.000 símbolos,
o que torna impossível remover a ignorância das massas. Aque
le jovem reformador, sem introduzir novas idéias, nem novas
formas de governos, nem melhores condições econômicas e
nem mesmo liberdade, conquistou na China uma grande po
pularidade e prestígio.
Ele é evidentemente um grande benfeitor para o povo
chinês, que sente necessidade de tomar parte no progresso
mundial; aquele progresso que só se atinge com a elevação
da personalidade. O povo chinês sente que seu direito fun
damental e primeiro é possuir as duas linguagem necessárias
ao homem civilizado. As duas linguagem são o ponto de parti
da e depois vem a cultura.
É necessário por isso distinguir na escola, de um lado as
duas linguagens, ligadas com a formação do homem, e de
cutro, a cultura que deve ser adquirida em um segundo tempo.
Com este propósito, indicarei minha experiência, obtida
através do estudo da criança, que pode ser muito útil àqueles
que se esforçam na eliminação do analfabetismo: a linguagem
escrita pode ser adquirida por crianças de quatro anos, mais
tacilmente do que por aquelas de seis anos, para as quais co
meça geralmente a educação obrigatória3. Enquanto as crian
ças de seis anos, com grande aflição e esforço contra a natu
reza, devem empregar pelo menos dois anos para aprender,
as crianças de quatro anos aprendem a segunda linguagem
em poucos meses4.
Essas crianças aprendem não só sem esforço e aflição
mas também com um grande entusiasmo. O fenômeno que
por mais 40 anos me tocou e fez surgir em mim o desejo
74
*
75
a escrita, porque ligou diretamente a linguagem escrita ccm
a falada fazendo daquela um complemento desta.
A linguagem falada é composta de poucos sons essen
cialmente distintos, de quantidade limitada* porque depen
dem da possibilidade das combinações dos movimentos dos
órgãos vocais que têm, por sua vez, um limite, que é o mesmo
para toda a humanidade. Em algumas línguas são usados so
mente 24 ou 26 sons essenciais, em outras, mais; mas os sons
são sempre limitados. Ilimitadas, ou quase, são as combina
ções destes sons, óu seja. as palavras. Não há limites para que
haja um enriquecimento de palavras numa língua, não há di
cionário que possa conter todas as palavras que podemos for
mar unindo letras e sílabas segundo as leis matemáticas das
combinações e permutações.
A linguagem escrita alfabética consiste em dar a repre
sentação, com sinais gráficos, de cada som que compõe uma
palavra. O resultado 6 que estes sinais são pouco numerosos,
isto é, tão pouco como são os sons. Esta representação é per
feitamente obtida nas línguas fonéticas. Mais ou menos per
feitamente toda linguagem escrita é baseada neste simples
princípio. O fato de que nem todas as escritas alfabéticas cor
respondem foneticamente à linguagem falada é uma dificul
dade resultante do alfabeto não ter sido aplicado completa
mente, segundo o seu significado, mas essa dificuldade pode
rá ser corrigida facilitando assim a escrita. Não há dúvidas de-
que as línguas e as suas traduçpes na escrita estão ainda em
desenvolvimento e continuámente se aperfeiçoando.
Esta é a razão pela qual a aprendizagem da escrita deve
ria começar de uma análise dos sons da palavra, pois este é o
caminho que deve ser seguido.
A escrita não deveria iniciar-se com os livros usados na
escola atual que começam representando sílabas e palavras
impressas: as cartilhas.
Para o uso correto do alfabeto na aprendizagem da escri
ta, deveriam ser dados somente os simples sinais do alfabeto,
colocando-os em relação direta com os sons que sao por eles
representados. Dessa maneira as combinações das palavras es
critas poderiam derivar diretamente da linguagem falada que
já está desenvolvida na mente* Isto é tão simples que pode
levar a escrever como por magia porque os sinais alfabéticos
são geralmente simples, de fácil execução, pouco numerosos
e, portanto, fáceis de serem recordados.
