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JOSE T A V A R E S
PROFESSOR D A FACULDADE D E DIREITO
OS PRINCIPIOS
FUNDAMENTAIS
DO
DIREITO CIVIL
VOLUME II
Pessoas, causas, factos jurídicos
PESSOAS
CAPITULO
[
PESSOAS INDIVIDUAIS'
cês, seguindo êsse caminho, formulou um quasi s e a reversão foi estipulada para o caso de o dona-
completo sistema de presunções fundadas no dÚpl0 tário morrer antes do doador sem deixar descen-
critério da idade e do sexo. Assim, entre dois dentes, e s e êstes e o donatário morrem na mesma
falecidos no mesmo desastre presume-se : ocasião, não podendo saber-se qual se finou pri-
a ) sobrevivente o mais velho, se ambos eram meiro, tem lugar a presunção da morte simultânea,
menores de 15 anos ;- verifica-se portanto o pressuposto da reversão, e
b ) o mais novo, se maiores de 60 anos; devem os bens doados voltar ao domínio do doa-
c ) O mais novo, se um era menor de 15 e d o r ; mas se o acidente da morte contemporânea -
outro maior de 60 anos ; abrange também o doador, não haverá lugar a
d ) pertencendo ambos à idade de 15 a 60 anos, reversão, porque a presunção da morte simultâ-
o mais jovo, s e eram do mesmo sexo ; nea exclui o pressuposto do prefalecimento do
e ) o varão, se eram de sexo diverso, quando donatário.
fossem da mesma idade, ou a diferença não exce-
desse um ano (artt. 721.O e 722.O). 3. Condição jurldica do nasduro.- Com base no
Êrte sistema co~cplicado de presunçôes, d e princípio que faz depender do nascimento a origem
resto insuficiente, foi jústamente abandonado pela da capacidade jurídica, os autores formulam geral-
maior parte dos códigos modernos, que, como a mente a doutrina de que antes do nascimento O
nosso ( art. 1738.*), o italiano ( art. 924." ), e O bra- indivíduo não tcm, não pode constituir ~ r n a ' ~ e r s o -
sileiro (art. I r."), estabelecem a presunção de morte nalidade ('1.
simultânea, sempre que n8o possa averiguar-se qual O nascituro não tem direitos, mas vale apenas
dos falecidos contemporâneamente se finou pri-
meiro, -de modo que entre eles se não dá a relação
.como spes hominis (v.
Comtudo a protecção de que a lei cerca o indi-
de direito sucessório. víduo, logo que é procreado, tem um carácter tão
Para facilitar a prova do prefalecimento de pes- intensamente jurídico, que bem pode dizer-se que
soas falecidas contemporâneamente, deveria men- O = embrião constitui já uma certa personalidade,
cionar-se n o registo do óbito, não apenas a hora, embora não tenha a plena capacidade jurídica, a
como determina o art. 252.", n." 5.O, do código do- qual s ó se adquire pelo nascimento.
registo civil, mas também tanto quanto seja possi- Êste conceito duma personalidade jurídica res-
vel o preciso momento da morte, como se dispõe trita do feto, durante a vida intra-uterina, é O
no art. 146." para o nascimento de gémeos. que melho; corresponde à realidade da vida, e é
A presunção de morte simultânea, embora particularmente verdadeiro n o sistema do nosso
estabelecida pelo cbdigo para o direito de sucessão, direito.
deve igualmente aplicar-se (art. 16.") a todos os
casos análogos, para qualquer optro efeito jurídico
que dependa da prioridade da morte de uma pessoa
e m relacão a outra. E o que acontece por exemplo- ( a ) Coviello, pag. 144; Ruggiero, pág. 299; Dr. Alves
Moreira, pág. 164, 167.
nas doaçdes com cláusula de reversão (art. 1473.0): ( * ) Ferrara, pag. 466.
Já o art. 6." do código civil o exprimiu. dizendo partus quaeritur: quamquam alii antequam nas-
que o indivíduo, logo que 6 procreado, tem-se por catur nequaquam prosit ( D. 7 . I. 5 ), que mais
nascido para os efeitos declarailos na lei. tarde os comentadores reduziram A máxima -Nas-
Igualmente o exprimiu o art. 1776.", contando citurus pro i a m nato .habetzdr puoties de ejus
o embrião entre as creaturas existentes, capazes de commodis agitur.
adquirir por testamento. A lei coloca-o sob a sua protecção, tendo-o
Mas onde a lei consigna expressa e formal- como nascido apenas para o efeito de haver, quando
mente o conceito da personalidade do feto, antes nasça com vida, os interesses que lhe advierem no
do nascimento, é no art. 38." do decreto n." 2 de período da gesta~ão,mas não para os transmitir;
25 de dezembro de 1910, determinando que a acção de modo que se nasce morto, nada pertencerá aos
de investigação de paternidade ilegítima pode ser ' que seriam seus herdeiros, se tivesse nascido com
proposta, ainda antes do nascimento do filho, pela vida (art. 6.", 1 4 7 9 . O , I 776.").
mãe grávida, em nome dêle, contanto que faça Entretanto é de notar que a regra do reconhe-
verificar previamente a gravidez, nos termos do cimento da existência jurídica do cpncebido, apenas
art. 650.' do c6digo de processo civil. para a defesa dos seus próprios interesses, tem na
E não há, diz Chironi, na protecção que a lei nossa lei uma excepção, em favor da mãe pobre
confere ao nascituro já concebido, uma ficção: « o de filho ilegítimo, pois que ela pode, quando inten-
feto, embora oculto no útero materno, vive; e tar a acção de paternidade ilegítima, nos termos
assim como esta vida revela o processo de for- dos artt. 38.", 4 7 . O e 48." do decreto de 25 de dezem-
mação do organismo, que, segundo a ordem ne- bro de 1910, exigir não s6 os necessários alimentos,
cessária da natureza, deve desenvolver-se e com- mas também a indemnização de todas as despesas
pletar-se em prazos fixos, a lei, durante êsse com a gravides e com o parto, e ainda de todos 0s
período, em que não há ainda o homem, mas prejuízos que necesslriamente lhe resultarem dês-
em que êle se forma, considera essa esperan$a ses hctos.
de homem coiilo um ente ao qual é justo conser- A protecção jurídica dos nascituros revela-se
var os interesses que pelo seu nascimento e exis- não s6 na ordem civil, mas ainda na ordem penal
tência como pessoa serão reconhecidos como direi- e administrativa.
tosa (i). Na administração pública deve ela praticar-se
A equiparação do concebido ao nascido (con- pela instituição de maternidades e outras obras de
cepirrs pro nato habetur) é feita pela lei apenas assistência As mulheres grávidas, no sentido de
no interesse dêle, de modo que não aproveita aos promover ò mais perfeito desenvolvimento de
outros, como já se dizia na sentença de Paulo - todos os nascituros e assegurar O melhor êxito dos
Qzdz in utero est, perinde ac si in rebus hurnn- partos.
nis esset, custoditur, quoties d e comrnodis i p s h ~ s Na ordem penal a protecção realiza-se pela
punicão do crime de abarto (c6d. pen., art. 358.")
e pela suspensão das penas graves impostas à
(I) Chironi e Abello, Trattato, I, pag. 175 mulher grávida, até passar um mês depois de
terrilinado o estado de gmvidês (c6d. pen., art. uma antecipacão da personalitiade (1) ; é a mhxi-
113.0) (I). - ma conceptus pro nato habetur.
A protecção civil do nascituro manifesta-se Mas esta regra é por muitos considerada uma
por dois modos : por um lado, com a instituição pura ficção dogmática insusceptível de ser gene-
do curador ao ventre, que pode ser nomeado pelo ralizada. Nem sempre que esteja em j8go o inte-
juiz quando uma viúva fica grávida à morte do resse do embrião este deve ser considerado como
marido (art. 157.O); mas, pelo menos entre nós, sujeito existente, mas sòmente nos casos estabele-
pode dizer-se que se trata de uma instituição pura- cidos pela lei, e assim a regra vale apenas como :
mente arcáica (9; por outro lado, reservando-se síntese dos casos positivamente contemplados ( 2 ) .
a favor do- nascituro, e acautelando devidamente, -
os direitos provenientes de doação ou sucessão 4- Estado e capacidade civil - A doutrina @o
(artt. 1479.", 1776.", 1777.@,1867.0 e 1824."). estado e da capacidade civil no direito romano
No rigor do direito strito, diz Ferrara, uma fora construída, como é sabido, sobre o conceito do
disposição em favor de um concebido deveria tríplice status, de que -podiam gozar as pessoas - '
dizer-se nula, porque falta o sujeito adquirente, status libertatis, status civitatis, statzds familzae
mas a lei mantem tal disposi~ão,que fica suspensa - constituindo os dois primeiros condição essen-
at6 ao nascimento. Decerto se o concebida não cial da capacidade jurídica, e determinando o Últi-
chega h existência, a disposição caduca ; mas se o mo a distinção entre pessoas suz jzdris e pessoas
embrião vem à luz com vida, a disposição vale alieni juris, em virtude da qual estas últimas,
com efeito retroactivo ao tempo da concepção. estando sujeitas ao podêr de outrem, eram afecta-
E o nosso cbdigo (art. 1777." e 1 8 6 7 . ~ assim
)~ das de incapacidade na esfera do direito privado.
como o italiano (art. 764.O), contêm uma disposi- Muito diversa é a doutrina do estado e da
ção ainda mais anómala, pois admite a validade de capacidade civil no direito moderno : abolida a
disposições a favor de nascituros filhos de certas instituição da escravatura, equiparada a condição
e determinadas pcssoas vivas ao tempo da morte . do estrangeiro A do cidadão quanto ao gôzo dos
do testador, mesmo que nâo estejam ainda conce- direitos civis ( art. 26."), transformados profunda-
bidos. mente o conteúclo e a esséncia dos poderes fami-
O embrião é considerado, tanto para as doa- liares, que já não absorvem como outrora a capa-
ções como para as heranças ou legados, como sendo cidade jurídica dos indivíduos, a única condição
já nascido : dá-se em certo modo, como diz Planiol, para ser sujeito de direitos é o facto de ser homeni.
A capacidade jurfdica, isto é, a idoneidade para
ser sujeito de direitos, pertence portanto a toda a
( I ) É já do mais antigo direito romano o preceito que
gente; mas pode ser limitada pela ordem jurídica,
suspendia a execução capital de mulher gravida ( D. 3. 48. 19),
que passou para as legislaçóes modernas - Pacchioni, Corso sendo negada ao sujeito relativamente a alguns
.di Dzritto Romano, 1 1 , pAg. 88; Dr. Luis Osório, Notas ao
Código Penal, I , pág. 373. Planiol, Traite' de Droif CiozZ, I, n.' 367
(1)
(1) Os Przncipios, I , pág. 777. (a) Ferrara, págs. 466 e 467.
direitos, por motivo de sexo, de idade, de saúde obrigaçúes civis, ou seja a capacrdade civil das
física ou mental, ou ainda por efeito de condena- pessoas, tanto a capacidade jurídica geral ou abs-
ção penal. Assim, por exemplo, falta a capacidade tracta, como a capacidade concreta de agir, não é
jurídica h mulher dum modo geral para os direitos igual para todos os indivíduos; mas depende de
políticos,'ao menor de quatorze anos para fazer tes- um conjunto de qualidades, circunstâncias ou si-
tamento, A mulher menor de desasse'is anos e ao tuações pessoais do indivíduo, que determinam a
homem menor de dezoito, assim como aos demen- sua posição jurídica na ordeM social, isto é, O seu
. tes, para contrair matrimónio, aos cegos e aos que estado. A igualdade jurídica das pessoas (art. 7.O)
não sabem ou não podem ler para fazer testamento não significa identidade de posição'jurídica, pois
cerrado, ao cônjuge condenado pelo crime do homi- que não godem tratar-se dum modo igual seres
cídio na pessoa do seu consorte, para casar com o realmente desiguais. As pessoas dè facto apre-
conderiado pelo mesmo crime. Mas tais lirnita@es, sentam diversidades naturais entre si, quer de
por máis importantes que sejam, nunca podem ir desenvolvimento físico ou mental, quer de sexo
até ao ponto de aniquilar a capacidade jurídica, ou posição na família, quer de condição social, ou
destruindo a personalidade do homem: a morte podem encontrar-se e m certos estados legalmente
civil, que as legislaçóes antigas admitiam, foi com- determinados, que teem influência sobre a sua
pletamente banida dos códigos modernos. capacidade civil, O direito não pode desconhecer
Mas é necessário distinguir a capacidade jurí- estas variedades orgânicas, psíquicas ou civis, e
dica ou de gdzo de direitos, cujo conceito coincide deve tomá-las em consideração, proporcionando a
com o de personalidade, da capacidade de agir capacidade de agir às diversas condições da pessoa.
ou de exercer os próprios direitos, isto é, a idonei- Essas diversas qualidades ou estados são: o sexo, a
dade do sujeito para praticar actos jurídicos. E idade, as enfermidades físicas e mentais, a posição
que, se aquela não exige, em regra, senão a exis- da mulher na família, a condenação penal, a má
tência da pessoa, esta exige além disso Uma efec- conduta not6ria e o estado social (I).
tiva capacidade de querer, que riem todas as pessoas Estas situap3es ou qualidades caracterizam ju-
teem, podendo em algumas faltar por causas diver- ridicamerite a pessoa, são o seu estado jurídico,
sas, como a menoridade, a enfermidade, o casa- que determina a esfera ou medida da sua capaci-
mento ou urna determinada situação jurídica e social. dade civil, e por isso s e chama o estado pessoal
Intervem em tais casos o instituto da represe+ztacâo, ou o estado civil.
. em virtude do qual outras pessoas procedem em
Na doutrina francesa e italiana é corrente O
nome e no interêsse do sujeito incapaz, adquirindo
conceito de estado da pessoa para significar tècni-
por êle ou transmitindo os seus direitos; B o que
camente a posição do indivíduo na sociedade polí-
acontece, por exemplo, com os menores não eman-
tica e na família ( e ) .
cipados, com os interditos e com os comercia~ites
falidos, cuja representação é exercida pelos pais,
tutores, curadores ou' administradores. (1) Ferrara. pág. 489.
Vê-se portanto que a capaeidade de direitos e (1) Coviello, pag. 148; Ferrara, pag. 337; Colin et Ca-
pitant, Cours, I , págs. I 1 2 e 383.
9
Tal conceito, porkm, tem um valor histórico, que isto assim fbsse, não éra bastante para consti-
que no direito moderno perdeu o seu significado, tuir uma categoria jurídica Aparte. Mas nem isso
pois que o estado das pessoas abrange também é verdade, porque a iac cio na lida de pode mudar-se,
todas as outras qualidades ou situações jurídicas e ate há indivíduos, os sem pá-tria, que não per-
que determinam a esfera e a medida da capacidade tencem a nacionalidade alguma ; e por outro lado
civil. Estado e qualidade jurídica são conceitos as relações de família faltam a alguns indivíduos,
idênticos. como os filhos de pais incógnitos. Acresce ainda
Aquele conceito clássico do estado civil con- que no mesmo sentido uma relação de permanên-
serva-se na terminologia moderna como reminis- cia e necessidade se verifica também na ligação
cência verbal da concepção romana dos três status; da pessoa a um certo lugar (domicílio, residência),
, mas bem profundas são as diferenças que separam a qual todavia não entra nos elementos constituti-
o direito antigo do moderno. Com efeito, no direito vos do status. Além disso os caracteres d e
romano, para se ter capacidade era necessário ter o intransmissibilidade e irrenunciabilidade não são
status libertatis (ser livre e não escravo), o status específicos do siatus, mas comuns a todas as quA-'
civitatis (ser cidadão, porque o estrangeiro estava lidades jurídicas, resultantes como corisequência
fora do jus civile), e o status .familiae (ser s u i do princípio que funda no j u s publicum a capaci-
jwiq os filhos estavam sub potestate). O estado dade das pessoas, e, portanto, a todas as condiçóes
era portanto um pressuposto ou condição da perso- que caracterizam os seus diversos aspectos.
nalidade jurídica. Hoje, porém, que a personali- E assim o direito moderno realizou uma pro-
dade é reconhecida indistintamente a todos os funda transformação do conceito de estado, o seu
homens, que não há mais escravos, que os estran- alargameiito, de modo a compreender todos os
geiros gozam dos direitos civis, e que a posição lados da condição jurídica da pessoa (I).
na família não altera a capacidade de direito, o Mas qual é na técnica do nosso direito positivo
status não é mais uma condicão para adquirir a o significado e alcance da palavra estado 3 Será o
capacidade, mas sim um modo de ser, uma puali- mesmo que a expressão estado civil ?
ficação da pessoa, e por isso não difere de qualquer -
O problema foi cuidadosamente estudado pelo
outra qualidade jurídica que pode caracterizar o nosso ilustre colega Dr. Carneiro Pacheco, numa
sujeito, como a condição de menor, de interdito, interessante monografia--Do êrro acêrca da pessoa
de condenado, de falido e semelhantes. Alguns como causa de nulzdade do casamento, concluindo
escritores defendem ainda no direito moderno o que a palavra estado, quando referida a pessoas,
conceito clAssico do estado, notando que diferen- tanto no código civil como no do registo civil,
, temente das outras qualidades jurídicas, que são significa sempre o estadu czvi2, e que por isso o
acidentais e tra~csitórias,o estado tem os cnrac: mesmo sentido deve atribuir-se-lhe no n.O 1.0 da
teres de necessidade e permanência. ( I ) Ainda art. 20." do decreto-lei do casamento civil.
-
(1) Dr. Machado Vilela, Tratado elementar teórico e de mãe portuguesa, nascidoa em pais estrangeiro, que vierem
prútico de direito internacional prtvado, i , pág. 86 e 87. estabelecer domicilio no territdrzo da república, ou que perante
(2) *Pelo que respeita a nacionalidade, são portu- os respectivos agentes consulares ou a competente autoridade
gueses : estrangetra, declararem por si, sendo S Z L ~ - j u rOU i s pelos seus
r.O Os que nascem no ferritório d a republicn d e p a i p o r - legitimas representantes, sendo menores ?$doemanczpados, que
tzlguzs, ou de mãe portuguesa, sendo filhos ilegitimos; querem ser portugueses, devendo, neste caso, os mesmos agentes
2." Os que nascem no terrztóno d a refiública, de pai comunzcar a declaração d comzssão do recenseamento indtcada
estrangeiro, contanto que êste não reçrda ao serviqo da sua pelos interessados, nos termos do 3 i ? do a r t . 36.';
Nação, salvo Se, perante a municipalzdade da respectioa resi- 4 . O Os que nascem no territorio d a rephblica, de pais
dência, declararem por si, sendo suz-jurts, ou pelos seus legitr- incógnitos ou de nacionalidade desconhecida;
znos representantes, sendo menores não emancipados, que não 5." Os que nascem em pais estrangearo de paiportuguês,
querem ser portugueses ; que alt resida ao servtço de Portugal;
3." Os filhos de pai portuguks, ainda quando êste haja 6." Os estrangeiros naturalizados B.
sido expulso do terrztório d a rephblzca, e os filhos iiegitimos ( ' ) Dr. Vilela, Tra tado, pág. 89.
Em segundo lugar o n.0 1 . O do art. 18.0 declara tuguesa aos filhos de pai português, ou aos filhos
portugueses os filhos ilegitimos nascidos em Por- ilegítimos de mãe portuguesa, desde que venham
tugal só de mãe portuguesa. estabelecer domicílio em Portugal, ou declararem
E claro que esta disposição refere-se só ao caso legalmente que querem ser portugueses ( art. '8.0,
de o pai ser estrangeiro e de não ter reconhecido n.O 3: e # 1.O).
o filho antes ou ao mesmo tempo que a mãe: se o E O que se chama a nacionalidade por opção,
pai é portugugs, o caso está compreendido na pri- escdlba ou eleigão, que pode ser tácita (domicílio)
meira regra do art. 18."; se o pai é estrangeiro mas ou expressa ( declaração oficial ).
reconheceu o filho antes o u ao mesmo tempo que Tem-se entendido, por analogia do*n.O 2 . O do
a mãe, o caso está compreendido na regra do n.O 2.0 art. 18.~,que esta opção não é necessária para os
do art. 18.~. filhos de portugueses que se encontrem no estran-
Mas quid juris se o pai reconhece O filho geiro ao serviço de Portugal, porque êsses teem a
depois da mãe ? qualidade de cidadãos portugueses pura e simples-
. Entendemos que conserva a nacionalidade por- mente jure sanguinis C').
tuguesa, porque esta, uma vez adquirida, só se Mas se atendermos a que esta doutrina estava
perde nos casos do art. 22.0. expressamente consignada no 3 3.O do art. 7.0 da
Em terceiro lugar declara o art. 18." n.0 2.0, Carta Constitucional, e não foi reproduzida no
em obediência ao j u s soli, portugueses os que nas- art. 18.0 do código civil, parece-nos que a invocada
cem em 'Portugal, de pai estrangeiro, contanto analogia do n." 2 . O dêste artigo provaria antes O
que não esteja ao serviço da sua Nação, salvos o contrário.
direito de opgão pela nacionalidade dos pais ( j u s Mas como a doutrina da Carta foi reproduzida
sanguinis) e o de reclamar ou inutilizar essa opção no n.0 5.O do 3 3.O do art. 51.0 do regulamento do
quando haja sido declarada pelos pais ou tutores recenseamento militar, assim deve entender-se O
(art. [S.', 3 2.0). sistema da nossa lei.
O confronto do n.O 2.0 do art. 18.0 com os O facto de o menor vir domiciliar-se em Por-
n."' I." e 3 . O mostra claramente que a palavra pai tugal com o pai ou mãe exercendo o poder pater-
nele empregada, o foi no sentido genérico, isto é, nal, ou com o tutor, deve considerar-se como opção
pai ou mãe, e que se refere tanto a filhos legítimos tácita da nacionalidade (art. 4 7 . O , 137.' e seg. e 185."),
como aos ilegítimos. pois que o menor é representado pelos pais, e na
Em quarto e último lugar, pelo nascimento em sua falta pelo tutor (9. I
Portugal, são portugueses os filhos de pais incbgni- Uma variante da opção tácita consiste na ins-
tos ou de nacionalidade desconhecida (art. 18.'. crição do assento do nascimento do filho no registo
n.' 4."), sendo evidente que neste caso se com- consular ( 3 1 , quando a inscrição seja feita na pre-
preendem com maioria de razáo os filhos dos sem
pátria.
( i ) Dr. Alves Moreira, pag. 177; Dr. Vilela, pág. 93.
O nascimento no' estrangeiro também pode (2) Contra Dr. Vilela, pag. 94.
fazer adquirir, jure sanguirzis, a nacionalidade por- (3) Dr. Vilela, pag. 94.
sença dos pais; mas esta inscrição pode e deve qualidade de cidadão português a mulher estran-
considerar-se como opção expressa, pois o art. 142.' geira casando com um português ( art. 18.*,n." 6.0) ;
do regulamento consular declara que ela supre a e isto ainda que pela lei do seu país n8o perca a
dedaração prevista no n.O 3.O do art. 18.' do cbdigo sua nacionalidade; e conserva a nacionalidade
civil. portuguesa, ainda depois de dissolvido o casa-
Não prevê o código o caso de nascimento a mento, quer por di~7órci0,quer por morte do ma-
bordo, no alto mar ou nas Aguas territoriais. rido, visto que nenhuma destas circunstâncias é
#
Se o nascimento teve lugar no mar alto, a solu- considerada como causa de perda da qualidade d e
ção é nítida, diz o Dr. Vilela: o regime jurídico cidadão ( art. 2 2 . O ) .
do alto mar é informado pelo princípio da liberdade c ) Naturalisacâo. Adquirem a qualidade de,
dos mares, não existindo aí a jurisdição exclusiva cidadão português os estrangeiros naturalizados
de qualquer Estado, encontrando-se os navios sujei- (art. i$.", n." 5.O). OS artt. r g . " - a ~ . Oregulavam a s
tos As leis e jurisdições do seu país, e por isso o condiç0es e a forma da naturalização, mas foram
nascimento tem de considerar-se realizado no terri- substituídos pelo decreto de 2 de dezembro de I 910.
tbrio do Estado da nacionalidade do navio ( 4 ) . A palavra natf.craLi;acão tem dois sentidos :
Mas se o nascimento teve lugar a bordo dentro num sentido lato, é todo o facto pelo qual um
das águas territoriais de um Estado, entende o estrangeiro passa a ser nacional, como a opção e
notável internacionalista que o nascimento deve o casamento ; n o sentido restrito, que é o,próprio
considerar-se realizado no território dêsse Estado, o; técnico, é o acto pelo qual um Estado concede
fundando este modo de ver no art. 380.", n: 2 . O do ou reconhece a um estrangeiro a qúalidade de
nosso código civil, e no art. I.", n." I.', do decreto cidadão.
n.0 5787-1111, de ro de maio de r 919, segundo os « E dizemos concede ou reconhece, por a natu-
quais as á e u a s salgadas d a s costas entram no ralização ora aparecer como uma praca do poder,
domínio público como as á q z ~ a interiores,
s devendo como é regra na Europa, ora como um direito do
poi isso ser consideradas como uma parte do ter- indivíduo, como acontece na Grécia, e em geral
ritdrio nacional. na América, desde que êle se encontre nas condi-
Parece-nos, porém, mais 16gico e mais justo çóes previstas na lei » (').
considerar o nascimento como realizado sempre Entre nhs a naturalização é considerada como
i10 território do Estado a que pertence o navio. uma concessão graciosa. Segundo O art. I." do
E a aplicaçao do princípio que considera os navios decreto de 2 de dezembro de 19x0, O govêrno
como um prolongamento do território nacional, poderá cortceder carta de naturalização aos estran-
ainda mesmo quando se encontram em águas terri- geiros que a requeiram na câmara municipal da
toriais estrangeiras. sua residência, e que se encontrem nas seguintes
b ) Casamento. Pelo casamento adquire a condiçbes :
racionalista, procuraram determinar por outro pro- bém é idónea para criar entes, que não são imagi-
cesso a essência da personalidade colectiva, e des- nários ou fictícios, mas entidades efectivamente
cobrir um sujeito nos seus elementos constitutivos. existentes. 40 sujeito natural, representado pelo
Zitelmann, numa monografia sdbre o conceito homem, contrap0e-se o sujeito ideal, representado
e a essência das chamadas pessoas juridicas, publi- pelas pessoas colectivas : o sujeito não é portanto
cada em 1873, construiu nesta ordem de ideas a a vontade da associação ou a do fundador, mas
teoria da vontade ( I ) . 1 sim o ente que por aquela vontade é criado, e tem
Segundo Zitelmann, é a vontade o poder que uma existência efectiva embora ideal sòmente ( I ) .
cria o sujeito : uma vontade pública ou privada, Estamos em plena teoria da vontade, e em todo
que, manifestada em conformidade com as normas o czso no puro domínio da abstracção e das idea-
da ordem jurídica, é em si e por si capaz de dar lizaçôes. Tanto basta para se concluir que a teoria
vida ao organismo, e que por isso deve ser tomada é insuficiente.
em si e por si como sujeito. Ora esta vontade é As principais teorias realistas são a teoria
nas corporações a vontade complexiva, distinta das orgânica, a do patvimdnio-fim, e a da institufqão.
vontades singulares dos seus membros, e diversa Estas teorias são uma reacção ao mesmo tempo
da soma delas; e nas fundaçbes a vontade de quem contra as concepç0es metafísicas ou puramente
deu aos-bens um destino, a qual, objectivando-se, idealistas da personalidade colectiva, e contra as
se destaca da pessoa que a teve e a manifestou, doutrinas negativistas.
constituindo-se como entidade existente por si A que mais autoridade conquisiou, sobretudo
mesma. na Alemanha, é a teoria orqânica, que afirma a
Contra esta teoria basta observar que, se não existência de organismos sociais dotados de capa-
se. finge a existênda de uma pessoa, arvora-se em cidade jurídica substancialmente idêntica h capaci-
sujeito uma entidade abstracta, o poder da vontade, dade natural dos indivíduos.
e personifica-se a vontade, por meio de um processo Mas esta teoria oferece duas moddidades dis-
que em nada corresponde A realidade das cousas. tintas -a forma bzclógica ( Gierke) e a forma
Muito semelhante ,a esta, embora um pouco sociológica ( Michoud ).
diferente, B a teoria do ente ideal, de Cicala: as Segundo Gierke, o homem é considerado pes-
pessoas colectivas são entes ideais, criados pela soa emquanto é capaz de querer, e como há outros
vontade, mas que existem não obstante a sua natu- organismos naturais como o homem dotados de
reza puramente ideal. Assim como a vontade é vontade, a esses se deve estender também a perso-
capaz de dar vida As relaçdes jurídicas, assim tam- nalidade jurídica. Ora as corporações e as insti-
tulçdes forniam precisamente pessoas reais colecti-
vas, organismos sociais, que súrgem, ou por facto
natural histórico, ou por constituição voluntária, e
( i ) Begrcf und Wesen der sogenannten juristischen
Personen. Segundo refere Ferrara, Zitelmann abandonou
depois esta teoria. Ferrara, pág. 603, quaiifica de realista a
teoria de Zitelmann.
*
que são corpos sociais dotados de vida autbnoma. res, como Bernatzik, na Alemanha, e Michoud, em
Estas pessoas colectivas, que o direito não cria, França, trataram de modificar a teoria orgânica,
mas declara, são capazes de querer e de agir, e 'expurgando-a do vício orgânico biológico, e acres-
portanto devem gozar de uma subjectividade pr6- centando-lhe um elemento novo, o interesse digno
pria ( '). da protecção jurídica. '
Esta teoria, que era afinal uma simples aplica- Segundo esses autores, o que caracteriza a
ção da teoria organicista do conceito das socieda- essência ou substractum do direito subjectivo, e
des humanas, consideradas como verdadeiros orga- portanto da personalidade jurídica, não 8 só a
nismos vivos, teve um êxito clamoroso, apoiando-se cap~cidade de querer, mas também e principalmente
em metáforas brilhantes de S O C ~ ~ ~ O ~e Oilustran-
S . a existência do interesse jurídico ; e, por consequên-
do-se com as mais abstractas concepções de filóso- cia, são titulares de direitos, não s6 os entes indi-
fos do último quartel do século passado. E teve o viduais, mas também os entes colectivos, que
grande mérito de pôr em relevo a realidade das tenham um interesse colectivo e permanente, e
pessoas colectivas, estudando com abundância uma organização capaz de desenvolver uma von-
maravilhosa de dados a sua evolução, estrutura e, tade própria ( I).
vida, de ter provocado a extensão do conceito de Como se vê, êste aspecto da teoria orgánica
personalidade colectiva da esfera do direito pri- já se aproxima bastante da realidade da vida jurí-
vado As relações de direito público, e de ter exer- dica ; mas tem ainda o vício fundamental do orga-
cido uma influência benéfica no movimento legisla- nicisrno, considerando as próprias fundacoes como
tivo e doutrinário em favor do regime de liberdade entes capazes de desenvolver uma vontade própria.
das associações. Como reacção contra o carácter exclusivamente
Mas no terreno da sciência pura a teoria oiga- subjectivista do conceito das pessoas c~lectivas
nicista não resistiu à crítica severa que a breve apareceu uma teori-a realista, que eleva a sujeito
trecho se lhe contrapds : o conceito de organismo de direitos certos património^-os destinados a um
social idêntico a organismo natural, considerado fim de interesse colectivo. E a teoria do fiatuirnó-
como um superorganismo composto de várias per- azo-f2m ( Zweckvevmõqen), devida também a auto-
sonalidades humands, e tendo uma vida própria res alemães (.Brinz, Bekker, Demelius ).
corpórea e espiritual, foi afinal apreciado como -
Estes autores, repelindo a idea da necessídaiie
sendo o fruto de uma imaginação fantastica a piira de um sujeito representado sempre por pessoas
concepção mística e transcendente. Ilsicas, e concebendo como tal o complexo de bens
Foi naturalmente por isso que alguns auto- destinados a u m fim, personalizam êste organismo
patrimonial, isto é, o património emquanto B des- .
tinado a um fim social. Para estes autores, o patri-
(') Esta teoria foi largamente desenvolvida por Gierke
-
nas suas obras notáveis Das deutscke Gcnossensckafts~echt,
Genossenschaftstkeorie, irnd die deutsche R e c k t s ~ p r e c k u n ~e, Michoud desenvolveu e sua teoiia na celebre mono-
(1)
Deutsches Priuntrecht. -grafia - t a théorie de Ia personalité morale.
mónio não s6 pode pertencer a alguém, mas pode que se personaliza 6 o estabelecimento, o servigo
existir para alguma cousa sem pertencer a ninguém: público, a instituição: as pessoas colectivas são
aos patrimónios individuais contrapdem-se os patri- organizaçbes sociais para a realização de um fim,
mónios destinados a um fim. O fim é o ponto para o desempenho de um serviço. Não são entes
central, em volta do qual vem constituir-se um vivos com vontade natural, mas sujeitos intelec-
património destinado ao seu serviço. Por isso tuais, institutos personalizados. Esta teoria. não
rião h á que fazer uma distingão das pessoas, mas faz mais do que ampliar o conceito de instituição
sim a' distinção dos patrimónios. E um escritor a todas as categorias de pessoas colectivas.
(Schwartz) foi ainda mais longe, dizendo que no Ferrara critica assim esta teoria : sesta constru-
lugar do sujeito deve colocar-se o /zm juridico ( $). ção, que 6 bastante satisfatória para as instituiçbes
A teoria do patrinzónio-fim deve antes quali- e fundaçoes, perece forçada para as corporaçbes,
ficar-se de negativista, e como tal parece consi- suprimindo a colectividade dos associados, que
derá-la Ferrara, quando diz que ela se choca contra formam porém o elemento' dominante na estrutura
a possibilidade de admitir permanentemente direi- das pessoas colectivas de carácter associativo~(l).
tos sem sujeito. Mas, como quer que ela se con- Mas crítica bem frouxa é esta, e que afinal bem
sidere, é em todo o caso inadmissível, porque fal- se explica, porque a doutrina formulada por aquele
seia a posição dos associados nas corporações e eminente civilista não é no fundo senão a teoria
dos administradores nas fundações, reduzindo-os da instituição
a servos do fim, e desconhece os casos em que E 116s também penssmos que esta é a melhor
falta um património para nele se personalizar o doutrina.
sujeito, podendo haver, e havendo de facto, pes- As teorias negativistas partèm todas de um
soas colectivas que não teem um património, em- princípio comum: B o de que as pessoas colectivas
bora tenham capacidade de o adquirir ( 2 ) . se reduzem sempre a indzviduos associados ou orga-
Como teoria reàlista consideramos também a nizados, mas os sujeitos são eles mesmos. E por
teoria da institutcáo, elaborada pelos autores d e isso Ferrara os qualifica de individualistas.
direito administrativo francês ( ), e desenvolvida São ainda muitos os partidários da doutrina
na Alemanha por Ennecerus, Behrend e outros. que rejeita o conceito de uma personalidade co-
Segundo esta teoria, nas pessoas colectivas o lectiva, si3bre tudo entre os escritores alemães, o
( i ) Ferrara, pág. 602 e 603. A teoria do patrtmdsio-$m (I) Ferrara, pag. 607.
chegou a ter um certo acolhimento na Itália, sendo desenvol- (2) Basta notar que logo a seguir escreve Ferrara: r NO
vida por Bonelli- i.u parsonalita giuridica dei b e n ~rn kqui- estudo dêste terna eu tenho-me sempre e cada vez mais con-
dafione giudi3iaie (Rzuzstn italiana par le scien~egiurzdicke, vencido de que, conforme com o desenvolvimento histórico, as
1 8 8 7 ) ; La teoria Jella persona giuridita (Rzvista dz dzritto pessoas jurídicas teem um substracto diverso, irredutível a um
ciuzle, 1910). esquema único, e de que a unidade do instituto é dada apenas
( 9 Ferrara, pág. 603; Ruggiero, pág. 355 e 356. pelo conceito de sujeito jurídico, que o direito objectivo pode .
