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Do ponto de vista da sua construção, este filme pode dar razão aos que criticam
Manoel de Oliveira pela verborreia dos seus filmes. Não haja dúvida de que é a muitas
das suas perplexidades sobre o destino português que o cineasta procura responder
30nas discussões que encena entre os militares em palco de guerra. […] O confronto
ideológico que o País viveu, face à guerra colonial, corporiza-o Oliveira nos diálogos
entre os militares, uns partidários do regime e outros forçados à tropa. Se,
ceticamente, o furriel Manuel, representado pelo ator Diogo Dória, comenta que «o
que defendem acerrimamente o regime, como o soldado Salvador, seja dos que se
posicionam num combate ideológico frontal que esquece as próprias raízes nacionais.
Pois é no entretecer desta disputa ideológica que o filme vai evocando os factos
e figuras que marcaram a construção da nossa identidade como povo. De forma
45exemplificativa, a própria figura de Viriato é perspetivada como a de um «patriota
trágico», que não compreendia as vantagens civilizadoras da romanização. Por
analogia histórica, serve o episódio de Viriato para desencadear uma discussão mais
atualizada sobre o sentido da herança colonial em territórios africanos. A personagem
do cabo Brito, figurativa de uma certa corrente de opinião política, manifesta
50profundas dúvidas sobre a missão civilizadora do colonialismo; de forma contraposta e
mitigando esta posição mais radical, o furriel Manuel invoca, a favor do legado
histórico colonial, o sentido de nação que foi dado às tribos africanas. Como diz a
personagem, «os portugueses, reunindo as tribos, criavam a formação de uma pátria»,
que até aí não tinha qualquer perspetiva de configuração. O mote está dado para uma
55discussão de fundo sobre a missão histórica dos Portugueses, emergindo o sentimento
de derrotismo como uma ameaça insidiosa ao orgulho nacional. Derrotismo que o
desastre histórico de D. Sebastião faz ecoar como paradigmático da nossa perda de
identidade e que Manoel de Oliveira quer superar quando, pela boca do furriel
Manuel, transfigurado nos campos de batalha de Alcácer-Quibir, declara: «Portugal
60tem um destino maior.» No entanto, é manifesta a complexa ambiguidade que resulta
Afinal há quem repare que a palavra «Non», que dá o título ao filme, é uma
palavra temível1 que parece dar crédito a uma certa descrença sobre a nossa própria
1
«Terrível palavra é um Non» é uma frase de um dos sermões de António Vieira (Sermão da Terceira
Quarta-Feira da Quaresma).
1. Para responder a cada um dos itens de 1.1 a 1.7, selecione a opção que completa
corretamente cada afirmação.
1.3 Parece persistir no inconsciente coletivo (i. e., na mentalidade do povo português)
(A) um sentimento de alegria provocado pela descolonização.
(B) alguma tristeza provocada pelo desaparecimento do império colonial.
(C) uma indiferença relativamente à descolonização e à missão histórica dos
portugueses.
(D) uma indiferença em relação aos feitos do passado.
1.7 Para a autora do texto, uma característica que distingue a obra de Manoel de
Oliveira é o facto de
(A) resultar de um ato de reflexão e pensamento.
(B) transportar o espectador para um mundo fantástico.
(C) despertar no espectador emoções muito fortes.
(D) oferecer respostas claras e definitivas sobre a identidade dos Portugueses.