Um raciocínio lógico leva à conclusão de que se este pro
cedimento fosse aplicado, a escrita deveria surgir espontanea
76
«•
77
a posse de duas linguagens, uma natural e outra supernatural.
Com esta última o homem pode transmitir seus pensamentos
para pessoas distantes, pode fixá-los para seus descendentes,
pode enriquecer-se, através do tempo e do espaço, dos produ
tos intelectuais de toda a humanidade.
“É surpreendente — diz Diringer — que a história da
escrita seja uma “Cinderela”, tanto para os homens cultos
como para os incultos. Esta história não é objeto de estudo
na universidade, nem na escola secundária, nem na primária
e nenhum museu importante achou necessário oferecer ao pú
blico uma exposição demonstrativa do desenvolvimento da
escrita.” (D. Diringer, L ’Alfabeto)
Concentrados nos progressos externos, os homens não pres
taram muita atenção a esse mágico instrumento.
A escrita não é o alfabeto. A escrita é uma série de ten
tativas para transmitir o pensamento de um modo prático e
permanente. A sua história remonta há milhares de anos. O
homem no princício tentou representar os objetos de seu pensa
mento por meio de desenhos, depois simbolizou as idéias em
sinais e só recentemente encontrou uma solução simples no
alfabeto.
Não são as idéias que devem ser representadas por meio
de figuras, mas sim, a linguagem nos seus sons componentes,
porque somente a linguagem pode representar genuinamente
as idéias e o conteúdo dos pensamentos mais elaborados. O
alfabeto permite fazer isto porque traduz fielmente a lingua
gem falada.
No ensinar a escrever, a função do alfabeto não é leva
da em consideração. Ele é somente apresentado como uma
análise da linguagem falada. Fica submerso na escrita, sem
objetivo e sem interesse.
Constitui por isso um árido princípio de estudos. O seu
objetivo e a sua vantagem ficam escondidos por longo tempo
na mente da criança. A linguagem escrita é ensinada nas lín
guas perfeitamente fonéticas, do mesmo modo como se ensi
naria a escrita chinesa, que não tem uma relação direta com
os sons das palavras e que não possui a maravilhosa e prática
simplicidade do alfabeto.
A nossa experiência, que se iniciou com crianças entre
três e seis anos de idade, nos fins de 1906 em Roma, é, eu
creio, o primeiro e único exemplo de ensinar a escrever ligan
do diretamente os sinais gráficos do alfabeto com a linguagem
falada, sem o uso de livros.
78
*
79
A nossa experiência feita com crianças de quatro anos
(época na qual a escrita pode “explodir” como consequên
cia dè uma conquista já feita) foi muito importante.
A linguagem se desenvolve até os cincos anos de idade
e a mente se encontra então numa fase de atividade e inte
resse para tudo aquilo que se liga com a palavra.
É este o tempo, poder-se-ta dizer, “a estação da vida”
na qual a linguagem escrita pode frutificar. A frutificação
não depende somente da semente e da preparação do solo,
mas depende também da estação do ano na qual iremos plan
tar.
A análise da escrita no seu mecanismo* que permite ligâ-
-la alfabeticamente com a lingagem falada pode ser útil tanto
para as crianças como para os aduítos, mas a época favo^
rável é aquela na qual a linguagem falada espontaneamente
vai se completando e se aperfeiçoando. Este é c período sen
sitivo psíquico” colocado pela natureza, com tal objetivo, na
criança pequena. Pode-se aqui realmente usar o termo “desen
volvimento da linguagem escrita” , porque colocando o alfabe
to em conexão com os sons das palavras, as duas linguagens
se desenvolvem, se expandem e se enriquecem* como se fos
sem um conjunto orgânico.
A preparação do mecanismo é um processo natural. Tam
bém a linguagem falada começa com os balbucios prolongados
que fazem funcionar mecanicamente os órgãos da palavra.