( 3 ) Hauriou, Précis de droit adminzstratif, pág. ó e seg. dar a qualquer substracto~.
que bem se explica porque esta corrente foi escritores alemães uma outra teoria negativa das
lançada e vigorosamente sustentada por um dos pessoas colectivas, segundo a qual tudo se reduz a
maiores espíritos de jurisconsulto da época con- uma relagão juridica. Assim: Ferneck ( I ) analiza
temporânea ( Ihering ). uma série complicada de relações distintas entre
, Segundo Ihering o sujeito encontra-se sempre membros e órgãos, entre órgãos e terceiros, e de
nos homens. Toda a instituição é sempre e neces- órgãos entre si ; Holder (3) distingue entre asso-
sàriamente destinada a benefício dos indivíduos, ciaçdes egoistas e altruistas, vendo nas primeiras
de especiais pessoas físicas ou grupos de pessoas; uma relação entre os indivíduos análoga B das
são porisso sujeitos nas pessoas colectivas de tipo sociedades (s), e nas segundas, em que se com-
corporativo os membros da associação, e nas do tipo preendem todos os entes públicos, uma relação
de fundacão os destinatários do património, isto entre os administradores do património e os asso-
é, a série dos indivíduos em proveito de quem os ciados; os administradores são sujeitos dum patri-
bens são destinados, como os doente's dos hospi- mónio de oficio, teem competência e obrigaçbes
tais, os mendigos dos asilos, e assim sucessiva- oficiais ; e esta realidade é mascarada por uma ficção
mente. Na doutrina de Ihering a personalidade de personalidade, isto é, pelo tratamento do patri-
colectiva é apenas um instrumento técnico, um mónio de ofício como se f6sse património dum
mecanismo, um veiculo das relaçbes que interce- ente diverso. Na mesma orientação diz Binder ( I )
dem na colectividade. E a personificação não é que, nas corporaçdes, sujeitos são todos os mem-
senão a forma de adaptação de um património aos bros. A unidade na pluralidade não existe: a
interesses e aos fins de pessoas indeterminadas (I), pessoa jurídica não é uma cousa em si, mas um
Na mesma Ordem de ideas Van den Heuvel conceito de relação. E Stammler (6) diz que a
considera a personalidade colectiva como absurda personalidade é apenas um m6todo de c9nceber
e inútil, dizendo que as sociedades personificadas unitiriamente as relaçbes dos membros. E, como
não são senão sociedades privilegiadas, e que dizia Meurer ( e ) , O tratamento unitário da plu-
nelas tudo se reduz a um complexo de privilégios ralidade dos membros nas corporaçbes ou dos des-
e derogações do direito comum; e Vareilles-Som- tinatários nas fundaçbes.
mières acrescenta: a pessoa jurídica é um simples A simples enuncíação das diversas teorias
efeito bptico, porque, na realidade, do que se trata
é de um regime especial por meio de clAusulas a
que estão sujeitas as sociedades personificadas (%).
f * ) Dle Rechtswzdrigkeit, pás. 244 e seg.
Modernamente tem sido definida por vários (2) h-aturlische und juristzsche Personen.
{ a ) Para compreensão desta terminologia deve ter-se
presente a distinção que na tCcriica juridica se faz entre asso-
( 1 ) Iheridg, Gelst des romzschen Rechts, rrr, $5 60 e 61 ; ciação (fimideal ou moral) e sociedade (fim lucrativo). Veja
Zweck zm Recht, pág. 460 e seg. ; Ruggieyo, pag. 355. as nossas Sociedades e empresas comerciais, capitulo I .
( 9 Van den Heuvel, De la situation Zégale des associa- (4) Das Problem der Re~htspersonlichkeit.
lions sans but lucrutzf en France et en Belgique, pág. 56; (5j Uebestimmtheit des Rechtssubiekts.
Vareilles-Sommières, Les personnes morales. (6 j Dze jurzsttschen Personen.
negativas mostra logo que só uma delas tem im- tam também potencialmente da obra da instituição,
portância apreciável. E a de Ihering, que, de e ainda mesmo a sociedade em geral. Neste último
resto, na sua essência, não é senão a teoria do aspecto a teoria transforma-se numa outra que foi
do património--fim, património ou propriedade dominante na época da revolução francesa, pela
coleciieia. que também, sob esta forma, tetn sido qual todas as fundações, sendo de interêsse público,
largamente defendida por alguns civilistas e publi- são dependências da soberania do Estado, que é o
cistas da moderna escola francesa ( I ) . único represenbnte dos interesses gerais. Porisso
Como justamente observa Ferrara, todas estas as fundações são corpos públicos administrativos,
teorias, procurando o substracto substancial que se e O Estado concedendo-lhes a personalidade, não
esconde no fundo das pessoas colectivas, perdem os faz verdadeiros proprietários, mas apenas os
de vista a-concepção da personalidade colectiva, a investe num serviço público, para o qual se podem
qual precisamente serve para evitar ou explicar considerar como institutos públicos descentraliza-
toda esta complicação de relações. Por outro lado dos e personalizados.
a teoria da reIação'juridica é incapaz de explicar Mas a verdade é. que nenhuma destas çoncep-
a unidade e permanência do ente, através de todas çóes B actmissivel.
as mudanças e vicissitudes dos sujeitos. Se é certo que o Estado exerce como poder
A's teorias negativistas é comum o modo es- político soberano direitos de vigilância, de reforma
pecial de conceber as fundaçbes, considerando-as e de supressão das fundações, não pode inferir-se
como patrimónios cujos sujeitos são os grupos dai que êle seja proprietário dos seus bens, como
de destinatários ou beneficiários. Esta é de resto de stationes $sei não autónomas. Pelo contrário,
a concepção primitiva que se elaborou històrica- a verdade é que a vontade do fundador tem o poder
mente. Com efeito, o conceito de fundação é um jurídico de criar um instituto independente, para
produto do Cristianismo; e pois que a única forma realizar um fim próprio, e não para fazer ao Estado
de pessoa colectiva no direito romano era a uni- uma doaçiio com encargo, a qual equivaleria a negar
versitas, procurou-se adaptar a êste tipo todos os a figura da fundação autónoma. Mais atraente
entes colectivos. Assim, os asilos de pobres foram parece considerar-se como sujeito o grripo dos
concebidos como collegia miserabilium, os hos- beneficiários. Mas o certo B que t a m b h esta con-
pitais como universitas leprosorum. E é preci- cepção não corresponde A essência do instituto,
samente esta idéa que inspira a teoria de Ihering, pois é bem manifesto que os destinatários da fun-
vendo o sujeito das fundações no grupo dos desti- dação não são os proprietários dos seus bens ( I ) .
natários, e dos outros escritores que consideram Em conclusão vê-se que, a doutrina negativista
como sujeitos o grupo das pessoas que se aprovei- da personalidade colectiva fica reduzida a um de
dois conceitos: ou a existência de patrimónios
sobre os quais ninguém tem direitos, nem mesmo
( 1 ) Planiol, Trazte Llémentaire de droit civrl, I , pág. 635
e seg.; Berthélemy, Traité élémentaire iEe droct a d m i f l ~ s t r a t z ~ ,
pág. 44 e seg. (I) Ferrara, pág. 605 e 606.
quaisquer poderes jurídicos, .o que é inadmissível, representativa dos interesses comuns, e indepen-
e até inconcebível, por ser contrário h própria dentemente dos interessados individualmente con-
noção de património ; ou então, e esta é a essência siderados, o Estado tem o dever de intervir, garan-
das diversas teorias negativistas, trata-se de patri- tindo instituição essa situação jurídica de que ela
mónios colectivos, que juridicamente são atribuídos carece.
a grupos de indivíduos, quer em propriedade, quer Esta situação jurídica é precisamente a-da per-
e m gBzo, quer em simples administração. sonalidade co:ectiva. E o seu fundamento está .
Mas dizer-se que há um grupo ou colectividade precisamente na satisfação duma real e efectiva
que tem o domínio, o gozo, ou ainda a mera admi- necessidade da ordem social e jurídica.
nistração dum certo. património, o mesmo é que E assim se vê, finalmente, como a teoria d a
dizer que essa colectividade é propriethria ou admi- instituigão, generalizada hs relações de direito pri-
nistradora dêsse património. vado, é a que melhor explica o conceito da perso-
, Reconhece-se, portanto, que há uma entidade nalidade colectiva.
c o l e c t i ~ a que tem e exerce direitos, ou poderes Mas como se explica e realiza o processo técnico
juridicos, se assim se preferir dizer, como se fosse da personificação? Qual é verdadeiramente a enti-
uma pessoa individual. E, tanto nas corporações -dade elevada a sujeito, ou qual é o substracto real
como nas fundações, é manifesto e intuitivo que desta personificação ?
êsses direitos ou poderes jurídicos não podem indi- A resposta é bem fácil, é mesnio intuitiva.
vidualmente pertencer a cada um nem ser exercidos O que s e personifica é a obra colectiva, O
por cada um dos interessados. estabelecimento ideal ou abstractamente conside-
Pois bem : todas essas entidades de carácter rado; é a instituzgâo.
colectivo ou social, instituídas para a realização Na estrutura jurídica da pessoa~colectivaentram
dum fim comum ou geral, e m harmonia com a dois elementos: o elemento real e o abstracto.
ordem jurídica, e que para a realização d o seu fim O primeiro é o facto real da existência d e
teem de entrar em relações jurídicas patrimoniais, agrupamentos de homens, em que estes se propõem,
precisam necesshriamente de nestas relaçbes proce- não já a realização dos seus pr6prios e exclusivos
der como as pessoas individuais, e por isso mesmo interesses, mas a realização de interesses comuns,
são e devem chamar-se pessoas colectivas. ou uma massa de bens especialmente afectada a
E assim, ao mesmo tempo que se determina o certos e determinados fins.
conceito da personalidade colectiva, se fixa também O segundo é a abstrayão pela qual a lei, e m
e justifica o seu fundamento jurídico. obediência a uma necessidade da ordem soeial e
Sempre que duas ou mais pessoas s e associam jurídica, transforma essa pluralidade de pessoas ou
para um fim licito, ou sempre que alguém destiha essa massa de bens em uma unidade juridzca capaz
um património para uma obra de interèsse da comu- de por si, e perfeitamente como uma pessoa, ini-
nidade política, desde que a instituição social por ciar e desenvolver o sistema de relaçóes necessá-
qualquer dêstes modos constituída careça de proce- rias a o melhor processo de realização do seu fim.
der nas suas relaç0es jurídicas como uma unidade O processo é de abstracgão, e não jicgâo,
porque esta supõe a invenção de uma cousa que que C. o substracto do ente colectivo, e é diverso,
não existia, ao passo que aquela, tendo na sua base conforme o ente é de carácter associativo ou insti-
uma realidade da vida, simpksmente interpreta e tucional, sendo no primeiro a associacdo de homens
organiza juridicamente um facto natural e realmente em vista dum fim, e no segundo a obra a realizar
existente, pela forma mais adequada A sua regula- por meio duma organização de homens e de bens
mentação ( I ) . postos ao seu serviço; o outro é o elemento formal,
. Nas corporaçties é subjectivada a unidade ideal que é a concessão da personalidade, ou seja o reco-
dos associados, a associagão; nas outras institui- nhecimento pelo Estado ( I ) ;
çOes ou fundações é a pr6pria obra ou servico b ) três elementos (Ruggiero): uma organi-
z'nstituido. Assim como os membros da associação gaçdo de pessoas ou de bens, um fim, e o reconhe-
se contrapõem ao ente colectivo, assim nas funda- ~ i m e n t opelo Estado (9) ;
çbes os administradores são representantes e fun- c ) cinco elementos ( Coviello) : I uma plu-
.O)
(1) Sociedades e enrpresas corne;ciais, pAg. 150; Coviello, (1) Ferrara, pág. 610e seg.
pag. 19;. (9) Ruggiero, pág. 359.
(') Ferrara, pág. 610. (3) Covkllo, pag. zoz e seg.
nalidade e o $m a realizar, fazendo -0s dois cle- fundamental, porque podem entretanto subsistir o
mentos uma completa fusão, sobretudo nas fun- fim e o fundamento da personalidade colectiva ( I ) .
dações. Nem a existência do ente colectivo é, em prin-
Por outro lado, a doutrina de Coviello, além cípio, dependente da constante identidade das pes-
de incorrer no defeito de incluir no elemento pes- soas: pode dar-se a mudança de todos os indivíduos,
soal a série indefinida dos beneficiários nas funda- de modo que a pluralidade pode transformar-se por
çóes, é excessiva na diferenciação dos elementos, substituições sucessivas dos seus membros, e toda-
destacando do elemento pessoal o património das via manter-se íntegra e idêntica a unidade orgânica
fundaçóes, e considerando ainda como elemento da corporação.
essencial da personalidade o animus personifZ- O efeito jurídico mais relevante da personali-
candi, quando é certo que a maior parte das vezes dade colectiva nas corporaçóes, uma vez consti-
nem sequer passará pela mente dos associados ou tuídas, é que todas as relaç0es patrimoniais, tanto
dos fundadores a idea da personalidade. activas como passivas, se referem daí por diante
Passemos pois a expor a doutrina de Rug- ao próprio ente colectivo, sendo inteiramente es-
giero. tranhas aos singulares membros, assim como as
I ) Orqani~açãode pessoas ou de bens. Nas relações destes são estranhas àquele; o principio
associaç0es a pluralidade das pessoas deve ser uma que governa a união é a perfeita separação da
pluralidade unitária, isto é, constituir uma unidade personalidade colectiva das personalidades singu-
corporativa, em que os indivíduos singulares como lares dos seus membros. E' o mesmo princípio já
que desaparecem no resultado final do processo de incisivamente formulado por Ulpiano, D. 7. I . 3 . 4 :
unificação, para dar lugar a uma nova personali- Si quid universitati debetgr, singulis non debe-
dade. Não é necessario, como se entendia em t u r ; nec quod dsbet universitas singuli debent.
. direito romano para os collegia ( I ) , um niimero O patrim6ni0, que também não falta nos entes
mínimo de tr&s pessoas afim de se poder tomar corporativos, tem uma função primordial nos outros
deliberaçóes por rilaioria, salva determinação es- entes (institutos, instituições, estabelecimentos,
pecial da lei exigindo um certo mínispo de pessoas, fundações), constituindo o seu substracto essencial.
como nas sociedades anónimas, que só podem
constituir-se com o mínimo d e dez sócios (cód.
com., art. 1 6 2 . O , al. I."). E, no rigor do direito,
S6bre a dissolução das sociedades por não existir
poderia mesmo a colectividade, depois de consti- (1)
mais do que um s6ci0, veja Sociedades e empresas romerczais,
tuída, ficar reduzida a um só indivíduo, sem que p a g 637 e 638. Ulpiano, D. 7. 2. 3. 4 : S i universitas a d unum
por isso a pessoa colectiva se possa dizer extinta, redit, m a g i s , a d m i t t t t u r posse eum conventre et connenirz,
embora lhe falte dai em diante o seu substracto cum jus ontnium i n unum retciderzt et stet nomen universzta-
tis. Mas entendem alguns romanistas que Ulpiano nao &-
mava que a universitas continuasse a existir como tal, mas
apenas que podia continuar a exercer as acções activa e pas-
. ( 1 ) Marcello, D. 85. :,o. 16: Neratius Priscus tres facere sivamente emquanto permanece o nomen universitatzs. Rug-
existzmat collegium, et hoc magis sequendum est, gero, pág. 360.
9
E por isso para estes entes é mais abstracto e arti- Na disposição directa não há êsse intermediário;
ficioso o processo da personificação, porque lhes e daí resuItou a grande controvérsia sobre a vali-
falta a associação de pessoas, que mais vivamente dade de tais disposições.
se presta A construção dum novo sujeito jurídico. Se para as disposiçdes modais nunca houve
Emquanto que nas universitates personarum bem dúvida de que o donatário, herdeiro ou legatário é
se pode compreender a formação de uma consciên- obrigado a cumprir o modo, criando a pessoa
cia e vontade colectiva distinta da dos sujeitos sin- moral com os bens destinados pelo instituidor,
gulares, que não é a sua simples justaposição ou graves dúvidas surgiram, porém, icêrca da validade
soma; mas antes a resultante da sua combinação e das disposições directas, por parecerem inconciliá-
interpretração, nas universitates bonorum não se veis com o princípio de que s6 podem adquirir por
vê tão fhcilmente onde reside essa vontade colec- testamento ou por doação as pessoas já existentes.
tiva, para servir de substracto jurídica 4 nova per- Mas os jurisconsultos pusecaa geralmente termo a
sonalid ade. tais discussões, pronunciando-se pela validade das
N6s pensamos, porém, e cremos ser esta a disposições directas para a funda~ãoduma pessoa
verdadeira doutrina, que também nas funda~ões colectiva, atendendo ao princípio fundamental do
existe o substracto jurídico duma vontade colectiva, direito de dispôr dos bens para depois da mcnte, e
mas que não é nem a vontade dos destinatários principalinente pela razão anal6gica da validade das
nem tão pouco a dos administradores. É precisa- disposiç0es a favor dos nascituros ( I ) .
mente a vontade do instituidor ou fundador, que -
I I ) O j5m. Que as colectividades e os patri-
mónios de fundação devam ter um fim,e que êste
sendo apropriada pela vontade geral da comuni-
dade representada na lei, passa a regular o futuro e seja Licito, é de per si intuitivo : o Estado não pode-
o destino final da fundação. ria tolerar que no seu territbrio se constituíssem e
O património pode ser qualquer massa de bens vivessem entes dotados de personalidade, tendo
( prédios, cousas móveis, créditos, dinheiro ), que .em vista quaisquer fins imorais, perigosos para a
o fundador destine a um fim e com a intenção de ordem pública, ou de qualquer modo contrários B
criar um ser permanente. ordem social e jurídica.
A vontade do fundador pode manifestar-se ou Mas além da ilicitude ou ilegitimidade, não há
por acto inter-vivos ou por uma disposição mortis outras limitaçoes da natureza ,objectiva dos fins :
causa. E por dois modos diversos pode realizar-se: podem ser de lucro ou religiosos, de beneficência
ou o acto de liberalidade (doação ou disposição de o u de cultura, de recreio ou de estudo; pode a
última vontade) impóe ao donatárfo, legatário ou utilidade estender-se a uma esfera mais ou menos
herdeiro, como encargo modal, a constituição do ampla de pessoas, como os habitantes dum muni-
novo ente ; ou a disposição é feita directamente a cípio, os membros duma classe, ou os nacionais
favor do ente, que por meio dela deve erigir-se.
No primeiro caso a disposição modal é dirigida a
um intermediário, a cargo de quem fica a fundação ('1 Para conhecimento das diferentes doutrinas sobre a
do ente. q u e s t ã o , - v e ~ ao nosso livro Sucessões e direzto sucessório, n."49.
dum país ; e pode o benefício limitar-se aos sócios assim de ter a sua base necessária, que é a vontade
da corporação, e ser o fim público ou privado. d o fundador, pois esta seria inexequível se não
Mas o que í: necessário é que se trate de fim deter- tivesse em vista um fim determinado, do mesmo
minado e razoável, duradouro e não individual: modo que seria sem causa, e portanto ineficaz, a
É impróprio o fim individual, por ser contrhrio vontade dos associados, s e ignorassem ' o fim pais
A própria razão d e ser das pessoas colectivas: é que se associaram. Mas bem podem os fins ser
inadmissível a constituição dum organismo com- múltiplos, se para váfios fins homogéneos e conci-
plexo para a realização de um fim que não interesse liáveis entre si se constituiu o ente, sem que a
uma maior ou menor pluralidade de pessoas. Mas multiplicidade destrua a unidade do corpo colec-
é indiferente que a pluralidade seja apenas um tivo (?).
grupo de articulares .ou seja considerada como I I I ) O reconhe~inzento.-O reconhecimento
uma parte do consórcio social. Q u e o fim não o u autorização do Estado não era exigido para os o
tenha necessàriamente de ser uma utilidade pública collegia na época da república em Roma. Foi só
é demonstra80 pelo facto de terem muitos entes mais tarde que se instituiu O regime da prévia auto-
colectivos, como as a s s o c i a ç õ e s de socorros rização confirmativa, quando se fez sentir a neces-
mútuos, sdmente em vista a utilidade dos seus sidade de suprimir alguns que funcionavam com
membros. .
fins inúteis ou iIicitos. Em todas as épocas da
O fim deve ser duradouro, e nao meramente história do direito se discutiu sempre mais ou.
transitório. Mas isto não significa que tenha d e menos acaloradamente a necessidade do reconheci-
ser perpétuo ou indefinido no tempo. Se e m regra mento ou autorização do Estado, como reqriesito
é perpétuo, todavia muitas vezes criam-se entes essencial da personalidade jurídica das corporações
colectivos, instituem-se fundaçoes, para a realização e fundações.
de fins e satisfação de necessidades que não s e No direito moderno pode dizer-se que triunfou
renovam perpètuamente, e que pelo contrário são definitivamente o princípio do reconhecimento por
determinadas e temporárias ; as sociedades fundadas parte do Estado, pois, como já acentuámos, os escri-
para certas obras públicas, como um canal, uma tores são geralmente confornies em considerar
ponte, as fundações destinadãs a estimular uma , êste reconhecimento um dos requesitos essenciais
descoberta scientífica ou industrial, e outras seme- da personalidade colectiva.
lhantes, teem desde o principio predeterminada Pclo que respeita ao direito portugugs, foi o
a duração da sua existência. Em resumo, o fim princípio expressamente formulado no art. 33.O do
deve ser duradouro e permanente, apenas no sen- código civil : c- Nenhuma associação ou corporação
tido de que seria insuficiente, para justificar a pode representar esta individualidade jurídica, nBo
criação dum n&o organismo, um fim fàcilmente se nchando*2eqalmezzte autoriqada».
realizável por uma só vez e pela acção duma s 6 E, sob um outro aspecto, o princípio do reco-
pessoa.
E não poderia o fim ser indeterminado: s
destinação ou aplicação do património deixaria (1) Ruggiero, pag. 364 e 365.
nhecimento é também formulado nos art. I O ~ . "107.O
, trinal, pois da solução num ou noutro sentido
e 108." do código comercial, para as sociedades derivam efeitos práticos diversos.
industriais e comerciais, exigindo que as sociedades Na doutrina daBccâo o acto do Estado, reconhe-
se constituam nos termos e segundo os trâmites cendo uma pessoa colectiva, tem carácter comtitu-
indicados na lei, para existirem com personalidade tivo, tem o valor de criar a personalidade jurídica.
j uridica. E êste modo de ver é também o de alguns autores
O reconheciinento pode dar-se por dois modos: de doutrinas positivistas, como Ferrara (L).
a ) ou determinadamente cnso p o r cnso, emquanto Outros autores entendem que o reconheci-
o Estado confere a capacidade jurídica a cada nova mento tem apenas um carácter declaratzvo, pois
instituição, depois de verificados os requesitos que a i n t e ~ e n ç ã odo Estado se limita a constatar
ou condic;óes que a lei considera indispensáveis ou verificar uma situação já existente. Esta é a
para a adquisição da personalidade; ou b ) dum doutrina realista pura: desde que existe um orga-
modo g e r a l para todas as categorias de pessoas nismo social com as condições ou requesitos de
colectivas, que adquirem a personalidade zpso facto característicos d a personalidade, há um prin-
j u r e , pelo simples. facto de se constituirem pela cipio jurídico geral que lhe atribui como aos homens
fórma prescrita na lei, como acontece com a s a capacidade j uridi ca.
sociedades comerciais ou civis (cód. com., art. Mas, como observa Ferrara, esta doutrina 6
I O ~ . " , 108.0), e com as corporacões cultuais consti- inaceitável. Um tal princípio geral não existe no
tuídas nos termos do decreto-lei de 22 de fevereiro sistema do direito positivo; a verdade é que o
de 1918. reconhecimento não é obrigatório para o Estada,
É para umas o regime da concessno ou auio- não havendo acção jurisdicional para o obter.
r i ~ a ç n oprévia, e para outras o de simples regula- Emfim, uma terceira doutrina atribui ao reco-
mentação ZqeZ ('). nhecimento um valor conpirmatzvo, porquanto a
Só uma pessoa colectiva não carece de reeo- constituição da pessoa colectiva resulta da combi-
nhecimento: é o Estado, como f à c i l m e n t e se dagão de dois factos: a formação autónoma por
compreende, pois não poderia reconhecer-se a si parte dos fundadores e a confirmação por parte do
próprio, podendo entretanto dizer-se que também Estado.
está sujeito h condição de reconhecimento interna- Qual destas doutrinas é a verdadeira?
cional dos outros Estados. N6s pensamos que nenhuma delas é aceitável
E qual é o carhcter ou o valor intrínseco d o como soluçá0 única, porque nenhuma B aplicável a
reconhecimento do Estado ? todas as espécies de pessoas colectivas. É o defeito
O problema não tem apenas importância dou- de wdas as soluções radicais, em problemas comple-
xos como êste.
Mas entendemos que todas elas são em parte
( ' ) Para os casos em que é necessária a autorização pre-
via ou é suficiente a constituição nos termos da lei, veja Socie-
dades e empresas comerczais,~pag.7 e seg. (I) Ferrara, pág. 615.
verdadeiras, pois cada uma delas é, com efeito, há até quem admita o reconhecimento por uma
aplicável a algumas espécies de pessoas colec- espécie de prescrição, ou posse de estado ; isto é,
tivas. , pelo facto de o ente se ter apresentado sempre
É assim que a teoria da criagão, ou do poder como pessoa colectiva ( I ) .
, constitutivo do Estado, é exacta para os institutos Consideramos decididamente injurídica a dou-
públicos personalizados, como, por exemplo, as Uni- trina do reconhecimento tácito. Mesmo quando o
versidades e Fatuidades universitárias, que sendo Estado autorize uma instituiqão não reconhecida, a
fundadas pelo Estado dêle recebem não s ó a inves- única cousa que se pode juridicamente dizer é que
tidura, mas a própria instituição, não podendo por- os agentes do Estado ou ignoravam a situação ile-
tanto deixar de se reconhecer que são criadas pelo gal dessa instituição, ou então foram eles mesmos
Estado. que cometeram uma ilegalidade. E nunca se pode
A teoria da simples declaracão é verdadeira dizer que um acto ilegal tenh'a a virtude de sanar
para todas as pessoai colectivas em cuja constitui- a ilegalidade duma situação juridicamente .irre-
ção o Estado não tem qualquer intervenção directa, gular.
limitando-se a formular, pelo sistema da regula-
mentacão legal, as condições substanciais e for- 16. Classificação das pessoas colectivas. - Dada a
mais da personalidade colectiva, como acontece grande variedade, pode dizer-se indefinida, de pes-
com as sociedades comerciais, e em geral com soas colectivas, impõe-se a necessidade de fazer a
todas as associaç0es licitas, para as quais não seja sua classificação em grupos, espécies ou tipos, con-
exigida por lei especial licença ou aprovação de forme os diversos aspectos ou pontos de vista a
estatutos, conforme o disposto na liberalíssima lei que podem ser referidas.
de 14 de fevereiro de 1907. E assim temos em primeiro lugar a mais antiga
E por fim a teoria da conpirmagZo é a verda- classificação das pessoas colectivas em corpora-
deira para todas as associaç0e.s e fundações, que, cões e fundacões, baseada na sua diversa estrutura
tendo já uma existência de facto, carecem de auto- . e organização.
rização do Estado para terem existencia legal, como Depois temos a classificagão -moderna, sem
acontece com as sociedades bancárias (lei de 3 de dúvida a mais importante, em pessoas colectivas
abril de 1896), com os sindicatos agrícolas, de pe- @úblicas ou de direito público, e privadas ou de
cuária, uniões de sindicatos, caixas de credito agrí- direito przvado, haseada na diversidade do fim,
cola mútuo (decreto n." 5219, de 6 de janeiro e no regime jurídico da sua organização e funcio-
de 1919). namento.
Alguns dos mais autorizados escritores ihlianos Ainda tem importância a distinção em pessoas
entendem que o reconhecimento pelo Estado pode civis e eclesidsticas, baseada na diversa natureza
também dar-se tacitamente, com a aprovação de
actos praticados pelo ente colectivo ou pela auto-
rização para praticar algum acto, visto qualquer Ruggiero, pág. 366 e 367; Fadda e Bensa, em TVin-
(I)
dêsses factos presupôr o reconhecimento prévio; e dscheid, Pandette, I , pág. 818 e seg.
do seu fim, e em nacionais e estrangeiras, con- condiç0es do gBzo, são impostas pela vontade dum
forme a sua nacionalidade. s6, que é a lei imutável para os interessados ( I ) .
E temos, .finalmente, a classificação legal do A imperfeição, ou o equívoco desta doutrina
nosso código civil em tempordrias e perpétuas, está em considerar como elemento pessoal nas fun-
conforme a sua duração e a natureza do seu objecto, daçoes a colectividade indefinida dos bencficiarios,
em pessoas morais e sociedades, conforme o inte- quando a verdade é, como já mostramos, que nas
resse que teem em vista. fundações o verdadeiro substrnctum subjectivo 6
res orientação completamente diversa, e adoptam^ Em compensação, em França, apesar das hesl-
uma solução quási cqmpletamente oposta. O pri- tações da doutrina, o supremo tribunal de justiça
meiro nega a personalidade das sociedades civis, ( Cour de Cassation ) firmou definitivamente? já
desde os fins do século passado, o princípio da per-
sonalidade jurídica das sociedades civis ( I ) .
(1) Para o conhecimento mais detalhado da questão da
personalidade das sociedades civis e comerciais, vcja Socie-
dades e Empresas comerciais, pag. 147 e seg. Colin et Capitant, r, pag. 668 e 669.
( i )
I*
Finalmente, para concluir o exame da classifi- jurídica ou universalidade de direito. Tais são:
cação legal das pessoas colectivas, deve notar-se a ) o estabelecimento comercial; b ) a herança ;
que os arts. 32.' e 3 5 . O do código civil fazem a c; a massa falida.
distinção das associações em perpétuas e tempo- A idea inexacta ou imperfeita, de considerar
rárias. o património das fundaçoes ou instituições como
E grande importância tem esta distinção, pois o verdadeiro sujeito dos direitos, podia induzir a
a restrição de capacidade patrimonial consignada errónea crença dc quc os patrimbnios acima men-
no-art. 3 5 . O é só para as corporações perpétuas. cionados devain ser tratados como pessoas. Mas,
É precisamente por isso que a distinção se não tendo etn vista a idea mais perfeita de que o patri-
funda apenas no tempo assinado A existência da mónio considerado como complexo de relações
pessoa moral, mas também na natureza do seu fim. jurídicas presupõe sempre um sujeito, e que não
. Como perpétuas se consideram, com efeito, sendo o estabelecimento comercial senão um patri-
não só as fundadas para viverem por tempo ilimi- mónio destinado a um certo comércio, é claro que
tado, mas também as que, embora fundadas para o sujeito dêste compl-exojurídico é o próprio comer-
tempo limitado, não tenham por objecto interesses ciante, indivíduo ou sociedade comercial, a qiiem
materiais. o estabelecimento pertence. A herança, quer scja
jacente, quer deixada em favor de nascituros, tem
22. Gorporaçaes e institulçées que não são pessoas por sujeito certas pessoas individuais, embora
colectivas.- Para uma exacta e completa determi- actualmente indeterminadas. Nem mesmo a he-
nação das pessoas colectivas, importa agora exa- ranca indivisa pode considerar-se uma pessoa, pelo
minar as corporaçbes e instituiçoes, que sendo €acto de o art. 2 1 1 5 . 0 dizer que a herança, ántes da
muito semelhantes, não gozam contudo do atributo partilha pelos herdeiros, responde so2idárÈamente
da personalidade juridi ca. pelas dívidas do autor dela, pois que este preceito
Segundo Coviello, podemos dividi-las em dois significa apenas que os herdeiros, emquanto não
grupos: aquelas que pela sua própria índole jurí- s e fizer a partilha. são solidariamente responsáveis
dica são desprovidas dos caracteres e elementos pelas dívidas do de c z ~ j u s . Também o.patrimÓnio
de facto necessários para constituir a personalidade do comerciante falido não deixa de ter como sujeito
cole~tiva,e aquelas que, apesar de terem tais carac- o próprio falido, o qual, simplesmente RYI interesse
teres, são pela lei declaradas incapazes de ser reco- dos credores, fica interdito da administração dos
nhecidas como pessoas ( I ) . seus bens. passando a ser representado pelo admi-
Assim, e em primeiro lugar, não são pessoas nistrador da massa ( cód. de proc. com., art. 198.0).
colectivas, por lhes faltar o elemento pessoal autó- Em segundo lugar, também .não são pessoas
nomo, alguns patrimónios análogos aos das funda- colectivas, por lhes Faltar o elemento do património
çdes, e como eles considerados como uma unidade autónomo, que sirva para os fins dum conjunto de
-pessoas entre si por algum modo coligadas :
a ) OS agregados corporativos; corpos cole-
(I) Coviello, pag. 206 e seg. giais ou colectividades desprovidas de clipacidade
patrimonial, tais como : as câmaras do parlamento, o grupo de comproprietários de cousa comum, pois
os corpos administrativos (juntas distritais, câma- que o regime que a lei estabelece para a proprie-
ras municipais e juntas de freguesia, pois que a dade comum não estabelece tal unidade jurídica.
personalidade pertence Bs circunscrições adminis- c I Não é pessoa a associação em conta de
trativas, de que aquelas colectividades são 6rgãos participação, porque a lei expressamente declara
ou representantes), os tribunais colectivos, os con- que ela não constitui individualidade jurídica ( cód.
selhos técnicos dos ministérios, e outras corpora- com., art. 224.' e 226.').
çaes semelhantes, porque os bens destinados A d ) Entre as sociedades civis não constituem
realização dos seus fins pertencem ao Estado ou à pessoas colectivas as de parceria agrícola, cujo
entidade da qual essas colectividades sáo órgãos. regime jurídico exclui a personalidade ( cód. civ,
b ) As diversas administrações do Estado, ).
art. 1.~99."-1303."
como os ministérios, as repartiçdes ou estabeleci- e ) Não é pessoa colectiva a Igreja católica
mentos do Estado, mesmo os da fazenda nacional universal, pois segundo o moderno direito ecle-
(stationes pisei), a não ser que a lei expressamente siástico português ( +creto de 20 de abril de 19I I,
Lhes confira a capacidade patrimonial, porque o s de 2 2 de fevereiro e de 8 de julho de 1918) a lei
meios financeiros de que tais estabelecimentos se só reconhece como pessoas morais de instituição
servem para os seus fins são-lhes fornecidos anual- eclesiástica a Santa Sé e as associações religiosas
mente pelo Estado pelas respectivas verbas orça- ou igrejas nacionais constituídas em conformidade
mentais. das leis portuguesas'(supra, d." 19).
c ) Não é pessoa colectiva a unidade ideal o u f ) E, portanto, não podem ser pessoas colec-
moral do conjunto de funcionários de cada ramo- tivas as associações religigsas que se constituírem
de serviços, de cada repartição ou estabeleci- sob a forma de congregações de carácter monástico
mento. ou conventual, porque todas essas são expres-
Finalmente, há várias corporaçcíes ou institui- samente proibidas.
ções, que embora tenham os elementos de facto
que constituem osubstracto essencial da personali- 23. ConstituTçHo das corporações e institu'ições. -
dade colectiva, não são comtudo pessoas colectivas, No exame dos princípios reguladores da constitui'-
porque a lei as não reconhece como tais ou proibe ção e organização das pessoas colectivas, há que
mesmo a sua existência. Assim : distinguir, em primeiro lugar, as que são criadas
a ) Não é pessoa colectiva no sentido técnico pelo Estado e as que são constituídas ou fundadas
jurídico a família, porque embora tenha todos os pelos particulares ou por outras pessoas públicas.
elementos materiais da personalidade colectiva, As corporações ou institutos públicos funda-
sobretudo no regime da comunhão de bcns, e n ã a dos pelo Estado, no exercício das suas funçdes poli-
lhe faltando até uma certa consciência de unidade- ticas e administrativas, são regulados pela respec-
moral e jurídica, o certo é que a lei não a consi- tiva lei ou regulamento, onde se devem estabelecer
dera como uma individualidade jurídica. todas as normas relativas à sua organização e vida
b ) Não é p.ela mesma razão pessoa colectiva interna.
Nestas pessoas colectirns o acto do poder p6- formação da pessoa colectiva, e a constituição su-
blico que as cria (lei ou regulamento j é de natu- cessiva ou p o r s u b s c r i ~ ã opública, com que a
reza constitutiva e orgânica, e portanto é nele que formação se prepara e desenvolve através duma '
se devem encontrar totios os princípios regu!ndores série de actos tendo por fim recolher as adesões dos
da sua existgncia e funcionamento. membros da associação, mediante a assinatura do
O mesmo acontece ainda, mas s6 em parte, documento (cédula ou boletim) emitido pelos pro-
com as associações ou corporações reguladas por motores, em que o subscritor se compromete a ser
lei especial, como as associaçóes de classe, as asso- membro da corporação a constituir, assumindo as
ciaç0es de socorros mutuos, os sindicatos agrí- obrigações correlativas. Quando pelas subscrições
cola ou pecuários, as sociedades de crédito ~ g r i c o l a houver o número bastante de aderentes, proce-
e todas as sociedades comerciais. Mas dizemos de-se i assemblea geral para a estipulação do
em parte, porque a outra parte é regulada pela von- acto constitutivo, com a qual se encerra êste pro-
tade das associações ou dos fundadores. cesso de gestação, encontrando-se a associação n o
'
Aqui s 6 temos que nos preocupar com os prin- mesmo ponto inicial em que se encontra na cons-
cípios reguladores das corporações e instituições tituição instantânea, isto'é, definitivamente consti-
que não teern -regulamentação em lei especial, fa- tuída (').
zendo a necessaria-.e Iundarncntal distinção entre Mas qual é a natureza do acto constitutivo?
as associaçbes e a s fundações. E certamente um acto jurídico, exigindo por
A existênc,ia duma corporação de tipo associa- isso capacidade dos su~eitos,validade do consenso,
tivo resulta do aclo constitufivo que a fundar, e objecto e causa lícitos.
estabelecendo as relaçdes de união entre os asso- Mas grandes divergências se teem manifestado
- ciados e do estatuto, que organiza a sua vida para sbbre a sua qualificação, considerando-o uns como
o futuro. um acto de criacão ( Regelsberger, Karlowa), que
Muitas vezes há uma situaç&ojurídica preiimi- vai muito além das relações das partes, chamando
nar: a iniciativa da constituição parte de um pro- à vida uma pessoa jurídica; outros como um acto
motor, ou mais reunidos numa sociedade suigene- unilateral; mas entre estes há ainda duas correntes
r i s (comissão organizadora), que dirigindo convites diversas: os que o consideram um acto unilateral
e programas ao público solicita a adesão dos futuros social ( Gierke, Lescot ) emanando e desenvol-
membros, para formar o substracto corporativo da vendo-se do prbprio organismo em formação, que
futura pessoa colectiva. Passam-se assini contrac- s e apresenta já e afirma como um sujeito, tendo
tos e relações de carácter preparatório, entre os a associação uma vida embrionária corporativa
promotores e aderentes, que ficam num estado (Gierke), espécie de gestação uterina garantida já
de pendência ou suspensão até que a corporação
venha a constituir-se ou se mostre inviávei.
Dois são, portanto, os modos de c ~ n s t i t u ~ ç ã o :
o mesmo processo da constituição das sociedades
a constituição simultânea, em que todos os mem- (1)
anonimas (cod. com., art. 1 6 2 , ~e seg.)-Soczedades e Empre-
bros reunidos procedem no mesmo momento A sas Comerciais, pág. 301 e seg.
pelo princípio coitceptus p r o nato habetur (Les- vários órgãos que cooperam no desenvolvimento
cot) ( I ) ; e os que o caracterizam como um acto da vida corporativa, as suas funções e competéncia,
colectivo, isto é, um acôrdo de duas ou mais decla- as condições e forma de escôlha das pessoas encar-
rações de vontade paralelas e dirigidas ao mesmo regadas dessas diversas funções; 4 . O os direitos
fim, e não cruzando-se entre si, mas encontrando-se e obrigaçoes dos membros em relação A associa-
num ponto de coincidência, como acontece nos ção; 5.O as normas sbbre modificação dos estatutos,
contractos (Kuntze, Windscheid, Dernburg, La- extinção da corporação e destino do seu patrimb
band, Coviello, Ferrara, Dr. Alves Moreira, Da- nio, nos casos em que a lei o permite (c&. civ.,
guit, Dr. Vital, etc, etc, ) ; outros consideram-no - art. 3b.O).
como acto bilateral, mas ao lado dos contractos Estes princípios formam o conteúdo tipico
( Biermann ) ; outros finalmente, coi~sideram-no dos estatutos, que podem entretanto ser mais
como um verdadeiro contracto, e esta é ainda, e ou menos pormenorizados, mais ou menos omis-
com razão, a doutrina dominante ( a ) . sos, e ser completados por meio d e regulamentos
O acto constitutivo é o acbrdo dos membros, anexos.
não só s6bre a existência e o fim da associação, Nas institu?çbes'ou fundações, o substractu da
sôbre os direitos e obrigações dos associados, mas personalidade colectiva não é uma colectividade de
até sobre os direitos especiais reservados a alguns pessoas, mas sim a obra a realizar vivificada pela
sócios, por exemplo, aos fundadores ( a ) . vontade do instituidor, que fornece os meios para
Muitas vezes com o acto constitutivo é con- a sua realização e dita-as normas que devem pre-
junto, e dele faz parte integrante, mas outras é sidir A constituição e ao funcionamento da insti-
distinto, e forma um simples anexo, o estatuto da tuição ou fundação.
associaçao, que em qualquer dos dois casos tem Ao acto de conshtuição das corporaç0es cor-
sempre a sua natureza jurídica própria: é o esta- responde aqui o acto de fundacão, e por isso
tuto fundamental e orgânico. alguns escritores teem concebido a constituição
O estatuto é a organi$acão constitucional da corporativa como uma fundação colectiva (Kuntze,
associação, o complexo das normas que regulam a Karlowa).
sua estrutura interna, o seu funcionamento e as Tratando-se de institutos criados por particula-
suas relações externas. res, ou por entes públicos que não sejam o Estado,
Em regra o estatuto determina: 1.0 O nome, o torna-se do mesmo modo necessário examinar
fim, e a séde da associaçao ; 2." os meios financei- separadamente a formação do substracto, que é um
ros com que se propõe realizar o seu fim; 3." os produto da vontade do instituidor, e o reconheci-
mento, que é dado pelo Estado ou pela lei.
O instituidor ou fundador declara pelo acto de
fundação a sua vontade de criar um certo instituto
(1) Lescot, Essaz s u r lu période constitutive des person-
nes morales, pág. a+z e seg. com carácter autónomo, precisando o seu fim e
( e ) V. Os Príncipzos, I, pag. 4a8 e seg. individualidade, destinando-lhe o património neces-
(a) Ferrara, pág. 136 e 137. sário para o seu estável funcionamento, e podendo
também formular as regras relativas i sua consti- O acto de fundação anallza-se, pois, num acto
tuicão e funcionamento, que devem ser respeitadas destinado h formagâo da pessoa c o l e c t i ~ ae numa
em tudo o que não for contrário à lei. disposipão patrimonial.
Do mesmo modo que na constituição das cor- Mas 6 na concepção de cada um dêstes actos
poracões voluntárias, se o acto de fundação não que surgec as divergências entre os doutores.
contém o estatuto completo da fundação, será êste Gierke considera o acto de fundação como um
elaborado i parte pelo mesmo fundador, pelos admi- acto social de criagão, um acto constitutivo da '
nistradores da fundação, ou pela autoridade que personalidade colectiva, emquanto que a dotação
promover ou fizer o reconhecimento legal. seria uma oferta de doacão a fundagüo nascitura;
A doutrina foi durante muito tempo hesitante Kohler diz que a fundacão é c r i ~ ã o é, uma decla-.
sôbre n natureza do acto de fundação. Da escola ração unilateral, que dá origem ao ente, e que a
francesa pode mesmo dizer-se que ainda até há dotação é tambhm acto unilateral, mas constituindo
pouco desconhècia a figura jurídica da fundaçao um tipo prbprio de acto ou negbcio juridico; Kar-
autónoma, isto é, a fundação-pessoa jurídica, admi- lowa vai mais lunge, e conjugando os dois elemen-
tindo apenas a fundagão indirecta ou fiduciária, sob tos do acto de fundadão, diz que não se trata de
a-forma-de,dotação ou-legado a uma pessoa física um negócio jurídico privado, mas de um acto ds
ou moral, para a realização do fim; e nesta orien- autonomia, pelo qual o indivíduo como ente social
taçáo definiam, Q acto sob o aspecto patrimonial, cria um sujeito de direito.
ora como doação ou legado modal, isto é. com Mas, seguindo orientaçáo diversa, muitos au-
encargo, ora como um depósito de capital conjunto tores vêem na disposição patrimonial uma doacão,
com um mandato para aplicar a renda perpétua- ou pelo menos uma jiberalidade, considerando-a
mente, -ora como uma disposição sob condição re- geralmente a doutrina francesa e italiana como
solutiva, e ainda em certas espécies de fundações sendo o fulcro de toda a fundação ( I ) .
como um verdadeiro contracto oneroso ( I ) . Parece-nos que a verdadeira teoria é a da cria-'
Foi a escola alemã, seguida depois pela italiana, cão, não a de Gierke, mas a ~ d eKarlowu, conju-
que profundou a doutrina da fundação autónoma, gando os dois elementos da fundação, pois que
pondo em relêvo como o acto de fundação é prin- ambos são essenciais, não sendo admissivel, neiãl
cipalmente destinado A criação de um instituto, h sequer concebível, o poder de o indivíduo criar
instituição de um sujeito jurídico, e sbmente como uma pessoa colectiva, sem ao mesmo tempo lhe
meio, h disposição patrimonial para o serviço da destinar o patrim6nio indispensável $t sua vida.
nova personalidade. E concordamos também com Ferrara em con-
siderar bastante a qualificação do acto de fundação
s Code Xapoleon, r, n.O 586 e seg. ;
como acta juridico; divergimos, porém, na sua
(1) Demolombe, C o u ~ de
L a u r ~ n t ,Princzpes de Drolt C z v z l , XI, n . O 1 7 j e seg.: Planiol, qualificação como acto unilnteral d u m a declara-
n." 3030; FéneIon, Lei Fondations e t les &tabltssements Éccle-
stasttques, pág. 83 e seg. ; Dejust, Fondatzons des Messes,
pág. j o e seg.
/') Covielio, pág. 214 e seg.; Ferrara, pág. 641 e 642.
cão de vontade não retírável, que fica perfeita vou-se fiel As tradições e ao espírito do direito
desde que seja manifestada em forma iddnea, e português ( 1 ).
portanto firme, ainda no caso de o fundador morrer Estabelecido que as fundações podem resultar
ou se tornar incapaz (I). de acto inter-wiwos ou mortis causa, surgiram
Parece-nos que é necessário distinguir entre prolundas divergências, e por longo tempo se tra-
as fundações por testamento ou por acto entre varam grandes disputas, sdbre a validade das dispo-
vivos. N o priíneiro caso está certa a doutrina do siçoes testamentárias destinadas h fundação directa
acto unilateral. de uma pessoa moral (9.
Mas sendo acto iizter-vivos, entendemos que
a fundnqizo d bem um contracto entre o fundador e
o Estado, considerado como o sujeito jurídico da
(3 O código brasileiro, regulando as fundações nos arti-
sociedade ( % ) . E' que, na verdade, a fundação, no gos a4.O-30.0, diz no art. z4.O : s Para criar uma fundação, far-
fundo, nào é senão uma doação feita P sociedade lhe há o seu instituidor, por escriturapublica ou testamento,
em geral. Ora, desde que ela se não pode tornar dotação especial de bens livres, especificando o firn a que a
efectiva, senão pelo reconhecimento ou aceitação destina, e declarando, se quiser, a maneira de administra-la>-
do Estado, mediante a aprovacão dos seus estatu- E no a r t a6.O: %Velará pelas fundações o Ministkria P i i b l i c ~
do Estado, onde situadas S. Nada diz, porém, sòbre a revogação
tos, nos termos da cláusula I . = do art. 5 . O do das disposiçdes instituidoras, donde deve concluir-se que se
decreto de 25 de maio d e 19x1, que regula 0s servi- aplicam as regras dos testamentos ou dos contractos, conforme
ços da assistência pública, 6 verdadeiramente um a disposição foi por uma ou outra forma.
contracto entre O fundador e o Estado. (4) Em relação ao nosso direito, dizia o Dr. Alves Mo-
reira, Insl , pag, 307: *Não pode suscitar-se, portanto, entre
Ferrara, no silêncio da lei italiana, fez a cons-
n6s a questão se por testamento pode constituir-se um patri-
trução jurídica da fundacão, manifestamente orien- .mónio para uma fundação directamente, pois na artigo referida
tado pela doutrina germânica, e especialmente pelo ( é o art. 1902.0)previne-se o modo por que deve electuar-se a
código alemão, que regula as fundações como actos liquidação desse património, para que seja aplicado ao fim a
jurídicos unilaterais, considerando-os revogáveis que o testador o destinou. A fundação, porkm, so existe desde
at8 ao momento em que intervem c reconhecimento que sejam aprovados os seus estatutos pelo governador civil,
e é á pessoa que seja incumbida pelo testador d e executar o
do Estado, que fa7 surgir o novd ente (c6d. ale- testamento que cumpre promover essa aprova@o. Ao gover-
mão, § 81 ). nador civil compete, quando s6bre o assunto não hajam provi-
N6s, porém, no silêncio da nossa lei, preferi- denciado os seus ínstituidores, regular, com aprovaçân do go-
mos aderir ao sistema da cbdigo brasileiro, que, verno, a fundação e administração de estabelecimentos d e
apezar de orientado no sistema geral da doutrina instruçâo, de beneficencia ou outros de utilidade pública (cód.
adm., a r t z52.', n.O 9.G)>.
germânica e especialmente do cbdigo alemão, Mas o certo é que o art. r902.a esta muito longe de s e r
nesta mathria, como em muitas outras, conser- bastante para resolver a grave questão da validade ou nuli-
dade das disposições testamentárias directamente dirigidas B
criação de uma pessoa moral, pois se limita a prever a hipo-
tese de o testador mandar empregar o produto de certa p a r t e
(I) Ferrara, pag. 642. da heranca em alguma fundação, podendo bem entender-se-
(3) Os Prznt iptos, r, pag. 4 r9 e 4ao. que se refere a fundações já existentes; mas, de resto, n5o se-
O importante e grave problema tem sido regu- Eesta doutrina parece-nos incontestável, mesmo
lado nos códigos modernos, e por leis avulsas em no sistema clássico da capacidade de adquirir por
alguns países, como na Itália ( I ) . testamento restrita As pessoas (herdeiros ou lega-
Entre n6s ainda a questão não foi resolvida tários) existentes ao tempo da morte do testador,
por um texto de lei, sendo de notar que nem o pois que as fundaçbes de utilidade pública outra
decreto de 25 de maio de 1911, sobre a assistência cousa não são que disposições a favor da socie-
públ:ca, contém qualquer disposição que a resolva. dade em geral representada na personalidade do
Apenas a cláusula I." do art. 5." regulou o modo Estado.
d e tornar efectiva qualquer obra de assistência Para mais completamente ilustrar a solução d o
devida a iniciativa privada ( 9 ) . problema vamos reproduzir a eaposiçao que dela
Mas n6s sempre entendemos e sustentamos faz, e a solucão que apresenta, o eminente Ferrara.
q u e C válida tanto a disposição testamentária para Pode a fundagão ser instituida rnortis causa
a ciiação duma pessoa colectiva de utilidade pú- em um testamento, no qual náo s6 seja declarada
blica, como a disposição a favor de um ente colec- a vontade de fundar. uma obra, mas como $m d e
t i v o já existente de facto, embora não legalmente dotacão seja a mesma obra chamada herdeira OU
constituido, desde que legalize a sua situação ( 8 ) . legatária do património do testador. Em tal caso
a relação é concebida como vocação heredithria
d e pessoa futura, e por isso, duma parte invocou-se,
~ e f e r eaos casos de o tesrador destinar, em vez do produto, os para sustentar a sua nulidade, a regra de que não
próprios bens. se pode instituir herdeiro ou legatário uma pessoa
' ) Na Itália foi a secular questão resolvida pelo art. 84.- que não existe, que não se pode considerar a dis-
d a lei de i 7 d e julho de I@, sâbre a s instituições pícblzcas d e . posição como feita sob a condição si nascatur,
benepkência, bispondo que toda a vez que o nothrio estipule
porque o mesmo seria que abolir o principio da
doagóes ou procedS a abertura de utn testamento em que por
mode d i ~ e c t oou iasrecto se fundem institutos tendo caracter existência do instituido no momento da devolução
d e benefichncia piiblica, é bbrigado a fazer comunicação do hereditária, e que não é possível na falta dum texto
facto ao sindico, o qual por sua vez é obrigado a avisar a d e lei dar efeito retroactivo a o decreto de reconhe-
Congregação d a Caridade, a qual deve tomar a s providtncias cimento ; e ex adverso, para sustentar a validade,
conservatonas e praticar os actos necessários para obter o
explicou-se não sér verdade que o ente não exista
~econhecimentod a parte d a autoridade governativa. Coviello,
pag. 216. n o momento em que é fundado, pois tem'já uma
(' ) Art. S.", cl. I . * : a Toda a obra de assisttnaa pri- personalidade inicial ou embrionária pela qual pode
vada, seja qual for a sua designação, não tem, para funcionar, equiparar-se ao embrião, tendo assim aplicacão O
outro dever a cumprir além d a participação da sua natureza, princípio conceptus pro nato kabefur. e que por
iins e representantes a commissáo competente de assistência
dentro d a área da sua séde, ou a Direcção Geral de Assis-
outro lado o reconhecimento legal não cria o ente
tência se a sua esfera de acção se estende a todo o pais ou a j u r í d i ~ o ,mas serve s6 para complctá-10 e declara-10,
mais de um distrito, e a apresentação dos seus estatutos à apro- e portanto tem carácter retroactivo, e que, final-
v q ã o do governador civil S. mente, nas fundações s e trata d e um legado a socie-
( 3 ) Sucessões, n." 49. dade, e que a sociedade existe sempre, não tendo
senão que pedir como herdeiro ou legatário a auto- mónio seja reservado e vinculado para o futuro,
rização para o aceitar. na expectativa dessa eventualidade. De resto, a
Como se vê, diz Ferrara, péssimas razões duma tese da validade das fundações m o r t i s causa tem
parte e doutra (crítica que n6s repelimos em rela- uma longa t r a d i ~ ã oa seu favor, a começar pelo
ção i s .razões pro validade), que foram com muito direito romano, através de todo o direito intermé-
brilho ilustradas perante os tribunais, onde preva- dio e na jurisprudência do direito comum, de tal
leceu a tese da validade, mas não tanto pela bon- modo que Gierke p6de bem dizer quc devc reco-
dade dos argumentos, como pelo intuito prático nhecer-se como um princípio d e direito consuetu-
que felizmente guia a magistratura na solução d o s dindrio ( I ) .
casos em harmonia com as exigências das relações Temos examinado até aqui a constituição do
jurídicas. substracto material das pessoas colectivas: u m a a s a -
Mas o problema era mal apresentado : não se ciaçào d e pessoas nas corporações, e destinação
trata de ver se é lícito instituir herdeiro ou lega- de um património nas fundacOes, tudo para u m
tário o ente que não existe (porque é intuitiva a fim lícito, que alem disso precisa ser de interêsse
solução contrária), mas de ver se sob forma de g-a1 nas institui~6espersonalizadas.
disposicão testamentária pode fazer-se um acto Mas elemento essencial da constituição das
de fundação. A fundação não é- vocação de her- pessoas colectivas é ainda o reconhecimento legal,
deiro ou legado, e por isso não é governada pelos como já observámos.
-- princípios sucessórios, mas é um aegócio auto- A constituição do substracto corporativo ou
nomo de instituição de uma obra ou de destinação institucional por vontade das partes, diz Ferrara,
de um património. Se também toma a veste testa- não faz surgir mais do que associaçóes ou institui-
~ e n t r l r i a ,se também é contekdo dum testamento, ções não autónomas; ter-se há numas uma plura-
não é porém instituição de h e d e i r o . Nao há que lidade de pessoas cam um patrim6nio conurn, nas
dar importância as expressões. do testador, mas outras destinação ou afectação de um património,
sim ao sentido-e ao fim da sua disposição. A questão que pode revogar-se ou dissolver-se a todo o mo-
portanto é virgem, e não influenciada ou domi- mento. Aquilo que transforma estas colectividades
nada pelas regras materiais que regulam as dispo- ou instituições sociais em pessoas jurídicas é a
sições de última vontade, pois que a fundação intervenção integrativa do Estado. O reconheci-
mortw5 cuusn é um teirtium genus, e não uma mento não é simples legalização do substracto, não
espécie daquelas. Sendo assim, é pelos princípios é o nulla osta oficial em face do ente já formado
intrínsecos dos negócios de fundação ou destinação ou o simples registo do seu nascimento: mas é
que deve formular-se a resposta á questão de saber concessão de personalidade, é criação de sujeito
s e é possível vincular por acto mortis causa u m jurídico » ( 9).
patrimbnio para um ente a instituir. E posto assim
o problema, não se pode duvidar um momento da
licitude dum tal procedimento, pois que se a fun- (1 ) Ferrara, pag. 645 e 646.
dação deve nascer no futuro, é legitimo que o patri- (e) Ferrara, pág. 648.
Na mesma ordem de ideas tem-se entendido dizer que há realmente uma intervenção do Estado
entre n6s que a autorização legal, a que se refere o a autorizar ou a completar a constitui'ção da pessoa
art. 33.0 do cbdigo civil, significa que a constituTção colectiva.
de todas as pessoas morais, isto i, de todas as Por conseqüência, a doutrina da concessão da
pessoas colectivas de utilidade pública ou pública personalidade ou criação do sujeito jurídico pela
e particular conjuntamente, tem de2ser aprovada autorização do Estado s6 se pode admitir, e no
pelas competentes autoridades administrativas, para sentido de ser um dos elementos componentes,
que fiquem sendo consideradas individualidades em relação as pessoas colectivas que efectivamente
jurídicas. carecem da autorização governativa.
E assim escrevia o Dr. Alves Moreira: «Se- Ora, segundo a nossa legislação, nem todas as
gundo a nossa legislação, o princípio relativo A pessoas morais carecem da autorização governativzr.
constituição das pessoas colectivas de utilidade Careccm de aprovação dos estatiitos pelo go-
pública ou que tenham fins ideais é o de que deve vernador civil todas as fundaçaes nas t m o s do
haver um reconhecimento especial dessas pessoas art. 252.O, n.0 8." do código administrativo de 1896
pela autorização da sua constituição, autorização e da cláusula 1.a d6 art. 5.0 do decreto de 25 de
que se considera virtualmente concedida pela apro- maio de 1 9 1 1 .
vação dos seus estatutos» ( I ) . Mas pelo que respeita As associações, já yimas .
Mas nenhuma destas doutrinas é inteiramente que não se pode deixar de considerar revogado o
verdadeira. art. 252.O, n.O S.", do código administrativo de 1896,
A doutrina de Ferrara s6 é verdadeira em- pela lei de 14 de fevereiro de 1907, salvo para as
quanto considera o reconhecimento legal como um que sendo reguladas por lei especial efetivamente
elemento ou requesito essencial da personalidade carecem de autorização do govêrno ou de aprovação
colectiva ; mas não 6 verdadefra quando atribui h dos estatutos pelo governador civil (supra, n." zr ).
intervenção do Estado pelo reconhecimento a f6rça Mas qual é o alcance do valor constítutivo,
de criar o ente jurídico: seria a pura teoria da ou antes confirmativo (supra, n." 15) da autoriza-
criacão de Gierke, que aliás Ferrara não aceita. .ção ou aprovação governativa? O reconhecimento
De resto, a verdade é que na forma do reco- terá a virtude de sannr os vícios que eventual-
nhecimento prévio e genérico da regulamentação mente afectem o acto de constituição ou de funda-
legal, pelo qual se consideram legalmente consti- .ção, por modo que uma vez constituído o corpo
tuídas, e com personalidade jurídica, as associaçoes moral êste existe legalmente em relaçáo a todos,
de mero interesse particular, desde que se consti- ainda que se prove que a constituição ou a funda:
tuam nos termos prescritos na lei, nem se pode $30 é ~zulapor defeito de forma ou da vontade,
por incapacidade, pelo seu conteúdo ou por outras
causas, que hajam passado desapercebidas A auto-
ridade que deu o reconhecimento?
( 1 ) Dr. Alves Moreira, lnst., pág. 305. No mesmo sen-
tido a citada consulta (supra n.' 2 1 ) na Revisda de Leg. e de A opinião dominante na Alemanha ( Fischer,
Jurisp., LV, pág. $ 1 1 - 2 1 6 . Kohler, Wellwig) é, com respeito as associac0es
inscritas, que emquanto a inscrição n ã c é revogada,
esta produz validade formal, porque a validade do 24. Organização das pessoas colectivas : estrutura '
substracto é um presuposto, e não uma condição da interna e representação externa. - As corporações sao
eficácia do reconhecimento, de modo que a sua colectividades compostas de sbcios ou membros,
falta pode ser causa de impugnação do acto admi- que são em regra pessoas individuais, mas podem
nistrativo, mas não um motivo de nulidade ; ácêrca também ser pessoas colectivas, como acontece nos
das hndações as opiniões são ainda mais incertas, consorcias administrativos ou bancários, muito fre-
pois emquanto uns, como Hellwig, aplicam o mes- quentes nos grandes países. O número de mem-
mo critério, outros distinguem entre invalidade do bros não é sempre determinado, podendo variar
acto de fundação e errónea apreciação do mesmo indefinidamente desde as sociedades d e dois ou três
acto por parte da autoridade governativa, admi- sbcios até um número indeterminado de membros,
tindo no primeiro caso a ineficácia, no segundo a camo acontece nas corporações territoriais, nas coe;
possibikidade de revogaçáo do reconhecimento pres- poraçdes profissionais ou associaçdes de classe, nas
tado. cooperativas, etc.
As condiçoes da admissão de fiovos membros
Por seu lado Ferrara entende que em todos os
casos o reconhecimento dado As corporações e fun- resultam dos estatutos ou aa lei, podendo ser exi-
dações faz nascer um sujeito de direitos, quaisquer gidns condições de idade, de sexo, de religião, de
que sejam os vícios que afectem o substracto, os profissão, de estado social, moral, etc.; e póde AS
quais poderão determinar a revogação do decreto vezes a admissão ser condicionada apenas pela suces-
de reconhecimento ou do registo, quer expontâ- são hereditária, ou pela compra do título de sócio,
como nas sociedades por acções. A qualidade de
neamente por parte da autoridade, quer mediante
recurso ou impugnagão por parte dos interessados. membro póde ser documentada pela inscrição num
Mas no intervalo o ente existe e é capaz de agir, registo existente na séde da corporação, ou ser incor-
para se extinguir s6 no momento ( e não ex tunc) porada num titulo ( quota ou acçiio ), que pode ser
em que o reconhecimento lhe fôr retirado ( i ) . transmissível conforme se determinar nos estatutos.
Nós pelo contrário entendemos que, sendo o Ás vezes a adquisiçãa da qualidade de mem-
substracto do acto de constituição ou de fundação o bro resulta de uma dada situação de facto ; masem
elemento essencial e primordial da existência da regra é um acfo de vontade, ao mesmo tempo do
pessoa colectiva, a nulidade do substracto importa associado que quer entrar e da associação que quer
a nulidade ou inexistência legal do ente colectivo, admiti-lo. Há em tal caso, na entrada do novo
É o mesmo principio consignado no art. 107." d o membro, um verdadeiro contracto, não nos pare-
cendo aceitável a doutrina daqueles que, como Fer-
c6digo comercial, considerando como não existen-
tes as sociedades que na sua constituição não obser- rara, dizem tratar-se de duas declaraç0es uniiate-
varem as prescrições da lei. rais que correm paralelas a a mesma linha sem
formar um contracto (I).
B
(') Ferrara, pág. 648 e 649.
( 1 ) Ferrara, pag. 656.
... .'i?
... ..
ser decidida em cada caso, em harmonia com o fim E, portanto, sempre que os administradores
da corporação ou instituição e os estatutos que a pratiquem um acto contrário aos legítimos inte-
regem ( I ) . resses, ou aos fins, O que e o mesmo, do ente
Alguns autores pretendem resolver o problema colectivo, não s6 incorrem em responsabilidade,
dum modo geral pelo chamado princípio da espe- mas o acto deve ser declarado nulo.
cialidade d o fim, segundo o qual todas as pessoas E assim, modificada neste sentido, a dout6na
colectivas teriam uma capacidade patrimonial deter- de Ferrara, parece-me ainda a melhor sohição do
minada e limitada pela sua pr6pria natureza, ou, o problema.
que equivale ao mesmo, seriam afectadas de uma Para exacta e perfeita compreensão do prin-
incapacidade geral para praticar quaisquer actos cípio geral da capacidade civil das pessoas colecti-
que não entrem na esfera do fim especial para que vas, deve finalmente notar-se que elas teem a
foram constituídas, mas que pelo contrario con- capacidade abstracta ou de g d ~ ode direitos, mas
duzem a fins diversos, que não s e encontram com não teem em si mesmas a capacidade concreta, de
aquele em necessária dependência. E assim um agir ou de exercer os próprios direitos. E não a
ente que tem fins de lucro não poderia praticar teem, porque, de facto, materialmente a não podem
actos de beneficência, como um outro que tenha ter, faltando-lhes o substracto real duma pessoa
fins de cultura não poderia estender a sua activi- física ou individual dotada de uma vontade sen-
dade a fins religiosos, e assim sucessivamente. sível.
Mas ser8 admissível o princípio? Dum modo Por consequência, s6 podem proceder ou actuar,
geral, os partidários da ficção dizem que sim, os por meio dos seus representantes.
14
O s partidários da teoria da realidade pura, muito diferente da tutela civil: é a legítima inge-
Gierke e seus adeptos, atribuem L pessoas colecti- rência do Estado na vida das pessoas colectivas,
vas uma verdadeira e prbpria capacidade de agir, e que aliás se exerce não no próprio interêsse
concebendo os indivíduos que de facto procedem destas pessoas, mas na defeza dos interesses gerais
por elas, não como representantes, mas como da sociedade, que elas se propõem realizar. E a
brgãos, isto é, como partes componentes da pes- isto ainda acresce que nem todas as pessoas colec-
soa colectiva, do mesmo modo que o cérebro, os tivas estão subordinadas inspecção ou ingerência
nervos, os ouvidos, a boca, etc. no organismo d o Estado ('1.
fisico. Mas êste conceito, por mais engenhoso que Mas se por um lado é justo reconhecer a m p h
seja, diz bem Covieilo, não é conforme B verdade, capacidade aos corpos ou entes morais, par outro
porque náo s6 não existe a reaIidade das pessoas lado é necessário opor-lhe certas limitaçães ou res-
colectivas concebida por esta fbrma, mas porque triçbes.
6 inexacto considerar os indivídiios representantes As pessoas colectivas de utilidade pública ou
nem mais nem menos que as partes ou brgãos dum pessoas morais teem geralmente por carácter a
organismo vivo. A teoria da realidade assim con- perpetuidade ou, pelo menos, uma longa duração;
cebida levaria ao absurdo de que entre a pessoa e por isso a sua capacidade patrimonial tem por
colectiva e os seus órgãos não subsistem relaç0es efeito vincular h sua própria existência uma parte
de direito, e que o indivíduo-órgão perde a sua das riquezas individuais, subtraíndo-as A circulaça
personalidade, que fica inteiramente absorvida na económica; daí resultou ab antiqvo aquela grande
do organismo do ente jurídico. E como tais con- massa de bens, que, destinados ao serviço daque-
sequências não podem deixar de ser rejeitadas, las pessoas, se chamaram de mão morta, como se
segue-se que a diferença entre brgão e ,represen- a mão dum morto os tivesse agarrado e os seques-
tante resulta puramente nominal: desde que há trasse para sempre da 6rbita das transacções do
duas pessoas, uma das quais procede ou actua em comércio, com grave prejuízo para a economia
vez e em nome da outra, temos a verdadeira figura social, e até muitas vezes para as famílias, que eram
d a representação jurídica. injustamente privadas da herança de seus paren-
Não deve, porém, concluir-se que a pessoa tes(v.
colectiva deva considerar-se como sujeita a tutela, a Por isso desde longa data o poder político
semelhança dos menores, ou antes a tutela perpé- começou a preocupar-se com esta situação, acen-
tua, como um louco incurável. Tutela e represen-
tação são dois conceitos diversos: se é certo que
OS' tutores dos menores e interditos são represen- Coviello, pag. 219 e 220.
(1)
tantes, a recíproca é que não é verdadeira: nem (2) V. em todo o caso a calorosa defesa que dos bens
todos 0s representantes sâo tutores. de mão morta fez Vareilles-Sommieres, considerando-os como
fecuidos instrumentos de actividade e produção, e criticando
De tutela das pessoas colectivas s6 pode fa- severamente o aistema dominante de restriçbes e suspeitas
lar-se no sentido da tutela governativa ou admi-
nistrativa, e ainda assim para exprimir um conceito
-
Contra as adquisiçõas dos entes morais Personnes titorales,
pâg. 450 e eeg.
tuando-se por toda a Europa o conhecido movi-
forem indispensáveis para o desempenho dos deve-
mento legislativo contra a mão mcrta,-por um lado
res das associações' ou corporações.
convertendo em parte a favor do Estado a proprie-
dade de tais entes, e por outro lado estabelecenda
9 2." São havidas, para os efeitos declarados
providências no sentido de impedir a sua recons- neste artigo, como perpétuas:
I." '4s associaç0es ou corporaçdes por tempo
tituição para o futuro. As primeiras providências
aparecem no antigo direito francês, que impunha ilimitado ;
.
2." As corporações ou associações, ainda que
aos corpos morais, sob pena de confisco, a obriga-
ção de solicitar para todas as adquisiçoes imobi- por tempo limitado, que não tenham por objecto
liárias licença ou carta de amortização (des lettres interesses mate~iais ».
d'ammortissement), isto é, uma espécie de inves- Mas deve notar-se que a primeira parte do
tidura da parte do senhor, concedida mediante uma corpo do art. 35." foi modificada, pelas Leis de 12
congrua indemniza~ão. E cartas de amortizaçao
de outubro de 1871 e de 21 de junho de 1889, no -
foram depois exigidas para todas as adquisiçoes sentido do 5 I.", isto é, permitindo as pessoas mo-
gratuitas. Êste direito dos senhores feudais a pas- rais perpétuas, ou corno tais consideradas, adquirir
sar cartas de amortização foi depois absorvido como também por título oneroso os im6veis indispensá-
monop6lio da Cor6a pela ordenação de Carlos v, veis para o desempenho das suas funçúes (I).
de 1372. E o edíto de 1749, do chanceler D'Agues-
reau, exigindo a aprovação rkal para a criação de Lei de r2 de outubro de ,871, art. 1.O : < É suscitada
(i)
novos- entes, determinou que todos os corpos e a observância do art. .io.", 2.O, n
O
. I.", da lei de 22 de junho
comunidades existentes não poderiam sans lettt-es de 1866. Ora o n.0 I." do § 2." do art. 10." da lei de 22 de junho
' d'ammorl issement acquérir, recevoir et p osséder de 1866 permitia a m distritos, municípios, paroquias, casas de
a L'avenzr aucun fonds de terre, naaisons, dt-oits miseric6rdias, hospitais, irmandades, confrarias, recolhimentos
e quaisquer outros estabelecimentos pios ou de beneficência,
réels, rentes foncières, quer a título oneroso, quer: nacionais ou estrangeiros, adquirir por tztulo oneroso os edi-
gratuito. ficios, jardins, passeios e quaisquer terrenos que o govêrno,
Tal foi a fonte do art. 910:" do cádigo de Na- depois de havidas as necessárias informaçoes das competentes
poleão, que por sua vez o foi do art. 35.O do nosso: autoridades, julgar indispensáveis a éstes estabelecimentos,
com prévia audiência dos seus administradores, para o desem-
a As associações ou corporações perpétuas não
penho das suas funções. e gbzo e serviço do público,, ficando
podem, porém, adquirir por título oneroso bens. tais bens sugeitos a desamortização logo que deixarem de ter
imobiliários, excepto sendo fundos consolidados; a aplicação que dela os isenta.
e os que adquirirem por título gratuíto, não sendo - Lei de 2 i de junho de i 889 :
desta espécie, serão, salvas as disposiçôes de leis Art. I." As associaçúee e institutos mèramente scient&cos
especiais, convertidos nela dentro de um ano, sob ou literArios, ou que tenham por fim bnico e exclnsivo promo-
ver o desenvolvimento de qualquer ramo de instrução, quando
pena de os perderem em benefício da fazenda; se achem legalmente constituídos, poderão adquirir por título
nacional. gratuito ou oneroso, e conservar, independentemente de auto-
5 1 . O O que fica disposto na segunda parte. rização do govêrno, quaisquer bens imoveis indispens&veispara
dêste artigo não abrange os bens imbveis, que a sua instalação, ou necessários para a consecução das seus
fins, compreendendo edifícios com carácter de monumentos
Deve, porém, notar-se que na adquisiçgo e Mas podendo as pessoas morais aceitar heran-
conservação de bens imobiliários há uma grande ças ou legados, independentemente de autorização
diferença de regime, conforme a adquisiçtlo é por do govêrno, poderão aceitar pura e simplesmente?
título oneroso ou por título gratuito. Parece-nos evidente a solução afirmativa.
No primeiro caso 6 preciso autorização do A solução negativa, sustentando, com funda-
govêrno, nos termos das leis de 12 de outubro de mento no art. 2025." do cbdigo civil, e no preten-
1871 e de 22 de junho de 1866, excepto tratando-se dido princípio da equiparação das pessoas morais
de estabelecimentos scientificos ou literários, nos aos menores e interditos, que só podem aceitar a
termos da lei de 2 r de junho de 1889. benefício de inventário (i), é absolutamente ina-
No segundo caso não há necessidade de qualquer ceitável, porque tal equiparação nem se encontra
autorização do governo, pois a licença governativa formulada na lei, nem é admissivel perante os
exigida antes do código civil deixou evidentemente princípios, como já m o s t r h o s { 9.
de ser necessária, em face dos artt. 32.O a 3 5 . O , e 1781." Note-se finalmente que as corporaçdes de ins-
deste cbdigo, que não irnpoem semelhante restrição tituição eclesiástica, ou associações religiosas cons-
A -capacidade patrimonial das pessoas morais (l). tituídas nos termQs db decreto de 22 de fevereiro
de 1918, ou ainda nos termos da lei de 14 de
fevereiro de 1907, teem uma capacidade de adqui-
historicos, minas, inscriçõps, dolmens, e terrenos proprios para rir por testamento restrita h décima oitava parte
estudos experimentais e explorações arqueol6gicas ou de qual- dos bens do testador, em virtude do art. 157.~
quer outra natureza unicamente scientifica ou literária, tudo
nos termos e em cenformidade dos respectivos estatutos. da lei da separação, e em harmonia com a inter-
$ iinico. O governo poderá compelir a s referidas associa- pretação que damos ao art. 1775.' e ao 5 Único do
ções ou institutos a alhear dentro do prazo & um ano os imo- art. 1781." ( S ) , no sentido de que o preceito com-
biliArios que tiverem adquirido por qualquer titulo e que s q a m binado destas duas disposições da lei é reduzir as
aplicados a fins diversos dos da respectiva instituiçáo, sob
liberalidades testameiitárias em favor da igreja ou
pena de os perderem em benefie30 d a fazenda nac~onal.