Somente aos dois anos de idade, quando os movimentos estão
estabelecidos, a linguagem se desenvolve sob o impulso da in
teligência, que absorve então novas palavras e continua a aper
feiçoar a própria construção da linguagem, absorvendo-a do
ambiente e das pessoas entre as quais, vive a criança.
Existem, portanto, duas diferentes fases: uma na qual
o mecanismo (isto é, a ágil função dos órgãos da palavra)
vai sendo preparado através de longos exercícios, e uma segun
da fase, intelectual, na qual a linguagem desenvolve a sua
construção expressiva.
Esta segunda fase, isto é, o período intelectual do desen
volvimento natural da linguagem, pode ser ajudada pelo alfa
beto para o seu aperfeiçoamento do mesmo modo como no
adulto a inteligência se aperfeiçoa com a aquisição da cultura,
quando ele sabe ler e escrever..
O fato importante é que o alfabeto e a conseqüente habi
lidade de escrever “ajudam” o desenvolvimento da linguagem
na criança e sendo uma real ajuda ao seu desenvolvimento
80
natural, que chega no tempo certo, é absorvida com vital
avidez.
Os símbolos alfabéticos que são dados às crianças, como
nós damos, em forma de objetos separados, que se pode mane
jar, não agem somente como estímulos que requerem a ativi
dade da consciência em favor da linguagem articulada, adqui
rida primeiro inconscientemente mas levam a anlisar os sons
que compõem a palavra, dando também a esses sons uma
forma visível que permanece sempre diante dos olhos.
O alfabeto móvel é um instrumento obediente, que a mão
pode mover fazendo combinações e construindo palavras, como
se faria com as diferentes peças de um quebra-cabeças, que
leva a uma maravilhosa conquista.
E que conquista mais fascinante se poderia encontrar?
Aqueles poucos objetos permitem construir todas as pa
lavras que uma criança conhece e também as palavras pro
nunciadas por outros. Este exercício intelectual tão fácil repre
senta por isso uma ajuda para determinar, aperfeiçoar e esta
belecer a linguagem falada.
A base destes exercícios é evidentemente a análise da
palavra, isto é, “spilling” , o acabamento. É um exercício intei
ramente interior que permite fazer uma análise das partes
componentes da linguagem. Isto a criança não faria, nem po
deria fazer, sem possuir a chave que lhe é dada por esses sinais
visíveis e móveis.
A criança, deste modo descobre sua própria linguagem.
Cada tentativa para construir uma palavra é baseada sobre
uma pesquisa e uma descoberta: a descoberta dos sons que
formam a palavra que ela quer reproduzir.
Estes exercícios podem também interessar o adulto anal
fabeto e, de fato, foi provado que é assim. O alfabeto pode
•er para todos a chave que conduz à exploração da própria
linguagem, suscitando um novo interesse. O interesse surge,
não só motivado por essa análise que faz superar a dificuldade
de ortografia na linguagem escrita, mas também porque oe
«inais alfabéticos são bem poucos e embora pouco numerosos
podem exprimir toda a linguagem em qualquer forma e em
toda ocasião. Se um adulto, por exemplo, sabe de cor uma
l>oesia ou uma prece, então todas as palavras desta poesia ou
desta prece podem ser construídas. Ê fantástico pensar que
todo» os dias as páginas dos inumeráveis jornais, são todas com
todo» o» dias as páginas dos inumeráveis jornais, são todas
combinações do alfabeto, que as conversas que se escutam no
ambiente onde se vive, tudo aquilo que é transmitido pelo
rádio, são representados por tão poucos objetos: as letras do
alfabeto!
Pode-se oem compreender como o homem iletrado sen
te-se elevado espiritualmente por este pensamento que pode
ser para ele uma revelação e uma inspiração!
Mas não são estas idéias que fascinam as crianças e sim
as ações das energias vitais. Os exercícios com o alfabeto lhes
dão emoções exaltantes, pornue no período do desenvolvimen
to da linguagem existem nelas uma chama viva que arde em
cada obra da criação.