Art. 2P Ficam assim alteradas as disposiç6e.c do art. 35.O das instituiçdes eclesiásticas.
e $ r." do codigo cral, e revogada a iegislaçáo eni contrario. Por fim, e para complemento da analise da
É de notar que a referência ao 5 r.0 do art. 35." C cample- cnpacidade jurídica das pessoas colectivas, resta
tamente descabida, pois que so o corpo do artigo 6 que foi definir Q grau de imputabilidade ou responsabili-
alterado.
dade pelos actos praticados pelos seus represen-
E e de notar também que esta lei de 21 de juiiho de 1889
está em perfeita harmonia com a doutrina por nos sustentada tantes no exercício das suas funções.
(supra, n.' 21 ), de que as associações constituídas nos termos Pelo que respeita B responsabilidade penal,
d a lei de 14 de fevereiro de 1907 não carecem de aprovaçãe
governativa para terem personalidade jurídica, excepto quando
lei especial determine o còntrbio, (1) É a doutrina da referida resolução do Supremo Tri-
( 1 ) Assim o decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, bunal Administrativo e da Reoista de Legisla~ãoe de Jurispru-
em sua resolução da a; de dezembro de 1879, publicada n a dência, no lugar citado.
Rev. de Leg. e ]urtsj., XIX, pág. 476; e a mesma doutnna foi (3) Succssóes, n. 49.
sustentada por esta Revrsta, xxm, pag. 226. ( 8 ) Sucessões, n.0 43.
nem sequer é concebível, em virtude da própria do-a no segundo, como nas pessoas de direito pn-
natureza do ente colectivo, e dado o carácter vado ( I ) .
essencialmente pessoal do conceito da imputabili-
dade criminal, uma capacidade natural para cometer 26. Funcionamento e transfennaqão das pessoas
crimes, e por conseqüência uma responsabilidade colectivas. - constituída urna corporação ou insti-
penal da pessoa colectiva. Seria mesmo material- tuição dotada de capacidade jurídica, começa esta
mente impossível submeter a uma pena pessoal o naturalmente a par em acção os seus meios de vida
ente jurídico da pessoa colectiva: com a pena para a realizaçiio dos seus fins; trata-se de desen-
pròpriamente dita sb podem ser atingidos os agen- volver em toda a sua amplitude a capacidade fun-
tes individuais da violação da ordem penal. Na cional do ente colectivo. Começa o funcionamento
actividade criminal e na acção penal, mais do que da pessoa colectiva.
em qualquer outra espécie de actividade jurídica, Para isso a primeira cousa a fazer é necessh-
6 presuposto indispensável a existência de sujeitos riamente organizar a sede central dos serviços
físicos individuais. administrativos, provendo-a do pessoal e =teria1
Mas nada obsta a que O ente colectivo seja necessários : e em 'seguida se instalargo os dife-
civilmente responsável pelos actos delituosos ou rentes serviços com seus estabelecimentos ade-
factos ilícitos praticados pelos seus representan- quados, e quaisquer sucursais, agências ou filiais,
tes, se o foram no exercício do cargo da fepresen- quando a complexidade e extensa0 dos serviços
tação. assim o exigirem.
O acto ilícito deve em tal caso obrigar direc- A sede central da organização e funcionamento ,
tamente a pessoa colectiva, em virtude da relação duma pessoa colectiva constitui precisamente o seu
jurídica que liga o manaante ao mandatário, o domicilio. E é bem de ver que o domicílio tem
representado ao representante ( art. 1350.')~ mesmo para as pessoas colectivas o mesmo papel e impor-
quando este haja excedido a esf6ra dos seus pode- tância que tem para os indivíduos, determinando-se
res ou atribulçoes, sem embargo do disposto no afinal pelo mesmo critério da residência normal,
art. 1351.O, porque a responsabilidade por factos pois outra cousa não significa o 5 Único do art. 4
1
:
ilícitos é regulada por outros princípios, entre os Com relação As corporaqões ou associaç0es a séde
quais está a regra do art. 238a.", exactamente da sua administraçáo substitui a residkncia a. Com
aplicável As pessoas colectivas e seus represen- efeito a séde da administração i precisamente o
tantes. lugar onde se reunem e funcionam os represen-
Mais grave, e vivamente debatida, é porém tantes ou dirigentes da pessoa colectiva; e por-
a questão ácêrca da responsabilidade dos entes tanto bem pode dizer-se que é o lugar onde ela
públicos, 2 particularmente da do Estado, pelos está ou reside normalmente.
actos praticados pelos seus funcionários. Geral- E também o domicílio da pessoa colectiva
mente a doutrina distingue entre os actos prati-
cados jure imperii, e juregestionis, não admitindo
a responsabilidade no primeiro caso, -e admitin- (1) Coviello, pag. 220; Ruggiero, phg. 377.
pode ser geral ou especial, e necessário ou volun-
tj I: h's juntas gerais de distrito, nos inter-
tário.
O domicílio geral é um só, e voluntário, porque valos das suas sessóes, pelos respectivos governa-
nada.se opáe a q u e 9 pessoa colectiva mude, quando dores civis.
tj 2." As sucursais, agências ou estabeleci-
lhe aprouver e convier, a séde da sua administra-
ção, cumprindo, é claro, perante a respectiva auto- mentos filiais de qualquer banco, sociedade OU
ridade as formalidades necessárias para a sua cons- comnanhia,
-- serão representados pelos seus chefes
tituição, como resulta do 3 único do art. 2 52." do na sede da respectiva administração ».
código administrativo de r896 e do art. I." da lei Para a determinação da competência territo-
14 de fevereiro de 1907. ria1 do tribunal dispóe a art. I%", em harmonia
Mas, além do domicílio geral, pode haver com o princípio do domicílio do réu (art. 1-6."):
vários domicílios especiais, que são os das diversas a O s corpos colectivos serão demandados no
sédes das administrações secundárias ou delegadas, juízo onde estiver a séde da sua administração.
que uma pessoa colectiva estabeleça em diversos S I: O juízo do domicílio das sucursais, agên-
lugares, como resulta doo art. r8.0 do código de cias ou estabelecime~tosfiliais de qualquer banco
processo civil, ou ainda os domicílios especiais, ou companhia, é competente para conhecer das
que para certos e deteminados actos, que a lei causas contra eles intentadas, quando disserem res-
não sujeite a certo domicílio, os seus represen- peito a contractos celebrados ou obrigaçbes con-
tantes estipulem por documento autêntico ou auten- traídas pelas mesmas sucursais, agências ou filiais.
§ 2." A disposição do parágtafo antecedente é
,ticado, pois que o art. 46." do código civil não
pode deixar de ser igualmente aplicável As pes- igualmente aplicável As sucursais, agências OU
soas colectivas; estes são domicílios voluntáfios, filiais de ba?cos, sociedades, companhias ou quais-
mas aqueles são necessários, porque são inipostos quer associaçóes, que tiverem a sua séde em país
pela bi . estrangeiro, por quaisquer actos ou contractos fei-
No desenvolvimento da sua actividade as pes- tos em Portugal>>.
soas colectivas veem-se muitas vezes envolvidas É de notar, porém, que o § I." do art. 1 r . O foi
em relaçoes jurídicas controvertidas, que só pode- revogado pelo art. 49.", n.' 7 . O , do código adminjs-
rão resolver-se por meio da accão jiirisdicional. trativo aprovado pela lei de 7 de agosto de 1913,
E que as pessoas colectivas podem ser partes determinando que os distritos sejam representados,
em juizo, isto é, accionar e ser deiriandadas na em juiqo ou fora dêle, pelas comissóes executivas
pessoa dos seus representantes, é ponto assente, das juntas gerais.
que não admite dúvida alguma.
E é de notar também que os art. I I .O e 18." se
De resto, êste princípio é expressamente con- referem apenas aos representantes dos corpos
signado no art. 11." do código de processo civil: colectivos; mas n2o s e pode deixar de entender que
e OS corpos colectivos são representados pelos seus
são igualmente aplicáveis As instituições cuja direc-
ção seja individual, pois que a expressão corpos
chefes, sindicos OU pscais, OU por quem suas vezes
fizer. colectivosz, é, pelo menos, para este efeito, sinó-
nima de pessoas colectivas ».
Para o Estado estabeleceu o art. 10." um sis- tos, não tendo uma vida corporal orgânica, não
tema de representação judiciária diverso, por uma teem qualidades psíquicas, não teem sciência nem
razão intuitiva e facilmente compreensível : é que consciência; e precisamente o depoimento é um
seria inconveniente para o.prestígio do poder poli- apêlo A -consciência das partes afim de provocar
tico, que fôssem envolvidas nos processos judiciais uma confissão, e o juramento é um acto interna
as pessoas dos seus altos repfesentantes, e ainda com que solenemente se afirma a verdade dum,
inconveniente pela sua constante variahilidade facto. Ora não é possível identi$car a consciên-
sobretudo nos regimes ultra-democrá~icos. O que cia do representante cdm a &a pessoa colectiva,
é necessário é uma representação ao mesmo tempo Mas a doutrina clássica responde que, se as
estável e id6nea. Por isso o art. 10."determinou pessoas colectivas não são sus~eptíveisde um es- B
que « o Estado é representado pelos agentes do tado psicolbgico subjectivo, devem porém sofrer a
ministério público, que funcionarem no respectivo conseqüência do estado de espírito dos seus repre-
tribunal. E o art. 19." dispoe: « O Estado será sentantes; e os efeitos juridicos, que dêstes mol
demandado na comarca onde s e tiver celebrado o mentos subjectivos derivam, não podem deixar de
acto jurídico, ou tiver ocorrido o facto, em que se se repercutir para bem.ou para mal no patrimbnio
fundar a causa B . das pessoas colectivas, concluindo-se por isso pela
A respeito da situaqão processual é muito âdmissibilidade tanto do depoimento de parte, oir.
discutido s e as pessoas colectivas devem ser obri- simples confissão judicial, como do juramento deci-
gadas a restar o depoimentch de parte e o jura- sório ou supletbrio ( I ) .
mento ( I ) , ou seja, a declaração de honra decisória . Qual será a verdadeira doutrina?
o u supletória. Parece-nos dever distinguir-se entre o depok
A doutrina clássica admitia quási sem discre- mento ou simples confissão e o juramento ou decla-
pância ambos êstes meios de prova, e apenas se ração sôbre palavra de honra.
preocupava com o modo como deviam ser presta- Entre os dois institutos há uma diferença qudi--
410s : se todos os membros da corporação deviam tativa fundamental : o primeiro é iim meio de prova,
depor OU jurar, ou sb alguns dêles, ou sb um man- como a testemunha (c6d. de pr. civ., art. ~26.~,),
datário especial. apreciável pelo conhecimento que a depoente mos-
Modernamente, porém, a questão complieou-se, trar dos factos em que s e funda a acção ou a defesa
porque alguns autores negam a possibilidade de e pela fé que merecer ( c6d. civ., art. 2514."); em-
aplicar tais institutos As pessoas colectivas, por quanto que o segundo é mais do que um meio d e
incompatíveis com a sua própria natureza ( a ) . Di- prova, pois é a própria decisão do pleito pela con-
zem que as pessoas colectivas, como entes abstrac- fissão jurada da parte ( art. 2522." e 2533.'); O pri-
meiro, embora seja um acto de consciência, é prin-
cipalmente um acto de sciência ou conhecimento.
(I) Os Principias, I , pág. 456, nota ( I ).
(2) V. a interessante monografia de Quarta, L'interro-
gatorro ed i1 giuramento nez rapporti delle persone gturzdiche. ( 1 ) Ferrara, pag. 681.
dos factos, ao passo que o segundo é exclusiva- As pessoas colectivas estão, com efeito, sujei-
mente acto de consciência. tas A znspecgüo ou vigilância por parte do Estado,
Daí resulta que a observação de Quarta, sbbre como de resto o estão também em certo modo as
a impossibilidade de identz$car a consciência da pessoas individuais, pois que o Estado é o supremo
pessoa colectiva com a dos seus representantes, é regulador e disciplinador de todas as actividades
realmente verdadeira em relação ao juramento deci- sociais,
sbno, pois seria d e facto impossível decidir por Mas a inspecção ou fiscalização do Estado
êste modo a causa sempre que a confissão dos desenvolve-se, como diz Ferrara, com maior ou
representantes fdsse divergente. menor intensidade, segundo a natureza e o fim
* Conclui-se, portanto, que, sendo admissível a dos diversos entes, a partir de uma tutela sdbre o
contissão dos representantes no depoimento de corpo moral, que implica uma Ingerkncia contínua
parte, não pode porém admitir-se para a decisão e interna em todas as manifestaçóes importantes da
jurada da causa. sua vida, diminuindo gradualmente até se reduzir
E qual .é a doutrina perfilhada pala nossa lei? a uma simples função geral de polícia, podendo
O código civil manifestamente regeitava tanto entretanto a intervenção do Estado como supremo
o depoimento de parte (art. 241I.", n.O 2.0) como O regulador político ir até ao ponto de suprimir
juramento arti. 2426.0 e 2520.')~ pois que só admi- a sua personalidade e decretar a sua extinção d B
tia a confissão judicial sobre factos que toquem facto.
pessoalmente A parte que a deva prestar. Assim se compreende fhcilmente que nos cor-
Mas o cbdigo de processo civil modificou êste pos ou organismos administrativos do Estado, que
sistema, dispondo no art. 221,": «Sendo parte na fazem parte da sua prbpria organização e estrutura,
causa alguma pessoa m o r a l das mencionadas no e que são por'êle fundados, a sua intervenção é
art. r ~ . " ,pode exigir-se o depoymento de quem a directa, e imediata, sendo mais do que a simples
representar». E deve entender-se que a expressão tutela administrativa, traduzindo-se na prbpria
apessoa moraln, significando dêste modo corpo direcção e administração por meio de funcionários
colectivo, como n o art. I I.", significa afinal o seus.
mesmo que pessoa colectiva. Em relação aos corpos administrativos territo-
O art. 219." do mesmo código determina que riais (colónias, distritos, municípios e freguesias
« o juramento decisório ou supletbrio será deferido ou paróquias civis), que já não estão integrados
s b nos casos em que é permitido pelo código civil>. na própria organização administrativa do Estado,
Vê-se, portanto, que a nossa lei consagrou afinal mas que, pelo contrário, gozam de uma certa auto-
precisamente a doutrina que defendemos. nomia política e financeira, a sua intervençáo é em
Determinada a situação judicial das pessoas todo o caso ainda directa e permanente, não s ó
colectivas, passemos a examinar a sua posição porque são estas corporações que no seu conjunto
social em face da pessoa colectiva máxima que é formam o próprio Estado, estando integrados na
o Estado. É o que se chama a tutela admtnistra- sua constituição e estrutura, mas ainda porque as
t i v a das pessoas colectivas. , suas funçbes em grande parte s e confundem com
as do Estado, não devendo nem podendo êste tivo, desde que não esteja em jBgo o interesse
desinteressar-se do seu funcionamento. geral, nãc tem o Estado que intervir no seu fun-
Dada a autonomia administrativa e financeira cionamento, a não ser no exercício da sua função
de tais entes, a intervenção do Estado já não é de de regulamentação gerái, para fiscalizar o exacto e
direcção e administração, mas apenas de fiscaliza- fiel cumprimento dos preceitos legais.
ção geral, e de tutela para alguns actos mais graves Mas por isso mesmo que algumas sociedades
e importantes. se propõem fins lucrativos, que também implicam
Pelo que respeita as corporações e instituições, com os interesses gerais da sociedade, tais como
ainda que de iniciativa particular, mas constituídas os de transportes, de seguros, de operaçdes bancá-
ou fundadas com algum fim de utilidade pública, rias, na constituição e vida dessas não pode o
isto é, com funções idênticas As do próprio Estado, Estado deixar de intervir com o regime de auto-
como instrução e assistência piiblicas, pois que rização ou aprovação de estatutos, e muitas vezes
estas pessoas morais já não pertencem A própria com a instituição de funcionários encarregados de
estrutura do Estado, mas se propõem fins paralelos vigiar e fiscalizar os seus actos.
e análogos, a intervençáo já não deve ser directa, Dum modo geral pode dizer-se que a ingerên-
mas deve em todo o caso ser de fiscalização per- cia do Estado na vida das pessoas colectivas é uma
manente, afim de evitar que tais entidades se afas- fiscalização de legalidade ou de oportunidade,
tem das normas que devem presidir d boa direcção conforine se trata apenas de as compelir ao cum-
e administração dos interesses públicos. primento da lei, ou de apreciar de rneritis a con-
Pelo que respeita as corporações e fundações veniência ou inconveniência dos actos por elas
que Sejam ao mesmo tempo de utilidade pública e praticados. O modo como se exerce a intervenção
particular, como são as de fim interessado duma d o Estado pode limitar-se a um procedimento
universalidade de pessoas (associações de classe, neqativivo, evitando que as corporações ou i~isti-
de socorros mútuos, sindicatos, etc.), e as de fim tuiçoes ultrapassem a sua esfera de acção e prossi-
ou interesse ideal (associações de recreio, religio- gam fins ilícitos ou contrários à ordem pública,
sas, scientíficas, literárias, artísticas, desportivas, como acontece- em relação aos entes de direito
etc.), pois que tais entidades, embora já muito privado, ou então consistir num procedimento
distanciadas das funções essenciais do Estado, são positivo, se o Estado na defesa do interesse piibiiço
em todo o caso pessoas colectivas de utilidade geral, obriga as pessoas colectivas de direito público ao
o Estado não deve desinteressar-se inteiramente do cumprimento dos seus fins, empregando os meios
seu funcionamento, mas a sua intervenção deve linii- coactivos para as compelir ao regular desempenho
tar-se a tomar conhecimento da sua existência e dos das suas funções. Estes meios podem ser prwen-
seus actos, para obstar a quaisquer procedimentos tivos ( autorizaçdes, aprwaçbes, vistos ) ou repres-
contrarios a ordem publica e ao conveniente aper- szvos ( anulação de deliberações ou de actos,
feiçoamento das energias individuais e colectivas. dissolução das direcções e nomeação de comissá-
Finalmente, pelo que respeita As pessoas cole- rios ou administradores extraordinários, penali-
ctivas de mero interesse particular ou de fim lucra- dades e outras sançdes semelhantes ).
'5
Nesta ordem de ideas Ferrara enumera seis dicas. Se a transformação se dá com extinção da
categórias de poderes que se conteem na inter- personalidade, seja porque esta-vai confundir-se
venção do Estado na vida e funcionamento dqs ou converter-se em outra, embora com fim análogo
pessoas colectivas de carácter público : ao da extinta, então não há transformação no sen-
r.@ Direito de informayão e de inspeccão tido rigoroso da palavra, mas sim uma fusão de
si3bre os actos, correspondência, orçamentos, regis- pessoas colectivas ou uma supressão conjunta com
tos, caixa, etc. ; uma nova criação (suppressio et erectio) ( I ) .
2.O Autoriqapio e aprovagão de certos actos Podem reduzir-se a cinco;os c?iversos tipos de
mais importantes; transformação :
3 . O Anulação de actos, por incompetência, I." Na natureya e qzcalidade jurídica. É o
excesso de poder, violação da lei, e ainda por que acontece se uma pessoa colectiva se transforma
motivo de oportunidade ; de corporação em instituição, de privada em pública,
4.' Nomeação, suspensão, demissão de auto- de civil em eclesiástica, de nacional em estrangeira,
ridades e administradores, e diversas penalidades ; ou vice-versa.
5.O Imposicão coactiva do cumprimento de 2." Na o r - a n ~ y a y ã oe vida intei-na. É o que
certos actos culposamente omitidos, como a ins- s e dá em todos os casos de alteraçbes mais ou
crição de dívidas nos orçamentos ; menos profundas na forma de govêrno e adminis-
6.O Reforma e supressáa das pessoas colec- tração, por meio de reformas nos estatutos, quer
tivas. porliníciativa do próprio ente, quer por determi-
Mas 6 claro que este conjunto de poderes é nação do poder tutelar do Estado.
diversamente distribuído e graduado, e em relação 3 . O Na autonomia do sujeito. -4tgumas vezes
aos diferentes tipos de corporaçbes e instituiçóes, a personalidade colectiva perde a sua orjginárja
conforme as leis especiais que as regulam ( l ). independência, entrando numa relação de consórcio
As pessoas colectivas durante a sua vida ou de subordinação com outros entes: todos os
podem passar por transformações mais ou menos entes coligados consemam a sua própria individua-
profundas tanto na sua estrutura como no seu fim. lidade juridica, mas deminuida na sua autonomia,
A transformacão pode tomar-se em dois em virtude da solidariedade que os prende em
sentidos: num sentido amplo, significa toda e maior ou menor grau de dependencia e subordi-
qualquer mudança ou substituição de um sujeito nação.
por outro; e ,no sentido técnico, significa apenas 4." No $m. Pode mudar-se, alterar-se por
as modificações que deixam intacta e idêntica a aumento ou restrição o fim a realizar, e manter-se
personalidade. Neste caso o sujeito continua a apesar disso a pessoa co1ectiv.a. A restrição do fim
sua vida, não obstante as transformaçbes sofridas, pode ir até B extinção.
sem que haja interrupção nas sugs relações jurí-
( 1 ) Ferrara, pág. 867 e 868. (I) Ferrara, pag. 868, e 869; Coviello, pág. 251 e 252.
cipalmente da doutrina francesa e italiana, seguida Segundo a moderna doutrina, o
também por alguns escritores alemães, e a teoria não tem sempre igual carácter jurídico: ora vale
moderna, que se diz positiva ou realista, seguida como $luraZidade de direitos pertencentes ao
pela generalidade dos autores alemães e por alguns mesmo sujeito, ora como universitas juris. De-
italianos. pende do direito positivo agrupar as relaçdes jurí-
Na doutrina tradicional o património e consi- dicas numa massa única, unificação que tem lugar
derado como uma figura económico-jurídica essen- para p n s especiais e nos timides distes fins. O
cialmente ligada à personalidade, por tal modo que património como totalidade das relaçbes individua-
entre personalidade e patrimdnio existe um nexo liza-se pela identidade do sujeito a quem pertence.
íntimo e indissoluvel, e toda a pessoa como tal Mas individualização não quer dizer unificação.
tem sempre e necesslriamente um património, Um mesmo sujeito tem na sua mão toda a série
ainda quando não tenha bens apreciaveis, um patri- das suas reiaçóes activas e passivas ; mas êste agre-
mónio qui ossibus irchaeret. Tal patrim6ni0, con- gado de direitos, que convergem num só titular, é
cebido como uma m i d a d c juridica (universitas sempre uma pluraijdade, uma massa, que pode
juris, universalidade de diretto), é único, indi- crescer ou deminuir, e pode também faltar. O su-
visível, inalienável, e inseparavel da pessoa. Pode jeito pode existir ou ficar temporkriamente privado
o sujeito num dado momento desfazer-se dos seus de direitos patrimoniais, salva a capacidade de os
bens ; mas a figura juridica do seu património fica adquirir de futuro. O património resolve-se na
intacta, emhora sem conteúdo material visivel e totalidade concreta dos direitos que a pessoa tem
palpavel ( 1 ). em cada momento da sua vida; mas esta totalidade
pode reduzir-se a zero. E pois que a importância
do patrim6nio se manifesta principalmente na sua
.(I) Planiol, I , n." 2148; Colin e t Capitant, pag. r06 e 107; qualidade de objecto de' garantia, quando o d e v e
Raoul de Ia Grasserie, Classi$~alion scientifique du droit,
pag. 2 7 ; Bonelli, Teoria delle persone giurrdiche, na Rivista dz dor não tem património, os credores encontram-se
dirttto civile, 191I , pág. 609 ; Ruggiero, pag. 2.02 e 203 ; Búk- na impossibilidade de o executar,: a melhor prova,
meyer, Das Vermògen zm juristische Sinne, pág. 174; Bevilac- conclui Ferrara, de que um patrim6nio naquele
qua, Theorza geral do direito czuil, pág. 2r6; Dr. T e i x e i ~ a d e momento não existe ( ).
Abreu, Curso, pag. 354 e seg. Como sinteses d a teoria clássica
são bem expressivas a s palavras de Raoul de La Grasserie,
considerando o patrimonio como o prolongamelato da per.~ona-
lidade sôbre as Lousas, e as de Bevilacqua, dizendo que i! a Ferrara, pág. 8 6 9 Coviello, pág. 252 e 253; Fadda
(1)
actividade economica duma pessoa sob u seu aspecto juridico, e Bensa, em Windscheid, Pandetie, I, pág. 667 e seg. Entre
ou a projeccão económica da personalidade ciuil. Planiol diz : nós a moderna teoria foi seguida pelo Dr. Alves Moreira : u o
u pessoa pode ter muito pouco de seu; ou não ter direitos património, embora represente o desenvolvimento da perso-
pecuniáxos nem bens de qualquer espécie; ou mesmo, como nalidade nas relações sociais, não e único nem inseparável
certos aventureiros, não ter senão dividas ; ela tem, no entanto, dela. Pode o patrimonio ter o carácter duma universalidade
um patrirnbnto. Património não significa rrquela; um patrimo- juridica, mas êsse carácter provir-lhe há dos fins para que ésse
nio nâo encerra necessariamente qualquer valor positivo; pode patrimonio é destinado, pois é em virtude dêsses fins que se
ser como uma bolsa vasia e não conter cousa alguma.. imprime unidade ao patrimonio. É assim que, na aceitaçáo
De que lado estará a verdade? numa pluralidnde, porque o contrário é de si evi-
É nosso parecer que neste problema mais uma dente: a concepção real de uma urtidade j u r i d i c a
vez triunfa a tradição sbbre o modernismo. não é incompatível com a pluralidade e diversi-
Com efeito, é bem verdade que o patrim6nio dade de situaçbes de facto e de direito.
duma pessoa, considerado como instituicão jurí- Dizcr que o patrimánio duma pessoa i. ú n i c o ,
dica norilia1 e permanente, está essencial e indivi- quer simplesmente significar que o direito objectivo
dualmente ligado h pessoa do seu titular. considera O complexo dos direitos e obrigaçbes
Poderá de facto excepcionalmente acontecer patrimoniais de cada pessoa como uma entidade
que um indivíduo venha ao mundo, filho de pais ( não personalidade ) abstracta, \mas realmente
Inc6gnitos, e tenha em tal caso a felicidade ou existente, perfeitamente distinta do património das
Infelicidade de morrer, sem que ao menos alguma outras pessoas, e que considerada em si mesma
alma caridosa lhe tenha dado uma camisa para lhe desempenha uma determinada função jurídica, qual
envolver o tenro corpo ! é a de servir de garantia geral dos credores e cons-
Êste seria O Iinico caso em que o indivíduo tituir o objecto proprio da sucessão hereditária.
pode existir (numa sociedade constituída, embora Outra cousa não s e pretende exprimir com o
mdimentarmente, bem entendido) sem chegar a conceito da u n i d a d e jttridica do património. Mas
ter um patrim6nio. assim entendido êle 6 intuitivo e indiscutível, nada
Mas seria ridículo, e até ofensivo da persona-I tendo de metafísico ou transcendente.
lidade intelectual, pensar que a tais casos se quer E fácil é de ver como dele resulta lógica e
referir a doutrina dos partidários da existência de naturalmente o seu carácter de indivisibilidade.
homens s e m p n t r i m d n i o . Dizer que o patrimbaio é indivisivel, não
Assente, pois, que a teoria se refere necessl- significa que não possa destacar-se dele algum dos
riamente as pessoas-que algum património, por seus elementos, que êle não possa decompor-se
.mais insignificante que seja, chegaram a ter, veja- nas suas diferentes partes, desfazendo-se atP, o seu
mos entao se êsse patrim6nio é, ou não, zínico, titular improdutiva ou inutilmente de algumas
indivisivel, innliendvel, e insepai-dvel da pessoa delas, ou até da sua quási totalidade, ou destinan-
emquanto viva fôr. do-as a certos e determinados fins, pois o contrário
Dizer que é zinico, não significa que não possa é evidente, dada s pluralidade concreta dos e l e
ser composto de vários elementos ou parcelas mentos do patrimonio e o direito que em regra
diferentes, que não possa concretamente consistir cada um tem de dispor do que .é seu.
Mas dizer-se que o património é indivisivel,
quer simplesmelite significar que, por maiores e
duma herança a beneficio de inventario, os bens que constituem mais variadas que sejam as divisbes e subtracçbes
a herança se consideram como um todo distinto do patrimonio que dêle se façam, subsiste sempre o substracto
do herdeiro, que é todavia o sujeito a quem a heranqa pertence.
Donde se conclui que, no sentido por n6s ligado a palavra pa- fundamental da u n i d a d e j u r í d i c a do património,
trzm0lai0, uma pessoa pode termais do queum. - Ins~z~uz~ões, pois nelr se conteem elementos essenciais, tão
PQ- 319- indissoluvelmente ligados A pessoa, que nem os
credores mais privilegiados podem executar para considerado nulo, quando mais não seja, por ser
satisfação dos seus créditos (art. 81 5." do c6d. de contrário A moral pública (art. 6 7 1 . ~n."~ 4.").
pr. civ.) (I}. De resto, a impossibilidade legal de alienação
Pela mesma razào que o património e únko e absoluta do património não deixou de ser sancio-
indivisivel, êle é também nècessariamente z~zalie- nada em outras disposicbes da lei, como a do
nável. art. r556.", que proibe a venda do direito a he-
Dizer que o património é inaliendvel, não rnnca de pessoa viva e do direito a alimentos, e
quer dizer, é claro, que o seu titular não possa a do art. 2042.O, que proibe os pactos sucess6rros.
dispôr dêle como lhe aprouver, dentro da ordem Finalmente, desde que o património, como
jurídica, porque isso seria negar o princípio fun- unidade jurídica indivisivel, é inalienável, tem de
damental do direito de propriedade, que épreci- concluir-se necessàriamente que 8 insepnrdvel da
samente a faculdade de dispôr 40s próprios bens, pessoa a quem p d e n c e .
quer por transformação (art. 2315.O;, quer por alie- E tão inseparável êle 6, que sempre que o
paçáo (art. 2357."). direito objectivo sentiu e reconheceu a necessidade
Mas dizer que o património é inaliendvel, quer de se constituir um património autónomo, com
simplesmente dizer que, embora o seu titular possa destino a certos fins, pelo menos tratando-se de
dispor dêle para os fins da vida, há, porém, uma fins de interesse público, ao mesmo tempo tratou
parte fundamental, tão essencialmente ligada a pr6- de construir a figura jurídica da pessoa colectiva,
pria personalidade, que como esta é indisponível para ser o sujeito ou titular dêsse património, per-
ou inalienável: é precisamente o substracto do sonalidade que nasce com esse património, e que
patrim6nio urzo e indi-aisivel. tem a sua vida por tal forma a êle ligada, que com
Eis a razão porque o nosso código ( art. 1460.") êle se extingue também (supra, R . O 14, 15 e 2 7 ) .
expressamente declara nula a doação que abrange E agora, em presença desta análise dos carac-
a totalidade dos bens do doador sem reserva do teres do patrim6ni0, que nos parece rigorosamente
usofruto, ou que deixa o doador sem meios de jurídica, podem os partidários da moderna dou-
subsistência. trina dizer, com Ferrara, que a doutrina clássica
E, se é certo que a lei'não fulmina igualmente representa a figura do patrim6nio por um modo
de nulidade a venda, ou qualquer outro contracto fantástico, como um poder ecorzómico indefecti vel,
oneroso de alienação total e absoluta de todo o único e inscindível do sujeito; que uma tal con-
património, incluindo a própria roupa do corpo, cepção é pura confusão do patrimbnio com a capa-
nem por isso um tal contracto pode deixar de ser cidade patrimonial, filha das concepções filosó-
ficas da escola do direito natural; que é uma
abstracção inútil e e c í v o c a , conceito puramente
( I ) Note-se que ainda quando. a respeito das pessoas metafísico, artificioso e absurdo ( I ) .
colectivas, B possível a execução completa do património, êste
facto, em vez de invalidar, confirma a doutrina da unidade e
indivisibilidade do património, pois que em tal caso a pessoa
morre ou extingue-se com o seu património (supra nO, 27).
N ós respondemos simplesmente com a demons- idêntica através das vicissitudes dos seus vários
tração que fizemos do verdadeiro e real carácter do elementos.
património como elemento essencial da vida da Só em face da lci sc pode decidir quando 6
personalidade, constituindo, por isso, uma unidade que efectivamente existe um património separado
jurídica inseparável da pessoa: a concepção soi ou autónomo, porque só o direito objectivo pode
disant positiva e realista da pluralidade ou diver- criá-lo: como diz Bekker, o patrim6nio separado
sidade concreta dos elementos do património, surge segundo regras fixas, e não por arbitrária
considerado apenas como complexo de valores declaração de vontade do titular do patrim6nio ( I ) .
jurídicos independente da pessoa do sujeito, per- O s autores não são concordes na fixação dos
feitamente divisível e completamente alienável, critérios próprios para verificar a existência de tais
é que é positivamente uma concepção absurda, patrimbnios, e por isso alguns alongam demasia-
manifestamente contrária a realidade da ordem damente a série deles. Basta notar que, por exem-
jurídica, e neste sentido se pode dizer artificiosa plo, Fadda e Bensa incluem na- categoria dos
e metafísica. patrimónios autónomos a herança, o dote, a comu-
Mas o conceito do património como unidade nhão entre os canjitges, o estabelecimento comer-
ou universitas juris não exclui . a possibilidade cial, a quota do &cio nas sociedades civis, e ainda
da constituição e existência de patrimónios parti- o navio em relação ao armador ( S ) . Pelo contrário,
culares, mais ou menos aut6nomos, com uma orga- outros, como Ferrara, reduzem os casos de sepa-
nização jurídica separada e distinta da do património ração de patrimónios B herança e sucessbes aná-
total: sáo como nucleos ou centros patrimoniais logas, e a falência (31). Outros, como o Dr. Alves
que se destacam do património global. É a teoria Moreira, consideram três casos típicos de patri-
da autonomia ou separação dos patrimónios. , mónio aut6noma: a sociedade conjugal, as socie-
.. O património separado, diz bem Ferrara, 6 um dades de responsabilidade pessoal dos sócios, e a
centro autónomo, que não tem outra relação com herança (v.
o.patrim6nio pròpriamente dito senão o lago extrín- O s autores que restringem os tipos de patri-
seco de pertencer ao mesmo sujeito. E' uma figura mónios autónomos partem da consideração de não
análoga B que o direito internacianal construiu com ser bastante um destirzo especial de certos bens,
a uniâo pessoal dos Estados. para lhes dar o carácter dum todo Único ou duma
Paratermos a figura jurídica dum património universitas juris. E então dizem, como Ferrara :
sep,arado ou a u t ó ~ o m ohão
, basta haver quaisquer a O único critério seguro para reconhecer a
bens destinados a um qualquer fim; mas é neces-
sário que esses elementos patrimoniais sejam orga-
nfzados pela ordem jurídica em um só todo, sujeito ( I ) Bekker, Pandekten, J, 5 43.
a um tratamento unitário, constituindo uma uni- ( 9 ) Fadda e Beiisa, em Wiiidscheid, 11, pág. 488 e seg.
( a ) Ferrara, pág. 880.
oersitas juris, um complexo de direitos e obriga-
(4) Dr. Alves Moreira, Patrimónios autónomos nas obri-
çOes de carácter económico numa massa Gnica, gações seguftdo o direito civil português, no Boletim da Facul-
com vida própria, e que permanece juridicamente dade de Diretto da Universidade de Coimbra, VII, pag. 47 e seg.
existência do património separado é o da respon- Mas para nbs, que consideramos pessoas colec-
sabilidade por dívidas. Património separado é tivas todas as sociedades legalmente constituídas
aquele que tem dividas prdprias, em que se loca- (supra n." 21 ), não pode haver em tal caso a figura
lt'$am as obrigações e responsabilidade que dêle jurídica do património autónomo.
nascem, e que não ressente os efeitos das outras Dêste modo ficariam os casos de autonomia
obrigaçoes do sujeito do património. Em poder de patrirnbnios reduzidos h sucessBo a título uni-
do mesmo titular há duas esferas jurídicas sepa- versal (herança, ou sucessão análoga, como doa-
radas: O patrimbnio geral da pessoa, e um outro ção, devolução dos bens das pessoas colectivas) e
centro patrimonial com próprios direitos e obriga- aos regimes de casamento.
ções. Este é O trago verdadeiramente essencial do Ora, a verdade é que há outras figuras de
instituto: outros efeitos, como a possibilidade de agregados patrimoniais diversos e pertencentes ao
uma acção universal para a pretensão do patrimdnio mesmo sujeito, que constituem organismos econó-
e o princípio da subrogação, não são constantes, mico-juridicos mais ou menos autdnomos, mere-
e podem encontrar-se tambkm em outras figuras cendo bom a qualificação de unidades jurídicas
jurídicas» ( 1 ) .- compostas ou uniqersalidades de direito, sempre
Parece-nos que o mithrio da responsabilidade que estejam sujeitas a um tratamento jurídico uni-
por ,dívidas emergentes do patrimbnio separado é tário.
excessivamente restrítivo, por um lado; e, por É o que acontece na compropriedade ou pro-
outro lado, em virtude da aplicação que dêle fazem priedade comum, no estabelecimento comercial,
os seus partidários, revela-se afinal demasiado com- ou em geral nas empresas industnais, navios,
pree?sivo. rebanhos, etc., etc. ( I ) .