Na nossa primeira escola as crianças carregavam freqüen-
temente, como se fossem bandeiras, algüns cartões que repro
duziam as letras do alfabeto, mostrando-os com seus gritos de
alegria e ímpetos de entusiasmo.
Nos meus livros eu falo das crianças que passeavam
sozinhas, como monges em meditação, analisando as palavras:
‘Tara escrever Sofia preciso d e s - o - f - i - a.”
Uma vez um pai perguntou a seu filho que freqüenta-
va nossa escola: “Você vai bem?” O filho respondeu enfa
ticamente: “Bem?. . . B - E M - ” , pois aquilo que ele havia
compreendido era uma palavra e logo a analisava em seus
som componentes.
Os exercícios com o alfabeto móvel movimentam inteira
mente a linguagem e provocam uma atividade propriamente
-intelectual.
É necessário notar, todavia, que em todos esses exercícios
a mão não escreve. A criança pode construir palavras longas e
difíceis sem nunca haver escrito, sem nünca haver segurado
uma caneta.
O exercício de compor a palavra é somente uma prepa
ração para escrever, mas, nesse exercício são unidos poten
cialmente as duas coisas: o escrever, porque dos exercícios
resultam objetivamente a palavra escrita e o ler, porque quan
do se olha aauelas palavras escritas se lê. Por isso, esses con
tínuos exercícios de construção tanto da palavra falada quanto
da escrita, preparam não só para escrever, mas para escrever
corretamente.
As crianças geralmente escrevem errado quando estnn
na escola. Esta séria dificuldade da escola comum (tanto quo
na América existem hoje clínicas para correção de ortogra
fia) é resolvida inteiramente com as construções feitas com 0
alfabeto móvel. Este exercício prepara para ler sem livro a
para escrever sem escrever.
82
«■
83
Também para a mão que escreve são necessárias certas
coordenações, mas estas, entretanto, podem ser analisadas com
a demora na utilização do instrumento usado para escrever, o
fluente movimento necessário para traçar com a pena o minu
cioso desenhar das letras do alfabeto sustentando, ao mesmo
tempo, a mão leve e firme.
Da mesma forma que trabalhamos com as crianças da
nossa escola, para os adultos podemos inventar trabalhos ma
nuais que preparem suas mãos para a escrita.
Movendo os objetos nos exercícios sensoriais, as crianças
preparam a mão e todas as ações necessárias para o ato de
escrever (ver: Método de Preparazione Indiretta delia Scrittu-
ra).
Basta somente dar uma indicação exata de como utilizar
os instrumentos da escrita.
A exatidão no manejo dá à criança um novo interesse.
Na época da primeira infância elas são impelidas pela nature
za a coordenar os movimentos da mão, como se pode observar
no instinto de tomar em tudo, de segurar tudo e de jogar quase
todos os objetos. A mão da criança “na idade dos jogos” é
levada pela própria vida a preparar-se indiretamente para a
escrita. Nesta época a criança tem também paixão pelo desenho.
A imensa vantagem de ter uma mão nova e aninfada
por energias naturais não se encontra mais no adulto e nem
na criança de seis anos, pois estas já passaram e período sen
sitivo ( a idade do jogo, a idade de tocar) e por isso já se esta
beleceram ao acaso os movimentos de suas mãos.
No operário, a condição é ainda pior porque, aprendendo
a escrever, deve destruir qualquer coisa que o hábito do tra
balho já fixou em sua mão.
Justamente por esta dificuldade é importante preparar
a mão do adulto analfabeto com qualquer exercício manual
e especialmente com o desenho, desenho este não livre, mas
conduzido com precisão por qualquer meio que guie a mão e
permita obter resultados visíveis de desenhos decorativos e
bem feitos.
Teríamos assim uma espécie de ginástica preparatória
dos mecanismos da mão que se pode comparar, em sua fi
nalidade, à outra preparação intelectual da escrita feita com
alfabetário móvel. A mente e a mão vão sendo preparadas
separadamente para a conquista da linguagem escrita, execu
tando ações diferentes.