E assim que Ferrara considera como um dos Assim como há, diz Ferrara, diversas massas
tipos de património autónomo a massa falida, patrimoniais pertencentes a um mesmo sujeito,
quando é certo que nem mesmo no critério amplo pode haver tambk-m um patrimbnio que pertença
de Fadda e Bensa s e compreende este caso, e com solidlriamente a vários sujeitos. Tem-se então O
razão, porque o falido não tem dois patrimónios património colectivo, que é em certo modo o
diversos, entrando todos os seus bens para a massa contraposto do patrimdnio separado. Aqui tam-
da íalência ( c6d. de pr. com., art. 201."). Outros, bém é a lei que decide do reconhecimento de um
como o Dr. Alves Moreira consideram como caso patrimbnio colectivo. O patrimbnio colectivo não .
de patrimbnio autónomo o da quota social dos significa, porém, uma massa de direitos e m comum,
sbcios de responsabilidade pessoal pelas obrigaçoes segundo o tipo romano (que é o do nosso condo-
da sociedade, porque não consideram tais socieda- mínio, art. 2175." e seg. ), isto 6 , uma comunhão
des dotadas de personalidade jurídica distinta da por quotas, na qual cada consorte tem uma fracção
dos sócios.
( i ) No sentido mais excessivamente restritivo sustenta
Coviello que verdadeiramente só ha uma universitas juris, que
( 1 ) Ferrara, pag. 877 e 878. e a herança -pag. 271 e 272.
de direito que lhe pertence individualmente, de seg.). E tal é também, segundo crêmos, O tipo
que pode dispor, e a toda a hora realizar por meio da organização colectiva da Revista de Legislapão
da divisão: mas é uma comunháo colectivista sem e de Jurisprudência, de Coimbra.
repartição de quotas, na qual os singulares iomu-
nistas não possuem qualquer direito individual por 3 r . Classificações doutrinais e legais das cousas-
si, não podendo por isso exigir divisão. O patri- -Sendo diversa a natureza das diferentes cousas, e
mónio existe para um grupo de indivíduos ligados diversas também as múltiplas e variadas circuns-
por um vinculo pessoal: todos no seu conjunto tâncias em que elas se podem encontrar, compreen-
são sujeitos, mas nenhum tem por si um direito de-se bem como deve correlativamente variar o
separado. Titulares do direito são os indivíduos, seu regime jurídico.
emquanto pertencem ao g r u p o ; por sua morte Torna-se, pois, indispensável classificá-las.
não são substituídos necessariamente pelos herdei- O cbdigo, nos art. 370.O a 382.", define os ter-
ros, mas independentemente das cegras sucessbrias mos de três classificaçdes importantes:
por aqueles que do grupo entram a fazer parte, e a ) Cousas do comércio e fdra do comércio;
como o grupo assim se vai perpetuando, assim b ) Cousas imdvezs e móveis;
a propriedade colectiva fica vinculada áquele c ) Cousas pziblicas, comuns e partzculares.
feixe de sujeitos sempre unidos em colectividade. Não quere, porém, isto dizer que a lei não
O gôzo é indivizkel entre a massa dos comunis- admita outras classificaç0es. r<
tas ;cada um goza na medida das suas necessidades ; E certo que outras há, tambem reconhecidas
as dívidas recaiem sobre todos indivisamente ; para pelo cbdigo, embora nele se não encontrem expres-
dispor da cousa comum todos teem de intervir, a samente definidos os seus termos, porque O legis-
não ser que em virtude da organização colectiva, lador entendeu ser preferível confiar êsse trabalho
esta seja representada pelo chefe. h doutrina e ijurisprudência.
Tal é a figura jurídica da compropriedade i n A estas classificaçóes dá-se, por isso, O nome
mano commune ( ~ ugesammten
r Hand ) do antigo de doutrinais, em oposição as primeiras, que se
direito germânico, da qual existem ainda vestígios chamam legazs.
no direito moderno (1). As mais importantes das classificaç0es doutri-
Vestígios do tipo do condomínio germânico nais são :
no nosso direito são, por exemplo, a comunhão a ) Cousas corpóreas e incorpbreas ;
dos cônjuges, a comunhão coactiva dos muros e b ) Consumiveis e não consumiveis;
paredes meias (art. 2328.0 e seg. ), e o condomínio c ) Funglveis e nno f ~ n q i v e i s ;
das cousas pdblicas e comuns (artt. 380.0 e 381.0). d ) L)tvisiveis e indiqisivets;
E como tal devem também considerar-se o quinhão e ) Principais e acessdrias;
(art. 2190.0 e seg.) e O comPÚscuo (art. 2262.0 e f ) Apropriadas e nullzus;
g ) Presentes e futuras;
h ) Simples e compostas.
(1) Ferrara, pág. 883 e 884. Na exposição de umas e outras seguiremos em
grande parte o estudo magistral que delas fez, no Esta distinção não tem alcance jurídico apre-
C u r s o de Direito Civil, o Conselheiro %r. Tei- ciável, porque, em verdade, as cousas s ó interessam
xeira de Abreu, uma das maiores figuras do profes- ao direito por virtude dos d j r ~ i t o sque sôbre elas
sorado e do faro português. s e podem exercer.
Mas tem grande importância para os sistemas
32. Cousas corpóreas e incorpóreas. Direitos s6bre jurídicos que, como o dos cbdigos,alemão e suíço,
direitos.- Esta distinção traduz a própria natureza só consideram como cousas os objectos materiais
das cousas, que, no seu sentido usual mais restrito, do mundo externo, e em todo o caso, mesmo nos
são apenas os objectos materiais, mas que, no seu sistemas que, como o nosso, consideram como
sentido mais geral, e ainda no seu significado pró- cousas os próprios direitos, ainda tem importância
prio ou jurídico, abrangem também os actos, factos n2o s ó doutrinal, mas de carácter jurídico prático,
ou acontecimentos que não teem uma existência pois que de ser ou nao ser corp6rea uma cousa
material. resulta muitas vezes uma diversa natureza das res-
Cousas corpóreas são, pois, as que teeni uma pectivas relaçues jurídicas.
existência material, podendo ser apreendidas pela É o que acontece, por exemplo, com a questão
acção fisiológica dos sentidos- quae tangi @os- vivamente debatida sobre rP natureza jurídica da
s u n t - como o terreno, os edifícios, o dinheiro, os electricidade. O problema é importantíssimo, não
géneros alimentícios, os agentes naturais, etc. só para determinar a natureza do contracto de for-
Incorpóreas são os modos de ser abstractos e necimento de energia eléctrica, mas para decidir
imateriais das próprias cousas, ou sejam, as cousas se pode haver realmente uma posse da corrente
que, não tendo uma existência real, sb existem nas eléctrica garantida pelas respectivas acgões posses-
concepções psicológicas do espírito humano -solo sórias, e s e pode haver furto de electricidade.
j u r i s intellectu existunt - como são os diversos A maior parte da doutrina alemã nega-lhe o
direitos fraccionários- em que se desdobra a pro- carácter de cousa, dizendo que a electricidade é
priedade plena ou perfeita (servidão, usufruto, etc.) ; uma fdrça, uma vibração da matéria, e não um
e, em geraf, os diferentes direitos subjectivos. objecto c o r p ó r e o ( E n d e m a n n , pegelsberger,
O próprio direito de propriedade plena, como Windscheíd-Kipp, C r o m e , Eneccerus, Kohler,
faculdade abstracta, é uma cousa incorpdrea, em- Oertmann ) (I). E o direito, diz Endemann, não
bora na doutrina mais subtíl do direito romano a pode prescindir do conhecimento actual da essen-
concepção jurídica das cousas corpóreas se refira cia das cousas.
i propriedade plena ou perfeita.
Esta idka acentua-se bem no uso ainda hoje
dominante de designar pela prbpria cousa o direito (1) Entretanto e certo que tambkm alguns jurisconsultos
de propriedade plena, que sbbre ela se exerce, notaveis (Gierke, Dernburg) a consideram uma cousa. Mas
dizendo-se - esta cousa pertence-me - e m vez porque a grande corrente era pela negativa, não se enqua-
drando por isso no furto a subtragão fraudulenta de energia
de se dizer-pertence-me a p r o p r i e d a d e desta
eléctrica, foi publicada na Alemanha a lei de 9 de abril de 1899,
GOUSU. punindo o furto como crime especial. Ferrara, pág. 737.
Mas aqui está precisamente, diz bem Ferrara, Existe, pois, juridicamente a categoria de
O êrro de tal doutrina. Não é sobre as teorias da direitos s6bre direitos.
física ou sôbre as hipbteses scientíficas da natureza Mas o problema tem sido vivamente contro-
da electricidade, que podem variar de um momento vertido, dizendo-se contra a realidade de tal cate-
para outro, que o direito deve formular as suas goria, que a concepção romana dos direitos como
decisdes. O direito B uma organiza~ãoprática cousas incorpbreas tem por fundamento a sin-
das relagões, e por isso deve assentar si3bre pontos gular confusão, que na propriedade se faz entre a
de vista práticos. Ora é inegável que a energia cousa objecto do domínio e o mesmo direito de
eléctrica é susceptível de apreensão e utilização propriedade : confunde-se o direito de proprie-
económica, é perceptível aos nossos sentidos, pode dade com a cousa na afirmação res mea cst, que
isolar-se e recolher-se em acumuladores, pode ser em vez de enunciar o direito de propriedade enun-
medida, dividida e fornecida: e tudo isto é mais cía a prbpria cousa. E, pois que do património
que suficiente para se ver nela um objecto suscep- fazem parte outros direito's, j u r a in r e aliena e
tível de propriedade material. E manifesta a ana- direitos de crédito, mas porque estes não teem
logia entre os líquidos e os gazes conduzidos p o r uma consistência material, dá-se-lhes o nome de
tubos recolhidos em'recipientes ou reservatdrios, res incorporales, do mesmo modo que ao direito
e a electricidade conduzida por fios e concentrada de propriedade identificado com a cousa, que é o
em aparelhos vários ( I ) . seu objecto, se chama res corporalis.
A concepção romana das res incorporales Como se vê, há aqui realmente uma confusão
inclui nesta categoria os direitos patrimoniais, entre a classificação das cousas e as partes consti-
dando lugar A célebre questão dos direitos sobre tutivas do património; agrupam-se para um lado
direijos, muito debatida tanto no campo do direito as cousas (objectos corp&reos), e para outro lado
romano, como no direito moderno. . os direitos, que si40 entidades heterogéneas ( I ) .
Considera, com efeito, o nosso código (art. Esta foi também naturalmente a idea que inspirou O
375.O, n." %.O, e 376."), A semelhança dos c6digos nosso legislador ao enumerar entre as cousas mb-
latinos, e também o cbdigo hrasileirn, apesar de veis e imbveis os direitos patrimoniais. Esta idea
moldado em grande parte pelo tipo ger-mano-suiço, não pode portanto deixar de se reconhecer como
como cousas, não s b os objectos materiais, mas construcão positiva da lei; mas sob O ponto de
também os prbprios direitos reais e de crédito ; e
admite que de um direito pode ser objecto outro Foi por isso que a teoria dos direitos sôbre direitos,
(1)
direito, quando, por exemplo, o penhor ou o acolhida a principio por Windscheid, foi depois por ele aban-
usufruto é constitujdo sobre títulos de crédito donada, perante a critica da maior parte dos escritores (Exner,
( art. 857.O e 2237."), como quando a hipoteca é Mansbach, Hanauseck, Bekker, Dernburg), ficando-lhe entre-
constituída sobre direitos imobiliários ( art. 890."). tanto alguns fiéis (Sohm, Seckel, Bierm~nn). Na Itália foi a
teoria adoptada pelos anotadores de Windscheid, Fadda e
Bensa, e por Venezian, mas combatida por quasi todos os
outros escritores de autoridade, Ferrara, Covicllo, Ruggiero.
( l ) Ferrara, log. cit. Ferrara, pág. 413 ; Ruggiero, pág. 391.
vista scientifico seria certamente mais exacto ex- forma que perdem a sua pr6pria individualidade,
cluir das cousas os direitos, embora se deva man- e n5o podem já prestar a mesma utilidade, como
ter a distinção das cousas corpóreas e incorpóreas, acontece com os géneros alimentícios, com as
para incluir nestas os bens imateriais ( I ) . sementes, etc.
Quanto A possibilidade de ser um direito Pelo consumo civil, as cousas manteem a sua
objecto de outro, ela é textualmente admitida no individualidade, mas perdem a possibilidade de
direito moderno, como era também pelo direito continuar a prestar a mesma utilidade ao indiví-
romano. E se falar de direito que tem por objecto duo que delas se utilizou, como acontece com o
um outro direito, em vez de uma cousa, não re- dinheiro.
pugna A concepção jurídica da relação entre direito É por isso que ao consumo fisico se chama
e objecto ou cousa, é porque afinal é sempre uma também absoluto, e relativo ao consumo civiE:
cousa que, mesmo nas figuras jurídicas de direitos
s6bre direitos, é o objecto do direito: C o im6vel -
34. Cousas funglveis e "ão fungfveis. Esta divi-
dado. em usufruto o u em enfitêuse, e a quantia de são é tão semelhante-h anterior, que muitos juriscon-
dinheiro ou qualquer cousa, ou facto devido pelo sultos e legisladores as teem confundido, parecendo
devedor, que é afinal o objecto do penhor ou da que O nosso c6digo incorre na mesma confusão,
hipoteca que serve de garantia da obrigação ( 8 ) . nos diversos artigos em que a elas se refere (artt.
765.O, 1259.-, 1260.", 1506.", 1507.", 1633.", r637.",
33. Cousas censumlveis e nãe consumíveis. - Tam- 2209.', a a a ~ . ~ n . I."
" ' e z.", etc.).
bém esta distincão se funda na prbpria natureza Cousas fungiveis são as que, por vontãde
das cousas, sendo certo que umas, as consumi- expressa ou tácita das partes, podem ser substi-
veis, com o primeiro uso que delas se faz, deixam tuídas por outras do mesmo género, qualidade e
de poder continuar a prestar a mesma utilidade a ' quantidade - quarzlm una alterius vice fungitur
que foram destinadas; quer dizer, são as que se (cbdigo civil, artt. 1507.' e 1636.").
consomem, fisica ou cicilmente, com o primeiro Cousas não fungiveis são, pelo contrário,
uso a que se destinam; pelo contrario, outras, as as que teem de ser entregues ou restituídas
não consumiveis, embora estejam sujeitas as leis em espécie, isto é, as mesmas e idênticas, não
naturais da sua destruição gradual, não deixam de podendo ser substituídas por outras da mesma
existir, nem fisica nem civilmente, com o pri- natureza. ,
meiro uso que delas se faz, como a mobília, o Assim, por exemplo, se se empreSta um livro,
vestuário, os livros, etc. para que a pessoa que o pede o restitua depois de
Pelo consumo fisico, as cousas não deixam de se servir dêle, o livro é náo fungível, e o con-
existir absolutamente, mas transformam-se por tal tracto é o commodato (art. 1507.~);mas se a pes-
soa que o pediu pode dispdr dêle como quiser,
obrigando-se apenas a restituir outro exemplar da
1) Os Princi#zos, I, pag. 616 e 617. mesma edição, o livro é fungive2, e O contracto 6
(2) Ruggiero, pag. 391 e 392. de mútuo (art. 1507.0, i n fine).
. O mesma é de dizer a respeito do empréstimo 35. Cousas divisíveis e indivislveis.- A noção de
de dinheiro em certa moeda. divisibilidade implica a ídea de separação material
Por conseqüência, 6 certo que a mesma cousa, de uma cousa em diversas partes; mas neste sen-
por sua natureza consumivel, pode ser fungt- tido a divisão aplica-se só is cousas corpóreas.
vel ou não funglvel, conforme a vontade das Ora em direito a divisibilidade refere-se tam-
partes. bém as cousas incorpóreas, traduzindo então uma
E o mesmo acontece com uma cousa não con- idea de separaçâo imaterial ou intelectual, a qual
sum<uel, como mostra o exemplo do livro. se verifica, por exemplo, no direito de comproprie-
E porque, emquanto que a distinção das cousas dade pro partibus indivisis, no qual cada consorte
consuniíveis e não consumíveis se funda apenas na tem sbbre cada uma das partes da cousa direitos
própria natureza das cousas, a distinção das fungí- d e propriedade perfeitamente iguais aos dè todos
veis e não fungíveis tem o seu principal funda- os outros comproprietários, por tal modo distintos
mento na vontade das partes. entre si, que a lei reconhece a cada um a facúldade
Já o nosso Coelho da Rocha, apesar de iden- de alienar o seu prpprio direito.
tificar as duas distinções, ao definir os seus ter- E como a cada um destes direitos diferentes
mos, reconhecia entretanto aquela diferença im- correspondem necessariamente objectos também
portante. diferentes, é f o r ~ o s oseparar para objecto de cada -
Definia cousas fungiveis aquelas das quais se um deles uma parte não determinada material-
não póde usar, s e m se consumirem, ou ao menos mente, mas apenas abstracta ou -intelectualmente,
sem lhes alterar a natureqa, como são ordinaria- na propriedade ou cousa comum.
mente as que constam de pêso e medida, por exom- Cousas divisiveis são, pois, aquelas que podem
plo, o vinho, o trigo, e também o dinheiro em ser nzaterial ou zntelectualmente separadas em
moeda, porque dele s e não póde usar sem o gastar; partes da mesma natureza do todo, sòmente mcno-
e c o u s ~ ns ã o - j u q i v e i s aquelas de que se pdde u s a r res em extensão.
sem se consunzirem, como os animais e os prédios. E in~divisiveis são as que nem material
Mas, apesar disso, escrevia : I-,j n e m intelectualmente podem ser separadas em
«Esta distinção tem muito uso na jurisprudên- partes.
cia. É necessário, porém, advertir que ela ngo é Todas as cousas corpbreas são maferialmente
tão exacta que possa seryir de base a todas as con- divisíveis; mas nem todas o são juridicamente,
clus0es jurídicas, pois muitas vezes cousas, que se porque muitas vezes a lei declara indivisiveis as
consomem pelo uso, são reputadas nas leis, nas cousas que não podem ser divididas sem detri-
convenç0es ou testamentos, como não-fungiveis, e mento, como, por exemplo, um animal vivo, um
vice-versa w. E exemplifica com o dinheiro e com livro, um retrato, etc. (cód. civ., artt. 2128." e
o vinho, nos termos já referidos ( I ) . 2145.~ cód.
~ de proc. civ., art. 720.").
Pelo contrário, todos os direitos subjectivos
sao por sua prbpria natureza indivisíveis, porque
(1) Inst., § 81 e nata. um direito, ou existe na sua perfeita integridade,
qu não existe, "não se compreendendo o que seja a indivzsa, não sendo necessário que seja realmente
terça, 'ou a quarta parte de um direito s6bre uma indivisivel, como aliás se diz no art. 1566.O.
causa, mas, apenas o direito de dispor da terça ou Êste modo d,e vêr parece ter-se tornado defini-
quarta parte dessa cousa. tivo depois que o c6digo de processo civil deter-
Não há direitos divislveis, diz um escritor, minou rio art. 848.O, n." 7 . O : « Afim de poderem
-as apenas direitos com objecto divisivel. usar do direito de preferência serão citados para
Muitas vezes a lei considera como divisáveis assistirem h praça: 7.0 os comproprietários quando
ou indivisiveis só as cousas que podem ou não se tratar de arrematação da parte que pertencer ao
ser materialmente divididas, embora sejam ideal- consorte na cousa indivisa» (1).
mente divisíveis (cbd. civ., artt. a180.", n.O a.", Quer dize* : tem-se entenaido que esta dispo-
2183.O, 2128." e 2145.O, e c6d. de proc. civ., art. 570.-
sição modificou, ou pelo menos interpretou auten-
6 5 2."). ticamente, a palavra indiaisivel do art. 1566." do
Outras vezes emprega aquelas expressões no cbdigo civil.
seu sentido mais geral, chegando mesmo a qualifi- Parece-nos, porém, inadmissível esta doutrina.
car como indivisiveis cousãs que, de facto, pelos Não é aceithvel a idea de uma interpretação
menos idealmente, são divisíveis, como, por exem- autêntica : em primeiro lugar, porque as leis s6 são
plo, o direito de vários coerdeiros 4 herança ainda interpretativas quando como tais são expressamente
indivisa (c&. civ., artt. 2015.' e 2269."). formuladas, ou como tais se apresentam lbgicamente
$ que a indivisibilidnde de uma'cousa póde pelo seu prbprio conteúdo ; em segundo lugar, por-
resultar da sua própria natureza (art. 2269.*), OU que a substituição de uma palavra por outra de
da disposição da lei (art. 2015.'), ou da vontade sentido completamente diverso, e é o caso de indi-
das partes (art. 7 ? r . O ,
n.Oe r . O e 3." ).
vislvel por indivisa, não pode ser qualificada como
A iadivisibilidade das cousas ou dos direitos interpretação, pois é manifestamente uma modifi-
tem grande importância, pelos efeitos que produz cação ou revogação da lei anterior.
%EIS relações jurídicas, como fácilmente se vê nas Mas, desde que o cbdigo de processo náo fez a
referidas disposiçóes do c6digo civil. revogação expressa do art. 1566.~do código civil,
Um dos seus mais notáveis efeitos verifica-se s6 poderia admitir-se aquela doutrina no caso de
no direito real do condomínio ou compropnedade, revogação tácita, isto é, se houver contradeda&
nos termos do art. 1566.": é o direito de opção ou inconciliável entre as duas dispos?çções.
preferência conferido ao consorte que tiver maior Mas tal contrariedade não existe; e as duas
quota, ou a todos, se as partes forem iguais, quando disposiçbes conciliam-se perfeitamente, entenden-
algum deles quiser vender ou tiver vendido a sua do-se que o art. 848.0 do cbdigo de processo manda
parte. citar os comproprietários para deduzirem o seu
A doutriaa e - a jurisprudência teem-se acen-
tuado no sentido de que aqbele direito de prefe-
rância existe sempre em todos os casos de com- (1) Dr. Vilela, em um artigo de jurispmd&nciacritica,
no Boletim do Faculdade de Dzraito da ~n;oersidadede Coim-
propríedade, . ernquanto a cousa comum estiver bra, vil, pág. 84.
direito de preferência, se o t i v w e m ; mas é claro Coelho da Rocha definia cousas principais
que s6 o teem, tratando-se de cou-sa i?zdiaisivel, aquelas que existem' por si e 6 a r a s i ; e acessórias
nos termos do art. 1566.- do có,digo civil, e não 04 pertencas aquelas que estão exteriormente uni*
apenas indivisa, como inadvertidamente, por certo, das d principal, ou seja pela natureza, como a
se escreveu no n." 7.0 do art. 848." do código de aluvião, o feto, os frutos; ou pela vontade da
processo. homem, com O fim de as fazer servir ao .uso perpé-
Mas como a indivisibilidade pode ser natural, tuo da principal, como -os animais e ferramentas
legal ou voluntária, ci claro que se os compro- de lavoura a respeito dos prédios rústicos (I).
prietários tiverem f e i t ~pacto de indivisão, no8 No direito de acessáo (art. 2289.0) o nosso
termos do art. 2185.', a COUSR indibisa 6 zndivisi- cbdigo exige, para se verifiiar a r e l a ~ ã ojurídica
nel emquanto subsistir válidamente aquele pacto, de cousa principare acessbria, que esta seja u n i d a
o que em certo modo explica a inadvertência do e incorporada Aquela, e que as duas não perten-
emprêgo da palavra indivisa em vez de indivisivel çam i mesma pessoa no momento em que se esta-
n o n,O .7." do art. 848." do cddigo de processo. belece a subordinação jurídica de uma A outra. -
Acrescente-se a'isto a circunstância de que o E assim, já n-ão podem considerar-se como
art. 848.0 é apenas uma regra de processo, tendente acessórios dos predios rústicos os animais e instru-
por um lado a assegurar convenientemente os efeitos mentos aratórios.
das arremataçóes na execucão dos devedores, e Entretanto é certo que a propósito do art.. 1843.8,
por outro lado a restringir o exercício do direito onde é expressa a referência a esta divisão tfas
de preferência dos comproprietários citados, nos cousas, já o c6digo nãa exige aquelas duas condi-
termos do 5 2 . O do mesmo artigo, e reconhecer-se çóes, sendo dispensada a primeira, e até excluída
há necesshriamente que o pensamento do código a segunda.
de processo não foi modificar a essência daquele Mesmo no direito de acessão a lei dispensa o
direito, ampliando-o além dos limites em que o requesito daincorporação na hipótese do art. 2293.O.
reconhece o art. 1566.0 do código civil. É que no seu sentido mais geral consideram-se
, .
acessórias as cousas que são adjacentes a outras,
36. Gousas principais e acessbrias. Pertenças, fru- ou mesmo separadas, mas que servem para lhes
tos e Bemfeitorias. -O código civil faz referencia A aumentar as utilidades, como os pátios e os jardins
distinção entre cousas principais e acessórias no em relação aos prkdios urbanos, e cs utensílios de
capítulo do direito de acessüo (artt. 2289.0 e segs. ), uma adega, de um lagar, ou de d a fábrica, em
embora não empregue textualmente estas expres- relação ao estabelecimento principal.
sóes. Mas, em todo o caso, os dois termos da divi-
Mas outra referência, expressa e textual, é s são teem uma significação meramente relativa, pois
que se encontra no art. 1 8 4 ~ . 0ordenando
, que a consideradas e m s i mesmas, e por sua própria - - - natu-
-
cousa legada ( a principal ) deve ser entregue com
os seus acessórios: no lugar onde, e no"estad0 em
que estiver ao tempo da morte do testador. , .
reza, não há distinção real entre cousas principais por exemplo, o dos objectos arrojados pelas cor-
e acessbrias; como diz o dr. Teixeira de Abreu, a rentes sobre os prédios marginais, que ficam pes-
distinção s6 aparece quando a união das duas cou- tencendo aos proprietários dêstes prédios, se os
sas origina a subordinação de uma outra. E esta donos de tais objectos não forem levantá-los no
relação de subordinação póde dar-se : prazo de três meses ou a o que judicialmenk lhes
. a) entre duas cousas wrp6reas ( prhdio e f6r assinado ( a r t . 2292.O); do mesmo modo a
sementejras) ; acessão dos mouch0es e aterros, nos termos do
b ) entre uma cousa corpórea e outra incor- ( art. 22gg.O), e alguns casos de acessáo imobiliária
pórea (prédio dominante e servidão ) ; e industrial ( art. 2304.0-2308.~).
c ) entre duas cousas incorpbreas (crkdito e Como cousas acessórias devem considerar-se
hipoteca) ( i ). as pertenyas, os fruios e as bemfeitorias.
Alguns autores, como o Dr. Alves Moreira, O nosso código regula os frutas nos art. 495.0,
entendem que o conceito de cousas acessórias é 497.' e outros; e as bemfeitorias nos art. 498.'503."
extranho ao instituto da acessão: <Quando, pela e outros. Não regula especialmente as pertencas,
acessáo, cousas que pertençam a diversos proprie- porque naturalmente considera, como Coelho -da
tários se unam ou encorporem (art. 2289.O), de Rocha, esta palavra sinbnima de cousas acess6rias
modo que não seja possível separá-las sem sedes- em geral.
traírem ou sofrerem notável detrimento, as cousas Parece-nos contudo que, para melhor com*
que se unem ficam formando um todo de carácter preensão da doutrina das cousas acessórias, con-
unitário, ficam sendo partes componentes, e não vém ter presente o conceito de pertenqas eiabo-
acessórias ou integrantes, não tendo assim aplica- rado pelos autores italianos. Pertenças são as
ção o conceito de cousas acessórias, e sendo em cousas que, conservando a sua individualidade e
regra peIo valor que tem de determinar-se a quem autonomia, são postas numa relação permanente
fica pertencendo o todo (art. 2299.", 2301.", 23oz.", de subordinação a uma outra para lhe servir de
4 1.q 23o6.", r:)> ( 3 ) . melhor uso, ornato ou complemento. Não for-
O certo é, porém, que nas fontes romanas se mam parte constitutiva ou integrante do todo: de-
encontra em matéria de acessão a relação entre pendentes juridicamente da princapal, sSo dela
cousas principais e acessórias, bem expressa nos independentes no ponto de vista da função e da
aforismas c accessorium sequitur ~rinci$aLea, essência do todo, porque dêste se podem livre-
r accessio cedit principali>. E o nosso código mente separar, sem lhe alterar a função-e a essên-
regula casos de acessão em que as cousas acessó- cia; a sua separação sòmente importa a deminuição
rias se juntam com a cousa principal, sem ficarem do valor de uso ou de perfeição da cousa principal,
constituindo com esta um todo inseparávei : tal é, a cujo serviço ou ornamento elas são destinadas
de modo permanente. Pode a conjunção ser tam-
bém material, mas o que constitui o vínculo de
(1) Dr. Teixeira de Abreu, pág. 242. subordinação jurjdica é a destinação voluntária da
(2) Dr. Alves Moreira, Insf., pag. 556. cousa acessbria posta em prática pelo possuidor
da cousa priqcipal para sua utilidade ou ornamento Distintos das pertenças são os frutos.
constante. C a r a c t e r e s das pertenças são pois : Por frutos em geral entende-se os produtos
a ) um vínculo, que pode ser físico ou intolcctual, OU utilidades materiais produzidas por uma cousa.
mas sempre subjectivo, porque 6 criado pela von- Emquanto se não destacam da cousa máe são uma
tade do possuidor ;,b ) uma afectação permanente parte fisicamente componente ou essencialnlente
;i0 serviço da cousa principal, que por isso sb pode constitutiva dela mesina; e depois de separados,
ser determinada e realizada pelo proprietário ou seguem o seu destino no consumo económico.
possuidor normal, e não por um possuidor even- NO sentido mais amplo a palavra frutos de-
tual, como o locatário ou o possuidor precário ; signa tanto as produções orgânicas como os pro-
c ) destinação ou afectação realizada de facto e dutos inorgânicos, não s6 as formações naturais e'
não apenas deliberada ou desejada. peribdicas, mas também as civis ou jurídicas, isto 8,
Exemplos de p e r t e n ~ a ssão as molduras dos as rendas, lucros oii juros, que o proprietário ou
quadros, as estátuas à entrada das casas e as está- possuidor da cousa recebe pela cedência do seu uso.
tuas nas frontarias, e em geral todas as cousas que Mas no sentido prbprio ou técnico, frutos são
por afectação ao serviço permanente dum prédio as partes orgânicas'que a cousa produz e reproduz
como que nele se imobilizam, e por isso são pelos (quzdquid ex re rrascz i t renasci), qder expontâ-
códigos francês, italiano e outros consideradas neamente, quer pela acção do homem, reprodu-
imbveis por destino . ( I ). zindo-se peribdicamente até se. exgotar a capaci-
Ora a diferença do carácter jurídico entre as dade reprodutiva.
duas espécies de acessões, as acessões em sentido O sentido Mrídico não é o prbprio OU técnico;
estrito e as pertenças, está em que as primeiras, o que no nosso cbdigo se vê claramente pelo
não sendo normalmente capazes de domínio sepa- art. 495.', § 3.G, c l a ~ s i f k a n dOS~ frutos em naturau,
rado, acompanham necessàriamente a cousa prin- os q u e a cousa produz expontânearnente, indus-
cipal, de modo que alienada esta são também triais, os que a cousa produz mediante 'a indústria
compreendidas na alienação; emquanto que as do homem, e civis, as rendas o u interesses prove-
pertenças, tendo a sua individualidade prbpria, e nientes da mesma cousa. E por outro lado emprega
sendo perfeitamente idóneas para uma existência no art. 375.' e outros a palavra produtos, para
separada, acompanham ou não a sorte da cousa significar os frutos naturais e industriais. Mas nos
principal, conforme se revelar a vontade do su- arts. 2252." e 2253.0 refere-se d aos frutos no sen-
jeito no acto jurídico da sua disposição (=). tido prbprio.
Mas tambem não t: no sentido mais amplo que
o nosso cbdigo emprega a palavra frutos, porque
( 1 ) lnfra, n." 42. Mas como pertenças não podem con-
siderar-se os m6veis de uma casa, porque não são destinados se assim fosse abrangeria também as minas, que
ao serviço do prédio, mas das pessoas que nele moram. nem sequer são prbpriamente consideradas como
(2) Ruggiero, pág. 402 e 403. Em certo modo pode objecto do direito civil, mas sim de legislação espe-
dizer-se que esta doutrina inspirou o art. 1844.O e 8 unico do cial (art. 4b7.0)~que é principalmente de direito
nosso código. administrativo ( lei de r3 de abril de 1917).
Para distinguir o s frutos dos produtos, diz o de fornriaç80 agrícola do ano económico (frutos
Dr. Alves Moreira : c nestes entra qualquer utili- naturais ou industriais ), e além disso as rendas ou
dade que a cousa seja destinada a produzir, haja juros que as outras cousas dão pela cedência d o
ou não diminuição da sua substância. São frutos seu uso (frutos civis) ( I ) .
tanto as utilidades que a cousa produz directamente,' Para exacto conhecimento do regime jurídico
como as que produz indirectamente, desde que essas dos frutos, é necessário ter presente a tradicional
utilidades se reproduzam periòdicamente. E assim classificação dos frutos naturais e industriais, con-
que, não podendo considerar-se frutos as vinhas, forme o seu estado, que Coelho da Rocha sinte-
olivais e quaisquer arbustos frutíferos, devem assim tizou admiravelmente : a dizem-se pendentes em-
considerar-se as devesas de talhadia, as plantas de quanto estão unidos L cousa que os produziu;
vivèiro e quaisquer arvores destinadas a cortes percebidos ou colhidos, depois que dela estão,
regulares > ( I ) . separados, e com destino de se usar deles; e estes
Mas não vemos a razão porque se não possam dizem- se exstantes ou consumidos, conforme exis-
considerar frutos as árvores frutíferas, quando como tem ainda, ou não, em poder do possuidor da
tais se consideram as não frutíferas destinadas a cousa. Finalmente dizem-se percipiendos aqueles
d r t e ou arranque regula< tanto mais que aquelas que, por dolo ou culpa lata, deixaram de se per-
também se podem reproduzir periòdicamente, en- ceber (c6d. civ., art. 497.0) O s frutos pendentes
trando portanto n o conceito g e r d dos frutos. das cousas imóveis reputam-se também imóveis,
O que nos parece é que as árvores, mezmo as excepto quando se dispae deles para serem sepa-
de devesas de talhadia, são produws, mas não são rados o (cbd. civ., art. 375.' n.' I . ° )
frutos, como resulta do confronto dos art. 2 2 1 0 . ~ ~ A distinção entre frutos naturais e civis tem
2211.~e 2212." com crs art. 2252.O e 2253.O. grande importância no diverso modo como s e
Como frutos n&o podem mesmo considerar-se adquirem: para os naturais é pela separação o u
toclos os produtos das árvores, mesmo que sejam ' colheita (art. 2203.O) wtambem peIo trabalho efec-
de reprodução peribdica, como por exemplo a cor- tivo ou presumido do possuidor (art. 495.") ; para
tiça dos sobreiros e azinheiras, porque lhe é mani- os civis vigora a regra de adquisição dia a dia
festamente inaplicável a regra da partilha entre o (art. 495.O e nzog."), e portanto quem tem direita
proprietário e o possuidor de boa fé, formulada no a eles adquire-os como se eles amadurecessem an
art. 495.O, bem como o da validade da venda feita se vencessem dia a dia, embora os não tenha
pelo usufrutuário antes do amadurecimento, for- colhido ou recebido.
mulada no art. 2252.:
Devemos, portanto, concluir que o conceito
jurídico de frutos abrange apenas os produtos orgâ- (I) Note-se que a diçtinqão entre frutos naturais tindus-
nicos que a terra dá dentro dos respectivos períodos ttiais é de importância mais económica do que juridica. Em
todo o caso parece-nos que tambCm tem ualar juridico, para o
efeito de se aplicar ssbmente aos frutos industriais a regra- d e
partilha formulada no art. 495.".
(1) Dr. Alves Moreira, pág. 356. ( z ) Coelho da Rocha, 5 83.
Pelo que respeita a última classe de cousas êste fôr de boa ou már fé. As necessikias dão sempre
acessórias, ou bemfeitorias ou melhoramentos, ou direito ao reembolso, mas s6 o possuidor de ^boa
despesas (spese), como dizem os italianos, e dizia fé goza do direito de retenção emquanto não for:
também o nosso grande Coelho da Rocha ( 3 84), pago (:irt. 498."). As iiteis conferem sempre o
ainda hoje vigora a triplice distinção do direito direito de as levantar, não se daficlo deterioração
Tomano: a ) necessárias, as feitas para conservar na cousa; e no caso c o n t r r i o direito a indemnização
a cousa, de modo que, se não fossem feitas, a cousa pelo valor delas no momerito da entrega da cousa;
.oupereceria ou se deterioraria (art. 498.0); b) zlteis, mas s b o possuidor de boa fé goza do direito de
as feitas para lhe aumentar a utilidade ou o rendi- retenção (art. 499.0). As voluptuárias s 6 dão ao
mento ( art. 4 9 9 . O , 5 I .'), como por exemplo trans- possuidor de boa fé o direito de as levantar, náo
formar um prado em vinha; c) voluptuárins, as havendo deterioiação da cousa (art. 500.' e 502.°)1
feitas para mero embelezamento da cousa, ou gôsto
a recreio do possuidor (art. 5oo.O, I."), como, por
exemplo, as plantas e fontes artificiais, as plantas
..