84
!ralt( agora o aio finòl, isto é, traçar efetivamente com a
mio o« símbolos alfabéticos que os olhos já conhecem.
( métodos comuns que são usados nas escolas consistem
fazer a criança copiar a letra já traçada e exposta como
mofjpln. Isto parece lógico, mas é somente ingênuo porque os
movlmontos da mão não têm nenhuma correspondência direta
com os olhos. Ver não ajuda a mão a escrever. É somente a
vontade que age quando se executa uma escrita copiando-a
de um modelo.
Não acontece como no caso da linguagem falada, onde
o ouvido e os movimentos da articulação da palavra têm
aquela misteriosa e íntima correspondência, que é uma das
características distintivas da espécie humana. Por isso, copiar
é um esforço artificial que conduz a uma série de tentativas
imperfeitas, fatigantes e desencorajantes.
A mão pode ser preparada diretamente para traçar os
sinais alfabéticcs e se algum sentido pode ajudá-la, este será
o senso tátil, o senso rr iscular, mas não a vista. Para isto pre
paramos para nossas crianças letras gravadas em lixas, coladas
sobre papel liso, que reproduzem em dimensões e forma as
letras do alfabeto móvel e ensinamos nossos alunos a tocá-las
exatamente, movendo o dedo sobre cada uma, no sentido da
escrita.
Este procedimento é muito simples e no entanto conduz
a resultados maravilhosos, porque a criança, dessa maneira,
poder-se-ia dizer, estampa a forma das letras na mão. Quando
começa a escrever espontaneamente, sua caligrafia é perfeita
e todas as crianças escrevem do mesmo modo, porque todas
tocaram as mesmas letras.
No caso de operários analfabetos, pode-se adotar o mesmo
procedimento. Qualquer operário é capaz de tocar as, letras de
lixa, guiado pelá sensibilidade tátil do dedo, podendo seguir
assim todas as particularidades dos simples desenhos relativos
ao alfabeto.
Eu sei que há cerca de dois séculos um artista que tra
balhava no Vaticano preparou desta forma a escrita caligrá-
fica, para uso de adultos. Naqueles tempos ainda se escreviam
a mão livros e pergaminhos, finas obras de arte. A caligrafia,
isto é, a bela escrita, era uma necessidade de especialistas,
mas tornava-se dificílimo executar as mínimas particularidades
de uma escrita perfeita.
Aquele artista pensou em fazer tocar os modelos, em vez
de copiá-los e obteve a preparação de calígrafos com uma rapi
85
dez e exatidão que haveria de requerer de outra forma, um
longo tirocínio, nem sempre seguido de sucesso.
Ê simples como o ovo de Colombo, é prático e lógico.
Então, quando tudo estiver pronto, a mente pode efe
tivamente escrever e se a mente já se exercitou na construção
das palavras pode “explodir” de repente, escrevendo logo pala
vras inteiras ou frases, como um prodígio, como um novo
dono da natureza. Assim aconteceu durante a famosa “explo
são da escrita” nas crianças de quatro anos. Elas escreviam re
produzindo a letra tocada e por isso escreviam bem, com uma
ortografia correta, já conquistada pela inteligência indepen
dentemente.
A rapidez com que as crianças aprendem a escrever é
espantosa. Nas minhas experiências elas receberam pela pri
meira vez o alfabeto no mês de outubro e na época do Natal
(25 de dezembro) escreviam cartas a seus pais. Antes disso
já escreviam na lousa saudações aos visitantes.
É bom por isso refletir que a mão daquelas crianças foi
preparada indiretamente para escrever pelo longo manuseio do'
material sensorial e que a língua italiana é quase perfeitamente
fonética podendo-se escrevê-la inteiramente por meio de so
mente vinte e um símbolos alfabçticos.
Também nas línguas não fonéticas acontece o mesmo
fenômeno, mas demora um pouco mais de tempo. Em todos
os países de língua não fonética como a inglesa, a holandesa,
a alemã, as crianças foram alfabetizadas também.