37. Cousas apropriadas e c iullins - Esta divi-
são funda-se no facto de haver cousas que não teem
naturais mas de mero luxo, as pinturas, etc. ( I ) . dono ( r e s nullius);. e que, por isso, podem ser
- A tripartição das bemfeitonas correspondem apropriadas pelo primeiro que as quiser e puder
regras diversas a respeito da obrigação que tem o apreender ( ocupacão ).
proprietário de reembolsar aquele que as fez. Essa As cousas que fazem parte do patrimónzo de
ebrigação pode ser muito diferente conforme a alguém ( a p r o p r i a d a s ) eram pelos Romanos desi-
natureza da r e l a g o jurídica. Neste lugar limita- gnadas res zrc prttrirnonio, em oposição As res
mo-nos a indicar as regras gerais na relação jurí- extrapatrimonium, que, além das nullius, com-
dica entre o proprietário e o possuidor. conforme preendem as res communes, que por sua pr6pria
natureza não são susceptíveis de apropriação indi-
São precisamente as definiçbes do direito romano:
vidual, sendo destinadas ao uso de toda a gente,
(1)
Impensarum species sunt tres, dizia Ulpiano : aut enim neres- como o ar, a água, o sol, etc.
sarzae aut utzles aut voluptuosae. Necessarzae sunt zmpensae, O nosso cbdigo refere-se a três espécies de
quzbus non f a c t i s dos deterior f u t u r a est, veZut si quis rutnosas cousas nullius: as que nunca tiveram donó, as
xefecertt; utiles sunt, quzbus non factzs quzdem deterior dos que foram abandonadas, ' e as que foram perdidas
non fuerzt, f a ~ t z sautem fructuosior efecta est, veluti sz vzneta
et ol~z'etaj e c e r í t : volzrptziosae sunt, neqzre omissis detertor dos
não s e n d ~reclamadas em tempo (art. 383.0 e segs.);
jierit neque factzs fructuosior d f i c t a est: quod evenzt in wrz- mas verdadeiramente há s6 as duas primeiras, por-
darzzs et picturis similibusque rebus. que as cousas perdidas s6 podem ser ocupadas, e,
Igualmente expressivas, e mais sintkticas, eram as defini- portanto, s6 se consideram nullius, quando s e
qões be Rauio: Impensad necesrariae sunt, quae st factae non tenha dado ao facto da achada a publicidade que a
sint, res a u t peritura aut detertor futura s i t ; utiZes impensae
esse FuZcinzcS a i t , quae meliorem dotem f a t i a n t ; voluptuariae
lei ordena, e o seu. dono não aparecendo-a recla-
sunt; quae speciem dumtaxat ornant non etiamf r u c t u m augent: .pá-las faz presumir que as abandonou.
u t szint viridra et aquae salientes, inrrutationes, Zarrrationes,
.
8 a - distinção das- cousas em apro#riadns e
picturae. nullius que dá lugar h divisão dos modos de adqui-
rir em origiltários e derivados, pertencendo Q todos os dias promete emrregar aquilo que se pro-
primeira classe, na opinião geral, s6 a ocupação, pbe adquirir (I).
e todos os outros A segunda. Entretanto o princípio enunciado $r Simona
celli, como regra geral, está sujeito a tais restri-
38. &ousas presentes e futuras. -O cbdigo não çdes, que tãlvez seja mais exsto formalar-se 80
formulou esta distinção, mas reconheceu expressa- sentido inverso, isto 6, que sb são vUidos os actos
mente os seus termos. Assim, ao definir a doação, jurídicos sabre cousas futuras aos casos e& que a
referiu-a sb a bens presentes (art. 1452:); e no lei os permite.
art. 1453."declarou que a doação não pode abranger Em comércia o princípio B verdadeiro, e o
bens futuros, defhindo estes no 5 único: aqueles nosso cbdigo comercial faz um3 aplicação dêle WJ
que nâo se acham em poder d o doador, ou a que art. 467.', dispondo que sso permitida's:'~." at com-
este não tem direito ao tempo da doação ('1. pra e venda de comas incerta5 ou de esprznças,
Mas como bens nem sempre é o mesmo que sdvo sempre o disposto nos artt. 1576.- e 1557.~ dO
C O U S ~ S (supra, n."" 28 e ng), torna-se necessário c66igo civil; 2." a venda de cousa que fbr proprie-
definir as cqusas futuras, para se poder saber até dade de outrem, ficàndo o vendedor obrigado a
que ponto elas poderão ser objecto. das relações adquirir e entregar a cousa ( 3 Único do art. 467.").
jurídicas. Mas nas relaçdes civis já não vigora o mesmo
Futura é aquela cousa que, embora ao pre- pimcíp?o, pois a afl;. rg55.O ãcv ~ 6 d i g dvil
e declara
sente R ~ Oexista i n rerunz ~ l a t u r aou no patrimb- hulo o contracto de venda cowa qrrep pertet8qtd
nio duma pessoa, todavia segundo o curso natural a outreni, dispondo ao mesmo tempo que ninguém
dos acontecimentos deverá ou poderá existir, ou pode vender senão o que fdr proprieda-de sQa; e O
poderá entrar no património da pessoa segundo as art. 1556.0 declara que não pode ser objecto de
regras normais da actividade jurídico-económica. compra e venda á sucessão futpr;Í, assim corno o
Que a cousa futura não tenha existência ao art. 2042.' proíbe em princípio todw os pactm
presente pode, portanto, entender-se de dois modos: sucess6rios.
ou no sentido de que não tem ainda existência Mas no sistema do nosso c6digo náo está C O ~ -
físicá, Q U no sentido de que não está aind? no pairi- signada a doutrina ensinada por s i m ~ d ~ e l tdizendo
i,
mbnio do disponente ( s ) . Em regra, acrescenta que em face cto ar€. 1977."do c6digo italiano a hipo-
.
Simoncelli, as cousas futuras podem ser objecto
de negócios jurídicos, aos quais, porém, é inerente
teca s6 pode ser constituída sôbre coasas presentes,
pois a indeteminação, qíie fácilmente pod&a
a candição suspensiva : se a cousa existir ou entrar redundar na antiga situagâo de gravâmes e encar-
no patrzmónio do disponente. O comerciante, por gos gerais sobre a terra, é incompatível com o
exemplo, normctlmente vende eousas de oarem: princípio da propriedade livre, que domina no
direito moderno.
( 1 ) Note-se porém que nas doaçbes para casamento
podem incluir-se bens futuros ( a r t 1166.O, i r 7 1 . O e 1175." ).
(2) Simoncelli, Istitu~ioai,pág. 140. (i) Simoncelii, pág. i4r.
'9
Sem nos preocuparmos agora com o sistema A importância desta distinção:consiste em que
do código italiano, o que é certo 6 que no nosso a muitas vezes, tratalido-se de cousas compostas,
hipoteca pode abranger cousas futuras, como resulta para definir a rclação jurídica, é necessário ver se
claramente do art. $r.@, segundo o qual a hipoteca a lei ou a vontade das partes tiveram em vista a
dum prédio abrange também as acessdes naturais totalidade d a cousa, ou apenas as suas singulares
e as bemfeitorias feitas i custa do devedor, e do partes componentes.
art. gog.", que admite a hipoteca geral voluntária O direito, para distinguir as cousas em simples
sBbre todos os bens do devedor, sem distinção e compostas, não tomou por base o s critérios da
entre presentes e futuros, salvo o direito de redu- química, nem mesmo os da" física, mas sim o cri-
ção ou limitação da hipoteca aos prédios de valor terio filos6fic0, econbmico e social : assim, simples
suficiente para garantir a obrigação. são as cousas que teem uma individualidade unitá-
E não há incoweniente em se permitir a hipo- ria, e como tais se consideram no uso, embora na sua
teca geral, pois que esta garantia real s6 pode estrutura fisi ca sejam compostas de várias partes
tornar-se efectiva pela sua inscrição no registo ou elementos, como por exemplo um quadro, um
predial, e êste é que só pode fazer-se em relaçao a livro, um prédio rústico sem acessórios, etc.; e
certos e determinados prédios ( I ) . compostas são as que resultam da conjunção
ou conexão mais ou menos íntima de várias
39. Cousas simples e compostas. Universitates cousas simples, em que as partes componentes
fadi e universitates juris ,-As cousas ou constituem se podem sempre distinguir, e até eventualmente
por si mesmas uma iInidade material, ou são cons- separar, e embora o todo apresente na sua com-
tituídas por uma pluralidade de cousas, cada uma posição uma ipdividualidade mais ou menos com-
das quais é em si mesma uma unidade natural. plexa, como o navio, um móvel, a biblioteca, o
As primeiras são 9s cousas simples, as segundas rebanho, etc.
dizem-se conzpostas. A tradicional e tríplice distinção dos objectos
As cousas compostas apresentam duas diversas em simples ou unitários (unum), compostos por
modalidades : ou são"tais que as suas partes cons- conjunção física (unicersiiates ex cohaere~tibus),
titutivas estão físicamente ligadas ou corporalmente ;e compost.os por conexão econbmica ou social
conexas (universitates ex cohaerentibus); ou apre-
sentam-se reunidas em grupos, mas sem aquela
u t aedificium, navis, armarium; tertium quod ex Zistantibus
ligação física ou conexão corp6rea (universitates constat, u t corpoia plura nun soluta, sed unt nominisubjecta,
ex distantibus) (s). zelutz, populus, Zegio, grex. Mas v+-se pelos exemplosdo texto
de Pomponio que esta distinção do direito romano era para os
corpos, e não para as res, pois que o direito romano, embora
. (1) Os Principias, I , pág. 574. coiisiãerasse como cousa o homem escravo, nunca como tal
( 3 ) Esta distinção é devida a Pomponio, D. 30, 41, 3 : considerou a assemblea dos homens - o popul'ús. Foi só mais
Tria autem genera sunt corporum, unum quod continetur uno tarde que os glosadores e comentadores, pondo de lado os
spiritu, u t homo, tignum, lapis e f szmzlia; alterunz quod ex exemplos de Pornponio relativos aos homens, aplicaram as
contingentibus hoc est pluribus inter se cohaerentibus constat, cousas a distinção dos corpos.
(universitates ex distantibus), baseada na distin- relaç0es jurídicas, a que a lei atribui a unidade e
ção romana dos três géneros de corpos, de P m - determinados efeitos ( I ) .
púnio, passou através da elaboração do direito Sem nos preocupamos com a análise minu-
intermédio para o direito moderno, mantendo inal- ciosa do exame das diferentes colecçdes ou conjun-
terável o seu critério fundamental, sendo apenas çbes de cousas, para se averiguar, uma por uma,
muito discutido (como o era já no direito romano} quais devam considerar-se como simples univer-
O conceito do tertium genus. salidade de facto, e quais devam merecer o título
Com efeito no terceiro género, isto é, nas de universalidade de direito, vejamos se é possí-
cçtusas compostas por conexão (e* distnntibus) vel fixar um critério positivo de distingão.
ainda hoje é necessário fazer a clássica distinção Carácter comum das duas espécies é que a
dos glosadores em universitates facti e universi- existência da universitas é independente da su%sis-
tates juris, sendo as -primeiras agregados de tência e da permanência n o agregado dos seus sin-
varias cousas corpóreas, como o rebanho, a livra- gulares componentes : a mudança dos elementos
ria, a colecção artística, etc., e as segundas um póde fazer mudar o valor económico, mas não o
complexo de direitos ou de relaçbes jurídicas patri- valor jurídico da un'idade do conjiinto. É Q que se
moniais, como a herança, o pecúlio e o dote. chama o princípio da subrogação.
Mas sobre a constituição intrínseca dêstes dois A propósito das universitates juris (heredr-
tipos de universalidades há grande divergência entre tas, dos, #eculium) criou-se no direito romano, e
tis autores, acêrca dos critérios da sua diferenciaçâa desenvolveu-se depois no direito comum, o coni
e da sua natureza jurídica. ceito de uma acção universal ( r n rem actzo uni-
Para uns a universalidade de facto é todo o versalis), e a máxima da subrogação real expressa
complexo de bens, sejam cousas corpóreas ou incor- na fórmula «res succedzt in locum pretii, pretium
póreas (compreendendo os direitos), móveis ou imó- succedit in Locum rei », como caracteres distinti-
veis, homogéneas ou heterogéneas, que o proprie- vos desta espécie de universaIidades.
tArio reune em conjunto para um especial destino O s autores modernos revelam uma grande
económico, e trata conjo um todo uno, indepen- hesitação em aceitar êstes institutos, mas nem por
dente das eventuais modificaçdes ou da subsistkn- isso se deve crer que eles tenham sido abandona-
cia dos singulares elementos que o compbem. dos, diz justamente Simoncelli. E o grande Filo-
Para outros a universalidade de facto é s ó o con- musi Guelfi com razão observou que B um grave
-junto das cousas corpóreas, móveis e homogéneas, êrro considerar pura e simplesmente abolidos ter-
reunidas dé modo a formar uma unidade para um tos conceitos, os quais não são incompatíveis com
fim social e económico. o direito moderno, mas que pelo contrário nele se
E uniuersalidade de direito é para uns toda
o complexo de relaçdes juridicas e de bens, cousas
móveis e imóveis, a que a lei atribui uma unidade Ruggiero, pág. 398, e autores ai citados; Coviello,
(1)
jurídica, reconhecendo-lhe certos e determinados pág. 371 e 372; Simoncelii, pág. 141 e q a ; Ferrara, pág. 797
efeitos; e para outros é sbmente o complexo d e e seg.
conservam, sendo apenas modificado o seu con- nente civilista e professor Ruggiero, o q u d consiste
teúdo (I). - precisamente na unidade reconhecida e declarada
Entretanto é certo que o simples critério da pela lei para certos efeitos práticos.
acção universal e do princípio da subrogação real Carácter da universitas juris, diz Ruggiero, é,
dos diversos elementos da universalidade não é por um lado, o reconhecimento que a lei faz do
suficiente para caracterizar uma universalidade de agregado como uma unidade jurídica sujeita a
direito. regras particulares, prescindindo dos singulares
Tipo incontestado de universitas jurzs é a componentes ; e, por outro lado, ser êle um com-
herança, e contudo, embora ela seja em princípio plexo de relaçbes jurídicas, e não apenas de rela-
garantida pela acção universal da petitio heredita- çbes e cousas corpbreas, pois que nele não são
tis (art. zo1q.O-zo17.~do c6d. civ. ), é certo que tomados em consideração os singulares bens, quer
diversos elementos duma herança podem já ter móveis quer imbveis, s6bre os quais as relaçóes
passado para o património de terceiros, por qual- são constituídas, mas as próprias relaçdes que aos
quer título legítimo, não podendo por isso ser bens se referem, isto é, os direitos que s6bre eles
abrangidos pela acção universal. E por outro lado, são constituídos. E-, em outros termos, universi-
pode ter-se dado subrogação real de algumas par- tas juris todo o complexo de direitos (propriedade,
tes da herança, com que o herdeiro não seja obri- obrigacdes, direitos reais) que pertencem a uma
gado a conformar-se, tendo por isso direito a reha- pessoa, e nela se concentram como seu patrim6nio.
vê-las. Tipo fundamental é a hmeditas, mas além desta
E, se é certo, pois, que a acção universal e a são também universalidades de direito, segundo a
subrogação não são características da universitas nossa opinião, alias contestada por alguns ( I ) , o
juris, tambbm é verdade que podem verificar-?e património do falido, o do ausente, o dote e outros
em algumas cousas compostas, que certamente não patrimónios especiais, considerados como uma
são universalidades de direito. massa distinta dos seus elementos. Também, dum
Dado o conceito da acçae, no direito moderno, modo geral, pode dizer-se que todas estas figuras
que perdeu o carácter excessivamente formulário e se reduzem sempre ao tipo universal do património,
sacramental do direito antigo, pode até dizer-se mas não o património em geral, porque este não
que hoje todas as universalidades de bens são pode ou não de& considerar-seycomo universitas
garantidas por uma acção universal, e que o seu jurzs, mas só os patrimónios especiais ou sepa-
titular pode por meio dela pedir tanto os objectos rados, que a lei, para um determinado fim, trata
que a constituíam, como os valores que no lugar como unidades sujeitando-os 'a um regulamento
deles hajam sido subrogados. diverso do dos singulares direitos ( y ) .
Parece-nos que o melhor critério para caracte- Concordamos com a doutrina de Ruggiero,
rizar a unaversatas juris 6 o ensinado pelo eini-
( 1 ) Gianturco, Sistema d i diritto cioale ifalzalzo, I, 43;
Coviello, Manuale, 3 81.
(1) Simoncelli, pág. 142. (9.) Ruggiero, pags. 398 e 399.
que até para nbs tem o particular interesse de excluír
da categoria da universitas o patriinónio central
da pessoa, que sendo um elemento essencial da
personalidade, só por morte do titular pode passar
i categoria de cousa integrando-se no conceito
objectivo d~ património hereditário, e s6 então é
unioersitas juris.
Por outro lado, a aplicação do critério da uni-
dade jurídica reconhecida pela lei conduz lògica- -
mente a uma ampliação das universitates juris,
além,dos limites indicados por Ruggiero.
E assim que, pelo menos no sistema do nosso
direito, não podemos deixar de considerar como 40. - Cousas no comércio e fora do comércio.
miversitates juris o estabelecimento comercial ou 41. - Cousas móveis e imóveis. Conceito e alcance desta clas-
industrial, que como tal é reconhecido pelo art. 9." sificação.
42. -Sistema do código na determinaçáo dos im6veis e dos
da lei n." 1662, de 4 de setembro de 1424 (inquili- movei?. Subdivisão de uns e outros.
oato) e, dum modo geral, todas a s empresas comer- 43. - Sign3icação das expressões zmóoeis e imobtliários, mboeis
ciais, que pelo código comercial (art. 23o.O) até são e mobzZt&ios.
consideradas como pessoas ( I ) . 44. - Significado d a expressão mhoeis de tal casa ou pridie.
E também não podemos deixar de considerar 45. -Imóveis por natureza e mediante a acção do homem. -
Prédios rústicos e urbanos.
como universitas juris o rebanho, quando f6r -
46. Imoveis por disposição da lei. - Produtos dos prédios
objecto de um usufruto (art. ~ 2 2 5 . ~ou ) de uma rústicos.
parceria (artt. ~ 3 0 4 . ~ - 1 3 1).7 - ~ 47- - Partes integrantes dos prkdios rústicos e urbanos.
Finalmente todos os patrimónios que wnsti- 48. - Direitos inerentes aos prédios rústicos e urbanos.
tuem o fundo econbmico ou o capital duma pessoa 49. - Fundos consolidados e outras cousas per ld imobilizadas.
50. - Cousas moveis. Suas esphcies.
colectiva não podem deixar de ser uma universitas
51. - Cousas piiblicas, comuns e particulares. Fundamento
juris. desta classificaç&o.
52.- Noção e caracteres distintivos das cousas piiblicas, co-
muns e particulares.
53. -Propriedade das cousas públicas e comuns. Domínio
público.
54. - Enumeração das cousas públicas. Estradas e caminhos.
55. - Cousas comuns. Baldios.
56. - Cousas particulares. Domínio privado.
Por um lado, a determinação das três catego- resulta que só os ihdveis e os móveis por nafu-
rias de imóveis não obedece a um critkrio definido r q a merecem rigorosamente esta quafifioagão ;
d e diferenciação, porque se 6 verdade que os pré- quando muito, na expressão imáveis poderia tam-
dios urbanos não são imóveis por sua natureza, bém compreender-se os prédios urbanos%
então s 6 o podem ser por disposição da lei, o que Por esta razão, e ainda porque na antiga juris-
nos levaria a admitir apenas duas classes de cousas prudência havia grandes incertezas sobre a signifi-
imóveis.
E se com a distinção entre os prédios uvba-
nos e o s imóveis por disposipão d a let se preten- (i) Dr. Teixeira de Abreu, pag. 262 e 263. ,
1
caçáo e alcance das palavras m8vel e imóael, Desta circunstância e das palavras -c sem outra
quando empregadas na lei, ou nos-actos e contra- qualiJcacão», conclae-se que o preceito do art. 377-O
ctos, pareceu ao autor do c6digo muito conveniente não é sempre imperatiao ou preceptivo, mas ape-
dar &a definiçáo legal destas expressóes, atri- nas interpretativo ou meramente subsidiário, para
buindo-lhes o seu rigoroso sentido, e adoptando a o caso em que a intenção do legislador ou das par-
tradução das palavras francesas immobilier e mobi- tes não seja diversamente manifestada.
lier, para significar conjuntamente o s im6veis ou E assim os nossos mais autorizados civilistas
os m6veis por natureza e os que por disposição da teem entendido que no art. 377.' O legislador se
lei são incluidos em uma ou outra das duas cate- limitou a estabelecer uma presunção, que p6de ser
gorias ('). invalidada por prova em. contrário, nos termas
Tal é a explicação do art. 377.O e seu 8 único, gerais de direito, sendo lícito produzir qualquer
onde se disp0e : meio de prova, como os documentos, as teste--
«Quando na lei civil ou nos actos e contractos munhas, ou mesmo outras presunçóes &e facto
se usar da expressão « bzns ou cousas imobiliá- '(art. 2519.0), para demonstrar que as palavras a
riasu, sem o u t r a guali$caçáo, compreender-se hão que se refere o art. 3j7." não foram empregadas no
nela, tanto os que são imbveis por natureza ou sentido em que ali se definem ( I ) .
mediante a acção do homem, como os que o são Parece-nos por8m que esta doutrina exagera
por disposição da lei. Quando se usar simples- muito o carácter interpretativo e subsidiário da
mente da expressiío «imOveis, cousas ou bens regra do art. 377.'.
i m ó v e i s ~ ,esta expressão significará s6 os que o Com efeito, êste artigo dá a definição legal das
são por natureza, ou mediante a acção do homem. z, palavras imdvel e imobzliário, móvel e mobiliá-
E< 8 único. Da mesma sorte a expressão «bens rio, quando empregadas sem o u t r a qualifica~ão.
ou cozrsas mobiliárias, abrangerá, tanto os móveis Portanto essa o u t r a qualificacão só p6de alte-
por natureza, como os que o são por disposiç'ão rar a significação legal das referidas palavras, quando
da lei ; e pelas palavras «mOvel, cousas ou 8ens s e encontrar também na lei, ou no acto ou con-
móv.&s> entender-se hão só os objectos materiais, tracto em que as mesmas palavras foram empre-
que por natureza são móveis. 2 gadas. Entendemos, pois, que não 8 lícito invocar
Todavia o próprio legislador emprega por qualquer meio de prova que seja estranho ao mesmo
vezes a palavra imóveis com a significaçao gecal de acto ou contracto.
\
imobiliávios, como, por exemplo, nos artt. 1461.0, É assim que nos citados artt. 1461.0, 551.',
551.", n." 3.' ( comparado com o art. I I ~g."), e 745.0 n." 3.0, e 745.O, a palavra imdveis tem a significa-
( comparado com o art. 1571.~). ção de imobiliarios, precisamente porque na pró-
pria lei se encontra outra qualipcação, que lhe faz
a t ~ i h u i rêsse sentido.
(1) Esta origem das expressbes irnobiliarzos e mobz7iá-
rios foi expressamente declarada pelo autor do projecto da
cbdigo, em sessão da comissáo revisora de 29 de março de 1860,
como consta das respectivas Actas, a pág. 14. (1) Dr. Teixeira de Abreu, pag. 267.
É certo que o art. 377.', entendido assim, como dio -onde naturalmente se modifica o sentido geral
definição legal, e não como uma simples presun- e legal da palavra mdveis.
ção, tem o inconveniente de atribuir muitas vezes Diz o art. 378.":
As palavras um significado diverso do que seria a «Todas as vezes que nos actos e contractos se
intenção das partes, pois que a significação dos usar da expressão « móveis de tal casa ou prédio,
vocábulos B variável com o gráu de cultura das compreender-se há nela só o que se chama mobi-
pessoas, com o seu diverso significado nas diferen- lia, utensílios ou alfaias, salvo se outra fÔr
tes localidades, e com muitas outras circunstâncias. con7zecidanzente a intençgáo das partes. B
Mas ao mesmo tempo tem a vantagem de evi- Refere-se o art. 378." apenas aos actos e con-
tar a complicação das demandas judiciais, com todo tractos, e não à lez, porque tendo esta um carácter
O cortejo de produção das provas testemunhais. de generalidade, não pode referir-se a certos e
Como aplicaçdes práticas do preceito do art. 377." determinados prédios.
iridicamos as seguintes : No artigo define-se o sentido da expressa0
a ) O legado dos móveis compreende, além c móveis de tal casf ozr prédto ;P, mas não se define
da mobília pròpriamente dita, o dinheiro de con- o significado das palavras -mobílza, utensilios e
tado, jóias, livros, numa palavra : todos os objectos alfaias - o que deixa a definição ainda incompleta,
materiais susceptíveis de se transportarem dum competindo A jurisprudência a missão de a com-
lugar para outro, ou por si, ou por fôrça estranha, pletar.
e que não forem por lei declarados imóveis ; Coelho da Rocha considerava como sin6nimas
b ) A expressão bens mobiliávios, empregada as expressões mobllia, trastes e alfaias da casa,
num testamento, compreende o dinheiro, as accões dizendo que, na falta de declaração, só compreen-
de bancos e companhias e as inscrz~õesnão imo- diam os móveis destinados ao uso e o m d t o d a ~
bili~adas,salvo se de outras palavras se reconhe- casas, como cadeiras, leitos, mezas, espelhos, re16-
cer que outra foi a intenção do testador; gios e outros objectos desta natureza, bem como
c ) Quando o testador deixa todos os seus as estátuas, quadros e porcelanas, se aí estivessem
móveis, nesta disposição compreendem-se os cou- para decoração, e não para outro fim, como para
pons e as dividas activas; ajuntar em colecção. E acrescentava que assim se
d ) O legado de móvezs, semoventes e gkne- devia entender a venda ou o legado de uma casa
ros, não compreende o direito a receber determi- mobilada ou com todos os mdveis ( I ) .
nada quantia devida ao testador ( I ) . No projecto primitivo do código dizia-se ape-
nas mobilza ou trastes; o acrescentamento da
44. Significado da expressão a móveis de tal casa palavra alfazas mostra bem que o legislador adop-
OU prédio>. -No art. 378.0 determina o código a tou a doutrina de Coelho da Rocha, pois que a
significação da frase -móoezs d e tal casa o u pré- simples substituição de trastes por utensilzos em
(1) Dr. Teixeira de Abreu, pag. 270 e nota. (1) Inst., 4 78, nota.
nada altera o sentido da expressão, sendo certo de uso pessoal, parecendo que neste sentido C em-
que estas duas palavras devem considerar-se equi- pregada a palavra no art. 882.", n.O 2.".
valentes. Mas em todo o caso, no sentido do art. 378.O,
O código não definiu cada uma destas pala- que deve %r o mesmo de Coelho da Rocha, estas
vras, certamente para que se tomasse sempre na diferentes palavras compreendem apenas os objec-
devida consideração o sentido em que elas são tos destinados ao uso ou ornato da casa. ,
'
empregadas no zdso vulgar, o que bem se mostra Alguns jurisconsultos. procurando determinar
nas expressóes - O que se chama e salvo se outra por exclusão o conteúdo das palavras mdveis de
f ô r conhecidamente e intengão das partes. tal casa ou prédio, dizem que não compreendem
De modo que, não sendo uniforme em todo o o dinheiro, os créditos, as jóias, os livros, equipa-
país o significado das referidas palavras, é necessário gens, objectos para colecçbes, frutos arrecadados,
recorrer ao uso e linquqem comum dos diversos provisões e fazendas de comércio, louças, mcda-
lugares, para determinar em cada caso o sentido da lhas, instrumentos de artes ou ofícios, animais,
expressão - móveis de tal casa ou prédio. ' armas, estátuas, roupas, etc. ( I ) .
E, com efeito, na linguagem usual há impor- Mas ha certamente exclusão demasiada nesta
tantes diferenças entre mobilia, utensitios ealfaias, enumeração, porque, pelo menos, as louças e as
embora se refiram sempre a objectos do uso ou roupas, sendo destinadas ao serviso da casa, não
ornato das casas. podem deixar de se incluir na expressa0 de alfaias
Torna-se, pois, necessário averiguar a signifi- ou de utensílios, ou mesmo de mobília, se quise-
cação de cada uma destas palavras, sobretudo para rem. Do mesmo modo as estátutas, se forem
quando, em vez de se empregar a expressão do destinadas ao ornato da casa.
ari. 378.O, .se empregam sb algumas daquelas três Devendo entender-se a expressão do art. 378.O
palavras. restrita aos mbveis de uso ou ornato da casa, deve
Como mobília consideram-se geralmente os atender-se a que, por um lado, não abrange toda a
mbveis que servem para adôrno e guarnecimento mobília que na casa se encontrar, como a que seu
das casas, com o fim de prestar ao homem a como- dono ali tivesse para negbcio ou para depósito
didade e o bem estar prbprios da habitação, como temporário, assim como, por outro lado, pode
leitos, mezas, cadeiras, sofás, tapetes, espelhos, abranger objectos que no momento do acto jurídico
etc., não ultrapassando os objectos destinados aos ou dos seus efeitos lá se não encontrem, como, por
usos ordinários em uma casa de moradia. exemplo, a mobília que estiver em casa do estofa-
A palavra utensílios compreende só os instru- dor ou marceneiro, a fim de ser concertada.
mentos que se empregam no trabalho prbprio da O art. 378.O não sb é meramente interpreta-
casa, como o trem de cosinha e o da adega, ou tivo ou subsidiário, como o art. 377.O, mas consti-
mesmo ainda os da lavoura, embora a estes se
chame também alfaia agricola ( Lobão, Casas,
§ 369.O). (1) Dr. Dias Ferreira, r, 269; Delfim Maia, Reoisfa dos
Por alfaias entende-se geralmente os objectos Tribunais, VI, pág. 129.
tui unaa simples presunção, que pode ser ilidida Mas será também o preceito do art. 1832.0apli-
por em contrário, como resulta da sua parte cável ao legado que se referir a um móvel, como
final « s a l v o se o u t r a fôr conhecidamente a inten- armário, secretária, cofr.e, baú, ou outro semelhante?
pão das partes ». Neste caso entendemos que i á não tem aplica-
No art. 1832.O determina o código o alcancc da ção o art. 1832.0, porque, por ser de
expressão ct casa com tudo que-se achar dentro carácter restritivo, não deve ampliar-se além dos
dela», quando empregada em testamento, dispondo seus precisos termos, oque seria contrário
que n2o se consideram como legadas também as vontade do testador, se êste tivesse por hábit6
dívidas activas, ainda que na casa se encontrem os guardar no móvel legado os títulos que lá Se
respectivos documentos ; mas a e x p r e s s ã o com- encontrassem.
,
preende, portanto, todos os outros móveis que lá
se encontrarem. 45. Imóveis por natureza e mediante a acgão Bo
Divergem, porém, as opiniões sobre o sentido -
homem - prédios riisticos e urbanos. A determina-
da mesma frase, quando empregada em acto inter çiío destas duas classes de imóveis encontra-se no
vivos, dizendo o Dr. ias erre ira que abrange art. 374.O:
também aquelas dívidas, em vista de ser especial a «São imóveis, ou naturalmente, ou mediante a
regra do art. 1832.0; outros, porém, pronunciam-se acção do homem, os prédios rústicos. e urbanos.
em sentido contrário, com o fundamento de que o «§ Único. Por prédio rústico entende-se o solo
referido artigo corresponde ao significado usual ou terreno, e por prédio urbano qualquer edifício
das palavras, devendo por isso observar-se em incorporado no solo ».
todos os casos, pois que as dívidas, sendo cousas Esta determinação consiste, pois, è m fixar as
incorp6reas, não podem considerar-se existentes três noçbes-de prédio, de prédio rústico, e de
no lugar-onde se encontram os títulos, que mais prédio urbano. I
não são do que meios de prova da existência d o A palavra prédio, no seu sentido jurídico pr6-
crédito ( 4 ) . prio, signific.a u m a fraccão Limitada do solo o u
as-dívidas activas compreendem-se também terreno, compreenda o u nâo qualquer edifício,
as inscricões e quaisquer outros títulos da divida e que faq parte do património de alguénz.
pública, 6em como as acçdes e obrigaçoes de qual- Com e-ito, embora o 3 único do art. 374.O, na
quer emprêsa ou companhia, porque todos estes definição de prédio rústico, pareça tomar a palavra
títulos sãb de créditos, e, portanto, dividas activtss, prédio num sentido mais amplo, é certo que esta
embora o Dr. Dias Ferreira, sem aduzir razoes, se palavra não pode aplicar-se ao solo tomado no seu
pronuncie em sentido contrário ( 8 ) . conjunto, porque, se assim fosse, ficai'íamos redu-
zidos a um só prédio rústico.
Por outro lado, é certo também que As cousas
(I) Dr-Teixeira de Abreu, pag. 275; Revzsfa dos Trzbu-
nazs, VI, 129.
fóra do comércio se não aplica a palavra prédio;
(8) n r . Dias Ferreira, r, pag. 209 ; Dr. Teixeira de Abreu, uma estrada ou um jardim público é uma cousa
pag. 275; nosso livro Su~essóese dzrezto sucessório, I, n.O 84. pública ou comum, mas não se lhe chama prédio,
emquanto não entra na classe dos bens patrimo- O prédio rústico abrange não s6 o terreno
niais ; e o mesmo se pode dizer dos terrenos incz~l- em toda a sua profundidade -salvas as restriçbes
$os públicos, e dos baldios municipais ou paro- relativas às nzinas - mas também o espaço aéreo
quiais. correspondente na altura susceptível de a p ~ p r i a -
Mas não 6 necessário que os limites ou extre- ção (art. 2288.0).
mas de qualquer prédio sejam sempre bem patentes No direito antigo a noção de prédio rustico '
e conhecidos, pois o cbdigo (art. 2340.") prevê a era, por um lado, mais extensa, pois compreendia
hipótese da necessidade da demarcaçâo, e garante também alguns edifícios, quando situados no campo
aos .interessados o direito de a exigir aos proprie- e destinados a fins diversos da habitação; e , por
tários visinhos; nem tão pouco é necessária uma outro lado, mais restrita, porque se consideravam
denominação pr6pria e exclusiva, para cada prédio prédios urbanos os jardins e quintais adjacentes
b r a sua individualidade definida e estabelecida, a estes, e destinados a simples gozo ou recreio,
pois que a divisão de um prédio por duas ou mais emquanto que pelo ç6digo sáo sempre prédios
pessoas dá lugar a outros tantos prédios, conser- rústicos.
vando-se, em regra, o mesmo nome do prédio Entre os antiios praxistas havia grande diver-
dividido ( I ) . gência na diferenciação dos prédios rústicos e
A idea de soto ou terreno anda sempre implí- urbanos.
cita na de prédro, não se compreendendo a exis- Emquanto uns, como Coelho da Rocha e Pe-
tência dêste independentemente daquele; de modo reira e Sousa, atendiam só ao destino -habitação
que, conclui o Dr. Teixeira de Abreu, quem possui ou recreio (urbanos) e cultura (nísticos), outros
um andar de uma casa não diz que tem um prédio como Lobão, atendiam também 1 sua situação.
urbano ;s6 pode afirmá-lo quem possuír uma parte E assim consideravam urbanos :
da casa dividida verticalmente, e distinta de todas a ) todos os construídos na cidade ou vila para
as Outras ( 2 ) . habitáção, ou armazenagem de mercadorias, ou para
Comtudo pode considerar-se como prédio um recolher animais destinados ao serviço pessoal : e
andar de uma casa, se se considerar, como deve b ) os edificados no campo para habitação e
ser, que o terreno da casa é comum aos compro- recreio dos senhores da quinta, mas não os que
prietários da mesma. tivessem por fim abrigar os colonos e animais ou
Prédio rústico é, pois, qualquer fracpão armazenar os frutos ( ).
limitada e aproprzada do solo, que não faca O código, porém, acabou com estas divergên- A
parte de algum edificio; porque, se faz parte de cias, definindo prédio rústico o solo ou o terreno,
algum edifício, confunde-se na própria individua- e prédio urbano qualquer edifício incorporado
lidade do prédio urbano. no solo.
(i) Berthelemy, Traité de droit admmistratif, pag. qrz. (1) Colin et Capitant, pág. 709.
administrativo ,bens do domínio privado, emquanto Na doutrina italiana o critério geral dominante
que para os civilistas continuam a ser do domínio é o destino dos bens públicos, isto é, servir ao
público (I). uso phblico.
Mas bem analizadas as cousas, reconhece-se Discute-se porém o que deve entender-se por
que afinal o critério do uso público, adoptado pelos uso publico, isto é, se se trata de um uso directo
civilistas franceses, se mostra ainda insuficiente e imediato por parte dos cidadãos, como, por exem-
para caracterizar o domínio público do Estado ou plo, nas estradas, praias e nos, de que os indivi-
das autarquias locais. Êle não serve para justificar duos podem gozar, transitando, pescando ou nave-
a qualificação das fortificações. E por outro lado gando ; ou se é ta rnbém o uso indirecto e medíato,
não se compreende o motivo porque não se hão emquanto é o Estado que dos bens faz uso direc;
de incluir, à semelhança destas, no domínio público tamente no interesse comum dos cidadãos, como
todos os edifícios e todas as cousas que, embora acontece com os edifícios públicos, fortalezas e
não sejam destinadas ao uso directo do público, são semelhantes.
como elas destinadas a um serviço público perma- Mais simplesmqnte : devem ser do domInia
nente, tão necesslirio A vida da Nação, que devem público ou dominiais s6 os bens destinados ao uso
igualmente ser indis@oniveis e imprescritiveis. directo do público, ou também os que são desti-
Eis a razão porque a doutrina italiana, em face nados a um serviço público realizado pelo Estado,
das disposiçoes do seu c6digo civil, calcadas, em pela província ou pela comuna?
parte, sôbre os artt. 538."- 541."do código francês, Se sòmente devem considerar-se dominiais as
sentiu a necessidade de construir uma teoria mais cousas que servem directamente ao uso dos cida-
completa do domi nio público. dãos, e todas as outras patrimoniais, entendem
Com fundamento nos artt. 426." e 432," do alguns que é necessârio distinguir nestas as que,
c6digo italiano, começam os autores por distinguir sendo destinadas a um serviço público (como os
os bens do Estado, das províncias e das comunas edifícios públicos ), são indisponiveis, e as que,
em Bens dominiais e bens patrimoniais, e dizem tendo uma utilidade econ6mica produtiva de ren-
que os bens dos institutos públicos e das outras dimento, são disponiveis.
pessoas colectivas são sempre bens patrimoniais, - Mas se, pelo contrário, se incluem Gús bens
nos termos do art. 433.' ( 2 ) . dominiais tanto aqueles que são directamente apro-
veitados pelos cidadãos como os que estes s6 indi-
Colin et Capitant, pág. 710. rectamente gozam, por ser o seu uso reservado ao
(1)
( a ) &t. 4 ~ 6 . ~a:1 beni dello Stato si distinguono in Estado, revertendo afinal a sua utilidade a favor
demasio pubblico e beni patrimoniaii. r dos cidadãos, por virtude da aplicação que deles
Art. 4 3 2 . O : I beni delle provincie e dei comuni si distin- faz o Estado a um serviço público, então é neces-
guono in beni di uso pubblico e in patrimoniali.. sário nos bens dominiais distinguir dois tipos: um
Art. 433.0 a 1 beni degli istituti civile ed ecclesiastici e
degli altri corpi morali appartengono ai medesimi, in quanto dominio público normal, em que o gozo das cousas
le leggi de1 regno riconoscano in essi Ia capacita di acquis- públicas é por sua natureza directamente atribuido
tare e di possedere v. aos cidadãos ; c um domínio público anómalb, cuja
utilidade de interesse geral é dada pelo uso que dominio público geral, B um dominio público local
dêle faz o Estado e cujo tipo mais característico é ou corporativo, como já mostrámos.
constituído pelos bens destinados A defesa naçional. Por outras palavras, o chamado domínio comum
Todos estes sistemas teem os seus defensores é também dominio público. Com efeito, o que mais
entre os escritores italianos ; mas o que nos parece caracteriza o domínio público não é o maior ou
mais conforme com a realidade da vida económica menor número de pessoas a quem êle interessa,
e jurídica é O que determina a dominialidade ou o mas sim o regime jurídico das cousas a que êle se
carácter público do domínio por qualquer dos dois refere.
princípios, ou pelo destino ao uso directo do Ora o regime jurídico das cousas comuns é
públictí, ou pela afectação a um servico flúblico; precisamente o do domínio público -indis$onibt-
ou, ainda mais simplesmente, pela f u n ~ ã oeconó- lidade, imflrescritibilidade e impenhorabílidade.
mica publica das cousas, isto é, pelo seu destino As cousas comuns são, como as públicas extra
ao uso de todos os cidadãos ou de uma generali- commercium ( art. 372.O) ; e por isso, e pelo uso
dade deles, mas tanto ao uso directo, como ao indi- público a que são destinadas, não podem ser alie-
recto por intermédio do serviço público do Estado nadas (art. 381."),nèm prescritas (art. 506.'), nem
ou da respectiva autarquia local ( l ) . hipotecadas (artt. 889.0 e 894.0), nem penhoradas
Tal é a constrqão jurídica do domínio público (art. 815.0, n.O 1 . O do c6d. de pr. civ.).
que s e adapta exactamente ao nosso direito, e que Contra a perfeita identificação do domínio
podemos dizer mesmo se encontra consignada nos comum com o domínio público nem mesmo se
artt. 379.0 a 382.", 3 Ún., do código civil: pode dizer que os baldios, ao contrário das cousas
Em primeiro lugar devemos observar que a públicas, podem ser alienados, divididos pelos
divisão das cousas em públicas, comuns e particu- moradores vizinhos ou aforados em hasta piiblica,
lares, não exige que o domínio se distinga igual- porquanto esta mudança de situação jurídica de
mente em público;* comum e particular. Nem ha tais cousas comuns só tem lugar quando deixam
coincidência necessária entre aquelas espécies de de ser destinadas ao uso público: é exactamente O
cousas e de domínio, porque, por exemplo, o que acontece com as estradas, jardins públicos, e
- art. 22b3." expressamente admite domínio público outras cousas públicas semelhantes, que uma vez
sobre cousas comuns. deixando de ser afectas ao uso publico podem tam-
É que na verdade a espécie de domínio que bém ser alienadas.
existe s6bre as cousas comuns é sem dúvida um Assente o princípio de que o dominio público
dominio público, como resulta da pr6pria definição i: tanto o que o Estado e as corporaçdes públicas (1)
_ do art. 381.O: simplesmente, em vez de ser um
-
(1) Deve notar-se que as corporações públicas suscepti-
veis de dominio público são, não sô a s autarquias locais e quais-
( 1) Para maior desenvolvimento da doutrina italiana, quer outros estabelecimentos piíblicos corporativos do Estado,
Coviello, pág. n8i e seg. ; Ruggiero, pág. 416 e seg.; Ferrara, mas tambkm as corporações admznzstrativas, nos termos do
pag. 760 e seg. 5 iInico do art. 253." do código administrativo de 1896 (ainda
exercem sôbre as cousas públicas, como o exercido Não nos parece mesmo que possa ter outra
pelas mesmas corporações sôbre as cousas comuns, significação a expressão «utilizar-se individual ou
6 fácil reconhecer que o conceito de domínio pú- colectivamente a.
blico formulado nos artt. 380." e 381.0 do nosso O que é necessário 6 distinguir, entre as cou-
tbdigo é exactamente o do serviço fldblico ou do sas do domjnio do Estado ou das corporaçóes pú-
uso directo ou indirecto dos cidadãos, quer seja o blicas, quais as que são do domínio phblico, e quais
tis0 geral, quer sòmente o uso local ou cnrporativo. as que não sendo destinadas ao uso, nem mesmo
Com efeito, nos termos do art. 380.", não podem indirecto, dos cidadãos, constituem por isso o do-
deixar de ser considerados cousas públicas todos mínio privado das pessoas colectivas públicas,
os edifícios ou construções do Estado, incluindo as o seu património, como cousas ou bens particu-
fortalezas, porque, embora os cidadãos não possam lares.
servir-se deles directamente, utilizam-nos todavia Para êste efeito parece-nos suficientemente
indirectamente, beneficiando do serviqo público a expressiva a doutrina de Ruggiero: «São domi-
que eles são destinados. ninis ( d o domínio público) os bens destinados ao
O r a o art. 380.O não faz distinção alguma entre uso piiblico, entend;do no sentido amplo de gozo
iiso público directo e indirecto, devendo pois directo ou indirecto, e os destinados A defeza nacio-
entender-se que se refere a ambos. nal, pois que de todos eles a utilidade geral consiste
Aqueles que, como o Dr. Guilherme Moreira, numa utilização directa da cousa. sem necessidade
entendem que é só no uso público directo que está de transformaç0es. Patrimor~iais ( d o domínio
o carácter essencial das cousas publicas, não veem privado) pelo contrário são todos os outros que,
que, ao contrário disso, o art. 380.' até s e refere não sendo destinados a um gozo i n natara, quer
tamb&rn a uso indirecto, dizendo «das quais C por parte dos cidadãos quer por parte do Estado,
lícito a todos, individual ou colectivawtente, utili- teem por função fornecer ao Estado, sob a forma
zar-se,: a utilização individual é o uso directo, a de preço de alienação, de renda por locaç80, e
utilização colectiva é o uso indirecto ( I ) . negócios semelhantes, os meios económicas neces-
Chamam-se baldios ou maninhos certos terre- 8 I . ~ ) ,e do mesmo modo o de 1896 (art. 429.",
nos geralmente incultos, que por antigos usos e § I.") resolveu a questão, determinando que teem
costumes se acham na posse e g6z0 exclusivo e direito A divisão dos baldios todos os chefes de
directo dos vizinhos de certos lugares. familia que há mais de u m ano cejam compartes
Os baldios são municipais OU paroquiais, n a fruzcão dêles, conforme os usos e costumes
pertencendo a esta classe os que são usufruidos estabelecidos.
pelos vizinhos de toda a par6quia ou de parte dela, Mas, pela lei de 7 de agosto de 1913 (arl. 185.0,
sendo municipais todos os outros. 5 r."), teem preferência para a divisão dos baldios
Na antiga jurisprudência foi muito discutido o próprios para cultura os chefes de família, que há
significado e alcance da palavra zliqinhos, para o mais de cinco anos vivam na circunscrição e tenham
efeito de se determinar quais as pessoas com direito sido compartes na fruiçào dêles.
A fruição dos baldios.
Entendiam alguns que oiqinhos deviam consi- 56. Cousas particulares ou do domlnio privado.-
derar-se todas as pessoas que residiam ou tinham 0 estudo que temos feito das cousas públicas e
bens no lugar. comuns mostra bem as profundas diferenças que
Como, porbm, a viqinhaizgn não f6sse definida as separam das particulares.
nas leis especiais s6bre a posse e fruição dos bal- As cousas de uso publico geral ou local, diz o
dios, sustentavam outros que devia entender-se de Dr. Teixeirn de Abreu, não podem ser objecto de
harmonia com o disposto na Ordenagão do Reino, propriedade privada, já porque a própria natureza
Liv. xO,Tit. 56, segundo a qual, quando por fora1 física as torna insusceptíveis de apropriação indi-
ou usança antiga das cidades ou lugares não esti- vidual, já porque, destinadas por lei ao uso directo
vesse ordenada ou admitida outra cousa, só deviam dos cidadáos, assumem carácteres jurídicos espe-
ter-se por aiqinhos dum lugar : ciais, que as colocam fóra do campo do direito
1.O O s que dêsse lugar ou do seu termo f6s- privado.
s.em naturais ou aí tivessem ofício 'de que vives- A propriedade das cousas particulares ara
sem, morando no dito lugar e seu termo; pertence a pessoas singulares, ora a pessoas colec-
2.O O português ou estrangeiro que casasse tivas, como o Estado, as corporaçbes administra-
com mulher da terra, emquanto ai morasse, ou tivas, e quaisquer outras pessoas jurídicas, como
onde tivesse a maior parte de seus bens, com resulta clara e terminantemente dos preceitos do
tençáo e vontade de ai morar; e. se acaso saísse, art. 38.3.* e seu*§ único.
com tenção de mudar O domicílio, e depois voltasse, Quando uma cousa pertence a diversas pessoas
só era havido por vizinho morando aí de novo simultâneamente, aparece a propriedade comum,
quatro anos, com sua mulher, filhos e fazenda; - cxcrcendo cada um dos comproprietários, conjun-
3.O O que mudasse o domicílio, só passado tamente com os seus consortes, todos os direitos
quatro anos, e nas mesmas condiçbes, era consi- que pertencem ao proprietário singular, em pro-
derado vizinho do novo lugar. porção da parte que teem naquela propriedade,
O código administrativo de 1895 (art. 441.', salvo qualquer limitação expressa na lei (artt. ~ 7 6 . ~
dum tal direito, tanto por parte dos cidadáos, que
e 2177.0). Mas a indivisão s ó é obrigatória quando só podem sôbre elas exercer direitos de fruiçáo e
a cousa fôr de sua natureza náo-partivel, ou nos uso, como da parte do Estado e corporações públi-
casos de casamento e sociedade, conforme se acha cas, porque estas, tendo por iinica missão regular
preceituado no art. 2180.0 do código civil. e fiscalizar o exercício daquelas faculdades, bem
O código, falando de pessoas colectzvas, no póde dizer-se, com Bianchi, que antes teem a seu
art. 382.", refere-se manifestamente As pessoas respeito encargos do que direitos, pois todas as
j u r i d i c a s ou morais, e não ipropriedade comum, suas faculdades derivam da obrigação, que sobre
a qual, por ser de várias pessoas, não deixa de per- as mesmas entidades impende, de manterem as
tencer a pessoas singulares. cousas públicas e comuns em condições de pode-
As cousas particulares diferem, pois, das cou- rem ser utilizadas directiimente pelos 'cidadãos.
sas piliblicas e comuns, não só emquanto aos actos As bguas particulares são enumeradas no
e'contractos de que podem ser objecto, mas tam- art. 2.O do decreto n.O 5787-1111, assim - redigido :
bem relativamente As pessoas que as podem possuir São do domínio particular:
e administrar, bem como em relação A natureza I." As águas qoe nascerem em algum prédio
dos direitos que sôbre elas podem exercer-se. particular e as pluviais que nele caírem, emquanto
Com efeito, tanto as cousas públicas como as não transpuserem abandonadas os limites do mes-
comuns estão f ó r a do comércio, sendo portanto mo prédio, ou que, ultrapassando êsses limites e
imprescri$tiveis (art. 50b.O), não podendo ser correndo por prédios particulares, são consumidas
legadas (art. 1811.0, n.O z . " ) , nem hipotecadas
antes de se lançarem no mar ou ein outras águas
(art. 889."), o que não sucede, em regra, com as do domínio público. Se, porem, se lançarem no
cousas particulares, que s 6 muito excepcional-
mar, ou em outras águas públicas, deixarão de ser
mente, e por motivos de interesse público, podem
particulares, apenas passem os limites do prédio
encontrar-se em condiçóes em certo modo análogas.
onde nascem ou caírem ;
Além disso, as cousas de uso público geral ou
local só podem encontrar-se na posse e adminis- - 2.0 O s lagos ou lagoas existentes dentro de
algum prédio particular, que não sejam alimentados
tração do Estado e corporaçóes públicas, e nunca por corrente pública ;
na dos cidadãos que s6 teem o seu gôzo e fruiç80,
na conformidade dos regulamentos administrativos 3.' As águas subterrâneas que nos prédios
particulares se encontrem ;
Ou da lei ; ao passo que as cousas particulares tanto
4.0 O s poços, galerias, canais, reservatórios,
se encontram no poder dos cidadáos, que aliás é albufeiras e demais obras construídas por pessoas
O caso mais vulgar, como no daquelas entidades
singulares ou colectivas para captagem, derivação
(art. 382.O).
ou armazenamento das águas públicas ou particu-
Finalmente, os direitos que podem recaír sôbre lares, no interesse da agricultura ou da indústria;
as duas classes de cousas sáo, em geral, de natu-
reza perfeitamente distinta, pois sendo as cousas 5.' O Blveo das correntes não navegáveis nem
flutuáveis, e bein assim o das águas pluviais que
particulares objecto de domínio privado, as cousas atravessarem ou banharem prédios particulares.
públicas e comuns são rigorosamente insusceptíveis
24
FACTOS JURIDICOS
FACTOS JURÍDICOS
EM GERAL
B
57. - A teoria e a classificação dos facfos juridicos.
58. -Conceito do acta juridico. Preferência d a lerminoiogia
tradicional s6bre a depominaçáo de negocio jurídico.
59. - Elementos dos actos juridicos.
60. - Classificação dos actos juridicos.
61. - Adquisiqão, modificação e perda ou extinção de direitos.
Sucessão.
6 2 . -Actos jiiridicos que importam alienação ou renuncia.
63. - O tempo como facto jurídico. Fixação e c6mputo.
noite seguinte, e em que portanto o dia se conta Parece-nos, ao contrário, que essa disposição geral existe
por inteiro, isto é, desprezando a fracção de tempo no art. 561.0 do codigo civil. E por isso entendemos ate que
anterior i primeira meia noite, de modo que, por quando o juiz, por exemplo, 6xa um prazo & zq horas, 48 horas,
exemplo, o termo ou prazo de três dias a contar etc., deve entender-se que é prazo de dias, e portanto fazer-se
a contagem pela regra do art. 561.".
de hoje abrange, além do intervalo que vai até h
Mas concordamos com o Dr. Alves Moreira em que, tra-
meia noite, os três dias seguintes compietos ( I ) . tando-se de actos a efectuar em repartições públicas, os dias
teem menos duração, terminando o dia final no momento em
que a respectiva repartição fecha. Dr. Alves Moreira, pág. 384.
(1) Os dias contados momento a momento, de aq em 24 Diversa é a contagem dos meses, como p o ~exemplo
(1)
horas, oâo os chamados dias m h e t s . no código italiano, ex nominatione dierum, non ex computa-
aComo não existe, porém, escreve o Dr. Alves Moreira, tione, isto é, contando-se como os anos, desde o dia inicial até
no direito civil uma disposiçao geral em virtude da qual devam ao dia correspondente do mês final-Ruggiero, pag. 282.
termo valha como completo apenas começado consolidar e tornar inalterável aquele estado, ainda
(dies cueptus p r o completo habetur), como que quando não é possivõl demonstrar a legitimidade
s e exija o seu inteiro decurso para se poder con- da adquisição do direito que dêle deriva. E é
siderar vencido o termo. frequente falar-se de prescrição imemorial para
Ora quzniu ao diss inicial, diz Ruggiero, a legitimar tais situaçdes de facto. M a s rigorosa-
regra universalmente recebida pela tradição histó- mente não há que falar de prescrição, porque nas
rica é que se não conta, de modo que O termo relaçóes jurídicas em que é admissível êste modo
começa a decorrer no dia imediato- dies a quo de adquirir direitos ou extinguir obrigações, a lei
non computatur i72 termino. Quanto ao dies contenta- se com um período determinado de tempo,
final não vale para nós a regra romana-dies ul- que na generalidade das legislaçbes modernas não
tzmus coeptus p r o cornpleto hnbetur-; deve vai além de trinta anos.
decorrer inteiramente, para que o termo possa A essência jurídica do tempo imemorial, segundo
dizer-se completo, o que equivale- a dizer que o a concepção germânica, está, não pròpriamente em
dia final se conta no termo ( I ) . fundar no decurso d+otempo a legitimidade de uma
Tal é precisamente a doutrina consignada situação, mas em criar uma presunção de confor-
no art. 562.0 do nosso código civil, para a con- midade do estado de facto com a ordem jurídica, ,
tagem do tempo na prescric;ão, mas que por ana- sempre que a vetusta antiguidade daquele estado
logia (art. 16." ) deve considíerar-se como regra não deixa encontrar o titulo constitutivo do direito,
geral. e não se tenha a prova de que tal título existia ou
Um aspecto interessante que pode apresentar era legítimo.
, o tempo na sua função jurídica é a posse ou exer- Mas O nosso direito actual não reconhece O
cício de certas situaçdes desde tempos irnemo- instituto do tempo imemorial, como regra ou prin-
riais. cípio de modo ou título de adquisição de direitos.
NO tempo imemorial não h á que faliir de Não pode valer como prescrição adquisitiva d e
cômputo, porque não há uma determinada duração cousas ou direitos imprescritiveis, porque a lei não
de tempo, mas uma vetustas, um tempo indeter- permite a prescrição de cousas fbra do comércie
minado e antiquíssimo, do qual não é possível (art. 506."), como não permite também a prescri-
estabelecer-se o início, e que te= decorrido sôbre ção das servidões descontínuas e das não aparentes
um estado de facto, mantido inaIterável e cons- (art. 2273.0 ), por mais antiga que seja a sua posse.
tantemente, através de toda a sua duracão. E tambkm não pode valer como presunção de legi-
Quando um estado de facto dura assim há timidade da mera situação de facto, porque a lei,
tanto tempo, que vai alem da membria dos ho- quando excepcionalmente dá valor a simples posse
mens, pode falar-se de tempo imemorial ou ab de estado, para valer como situação jurídica, di-lo
imrnmorabili, como um factor que serve para expressamente, e ainda assim em termos muito
restritos, como faz, por exemplo, para o .estado
de casado, no art. 1084.0, que foi mantido n e
( 1 ) Ruggiero, pág. 281 e 282. art. 47.O do decreto-lei do casamento civil.
Mas isto não obsta a que ainda hoje se possa
invocar O tempo imemorial como título justifica-
tivo de uma situação que no domínio da legislação
antiga se pudesse estabelecer juridicamente, por
virtude da posse ou exercício desde tempos ime-
moriais ( 1 ).
E o que precisamente acontece com as servi-
does descontínuas e com as não aparentes, que
podiam constituir-se antigamente pela prescrição
imemorial, segundo o testemunho de Coelho da
Rocha ($' 599."), e que por isso foram resalvadas
pelo 5 único do art. 2273.'. A EFICACIA DA VONTADE
NOS ACTOS J U R ~ D I C O S
manifesta a sua vontade por intermédio do repre- Pasto margem' o s-iktenia de'WiiGd&to idj3e-
sentante: o representante é, por assim dizer, O rativo, 6s repre&tántes'políticos éxbimem, com
-
veículo da vontade do representado q u i m a n d a t efeito, as suas pr6pfias opiniões e'vontade, etg vez
ipse,fecisse videtur. dos desejos é interesses individuais dos seus man-
Compreende-se bem como esta explicação foi dantes ou eleitores, -e daí vefu naturalmente a. i'dea.
alvo de justas críticas. E os pr6prios autores de aplicar o mesmo-eritkrjo representação de
franceses da escola moderna reconhecem que ela direito privado. i'
não se ajusta à realidade da vida jurídica, não s e Mas a idea não nos'parece feliz, sendo mesmo
conciliando bem com o instituto da gestso de contrária à realidade dos factos. -
negócios, e mostrando-se inaceitável sobretudo Com efeitõ, a vontade nõs actos jurídicas dos
quando o representante não é escolhido pela von- representantes não 8, em princípio, ou jufidiea-
tade do representado, mas pertence a categoria dos mente, a sua-própria vontade, mas sim a~dosrepre-
mandatários legais. E por isso dizem que mais sentados, ou pelo menos a que deve presumir-se
vale reconhecer muito simplesmente que, no es- que seria a deles,se pudessem exprimi-la.
tado actual do Direito, um acto jurídico pode Esta concepção t5 fáci t de verifiear nos diversos
fazer atribuir os seus efeitos a uma pessoa diversa tipos de representaçgo.
de quem o pratica. Assim o acto feito por um Os diversos tipos de representação teem a sua
representante apresenta um duplo aspecto : por origem em causas aiversas, reduzindo-se a duas
um lado é o representante quem pratica o acto; as fontes imediatas dos poderes~dasrepresentantes:
mas por outro os efeitos do acto são atribuidos a lei e a vontàde dos repfesentados.
à pessoa cio representado (I)] Lega2 6 a representa-@o conferida As pess'oas
A moderna doutrina francesa tem o mérito de que, em virtude do seu cargo ou função especial,
ser muito simples, nítida e realista. Mas tem o ou em virtude de uma situação familiar, exercem
defeito da sua excessiva simpiicidade: deixa afinal os direitos e obrigações dos incapazes e das pessoa9
sem explicação o facto de se atribuir todos o s colectivas : é com efeito a lei que em regra orga-
efeitos do acto a uma pessoa que nele não inter- niza a representação civil destas duas categorias
de pessoas, intervindo por vezes tamb8m a vontade'
de alguns dos .representantes legaís na escolha de
(1) Colin et Capitant, pág. 90. outros representantes (twteia testamentária.e dativa,
eleição de ahefes, directores ou administradores mandatário fóra dos limites do seu poder de re-
nas pessoas cdectivas de tipo corporativo). Mas presentação, persiste num estado de pendência até
niío há representnçãq quando para os actos de uma que intervenha a ratificação, não podendo produzir
pessoa parcialmente incapaz a lei se limita a exigir efeitos, nem para o interessado, porque nele não
a intervenção ,ou assistência de outra pessoa, não tomou parte, nem para o gestor, porque tratou em
a título de representante, mas para integrar a imper- nome de outrem e n a em seu próprio nome.
feita capacidade daquela pessoa ( autorização mari- Dada a ratificação, esta prwede retroactivamente,
tal, outorga da mulher, assistência do curador do e os efeitos do acto consic$eram-se produzidos desde
interdito p q prodigalidade, etc..). o início, salvos os direitos adquiridos por terceiro
Voluntdria é a representaç& resultante do ( art. 1726.") (1).
contracto de mandato ou procuradoria, em virtude Vê-se, portanto, que nos actos de representa-
do qual alguem se encarrega de prestar ou fazer çáo voluntária o que vale afinal 6 a vontade do
alguma cousa por mandado e em nome de outrem representado. E assim s e explica perfeitamente
(art. 1318."), e ainda dos actos ou factos jurídicos que os actos praticados pelo representante sejam
de gestão de negbcios, pelos quais alguém se atribuídos ao representado.
intromete sem prévia aut~rizaçãonos negócios E acontecer6 ou não juridicamente o mesmo
de outrem (art. 1723."). na representação legal?
No caso de gestão de negócios, ao qual deve Parece-nos que a resposta não pode deixar de
equiparar-se o caso de mandato quando o manda- ser afirmativa.
tário excede os poderes que lhe foram conferidos Quer se trate de representação de incapazes,
pelo. mandante, não pode -natumimente dizer-se quer de pessoas colectivas, os representantes teem
que o acto jurídico vale como praticado pelo repre- sempre a sua vontade subordinada aos poderes
sentado, pois depende da vontade d&ste apropriar que lhes são conferidos pela lei, pelo acto de cons-
ou não os seus efeitos (artt. I J ~ I . ~ 1353.",
, 1726.', tituição ou de fundação ( estatutos ), e pela vontade
I 730." ). A vontade manifestada pelo mandante ou colectiva da sociedade ou associação, expressa nas
pelo dominas negofii, e destinada a fazer seus os deliberaç&s das assembleas. Em todos os casos
efeitos do acto, é o que se chama a ratlficacão, se trata sempre de exprimir, interpretar e executar
que outra cousa não é senão a aprovação do acto a vontade real op presumida do representado.
praticado sem precedente autorização. A ratifi- Tudo isto mostra bem que, ao contrário da
cação podc ser expressa ou tácita, conforme a represcntação política, na representação de direito
aprovação é formalmente declarada ou resulta 1ò- privado o que prevalece é o princípio do mandato
gicamente de factos concludentes praticados pelo imperativo: o representante deve pôr em acção,
interessado. Expressa ou tácita, a ratificação tem não a sua prbpria vontade, mas sim a do repre-
o eieito.de revalidar o acto como se êle fosse pra- sentado.
ticado nos limites dos poderes conferidos no man-
dato - ratihabitio mand~ito comparatur. Daí
resulta que o acto praticado pelo gestor, ou pelo (1) Ruggiero, pág. 248.
E s6 assim se explica o princípio de que man- quando o próprio representado declare a sua von-
datários ou representantes convencionais podem tade, caso em que o mandatário exerce uma mera
ser os menor- não emancipados (art. 1334.')~ o função de instrumento. E assim que o cbdigo
que seria incompativel com a teoria da vontade civil admite .o mandato para a celebração do ma-
do representante. E se o não podem ser na repre- trimónio (art. 1048."j, c que na emancipação dos
sentação legal dos incapazes é, não sb porque seria mènores, tanto estes como os pais podem ser re-
intoncebível O princípio de se suprir a lncapaci- presentados por procuradores com poderes espe-
dade duma pessoa por meio &e outra legalmente ciais ( cód. proc. civ., art. 770-p, 3 r ."; e 771.O, 9 2 . 0 ) .
também incapaz, mas ainda porque na representa- Exigindo-se para a representação mnvci'nticional, em
ção dos incapazes o representante tem na verdade relação aos actos que teem de realizar-se por modo
uma larga esfera de liberdade de acção dentro dos autêntico ou soléne, ou para cuja prova é exigido
limites dos seus poderes legais. E o mesmo acon- documento autêntico, procuraçãQ piiblica ou havida
tece na representaqãb legal das pessoas colectivas. por pública ( art. r327.O), e sendo nessa procuração
Quando se diz que a represenfação tem carác- expressamente declarada a vontade d o mandante,
ter normal quer-se naturalmente significar que a não há motivo algum para que, em relação a todos
representação legal abrange todos os actos que o s negbcios respeitantes As relaçbes de família, e
entram na esfera das atribuições (competência ) do apesar do carácter pessoal deles, se exclua o man-
representante ; e relativamente a representação dato, que, como já notámos, não tem pròpfiamente,
convencional ou voluntária, que ela pode abranger em tais casos, o carhcter de .representação» (').
todos os actos que não forem de natureza exclusi- Como se v6, o ilustre professor foi muito in-
vamente pessoal. fluenciado pela doutrina dos autores alemães e
I Ern matéria de contractos, dispõe o art. 645.O: italianos. E foi provavelmente o seu modo de
a o s contractos podem s e r feitos pelos outorgantes pcnsar a êste respcito que influiu no espírito dos
pessoalmente, ou por interposta pessoa devida- legisladores de 1910, que reproduziram no art. 2 5 . O
mente autorizada,. do decreto-lei do casamento civil o art. 1068."do
Para os actos jurídicos dispõe o art. 1332.~: código civil, apesar de ser um preceito devido
«Pode qualquer mandar fazer por outrem todos os ao direito canbnico (9). Parece-nos que melhor
actos jurídicos, que por si pode praticar, e que não seria manter integro o principiu do art. 1332.0,
forem meramente pessoais ». que não permite a representação em actos mera-
<Não há dúvida alguma, escreve o Dr. Alves mente pessoais, como acontece com o testamento
Moreira, de que nas relações de família, já por
serem de ordem pessoal, já por nelas dominarem
princípios de interesse e ordem pública, se não (1) Dr. Alves Moreira, pag. 454 e 455.
admite, em regra, a representação convencional. (2) Pois nos, católicos, criticamos êste preceito, consi-
Esta não é, porém, excluída dum modo absoluto, ,derando o incompatível com o caracter essencial e exclusiva-
mente pessoal do casamento.- 01P ~ i n c i p i o sI,, pág. 714. Nem
sendo até em alguns casos expressamente facultada o cbdigo francks nem o italiano admitem a representação no
gela lei, quando o mandato seja especial, ou, antes, casamento.
(art. 1740.0), a confisão judicial em depoimento e considera indispensável a especificaçâo d a cousa
de parte (art. 2411.0, n." r . O , e cbd. proc. civ., doada e da pessoa do donatario, porque de outro
art. 223."), a declaração de honra decisória ou su- modo a doação poderia praticamente perder o carác-
plethria ( art. 2520.~). ter de liberalidade expontânea, e podia ser feita em
A representação por mandato ohedece a certas favor de pessoa em quem o doador nem pensasse,
regras que importa ter bem presentes. não devendo por isso admitir-se o mandato gené-
O poder de representação é dado no interesse rico de doar cai voEes (I).
de quem o outorga, na confiança de que o repre- N6s entendemos que não é suficiente o poder
smtáote se sirva dêle só no interesse do represen- genérico de doar, mas simplesmente pela razão de
tado. Por isso é essencialmente revogável, salvo ser nula a doacão geral (art. 4460."). Mas desde
em todo o caso o direito de indemnização pelos que na procuração se especifiquem os bens a doar,
prejuízos sofridos pelo representante conforme as parece-nos que a procuração é eficaz, sem neces-
especiais relações existentes entre êle e o repre- sidade de se individualizar o donatário, visto que
sentado (art. 1364." e 1365."). o código não estabelece em matéria de doaçdes
O poder de representação é circunscrito aos preceito correspondente ao dos artt. 1740." e 1741:"~
limites estabelecidos por quem o conferiu; e assim que não permite as disposiçdes testamentárias depen-
a representa~ãopode ser geral ou especial. O poder dentes do arbítrio de outrem ou a favor de pessoas
de representação geral não se deve confundir com incertas.
o poder conferidoam termos genéricos; nem o de O acto conshitutivo do poder de representaçáo
representação especial com o poder conferido em deve ser dado a conhecer aos terceiros com quem
termos especi&ados ( art. 13a3.'-1325."). Há repre- trata o representante, precisamente para que fiquem
sentqgo ou procuração geral quando o constituinte sabendo qye os efeitos do acto se referem ao cons-
dá ao procurador poderes para o substituir em todos tituinte. E par isso que a procuração precisa de
os actos referentes ao seu património, quer o faça ter a forma pelo menos tão solene como a exigida
em termos genéricos e compreensivos ( como admi- por lei para o acto a praticar pelo procurador (art.
nistrar, alienar), quer o faça em termos especifica- 1327."-1329.~)-
dos, isto é, designando minuciosamente os diversos
actos autorizados. A representação ou procuração 68. Irrtequetaçãe de9 astos juridi6es.- Pois que
é especial, quando só confere poderes para certos os efeitos do acto jurídico são o resultado da acção
e determinados actos. E assim deve entender-se combinada da,vontade das partes e da lei, é evi-
que procuração para alienar é especial, embora dente a necessidade d e interpretar as declaraçdes
concebida em termos genéricos; e que, portanto, da vontade, como necessária é também a interpre-
com ela pode o procurador vender todos os bens tação das normas legais.
do constituinte. Basta recordar o clássico princípio de que O
Mas que dizer da procuraçáo para doar?
Coviello entende que não é bastante êste poder,
para que o representante possa fazer uma doação;
( 1 j Coviello, pag. 405.
Contracto fuq lei entre as partes contratantes, prin- E facilmente se compreenderá o a l c a n ~ eda dis-
cípio que até foi expressamente formulado emalguns tinção, tenda em vista o pri-ncípio de.que a fonte
c6rligos, como o frances e o italiano, para desde principal, directa e imediata dos direitos e obriga-
.logo se sentir a necessidade de proceder Q inter- çbes 'resultantes do acto jurídico 6 justamente a
pretacão das declaragbes da vontade manifestada vontade, e m q u a n t ~. actua dentro dos limites da
ipara efeitos jurídicos. ordem juridica. A lei s6 intervem para ampliar
O nosso código tanto sentiu esta necessidade, ou restringir o conteúdo da vontade nos seus pro-
q a e na parte geral dos contrados inseriu um capí- pósitos ou pretensóes, em harmonia com a mais
- t d o destinado a dar~lhesatisfação. E o capitulo v£ conveniente e adequada realizago do fim prático
- D a i n t e r p r e t a ~ ã o 50s contractos-art. 684." que se tem em vista.
,e 68s.". Sendo assim, é claro que, na determinação
E parece-nos inquestionável que estas disposi- dos efeitos ou conseqüências dum acto juridico,
soes, na parte apiicâvel, devem também ser obser- que prevalece é a intenção das partes, emquantw
vadas na interpretação dos outros actos jurídicos, se mantem nos limites traçados pela ordem jurídica.
-e& virtude das regras de interpfetação e integração E, portanto; o que em primeiro lugar importa ave-
-da lei consignadas no 'art. r 6 . O . riguar é qual foi a verdadeira vontade dos sujeitos;-
De resto, ainda outras disposiçbes'se encon- e s6 depois, na falta ou insuficiência da declaração,
tram no código, e estas relativas aos actos jurídicos interveem as normas supletivas ou integrantes
em geral, e em especial aos testamentos, como são para a suprir ou completar, e .as normas disposi-
OS art. 378.", 1761." e 18j7P, que se.referem mani- tivas para restringir ou ampliar os efeitos do acto,
festamente i interpretação das declarag~esda von- conforme as exigências do interesse colectivo.
tade jurídica. Mais simplesmente: em primeiro lugar há que.
Ora de todas estas dísposiç8es resulta bem fazer a interpretação propriamente dita da declara-
.nitidamente qual é o conceito atribuído pela lei A ção da vontade; e s6 depois terá lugar o seu supri-
interpretapão dos actos jurídicos, que é bem o mento ou integração, isto é, a interpretação em
seu conceito natural e lógico: é a exacta determi- sentido amplo, pois que as regras supletivas o u
nação da intenção ou vontade das partes a respeito subsidiárias, como as dos artt. 377.', 378.", 1742."~
d o objecto ou contefido cfo acta;; ou, por outras 1797.O e - semelhantes, s6 teem aplicação quando.
palavras, é a determinação do significado e alcance a vontade das partes não tiver revelado outra
atribuídos pelas partes A declaração da sua vontade. intenção-.
Ora, sendo assim, é preciso não confundir a O supremo pfincípio em matéria de interpre-
interpretação da vontade corn o seu suprimento t a @ ~dos actos jurídicos é, pois, o da investigação
.ou integração das suas lacunas, que também mui- da vontade do seu autor, atendendo não s6 a o ,
tas vezes se chama imprdpriamente interpretação sentido literal das palavras por êle empregadas,
ou interpretação em sentido amplo, a qual é reaii-
a - - --- -- mas também e principalmente A sua verdadeira e
zada, não pelas normas interpretativas, mas pelas real intenção, desde que esta seja suficientemente:
normas supletivas ou subsidi-arias. revelada.