Quanto à leitura, ela está, de certo modo, envolvida nos
exercícios com o alfabetário. Em uma língua perfeitamentè
fonética poderia desenvolver-se ainda sem outra ajuda, que
não fosse um forte desejo de conhecer os segredos da escrita.
*
As nossas crianças, quando aos domingos passeavam com
os pais, paravam constantemente diante das lojas conseguindo
ler os nomes que estavam escritos, mesmo os qué eram escritos
com letras de forma e maiúsculas, embora õ alfabeto por elas
conhecido fosse cursivo.
Elas faziam um verdadeiro trabalho de interpretação,
semelhante àquele que se faz para interpretar as inscrições dos
povos desaparecidos.
Tal esforço podia nascer somente de um grande interesse
em compreender aquilo que estava escrito.
Certa vez, na nossa primeira escola, freqüentada por cri
anças filhas de analfabetos e que por isso não tinham livroí
86
s .
K
87
cartãozinho ao lado do objeto que nele está indicado. Num
período sucessivo são escritas nos cartãozinhos frases curtas
que indicam uma ação para ser executada.
Indicar nomes ensina a distinguir uma parte da oração;
indicar ações faz distinguir uma outra parte, isto é, nos verbos.
Assim, as primeiras leituras podem ser preparadas de tal
medo que se possa introduzir o estudo gramatical da lingua
gem.
A criança de dois anos não possui somente palavras, mas
também as sucessivas combinações necessárias para exprimir
o pensamento na linguagem materna. Porque não bastam as
palavras para dar o sentido. É também necessária a ordem
em que as colocamos para tornar claro o significado do que
queremos expressar.
Da mesma forma como a análise das palavras, nos seus
9ons componentes, durante o período da construção alfabética
ajuda as crianças na realização consciente de sua própria lin
guagem, também a leitura, baseada nas partes do discurso,
facilita o conhecimento da construção gramatical, das funções
de cada parte da oração e da ordem que cada uma deve ocu
par para tornar claro o período.
A gramática assume desse modo uma forma “construtiva”
ajudada por uma análise, não sendo como se costuma fazer
nos métodos comuns, uma espécie de anatomia que separa o
discurso nas suas partes, para analisá-las.
As pequenas leituras gramaticais são curtas, fáceis e cla
ras e ao mesmo tempo interessantes, sobretudo, porque são
também acompanhadas de atividades motoras, não só da mão,
mas de todo o corpo. Estas ativas leituras gramaticais condu
zem a um desenvolvimento das ações e dos jogos, que ajudam
a explorar a linguagem, isto é, aquela maneira de exprimir-se
que foi adquirida inconscientemente.
Por isso: a exploração da linguagem que já se encontra
construída é feita por meio de atraentes exercícios práticos,
ligados com a leitura.
Para que a leitura das frases se torne atraente elas são
preparadas com escritas não somente grandes mas em vária«
e vivas cores. Isto torna não só mais fácil a leitura, mas per
mite distinguir com facilidade as diferentes partes da oração,
É neste ponto, nesta época da vida, que a criança pode
ser ajudada a corrigir os defeitos gramaticais de sua lingua
gem, do mesmo modo que a construção alfabética ajuda a
ortografia.
88
No procedimento desta experiência se apresentam fatos
que são de difícil compreensão para aqueles que ainda não
estejam trabalhando em nosso método. Por exemplo: o fato
de não existir uma progressão sucessiva entre os exercícios, por
serem feitos em conjunto e podendo ser repetidos muitas vezes
àqueles que já tinham sido feitos. Os que seriam considerados
mais difíceis nas escolas comuns podem anteceder outros exer
cícios considerados mais fáceis, alterando-se uns aos outros,
na mesma manhã. Pode acontecer que uma criança de cinco
anos, que já sabe ler livros inteiros, volte a tomar parte en
tusiasticamente nas leituras gramaticais, participando de jogos
que já conhece.