Mas isto não sigaifica, como justamente observa O art. 684.0, determinando que a intenção ou
Covtello, que a vontade pura, ainda -que não se vontade dos contraentes, sobre o objecto principal
manifeste externamente, deva ter eficácia jurídica, dos contractos, deve ser deduaida dos seus termos,
pois que assim perderia a sua importância prática natureqa e circunst&ncias, ou do uso, costume
a declaração da voatade; significa, porém, que ou lei, sendo nulo o contracto se ela assim se não
nem sòménte com os meios fornecidos pela gra- puder deduzir, enunciou na verdade uma regra de
mática ou pelo dicionário se pode reconstruir a . interpretação, e tão genériea que bem pode sem a
vontade real, mas também com os elementos for- menor diivida aplicar-se a todos os actos jurídicos.
necidos pela disciplina da lbgica. É sempre indis- Mas tão genérica é, que se toma imprecisa, vaga
pensável que a vontade seja declarada: simples- e indefinida, e por isso mesmo insuf~rente.
mente pouco importa que ela resulte do sentido O art. 685.O, para o caso de haver dúvida sobre
literal das palavras, ou em geral, dos meios empre- os acessórios do objecto do contracto, que não
gados para manifestá-la, ou que, em vez disso, possa resolver-se pela regra do art. 684.", estabelece
resulte por via de d ~ d u ç ó e slógicas do conjunto duas regras subsidjár&s : uma, para os contractos
das várias declarações, do fim prático que se tem gratuitos, que manda resolver a dúvida pela menor
em vista, e de todas as circunstâncias de facto ( I ) . . transmissão de direitos e interesses; e a outra,
Dá-se com a interpretação dos actos jurídicos para os onerosos, que manda resolvê-la pela maior
o mesmo que na interpretação das leis, com a reciprocidade de interesses. São regras mais pre-
diferença de que emquanto aquela é prevalente- cisas, mas de um campo de aplicação muito res-
mente subjectiva, pois consiste precisamente na trito, e traduzem pura e simplesmente a vontade
indagação da vontade-do declarante, esta é princi- presumida das partes.
palmente objectiva, pois que p o r via dela se pro- Como regras legais de interpretação dos actos
cura mais a determinação do sentido e alcance da jurídicos em geral não podem deixar de ser consi-
lei, do que a reconstrução do pensamento ou da derados os artt. 13.0, 14.0e rg.", que são também
vontade dos seus autores individuais 1%). regras de aplicação da lei, e que por isso exami-
Mas quais são as regras da dedução ou indução naremos no capítulo da interpretação e aplicação
lbgica, que devem presidir Q interpretação da das leis (infra, cap. XIII). *
vontade ? O código italiano também tem na parte geral
O código limitou-se a formular para os con- dos contractos um parágrafo destinado A interpre-
tractos as regras dos artt. 684.O e 685.",que devem tação; mas, diferentemente do nosso, consignou
também aplicar-se aos actos jurídicos em geral, verdadeiras regras de interpretação lógica da von-
tanto mais que o seu carácter de excessiva gene- tade dos contraentes, e que, no pensar comum dos
ralidade bem se adapta a todos êles. escritores, sâo igualmente aplicáveis aos outros
actos jurídicos. E, na verdade, tão lógicas são
essas regras, que não podem deixar de ser igual-
( 1) Coviello, pág. 410. mente aplicáveis no nosso direito.
(a) Infra, cap. XIII. Assim :
a) determina o art. r 136.0 d o código italiano deve entender-se no sentido pelo qual pode ter
que- as,.cl&~sulasdos contractos devem interpre- algum efeito, e não por aquele pelo qugl não teria
tar-se umas pelas outras, atribuindo a cada uma o efeito algum ( art. 1132."); ,.
sentido do conjunto do acto; 2.") as palavras, que podem ter dois sentidos,
6 ) o art. 1138.0 prevê a intcrpretação restri- devem entender-se no*sentido mais conveniente A
tiva, determinando que embora as expressdes dum matéria do contracto (art. 1133.~);
contracto sejam gerais, não compreendem senão 3.') a cláusula ambígua ieterpreta-se segundo
aquilo a respeito do que as partes se propuseram o que se pratica no país onde foi estipulado o con-
contratar ; tracto (art. I 134.");
c ) O art. 1139.' prevê a interpretação exten- 4.") nos contractos devem -ter-se por inclui-
siva, determinando que, se num contracto foi ex- das as cláusulas- em uso, ainda que não sejam
presso um caso a fim de explicar uma clausula, expressas (art. 1135.0); '
não se presume que se haja querido excluir OS 5.O) na dúvida, o contracto interpreta-se con-
casos não expressos, aos quais possa razoavel- tra aquele que estipulou ( é o credor, segundo a
mente estender-se a mesma clausula; deve antes técnica da stipulatio), e a favor de quem assumiu
entender-se, diz Coviello, que o caso expresso foi a obrigação ( art. I 137.")- ber~ignus est inter-
indicado apenas exempli causa. Em suma, tanto pretandum, in obscuris quod minimum est se-
numa como ria outra hipótese os actos juridicos quimur ;
devem entender-se nos limites queridos pelas par- 6.") nos contractos deve indagar.se qual tenha
tes: não s e deve. exceder o seu pensamento, nem sido a comum intenção das partes, em vez de se
ficar áquem dêle ; e esta regra vale igualmente para atender só ao sentidoliteral das palavras (art. I 131.").
as renúncias, cláusulas penais e transacções, a res- Mas ti necessário ter sempre em vista que o
qeito das qu" se diz muitas vezes, mas inexacta- critério de investigação e determinação da vontade
mente, que não admitem interpretação extensiva. das partes é naturalmente diverso, conforme se
O que não B admissível é a extensão analógica, trata de actos bilaterais ou unilaterais. Nos pri-
pois que nos actos jurídicos é preciso atender meiros não basta atender i intenção de cada uma
vontade das partes, e á analogia supoe a falta de das partes, pois o que importa é a vontade con-
vontade ( I ) . tratual ou a intenpão comum dos contraentes-
E não se contentou o código italiano com in idem plrzcitum consensus. De modo que se
aquelas três regras gerais de interpretação; mas entre a proposta e a aceitação houver contradi'ção
formulou ainda outras igualmente lógicas, que por ou ambiguidade insolúvel pela interpretação, o con-
isso também julgamos aplicáveis no nosso direito. tracto é nulo, nos termos do art. 684.". Pelo con-
Assim : trário, nos actos unilaterais,'visto que a vontade
I.") a declaração, que admite dois sentidos, do declarante produz os seus efeitos sem necessi-
dade da aceitação da pessoa a favor de quem rever-
tem, basta atend6r h intenção. do autor do acto
( 1 ) Coviello, pags. 410 e 411. ( art. 1761 1837.")-In testamento plenius oolun-
.O,
tates testantium interpretantur, diz-se no D- I. Como já vimos, tratando-se do objecto dos
12. 50. 17. direitos ou das relações jurídicas (supra n.O 281,
O código italiano formulou ainda uma regra, pode distinguir-se entre o objecto (objecto ime-
que embora relativa aos efeitos e cumprimento diato) e conteúdo (objecto mediato). Mas tra-
dos contractos, k ao mesmo tcmpo uma norma tando-se das actos jurídicos, objecto e conteúdo
interpretativa. E' o art. I 124.", correspondente ao são uma e a mesma cousa: 8 precisamente o con-
nosso art. 704.". Determina-se ali que os contrac- teúdo concreto, o alcance jurídico da vontade.
tos devem ser cumpridos de boa fé, e obrigam Ora, atendendo ao seu conteúdo ou objecto, os
não só a quanto é neles expresso, mas também a actos jurídicos sáo nulos ou juridicamente-insubsis-
todas as conseqiiências que segundo a equidade, tentes, sempre que o seu objecto não seja possível,
o uso ou a lei deles derivam. quer por ser impossível ou irrealizável pela pró-
Esta regra 6 tão intuitivamente a pura expres- pria ordem da natureza, quer por ser contdrio h
são de princípios ou sentimentos fundamentais da ordem jurídica (art. 669."). O que ainda mais sim-
Justiça, que não podemos deixar de completar ou plesmente se pode egprimir, dizendo : são nulos
integrar por ela o preceito do nosso artigo 704.O. os actos jurídicos impossíveis, quer a irnpossibili-
Mas isto não significa, diz bem Coviello, que dade seja natural ou física, quer seja legal ou jurí-
o juiz possa refazer o contracto segundo o seu ideal dica, por serem contrários A lei.
d e justiça e de equidade, contra aquilo que as par- A impossibilidade do conteúdo dos actos jurí-
tes tenham realmente querido : significa porém que dicos, em virtude da ordem natural das cousas,
nos contractos as duas vontades devem interpre- tem lugar quando não existem realmente as cousas
tar-se, não isoladamente e unilateralmente, mas que devem formar êsse conteúdo, como na venda
em harmonia entre si, de modo que uma se não de um animal que já tenha morrido, ou de uma
sobrcponha h outra, e resulte assim a vontade casa que haja sido destruída por um incéndio, ou
comum, aquela que cada uma das partes deveria quando as cousas, embora existindo, estãb fora do
certamente ter, segundo o fim do contracto ( I ) . comércio por sua pr6pria natureza, como o mar, o
E' sempre o princípio da voluntas spectanda ar, a luz, etc.; ou ainda quando o acto ou serviço
lógicamente entendido. em que consiste a prestação é absolutamente impos-
sível em si mesmo, sem a t e n ~ ã oa possibilidade da
69. Objecto ou conteódo dos. actos .jurídicos. - pessoa que se obriga (art. 670."), como, por exem-
Por objecto dos actos jurídicos entendem-se, como plo, num contracto que tenha por objecto fazer
nos contractos, o c0,njunto ou sistema de relaçoes secar o mar.
jurídicas que derivam da declaração da vontade ou Nos testamentos, por6m, consideram-se física-
das disposições subsidiárias da lei ( a ) . mente impossíveis, não só as condições que o são
absolutamente, mas também relativamente ?I pessoa
a quem se refere o facto condicianante (art. 1743.0).
(1) Coviello, pág. 412. s-
A impossibilidade legal ou jurídica tem lugar
( % ) Ck Principias, r, pag. 487 e seg. (art. 671.'):
N6s entendemos, porém, que a disposição de
I .o Se as cousas estão f6ra a o comércio por cousas que não perttencem ao alienante está, em
disposição da lei, como as cousas d c ~domínie regra, compreendida no preceito do art. 671.O, n.0 $.O,
público;
2.O Se as cousas ou actos n&o podem redu-
e,
porque na verdade e m regra, não só contrária &.
lei., mas i moral pública.
zir-se a um valor exigível, como, por exemplo, Mas na@ podia, ou pelo menos não devia, o
entregar um animal qualquer, pois que em tais legislador consig~xarexpressamente a regra, preci-
casos a obrigação não foi sèriamente constituída, samente porque ela tem excepções @o amplas,
podendo ser cumprida com a entrega de uma mosca; que quási a i~nutilizam. Tais são as excepqões dos
3." Se a cousa não é ou não pode ser deter- artt. 1054."e 1g5.0,$ único, 1~80r.~-r804." docódigo
minada em espécie, como, por exemplo, um peixe, civil, e art. 467.0 do c6digo comercial. Como eã-
pela mesma razão do número precedente; cepção Aquela regra deve ainda considerar-se a
4.O Se os actos ou servíços forem contrários. abriga@o tendo por objecto um facto de terceiro,
h moral pública ou As obrigaçbes impostas por lei, que consideramos válida em face dos artt. 67c.",
como, por exemplo, no contracto celebrado para. 702.O e p5.O (a). .
agredir ou difamar alguém. A expressão a actos contrkrios As obrigaçoes
Todas as causas de impossibilidade jurídica se impostas por leia, empregada pelo art. 67r.O, n-o4.0,
reduzem afinal a duas-a indeterminagâo econórnicm significa certamente o mesmo que a expressão
e a proibicão legal, ou seja, a incompatibilidade st actos praticados c o n t p a disposição da lei », em-
ou contrariedade das disposiçbes da lei. É a dou- pregada pelo art. io.', apenas com a diferença
trina do carácter patrimonial das obrigacb,es, d o s objectiva d e que os actos a que se refer? o art. 10."
requesitos. da prestação e do objecto dos contra- são os actos jurídicos pròpriamente ditos, emquanto
ctos ('). que o art. 671.0, n.O 4.0 se refere aos actos e aos
«Entye as causas de nulidade dos actos jurídi- factos voluntários, materiais ou imateriais.
cos em razão do seu conteúdo, observa o Dr. Alves. Mas o que deve entender-se por actos contra
Moreira, não especifica o código a que resulta de Legem ?
se dispôr de uma cousa a que as partes não teem. Abrangerão tamb6m a fraus Zegis, isto é, os
direito. Em vários contractos há referência a essa actos de fraude h lei? Ou são estes uma categeria
condição nas disposiçbes i-elativas A capacidade,. à parte, com uma figura própria e autónoma, que
mas um negócio jurídico assim realizado não pode não se confunde com aqueles?
deixar de considerar-se nulo em virtude do seu, Para se ver a importância prática do problema,
conteúdo. Assim será nula a venda ou arrendamento- basta considerar o exemplo muito frequente a pro-
dum prédio alheio, que o possuidor, em virtude de: pósito dos arrendamentos, em que o senhorio, para
êrro, supunha que,lhe pertencia.» ( 3 ) .
deração o último, o mais pr6ximo da acção, isto Ora, a verdade é que muitas vezes êste con-
é, aquele que a determinou e que está, objectiva- ceito da causa é tudo o que há de mais contrário
mente e juridicamente, a justificar a promessa ou 4 realidade dos factos: 6 o que acontece sempre
a entrega; abstrai de todos os ouiros mais remo- que a doacão é inspirada por um fim ou por um
tos, que embora também tenham impulsionado a motivo imoral ou contrário Q lei. Em tais casos,
vontade dando-lhe ocasião a determinar-se, não é'bem verdade, como dizem Colin et Capitant,
são porém suficientes para, em si e por si, a deter- que há naquela doutrina uma maneira de ver com-
minar, e justificar assim a promessa ou a entrega; pletamente inexacta : é uma tautologia, pois equi-
e não os toma em consideração porque eles são vale a dizer que o doador dá porque quer dar, e
em regra irrelevantes ou indiferentes para o não explica cousa alguma. A verdade é que, para
direito, a não ser que tenham sido'incorporados conhecer a causa duma doação, é preciso averiguar
na própria declaração da vontade sob a forma de o motivo porque o doador a fez. Ora a resposta
condição, de modo ou pres~posição, de forma a há de necessariamente encontrar-se no espírito do
fazer parte integrante dela. Pois bem, aquele doador; convém pois descobrir qual fui o mbbil
motivo é a cazisa, quer dizer, a razão determinante determinante que o levou a fazer a liberalidade!
da vontade e, para os neg6cios de conteúdo eco- A causa confunde-se aqui necessariamente com o
n6mic0, o fundamento que justifica a atribuicão motivo. A sorte da doacão dependerá de se saber
patrimonial; estes são os motivos, isto é, as causas se o móbil da liberalidade tem alguma cousa de
impulsivas, individuais e subjectivas; aquele é a contrario as leis ou aos bons costumes. Tal é a
condição essencial da existência do neg6cio jurí- solução que se apresenta perfeitamente conforme
dico, sem a qual a vontade não seria de per si ao interesse social. A doação é um acto muito
capaz de produzir o efeito que procura; estas são grave para os interesses das famílias, e constitui
a razão ocasional e acidental do negbcio, á qual, um instrumento de persuasáo e corrupção dos
embora não falte em regra como estímulo p r i m r - necessitados, demasiado poderoso e perigoso, para
diai da vontade, não tem comtudo para o direito que a lei possa admitir a sua eficácia, quando a
importância alguma ( I ) .
rida, para depois fazer a sua aplicação aos casos vontade e a declaração, que afectasse a formação
concretos (.i ). jurídica dêsse acto e o ferisse de nulidade (I).
Nós preferimos seguir o caminho inverso : exa- b ) ,Teoria d a cul#a i n contrahendo. Como
minar primeiro os principais casos típicos de dis- reacção contra a injustica e conseqüente imperfei-
cordZincia, procurando dar-lhes a justa solução, para cão da teoria da vontade, mnstruiu Ihering a sua
concluirmos depois por vêr se há alguma teoria ou teoria da culpa in contraheitdo., Segundo Ihering,
critkrio geral orientador das soluçbes práticas. a pessoa que faz uma proposta de contracto tem
Aqui limitamo-nos a indicar as principais teo- obrigação d e fazer uma proposta eficiente, isto é,
rias até hoje apresentadas. deve assegurar-se primeiro que, oeg em si próprio,
a ) Teoria da vontade ou da vontado reaz. nem no objecto do contracto, há qualquer defeito
Foi a primeira que se prop6s resolver o problema ; que se oponha h sua eficáciai - P-or ísso, assim
é da autoria do grande romanista Savigny. O como pode haver culpa ia contractu, também a
Dr. Beleza dos Santos resume-a muito bem em três pode haver i n contrahendo\; e tarnb6m desta
postulados : resulta a responsabilidade contratual por perdas e
1.0 A vontade que se não declara é por sua danos, não o id quòd interesf positivo da execu-
pr6pria natureza juridicamente irrelevante ; .
ção do contracto, mas sim o interesse negativo
2.O A declaração sem vontade é ineficaz, ainda ( negat ives Verfraqsinteresse ou Vertrauenscha-
mesmo que a contradição entre a vontade e a sua den) representativo do que o contraente prejudi-
declaração seja devida a culpa do declarante, excepto cado não teria perdido ou deixado de lucrar, se o
no caso de reserva m e e a l não conhecida da pessoa contracto nulo se não tivesse celebrado (').
a quem a declaração,se dirija ; Mas, como se vê, a teoria não resolve o pro- .
, 3.' &Seuma declaraçãlo aparente oculta outra blema, sendo apenas um pequeno remédio, aiiás
declara*^ de vontade real, é esta bltima que deve muito falível, contra o prejuízo e a injustiça em
prevalecer. muitos casos resultantes da anulaçáo de contractos,
Esta teoria, apesar do seu carácter de dedu- decretada pela teoria da vontade.
ção lógica, leva a c~nseqiiênciasinjustas e peri- c ) Teorta da declaracão, Dadg a injustiça,
gosas. ou pelo menos, a -inconveniência- da teoria da
Por esta doutrina, diz bem o Dr. Beleza dos vontade real, proauraraF..muitqg juriscsnsultos
Santos, quem confiasse na verdade, na seriedade, fazer valer a deciarago stibre a própria vontade.
na eficbcia de um acto jurídico, poderia ver a sua Um dos mais notáveis defensores desta teoria,
confiança iludida, a sua boa fé ludibriada pela Saleilles, diz : a quem emite uma declaração jurí-
existêhcia imprevista de um desacordo entre a dica aceita ficar vinculado para com aquele a quem
se dirige, pelo sentido normal das expressões que
sejam feitas com aparência de seriedade, como dicos, juntamente com as disposiçi3es especiais
sérias teem de considerar-se, o que equivale a (artt. 1719.", 1745.", 1748.0, 2036.", 2037.O, 2413."~e
dizer-se que a declaraçfio de vontade deve presu- art. 20.0 do decreto-lei do casamento) determinadas
mir-se como sendo a expressa0 da verdadeira e pela natureza especifica de alguns dêles.
real vontade. Em primeiro lugar, os autores modernos dáo
Em conclusão : para os efeitos jurídicos, a decla- grande importância A distinção, j l entrevista mas
raç8o da vontade exprime sempre a intenção ou mal definida por Savigny, e depois precisada por
vontade real, excepto quando as próprias circuns-
tâncias em que é feita revelam o contrário, ou ( 1 ) Os Princi$ios, I, pág. 486. O Dr. Alves Moreira,
quando o declarante a fizer em estado de incapaci- Inst., pkg. 411,diz que, se o nosso c6digo trata apenas do êrro,
dade ou de êrro essencial, quer no processo não se referindo a ignorância, foi isso devido sem duvida a que
psíquico da formaçáo, quer na declaração da não C provavel a realização dum negócio jurídico sbbre cujo
conteiido as partes tenham completa ignorAncia. Nós o que
vontade. pensamos C que se tal facto se der, a nulidade do acto resulta
E' isto que nos parece ser a exacta teoria necessánamente tanto da incapacidade como da falta d e con-
das relações entre a vontade juridica e a sua sentimento. Mas o que é certo é que a ignorânciaestá incluída
declaração. no Crro.
Larombiere,; entre o êrrò que se da no próprio O êrro na declaração pode consistir numa sim-
pmçess.0 pshpico, da formação da vontade ( érro
pròpqjaarpn$eií dito, êrro-motiao, êrro-vicio ou
ê~?o:nglidade) e o que recai sdbre a declaração
( êrro impndprio, essencial ou êrro-obstáculo ).
ples distracção, um lapsus linguae ou lapsus cala-
mi, como se, por exemplo, em vez de se dizer ou
escrever « vender», se disse ou escreveu « aforar
se, em vez de se escrever Fernando, se escreveu
Francisco, se num telegrama a transmissão é dife-
.,
O erro que recai apenas sôbre o próprio con-
teúdo da vontade não dá lugar a divergência entre rente do que se escreveu, etc., etc.
a,vontade real e a declaração, porque a vontade Diferentes destas e outras semelhantes hip6te-
efectiva é exactamente a manifestada; o que h l 8 ses, embora por vezes se possam confundir, são as
desacordo entre a vontade actual, isto é, a que s e de êrro determinante da vontade: são aquelas em
formou em virtude do erro, e a vontade eventual, que alguém tem um conceito errado, isto é, está
ou a verdadeira, isto é, a que se teria formado, se enganado ou iludido, sdbre as pr6prias pessoas,
não fora a influência do êrro.
Se, porém, o êrro, em vez de recaír sòbre o
processo psíquico da formação da vontade, se da é o êrro a causa da invalidade do acto, mas sim a falta objec-
depois no conteúdo da declaração, surge a diver- tiva de um dêstes elementos essenciais, ja náo é igualmente
gência entre a vontade e a sua manifestação, porque exacta, quando o êrro produz o desacordo entre a.vontade
uma cousa é O que se quis e outra é o que s e e a declaraçso. Com efeito, se êste desacbrdo não importa
por si mesmo e em todos os casos a nulidade do acto, como
declarou querer - aliud dixit, aliud voluit. acontece na reserva mental, é claro entretanto que o facto cau-
; No primeiro caso formou-se, ou, pelo menos, sador dêsse desacordo não pode ser um facto indiferente : se,
praficou-se regularmente o acto jurídico, mas tra- quando há desacordo por equivoco ou mal entendido, h6 nuli-
tqado-se de êrro grave ou .substancial, êle está dade, a verdadeira razão desta nulidade está precisamente no
afectacio cle.um vicio estrutural e orgânico, que êrro, que por isso não pode chamar-se impróprio ou indife-
rente, como nos actos acima mencionados.
importa a. anulabijidade dos, Seus efeitos ; e por isso Nem táo pouco é aceitável a denominação de êrro esse#-
êsse erro se chama êrro-vicio ou Erro-nulidade, ~ t a l porque
, assim é precisamente e com razão chamado o êrro
No .segundo caso, nem sequer se chegou a que intlui na determinaçao da vontade e que, recaindo nos ele-
formar o u praticar regularmente o acto jurídico, mentos essenciais do-aeto, pode causar a sua nulidade, o qual
porque a vontade não foi devidamente declarada, então, para se contrapor aquele teria de se chamar acidental.
Tal é a razão porque os autores italianos lhe chamam êrro
não chegando o acto a ter existência jurídica; e ostatzuo, seguindo a autoridade de Giorgi, que assim traduziu
por isso esse êrro se chama êrro-obstBcuZo, visto a expressão erreur-obstacle, que Larombiére empregou em con-
que se op6s ou obstou a formação regular do acto (l). traposição ( e não equivalente, como erroneamente diz Brugi,
nas Istituqioni d i dirzto ciwzle, 24 ) a frase erreur-nullitd,
usada para indicar o Crro determinante da vontade; pois
(1) @ta espécie de erro tem na doutrina várias denomi-- emquanto que êste não impede a formaçáo do acto, mas s6 o
nações : Prro imprbprio, Erro essencial, êrro oúslatzvo. A deno- torna anulavcl, o outro, pelo contrLrio, sendo causa do desa-
minação de impróprzo, adoptada por Savigny, se é exacta para cordo entre a vontade e a sua manifestação, produz a falta do
o erro que recai sbbre a existência do objecto do contracto ou elemento essencial da vontade, sendo por isso um obstáculo a
sòbre a capacidade do outro contraente, pois em tais casos não própria existência do acto - Coviello, pag. 380, nota (2).
cousas ou factos, que quer designar ou exprimir, quer seja na declaraçáo, para determinar a sua in-
como, por exemplo, se crê que a pessoa a quem fluência na eficácia do acto, importa distinguirentre
faz uma doacão é aquela que o salvou num perigo, o êrro dsencial e o acidental ou concomitante.
quando náo é; como s e julga que uma cousa, a Essencial é aquele que recái sobre pontos
que quer referir-se, é a mesma que viu em certa substanciais da relação jurídica, isto é, sôbre algum
omsiáo, quando não é assim. Em tais casos há dos elementos essencialmente constitutivos do acto,
um êrro, que não recái sdbre a expressão, mas sim quer o sejam em virtude ân sua natureza intrínseca,
sobre o pr6prio conteúdo da vontade. conforme o tipo abstracto de que s e tratar, quer
Segundo diz Coviello, êste êrro -o êrro-vício seja porque no caso concreto a vontade das partes
-é o considerado no c6digo italiano; o outro- estipulou como elemento importante e decisivo
O êrro qbstativo - é considerado s6 no campo da algum que normalmente não teria tal carhcter.
doutrina (I). Acidental é a êrro que recái sôbre qualquer
Não nos preocupando com o sistema do c6digo outro elemento secundário ou acessório do acto.
italiano, embora nos pareça muito duvidosa a aíir- Por sua vez o êrro essencial pode ser:
magáo de Coviello, o que é certo é que no sistema a ) E r r o r in negotio, o erro sdbre a natureza
do nosso c6digo (art. 656."-665.") são consideradas ou espScie do acto, isto é, um erro que recái sdbre
as duas espécies d e êrro ). a própria índole do acto que se realizou, confun-
Quer se trate de êrro na formação da vontade, dindo-se, por falso conhecimento do direito, uma
causa jurídica com outra, como, por exemplo, con-
tratando-se um aforamento, quando o que se quer
( 1 ) Coviello, pág. 381. é apenas um arrendamento. Êste ê r r o pode tam-
(2) Assim o enteadia o Dr. Alves Moreira, lnstttuzçõcs, bém dar-se apenas na declaração ( êrro-obstácuIo ),
pág. +r*, 413,417 e 418. CD~tudoO Dr. Beleza dos Santos, no se a confusão resultou d m e n t e de engano ou
seu belo livro sobre a Simtilaçiio, pig. 49 e seg., deixando-se equivoco nas expressões da enfitêuse e da locação.
influenciar pela doutrina de Coviello, sustenta que os art. 656.0
e srg. se referem somente ao êrro na formaqão da v o n t a d ~ ,
E o a e s m o pode dizer-se a respeito das outras
que importa apenas a anulabilidade do acto, emquanto que o espécies de êrro essencial, se bem que a diferença
erro na declaração só é atingido pelos art. 641."-643.Oe 647.0, e seja por vezes muito subtil.
equivalendo à falta de consentimento, importa a inexistência b ) E r r o r in corpore, o êrro que recai sdbre
ou nnlidade absoluta do acto. a identidade do objecto, como, por exemplo, se
Mas basta reparar em que a palavra <consentimento>,
se declara querer, comprar um cavalo que está &
mento .,
( de cum e senttre) e, portanto, a expressão * êrro de consenti-
abrangem não só a determinação da vontade mas
tambCm, e principalmente, a sua declaração, para nos conven-
vista, e êsse efectivamente se quer comprar, mas
raiicia de tais vicios pelo nlieria~ireiiáo o exime a rcspoiisabi- O que deve entender-si: por erro qeral e
lidade. c o m ~ ~C mÉ naturalmente aquele em que incorre a
-4rt. r10j.O Sc o aiicnantc coiihccia o vicio, ou o defeito, generalidade das pessoas. toda ou quási toda a
restituira o que rcccbeu com perdas c danos; se o nao conhe- gente.
cia, tam sbmcnte restituíra Q vaior recebido. mais as despesas
do coiitracto. Daí resulta não ser provável que um tal ê r r o
Art. 1104.' A responsabilidade do alieiiai~tesubsiste airida recaia sobre elementos essenciais ou substanciais
quc a cousa perega em poder do alieriatario, s e pereccr por dos actos jurídicos, e portanto suficientemente
vicio oculto, ja existente ao tempo d a tradição.
h r t . I to^.“ Em vez de regeitar a cousa, rcdibirido o con
tracto, pode o adquirente reclamar abatimento no prcqo.
Art. I 106." Se a cousa foi vendida em hasta pública, não (i) Coviello, pag. 342.
cabe a acção rcdibitoria, ncm a de pedir abatimetito no preco. (2) Dr. Alvcs Moreira, Inst., r, p á g 422.
intenção de causar um dano ou prejuízo, compreen-
grave para importar nulidade; e que, em todo o dendo assim o dolo propriamente dito também a
caso, mesmo quando tal aconteqa, seria inconve- má fé: isto é, tanto as hipóteses em que, por meio
d e falsas atirmaçbes ou artilicios, se induz uma
niente. e por isso injuridico. decretar a nulidade,
pois esta iria abranger toda uma série indefinida pessoa e m êrro, como o silêncio, a inacção, nos
de actos aliás praticados em condiçoes normais e casos e m que haja o dever de elucidar a outra
iguais da consciêilcia e da vontade dos contra- parte sôbre qualquer êrro e m que ela labore para
tantes. que se não realize e m prejuizo desta o locupleta-
A regra do a r t . 6b4.O está formulada sòmente mento de quem com ela contracta. Assim, se um
para o êrro como vicio na prestação do coiisenti- indivíduo declara vender a outro um objecto d e
mento nos contractos. prata dourada, e êste sabe que o objecto não é d e
Entret:into a nossa jurisprudência, embora com prata mas de ouro, tem o dever de o prevenir d o
divergéncias! também a tem aplicado As formali- seu êrro, sob pena de o contracto poder ser rescin-
dades dos actos jurídicos, julgando. por exemplo, dido em virtude da má fé ( I ) .
valido um documento e m que era testemunha um O dolo ou a má fé é pois um acto ilicito, con-
estrangeiro por êrro geral e comum considerado siderado na f o r m a ~ ã o do acto jurídico como uma
português ( ' ). causa que desvia a vontade da sua determinação
consciente, provocando um êrro ou mantendo O
êrro ja existente. P o r isso a lei: e m tais casos,
76. Erro causado por fraude: dolo e má fé. - Êrro
especialmente regula20 é o induzido ou mantido não se contenta ein considerar o êrro e m s i ; e vai
fraudulentamente, isto é, por d o l o ou m á f é . nos atk h sua causa. para sancionar a anulação d o negó-
termos do art. 663.': <o,krro, que procede de cio, ainda que o êrro haja recaído sobre elementos
dó10 ou de má fé de um dos contraentes, ou de não essenciais ou sôbre motivos internos ( = ) .
terceiro, que tenlia interèsse directo no contracto. Q u e r dizer: emquanto se trala apenas de con.
produz nulidade. 5 Único. Entende-se por dolo siderar o êrro em si mesmo, independentemente
nos contractos qualquer sugestão ou artificio, que da sua causa ou proveniência, a lei só o admite
s e empregue para induzir e m êrro, ou manter nêle como causa de nulidade d o acto jurídico quando
se mostre nos precisos termos dos artt. 660." a
algum dos contracntes; e por má fé a dissimula-
ção do êrro do outro contraente, depois de conhe- 662.O que êle foi a,causa determinante da vontade
cido 3. declarada. isto é, que s ó pela razão do êrro, e não
Como justamente observa o Ur. Alves Mo- por outra. a parte enganada fez a declaração d e
reira, a palavra d o l o também pode significar, em vontade n o acto jurídico: não basta a verificação ,
contraposição R falta de diligência ou culpa, a
PESSOAS
C.~PÍTUI,O 1
Pessoas individuals
I>*GS.
Pessoas colectivas
E\iitêiicia dc pessoa$ cnlectivar, l ) e s ~ n v o l r t m ~ n t ~
histórico do seu conceito juridico. ...... 103
Teorias sóbre o conceito e fundamento d a personali- .
35. Cousas divisiveis e inrlivisiveis . . . . . . . .
dade colectiva. ............. jb. Cousas principais e ace~sorias. Pertenças, frutos e
Elemeiitos constitutivos da pessoa colectiva . . . . bem feito ri.^^........ . . . .....
. . . . . . .
Classificação das pessoas colectiras 37. Cousas apropriadas e 5 nullius . . . . . . . .
Corporaçaes e f~1iiiidaç6esoii institui<óei . . . . . . .
38. Cousas presentes e fiitiiras . . . . . . . .
Pessoas colectivas públicas ou de direito público r jg. Cnusas iimples r compostas. c Univer-itatis facii e
privadas ou de direito privado. . . . . . . . universitatis juris a ............
Pessoas civis e eclesiasticas ..........
Pessoas coleclivas nacionais e estrangeiras. . . .
Classiiicação legal : pessoas morais e socicdadcs; per-
pktiias e tpmporárias . . . . . . . . . . . Classificação legal das eousas
CorporacO~se iiistituiç6es qiie não sai1 peisoas colec-
tivas. . . . . . . . . . . . . . . . . 40. . . . . .
Cocisas no comtrcio e fora do comércio
Constituição das corporaçóes c iiistitu'içiws .... 1 1 . Cousas m6veis e imóveis. Conceito e alcance desta
Orgaiiização das pessoas cillpcti\.~i: cstriitiira iiit-riia
c representação externa . . . . . . . . . .
ciassificação. . . . . . . . . . . . . . . .
. Siitema do cridigo iia Lietcrmiiia~ãodos imóveiq c dos
Capacidade das pessoas colectivas. I'riricipio geral e
restri(<>es . . . . . . . . . . . . . . .....
iiióv~is. Subdivisão de uns e outros.
43. Çigiiificaçáo das cspressfies iniiiveiq e iinobiliários,
l~uiicionamcntoe t r a n e l r m a ç í o das pessoas rolec-
tivas . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . .
móvsis c mobiliários
41. Significado da expressão « moveis de tal casa ou
Estiii<ão das pessoas c»li.ctiv~-. Dr:-titi« do patri-
. . . . . . . . . . . . . . . . .
inciiiio
prcdio . . . . . . . . . . . . . . . . .
15. lmóveiç por natureza e mediante o acção do honiem
- prCdios rústicos e iirbanos . . . . . . . .
46. Imovcis por disposição da Lei - produtos dos prédios
rústicos . . . . . . . . . . . . . . 'r '
4 . Parte3 integrantes dos p r d i o s ríisticrrs e urbanos. .
SEGCSD.\ SECÇÃO
48 Direitos inerentes aos prldios rusticos e urbanos . .
49. Fundos consolidados e outrac cousas por lei iinohili-
COUSAS zadas . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . .
50. ' Coiisas moveis. Suas especies
Sr. Cousas publicas, comuns e particulares. Fundamento
desta classificação ..............
Conceito jurídico e classificaçáo doutrina1 das cousas 52. Xoção e caracteres distintivos das cousas publicas,
comuns e particulares . . . . . . . . . .
LS. Objecto dos direitos e cousas . . . . . . . . . 241 53. -1questão da propriedade das coiisas publicas e co-
29. Xoção jiiridiia das cousas -- Lousas c bcii> . . . . muiis. Doininio píiblico ......... .
30. Conceito jurídico do patrimoiiio. Pati-imo:iios aiitóno- 54. Eniimera~ãodas cousas piiblicas ........ .
mos ou separados e colccrivos. . . . . . . . zjo 55. Baldios municipais ou paroquiais ...... .
31. Clasnificaçórs doutriiiais e lcgais das cou-as, . . . 267 . . .
56. Cousas partiiularcs ou do domínio pi-ivado .
,;L Lousas corporeas incorpórcas. Direitos &bre di-
rcitos . . . . . . . . . . . . . . . . . ~ 6 8
33. Cousriç consumivcis:e iião consumir7ci<. . . . . . z ~ a
. . . . . . . .
31. Cousas fuiigivei? e hão fungíveis 273
74, Èrro "bre a s qualidades do objecto: lesão e vicios
FACTOS J U R ~ I I I C O S ...............
I t:dibitbrios 502
-1,.- Èrro geral e comum. . . . . . . . . . . . . 506
76. f,rro causado por fraude : dolo e m a fe. . . . . . 508
77. .Icoacção. . . . . . . . . . . . . . . . . 513
j7. 12 teoria e a classificação dos factos jurídicos . . . 37 1 60. Efeitos do acta ~ n r i l i c opara com a s partes e para
58. Conceito do acto juridieo. Prefercncia da termiiiolo- com tcrcciros, O registo. ......... 528
pia tradicional sbbrc a denominaç6o de neg6cio
jiiridico . . . . . . . . . . . . . . 375
59. Elementos d o s actos jurídicos. . . . . . . . . 385
60. Classificação dos actos jiiridicos . . . . . . . . 3%
6 Adquisicào, iilodi6caçbo e perda ou cxtiiição de dirri-
to=. Sucess'5o . . . . . . . . . . . . . 394
62. Actos jurídicos que importam alieiia$iio ou rvniiii-
cia . . . . . . . . . . . . . . . . . 399
63. O tempo como facto juridico. 1~'ixa~:o r ciimpiiio. . 409