A leitura apresenta-se então diretarnente no plano da
cultura, porque não se limita somente a fazer ler, mas pene
tra no progresso do conhecimento: o estudo da própria língua.
Durante esse brilhante procedimento são encontradas e supe
radas todas as dificuldades gramaticais. Também aquelas pe
quenas variações que as palavras devem suportar para adapta
rem-se às particularidades de um discurso expressivo: os pre
fixos, os sufixos, as flexões, tornam-se uma exploração interes
sante. As conjugações dos verbos têm suscitado uma espécie
de análise filosófica que faz compreender como o verbo numa
oração é a voz que fala das ações, não é a indicação de ações
efetivas que se estão concluindo e ergue diante da consciência
as diversas latitudes do tempo. Os verbos irregulares (tão di
fíceis de aprender) já existem na linguagem e é necessário
somente descobrir que são irregulares.
Ê completamente diferente de quando se estuda a gramá
tica de uma língua estrangeira, onde todas as coisas devem
«er aprendidas.
Mas não se estuda porventura assim nas escolas comuns,
ã gramática, a língua materna?
A própria língua é estudada como se fosse uma língua
©etrangeira.
Prescinde-se do trabalho divino e misterioso da criação,
*!<> maior milagre da natureza.
Ê fácil compreender que as leituras gramaticais, com sua
simplicidade e clareza possam ser usadas também pelos adul
tos analfabetos.
Do outra forma eles, para aprender a ler, deve: iam es-
fgrçar Ne para compreender a escrita de um livro que não
nenhuma atração na uniformidade monótona da estam-
l»s Isso requer a dificuldade de conhecer ao n :mo tempo
89
dois alfabetos diferentes: aquele com o qual se escreve e aque
le com o qual se lê.
A exploração gramatical da linguagem ajuda não só a
leitura mas também consegue estimulantes satisfações pois,
vai de encontro à linguagem que já se possui, enquanto ler
os livros faz concentrar sobre pensamentos que vêm de fora.
Praticamente, pois, para ensinar uma massa de homens
analfabetos não seria fácil encontrar muitos professores que
conhecessem bem a gramática, mas um material preparado
pode assumir esta imperfeição de professores improvisados e
a fadiga de ensinar para o próprio professor é aliviada.
Numa recente experiência feita na Inglaterra depois da
segunda grande guerra, uma professora escocesa disse: “Eu
me sentia embaraçada, com as muitas coisas a fazer, mas o
material supria a minha insuficiência, a classe estava se tor
nando uma verdadeira feitoria gramatical com operários, to
dos ocupados e alegre.”
A cultura em si mesma não deve ser confundida, como
disse no princípio, com aprender a ler e a escrever.
A criança de cinco anos não é culta porque possui a lin
guagem escrita, mas porque é inteligente e pode ter apreendido
muitas coisas.
De fato, as nossas crianças, aos seis anos, possuem já
muitos conhecimentos sobre biologia, geografia, matemática,
que são devidos diretamente ao uso de um material visível e
manejável.
Este, portanto, é um argumento diferente daquele que
desejo tratar aqui. Propus-me a tratar somente da atuali
dade que é a eliminação do analfabetismo nas massas.
A cultura pode ser transmitida através da palavra, do
rádio, e por meio de discos e projeções de filmes cinemato
gráficos. Mas sobretudo deve-se deixar operar através de ati
vidades, com a ajuda de materiais que permitam à criança
adquirir a cultura por si mesma, impulsionada pela natureza
de sua mente que obedece às leis de seu desenvolvimento.
Isto demonstra que a cultura é absorvida pela criança através
de experiências individuais, com as repetições de exercícios in
teressantes, para os quais sempre contribui a atividade das
mãos, órgãos que cooperam para o desenvolvimento da inteli
gência.
INTRODUÇÃO
CONTRADIÇÕES
III — AS “NEBULOSAS”
AN ALFABETISM O M UN DIAL